  ,
  
Carlos Cândido de Almeida
Mariana Vii-Rodrigues
(Organizadores)
ESTUDOS
PLURIDISCIPLINARES DA
INFORMAÇÃO
ESTUDOS PLURIDISCIPLINARES DA INFORMAÇÃO
  ,   
Carlos Cândido de Almeida | Mariana Vii-Rodrigues (Orgs.)
Programa CAPES-PRInt-UNESP, Código de Financiamento 001
Processo: 88887.571329/2020-00.
Auxílio para impressão: CAPES-PROEX - Auxílio - 1628/2024 -
Processo: 88881.974501/2024-01
Coleção Estudos em
Ciência da Informação
3
Coleção Estudos em
Cncia da Informão
Nº 1 - Estudos críticos em organização do
conhecimento
Organizadores: Carlos Cândido de Almeida,
Rosa San Segundo e Daniel Martínez-Ávila
Nº 2 - Estudos pluridisciplinares da informação:
filosofia, tecnologia e semiótica
Organizadores: Carlos Cândido de Almeida e
Mariana Vitti-Rodrigues
Nº 3 - Estudos pluridisciplinares
da informação: ciência da informação, ética e
linguagem
Organizadores: Carlos Cândido de Almeida e
Mariana Vitti-Rodrigues
3
PPGFIL
PPGFIL
"Como é de se presumir, o diálogo entre
cientistas da informação, cientistas da
computação, filósofos e outros especialistas
e as convenções sobre os termos de toda e
qualquer discussão nem sempre são fáceis de
atermar.
A ideia original de reunir os estudos da ci-
ência da informação, ciência da computação,
filosofia e outras áreas sobre o tema informa-
ção ficou extremamente complexa, como
devia de ser. Para tanto, foi recomendado se-
parar o projeto em duas coletâneas: a primei-
ra, intitulada Estudos pluridisciplinares da
informação: filosofia, tecnologia e semiótica
(Coleção Estudos em Ciência da Informação;
2) e a segunda, intitulada “Estudos pluridis-
ciplinares da informação: ciência da informa-
ção, ética e linguagem” (Coleção Estudos
em Ciência da Informação; 3). A leitura do
conjunto permitirá uma compreensão mais
adequada das perspectivas realistas e relativis-
tas da informação, embora estas classificações
não sejam sempre as mais adequadas para
abarcar a complexidade das contribuições
dos diversos autores."

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Estudos pluridisciplinarEs
da informação
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3
Marília/Oficina Universitária
São Paulo/Cultura Acadêmica
2025
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(O)
Estudos pluridisciplinarEs
da informação
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3
PPGFIL
Editora afiliada:
Cultura Acadêmica é selo editorial da Editora UNESP
Oficina Universitária é selo editorial da UNESP - campus de Marília
Copyright © 2025, Faculdade de Filosofia e Ciências
Ficha catalográfica
E82 Estudos pluridisciplinares da informação : ciência da informação, ética e linguagem / Carlos Cândido
de Almeida, Mariana Vitti-Rodrigues (organizadores). – Marília : Oficina Universitária ; São Paulo
: Cultura Acadêmica, 2025.
372 p. – (Coleção estudos em ciência da informação ; 3)
Inclui bibliografia
ISBN 978-65-5954-634-3 (Impresso)
ISBN 978-65-5954-635-0 (Digital)
DOI: https://doi.org/10.36311/2025.978-65-5954-635-0
1. Ciência da informação - Filosofia. 2. Abordagem interdisciplinar do conhecimento. 3. Ética. 4.
Notícias falsas. 5. Linguagem e ética. 6. Semiótica. I. Almeida, Carlos Cândido de. II. Vitti-Rodrigues,
Mariana. III. Série. CDD 020.01
Telma Jaqueline Dias Silveira –Bibliotecária – CRB 8/7867
Este trabalho está licenciado sob uma licença Creative Commons Attribution-NonCommercial-NoDerivatives
4.0 International License.
Diretora
Dra. Ana Clara Bortoleto Nery
Vice-Diretora
Dra. Cristiane Rodrigues Pedroni
Conselho Editorial
Mariângela Spotti Lopes Fujita (Presidente)
Célia Maria Giacheti
Cláudia Regina Mosca Giroto
Edvaldo Soares
Franciele Marques Redigolo
Marcelo Fernandes de Oliveira
Marcos Antonio Alves
Neusa Maria Dal Ri
Renato Geraldi (Assessor Técnico)
Rosane Michelli de Castro
Parecerista
Prof. Max Rogério Vicentini
Professor Associado do Departamento de Filosofia e
Programa de Pós-Graduação em Filosofia da Universidade
Estadual de Maringá (UEM).
Coleção estudos em CnCia da informação
Organizador: Carlos Cândido de Almeida
Normalização:
Lucas Corrêa da Cunha Silva
CRB 3: CE1626
Câmpus de Marília
Agradecimento
O presente trabalho é resultado das atividades decorrentes das bolsas recebidas pelos organizadores do livro, a saber:
mariana Vitti-rodrigues
Bolsa de Pós-Doutorado (Brasil) - Processo FAPESP n. 2020/03134-1
Bolsa de Estágio de Pesquisa no Exterior (Inglaterra) - Processo FAPESP n. 2023/01408-5.
Carlos Cândido de almeida
Bolsa de Produtividade em Pesquisa CNPQ - Processos n. 316198/2021-8 e n. 309086/2025-6.
Os organizadores agradecem o apoio recebido para a realização deste projeto.
5
SUMÁRIO
PREFÁCIO ................................................................................... 9
Rodrigo RABELLO
APRESENTAÇÃO ........................................................................ 21
Carlos Cândido de ALMEIDA
Mariana VITTIRODRIGUES
PARTE I - INFORMAÇÃO, CIÊNCIA DA INFORMAÇÃO E
BIBLIOTECONOMIA
1. DOCUMENTO E INFORMAÇÃO: MEDIAÇÕES ENTRE
INSCRIÇÃO E REALIDADE....................................................... 33
Rodrigo RABELLO
2. SISTEMAS, INFORMAÇÃO E COMPLEXIDADE:
ALGUMAS QUESTÕES EM TORNO DOS OBJETOS E DO
PENSAMENTO NA BIBLIOTECONOMIA E CIÊNCIA DA
INFORMAÇÃO ........................................................................... 71
Marivalde Moacir FRANCELIN
6
3. UMA ARQUEOLOGIA DO SABER NA CIÊNCIA DA
INFORMAÇÃO: PERCURSO INTELECTUAL DO
PROGRAMA DE PÓSGRADUAÇÃO EM CIÊNCIA DA
INFORMAÇÃO DA UNESP ...................................................... 91
Augusto Júnior MACUCULE
Marta Lígia Pomim VALENTIM
4. CARTOGRAFIAS ANTIEPISTEMICIDAS EM
BIBLIOTECONOMIA E CIÊNCIA DA INFORMAÇÃO DESDE
ÁFRICA: EPISTEMOLOGIA DECOLONIAL A PARTIR DA
REPÚBLICA DEMOCRÁTICA DO CONGO .......................... 131
Gustavo Silva SALDANHA
PARTE II - INFORMAÇÃO, ÉTICA INFORMACIONAL E
FAKE NEWS
5. PERSPECTIVAS ETIMOLÓGICAS SOBRE A VERDADE E
SUAS RELAÇÕES COM AS FAKE NEWS ................................. 173
Maria Lívia Pacheco de OLIVEIRA
6. O CENÁRIO DE DISRUPÇÃO NA ESFERA PÚBLICA
MEDIADA POR SISTEMAS AUTOMATIZADOS:
DESINFORMAÇÃO E EROSÃO DA CONFIANÇA ................ 193
Renata MIELLI
Anderson Vinícius ROMANINI
7. UM CONVITE À ÉTICA INFORMACIONAL .................... 213
João Antonio de MORAES
Rafael Rodrigues TESTA
7
PARTE III - INFORMAÇÃO E LINGUAGEM
8. PROCESSAMENTO DA INFORMAÇÃO E PRAGMÁTICA
DA LEITURA DA FICÇÃO: IMAGINAÇÃO, HABITUAÇÃO,
AFETO .......................................................................................... 241
Pedro Ramos Dolabela CHAGAS
9. TEORIA DA INTERPRETAÇÃO: PERCURSO ENTRE A
EXPRESSÃO E O CONTEÚDO ................................................ 265
Alexandre Robson MARTINES
10. DESCLASSIFICAÇÃO E LINGUÍSTICA DECOLONIAL:
INSTRUMENTOS E TERRITÓRIOS POSSÍVEIS CONTRA A
COLONIALIDADE INFORMACIONAL .................................. 311
Marco Donizete Paulino da SILVA
Luciana de Souza GRACIOSO
GLOSSÁRIO ................................................................................ 337
Carlos Cândido de ALMEIDA
Mariana VITTI-RODRIGUES
PARA SABER MAIS ..................................................................... 355
Carlos Cândido de ALMEIDA
Mariana VITTI-RODRIGUES
SOBRE OS AUTORES ................................................................. 365
8
9
PREFÁCIO
...exemplares de uma
virada social e pragmática
da ciência da informação
A compreensão de algo em movimento e transformação é sempre
um desafio. A realidade, conforme a alegoria de Heráclito, assemelha-se a
um rio que se modifica a cada instante. Se, na compreensão da natureza,
o movimento é incontestável e dado, quanto mais o será naquilo que se
costuma denominar produto ou fabricação social. É nesse contexto que
se insere a informação e os campos do saber que buscam compreendê-la,
controlá-la e manipulá-la.
A informação – quando concebida como produto de um processo
cognitivo e/ou social – encerra, em parte de sua etimologia e concepção,
um desafio de caráter interpretativo. Embora todos os campos do saber
lidem com a informação, convivam com ela e a apreendam de maneiras
distintas, alguns a assumem como objeto central de investigação. A esses
campos incumbe, entre outros desafios, a difícil tarefa de compreendê-la
e dominá-la conceitual e tecnicamente, de modo que sua aplicação seja
significativa e efetiva.
https://doi.org/10.36311/2025.978-65-5954-635-0.p9-20
Carlos Cândido de Almeida & Mariana Vitti-Rodrigues
10
Esse é o caso da ciência da informação e dos seus desafios, diante da
necessidade de mobilizar conhecimentos e saberes de diferentes perspecti-
vas – cada qual com sua contribuição – para o estudo da informação. O
presente livro – Estudos pluridisciplinares da informação: ciência da infor-
mação, ética e linguagem –, organizado por Carlos Cândido de Almeida e
Mariana Vitti-Rodrigues, apresenta alguns caminhos e um necessário mo-
saico de possibilidades interpretativas, evidenciando o quão escorregadia
pode ser a compreensão desse objeto.
A apreensão da complexidade da informação também é proces-
sual, transitando de uma fase “da arte” para fases “humanista” e “cien-
tificista”. Poder-se-ia dizer que ainda vivenciamos variações dessas últi-
mas, embora com o acréscimo de novas camadas e mediações, as quais,
se por um lado permitem compreender as potencialidades e as limita-
ções de perspectivas mais estáticas e com pretensões de totalidade – em
uma palavra, tradicionais – no que diz respeito às possibilidades de
compreensão, controle e manipulação da informação, por outro lado,
permitem explicitar sua complexidade.
O que, na modernidade, se convencionou chamar de controle da
informação possui raízes remotas, mantendo a relação fundamental entre
suporte (bíblos) e conteúdo discursivo (lógos). Como evidencia a etimolo-
gia grega, para além da associação que hoje evoca a relação entre livro e in-
formação, esse controle remonta às origens da organização da informação e
do conhecimento. Essa trajetória remete ao armazenamento de conteúdos
(lógoi) em espaços de conservação (thḗkē), com vistas ao posterior acesso
e recuperação, sendo orientada por normas e regras (nómos) e sustentada
por estratégias de produção de registros escritos (-graphía), para, por exem-
plo, a elaboração de listas.
Essa breve incursão etimológica sobre determinadas práticas expli-
cita que a relação do controle e organização de conteúdos para acesso e
recuperação está vinculada à formação lexical de termos como “bibliote-
ca” (bíblos + thḗkē), “bibliografia” (bíblos + graphía), “biblioteconomia
(bíblos + thḗkē + nómos) e “bibliologia” (bíblos + lógos). O advento do
Estudos pluridisciplinares da informação: ciência da informação, ética e linguagem - nº 3
11
Iluminismo (séculos XVII e XVIII) e do cientificismo (séculos XIX e XX)
trouxe novos significados às práticas de controle da informação.
O espírito do tempo na Idade Moderna impulsionou a disciplinari-
zação do conhecimento como estratégia para sua compreensão, controle e
manipulação. A produção e o uso de tratados e manuais – convertidos em
fontes para técnicas ou métodos – exemplificam a busca pela reprodução,
replicação e aplicação do conhecimento sistematizado. O universalismo
racional e empírico estabeleceu-se como modelo dominante no contexto
ocidental. Nesse cenário, o acesso ao conhecimento, antes mais restrito,
passou por um movimento pendular entre o humanismo e a especialização
empírico-racional, algo perceptível, por exemplo, no papel desempenhado,
respectivamente, pelas bibliotecas públicas e pelas bibliotecas especializa-
das e centros de documentação.
Como desdobramento da biblioteconomia e do movimento biblio-
gráfico modernos, a documentação – concebida por Paul Otlet e Henri La
Fontaine no início do século XX – foi instrumentalizada como uma espé-
cie de tecnologia literária, cuja síntese se expressa na obra de Otlet Traité de
Documentation, publicada em 1934. Nesse contexto, buscou exercer uma
força mandatária, amparada por um discurso voltado à promoção da dia-
logicidade entre instituições parceiras, com o objetivo de internacionalizar
o controle bibliográfico em todos os campos do saber, por meio de uma
rede centralizada na Europa – o Mundaneum –, pretensamente capaz de
articular associações de colaboradores espalhados pelos continentes.
Embora tenha se constituído como um projeto político mais amplo,
voltado à promoção de uma cultura de paz, e apesar do fracasso do
Mundaneum antes do fim da Segunda Guerra Mundial, em 1945 – anterior
à morte de La Fontaine, em 1943, e de Otlet, em 1944 –, a dimensão
técnica da documentação disseminou-se por diversas regiões, mantendo-se,
ao mesmo tempo, influente e marginalizada. Esse fenômeno deve-se, em
grande medida, à sobreposição do discurso informacional promovido pelo
mundo anglo-saxão que se fortaleceu no contexto do pós-guerra, marcado
pela polarização da Guerra Fria entre as duas potências hegemônicas – os
Carlos Cândido de Almeida & Mariana Vitti-Rodrigues
12
Estados Unidos e a antiga União Soviética – e suas respectivas zonas de
influência, redefinindo os contornos da ordem mundial.
Na segunda metade do século XX, nos Estados Unidos, a confluên-
cia entre fatores políticos, econômicos, tecnológicos e militares resultou,
no âmbito acadêmico, na proposição da ciência da informação. A crescente
necessidade de controlar a informação por meio de sistemas especializados
e tecnológicos exigiu a criação de uma “ciência” interdisciplinar, atenta
a contribuições multidisciplinares. Assim, além da biblioteconomia espe-
cializada e da documentação, integraram-se saberes provenientes de áreas
como cibernética, matemática, cientometria, psicologia, linguística, ciên-
cia da computação, ciência cognitiva, entre outras.
A busca pelo controle da informação registrada é uma constante que
atravessa as fases da “arte”, do “humanismo” e do “cientificismo”. Esse
intento histórico de controle não apenas constituiu, como também segue
orientando concepções que associam informação a registro. Na tradição
da “arte” biblioteconômica ou bibliográfica, essa concepção está ligada ao
bíblos que contém lógos; na biblioteconomia humanista, refere-se prio-
ritariamente aos livros impressos, como demonstra o papel marcante da
enciclopédia; no início da biblioteconomia especializada, direciona-se aos
documentos bibliográficos, sobretudo com a emergência do periódico
científico; e, na documentação, abrange os documentos em sentido amplo.
Já na tradição da ciência da informação, a ênfase recai sobre a informação
registrada em um suporte. Em todas essas abordagens, o registro torna-se
passível de tratamento e processamento – seja em sua dimensão descritiva,
seja em sua dimensão temática –, possibilitando seu acesso e recuperação
em sistemas de informação.
A centralidade da noção de sistema de informação também se tornou
uma característica distintiva. No século XX, a cibernética – sistematizada
por Norbert Wiener e amplamente debatida e aprofundada nos Estados
Unidos e na antiga União Soviética, como bem demonstrado nos estudos
de Roberto Lopes dos Santos Junior –, influenciou a teoria matemática da
informação, de Claude Shannon, além de fundamentar o início do desen-
volvimento da computação e da inteligência artificial. Nesse contexto, a
Estudos pluridisciplinares da informação: ciência da informação, ética e linguagem - nº 3
13
ideia de sistema de informação foi fundante e se consolidou, dentre outras,
na ciência da informação, onde a informação registrada, ou mensagem
física, deveria ser transmitida de forma eficaz e eficiente. Inicialmente, os
estudos concentraram-se na estrutura e no aperfeiçoamento dos próprios
sistemas, para, em um segundo momento, incorporar à equação o papel
dos usuários que acessavam e consumiam a informação processada profis-
sionalmente nesses sistemas.
Embora a noção de aperfeiçoamento de sistemas, com a otimização
do fluxo de informação, componha a tradição da ciência da informação e
tenha passado por renovação – especialmente com a incorporação de novos
interesses, como ciência de dados, big data, e-science, estudos métricos e
investigações sobre o comportamento de dados e algoritmos em platafor-
mas digitais –, de forma mais visível, ao menos nas últimas quatro déca-
das, o campo tem vivenciado uma “virada social e pragmática”, conforme
demonstrado por Rafael Capurro. A partir desse cenário e incorporando
a renovação tecnológica mencionada, os fundamentos da ciência da infor-
mação têm se expandido, estabelecendo conexões da informação com a
filosofia e as ciências sociais, e ampliando seus horizontes, tanto no âmbito
epistemológico quanto nos estudos éticos, políticos, históricos e econômi-
cos, além do crescente interesse, nesse contexto, pela investigação do papel
dos signos e da linguagem.
A contribuição de Almeida e Vitti-Rodrigues, e dos colaboradores,
cujos textos compõem a obra Estudos pluridisciplinares da informação, é ge-
nerosa e oportuna ao explicitar elementos da mencionada “virada social e
pragmática” do campo. No livro são apresentados temas que demonstram
a ampliação dos horizontes de investigação e registram o desenvolvimento
da ciência da informação no Brasil, que tem se fortalecido na compreensão
da área à luz de uma leitura particular. Essa força tem se construído não
apenas no contexto da corrente principal (mainstream), conforme os “câ-
nones” do Norte Global, mas também ao estabelecer uma reflexão crítica
própria, sensível aos problemas do Sul Global, incluindo questões regio-
nais e locais.
Carlos Cândido de Almeida & Mariana Vitti-Rodrigues
14
um mosaico intErprEtativo sobrE a informação
No panorama interpretativo construído pelos autores sobre a com-
preensão da informação, sobressaem expressões ou temas como mediação
e materialidade, pensamento complexo, visibilidade epistêmica, teoria crí-
tica e epistemicídio, verdade, notícias falsas (fake news) e desinformação,
mediação algorítmica, ética informacional, pragmática da leitura, teoria
da interpretação, desclassificação e linguística decolonial. Abrangendo esse
universo temático, o livro está estruturado em três partes: a primeira trata
da relação entre “informação, ciência da informação e biblioteconomia”; a
segunda aborda “informação, ética informacional e fake news”; e a terceira,
dedica-se à “informação e linguagem”.
No primeiro capítulo, “Documento e informação: mediações entre
inscrição e realidade”, Rodrigo Rabello examina a relação entre documento
e informação, problematizando a mera inscrição em suporte como meio
de representação da realidade. A complexidade envolvida em tal represen-
tação exige mediações que abarquem dimensões epistêmicas, políticas e
éticas. Para exemplificar aspectos dessas mediações, o autor propõe três
perspectivas a partir das quais a realidade pode ser abordada: como um
dado” (que “está aí”), como algo “próximo” (dependendo da interpreta-
ção), ou como algo “distante” (ou “não muito próximo”). A análise conta
com a contribuição de pressupostos das disciplinas história e documenta-
ção, ampliando o debate sobre a materialidade da informação. A adoção
das perspectivas relacionadas à materialidade, especialmente em contextos
ou modos de institucionalidade, é apresentada como uma alternativa para
as contigencialidades da representação da realidade.
No capítulo seguinte, intitulado “Sistemas, informação e com-
plexidade: algumas questões em torno dos objetos e do pensamento na
Biblioteconomia e Ciência da Informação”, Marivalde Moacir Francelin
analisa as relações entre sistemas, informação e complexidade à luz dos
pensamentos de Heidegger e Morin. O autor questiona os modelos tra-
dicionais de interpretação da informação, destacando a necessidade de
uma abordagem renovada que vá além da simplificação centrada no indi-
víduo e na perspectiva tecnocientífica. A pesquisa tece uma reflexão sobre
Estudos pluridisciplinares da informação: ciência da informação, ética e linguagem - nº 3
15
o papel central dos objetos-informação e das bibliotecas na construção
do conhecimento. O estudo contribui ao refletir sobre as transformações
da sociedade da informação, destacando a mudança para uma era de
compartilhamento de objetos, propondo, ao final, uma reforma do pen-
samento e reconhecendo a informação como algo sempre existente em
sistemas em (in)formação.
No terceiro capítulo, “Uma arqueologia do saber na ciência da in-
formação: percurso intelectual do Programa de Pós-Graduação em Ciência
da Informação da Unesp”, Augusto Júnior Macucule e Marta Lígia Pomim
Valentim investigam a trajetória intelectual do PPGCI da Unesp, com ên-
fase na produção científica de seus docentes entre 1998 e 2021. A partir
das abordagens teóricas de Foucault e Bachelard, os autores destacam a
interrelação entre ensino e pesquisa e o impacto do Programa no cenário
acadêmico nacional e internacional. O estudo revela, ademais, um cres-
cimento substancial na produção de artigos, livros, teses e dissertações,
como um reflexo do amadurecimento da área. A pesquisa contribui para
a compreensão da consolidação da identidade da ciência da informação
no Brasil, além de evidenciar a importância da formação de profissionais e
pesquisadores no campo.
O capítulo que finaliza a primeira parte do livro, intitulado
“Cartografias antiepistemicidas em biblioteconomia e ciência da in-
formação desde África: epistemologia decolonial a partir da República
Democrática do Congo”, de Gustavo Silva Saldanha, propõe uma análi-
se crítica sobre a epistemologia da biblioteconomia e ciência da informa-
ção (BCI), destacando a contribuição africana na constituição do campo.
A pesquisa, vinculada ao projeto “Cartas filosófico-epistemológicas em
Ciência da Informação”, examina as repercussões da colonialidade na for-
mação dos sistemas de conhecimento, com ênfase na tradição bibliográfica
africana e no papel político e econômico da bibliografia. O autor critica
os paradigmas epistemológicos dominantes, ressaltando a importância do
pensamento decolonial e anti-epistemicida, e argumenta pela necessidade
de uma epistemologia autônoma, com particular atenção às experiências
do Congo e suas implicações para a construção de BCI.
Carlos Cândido de Almeida & Mariana Vitti-Rodrigues
16
Essa primeira parte, dedicada aos estudos sobre “informação, ciên-
cia da informação e biblioteconomia”, ilustra a ampliação dos horizontes
de investigação ao considerar o pensamento complexo que incide sobre
sistemas e, para além deles, sobre dimensões epistêmicas, éticas e políticas
da informação. Com base em uma pesquisa conduzida em um reconhe-
cido programa de pós-graduação brasileiro em ciência da informação,
essa seção também explora a visibilidade epistêmica da área em um país
de economia emergente e pertencente ao Sul Global, abordando, além
disso, as assimetrias e os aspectos histórico-críticos do epistemicídio em
relação ao conhecimento produzido em África. Essa discussão prepara o
terreno para a próxima parte, dedicada à “informação, ética informacio-
nal e fake news”.
A segunda parte do livro tem início com o quinto capítulo, intitu-
lado “Perspectivas etimológicas sobre a verdade e suas relações com as fake
news”. Nele, Maria Lívia Pachêco de Oliveira analisa como as transforma-
ções nas tecnologias de informação e comunicação, aliadas à ampliação das
redes de relacionamento, afetam os fenômenos informacionais. Embora a
circulação de notícias falsas seja um processo historicamente documenta-
do, o cenário atual potencializa sua difusão e influência. O capítulo exa-
mina as concepções etimológicas da verdade, evidenciando como seus fun-
damentos são mobilizados na construção das fake news, conferindo-lhes
aparente legitimidade. A pesquisa aponta para a urgência da construção de
estratégias voltadas ao desenvolvimento da competência informacional e
do pensamento crítico como formas de mitigação da desinformação.
No capítulo seguinte, intitulado “O cenário de disrupção na esfe-
ra pública mediada por sistemas automatizados: desinformação e erosão
da confiança”, Renata Mielli e Vinícius Romanini analisam as transfor-
mações do debate público sob a mediação algorítmica das plataformas
digitais. Os autores adotam uma abordagem semiótica e sociológica
para investigar de que modo os algoritmos de aprendizagem de máquina
modulam a distribuição de conteúdos e intensificam discursos morais e
emocionais, influenciando a construção de crenças. O texto demonstra
que a microsegmentação informacional intensifica a desinformação, re-
Estudos pluridisciplinares da informação: ciência da informação, ética e linguagem - nº 3
17
configura relações de poder e compromete a confiança pública. Diante
desse cenário, os autores defendem políticas regulatórias e estratégias de
governança para mitigar a fragmentação discursiva e os impactos adver-
sos da manipulação algorítmica.
O sétimo e último capítulo da segunda parte, intitulado “Um con-
vite à ética informacional”, propõe uma reflexão crítica sobre os desafios
éticos emergentes na sociedade digital. João Antonio de Moraes e Rafael
Rodrigues Testa analisam a ascensão da sociedade da informação e os des-
dobramentos da mediação tecnológica nas relações sociais, explicitando
como a digitalização reconfigura o acesso ao conhecimento, o trabalho, a
educação e a cidadania. Ao examinar a influência dos algoritmos na circu-
lação da informação, os autores demonstram como essas dinâmicas afetam
a esfera pública e a autonomia dos indivíduos. O capítulo contextualiza
a ética informacional e apresenta algumas questões centrais desse campo
– como é o caso da censura, privacidade informacional, governança na
Internet, dentre outras –, buscando sensibilizar leitores e leitoras para os
dilemas que emergem da crescente dependência tecnológica.
A segunda parte do livro, conforme observado, é provocativa e res-
gata questões que precisam ser enfrentadas. Diante do uso instrumentali-
zado da noção de verdade para distorcê-la, é necessário desenvolver estra-
tégias que promovam a educação e competências críticas em informação.
Além disso, a construção de políticas regulatórias torna-se fundamental
para enfrentar o poder da mediação algorítmica das plataformas digitais,
especialmente as privadas, que têm grande influência na esfera pública.
Esses efeitos geram implicações que vão além dos novos modos de circula-
ção e acesso à informação, alcançando também as práticas dos indivíduos
em diferentes formas de sociabilidade. Isso é visível não apenas no caráter
emancipador das tecnologias, mas também no seu potencial de aprisio-
namento de subjetividades, como ilustrado pelo crescimento do vício em
dispositivos móveis e redes sociais. Nesse contexto, a terceira parte – dedi-
cada à “informação e linguagem” – apresenta nuances complementares a
essas questões.
Carlos Cândido de Almeida & Mariana Vitti-Rodrigues
18
No oitavo capítulo – “Processamento da informação e pragmáti-
ca da leitura da ficção: imaginação, habituação, afeto” –, Pedro Ramos
Dolabela Chagas examina os processos cognitivos e afetivos que sustentam
a experiência leitora, enfatizando a interação entre informação, construção
ficcional e envolvimento do leitor. A análise considera a dualidade da in-
formação na leitura literária: como unidade distintiva no fluxo narrativo e
como mecanismo de redução de incertezas interpretativas. O autor discute
a formação de mundos possíveis na ficção e o papel da familiaridade na
assimilação dos elementos narrativos, destacando a maneira como os efei-
tos textuais orientam a cognição e a afetividade do leitor. O estudo oferece
uma alternativa para se aprofundar a compreensão dos processos mentais
que estruturam a recepção da literatura e sua função na experiência huma-
na da narrativa.
O capítulo seguinte, “Teoria da interpretação: percurso entre a ex-
pressão e o conteúdo”, de Alexandre Robson Martines, explora a interação
entre linguagem, informação e interpretação, destacando a forma como
a linguagem materializa a informação e estrutura o processo interpreta-
tivo. O autor analisa as camadas semânticas e linguísticas que formam o
enunciado, ressaltando o papel da linguagem na ativação de conceitos e na
construção do conhecimento. A pesquisa busca fundamentar uma teoria
da interpretação, considerando as diferenças entre o plano da expressão e
o plano do conteúdo. Martines também evidencia como os signos linguís-
ticos são instrumentos de significação, ativando a cognição e permitindo
que a informação seja compreendida, ao mesmo tempo que discute os
riscos de manipulação discursiva e a importância de critérios de verificação
para garantir a legitimidade da informação na construção de um discurso
democrático.
No capítulo final do livro, intitulado “Desclassificação e linguística
decolonial: instrumentos e territórios possíveis contra a colonialidade infor-
macional”, Marco Donizete Paulino da Silva e Luciana de Souza Gracioso
aprofundam o exame das disputas em torno da linguagem e de sua instru-
mentalização na imposição de normas comunicativas. Articulando aportes
da ciência da informação, da linguística e da teoria decolonial, os autores
Estudos pluridisciplinares da informação: ciência da informação, ética e linguagem - nº 3
19
investigam como dispositivos linguísticos têm sido mobilizados para a ma-
nutenção de relações coloniais em contextos de controle e silenciamento. A
partir de conceitos como “mundo da vida” e “ação comunicativa”, propos-
tos por Jürgen Habermas, a análise enfatiza estratégias de resistência lin-
guística presentes em comunidades identitárias, com destaque para o mo-
vimento LGBTQIAPN+. Ao defender a legitimidade de expressões como
a linguagem neutra, o estudo contribui com caminhos teóricos e políticos
para a reconstrução de espaços classificatórios que acolham a pluralidade
dos sujeitos e saberes.
Enfim, na terceira e última parte do livro, são exploradas as camadas
da materialidade que envolvem “informação e linguagem”. Inicialmente,
abordam-se os efeitos cognitivos e afetivos sobre o leitor, com ênfase na
experiência da leitura do texto ficcional. Em seguida, a articulação de
uma teoria da interpretação – fundamentada em bases epistemológicas e
técnico-linguísticas – expande, por exemplo, aspectos de aportes teóricos
de Bernd Frohmann no campo da ciência da informação. Essas análises
contribuem para a compreensão da estruturação de discursos e enuncia-
dos, demonstrando que a linguagem não apenas expressa, mas materiali-
za a informação. Tais perspectivas introduzem mecanismos cognitivos e
lógicos que podem ser mobilizados nas relações de poder no âmbito, por
exemplo, das linguagens documentárias, reforçando a urgência de uma
revisão crítica dos sistemas classificatórios tradicionais e da construção de
linguagens decoloniais.
Para além dos tradicionais interstícios destinados ao controle da in-
formação, a presente publicação oferece exemplares oportunos para repre-
sentar a “virada social e pragmática” da ciência da informação no contexto
brasileiro e, consequentemente, de um recorte do cenário latino-america-
no. A obra compõe um mosaico interpretativo sobre a informação, explo-
rando múltiplos matizes e abordagens.
A informação, enquanto artefato líquido – para usar uma alego-
ria de Zygmunt Bauman, recentemente investigada por Richele Grenge
Vignoli –, reflete, em sua própria etimologia, a metáfora da realidade
em movimento. Trata-se de algo que escapa, escoando pelos dedos do
Carlos Cândido de Almeida & Mariana Vitti-Rodrigues
20
pesquisador, exigindo a constante atualização de instrumentos e aportes
teóricos não apenas para sua compreensão, controle e manipulação –
dentro de uma teleologia voltada ao aperfeiçoamento e funcionamento
dos sistemas de informação –, mas, sobretudo, para situá-la na posição
condizente à sua complexidade.
A obra organizada por Carlos Cândido de Almeida e Mariana Vitti-
Rodrigues convida os leitores a um espaço pluridisciplinar de reflexão, mo-
bilizando estudos que permitem vislumbrar a amplitude de perspectivas
que ilustram e problematizam os desafios e potencialidades da informação
na contemporaneidade.
Brasília, 5 de abril de 2025.
Dr. Rodrigo RABELLO
Faculdade de Ciência da Informação
Universidade de Brasília
21
APRESENTAÇÃO
Carlos Cândido de ALMEIDA
UNESP
carlos.c.almeida@unesp.br
https://orcid.org/0000-0002-8552-1029
Mariana VITTIRODRIGUES
UNESP
mvittirodrigues@gmail.com
https://orcid.org/0000-0002-4764-2575
A informação volta e meia ressurge como um objeto primordial de
preocupação de diversas áreas do conhecimento e de interesse dos debates
jornalísticos. A questão da popularidade da informação no debate público
mobiliza diversos acadêmicos a sentar-se e emitir pareceres a respeito de
uma infinidade de temas, do impacto das novas tecnologias da informa-
ção e da comunicação, da inteligência artificial, da velocidade de acesso à
informação, da brecha digital, dos problemas cognitivos e sociais causados
https://doi.org/10.36311/2025.978-65-5954-635-0.p21-29
Carlos Cândido de Almeida & Mariana Vitti-Rodrigues
22
pelo excesso de conteúdos midiáticos, até o uso da informação no contexto
das guerras.
No caso da ciência da informação, constituída na segunda metade
do século XX com o apoio de um aglomerado de disciplinas, da química à
biblioteconomia, que busca direcionar a sua atenção ao problema humano
do processamento e uso da informação inscrita em documentos, pensar
sobre o fenômeno informação consiste na justificativa de sua própria exis-
tência e torna-se uma questão identitária. Contudo, a forma de abordar o
problema e as premissas envolvidas nos estudos de informação nem sempre
está disponível ao grande público e mesmo o debate acadêmico não pro-
cura aclará-las.
Nesse sentido, busca-se nesta introdução marcar como as correntes
realistas e relativistas tendem a orientar o debate. Parte do desentendimen-
to e da improdutividade do diálogo entre cientistas da informação, de um
lado, e informáticos e cientistas, de outro, deve-se à dificuldade de admi-
tir como plausíveis a posição epistemológica adversária. Como será visto,
o pêndulo da ciência da informação inclina-se ao relativismo e algumas
contradições e limites para a argumentação da área são impostos por esse
alinhamento.
O realismo - a constatação de que há fenômenos reais e externos à
mente dos quais não podemos alterar por força volitiva - impõe-se como
condição epistemológica básica, associado, obviamente, com os princípios
clareza, racionalidade, prova empírica e sistemismo, tal como apontados
por (Bunge, 2015, p. 18, Bunge, 2017). Esta concepção de realismo é ex-
plicitada na filosofia de Peirce quando enfatiza que “O real, então, é aquilo
que, mais cedo ou mais tarde, informação e raciocínio poderiam finalmen-
te nele resultar, e que portanto independe dos meus e dos seus caprichos.
(Peirce, 1974, p. 1795, CP 5.331, tradução nossa). O filósofo norte-ameri-
cano também defende um realismo das formas que se contrapõe à doutrina
denominada nominalismo. Esse segundo tipo de realismo considera que
os conceitos correspondem a estruturas formais reais, isto é, há padrões
presentes no universo que independem da atribuição humana de nomes.
Estudos pluridisciplinares da informação: ciência da informação, ética e linguagem - nº 3
23
Nos estudos sobre a informação, podemos perceber estes dois tipos
de realismo - o real como aquilo que independe de nossas crenças sobre
o mundo, e realismo das formas - moldam a análise do que se entende
por informação em suas diversas perspectivas, seja ontológica, epistemo-
lógica, ecológica, ética, técnica, ou semiótica. De certa forma, as aborda-
gens do realismo de Peirce, são retomadas nas discussões sobre a informa-
ção na filosofia, na computação e na biologia (vide a coletânea “Estudos
Pluridisciplinares da Informação: filosofia, tecnologia e semiótica”, perten-
cente à “Coleção Estudos em Ciência da Informação”).
No outro espectro de análise, encontramos perspectivas relativis-
tas que orientam diversas posições epistemológicas nas ciências humanas
e sociais. Para seguir com a argumentação, vamos recorrer à organiza-
ção das linhas do relativismo propostas por Rios (2021), o qual constata
que: “Essas influências que originam o debate relativista são tratadas, na
Filosofia Contemporânea, pela Fenomenologia, pelo Pragmatismo, pela
Hermenêutica, pelo Pós-estruturalismo, pela Pós-modernidade e, princi-
palmente, pela Filosofia da Ciência: Kuhn (1962) e Feyerabend (1965).
(Rios, 2021, p. 37).
De acordo com Rios (2021) são vários tipos de relativismo: o rela-
tivismo cultural, relativismo histórico, relativismo moral, relativismo con-
ceitual, relativismo sobre a verdade e relativismo epistêmico. Não é fácil
identificar e separar esses tipos de relativismo e como orientam as pesquisas
nas ciências humanas e sociais.
Adeptos da variação denominada relativismo cultural defende que
existe uma “diversidade de valores e normas entre culturas e épocas his-
tóricas diferentes, a relatividade de julgamento quanto às visões de mun-
do diferentes, a relatividade do comportamento e pensamento humano
quanto aos seus ambientes culturais e uma tolerância entre os pontos de
vista” (Baghramian, 2015 apud Rios, 2021, p. 37). Parte-se da constatação
antropológica elementar de que a humanidade está dividida em várias cul-
turas nas diversas regiões do globo, e que, consequentemente, os valores e
as normas de convivência serão distintas entre as comunidades.
Carlos Cândido de Almeida & Mariana Vitti-Rodrigues
24
Por outra parte, segue Rios (2021), o relativismo histórico, uma
espécie de derivação do primeiro, sustenta que cada época possui a sua
própria ideologia, bem como a sua forma de expressão cultural e social. É
imperativo evitar comparar etapas da história, pois, segundo essa posição,
a ideologia que nutre a interpretação será sempre distinta. Com base nesse
argumento, não seria possível reinterpretar o passado porque estaríamos
presos a ideologia do presente com vieses que impediriam a compreensão
dos eventos passados.
O relativismo moral prega a tolerância, argumentando que crenças
e valores de uma sociedade variam de acordo com o tempo, a cultura e o
local. Nesse sentido, qualquer julgamento moral estaria condicionado às
regras sociais e ao contexto cultural do indivíduo. A busca de universais
éticos que balizam as decisões dos indivíduos seria inócua.
Por sua vez, o relativismo conceitual, mais específico e sofisticado
para a explicação sobre o que é o conhecimento e como o adquirimos,
sustenta que o real é construído por meio de conceitos e estes decorrem
da cultura e de seu tempo histórico. À primeira vista, parece aceitá-
vel que os conceitos sejam construções formadas no seio de uma dada
sociedade e baseados nas crenças de uma determinada época, mas se
oculta o fato de que os conceitos científicos devem ser contrastados
com elementos da realidade.
Neste contexto, a relação entre conceito, referência, significado,
verdade e sua possível correspondência com a realidade se torna impres-
cindível. Sabemos que nem todos os conceitos podem ser questionados,
verificados e testados para atender critérios de cientificidade. Então, de que
conceitos se está tratando?
No relativismo conceitual, “A construção do ‘real’ ocorre pelo uso
de conceitos que podem ser compreendidos como unidades semânticas
ou unidades significativas do conhecimento.” (Rios, 2021, p. 39). Assim,
os relativistas conceituais sustentam que a linguagem recorre a categorias,
sistemas e esquemas conceituais e estes moldam a realidade com base na
cultura, no contexto social e histórico. De certa forma, tal pressuposto está
presente nas afirmações linguísticas sobre o pluralismo linguístico. Rios
Estudos pluridisciplinares da informação: ciência da informação, ética e linguagem - nº 3
25
(2021) menciona que há um paralelo entre o relativismo conceitual e a
ideia de paradigma de Kuhn (1997), pois cientistas de paradigmas diferen-
tes atuam sob o efeito de esquemas conceituais distintos, tendo em vista
que suas visões sobre o mundo, os experimentos, as leis e as teorias serão
diferentes para explicar determinado fenômeno.
No caso específico do relativismo sobre a verdade, Rios (2021, p. 40)
comenta que a tese principal “declara que algo pode ser verdadeiro para
uma pessoa ou para uma comunidade, mas não pode ser verdadeiro para
outra pessoa ou para outra comunidade.” Nesse sentido, conforme o autor,
de maneira resumida, para que algo seja verdadeiro, basta que alguém afir-
me que algo é corresponde com a realidade, e pronto: “Para que sejamos
mais claros, coloquemos essa expressão na seguinte forma: ‘P é verdadeiro
para X’.” (Rios, 2021, p. 40). Para Rios (2021), uma crítica antirrelativista
consideraria a possibilidade de autorrefutação e a falta de determinação
sobre o que se entende por verdadeiro ou falso.
Por fim, o relativismo epistêmico considera que o conhecimento
depende e se altera de acordo com os sistemas conceituais e as culturas
em que está inserido/disseminado. Em outras palavras, esses condicionam
a produção do conhecimento, bem como as suas formas de admissão.
Dentro desse tipo de relativismo, segundo Rios (2021, p. 41), podemos
entrever algumas variedades nem sempre admitidas: o relativismo sobre a
racionalidade, o relativismo sobre a lógica, o relativismo sobre a ciência e
o construcionismo social.
Em síntese, presumimos que os relativismos têm orientado noções
de informação, especialmente as definições atinentes aos problemas das ci-
ências humanas e sociais. A fórmula básica é que, para o sujeito cognoscen-
te autônomo, um conteúdo interpretável é informativo ou será informação
quando for assimilado. Isto é, bastaria passar dos estímulos externos para
imagens mentais internas para alcançarmos a informação. Nesse sentido, e
com o apoio dos relativismos cultural, histórico, moral, conceitual e epis-
têmico, não haveria possibilidade de universalizar a questão e determinar
que elementos mínimos e gerais estão associados ao tema da informação.
Carlos Cândido de Almeida & Mariana Vitti-Rodrigues
26
Se o relativismo tem ocupado boa parte das explicações sobre in-
formação no escopo da ciência da informação, isso deve levar a algu-
mas consequências. Entendemos que há limitações em falas que podem
ser resumidas nas seguintes afirmações: “são os usuários da informação
quem podem dizer o que é informação”, “o que é informação para uma
pessoa pode não ser considerado informação para outra”, ou ainda, “a
informação está na significação da mensagem e esse processo é individual
e social”. No caso das instituições, podemos encontrar ainda as afirma-
ções: “a informação é uma construção coletiva conduzida por instituições
sociais” ou “as instituições dedicadas à informação selecionam, organi-
zam e classificam e direcionam o significado, transformando dados em
informação”. Há um paralelismo aqui, segundo essa leitura, o significado
das mensagens não existe per se, logo, não existe informação sem a in-
tervenção humana ou de algumas de suas instituições. Assim, intensão e
extensão não existem a priori.
Contudo, pode-se dividir a questão em um psicologismo e um socio-
logismo. No primeiro, a essência mesma da informação é mental, é fruto
de um conjunto de operações psicológicas que, para orientar-se no mundo,
o organismo seleciona e registra algumas disposições externas traduzidas
pela linguagem, lhes dá sentido e as transforma em pacotes de significado
(informação). No segundo, à moda dos estruturalistas, o indivíduo quase
nada produz, apenas é vinculado à informação como um epifenômeno do
coletivo. Isto é, externalizamos apenas as possibilidades linguísticas dadas
pela instituição social chamada língua. Há uma dificuldade em saber ao
certo qual orientação é mobilizada, como nos modelos cognitivo e socio-
cultural (Araújo, 2018, p. 86-91), ou um psicologismo superficial ou um
estruturalismo arcaico. Não obstante, a base mostra-se comum: uma con-
siderada transformação de dados em informação dependerá de cada sujeito
e de sua mente ou de cada cultura e de suas instituições.
Trocando em miúdos, do ponto de vista dos cientistas da informa-
ção em seu viés relativista, quando retiramos um livro de uma estante e o
lemos, a interpretação não precisa coincidir com enunciados e os referentes
dos autores. No mesmo exemplo, a classificação dos livros, bem como a
sua utilidade, dependem de uma determinada cultura e dos processos ins-
Estudos pluridisciplinares da informação: ciência da informação, ética e linguagem - nº 3
27
titucionais (seleção, coleta, aquisição, catalogação, classificação, indexação,
recuperação e uso) que levam uma sociedade a valorizar certos conteúdos
e não outros.
O projeto de construção deste livro originou-se da necessidade de
aproximar áreas como a ciência da informação e a filosofia. Outras ciências
também foram agregadas ao projeto, além de reflexões sobre o uso público
da informação. Desse modo, o trabalho excedeu o âmbito de uma discipli-
na ou um campo, convertendo-se em pluridisciplinar, isto é, acolhendo di-
ferentes perspectivas sobre o conceito de informação advindo de múltiplas
áreas do conhecimento sem, necessariamente, almejar a universalização
daquilo que entendemos por informação.
Como a proposta de conjugar os estudos da ciência da informação
e de outras ciências sobre o tema informação ficou extremamente extensa,
foi necessário separar o projeto em duas coletâneas: a primeira intitulada
“Estudos pluridisciplinares da informação: filosofia, tecnologia e semióti-
ca” (Coleção Estudos em Ciência da Informação; 2) e a segunda, de que
trata o volume ora apresentado, “Estudos pluridisciplinares da informação:
ciência da informação, ética e linguagem” (Coleção Estudos em Ciência da
Informação; 3). A leitura do conjunto permitirá uma compreensão mais
adequada das perspectivas realistas e relativistas da informação, embora es-
tas classificações não sejam sempre as mais adequadas para abarcar a com-
plexidade das contribuições dos diversos autores.
Esta coletânea voltada aos temas ciência da informação, ética e lin-
guagem, está organizada em três partes, as quais procuram reunir as con-
tribuições dos mais diversos especialistas brasileiros sobre a informação.
Inaugura as seções do livro, a primeira parte dedicada aos estudos da infor-
mação como debatidos na ciência da informação, com o capítulo teórico
de Rodrigo Rabello sobre a noção de documento em que explora a relação
entre representação e realidade por meio do estudo de diferentes formas
de mediação. O capítulo Marivalde Moacir Francelin apresenta os prin-
cipais conceitos do pensamento complexo nos estudos sobre informação
objetivando repensar a informação em termos de essência e complexidade.
Também constam as contribuições de Augusto Júnior Macucule e Marta
Lígia Pomim Valentim, sobre o impacto de um programa de ciência da
Carlos Cândido de Almeida & Mariana Vitti-Rodrigues
28
informação na formação da área no Brasil e o estudo de Gustavo Silva
Saldanha, o qual versou sobre o epistemicídio na constituição do pensa-
mento da ciência da informação na África.
A segunda parte, intitulada “Informação, ética informacional e fake
news”, é central para entender a convergência entre as perspectivas rela-
tivistas e realistas da informação e o interesse público recente pelo tema
da informação. Na referida parte, o leitor encontrará o capítulo de Maria
Lívia Pacheco de Oliveira sobre o conceito de fake news que explora a
relação entre informação e diferentes abordagens sobre a verdade, o traba-
lho sobre os sistemas automatizados de desinformação de Renata Mielli e
Vinícius Romanini e suas implicações para o debate público e a formação
de crenças e, por fim, um convite para uma ética informacional, de autoria
de João Antonio de Moraes e Rafael Rodrigues Testa no qual os autores ex-
põem os principais fundamentos conceituais e as problemáticas abarcados
pela Ética Informacional.
A terceira e última parte do livro explora a conjunção linguagem e
informação, com o capítulo sobre pragmática da leitura de ficção, de Pedro
Dolabella Chagas, que apresenta e discute a ideia de informação como
unidade de diferença e como redução de alternativas na interpretação de
personagens ficcionais. O capítulo de Alexandre Robson Martines sobre a
teoria da interpretação que investiga a relação entre informação e aquisição
de significado ao explorar o plano de expressão e o plano de conteúdo da
linguagem, e uma contribuição sobre a linguística decolonial de Marco
Donizete Paulino da Silva e Luciana de Souza Gracioso em que discutem
as relações de poder e suas implicações em disputas linguísticas.
Para municiar o leitor que está sendo introduzido ao assunto, acres-
centa-se um breve “Glossário” com termos técnicos centrais para a com-
preensão dos capítulos, formado por definições fornecidas pelos próprios
especialistas. Além disso, agrega-se a seção “Para saber mais”, dedicada a
arrolar a bibliografia básica para compreender os argumentos principais
dos capítulos. Os apêndices relativos ao “Glossário” e “Para saber mais” in-
cluem os verbetes e a bibliografia referente à coletânea “Estudos pluridisci-
plinares da informação: filosofia, tecnologia e semiótica”. Essas duas seções
Estudos pluridisciplinares da informação: ciência da informação, ética e linguagem - nº 3
29
ajudarão os estudantes universitários e a comunidade externa a aprofun-
dar-se nas temáticas tratadas.
Por fim, espera-se que o livro possa qualificar o debate brasileiro
sobre as diversas formas de afrontar o problema da informação na ciência
e na sociedade. Adicionalmente, deseja-se que os especialistas no Brasil
possam considerar os pontos de vista concorrentes sobre a informação e
valorizar os seus contextos de aplicação, permitindo um diálogo profícuo
entre os pesquisadores e os leitores interessados.
rEfErências
ARAÚJO, C.A. O que é ciência da informação. Belo Horizonte: KMA, 2018.
BUNGE, M. Elogío al cientificismo. Pamplona: Laetoli, 2017.
BUNGE, M. Evaluando filosofías. Barcelona: Gedisa Editorial, 2015.
RIOS, M. C. O relativismo epistêmico sobre a ciência: um desacordo entre filosofia e
sociologia do conhecimento científico. Revista Paranaense de Filosofia, Curitiba, v. 1, n.
2, p. 33-54, jul./dez. 2021.
KUHN, T. S. A estrutura das revoluções científicas. 5. ed. São Paulo: Perspectiva, 1997.
PEIRCE, C. S. Collected papers of Charles Sanders Peirce. 4th. ed. Cambridge: Belknap
Press, 1974. v. V-VI.
30
PARTE I
INFORMAÇÃO, CIÊNCIA
DA INFORMAÇÃO E
BIBLIOTECONOMIA
33
1
DOCUMENTO E INFORMAÇÃO:
MEDIAÇÕES ENTRE INSCRIÇÃO E
REALIDADE
DOCUMENT AND INFORMATION:
MEDIATIONS BETWEEN
INSCRIPTION AND REALITY
Rodrigo RABELLO
UnB
rdgrabello@unb.br
https://orcid.org/0000-0001-7217-1608
https://doi.org/10.36311/2025.978-65-5954-635-0.p33-70
Carlos Cândido de Almeida & Mariana Vitti-Rodrigues
34
Resumo: Considerando a importância dos conceitos de documento e informação na
área de informação e questionando a suposta autossuficiência da inscrição ou registro
físico (informação registrada) para a representação da realidade, objetiva-se explorar a
necessidade de incorporar “mediações” para uma compreensão mais abrangente do processo
de representação. Para tanto, a análise foi realizada em três abordagens, examinando
tanto perspectivas tradicionais como emergentes. Elas se referem à representação da
realidade como algo: 1. “Dado” (que “está aí”); 2. “Próximo”; e 3. “Distante” (ou “não
muito próximo”). A apreciação contou com exemplos de aspectos presentes na trajetória
das disciplinas história e documentação. Observou-se que a adoção das perspectivas
relacionadas à materialidade – em contextos de institucionalidade – emerge como uma
alternativa para a representação da realidade. Essas perspectivas incorporam “mediações
que abarcam camadas epistêmicas, políticas e éticas, permitindo uma abordagem
diferenciada para o estudo do documento e da informação.
Palavras-chave: Documento; Informação; Fisicalidade; Materialidade; Representação da
realidade.
Abstract: Considering the importance of the concepts of document and information
in the field of information and inquiring the supposed self-sufficiency of the physical
record (registered information) for the representation of reality, our aim is to explore
the need to incorporate “mediations” for a more comprehensive understanding of the
representation process. To do so, an analysis was carried out using three approaches,
examining both traditional and emerging perspectives. ey refer to the representation
of reality as something: 1. “Data” (which “is there”); 2. “Proximal”; and 3. “Distant
(or “not very near”). e assessment included examples of aspects present in the history
and documentation disciplines. is study observed that the adoption of perspectives
related to materiality in institutional contexts emerges as an alternative for representing
reality. ese perspectives incorporate “mediations” that encompass epistemic, political,
and ethical layers, allowing for a differentiated approach to the study of documents and
information.
Keywords: Document; Information; Physicality; Materiality; Representation of reality.
Estudos pluridisciplinares da informação: ciência da informação, ética e linguagem - nº 3
35
1 introdução
Este ensaio explora os conceitos “documento” e “informação” com
o objetivo de iluminar tanto as contribuições quanto às limitações acadê-
micas relacionadas à representação da realidade. De um lado, entende-se
que a representação pode ocorrer diretamente pelo “acesso” aos produtos
do processo de inscrição; de outro, questiona-se a suposta autossuficiência
da informação registrada como meio suficiente para essa representação. O
capítulo introduz a tese de que é necessário considerar outras dimensões ou
camadas – ou mediações – para (re)posicionar o acesso e a representação da
realidade, levando em conta as dimensões epistêmicas, políticas e éticas do
documento e da informação.
Em uma primeira aproximação, a informação1 pode ser conceituada
como algo que possui conteúdo semântico. Um documento,2 por sua vez,
é um objeto simbólico composto por suporte, forma e conteúdo (informa-
ção). Esses conceitos implicam na atribuição de sentidos em um contexto
específico, reconhecendo que informação e documento desempenham um
papel no processo comunicativo e, portanto, intersubjetivo. A relação en-
tre esses conceitos é amplamente explorada pelas ciências da informação
e da documentação, como a biblioteconomia, a documentação, a ciência
da informação, a museologia e a arquivologia. Para simplificar e alcançar
A palavra “informação” encontra relação, dentre outras possibilidades, com o baixo latim da Era
Merovíngia. Na época, formaticum e forma eram sinônimos de “queijo”. Um texto do latim tardio (837
d.C.) mostra a proximidade metafórica entre “informação” e “queijo”. Aquela surgiu nas línguas neolatinas
a partir da base enform-, primeiro no francês (séc. XII) e depois no português, galego e inglês (séc. XIV).
Até então, “informação” ocorria como variações de enform- (ou emform-, form-, raramente efform-),
predominando em relação a inform- no português. O verbo “enformar” tem origem no latim efformare, não
comum em autores clássicos. Indicava colocar na fôrma. A relação entre “informação” e “queijo” reflete o
desenvolvimento linguístico. “É no domínio da enformação ‘pôr na fôrma’ que devemos, enfim, procurar
a experiência que orienta a informação-como-coisa de que fala Buckland, autor que nos guia na análise da
estrutura desse moderno domínio da ‘comunicação’.” (González, 2013).
A palavra “documento” deriva do latim documentum, originado do verbo latino docēre, relacionado ao verbo
grego δοχετν, associado a termos latinos como dicere e ducere, que enfatizam sua natureza comunicativa. Os
sufixos –men ou –mentum, indicando instrumento ou exemplo, conferem à palavra documento o sentido
de prova do ensinado ou exemplificado. Assim, o documento é o meio de transmitir conhecimento, ou
seja, possui posição estratégica em determinados contextos de comunicação. Esta abordagem etimológica
pode variar entre a concepção restrita de objeto-texto e a ampla objetivação do conhecimento em suporte
(Valente, 1978; Sagredo Fernández; Izquierdo Arroyo, 1982; López Yepes, 1995; Buckland, 1997). Essa
objetivação encontra, portanto, a necessidade de “pôr na fôrma” alguma coisa – informação – mediante a
inscrição.
Carlos Cândido de Almeida & Mariana Vitti-Rodrigues
36
alguma generalização, essas disciplinas poderão ser referidas coletivamente
como “área da informação”.
A noção de inscrição3 é especialmente relevante, pois está direta-
mente vinculada à ideia de informação registrada, pressuposta no conceito
de documento. A inscrição, muitas vezes, é vista como o produto de uma
representação contida em um objeto, algo que possibilita o acesso a deter-
minado conteúdo. O curioso é que, quando a inscrição é pensada de forma
estrita, a linguagem ou outras variáveis tendem a ser negligenciadas. Isso
pode levar ao entendimento controverso ou equivocado de que o simples
acesso ao registro seria suficiente para resolver questões relacionadas à lei-
tura, aprendizado, uso e apropriação da informação, assim como questões
de direito, desigualdade informacional e representação da realidade.
Com essa acepção “tradicional”, as ciências da informação e da do-
cumentação têm buscado estudar o modo como os documentos atuam
como portadores de informação em determinado processo comunicativo,
representando ou podendo ser representados por aspectos da realidade que
eles – os documentos – incorporam. Tais elementos se caracterizam pelo
emprego de determinadas funções e finalidades institucionais. Adjetivos
que qualificam o documento ou a informação nele contida – como biblio-
teconômico, museológico, arquivístico, jurídico, administrativo, histórico,
artístico, dentre outros – denotam tais funções e finalidades.
No entanto, seguindo essa lógica, o documento se limita a ser um
repositório” de conteúdo com determinada função? Em outras palavras, a
dimensão informativa do conteúdo explícito – registrado – contido em um
documento tem maior valor ou tem centralidade em relação a outras pos-
síveis dimensões ou camadas? Ante a isso, defende-se o argumento de que
outras mediações podem ser incluídas ou ocupar um espaço de relevância,
de equivalência ou de igualdade na área de informação.
A ideia de inscrição em objetos remonta a necessidade de revisitar teses sobre a evolução da linguagem,
passando de gestos para linguagem oral e escrita. Em hipótese, a escrita originou-se da leitura e marcas de
animais, não diretamente ligada ao oral. Isso sugere que a primeira linguagem foi gestual, evoluindo para
a oral. Os primeiros pictogramas representariam gestos. Até a Idade Média, a fala era dominante; livros
manuscritos apoiavam discursos orais. A imprensa mudou isso, introduzindo vários estilos e mudando
percepções. A escrita impressa educou o olhar e a língua. Em sociedades analfabetas, erros gramaticais
inexistiam ou eram raros, pois ninguém os via (Barthes; Marty, 1987).
Estudos pluridisciplinares da informação: ciência da informação, ética e linguagem - nº 3
37
As camadas epistêmicas e heurísticas podem ser observadas em in-
vestigações que têm revelado uma trajetória na qual as dimensões tradi-
cionais e emergentes coexistem, revelando, ainda, que os conceitos não
são neutros. A preocupação faz parte da proposição de um programa de
investigação que versa sobre a possibilidade de se estudar perspectivas de
materialidade em modos de institucionalidade que envolvem informação
e documento. Nessa proposta há um movimento de “mão dupla” onde
documento pode ser estudado em direção à informação e esta pode ser
investigada em direção ao documento (Rabello, 2019).
É interessante observar que as preocupações do gênero refletem, para
além da dimensão epistêmica, a constituição histórica e etimológica de dis-
ciplinas. Tais preocupações podem levar a relações interdisciplinares prolí-
ficas, seja com a diplomática e com a documentação – com o foco no estudo
do documento, como sugere o radical das palavras – ou com a ciência da
informação, com o enfoque naquilo que a nomeia. A “nova” documentação
tem se apresentado ou proposto ser um “lugar de encontro” para essa rela-
ção interdisciplinar. Considerar camadas, no âmbito epistêmico, se apre-
senta como um meio para ultrapassar obstáculos por vezes fundamentados
na crença de total domínio do sujeito sobre o objeto. Transcender tais bar-
reiras indica, por exemplo, passar a se considerar a relação de mútua inter-
venção de um sobre o outro, já que o objeto também atua sobre o sujeito.
A dimensão política, nesse contexto, encontra no acesso ao conteú-
do registrado um ponto inicial e necessário. No entanto, a representação
da realidade por meio desse conteúdo é contingente e sujeita ao arbítrio,
à força ou à impossibilidade de ação daqueles que desejam, não desejam,
podem ou não podem fazer valer suas posições. Essa dimensão pode ser
analisada em termos de linguagem, valor, sentido, intenção, intervenção,
protagonismo, compreensão e incompreensão, termos que podem se ma-
nifestar como antagonismos e assimetrias. Assim, a dimensão política do
documento e da informação pode ser amplamente abordada por meio de
mediações guiadas por uma visão de mundo particular, abrangendo inte-
resses, modos de saber e de poder.
A dimensão ética, complementarmente, está preocupada com os
efeitos que podem ser investigados a partir da composição e da dinâmica
Carlos Cândido de Almeida & Mariana Vitti-Rodrigues
38
das redes, sendo orientadas por modos de institucionalidade e por visões
de mundo. Advém, portanto, da dimensão política. Tais caminhos buscam
identificar, descrever e/ou prospectar o alcance de tais implicações e a sua
reflexividade. As práticas geradoras, no caso, afetam ou implicam aqueles
que estão envolvidos, direta ou indiretamente, nas ações. Nesse caso, es-
sas práticas podem recepcionar ou restringir interpretações sobre eventos,
acontecimentos, ideias, dando voz para determinados atores ou silencian-
do outros. Levam, portanto, a dilemas.
A relação entre as dimensões epistêmica, política e ética fundamenta
o argumento sobre os desafios e as contribuições acadêmico-institucionais
para a representação da realidade. Em última instância, pode ser explorada
em termos de “materialidade” do documento e da informação. Em função
da atenção dedicada ao documento e ao seu conteúdo (tradicionalmente
entendido como informação), esses aspectos foram exemplificados com
base em pressupostos das disciplinas história e documentação. A primeira
origina-se nas crônicas e na crítica documental, desembocando em uma
interlocução mais ampla com as ciências sociais. A segunda emerge das
estratégias de comunicação científica, no contexto do “movimento biblio-
gráfico”, e também como parte de um projeto político mais ambicioso.
Na trajetória de ambas as disciplinas, o documento – e seu conteúdo –
desempenha um papel central no desenvolvimento e em sua formulação
discursiva.
2 mEdiaçõEs para a rEprEsEntação da rEalidadE
A abordagem nesta seção segue uma dinâmica em três etapas para
analisar a relação entre documento e informação. Primeiro, enfatiza-se a
primazia da “coisa em si”, cuja autoridade se apoia na origem da produ-
ção e no local de armazenamento, traduzida, por exemplo, em termos de
autenticidade do documento. Essa abordagem influencia a crença de que
a “realidade está aí”, pois esta se apresenta como um “dado”. Em seguida,
a ênfase desloca-se para o contexto, ampliando a noção hermenêutica de
que, por meio da interpretação, a realidade “está próxima”. Finalmente, o
ensaio aborda uma terceira situação, onde a realidade “não está tão próxi-
Estudos pluridisciplinares da informação: ciência da informação, ética e linguagem - nº 3
39
ma”. Nesse estágio, além de considerar o contexto e a interpretação, des-
taca-se a necessidade de não separar, desde o início, conteúdo e contexto,
estabelecendo uma simetria necessária para entender como um influencia
ou alista o outro. Isso, a princípio, permite analisar os rastros biográficos e
as intencionalidades situacionalmente presentes em tal trajetória.
2.1 Quando a rEalidadEEstá
A inscrição é o meio que permite uma abordagem “física” ou “fisi-
calista” da informação, algo que fundamenta ou dialoga com o conceito
de informação registrada. A fisicalidade produzida com a inscrição pode se
manifestar em dois meios de produção, processamento, armazenamento e
acesso: analógico e digital. O meio analógico envolve contato direto com
suportes físicos, como papel, madeira, plástico, dentre outros, para acesso
e leitura de registros. Na analogia indireta, os registros são acessados ele-
tronicamente, como é o caso, por exemplo, de um leitor de microfilme. O
suporte digital é essencialmente indireto, exigindo dispositivos eletrônicos
para processar e ler informações. O acondicionamento da numerabilidade
é uma característica desse suporte devido à representação binária dos regis-
tros digitais. Computadores e dispositivos digitais permitem criar, receber,
processar e transmitir dados, que podem ser transformados em imagens
(estáticas ou em movimento), sons e textos, combinados em formatos
(Rabello, 2019). Esses modos de fisicalidade constituem parte da fôrma
da informação.
A análise sistemática de inscrições – tradicionalmente relacionada a
suportes analógicos e a textos escritos – foi o meio para o estudo realiza-
do, por exemplo, pela diplomática, primeiramente no âmbito do direito
canônico (século XVII) e, posteriormente, para investigações e práticas
profissionais realizadas nos primórdios do processo de disciplinarização de
campos do conhecimento, como foi o caso da história e da arquivologia
(século XIX). Abordagens dessa natureza demonstram a importância do
documento como meio de representação da realidade (Rabello, 2009).
Particularmente para a diplomática, houve o interesse de analisar
elementos internos e externos do documento – que compõem a forma
Carlos Cândido de Almeida & Mariana Vitti-Rodrigues
40
documental – para fins de demonstrar sua autenticidade (Duranti, 1994).
A história, complementarmente, se interessou por documentos arquivados
– diplomas, com função administrativa e/ou jurídica – como meio para
a escrita sobre o passado, atestando seu valor de prova histórica (Bauer,
1957). Assim, tanto os discursos diplomáticos como historiográficos, no
cientificismo, fundamentam seus estudos, sobretudo a partir da noção de
autenticidade do texto escrito arquivado. Os arquivos têm sido locais com
autoridade por comportar documentos organizados segundo determina-
dos princípios, de modo a demonstrar ou atestar a autenticidade dos obje-
tos armazenados em determinado conjunto documental.
Com tais características, os arquivos foram úteis no “cientificismo
dos oitocentos. Nesse contexto passaram a constituir espaços privilegiados
para o acesso a fontes com vistas à escrita da história (Gay, 1990), bem
como para o controle da massa documental produzida segundo a raciona-
lidade burocrática do Estado (Weber, 2002; Fonseca, 2005). Nesse contex-
to, os documentos de arquivo – de natureza jurídica, administrativa e his-
tórica (Nuñez-Contreras, 1981) – passaram a ser concebidos como o meio
de contato imediato do historiador à realidade de outrora (Bauer, 1957).
Há de se observar que esse foi um momento de proposição e de-
marcação de campos do conhecimento. A busca pela disciplinaridade se
orientou pelo arquétipo das ciências naturais. Ao fazer parte desse cenário,
o processo de disciplinarização da história também foi orientado por tal ar-
quétipo. A história – ou historiografia ou escrita da história – buscou fun-
damento enquanto ciência social a partir do ideário ou espírito “positivo”.
Adjetivos como “metódica” (Gay, 1990) ou “positivista” (Le Goff, 2013),
atribuídos à história, evidenciam essa busca por cientificidade.
A história, nesse contexto, conquistou seu espaço na universidade.
Para tanto, definiu para si elementos para validar seu status de ciência em-
pírica. Ela contou com um “laboratório” – o arquivo – e com um “objeto
empírico” – o documento – (Gay, 1990), bem como com “métodos au-
xiliares” – diplomática, paleografia, numismática, dentre outros (Bloch,
1952; Valente, 1978) – para trabalhar com tal objeto. Utilizou-se, ademais,
da bibliografia para organizar o registro da produção acadêmica no campo.
A bibliografia foi uma estratégia de comunicação científica comum entre
Estudos pluridisciplinares da informação: ciência da informação, ética e linguagem - nº 3
41
os demais campos de conhecimento, igualmente em busca de alcançar ou
fazer valer seu status de ciência.
Há de se observar que a bibliografia – ou a “arte da bibliografia
– serviu, desde a antiguidade, para a elaboração de índices sobre os do-
cumentos e seus conteúdos nos espaços físicos de bibliotecas. No século
XIX, esse processo ou meio de inscrição passou a ser um “método auxiliar”
das ciências. Os instrumentos gerados passaram a ser estratégicos para a
organização do conhecimento registrado, permitindo com que disciplinas,
sobretudo a partir dos oitocentos, pudessem acessar e utilizar os conheci-
mentos acumulados no respectivo campo (Woledge, 1983).
Também com pretensões de cientificidade, a bibliografia materiali-
zou o preceito atribuído e/ou difundido por Isaac Newton de que o co-
nhecimento deve se respaldar naquele produzido anteriormente para que
possa avançar – algo como subir nos ombros de gigantes para enxergar
além. Nascia, então, o “movimento bibliográfico” e, com ele, uma estraté-
gia política de comunicação científica. Esta somente passou a ser mais bem
visualizada com a atuação e a mobilização de atores no final dos oitocentos
e na primeira metade do século XX (Saldanha, 2020). O advogado belga,
Paul Otlet, foi um dos principais atores.4
A organização das bibliografias, em diferentes regiões, carecia de
padronização e estratégia. Isso levou à produção isolada de registros de
conhecimento em determinadas localidades. Esse isolamento resultou em
tornar inacessível tais registros, dificultando a produção de conhecimento
previamente fundamentado, assim como levando à redundância e ao des-
perdício de recursos e de tempo.
Frente a esse desafio, Otlet foi um intelectual ativo, propondo es-
tratégias teóricas, metodológicas e atuando na internacionalização do mo-
vimento, mediante a articulação de instituições para a universalização do
conhecimento. Tal abordagem visava superar as barreiras geográficas e per-
A atuação de Paul Marie Gislain Otlet, no âmbito do “movimento bibliográfico”, catalisou, dentre
outros aspectos, os princípios cartesianos fundamentais para a ciência moderna, a saber: a produção do
conhecimento de forma “clara” e “distinta”, com a característica de “universalidade” (Descartes, 2010). A
clareza é alcançada por meio da classificação e da descrição das coisas, enquanto a distinção se dá através
do método, estabelecendo sua própria racionalidade. A universalidade é assegurada pela característica de
replicabilidade do método para a obtenção de resultados coerentes entre si (Paty, 1995).
Carlos Cândido de Almeida & Mariana Vitti-Rodrigues
42
mitir uma disseminação mais ampla do conhecimento acumulado, redu-
zindo a duplicação de esforços intelectuais e facilitando a continuidade da
pesquisa e da produção de conhecimento.5
Além das iniciativas internacionais no âmbito do “movimento bi-
bliográfico”, certos pressupostos complementares eram indispensáveis para
viabilizar o acesso global. Estes incluíam a representação e organização do
conhecimento – com a produção, por exemplo, de linguagens documen-
tais, como é o caso de sistemas de classificação –, envolvendo a necessidade
de conjugar padronização da representação dos documentos bibliográficos,
em conjunto com a criação de um espaço físico capaz de abrigar uma rede
centralizada e estruturada internacionalmente. Essa infraestrutura forma-
ria uma abrangente “base de dados” bibliográfica a ser acessada pelos mem-
bros da rede.
No âmbito da representação descritiva, pode ser observado, por
exemplo, a utilização e a difusão de fichas catalográficas estandardizadas,
no padrão americano, e da aplicação do princípio monográfico, algo que
preceituava que cada documento deveria ser registrado uma vez, embora
utilizando da estratégia de remissivas (Santos, 2006). No âmbito do trata-
mento temático, se notabilizou a customização do sistema de Classificação
Decimal (CDD), do bibliotecário estadunidense Melvil Dewey, a pedido
de Otlet para a elaboração da Classificação Decimal Universal (CDU).
Em termos de infraestrutura, além do uso das tecnologias disponí-
veis na época, como o microfilme, foram estabelecidos e mantidos reper-
tórios temáticos que incorporavam registros bibliográficos gerados e com-
partilhados por uma rede de colaboradores. Numa metáfora comum do
século XIX, que associava o funcionamento da sociedade e das instituições,
esses registros eram comparados ao “sangue” que fluía pelas “artérias” da
infraestrutura até o “coração” – o Mundaneum –,6 concebido como a ins-
As iniciativas de internacionalização no campo bibliográfico, lideradas por Paul Otlet, incluíram a fundação
do Instituto Internacional de Bibliografia (IIB) em 1895. Mais tarde, em 1931, o IIB foi renomeado
como Instituto Internacional de Documentação (IID), incorporando o termo “documentação”. Em
1938, um avanço significativo ocorreu com a criação da Federação Internacional de Documentação
(FID). (Rayward, 1994).
Por conta da turbulência do período entre guerras, aventou-se, na primeira metade do século XX, a
construção do Mundaneum. Otlet chegou a solicitar, formalmente, a construção do espaço junto a
autoridades de diferentes países, dentre os quais, a Bélgica. Neste caso, o plano era que o Mundaneum
Estudos pluridisciplinares da informação: ciência da informação, ética e linguagem - nº 3
43
tituição central7 para receber, organizar e disseminar esses registros. Nesse
processo de retroalimentação, coordenação e colaboração internacional, o
Mundaneum atuava como o “núcleo” vital da iniciativa.
A força do documento bibliográfico decorre da sua conveniência e
praticidade para a comunicação científica. O documento bibliográfico,
desde o início da Idade Moderna, seguiu a tradição do formato códice, ou
seja, apresentava-se como uma brochura, unida na lombada (vértice), mas
passando a ser produzido mecanicamente no impresso em papel. Ainda
hoje este documento abrange textos monográficos, relatórios e publicações
diversas, como livros, anais de eventos e periódicos científicos, sendo estes
últimos produzidos em séries periódicas. A concepção de documento bi-
bliográfico, nesse contexto, foi útil a um entendimento voltado para o seu
conteúdo. Este passou a ser tratado, temática e descritivamente, de modo
fragmentado, considerando seções e capítulos, textos de comunicações em
eventos ou artigos de periódicos, de acordo com as informações contidas.8
Além da influência política direcionada à comunicação científica,
a amizade entre Otlet e o também advogado belga, Henri La Fontaine,
repercutiu em outras ações na política internacional, transcendendo o
campo bibliográfico. Dentre os pensamentos que influenciaram ambos os
advogados, merece destaque a corrente filosófica denominada positivismo.
Essa perspectiva fazia parte do repertório político e intelectual do final do
século XIX e início do século XX. Nela, o conceito de “estado positivista
representava, para o filósofo francês Auguste Comte, a última fase histórica
fosse construído na capital Bruxelas. O projeto nunca foi finalizado por conta, dentre outros aspectos,
da adversidade do momento histórico. Otlet faleceu em 10 de dezembro de 1944 em sua terra natal,
portanto, um pouco antes do fim da Segunda Guerra Mundial, em 2 de setembro de 1945. Hoje há um
museu em Mons, na Bélgica, que recebe o nome Mundaneum e também funciona como um repositório
de documentos produzidos por Otlet, por seus colaboradores e por pesquisadores que têm resgatado a sua
memória. Link: http://www.mundaneum.org/en
7 “O Mundaneum, centro científico, documentário, educativo e social, desenvolve-se em três direções: como
ideia, como instituição e como corpo físico de coleções e serviços.” (Otlet, 2018, p. 650).
No trabalho de Fayet-Scribe (2001) é destacada a importância da transformação na concepção da unidade
documental, passando de uma visão unitária para outra que pode considerar aquela unidade de maneira
fragmentada, de acordo com o conteúdo temático. Nesse contexto, a Classificação Decimal Universal
(CDU) e sistemas de classificação facetada – como o Colon Classification (CC), sistema desenvolvido
pelo matemático e bibliotecário indiano Shiyali Ramamrita Ranganathan –, desempenharam um papel
significativo. Permitiram a flexibilidade técnica para organizar conteúdos com base nas relações entre
unidades e fragmentos documentais, possibilitando atender demandas sociais por informação.
Carlos Cândido de Almeida & Mariana Vitti-Rodrigues
44
(Comte, 1972), sinalizando o “fim da história” (Benoit, 1999). Esta visão,
também baseada na ciência e propagada por Comte, delineava uma era de
“iluminismo radical” onde os conflitos sociais seriam eliminados.
Esse cenário guarda certa afinidade com o pacifismo de Otlet e La
Fontaine, o último agraciado com o Prêmio Nobel da Paz em 1913. Suas
ideias foram apresentadas e debatidas na Liga das Nações e no Instituto
Internacional de Cooperação Intelectual, antecessores da UNESCO
(Rayward, 2014). Parte do idealismo de Otlet e La Fontaine converge para
um argumento: se os conflitos bélicos resultam da ignorância e se nem
todos têm acesso ao conhecimento científico, então a promoção universal
desse conhecimento poderia contribuir ativamente para a paz mundial.
Este conceito reflete, como também afirmava em alguma medida o po-
sitivismo, a visão idealizada de uma sociedade onde os conflitos sociais,
pelo menos os mais extremos, não teriam lugar quando sob a “luz” do
conhecimento.
O desdobramento da bibliografia ocorreu no início do século XX,
em meio ao avanço de diversas áreas do conhecimento e ao progresso tec-
nológico, como os benefícios trazidos pela fotografia, pelo rádio e pela ima-
gem em movimento. Para Otlet, essa evolução indicava que a concepção
tradicional de documento bibliográfico – escrito e resultante dos avanços
técnico-operacionais entre o códice manuscrito e o livro impresso9 – tor-
nava-se insuficiente. Com o tempo, a concepção centrada no texto escrito
deixou de ser adequada como a única fonte de produção do conhecimento
científico. Esse entendimento revelou a necessidade de expandir a noção de
documento para incorporar as transformações intelectuais e tecnológicas
em curso, atendendo às diferentes especializações do saber.
A premência de mudança no cenário conceitual e empírico foi fun-
damental para que Otlet pudesse estabelecer, no início do século XX, uma
A concepção de adquirir conhecimento diretamente por meio dos livros impressos em suporte papel é
recente, já que resulta da revolução técnica alcançada com a criação da prensa de Johannes Gutenberg.
Até o século XV, os livros manuscritos eram produzidos por escribas/religiosos. A partir daqueles avanços,
na Idade Moderna o significado do conhecimento mudou. A raiz grega da verdade, alêtheia, reflete essa
evolução: á-lethês, significando “antes do esquecimento” (era oral), e á-letheia, significando “retirar o véu
(era da imprensa). A invenção do alfabeto tipográfico, que confina a palavra no espaço, alterou relações
audição/visão, refletida na pintura com a revolução na forma de tratar a perspectiva (Barthes; Marty, 1987).
Estudos pluridisciplinares da informação: ciência da informação, ética e linguagem - nº 3
45
conexão direta entre as expressões antigas bíblion (grego)10 e documentum
(latim), de modo a tentar unir o que foi então separado, sobretudo em um
momento de consolidação das ciências. Noutras palavras, a limitação epis-
têmica e operacional dos documentos bibliográficos de então levou Otlet
a resgatar a noção antiga de livro ou biblos,11 sendo este objeto concebido
como qualquer suporte físico que continha logos12 (Rabello, 2009).
Para substituir as palavra “bibliografia” ou a adjetivação “bibliográ-
fico”, Otlet propôs os termos “bibliologia” ou “documentologia13 para re-
presentar uma área de estudos, mas foi “documentação” que prevaleceu,
compondo inclusive o título de sua obra seminal, Traité de documentation:
le livre sur le livre, théorie et pratique, publicada em 1934.14 O termo ainda
é utilizado nesse sentido disciplinar (López Yepes, 1995), embora outra
parte relevante do sentido original da documentação – como um meio
para alcançar objetivos políticos voltados para uma cultura de paz na Belle
Époque europeia (Rayward, 2014) – seja frequentemente esquecido.15
10 O “[...] bíblion será para nós a unidade intelectual e abstrata, mas que podemos encontrar, concreta e
realmente, assumindo diferentes formas [...]” (Otlet, 2018, p. 60). Constitui “[...] o pensamento fixado
pela escrita das palavras ou imagens das coisas, signos visíveis fixados num suporte material” (Otlet, 2018,
p. 13). Nesse sentido, qualquer objeto poderia ser valorado como documento, transcendendo a noção de
documento bibliográfico associada a textos escritos, em suporte papel (Otlet, 2018).
11 Os registros contidos em múltiplos rolos de papiro tiveram sua origem na expressão grega biblion (βιβλίον).
A unidade era denominada biblos (βιβλίο), no latim rotulus ou volumen. Outras derivações são comuns,
como biblioteca (do grego βιβλιοθήκη, ou seja, biblion, βιβλίον + thēkē, θήκη = caixa, estojo, baú),
biblioteconomia (soma-se, no sufixo, a palavra grega nomos, νόμος = lei, regra, norma), bibliografia (grafia,
escrita, γραφή, ou cópia sobre o biblos), bibliometria (aferição da medida ou da quantidade de biblos). No
contexto religioso medieval, o termo bibliotheca era também utilizado para se referir a uma obra composta
por diversos rolos, como aqueles que constituíam a Bíblia cristã. Desse período, derivam termos do latim
que persistem atualmente: folium (folha), liber (unidade intelectual) e volumen (volume físico ou unidade
material) (Valente, 1978).
12 Por logos (do grego λόγος) (Chauí, 2003), compreende-se o verbo, o pensamento ou discurso racional, o
conhecimento, algo que hodiernamente tem sido denominado informação (Rendón Rojas, 1997).
13 Tanto bibliologia como documentologia se referem ao estudo (logos) sobre o biblos, ou seja, ciência (geral
ou parcial) do livro e do documento. A bibliologia geral “[...] deve consistir em estudar as leis gerais de
produção, intercâmbio e consumo literário” (Otlet, 2018, p. 567).
14 Conforme observado anteriormente, o termo “documentação”, antes da publicação do Traité, já nomeava,
em 1931, o Instituto Internacional de Documentação (IID).
15 Desconsiderar os objetivos originários da documentação acaba por descontextualizar ou distorcer o papel
estratégico da disciplina em seu projeto político original. É interessante notar que o afastamento desses
objetivos de inspiração “iluminista” tem adquirido novos matizes na contemporaneidade. O contexto
digital, nas últimas décadas, possibilitou a substituição dos suportes analógicos, resultando em modificações
sem precedentes nos meios de produção, tratamento, circulação e utilização da informação. No âmbito da
documentação científica e tecnológica, desde a segunda metade do século XX, as bases de dados referenciais
e de acesso a textos completos, disponíveis em plataformas digitais, têm substituído as bibliografias,
Carlos Cândido de Almeida & Mariana Vitti-Rodrigues
46
O início da história e da documentação científicas foi marcado por
uma perspectiva positivista, que via a realidade como algo existente e aces-
sível, a ser extraído dos documentos. Essa visão implicava que o uso de
técnicas científicas seria suficiente para alcançar essa realidade, desde que
fossem seguidos determinados ritos e protocolos universais, utilizando ins-
trumentos ou fontes confiáveis de representação – expressos, em última
análise, nos documentos (Rabello, 2009; Rabello; Rodrigues, 2019).
Nesse contexto, o historiador precisava apenas ancorar-se na auten-
ticidade do documento escrito, fundamentando-se em certos atributos
identificáveis para obter a certificação que validaria a “boa fé” da produção
documental e de sua função como meio para a representação fidedigna da
realidade. Esse processo considerava o local de origem ou armazenamento
– o arquivo como um “laboratório” – e os “métodos auxiliares” que confe-
riam objetividade à escrita da história, como a diplomática, relevante para
a análise dos elementos internos e externos do documento.
O documentalista, incorporando essa perspectiva positivista, limi-
tava-se ao tratamento descritivo e temático dos documentos em instru-
mentos de organização e recuperação de conteúdo, permitindo a extração
de informações tanto da fonte representada (inicialmente, o documento
bibliográfico, expandindo-se para qualquer objeto de interesse científico)
quanto do próprio instrumento de representação (como catálogos e reper-
tórios). Assim, buscava-se iluminar o homem da razão, promovendo, por
exemplo, o conhecimento que orientaria para a paz mundial.
Os exemplos observados nas práticas de historiadores e documenta-
listas, especialmente nos primórdios dessas disciplinas, refletem a crença de
que a aplicação cuidadosa da técnica, com foco na eficiência e eficácia dos
instrumentos, seria suficiente para garantir a autenticidade do documen-
to. Isso permitiria um acesso fiel à verdade do discurso, seja ele jurídico,
administrativo ou histórico. Essa associação entre autenticidade documen-
tal e veracidade discursiva persiste até hoje, especialmente sob preceitos
oferecendo maior praticidade e agilidade na produção e no acesso ao conhecimento. Ademais, essas bases de
dados fornecem serviços e modos de sistematização de dados cientométricos que eram inimagináveis para
os movimentos bibliográfico e documentalista.
Estudos pluridisciplinares da informação: ciência da informação, ética e linguagem - nº 3
47
tradicionais, estendendo-se não apenas à história e à documentação, mas
também a áreas como o direito, a administração e a arquivologia.
2.2 Quando a rEalidadEEstá próxima
O “movimento dos Annales” (Reis, 2004) ou “escola dos Annales
(Burke, 1997), que originou, posteriormente, a “nova história” (Le Goff,
1978; Burke, 1992), nasceu do encontro entre Lucien Febvre e Marc Bloch
em Estrasburgo (França). Essa perspectiva historiográfica teve como mar-
co inicial a criação do periódico Annales d’Histoire Économique et Sociale,
em janeiro de 1929. Ele surgiu, dentre outros aspectos, do questionamen-
to da narrativa historiográfica tradicional, que priorizava feitos políticos
de “grandes” personalidades, acontecimentos históricos chancelados pelo
poder vigente, além de documentos oficiais arquivados como principais
fontes. Os fundadores, e os colaboradores, buscaram uma abordagem in-
terdisciplinar que dialogasse com as ciências sociais.
Em outras palavras, a primeira geração dos Annales ampliou a con-
cepção de documento ao, dentre outros aspectos, questionar a abordagem
historiográfica centrada em documentos oficiais escritos. Reconheceram
que documentar ou reconhecer o valor de um objeto como documento é
uma ação hermenêutica, trazendo novos horizontes para o questionamento
das fontes historiográficas. Com isso foi possível estabelecer interpretações
segundo as quais o documento se apresenta como “objeto da memória
(Meneses, 1998), dotado de “vida social” (Appadurai, 1991) e “biografia
própria (Kopytoff, 1991), com uma dimensão política nele encarnada, na
condição, também, de “monumento” (Le Goff, 2013).
O enunciado “todo documento é um monumento” contrasta com a
visão historiográfica positivista, que considerava todo documento autênti-
co uma prova histórica de “boa fé”, algo supostamente essencial para uma
representação fidedigna da realidade. A ideia do “documento/monumen-
to” expõe as limitações do positivismo, pois, ao ser um monumento com
intencionalidades, o documento reflete relações de poder. Nesse sentido,
não há um documento primário isento de influências. A durabilidade do
documento/monumento” permite que sociedades históricas moldem sua
Carlos Cândido de Almeida & Mariana Vitti-Rodrigues
48
imagem, consciente ou involuntariamente. Portanto, não existem docu-
mentos absolutamente verdadeiros, exigindo dos historiadores uma abor-
dagem crítica à luz dessa constatação (Le Goff, 2013).
O desafio hermenêutico tornou o trabalho do historiador mais com-
plexo, exigindo a seleção e interpretação de evidências documentais que
antes eram comumente consideradas irrelevantes, sempre com a consciên-
cia de que o contexto contribui para a produção daquilo que documento
representa. A capacidade de ler “nas entrelinhas” (Bloch, 1952; Le Goff,
2013) permitiu ao historiador ir além das informações aparentemente in-
significantes dos objetos, buscando evidências – por meio do questiona-
mento – para esclarecer tanto a investigação do passado quanto a relação
do homem com o tempo. Os historiadores dos Annales reconheceram a
materialidade dos objetos e dos espaços a partir de sua produção em uma
cultura específica, contribuindo significativamente para os estudos de cul-
tura material.
A ampliação do conceito de documento pela historiografia permi-
tiu uma nova convergência com a documentação. A historiografia “me-
tódica” ou “tradicional”, com seu foco no documento escrito arquivado,
compartilhava com a documentação a ideia de neutralidade do documento
como uma fonte para a compreensão da realidade. Essa noção foi preser-
vada mesmo quando Otlet propôs uma expansão do conceito de docu-
mento. No entanto, a ampliação conceitual proposta pelos historiadores
dos Annales difere da abordagem da documentação otletiana (Rabello,
2009). Enquanto a documentação ainda estava enraizada no positivismo
(Rayward, 1994; Bezerra; Saldanha, 2013), os historiadores dos Annales
ampliaram o conceito de documento em um contexto que criticava os pre-
ceitos dessa perspectiva filosófica (Bloch, 1952; Burke, 1997; Reis, 2004;
Le Goff, 2013).16
16 Para ilustrar a situação, se faz relevante observar que para Otlet todo objeto poderia se tornar um documento
e, por meio dele, haveria a garantia de acesso inequívoco à realidade. Em analogia – segundo essa “fase
positivista” da documentação (Rabello, 2009) –, seria possível “[...] remover fatos de documentos do
mesmo modo que descascamos ervilhas de suas vagens” (Rayward, 1994, p. 247, tradução nossa). Por sua
vez, os mentores dos Annales, ao estenderem a compreensão do conceito de documento, lançavam críticas
sobre a história “positivista” (Le Goff, 2013). Isso porque esta abordagem historiográfica “tradicional”
sustentava, em grande medida, a possibilidade de acesso inequívoco à realidade mediante os registros
escritos arquivados. Os representantes do “movimento dos Annales”, por outro lado, tinham uma visão
diferente em relação às fontes documentais. Para eles, quanto mais a pesquisa buscava revelar os eventos
Estudos pluridisciplinares da informação: ciência da informação, ética e linguagem - nº 3
49
Curiosamente, embora as propostas de ampliação conceitual de
documento pela documentação e pela historiografia tenham surgido por
volta da década de 1930, a relação entre elas permanece pouco clara. Há
escassa menção a uma interação direta entre o movimento documentalista
e o historiográfico, apesar de ambos atuarem no contexto francófono e
abordarem, cada qual a seu modo, os limites das fontes documentais para
a ciência (Rabello, 2009). Além disso, é relevante notar que os estudos de
cultura material influenciavam e eram influenciados por diversos campos
do saber, além do historiográfico (Pesez, 1978; Bucaille; Pesez, 1989), le-
vantando a questão de até que ponto esses estudos contribuíram ou estabe-
leceram alguma relação com o início da documentação.
A contribuição dos estudos de cultura material, em uma perspectiva
hermenêutica, repousa sobre o reconhecimento de que os símbolos materiais
dos documentos comunicam e representam, mediante a linguagem. Estudos
neofuncionalistas “[...] exploram como os objetos materiais, incluindo do-
cumentos, na prática carregam significados como veículos de expressões sim-
bólicas” (Shankar; Hakken; Østerlund, 2017, p. 64, tradução nossa). Ainda
assim, uma de suas limitações consiste no entendimento de existência de
artefatos acabados, deixando de considerá-los em processo, em sua história.
Isso porque, o que “[...] flui nos estudos de cultura material não é o do-
cumento, mas sua interpretação, e o material se torna um mero atributo.
(Shankar; Hakken; Østerlund, 2017, p. 65, tradução nossa).
A interseção entre a documentação e a historiografia da Escola dos
Annales ganha novas nuances, especialmente com as contribuições da bi-
bliotecária francesa Suzanne Briet, seguidora de Paul Otlet. Em seu ensaio
Qu’est-ce que la documentation?, publicado em 1951, Briet abre espaço para
uma “fase hermenêutica” da documentação (Rabello, 2009) que se alinha
ao início dos Annales, envolvendo dimensões representacionais e de valida-
ção, seja em termos indiciários, simbólicos ou probatórios.17
fundamentais, mais ela dependia da convergência de testemunhos diversos em sua natureza (Bloch, 1952).
17 Ao creditar uma citação a um “bibliógrafo contemporâneo preocupado com a clareza”, Briet põe em
evidência uma dimensão indiciária, simbólica e probatória envolvida no processo de representação
documental, seja o documento na condição de “uma prova que sustenta um fato”, ou como um “índice
concreto ou simbólico, conservado ou registrado, com a finalidade de representar, de reconstituir ou de
provar um fenômeno físico ou intelectual” (Briet, 1951, p. 7, tradução nossa).
Carlos Cândido de Almeida & Mariana Vitti-Rodrigues
50
A partir da década de 1950, a ideia de neutralidade do documen-
to, conforme expresso por Otlet, começou a ser problematizada. Embora
Briet (1951) não tenha abordado essa questão explicitamente, a discussão
tornou-se evidente nos trabalhos de autores que revisitaram e expandiram
os estudos sobre a abordagem otlet-brietiana da documentação (Meyriat,
1981; 1993; Escarpit, 1981; Rayward, 1994; Buckland, 1991; 1995; 1997;
Frohmann, 1992; Day, 1997; Lund, 2010; Fayet-Scribe, 2012).
Com essa perspectiva, passou-se a argumentar que o documento não
possui neutralidade intrínseca, tendo em vista o seu valor simbólico confe-
rido dentro de um contexto cultural e institucional (Rabello, 2019). Assim,
o documento resulta de uma interpretação situada, que depende de quem
o utiliza e de onde a informação é aplicada (Meyriat, 1981). Essa dinâmica
está intimamente vinculada à interação e à intervenção do interpretante
na sociedade, bem como à sua relação com os objetos. Considerando a
noção de contexto como definidora, quem interpreta atua sobre os objetos,
enquanto, reciprocamente, os objetos influenciam aqueles que os interpre-
tam. Essa noção, todavia, pressupõe polos que, de acordo com o ponto de
partida, engendram ou são engendrados em um processo de redução.
A noção de contexto, sob uma perspectiva hermenêutica, sugere que o
documento depende de uma intervenção externa para ser interpretado. Em
vez de reduzir o papel do documento – como ocorre ao adotar categorias
prévias de análise –, uma alternativa seria possibilitar uma posição em que
os participantes do processo interpretativo possam ser representados a partir
de seu próprio espaço e tempo, algo que lhe garantiria rastreabilidade. Para
isso, seria adequado adotar os procedimentos dos próprios atores, evitando
um ato inquisidor para fazer, ou obrigar, os documentos falarem. O objetivo
seria, em vez disso, estabelecer uma relação etnográfica de modo a deixá-los
falar, desde que se rastreiem “[...] as pistas deixadas pelas atividades deles na
formação e desmantelamento de grupos.” (Latour, 2012, p. 51).
2.3 Quando a rEalidadEnão Está muito próxima
A ideia de capacidade de rastreabilidade dos documentos que podem
falar pode ser sintetizada no seguinte enunciado: um documento “significa
Estudos pluridisciplinares da informação: ciência da informação, ética e linguagem - nº 3
51
o que diz”, algo que pressupõe que “o significado dos documentos está
contido neles”, bem como “esse significado é amplamente direto e autoe-
vidente.” (Shankar; Hakken; Østerlund, 2017, p. 60, tradução nossa). Os
estudos de ciência e tecnologia, a partir dessa perspectiva, parecem pres-
supor que a realidade não apenas “está próxima”, mas que ela “está dada”,
isto é, “ela está aí”. No entanto, permitir que o documento fale, já que ele
significa o que diz” – ou seja, o documento documenta – envolve relações
complexas, ou, em outras palavras, mediações, o que demonstra que a rea-
lidade “não está tão próxima” quanto se poderia supor.
A rastreabilidade da relação entre documento e informação, da sua
forma e conteúdo, depende da relutância de se separar artefato das práticas
que documentam. Os estudos de ciência e tecnologia dependem da inter-
pretação dos documentos e das práticas que documentam o próprio arte-
fato, suas técnicas e os seus papéis sociais. Houve mudanças na produção
de documentos, o que implica tanto no modo como são criados quanto
nas formas que assumem. Essas mudanças, incluindo a digitalização de
documentos, dificultam a interpretação de sua rastreabilidade. Em suma,
à luz de tais variáveis, há o entendimento de que o documento compreen-
de “qualquer artefato que inclua referências substanciais aos processos so-
ciais por meio dos quais foi produzido e reproduzido” (Shankar; Hakken;
Østerlund, 2017, p. 59, tradução nossa).
A ideia de que a realidade “está aí” se fundamenta, sobremaneira,
na fisicalidade da informação, relacionada às propriedades que garantem a
existência do objeto-suporte no espaço e no tempo. Já a concepção de que
a realidade “não está tão próxima” abre caminho, para além da fisicalidade,
para outras camadas ou mediações de interpretação, encontradas na ma-
terialidade da informação. A materialidade se manifesta nos enunciados,
registrados ou não,18 e abrange outras dimensões, como as epistêmicas, po-
líticas e éticas. Ela se fortalece com o processo de inscrição e tanto compõe
quanto é composta por redes. Nessas redes, a materialidade é operacionali-
18 Tal dinâmica já era considerada na primeira metade do século XX, quando se passou a ter interesse na ação
que “[...] acompanha o documento desde o instante em que ele surge da pena do autor até o momento que
impressiona o cérebro do leitor”. (Otlet, 1937).
Carlos Cândido de Almeida & Mariana Vitti-Rodrigues
52
zada por práticas guiadas por modos de institucionalidade, que podem ser
formais, semiformais ou informais.
2.3.1 pErspEctivas dE matErialidadE
As pesquisas de Bernd Frohmann19 estabelecem uma distinção das
práticas documentárias”, focadas no processo de documentar, em relação
à “ontologia da informação”, que se concentra na informação abstrata ou
imaterial, com um enfoque nos aspectos “cognitivos” e “mentalistas” indi-
viduais do humano. Para tal diferenciação, o autor propõe aquilo que ele
nomeou “ontologia documentária” (Frohmann, 2008b). Essa abordagem
considera ações sociais que conduzem “práticas informacionais”, mobili-
zadas por “práticas não-documentárias” e podendo culminar em “práticas
documentárias”, estas por ele também denominadas de “documentação”.20
A proposição de “práticas documentárias” também encontra terreno
fértil na noção de “artefato híbrido” ou “quase-objeto”, que fundamenta
pesquisas do tipo ator-rede (Frohmann, 1995). Inicialmente exemplifica-
dos como a “rádio aberta” e a “info-bahn”, esses híbridos evoluem para
a ideia unificada de “documentos” em textos posteriores, refletindo uma
perspectiva “neodocumentalista”. Frohmann busca reinterpretar as práti-
cas documentárias, em linha com as transformações promovidas pela te-
oria ator-rede (TAR)21 nos estudos de ciência e tecnologia (González de
Gómez, 2012).
19 Bernd Frohmann é um pesquisador alemão radicado no Canadá e concentrou seus estudos no campo da
teoria da mídia, arqueologia da mídia e ética midiática. Ele trabalhou na Universidade de Western Ontario
até sua aposentadoria em 2012. Frohmann faz parte de uma corrente de pesquisa que emergiu na década de
1990 no campo da ciência da informação, conhecida como “nova” documentação. Essa corrente também
inclui destacados autores como Rayward, Buckland, Lund, Day, entre outros.
20 As práticas documentárias e as relações discursivas se tornam questões que abrangem aspectos tanto
epistemológicos quanto políticos. Frohmann exemplifica esse conceito por meio das formas discursivas
de Paul Otlet, onde a noção de sistema documentário leva em consideração as propriedades materiais da
informação quando ele tentou propor uma sociedade baseada em uma cultura de paz.
21 A teoria ator-rede ou teoria do ator-rede (TAR), também conhecida como ANT (sigla em inglês para
Actor-Network eory), foi explorada por Frohmann no âmbito da ciência da informação. A TAR foi
originalmente formulada por Michel Callon e desenvolvida com base nas contribuições de Bruno Latour,
no início da década de 1980, no âmbito do Centre de Sociologie de l’Innovation (CSI) da École Nationale
Supérieure des Mines de Paris.
Estudos pluridisciplinares da informação: ciência da informação, ética e linguagem - nº 3
53
Portanto, mediante as contribuições de Frohmann22, é possível ex-
plorar a materialidade da informação e do documento no âmbito da “neo
ou “nova” documentação. Esta abordagem retoma ideias de Paul Otlet, de
Suzanne Briet e de outros autores documentalistas, além daqueles denomi-
nados pós-estruturalistas e/ou que estão envolvidos em estudos de ciência
e tecnologia. A “nova” documentação tem contribuído com a expansão da
compreensão de documento e de informação. Ela contrasta com a perspec-
tiva fisicalista, tradição supostamente originária do campo informacional
(Capurro, 2007). Para estabelecer a diferenciação em relação à visão tra-
dicional, Frohmann faz uma distinção entre materialidade e fisicalidade23
(Frohmann, 2008a).
O conceito de materialidade da informação em Frohmann baseia-se,
em parte, na análise do discurso de Foucault (Frohmann, 2008a), mas
também abrange a política da informação em regimes ou redes sociotéc-
nicas de forma mais ampla (Frohmann, 1995; 2008b; Amorim; Rabello,
2023). A complexidade dessas redes revela que a realidade “não está tão
próxima”. Essa abordagem considera os aspectos sociais que influenciam a
criação de enunciados, bem como os efeitos que eles geram. A análise do
discurso, por sua vez, concentra-se nos enunciados que moldam a dinâ-
mica do poder, especialmente por meio de especialistas e porta-vozes, aos
quais se atribui autoridade. 24
22 Para realizar essa análise, foi realizada uma revisão de trabalhos publicados por Frohmann (1995, 2008a,
2008b). Além disso, foram consideradas as contribuições de outros autores no campo da informação que
dialogam com a teoria de Frohmann (Day, 1997; Ferrando; Freitas, 2017; González de Gómez, 2012;
Rabello, 2022b; Amorim; Rabello, 2023).
23 A abordagem fisicalista, como o nome indica, enfoca a fisicalidade da informação, ou seja,
a informação registrada. Esta informação pode ser quantificada, manipulada, processada,
controlada e armazenada em sistemas de informação. Tal perspectiva tem no horizonte a realidade
que idealmente “está aí” nas inscrições. A fisicalidade se refere, portanto, às propriedades físicas
do suporte e de seu registro. Tais propriedades permitem a realização de pesquisas ou práticas
profissionais aplicadas, sobretudo para melhorar o funcionamento do sistema de informação.
Busca, portanto, meios técnicos para solucionar problemas informacionais. Entretanto, a
questão epistemológica e social se coloca quando a abordagem fisicalista reivindica, para si,
neutralidade técnica e política. Nesse contexto, o documento é concebido exclusivamente
como um suporte para a informação registrada. À luz da suposta neutralidade técnica e política
incorporada no documento, por meio dele seria possível, em tese, o acesso direto e inequívoco à
realidade. Conforme observado há pouco, essa é a relação segundo a qual a história, “metódica
ou “positivista”, e a documentação, em sua “fase positivista”, constroem o conceito de
documento.
24 As classificações ou representações da realidade, seja para fins documentários ou não, são formas pelas quais
os enunciados são apresentados. Elas podem utilizar linguagem artificial ou natural e podem ser orais ou
Carlos Cândido de Almeida & Mariana Vitti-Rodrigues
54
O conceito de “dispositivo”,25 de Michel Foucault, é relevante para
a análise das relações de poder na leitura de Bernd Frohmann (Ferrando;
Freitas, 2017).26 Nele Foucault reconhece que “épistémé” é um dispositivo
discursivo, distinguindo-o dos não discursivos. A fase genealógica da pro-
dução de Foucault acomoda o conceito de dispositivo como um conjunto
heterogêneo que abrange discursos, instituições, regulamentos, leis e outros
elementos, discursivos e não discursivos, que formam uma rede. De modo
geral, o dispositivo é uma formação que, em um contexto histórico específi-
co, tem uma função estratégica primordial na resposta a urgências, desempe-
nhando um papel dominante na dinâmica do poder (Foucault, 2002).
O documento e a informação, nessa perspectiva, não são neutros.
A qualidade do enunciado influencia a circulação da informação. Ele – o
documento – pode ter diferentes graus de estabilidade. A fisicalidade, no
caso, contribui para sua permanência, mas não é definidora. A informação
pode ter materialidade, ao circular socialmente, sem necessariamente estar
registrada em um suporte físico. A estabilidade influencia a adaptabilidade
do discurso em sua capacidade de gerar efeitos. Para Frohmann (2008a;
2008b), nos estudos de materialidade da informação, o mais importante
são os efeitos (políticos) dos enunciados e suas implicações (éticas).
registradas, científicas e técnicas ou, ainda, em linguagem não especializada. A linguagem científica ou
técnica – na forma registrada – se encontra, por exemplo, em publicações científicas, manuais profissionais
que orientam práticas, como os códigos médicos e penais, sistemas de classificação bibliográficos, em
bibliografias ou bases de dados bibliográficos, dentre outros exemplos. Na linguagem técnica não registrada,
encontram-se, por exemplo, apresentações orais em eventos, conversas informais entre profissionais
e acadêmicas. Na linguagem não especializada – que pode ser, por exemplo, realizada pela oralidade e
circular entre pessoas alfabetizadas ou não alfabetizadas –, a dependência da memória individual ganha uma
dimensão ainda mais relevante. Esse seria o caso de conhecimentos transmitidos oralmente por gerações,
conforme ocorre, por exemplo, com líderes em comunidades de povos originários. Essa linguagem não
especializada pode se valer, ainda, de inscrições diversas, com a produção de documentos de interesse
comum em determinada rede ou institucionalidade informal ou semiformal, como grupos ou interações
em redes sociais em plataformas digitais, produção de documentação em determinada comunidade para
fins de memória, defesa de determinado pensamento, dentre outros.
25 Originado nas obras Vigiar e Punir, de 1975, e História da Sexualidade, iniciada em 1976, a coletânea
Microfísica do Poder resume o entendimento de Foucault (2002) sobre o dispositivo. Ele enfatiza a
heterogeneidade desse conceito, indo além da fase arqueológica.
26 Com base no conceito de dispositivo, Ferrando e Freitas (2017) reforçam a perspectiva de Foucault e,
especificamente, a de Frohmann, ao entenderem a agência documentária como um processo no qual o
documento gera efeitos. Conforme descrito pelas autoras, a agência documentária se refere ao “[...] poder
de afetar do documento, que pode reposicionar formas e pensamentos de acordo com seus contextos de
uso, ou ainda, a partir das práticas sociais documentárias.
Estudos pluridisciplinares da informação: ciência da informação, ética e linguagem - nº 3
55
A materialidade da informação se manifesta em redes complexas de
relações que podem ser denominadas de regimes. Os “regimes de verda-
de” estabelecem quando uma verdade é concebida e aceita como verda-
de. Os “regimes de materialidade” são orientados pela ordem das redes
e das instituições. Já os “regimes de informação”, para Frohmann (1995,
2008a, 2008b), constituem uma síntese das perspectivas anteriores, segun-
do a qual se encontra a assimetria orientada pela relação entre poder e
conhecimento.
A apropriação de Frohmann da TAR se desenvolveu concebendo-a
como uma abordagem heurística para investigar o meio pelo qual os
atores, em rede, interagem e criam a realidade. Noutras palavras, a TAR
compreende o estudo da sociedade como sendo composto por associações
entre atores.27 Portanto, essas associações sociais e técnicas – numa
palavra, sociotécnicas – constituem redes as quais englobam uma série de
transformações, traduções e deslocamentos que se desenrolam dentro dos
cursos de ação (Latour; Woolgar, 1997).28
Nesse contexto, tanto os atores humanos quanto os não-humanos
(instituições, objetos, tecnologias, seres orgânicos e inorgânicos) têm a
capacidade de agir, sendo considerados, por conseguinte, como “actan-
tes” (Latour, 2017).29 A abordagem da TAR, como ponto de partida, não
27 Faz-se menção à concepção de sociedade defendida, no século XIX, pelo sociólogo francês Gabriel Tarde,
em diálogo e em contraponto à concepção de sociedade pelo também sociólogo francês Émile Durkheim,
mobilizada pelo conceito de “fato social” (Latour, 2012). A concepção de Tarde tem sido relevante para
estudos de ciência e tecnologia.
28 Um curso de ação é composto por desvios, e a interpretação desses desvios “define uma defasagem que
representa a medida da tradução” (Latour, 2016, p. 28). Um desvio é uma alteração no curso de ação
original, que pode resultar em uma nova tradução. Dessa forma, novos elementos são incorporados,
formando uma composição (Latour, 2016). O objeto de estudo de um curso de ação é sociotécnico
quando envolve atores humanos (pessoas) e atores não-humanos (artefatos, instituições, seres orgânicos e
inorgânicos, etc.). Os atores humanos e não-humanos se entrelaçam e formam entidades coletivas mutáveis,
conhecidas como híbridos.
29 Na atuação dos atores em rede, as linguagens podem transcender os meios convencionais de registro
simbólico, como a linguagem escrita com alfabetos e regras gramaticais. Nos meios digitais, as linguagens
contam com o recurso da numeralidade binária, expresso em metadados, orientadas por fórmulas de ação,
ou algoritmos. Outros métodos de intervenção e inscrição em objetos, sejam eles artificiais ou naturais,
podem ocorrer por meio de simples modificações no suporte, como esculpir, escrever, deformar, (re)
programar, ou mesmo na simples preservação de um objeto, analógico ou digital, para fins de conhecimento,
memória, afetividade, dentre outros. Nesse contexto, as “marcas” nos objetos refletem intenções específicas,
atribuídas em contexto. Tais “marcas” (sentidos e intencionalidades) podem orientar, por exemplo, critérios
para formação de coleções, seja em instituições formais, como em um museu, ou em institucionalidades
informais, como em práticas de colecionismo.
Carlos Cândido de Almeida & Mariana Vitti-Rodrigues
56
faz distinções hierárquicas entre atores,30 uma vez que eles são tratados de
forma simétrica. Isso faz da TAR um recurso heurístico, permitindo uma
análise que “segue os próprios atores” e oferece uma “[...] maneira mais
científica de construir o mundo social” (Latour, 2012, p. 45).
Esse entendimento se refere a uma sociomaterialidade, como a ima-
gem de algo “[...] nodoso, evocado tanto em observações empíricas comuns
quanto em ontologias relacionais desenvolvidas analiticamente” (Shankar;
Hakken; Østerlund, 2017, p. 65, tradução nossa).. Essa perspectiva rela-
cional e com o enfoque no processo é relevante como um modo de “[...]
corroborar a história do documento, rastreando-a por meio de quaisquer
transformações anteriores.” (Shankar; Hakken; Østerlund, 2017, p. 65,
tradução nossa). Os fios bagunçados desse percurso necessitam ser acom-
panhados até se chegar ao desfecho do novelo, mesmo que tal desfecho seja
provisório e, portanto, situacional.
As inscrições não são apenas marcas da trajetória dos documentos,
mas também revelam defasagens e desvios de significação. Suas instâncias
materiais permitem que o trabalho documentado – como em um labora-
tório – seja combinado, contrastado, manipulado e avaliado. A sobrepo-
sição dessas instâncias, semelhante à analogia com os “centros de cálculo
(Latour; Hermandt, 2004), permite que as inscrições sejam reproduzidas,
distribuídas, reorganizadas e combinadas, possibilitando, assim, o alista-
mento de novos aliados (Callon, 2021).
30 Estudos baseados na TAR partem do princípio de simetria entre atores humanos e não-humanos,
reconhecendo que ambos têm a capacidade de agir e influenciar as redes de associações em que estão
inseridos. No entanto, essa simetria inicial não elimina a existência de hierarquias; pelo contrário, ao
analisar as associações e mediações realizadas pelos atores, a TAR permite identificar assimetrias e relações
de poder. Como sugere Latour (2012), mediadores não apenas transportam significados, mas também
os transformam, revelando que a dinâmica das associações pode expor desigualdades. Essa perspectiva
performativa de mediação, fundamentada nas contribuições de Jean-Gabriel de Tarde, contrasta com a
abordagem de Émile Durkheim, que prioriza estruturas sociais previamente estabelecidas e estáticas
(Durkheim, 1972). Estudos que adotam a TAR beneficiam-se desse entendimento ao evitar definir
previamente a posição dos atores, concentrando-se nas interações concretas e nas transformações que
ocorrem dentro das redes.
Estudos pluridisciplinares da informação: ciência da informação, ética e linguagem - nº 3
57
2.3.2 modos dE institucionalidadE
A dependência dos documentos em relação ao contexto pode variar
entre forte e fraca, em uma dinâmica inserida em redes que vão do alta-
mente formalizado e organizado ao informal e pessoal, como ocorre com
documentos e coleções pessoais. A partir dessa dinâmica, um “[...] docu-
mento pode servir como geral e explícito em algumas situações e se tornar
particular e implícito em outras.” (Shankar; Hakken; Østerlund, 2017, p.
71, tradução nossa). Em suma, a permanência de documentos pode estar
relacionada a um grupo “[...] relativamente desenvolvido, como organiza-
ções e governos, enquanto sua efemeridade pode ser associada a movimen-
tos sociais ou ondas de cultura popular.” (Shankar; Hakken; Østerlund,
2017, p. 63, tradução nossa).
A relação dinâmica e variável entre a dependência do contexto e
a permanência do documento (Shankar; Hakken; Østerlund, 2017) será
abordada em termos de modos de institucionalidade (Rabello, 2019;
2024), partindo do entendimento de que as instituições são regidas por re-
gras e normas que tanto influenciam e orientam ações, quanto são influen-
ciadas e moldadas por determinadas práticas (Berger; Luckmann, 1995).
Assim, busca-se compreender como o ordenamento e as práticas podem
evidenciar, por exemplo, a formação de redes em modos institucionais que
acolhem não apenas humanos, mas também outros atores.
Os modos de institucionalidade formam um espectro que vai do
formal ao informal, com as instituições semiformais ocupando um espaço
intermediário e correspondendo a diferentes tipos de redes (Rabello, 2019;
2024). Esses modos podem se relacionar entre si e até mudar de condição
(embora isso seja menos provável nas instituições formais), refletindo seu
caráter dinâmico, situacional, temporário e transitório. Eles orientam as
práticas dos atores envolvidos, direta ou indiretamente, na perenidade, cir-
culação e influência da materialidade da informação, gerando efeitos sobre
aqueles que interagem com ela ou são por ela afetados. A dependência de
plataformas digitais privadas, quando presente, torna a gestão da informa-
ção em instituições formais, informais ou semiformais mais complexas,
devido à influência de algoritmos e políticas dessas plataformas.
Carlos Cândido de Almeida & Mariana Vitti-Rodrigues
58
As instituições formais são caracterizadas por regras explícitas, hie-
rarquias rígidas e uma forte dependência do conhecimento técnico-cien-
tífico. No caso do setor público, seus processos são burocratizados, e a
comunicação, tanto interna quanto externa, ocorre sobretudo por canais
oficiais. Os atores humanos, geralmente, são profissionais com expertise
específica e funções técnicas, científicas e/ou legais bem definidas, confor-
me suas atribuições e limites de competência. No campo informacional,
predominam os meios tradicionais de comunicação, além de uma varieda-
de de equipamentos e dispositivos informacionais e culturais, como biblio-
tecas, arquivos, museus, centros de documentação, bases de dados, em suas
diversas tipologias, tanto no setor público quanto no privado.
Em contraste, as instituições informais são mais flexíveis e horizon-
tais, valorizando o conhecimento tácito e as experiências compartilhadas,
com destaque para iniciativas comunitárias e populares em movimentos
sociais. Os atores humanos, geralmente voluntários, concebem essas inicia-
tivas como uma forma de reafirmar os objetivos da instituição vinculados
com alguma identidade da comunidade, seja na reivindicação de direitos,
na melhoria da qualidade de vida de seus membros ou em outras necessi-
dades. Exemplos incluem qualquer agremiação informal para satisfazer al-
guma demanda não atendida por políticas públicas ou, simplesmente, para
satisfazer alguma necessidade ou crença. Tais modos institucionais muitas
vezes são marcados pela improvisação e/ou pela escassez de recursos, como
é no caso de meios de comunicação informais, como rádios comunitárias,
fanzines, blogs, ou em equipamentos ou dispositivos informacionais ou
culturais informais, como bibliotecas, museus, arquivos e centros de do-
cumentação populares, bem como para iniciativas particulares, como é o
caso do colecionismo.
As instituições semiformais combinam características de organiza-
ções formais e informais, oferecendo maior flexibilidade do que as institui-
ções formais, mas mantendo certo grau de estruturação. O Terceiro Setor
é um exemplo clássico, pois busca suprir a ausência ou insuficiência da
atuação estatal em demandas específicas da comunidade, ao mesmo tempo
em que concilia objetivos sociais com eficiência e sustentabilidade relativa.
A participação de atores humanos nessas instituições pode incluir tanto
Estudos pluridisciplinares da informação: ciência da informação, ética e linguagem - nº 3
59
profissionais quanto voluntários. Exemplos dessa forma de institucionali-
dade incluem associações como bancos populares (para atender a deman-
das financeiras), cooperativas no setor produtivo, e meios de comunicação
ou dispositivos informacionais e culturais alternativos, como bibliotecas,
museus, arquivos e centros de documentação populares, muitas vezes asso-
ciados a organizações não-governamentais (ONGs).
Os modos de institucionalidade encontram na informação e em sua
materialidade o “amálgama” que (re)produz tanto instituições quanto re-
des, que, por sua vez, também (re)produzem essas informações. A materia-
lidade da informação, seja fluida e efêmera (como na oralidade) ou tangível
e física (como nos documentos), gera efeitos mais ligados às suas impli-
cações epistêmico-políticas do que ao meio pelo qual se manifesta. Entre
esses efeitos estão a mobilização de comunidades e a orientação de práticas.
Independentemente do tipo de institucionalidade, as instituições-rede são
orientadas por enunciados cujas positividades são fundamentais para criar
zonas de fronteira” e viabilizar a interação entre os diferentes modos de
institucionalidade, do informal ao semiformal, e deste ao formal.
2.3.3 pErspEctivas dE matErialidadE Em modos dE
institucionalidadE
A seguir, serão apresentados exemplos quase ficcionais31 que rela-
cionam modos de institucionalidade com a materialidade da informação.
O intuito é observar a institucionalidade “impregnada” nos atores, que
orienta suas práticas documentárias. Pretende-se compreender a autori-
dade do ator/autor e o consequente adensamento da materialidade da
informação registrada no documento, compondo e influenciando redes
e práticas de terceiros.
Nos exemplos, as ações serão abordadas a partir de diferentes enfo-
ques institucionais, podendo ser incialmente:32 i. Formal – como a atua-
31 Os exemplos foram denominados (quase) ficcionais, pois se lançou mão da liberdade interpretativa das
fontes consultadas para descrever, de modo ensaístico, possíveis situações que, não necessariamente,
correspondem a casos especificamente e empiricamente observados.
32 A palavra “inicialmente” é estratégica, já que modos de institucionalidade não são estáticos, podendo
transitar ou dialogar de um modo a outro, a depender do enfoque direcionador.
Carlos Cândido de Almeida & Mariana Vitti-Rodrigues
60
ção de um professor/pesquisador e de um legislador no contexto de uma
pandemia; ou de um profissional no contexto de um sistema de informa-
ção;33 ii. Semiformal – como no “movimento antivacina”, onde surgem
questionamentos de dissidências, com ou sem alguma autoridade técnica,
ainda que contestada; iii. Informal – autores e utilizadores de blogs sobre
a temática trans.
Ao ser provocado pelo avanço de um ator não-humano – um vírus
– um especialista em profilaxia, respaldado por diversas instâncias formais,
passa a ganhar notoriedade junto à opinião pública quando suas orienta-
ções passam a ser amplificadas por entidades governamentais e não-go-
vernamentais, mediante, por exemplo, veículos de mídia e plataformas
de redes sociais. O pesquisador detém prestígio em círculos acadêmicos,
respaldado por sua qualificação e afiliação a uma universidade ou a centro
de pesquisa. Sua influência se fundamenta em publicações em revistas e
em eventos científicos, mediante revisões por pares. Ele orienta pesquisas,
participa de processos de avaliação e comunica resultados. Suas instruções
são valorizadas, uma vez que são respaldadas por pesquisas aceitas pela
comunidade. O pesquisador transcende o ambiente acadêmico ao divulgar
seus saberes, contribuindo para a saúde pública e modalizando as aborda-
gens de prevenção.
As pesquisas do especialista em profilaxia – com autoridade – poten-
cialmente ganharão alcances ainda maiores quando passam a fundamentar,
por exemplo, determinado projeto legislativo. No processo legislativo, in-
formações circulam na estrutura formal da casa legislativa onde parlamen-
tares atuam representando segmentos sociais (Santana, 2023). Algumas
vezes, essas informações também transitam, como estratégia do legislador,
por modos de institucionalidade semiformais ou informais, quando, por
exemplo, realiza uma consulta pública junto à sua base, composta por
representantes da sociedade civil organizada, como ONGs, movimentos
sociais e associações de moradores. A produção de documentos no âmbi-
33 Os sistemas são aqui compreendidos como infraestruturas institucionalizadas que englobam entrada,
processamento e saída de registros, com o propósito de utilização para suprir determinada necessidade.
Exemplos de sistemas de informação – em setores públicos ou privados, em contextos analógicos ou
digitais – incluem bibliotecas, museus, arquivos, centros de documentação, editoras, dentre outros. São
estruturados por subsistemas que operam através de linguagens documentais e mecanismos de produção e
utilização de metadados, tais como catálogos, repositórios, bases de dados, dentre outros.
Estudos pluridisciplinares da informação: ciência da informação, ética e linguagem - nº 3
61
to jurídico e administrativo sempre tem consequências, mas, no caso do
processo legislativo, busca-se a máxima influência quando um tipo de ins-
trumento – uma Lei Federal – é aprovado pelo parlamento e passa a fazer
parte do ordenamento jurídico do país. Analisar e entender esses processos
escalonados e suas composições desafia estudos do gênero.
Em outro exemplo, o “movimento antivacina” se mobiliza mediante
enunciados, tais como “todas as vacinas são prejudiciais à saúde.” Esses
movimentos formam uma rede com uma institucionalidade semiformal
ou informal, baseada em convenções mais flexíveis e espontâneas, crian-
do “verdades” para seus membros. Por vezes, pesquisadores, professores e/
ou profissionais da saúde – gozando de institucionalidade formal, quando
vinculados ou com formação em instituições da área – trazem ao “movi-
mento antivacina” requintes de formalidade. A mescla dos modos de ins-
titucionalidade e das camadas de informação semântica, misinformação e
desinformação amplia a complexidade para o estudo da materialidade nos
regimes de informação (Vignoli; Rabello; Almeida, 2021).
O enunciado que dá vida a esse movimento exerce influência e resis-
tência, mesmo quando propagado oralmente. Ele ganha ainda mais força
e resistência por meio das práticas documentárias, ou seja, pela criação de
registros, como postagens em mídias sociais, como Facebook, Instagram,
WhatsApp, dentre outros, ou através da criação de websites e outras fon-
tes, em institucionalidades marcadamente informais. Lamentavelmente, os
efeitos da materialidade da informação antivacina podem ter consequên-
cias que chegam a levar ao adoecimento ou a morte de pessoas. O ressur-
gimento de doenças previamente erradicadas no Brasil, como o sarampo,
ilustra o impacto social negativo da informação em situações de informa-
ções falsas ou imprecisas.
Existe, neste momento, o interesse de observar um exemplo em um
sistema de informação. Nele, um objeto – ou suporte de informação –
para ser valorado como documento depende de algumas mediações. Tal
dinâmica será pensada em um contexto formal. Ele – o objeto – preci-
sa ser selecionado e adquirido por um ator institucional, por exemplo,
um bibliotecário. Esse ator necessita, mormente, de formação acadêmica
e técnica, podendo passar por experiências laborais. Ao adquirir o status de
Carlos Cândido de Almeida & Mariana Vitti-Rodrigues
62
profissional, com alguma autoridade, o ator institucional maneja manuais
e códigos, criados por ele ou por membros da comunidade profissional a
qual faz parte ou dialoga. Segue, ainda, normas e regras, conforme o orde-
namento jurídico o qual está deontologicamente submetido.
A inclusão de um objeto em uma rede institucional, como uma bi-
blioteca, não depende apenas do trabalho humano, mas também de tec-
nologias e infraestruturas específicas.34 Os critérios de seleção são estabe-
lecidos e registrados na política de desenvolvimento de coleções, alinhada
com a missão e os objetivos da instituição. Essa política determina como
os objetos podem entrar, permanecer ou ser removidos do acervo. Ela tam-
bém aborda a necessidade de cumprir critérios de autoridade relacionados
à qualidade do conteúdo, do suporte, da autoria, da edição, dentre outros
elementos. Esses aspectos, relacionados à formalização institucional do ob-
jeto, afetam a força e a permanência da materialidade da informação como
fonte para representar a realidade.
A incorporação de objetos em redes ou estruturas institucionais
informais ou semiformais não diminui sua relevância como fontes de
informação para compreender e representar a realidade, mesmo que não
sigam os ritos, procedimentos e pressupostos formais estabelecidos pelas
instituições. As chamadas fontes alternativas de informação desempe-
nham um papel crucial na reflexão sobre fenômenos cuja cobertura nem
sempre é alcançada por fontes formais. Isso se aplica, por exemplo, à
criação de blogs voltados para atender uma comunidade específica, como
a comunidade trans. 35
34 Em uma analogia metafórica, nesse contexto, “cartografias” se sobrepõem em “centros de cálculo”. Um
centro de cálculo” é um lugar privilegiado ou uma “[...] rede de transformações que liga cada inscrição ao
mundo, e que liga em seguida cada inscrição a todas as que se tornaram comensuráveis a ela pela gravura,
o desenho, o relato, o cálculo ou, mais recente, pela digitalização” (Latour; Hermandt, 2004, p. 53).
35 As pessoas transexuais fazem parte do espectro que compõe o movimento de lésbicas, gays, bissexuais,
transexuais, transgêneros, queer, intersexuais, assexuais, e mais (LGBTQIA+). A web pode desempenhar
um papel importante na construção da identidade das pessoas trans, fornecendo acesso à informação e um
espaço para enfrentar a violência e o preconceito. Isso permite com que a ação nesses meios influencie a
dinâmica social, expandindo performances e percepções sociais, embora os resultados sejam moldados pelos
contextos locais e pelos meios de comunicação utilizados. Esses meios alternativos podem permitir com que
pessoas trans compartilhem suas vivências e construam redes de apoio, independentemente da localização
física (Rojas, 2015).
Estudos pluridisciplinares da informação: ciência da informação, ética e linguagem - nº 3
63
Como meios alternativos de validação de informação, os blogs so-
bre a temática trans encontram no critério de “local ou lugar de fala” um
meio relevante para a permanência e a força da materialidade das infor-
mações veiculadas junto à comunidade. Ela, a comunidade, reconhece as
experiências pessoais dos autores dos blogs, justamente por compartilha-
rem vivências semelhantes. Esses blogs – mesmo que, por vezes, não sejam
reconhecidos academicamente como fonte de informação ou não sejam
considerados por sistemas de informação formalizados – desempenham
um papel relevante para a comunidade por meio da qual passa a integrar
a rede.36
Os critérios de autoridade e “lugar de fala” se complementam na vali-
dação de informações em mídias alternativas. Essa abordagem beneficia es-
pecialmente grupos sociologicamente marginalizados, como é o caso daque-
les que fazem parte do movimento LGBTQI+, incluindo as pessoas trans. As
experiências observadas em blogs produzidos por pessoas trans, direcionados
para a comunidade trans, trazem questões sobre os modos de representação
autorizados pelas instituições formais, como é o caso, por exemplo, das bi-
bliotecas públicas. Tais instituições muitas vezes não se atentam para atender
membros da comunidade em situações de vulnerabilidade social. A existên-
cia do “não-público” de instituições formais é um tema emergente que a área
de informação necessita debater (Rabello, 2023).
3 considEraçõEs finais
No estudo da representação da realidade, é fundamental analisar os
regimes” (de verdade, de materialidade, de informação), uma vez que eles
não apenas tendem a mesclar composições mais rígidas (formais) e flexí-
veis, temporárias e situacionais (semiformais e informais), mas permitem
a rastreabilidade das redes e dos documentos. Essas composições surgem
36 Incorporar o “lugar de fala” na avaliação de conteúdo pode ser útil para bibliotecários e para usuários
de informação ao selecionarem materiais pertinentes às suas situações de necessidade (Sá, 2019). Mesmo
que esses blogs não sejam formalmente reconhecidos, por exemplo, pela área de informação como fontes
confiáveis, eles desempenham um papel crucial na disseminação de informações e na representação de
grupos específicos. Integrar o “lugar de fala” na avaliação de conteúdo para fins de seleção, aquisição e
tratamento de fontes é uma alternativa útil para bibliotecários e usuários ao escolherem materiais que
atendam às suas situações e necessidades de informação (Sá, 2019).
Carlos Cândido de Almeida & Mariana Vitti-Rodrigues
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da interação entre os atores e das forças envolvidas. Assim, os regimes mol-
dam e são moldados pelos interesses e possibilidades que influenciam e
são influenciados pelos atores. Em situações de agenciamento, os enuncia-
dos – com materialidade – circulam na sociedade e podem se manifestar,
por exemplo, como informação não registrada, por meio da oralidade, ou
como informação registrada, mediante os documentos.
A ideia de que a realidade “está aí” – uma noção fundamental nas
origens de disciplinas como a história e a documentação, que considera-
vam a informação registrada um canal privilegiado – parece ganhar força
com a prevalência de discursos respaldados por estudos métricos ou pela
suposta neutralidade tecnológica, como é o caso da inteligência artificial.
Esse pensamento tende a limitar o espaço para outras formas de mediação.
A crença na neutralidade da técnica, da tecnologia e dos números frequen-
temente resulta em políticas que, paradoxalmente, não reconhecem seu
próprio caráter político. No contexto atual, os interesses do capitalismo se
beneficiam dessas crenças, visando minimizar responsabilidades e ocultar
as assimetrias na produção, circulação e consumo do conhecimento.37
A “transformação” de um objeto em documento depende de uma
composição que integra a informação e sua institucionalidade. Além disso,
conceber o documento como um ente que pode falar e que está sempre
em relação com outros atores permite uma compreensão mais complexa e
situada de sua materialidade. O documento é o ponto em que a materiali-
dade da informação se torna evidente, conferindo à informação permanên-
cia e força, características que possibilitam a rastreabilidade da memória e
da “biografia” dos enunciados. Assim, uma das principais qualidades do
documento é sua capacidade de rastrear a materialidade da informação,
permitindo ao pesquisador seguir as redes e atores envolvidos.
É premente adotar perspectivas que não apenas questionem ou de-
monstrem os limites e o anacronismo do sonho positivista – que busca o
acesso direto à realidade e sua representação inequívoca –, mas que tam-
37 Interessante observar a assimetria entre o chamado “norte global”, central e pujante, e a periferia ou “sul
global”, atrasado ou em desenvolvimento. Há, com isso, um complexo jogo em que ciência e tecnologia
são, de modo geral, desenvolvidas pelo centro – tendendo a se beneficiar, obviamente, em primeiro lugar
–, privando ou minimizando possíveis benefícios para os quase sempre ou apenas consumidores do sul
(Santos; Meneses, 2010).
Estudos pluridisciplinares da informação: ciência da informação, ética e linguagem - nº 3
65
bém apresentem alternativas para as mediações sobre essa realidade. A hu-
mildade diante da complexidade do mundo é fundamental. A noção de
perspectivas e camadas de materialidade da informação e de composições
em redes (em distintos modos de institucionalidade) revela que, apesar do
desejo de simplificação do mundo da vida, a realidade “não está tão pró-
xima”, demandando mediações prudentes e uma presença ativa junto aos
atores implicados (Rabello, 2022a).
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71
2
SISTEMAS, INFORMAÇÃO E
COMPLEXIDADE: ALGUMAS
QUESTÕES EM TORNO DOS
OBJETOS E DO PENSAMENTO NA
BIBLIOTECONOMIA E CIÊNCIA DA
INFORMAÇÃO
SYSTEMS, INFORMATION, AND
COMPLEXITY: SOME QUESTIONS
ABOUT OBJECTS AND THINKING
IN LIBRARY AND INFORMATION
SCIENCE
Marivalde Moacir FRANCELIN
USP
marivalde@usp.br
https://orcid.org/0000-0002-9576-7743
https://doi.org/10.36311/2025.978-65-5954-635-0.p71-90
Carlos Cândido de Almeida & Mariana Vitti-Rodrigues
72
Resumo: Analisa as possibilidades de convergência entre sistemas, informação e
complexidade. Identifica, como situação problemática, a corrente simplificação da
informação à tecnociência e ao indivíduo. Questiona a possibilidade de repensar a
informação como essência e complexidade. Para responder à questão apresentada,
parte-se da hipótese de que a relação entre essência e complexidade está na informação.
Coloca em evidência a importância do pensamento complexo para a informação, porém
questiona o domínio dos objetos-informação como excedentes de complexidade. Pesquisa
exploratória e descritiva, que toma como base o método crítico-hermenêutico e a análise
dialética e interpretativa das questões enunciadas. Como principal resultado relaciona
livro e pensamento e objetos e informação para corrigir lacunas e avançar nos conceitos
de sistemas e complexidade. A principal contribuição da pesquisa é o desenvolvimento de
um novo caminho de estudos sobre a informação, chamado de sistemas em (in)formação
e o retorno à relação livro-pensamento. Conclui que a informação pode subsistir como
essência e paradoxo somente se a reforma do pensamento avançar para a reforma dos
objetos.
Palavras-chave: Sistemas; Informação; Complexidade; Objetos; Pensamento.
Abstract: is chapter analyzes the possibilities of convergence between systems,
information, and complexity. It identifies, as a problematic situation, the prevailing
simplification of information to technoscience and to the individual. It questions the
possibility of rethinking information in terms of its essence and complexity. In order to
answer the question, the hypothesis is that the relationship between essence and complexity
lies in information. is highlights the importance of complex thinking for information,
but inquires about the domain of information objects as an excess of complexity. is is
an exploratory and descriptive research, based on the critical-hermeneutic method and
the dialectical and interpretative analysis of the questions. As a result, it relates books,
thoughts, objects, and information to correct gaps and advance the concepts of systems
and complexity. e main contribution of this research is the development of a new form
of studying information called systems in (in)formation and a return to the book-thought
relationship. It is concluded that information can exist as an essence and a paradox only
if the reform of thought moves toward a reform of objects.
Keywords: Systems; Information; Complexity; Objects; inking.
Estudos pluridisciplinares da informação: ciência da informação, ética e linguagem - nº 3
73
1 introdução
Ele [Edgar Allan Poe] afirmava que quem não sabe tocar o intangível
não é poeta; que só é poeta quem é mestre da memória, soberano
das palavras, estando o registro de seus próprios sentimentos
sempre prontos a se deixar folhear. Tudo pelo desenlace! ele repete
incansavelmente. Até o soneto tem necessidade de um plano, e a
construção, a armação, por assim dizer, é a garantia mais importante
da vida misteriosa das obras do espírito (Baudelaire, 2012, p. 19).
Al principio no fue la palabra, sino la desazón que busca palabras. En
el mito recayó la tarea de mostrar caminos de salida de la oscuridad
primera. De aquello de lo que no se podía guardar silencio hubo
que contar cosas. Contar o narrar significa hacer como si se hubiera
estado presente en el comienzo. A los narradores les gusta simular
que con sólidos recipientes atados a largas cuerdas son capaces de
extraer de los pozos del pasado. A menudo la afirmación de poseer
una fuerza narrativa superior fue acompañada por la sugestión
de que se ha recibido de círculos del más allá, normalmente bien
informados, informaciones privilegiadas sobre las circunstancias
más próximas al final (Sloterdijk, 2015, local. 33).
En cambio, nuestra interpretación negándose a reconocer en la
inteligencia el fin de la vida hace de ella un ineludible instrumento
de ésta, con lo cual la arraiga en la gleba vital inexorablemente, le
proporciona imperecedera autoctonía. El intelectualista tradicional
sostenía que el hombre debe pensar, pero reconocía que de hecho
puede el hombre vivir sin ejercitar su inteligencia, que entendía
en un sentido muy estrecho y parcial. La idea nuestra niega que
la inteligencia, la intelectualidad sea un deber del hombre. Se
contenta con mostrar que el hombre para vivir tiene que pensar,
gústele o no. Si piense mal, este es, sin íntima veracidad, vive mal,
en pura angustia, problema y desazón. Si piensa bien encaja en sí
mismo – y eso, encajar en sí mismo, es la definición de la felicidad
(Ortega y Gasset, 1965, p. 124-125).
As citações de Baudelaire (2012), Sloterdijk (2015) e Ortega y Gasset
(1965), colocadas como epígrafes de abertura deste texto, têm em comum
a tentativa de ver além e mostrar - ou dizer - o que foi visto. O objetivo
aqui é mais modesto e vai ao encontro de algumas questões que poderiam
ser colocadas em torno dos objetos e do pensamento em Biblioteconomia
e Ciência da Informação. Tais questões são tomadas de aspectos específicos
Carlos Cândido de Almeida & Mariana Vitti-Rodrigues
74
que envolvem a complexidade e problematizadas na possibilidade de esgo-
tamento do modelo complexo de informação. A premeditação da socieda-
de atual não foi considerada por teóricos da complexidade, como Edgar
Morin por exemplo, fazendo com que os excedentes de complexidade se
distanciassem dos eixos centrais de problematização, perdendo contato
com seu principal objeto, a informação. Ao se propor uma descontinui-
dade, ela deve ser fundamentada por uma epistemologia crítica e rigorosa,
que observe critérios de análise sobre a essência dos objetos e sobre os con-
textos do pensamento.
Dessa forma, o recorte temático inicial ocorre no universo teórico-
conceitual dos sistemas, da informação e da complexidade. Como
documentos de base foram usadas as obras “A questão da técnica”, de
Heidegger (2007), e “Método 1: a natureza da natureza”, de Morin (2002).
Essas obras representam momentos que ampliaram e aprofundaram a
compreensão da informação. Nesse percurso tenta-se relacionar alguns
desses momentos e verificar em que medida é possível – e permitido - que
se ocupe novas posições de observação da informação.
Partindo de um ponto de vista dialético, que reconheça nos con-
trários uma forma de compreensão da complexidade (Rendón Rojas,
2015, 2017), e de limites definidos e contextuais de interpretação (Eco,
2013), procura-se articular alguns momentos do pensamento de Martin
Heidegger (1889-1976) e Edgar Morin (1921-) sobre os sistemas, a infor-
mação e a complexidade e, mais especificamente, sobre os sistemas de in-
formação da informação e os sistemas de conhecimento do conhecimento.
Portanto, o caminho percorrido na literatura foi norteado pela busca de
relações entre perspectivas distintas, colocando em evidência suas possíveis
relações, avanços e limites.
Nesse sentido, a primeira parte da pesquisa pode ser caracterizada
como exploratória e descritiva, com base em procedimento analítico-refle-
xivo na investigação sobre a informação. Esse procedimento visa a recupe-
ração das características tanto da literatura quanto da realidade vinculada
aos fatos. Numa época na qual impera um conceito como o de pós-ver-
dade, é fundamental que qualquer procedimento faça uso de um método
Estudos pluridisciplinares da informação: ciência da informação, ética e linguagem - nº 3
75
hermenêutico crítico baseado em uma análise dialética e interpretativa que
procure evidenciar contrários sem eliminá-los.
A eliminação dos contrários deve ser vista com prudência diante do
fato de que apenas uma das posições em conflito irá sobressair, enquanto
a outra deixará de existir; ou, todas as posições conflituosas serão elimina-
das, surgindo uma única posição dominante. Por este motivo, o método
empregado visa um percurso de análise que considere a problemática de
que na estrutura que não se apresenta, e no conjunto de relações que unem
partes e todo, evocam, explícita ou implicitamente, um sistema (em) infor-
mação análogo à condição de estar no mundo e de relacionar-se com suas
partes (Heidegger, 2007; Morin, 2002).
O que está exposto em ambos é uma crítica à ciência, à “tecnologia
e à razão enquanto instâncias que limitam o próprio pensamento (Araújo,
2016; Crespo, 2017; Dicks, 2020). Porém, para não se colocar o problema
sem evidenciar uma hipótese, supõe-se que, em Heidegger (2007) e em
Morin (2002), os interesses científicos estão ocultos por um debate mais
amplo sobre a técnica e a complexidade num contexto de informação que
se coloca entre sistemas e linguagem.
Dessa forma, na segunda parte do texto busca-se contextualizar o
diálogo proposto em uma discussão em torno do que pode ser chama-
do de pensamento-livro e objeto-informação. Ao retomar o livro como
paradigma do pensamento, tenta-se contribuir para o não ocultamento
dos objetos-informação, pois, estes são parte do “sistema informativo do-
cumental”, objeto de estudo, segundo Rendón Rojas (2015, p. 60), da
Biblioteconomia, mas, que, epistemologicamente, não se dissociam da
Ciência da Informação.
2 sistEmas
Rüdiger Safranski, no capítulo “Demonização da técnica e a técnica
da demonização”, da biografia dedicada a Martin Heidegger, observa que
“[...] a conferência sobre A Questão da Técnica, de Heidegger, de 1953,
Carlos Cândido de Almeida & Mariana Vitti-Rodrigues
76
não é um avanço filosófico isolado nesse terreno. Ele toma a palavra num
debate que já está acontecendo” (Safranski, 2000, p. 463).
Mas, o que estava em destaque naquele debate e o que se pode enten-
der como vigente ainda hoje? Acredita-se que essas duas esferas do pensar
unem-se em torno da questão sobre o próprio sistema, mas não qualquer
sistema genérico de informação como provocação e permanência e sim um
sistema (em) informação.
Primeiro, tem-se que colocar em dúvida a validade da hipótese que
supõe categorias isoladas de pessoas que usam artefatos técnicos. Hoje, as
pessoas constroem suas relações com a técnica de forma natural e cons-
ciente por conta de um longo percurso de aquisição, reprodução e dis-
seminação de experiência, saber, conhecimento e cultura. Existe, além
da natureza técnica, uma naturalidade própria do ambiente da vivência.
Conscientemente, as pessoas não apenas se compreendem, mas se sentem
como seres técnicos.
Essa essência que está, faz sentir e não se vê revela a descoberta de
um novo habitat para o ser. Revela o existente ainda não desvelado pelos
sentidos. “Tudo” o que é novo não é o mesmo tudo que é criado. O novo já
está, apenas ainda não se apresenta. Dessa maneira, não é de todo estranho
dizer que a criação é o encontrar de algo que já foi criado, mas que ainda
não tinha sido desvelado.
Comum ao ser e a todos os outros “entes” no mundo há, então, uma
natureza que possui sua própria natureza, uma natureza da natureza como
diz Morin (2002), um sistema que já tem uma forma, e tudo o que tem
uma forma está “em” forma, está (in)formado. O dispositivo, diz Safranski
(2000, p. 465, grifo do autor), “[...] tornou-se o nosso destino. O perigoso
nisso é que essa vida dentro do dispositivo ameaça tornar-se unidimensio-
nal e sem alternativas, e que a memória de uma espécie de encontro com o
mundo e estadia no mundo se apague.
Um sistema que já possui uma forma não seria, necessariamente, um
sistema de informação, mas um sistema em informação. Um sistema está
em, mas não é de algo. O sistema é o que se vê e a informação é a arma-
ção, estrutura, destino, portanto, este sistema, no qual hoje se vive, está na
Estudos pluridisciplinares da informação: ciência da informação, ética e linguagem - nº 3
77
informação. Para Heidegger (2007), os sistemas de informação colocam à
disposição as provocações na natureza. Para o autor, a física não pôde re-
nunciar ao que se apresenta como calculado na natureza porque se tratava
de um modo de imperar da armação.
Pode-se falar de sistemas de informação, ambientes informacionais,
enquanto “entes” no mundo, mas não como estrutura para o “ser”, ou seja,
a (con)formação da existência na armação se apresenta como um todo (in)
formado que se revela como destino.
O destino está condicionado ao “ser” da técnica na armação. Ou
seja, já existe uma conformação técnica ao futuro da existência. Além dis-
so, se aceitar-se a hipótese de (con)formações dos sistemas ao que está (in)
formado, esses sistemas seriam melhor entendidos como sistemas em in-
formação, mas não como sistemas de informação.
Na (con)formação está o habitat (morada) e no sistema está a vi-
vência (os que vivem ou moram). A natureza da vivência é o seu habitat,
portanto, há uma natureza da natureza. Nesse sentido, nem toda nature-
za está, segundo Heidegger (2007), disponível à manipulação, somente
aquela que está como sistema, no espaço da vivência. E a natureza que está
em (con)formação (habitat/morada) com a (in)formação apenas pode ser
transformada pela armação, pelo destino. Mas, sendo a armação a estrutu-
ra do que já está, e que pertence ao destino, não existe a possibilidade de
interferência do modo de vivência.
Neste caso, é justificável dizer que o ser humano vive em perigo
(Heidegger, 2007, p. 389) porque tem acesso parcial aos caminhos do
desabrigar. Além de acessar parcialmente esses caminhos, o ser humano
também não se (con)forma espontaneamente à (in)formação (armação/
estrutura), como ocorre com a natureza.
3 complExidadE
Não se pode afirmar que a informação é complexa porque talvez
ela não seja uma coisa, como se observa na própria tradição da Ciência da
informação. Faltando-lhe esta opção, o caminho que lhe resta é o de consi-
Carlos Cândido de Almeida & Mariana Vitti-Rodrigues
78
derar uma hipótese cogitada por diversas frentes e momentos na literatura
e assumir-se como o espaço das coisas e dos objetos.
Se, como diz Morin, a informação não pode ser definida em con-
ceito ou fechada em algum programa ou processo, ela também não pode
ser descoberta, pois, ao mesmo tempo que se “revela”, é “mistério” (Morin,
2002, p. 422).
Após realçar as características “camaleonescas” do conceito de in-
formação, o autor diz que diante de suas lacunas e incertezas é necessário
interrogá-lo. Segundo Morin (2002, p. 436), para compreendê-lo “[...] é
preciso exorcizar as sombras platônicas, aristotélicas, cartesianas que ron-
dam ainda o inconsciente do conceito informação”. Mas, o que chama a
atenção nessas passagens finais do livro de Morin (2002) é que, além de
enfatizar diversas vezes a superação dos conceitos, teorias e modelos de
informação vigentes, ele afirma que o conceito múltiplo de informação
também deve ser extinto.
Se existe uma natureza da natureza não se pode considerar a solução
de um sistema de informação como uma estrutura, mas como a estrutura
da estrutura. Assim, se pensa em um sistema do sistema para que seja pos-
sível uma informação da informação. Esse não é um movimento circular,
mas em espiral e auto-organizado, na perspectiva de Morin (2002).
Pode-se pensar, por analogia, que a auto-organização pode estar em
sua maneira de acontecer e a provocação num processo sistêmico infor-
macional. Porém, parece que Morin (2002) propõe não apenas relacionar,
mas ampliar esse campo de visão articulando o conceito de complexidade
em uma nova “physis”.
Nesse campo de visão, a genealogia e a generatividade da informação
são apresentadas como ordem, desordem, caos, poíesis, onde as relações são
o ponto mais importante, porém, estão ocultas num princípio “maquinal”
do ser e da natureza.
Morin (2002, p. 226) também interroga sobre o ocultamento da
generatividade e da poíesis na conceituação de “máquina artificial”. Do
ocultamento do conceito de máquina surge (desabriga) o desconhecido
Estudos pluridisciplinares da informação: ciência da informação, ética e linguagem - nº 3
79
com um “ser”, mas sem um “si”. Este (si, ente, coisa) terá no campo da
produção e organização do próprio ser o seu ambiente de “nascimento”.
4 a manipulação da linguagEm E a informação
A transformação do real em objeto de experimentação, domínio e
manipulação foi, de acordo com Oliveira (2001, p. 203), uma ação do ser
humano que reduziu a linguagem à informação. Para ser manipulável, a
natureza se revela nos questionamentos do ser humano. Por isso se diz, a
partir de um ponto de vista heideggeriano, que a informação é o “modo
como a natureza se “revela” na técnica. Com base em Capurro (1981),
Oliveira (2001, p. 20) afirma que a “[...] informação é a mediação do sa-
ber necessário à manipulação.” Assim, na contemporaneidade, o computa-
dor (a “máquina”) resume o que se deve entender por linguagem, pois é
uma realidade de controle, onde existe a materialização da linguagem na
informação.
A concepção da linguagem e a essência do ser humano são determi-
nadas pela “máquina”. Fazendo uma síntese do pensamento heideggeriano,
Oliveira (2001, p. 205), diz que “[...] a manifestação epocal da linguagem
como informação pressupõe o paradigma das teorias da consciência e da
representação.Também numa perspectiva heideggeriana, Day (2008) en-
tende que os objetos, as obras (de arte e bibliográficas) e os artefatos são
formas sociais e culturalmente endereçadas no espaço e no tempo que, em
termos informacionais, precisam ser vistas a partir das teorias materialista,
crítica e da atividade em oposição às teorias semântica, mentalistas e de
conteúdo.
Os argumentos e pressupostos levantados por Day (2007, 2008) ques-
tionam diversos conceitos e processos fundamentais da Biblioteconomia e
da Ciência da Informação. Informação, representação, necessidade de in-
formação, conteúdos informacionais, comportamento informacional são
alguns dos temas criticados pelo autor. Day entende que os significados são
dados na experiência sociocultural, localizada no tempo e no espaço. Os
significados, segundo o autor, não seriam conteúdos ideais ou ideacionais.
Neste plano só existiriam “metáforas”, termo que Day (2007, 2008) usa
Carlos Cândido de Almeida & Mariana Vitti-Rodrigues
80
para se referir aos conceitos e processos considerados mentalistas, metafísi-
cos, subjetivos, cognitivos ou idealistas.
Metafóricos e baseados em “crenças populares”, os pressupostos me-
tafísicos da informação e da comunicação são, afirma Day (2007, p. 332),
equivocados e fundamentados em uma “psicologia popular”, de tradição
cognitivista. Para atender ao campo da experiência, social e culturalmente
localizados no tempo e no espaço, Day (2007, 2008) propõe uma teoria do
conhecimento baseada na psicologia discursiva, no sentido de construção
por interação externa ao invés de uma forma fechada e interna.
Por fim, no modo de existência heideggeriano o ser humano está,
segundo Capurro (1982), fora com as coisas e, por isso, não é preciso que
elas entrem; o “ser” está no mundo. Assim, diz o autor, a linguagem não é
uma “etiqueta”. A linguagem aparece na relação (percepção) “significativa
do “ser” com as coisas no mundo, portanto, ela não é somente um instru-
mento para representar e comunicar, mas o lugar de “desvelamento”.
5 Em torno dE objEtos E pEnsamEnto Em bibliotEconomia E ciência da
informação
A habilidade de pensar pode ser, como diz Arendt (2022, p. 34), “[...]
algo que vai além dos limites do conhecimento, [...] algo mais do que um
instrumento para conhecer e agir.” O “lugar nenhum” (Arendt, 2022, p. 257)
do pensamento é um “conceito-limite” que estaria ausente de informação.
Barreto (1999) interpretou este “pensar” fora do tempo “linear dos estoques
de informação”, mas também asseverou, anteriormente, a sua preocupação
com a “racionalidade técnica” como redutora da linguagem e das possibili-
dades de conhecimento (Barreto, 1989). Na linha dos objetivos da Ciência
da Informação, e ainda tomando como base Arendt, Barreto (2002, p. 23)
diz que a área atua em “realidades diferenciadas” e que cada uma delas pode
ser reduzida a um mundo subjetivo (“sistemas cerebrais”, “dos conteúdos de
informação, da sua geração e assimilação”), a um mundo objetivo (“sistemas
materiais”, “mundo objetivo dos aparatos, equipamentos e instrumentos
com que opera a ciência da informação”) e a um mundo cibernético (“mun-
do do ciberespaço, da velocidade igual ao infinito, do tempo e espaço zero”).
Estudos pluridisciplinares da informação: ciência da informação, ética e linguagem - nº 3
81
Algumas dessas interpretações foram analisadas por Suave e Sabbag (2021)
a partir de um quadro comparativo entre o livro “A condição Humana”, de
Hannah Arendt, e o artigo “A condição da informação”, de Aldo Barreto. No
trabalho, as autoras concluíram que “[...] as reflexões propostas têm como
preocupação as relações entre o ser humano e a informação, não tendo como
prioridade preocupar-se com as operações e as ferramentas que dão apoio à
informação [...]” (Suave; Sabbag, 2021, p. 11).
Por outro lado, um “pensamento informacional” seria a localização
de algo particular no espaço e no tempo. A informação, afirmam Lacerda e
Lima-Marques (2017, p. 84), “[...] localiza-se na esfera dos objetos ou do
mundo, sendo inerentemente objetiva, ou seja, sua existência é indepen-
dente do sujeito e dissemina-se em fluxos.” Para McGarry (1999, p. 6), as
informações são “captadas”, mas não utilizadas imediatamente.
Mas, se as informações existem de forma independente, quando cap-
tadas, deixariam de existir? Se deixassem de existir, no que se transforma-
riam? E para onde iriam essas informações inexistentes ou transformadas
que não são utilizadas de imediato? Perguntas desse tipo poderiam ser con-
sideradas secundárias no espaço documental, onde a informação é apenas
um “efeito” (Frohmann, 2004) da materialidade documental. Contudo,
na sociedade de dados, a materialidade documental ganha dimensões que
vão além da sociologia histórica dos artefatos e dos centros documentais.
O processo informacional, segundo Rodrigues e Gonzalez (2018),
continua “autônomo” na sociedade de dados, porém, sendo também sistêmi-
co, “[...] integra, em certa medida, dimensões técnica, epistemológica, onto-
lógica, ecológica e ética, permitindo-nos investigar os desafios trazidos pelas
novas TICs [...]” (Rodrigues; Gonzalez, 2018, grifo nosso, tradução nossa).
A crítica sobre a questão da ética algorítmica ganha destaque nesse contexto
por apresentar os mesmos dilemas que “nunca”, de acordo com Souza (2018,
p. 183), foram suficientes para impedir o uso de uma tecnologia.
O que parecia ser uma abertura para novas relações de informação
e conhecimento tem se apresentado como um processo sistêmico de con-
trole de dados e de dilemas éticos promovidos pela ausência de consciên-
cia (Han, 2017; Harari, 2019; O’Neil, 2020). Nesse percurso, que vai do
Carlos Cândido de Almeida & Mariana Vitti-Rodrigues
82
conhecimento aos dados, questões tecnológicas nas esferas micro e marco
também ficaram em evidência nos dilemas da informação (Neill, 1992;
Castro; Ribeiro, 1997; ornley, 2009; Ochôa; Pinto, 2020). Porém, uma
parte desses estudos se concentrou em descrever o que se apresentava, mas
não em compreender e explicar os pontos de intersecção e de passagem
conceitual e epistemológica.
Um dos exemplos marcantes dessa falta de explicação de continui-
dade/descontinuidade refere-se à pós-modernidade, que passou de um pa-
radigma científico, conceitual e epistemológico (Wersig, 1993; Day, 1996,
2001; Araújo, 2003; Smit; Tálamo, 2007; Sousa et al., 2022) para um
objeto de crítica no contexto da pós-verdade e das fake news (Silva, 2018;
Araújo, 2020a, 2020b). Os objetos de crítica no paradigma do pensamen-
to filosófico e científico da pós-modernidade tornaram-se paradigmáticos
e o “pós-moderno” foi reduzido a um objeto-informação caracterizado, em
alguns momentos, como relativista.
Da mesma forma como Morin (2005) apresentou a questão da cons-
ciência na ciência e a formação dos conceitos na complexidade, Santos
(2022), que já havia discutido o tema e analisado o conhecimento pruden-
te e o senso comum “esclarecido”, tem buscado compreender e explicar a
passagem do pós-moderno ao pós-colonial. Porém, são raros os estudos,
como os de Browker e Star (1999) e de Kosciejew (2015), que entendem
os documentos e a documentação como espaços e aparatos integrados,
sistêmicos e complexos que formam conceitos e são responsáveis pela ma-
nutenção de paradigmas.
Dado, informação e conhecimento estão em contínua relação, po-
rém, mesmo que o conhecimento seja gerado e transmitido como infor-
mação, isto é, como prática e ação, existe a necessidade de trazer à tona
o que Arendt (2007, p. 64) chamou de “espaço público” ou o que deve
“[...] transcender a duração da vida de homens mortais.” A vida na “polis”,
diz Arendt (2007) com base em Aristóteles, não deve ser de “futilidades
individuais, mas de “permanência”. Sobre a perspectiva do “mundo” e da
condição humana”, Moura (2014, p. 68) diz que Arendt “[...] permite
compreender os artificialismos produzidos pelo homem, inclusive os equi-
pamentos coletivos, como possibilidade de nossa existência.” Diante disso,
Estudos pluridisciplinares da informação: ciência da informação, ética e linguagem - nº 3
83
afirma a autora, “[...] as bibliotecas, e mais especificamente as bibliotecas
públicas, compõem o mundo, na medida em que criam oportunidades
para a expressão da pluralidade pela convivência em espaços públicos
(Moura, 2014, p. 68). Já, de um ponto de vista da utilidade e do consu-
mo, Foresti, Varvakis e Vieira (2020) apresentam, também com base em
Arendt, as práticas e ações do “labor” informacional como vitais para a
sobrevivência humana.
6 livros
Cícero (2014, p. 49, livro I) escreve, por volta de 45 a.C., que “Os
autores querem se notabilizar depois da morte”. No final deste mesmo
trecho, Cícero pergunta se “Porventura nossos filósofos não inscrevem seus
nomes nos próprios livros que escrevem sobre o menosprezo da glória?”.
Então, o tempo do conhecimento passou a ter no registro um importante
campo de permanência.
Nas bibliotecas, o conhecimento, que marca o tempo, permanece
nos livros. São os próprios livros, como também relata Cícero (2014, p.
149, livro II), que formam uma “[...] multidão imensa [...] por causa do
grande número daqueles que escreveram. Pois as mesmas coisas são ditas
por muitos e por essa razão acumularam tudo nos livros”. Esta “multidão
de livros” será retomada várias vezes, mas chega com mais força ao campo
com os estudos sobre a Bibliografia (Araújo; Crippa, 2016). Nessa multi-
dão de livros, seus leitores estão sozinhos e, ao mesmo tempo, como diz
Manguel (2021), lutando “contra a solidão”. Os instrumentos desta “luta”,
diz o autor, são as bibliotecas públicas. Os livros ganham novas “identida-
des”, novos “rótulos”, diz Manguel (2021), com base em Benjamin (1987),
e a questão que novamente surge é: há algo mais inovador do que o múl-
tiplo de identidades?
Por isso, não se deve esquecer que há um aspecto social em todo esse
processo que envolve o conhecimento registrado que retrata uma cadeia
de eventos complexos que vão desde a técnica de impressão, ordenação e
leitura (Chartier, 2009, 2017, 2020) até a circulação, comercialização e
institucionalização (Burke, 2003, 2012) do livro e de outros registros do
Carlos Cândido de Almeida & Mariana Vitti-Rodrigues
84
conhecimento. Além disso, todo o processo de socialização do livro passa
por uma forma de “representação” ou de “apresentação” das bibliotecas
(Baratin; Jacob, 2000; Barbier, 2018) e de suas figuras humanas, sensíveis
e imaginárias (Melot, 2019). Como diz Gustave Flaubert (1821-1880) a
respeito do seu personagem, no conto Bibliomania, de 1837, “[...] não
era de modo algum a ciência o que ele amava, mas sua forma e expres-
são; amava um livro porque era um livro; amava seu cheiro, sua forma,
seu título” (Flaubert, 2001, p. 20). Na sequência, esse “amor” pelos livros
ganha contornos ainda mais sentimentais e físicos nas linhas de Flaubert
(2001, p. 20): “Essa paixão absorveu-o completamente, mal comia, não
dormia mais, sonhava porém noites e dias inteiros com sua ideia fixa: os
livros”. Nesta mesma coletânea, encontra-se ainda o seguinte trecho: “[...]
nos dias de hoje fazemos pouco caso da ciência e preferimos um bacamarte
ou uma carabina à melhor obra, ao manuscrito mais precioso” (Gazette des
Tribunaux, 2001, p. 46). Os objetos, assim parece evidente, sejam quais
forem, não têm a mesma capacidade de representação dos livros.
No caso do campo específico da Biblioteconomia e Ciência da
Informação, as bibliotecas são espaço de “culto” ao conhecimento, de ri-
tuais de saber, onde o tempo continuará sendo tempo. Como diz Melot:
Nosso pensamento moldou-se sobre o livro [...] A forma do livro
exprime também uma relação com o tempo. [...] O tempo dos
livros é dos pêndulos: espacial, segmentado, regular e orientado,
com um início e um fim, como exige nossa concepção da História.
[...] Abrir e fechar um livro não se dá sem certa solenidade, que
provoca em nós uma ressonância completamente diferente do ato
de amarrar os sapatos ou de abrir uma gaveta. Esse ritual resiste
(Melot, 2019, p. 59-60).
Mas, a pergunta “As bibliotecas marcam o tempo e os livros moldam
o pensamento?” ainda terá que ser aprofundada e analisada diante dos ex-
cedentes de complexidade do século XXI.
Estudos pluridisciplinares da informação: ciência da informação, ética e linguagem - nº 3
85
7 considEraçõEs finais
A sociedade da informação está em plena transformação para uma
sociedade de compartilhamento de objetos e isso representa uma nova era
para o objeto-informação. Os processos de mudança são significativos na
forma humana de conhecer, de se relacionar e de pensar.
A ideia de mudança nem sempre pode ser vista como algo bom e
nem sempre pode ser vista como algo ruim porque as mudanças podem
ocasionar crises profundas e duradouras que, aos poucos, podem se tornar
parte da própria essência do mundo. Ou seja, a crise, em todas as suas
dimensões, não é um acidente, no sentido aristotélico, mas um “ser” (ou
ente), no sentido heideggeriano, que se “a-presenta”.
Se em Heidegger (2007) a armação não é técnica, nem maquinal e,
também, não acontece no ser humano e nem por ele, em Morin (2002),
técnica, ser humano, máquina estão relacionados na complexidade, em
uma nova “physis”. Nesta esfera, Morin pretende reformar o pensamento
através da religação dos saberes.
O primeiro passo na reforma do pensamento é entender que a infor-
mação não foi criada, mas sempre existiu, como faz crer mais fortemente
Morin, como armação, destino e “physis”. Vê-se, então, que o conheci-
mento e o saber são “outros” objetos recentes no mundo. Movidos pela
produção humana são “entes”, objetos, participantes de um modo de vida,
mas não presentes no vivido. O conhecimento e o saber são a expressão
máxima de provocação, “inquietação” e, porventura, de felicidade, pois
manifestam-se plenamente no pensamento.
Sendo assim, a conclusão deste texto sugere que na corrente reforma
do pensamento também se cogite um retorno ao pensar à margem das
coisas e dos objetos gerais, pois é urgente o reconhecimento de objetos es-
peciais como as bibliotecas e os livros para a apresentação do pensamento.
Carlos Cândido de Almeida & Mariana Vitti-Rodrigues
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3
UMA ARQUEOLOGIA DO SABER
NA CIÊNCIA DA INFORMAÇÃO:
PERCURSO INTELECTUAL DO
PROGRAMA DE PÓSGRADUAÇÃO
EM CIÊNCIA DA INFORMAÇÃO DA
UNESP
AN ARCHEOLOGY OF KNOWLEDGE
IN INFORMATION SCIENCE: THE
INTELLECTUAL JOURNEY OF
THE GRADUATE PROGRAM IN
INFORMATION SCIENCE AT UNESP
Augusto Júnior MACUCULE
UNESP
augusto.j.macucule@unesp.br
https://orcid.org/0000-0001-6014-0070
Marta Lígia Pomim VALENTIM
UNESP
valentim@valentim.pro.br
https://orcid.org/0000-0003-4248-5934
https://doi.org/10.36311/2025.978-65-5954-635-0.p91-130
Carlos Cândido de Almeida & Mariana Vitti-Rodrigues
92
Resumo: Analisou-se o percurso intelectual do Programa de Pós-graduação em Ciência
da Informação da Universidade Estadual Paulista, criado em 1998, tendo em vista a
contribuição intelectual dos docentes do Programa ao longo dos vinte e cinco anos de
existência. O perfil intelectual dos docentes permanentes do Programa pode ser avaliado
com base na distribuição da produção intelectual, a partir dos grupos de trabalho do
Encontro Nacional de Pesquisa em Ciência da Informação, evento da Associação
Nacional de Pesquisa e Pós-graduação em Ciência da Informação, que possibilita avaliar
o estado da arte no campo de pesquisa da Ciência da Informação. O percurso intelectual
de um programa de pós-graduação em Ciência da Informação pode ser medido a partir
da produção intelectual de sua força de trabalho, bem como das avaliações feitas pela
Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior, porque proporcionam
verificar o impacto do Programa no desenvolvimento da área de Ciência da Informação
no Brasil. Para realizar o mapeamento utilizou-se o website do Programa de Pós-
graduação em Ciência da Informação da Universidade Estadual Paulista, documentos
institucionais do Programa, bem como o Currículo Lattes dos docentes permanentes
e o repositório ‘BENANCIB’. No que tange a análise dos dados coletados, aplicou-se
o método Análise de Conteúdo, mais especificamente a técnica Análise Categorial, por
meio do estabelecimento de categorias a posteriori. Nos últimos 25 anos verificou-se um
crescimento quantitativo e qualitativo de artigos, livros, teses e dissertações que espelham
a evolução do campo de pesquisa de Ciência da Informação da Universidade Estadual
Paulista. A produção de conhecimento dos docentes com vínculo de exclusividade no
Programa de Pós-graduação em Ciência da Informação da Universidade Estadual Paulista
revela que as subáreas contempladas nos grupos de trabalho do Encontro Nacional de
Pesquisa em Ciência da Informação comportam os traços identitários e produtos de
pesquisa publicados ao longo do período de 1998 a 2021 pelos pesquisadores e docentes
do Programa, confirmando a contribuição do Programa para a consolidação do campo
científico da Ciência da Informação no Brasil.
Palavras-Chave: Arqueologia do Saber; Ciência da Informação; Estrutura Intelectual;
Programa de Pós-Graduação; Ciência da Informação.
Abstract: is chapter analyzes the intellectual path of the Postgraduate Program in
Information Science at São Paulo State University, which was created in 1998, taking into
account the intellectual contribution of the programs professors over the 25 years of its
existence. e intellectual profile of the programs permanent professors can be assessed
by means of the distribution of intellectual production based on the working groups
of the National Meeting of Research in Information Science, an event of the National
Association of Research and Graduate Studies in Information Science, which makes it
possible to assess the state of the art in the field of Information Science research. e
intellectual trajectory of a postgraduate program in Information Science can be measured
by means of the intellectual production of its workforce, as well as the evaluations carried
out by the Coordination of Superior Level Staff Improvement because they enable the
evaluation of the programs impact on the development of the field of Information Science
Estudos pluridisciplinares da informação: ciência da informação, ética e linguagem - nº 3
93
in Brazil. To carry out the mapping, we used the website of the Postgraduate Program in
Information Science at São Paulo State University, the programs institutional documents,
as well as the Lattes CV platform of the permanent professors and the ‘BENANCIB’
repository. Regarding the analysis of the collected data, the content analysis method was
applied, more specifically, the categorical analysis technique was applied by establishing
categories a posteriori. Over the last 25 years, there has been a quantitative and qualitative
growth in the number of articles, books, theses, and dissertations that reflect the evolution
of the field of Information Science research at São Paulo State University. e production
of knowledge by the professors working exclusively in the Postgraduate Program in
Information Science at São Paulo State University reveals that the sub-areas covered by
the working groups of the National Research Meeting in Information Science include the
identity traits and research products published by the Programs researchers and professors
from 1998 to 2021, confirming the Programs contribution to the consolidation of the
scientific field of Information Science in Brazil.
Keywords: Archeology of Knowledge; Information Science; Intellectual Structure;
Graduate Program; Information Science.
1 introdução
Analisa-se o processo histórico intelectual do Programa de Pós-
graduação em Ciência da Informação (PPGCI) da Universidade Estadual
Paulista “Júlio de Mesquita Filho” (Unesp), a partir da produção intelec-
tual dos docentes permanentes do PPGCI. Entende-se como produção
intelectual os produtos oriundos de pesquisa individual e coletiva dos do-
centes, nomeadamente artigos científicos, capítulos de livros, livros e con-
tribuições por meio da orientação de teses de doutorado e dissertações de
mestrado. Contudo, para a efetivação desta pesquisa contemplou-se ape-
nas os artigos científicos publicados em periódicos revisados por pares, que
compreendem o período de 1998 a 2021.
Para tornar inteligível o discurso proposto nesta pesquisa, recor-
reu-se à proposta intelectual de Michel Foucault sobre ‘A Arqueologia
do Saber’ (2010) e à proposta intelectual de Gaston Bachelard em tor-
no da ‘Epistemologia’ (2006). Ademais, discutir o processo de produção
de conhecimento dos docentes permanentes do PPGCI/Unesp ao longo
dos seus 25 anos, com suporte nestes dois trabalhos supracitados torna
o presente trabalho inteligível. Acredita-se que é possível compreender o
conhecimento produzido como construtores de uma elipse de ideias frag-
Carlos Cândido de Almeida & Mariana Vitti-Rodrigues
94
mentadas e orientadas para a evolução no âmbito de pesquisa da Ciência
da Informação.
Análises históricas são normalmente realizadas sobre longos perío-
dos, o que não é o caso do PPGCI/Unesp. Apesar de 25 anos de existência
não serem suficientes para avaliar o impacto do PPGCI/Unesp no panora-
ma acadêmico-científico do campo da Ciência da Informação, por outro
lado possibilita conjecturar alguns avanços e recuos da área de Ciência da
Informação no Brasil e a sua contribuição multidimensional nas diversas
áreas de pesquisa, que se estabelecem no ecossistema nacional do campo
da Ciência da Informação enquanto espaço e comunidade de destino inte-
lectual. O estabelecimento de uma comunidade científica pressupõe a exis-
tência de associações científicas, acadêmicas e profissionais que propiciam
a coordenação de esforços de pesquisa, ensino e extensão, por meio da pro-
moção de espaços de produção e apropriação do conhecimento produzido
nos espaços acadêmicos-científicos, quais sejam: programas de pós-gradu-
ação, linhas de pesquisa, grupos de pesquisa, projetos de pesquisa, eventos
e periódicos desenvolvidos por docentes, pesquisadores e discentes.
O estado da arte do campo científico da Ciência da Informação
no Brasil pode ser visualizado a partir dos grupos de trabalho estabe-
lecidos pela Associação de Pesquisa e Pós-graduação em Ciência da
Informação (ANCIB), cujas pesquisas são apresentadas no Encontro
Nacional de Pesquisa em Ciência da Informação (ENANCIB), con-
siderado o maior evento da Ciência da Informação do País, contem-
plando 12 (doze) Grupos de Trabalho (GT), nomeadamente: GT1 -
Estudos Históricos e Epistemológicos da Ciência da Informação; GT2
- Organização e Representação do Conhecimento; GT3 - Mediação,
Circulação e Apropriação da Informação; GT4 - Gestão da Informação
e do Conhecimento; GT5 - Política e Economia da Informação; GT6 -
Informação, Educação e Trabalho; GT7 - Produção e Comunicação da
Informação em Ciência, Tecnologia & Inovação; GT8 - Informação e
Tecnologia; GT9 - Museu, Patrimônio e Informação; GT10 - Informação
e Memória; GT11 - Informação & Saúde; e GT12 - Informação, Estudos
Étnico-Raciais, Gênero e Diversidades (ANCIB, 2024).
Estudos pluridisciplinares da informação: ciência da informação, ética e linguagem - nº 3
95
O ENANCIB “[...] consiste em um foro privilegiado para a reflexão
e o compartilhamento das pesquisas científicas em Ciência da Informação
e áreas de interface, congregando pesquisadores, docentes e discentes de
pós-graduação” (ANCIB, 2023), assim enquanto lugar de pertencimento
e ecossistema intelectual da área de Ciência da Informação no Brasil, cons-
titui-se como universo para a realização de uma revisão arqueológica do
conhecimento produzido pelos docentes permanentes do PPGCI/Unesp
ao longo dos anos de 1998 e 2021.
Estabelecer critérios sobre o percurso intelectual de um programa de
pós-graduação em Ciência da Informação, a partir da produção intelectual
dos docentes permanentes a luz dos GT do ENANCIB, possibilita com-
preender o ecossistema de pesquisa não só do PPGCI/Unesp, mas também
do conjunto da pós-graduação da área no Brasil.
Os GT do ENANCIB foram estabelecidos pela ANCIB, a par-
tir da primeira edição do evento em 1994, realizado na Cidade de Belo
Horizonte, Estado de Minas Gerais que, por sua vez, conta com 22 (vin-
te e duas) edições. Nesse contexto, o percurso intelectual do PPGCI/
Unesp se confunde com os eventos realizados pela ANCIB no âmbito do
ENANCIB, por isso considera-se este parâmetro como fundamental para
o vínculo dos produtos do devir dos docentes e pesquisadores do PPGCI/
Unesp com os GT do ENANCIB.
Vale destacar que o percurso intelectual do campo de pesquisa em
Ciência da Informação, a partir da produção intelectual dos docentes per-
manentes do PPGCI/Unesp conjugado com as disciplinas por estes minis-
tradas constitui um avanço para a consolidação de uma identidade epistê-
mica do campo no País. Associar o ensino à pesquisa ou vice-versa garante
a consolidação do escopo do campo de pesquisa e das suas subáreas, uma
vez que as disciplinas nascem ou são criadas para colmatar uma lacuna no
âmbito da pesquisa de temáticas complexas no campo de pesquisa.
Nessa perspectiva, faz-se necessário, não apenas mapear as pesquisas
disseminadas em periódicos com revisão por pares e estabelecer o seu espa-
ço nos GT do ENANCIB, mas também analisar as disciplinas lecionadas
Carlos Cândido de Almeida & Mariana Vitti-Rodrigues
96
pelos docentes permanentes do PPGCI/Unesp como uma maneira de ali-
mentar o processo identitário estabelecido a partir dos GT.
2 matEriais E métodos
Para realizar o mapeamento utilizou-se o website do PPGCI/Unesp,
documentos institucionais da Unesp e do Programa, o Currículo Lattes
dos docentes permanentes do PPGCI e o repositório do ENANCIB, de-
nominado de BENANCIB1. No que tange a análise dos dados coletados,
aplicou-se o método Análise de Conteúdo (Bardin, 1997), mais especi-
ficamente a técnica Análise Categorial, por meio do estabelecimento de
categorias a posteriori.
3 dados dE pEsQuisa
Inicialmente apresentar-se-á as disciplinas ministradas pelos atuais
docentes permanentes do PPGCI/Unesp, visando demonstrar a relação
dos docentes com o ensino de pós-graduação, para posterior triangulação
e análise.
As disciplinas ministradas pelos docentes permanentes do PPGCI/
Unesp constituem um espaço de formação de novos docentes e pesquisa-
dores para o campo da Ciência da Informação. Nessa perspectiva, destaca-
-se que as disciplinas contribuem significativamente para o estabelecimen-
to do perfil dos futuros docentes e pesquisadores, bem como determinam
os interesses de pesquisa.
Formar profissionais e cientistas da informação a partir dos proces-
sos didático-pedagógicos e da interação com os docentes pertencentes às
diversas linhas de pesquisa do PPGCI, bem como de outros programas
da área ou de áreas afins nacionais ou internacionais, propicia preservar a
identidade da área e, também, rupturas ligeiras, uma vez que para se criar
rupturas profundas requer maturidade e estoque de conhecimento.
http://enancib.ibict.br/index.php/enancib/index/index. Acesso em: 8 ago. 2023.
Estudos pluridisciplinares da informação: ciência da informação, ética e linguagem - nº 3
97
As limitações para dar respostas aos problemas apresentados no âm-
bito das disciplinas e da estrutura curricular podem propiciar o surgimento
de novas disciplinas, o que também possibilita a continuidade e/ou a des-
continuidade do devir dos docentes permanentes do Programa ao abraça-
rem novas temáticas, demonstrando que o ensino por meio de disciplinas
ocasiona o desgaste intelectual, fator que ajuda na ressignificação de teo-
rias, conceitos e métodos do campo científico da Ciência da Informação.
O Currículo Lattes dos docentes e documentos oficiais do PPGCI/
Unesp (2023) apresenta as disciplinas ministradas no período de 1998
a 2021, a partir do credenciamento do docente, de modo quantificar
as disciplinas ministradas no período, e a partir do título da disciplina
evidenciar os conteúdos programáticos ministrados. Vale ressaltar que
os docentes ora apresentados são os que compõem o corpo docente per-
manente atual do Programa, ou seja, docentes que foram permanentes
em outros momentos, mas atualmente não o são, não fizeram parte do
levantamento e análise dos dados.
A construção dos alicerces didáticos-pedagógicos que respondem às
necessidades provocadas pelas demandas epistêmicas, políticas, econômi-
cas, sociais, culturais, tecnológicas, entre outras, são escrutinadas nas disci-
plinas cientificamente planejadas. Nessa perspectiva, boa parte das discipli-
nas instituídas no PPGCI/Unesp entre 1998 e 2021 respondem não só aos
problemas enfrentados pelo campo de pesquisa em Ciência da Informação,
mas constituem respostas coerentes para os problemas informacionais e da
porosidade do conhecimento que desafia os processos de acesso, seleção,
tratamento, organização, gestão, armazenamento, recuperação, dissemina-
ção, apropriação e uso.
O Programa institucionaliza-se a partir das demandas epistemológi-
cas do campo da Ciência da Informação, entretanto, os desafios epistêmi-
cos vão sendo atrelados aos desafios éticos do fazer ciência no âmbito do
campo científico. Desse modo, o desenvolvimento de disciplinas ancora-
das aos desafios individuais ao longo do período em análise se confundem
com a evolução da sociedade como um todo. São 191 (cento e noventa e
uma) disciplinas constituídas a partir da amálgama de preocupações de
natureza diversa e complexa, mas as respostas se encontram na ampliação
Carlos Cândido de Almeida & Mariana Vitti-Rodrigues
98
das temáticas de pesquisa, projetos de pesquisa e organizações de âmbito
nacional e internacional preocupadas com o processo de ensino, pesquisa e
extensão no campo da Ciência da Informação.
O Currículo Lattes dos docentes do PPGCI/Unesp (2023) apresen-
ta os projetos de pesquisa desenvolvidos pelos atuais docentes permanentes
do PPGCI/Unesp no período de 1998 a 2021, no intuito de demonstrar
a inter-relação entre pesquisa e ensino. Existe uma aderência lógica em
relação às disciplinas ministradas pelos docentes e os projetos de pesquisa.
Os projetos de pesquisa, assim como as disciplinas, estão voltados à
investigação científica dos docentes enquanto coordenadores de projetos
de pesquisa, e os discentes enquanto participantes ativos do processo de
construção de conhecimento em sala de aula e nos grupos de pesquisa,
em que seus orientadores estabelecem compromissos com instituições de
fomento que financiam seus projetos de pesquisa, bem como ajudam a
valorizar o docente e o Programa no âmbito das avaliações às quais são
submetidos.
Quadro 1: Sistematização quantitativa referente ao período de
1998-2021
Docentes Permanentes Linhas de
Pesquisa Qtde.
Disciplinas
Qtde.
Artigos
Publicados
Qtde.
Projetos de
Pesquisa
Carlos Cândido de Almeida (CCA) POI 6 37 5
Cecílio Merlotti Rodas (CMR) IT 2 18 6
Cláudio Marcondes de Castro Filho
(CMCF) GMUI 2 57 6
Daniel Martínez Ávila (DMA) POI 9 100 6
Deise Maria Antonio Sabbag (DMAS) POI 1 37 3
Edberto Ferneda (EF) IT 5 23 6
Ely Francina Tannuri de Oliveira
(EFTO) POI 3 38 8
Helen de Castro Silva Casarin (HCSC) POI 7 38 15
Ieda Pelógia Martins Damian (IPMD) GMUI 1 91 4
José Augusto Chaves Guimarães (JACG) POI 24 94 16
José Eduardo Santarém Segundo (JESS) IT 3 79 6
Leonardo Castro Botega (LCB) IT 2 24 3
Luana Maia Woida (LMW) GMUI 4 33 2
Estudos pluridisciplinares da informação: ciência da informação, ética e linguagem - nº 3
99
Docentes Permanentes Linhas de
Pesquisa Qtde.
Disciplinas
Qtde.
Artigos
Publicados
Qtde.
Projetos de
Pesquisa
Marcia Cristina de Carvalho Pazin
(MCCP) GMUI 2 36 6
Maria Cláudia Cabrini Grácio (MCCG) POI 6 66 7
Maria José Vicentini Jorente (MJVJ) IT 8 46 5
Maria Leandra Bizello (MLB) POI 5 13 5
Mariângela Spotti Lopes Fujita (MSLF) POI 20 146 12
Marta Ligia Pomim Valentim (MLPV) GMUI 13 148 16
Oswaldo Francisco de Almeida Júnior
(OFAJ) GMUI 7 57 4
Rachel Cristina Vesu Alves (RCVA) IT 3 9 3
Ricardo César Gonçalves Sant’Ana
(RCGS) IT 7 61 6
Rosângela Formentini Caldas (RFC) GMUI 4 29 6
Silvana Aparecida Borsetti Gregorio
Vidotti (SABGV) IT 28 115 8
Sonia Maria Troitino-Rodriguez (SMTR) POI 3 19 4
Tamara de Souza Brandão Guaraldo
(TSBG) GMUI 3 8 3
Telma Campanha de Carvalho Madio
(TCCM) POI 9 32 5
Walter Moreira (WM) POI 4 29 7
Total - 191 1.483 183
Fonte: Elaboração própria a partir dos dados de pesquisa (2023).
O Quadro 1 apresenta as linhas de pesquisa na qual os atuais docen-
tes permanentes do PPGCI atuam, o número de disciplinas ministradas,
o número de artigos científicos publicados e o número de projetos de pes-
quisa desenvolvidos no período entre 1998 e 2021. O Quadro 1 apresen-
ta uma síntese dos docentes enquanto integrantes de linhas de pesquisa,
nomeadamente: Informação e Tecnologia (IT); Produção e Organização
da Informação (POI); e Gestão, Mediação e Uso da Informação (GMUI).
As Linhas de Pesquisa estabelecidas no Programa congregam dis-
ciplinas oferecidas ao longo do período analisado e garantem a inter-re-
lação entre os conteúdos ministrados e os escopos e as ementas das li-
nhas e o alinhamento com a área de concentração do Programa, qual seja,
‘Informação, Tecnologia e Conhecimento’.
Carlos Cândido de Almeida & Mariana Vitti-Rodrigues
100
A produção intelectual apresentada se refere aos artigos científicos
publicados em periódicos com revisão por pares e os projetos de pesqui-
sa associados às disciplinas proporcionam as condições intelectuais para
a geração de conhecimento alinhado à área de concentração, às linhas de
pesquisa, às disciplinas e aos projetos de pesquisa desenvolvidos pelo corpo
docente permanente, proporcionando consistência e coesão à proposta do
Programa.
Quadro 2: Produção intelectual dos atuais docentes permanentes do
PPGCI/Unesp publicada no BENANCIB distribuída por GT do
ENANCIB
GT2Produção intelectual dos atuais docentes permanentes do PPGCI/Unesp
GT-1
Informação semiótica: contribuições para a Ciência da Informação. PASCOAL, Valdirene Aparecida; ALMEIDA, Carlos
Cândido de. XXI Encontro Nacional de Pesquisa e Pós-graduação em Ciência da Informação, Rio de Janeiro, 2021.
Informação líquida: contribuições teóricas à Ciência da Informação. VIGNOLI, Richele Grenge; ALMEIDA, Carlos Cândido
de. XXI Encontro Nacional de Pesquisa e Pós-graduação em Ciência da Informação, Rio de Janeiro, 2021.
Documento na cultura da convergência: definição dos textos de uma comunidade fanfiction. SANTOS JÚNIOR, Edmilson Alves
dos; ALMEIDA, Carlos Cândido de. XXI Encontro Nacional de Pesquisa e Pós-graduação em Ciência da Informação, Rio de
Janeiro, 2021.
Aspectos históricos acerca da presença do feminino na Biblioteconomia brasileira. XAVIER, Ana Laura Silva; SABBAG, Deise
Maria Antonio. XXI Encontro Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Ciência da Informação, Rio de Janeiro, 2021.
Hannah Arendt e suas contribuições para a Ciência da Informação. SUAVE, Aline Laureano; SABBAG, Deise Maria Antonio.
XXI Encontro Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Ciência da Informação, Rio de Janeiro, 2021.
Tríade dados, informação e conhecimento: elementos de compreensão epistemológica da Ciência da Informação. SEMIDÃO,
Rafael Aparecido Moron; ALMEIDA, Carlos Cândido de. XIV Encontro Nacional de Pesquisa e Pós-graduação em Ciência da
Informação, Florianópolis, SC, 2013.
A relação conceitual entre conhecimento e documento no contexto da organização do conhecimento: elementos para uma reflexão.
RABELLO, Rodrigo; GUIMARÃES, José Augusto Chaves. VII Encontro Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Ciência da
Informação, Marília, SP, 2006.
Os Grupos de Trabalho (GT) da Associação Nacional de Pesquisa e Pós-graduação em Ciência da Informação
(ANCIB) são compostos por 12 Grupos a saber: GT-1 – Estudos Históricos e Epistemológicos da Ciência
da Informação; GT-2 – Organização e Representação do Conhecimento; GT-3 – Mediação, Circulação
e Apropriação da Informação; GT-4 – Gestão da Informação e do Conhecimento; GT-5 – Política e
Economia da Informação; GT-6 – Informação, Educação e Trabalho; GT-7 – Produção e Comunicação da
Informação em Ciência, Tecnologia & Inovação; GT-8 – Dados, Informação e Tecnologia; GT-9 – Museu,
Patrimônio e Informação; GT-10 – Informação e Memória; GT-11 – Informação & Saúde; GT-12 –
Informação, Estudos Étnico-Raciais, Gênero e Diversidades.
Estudos pluridisciplinares da informação: ciência da informação, ética e linguagem - nº 3
101
GT2Produção intelectual dos atuais docentes permanentes do PPGCI/Unesp
GT-2
Indexação híbrida participativa: a representação de fanfictions. SILVA, Bruna Daniele de Oliveira; SABBAG, Deise Maria
Antonio. XXI Encontro Nacional de Pesquisa e Pós-graduação em Ciência da Informação, Rio de Janeiro, 2021.
Politicamente correto ou erroneamente polido? FIORAVANTI, Denise Cristina Belam; NASCIMENTO, Francisco Arrais;
SABBAG, Deise Maria Antonio. XXI Encontro Nacional de Pesquisa e Pós-graduação em Ciência da Informação, Rio de Janeiro,
2021.
Organização e representação de documentos de arquivo em universidades. BIZELLO, Maria Leandra; RODRIGUEZ, Sonia
Maria Troitiño. XVI Encontro Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Ciência da Informação, João Pessoa (PB), 2015.
Elaboração de tesauro conceitual de política de indexação para bibliotecas universitárias. TARTAROTTI, Roberta Dal’Evedove;
DAL´EVEDOVE, Paula Regina; FUJITA, Mariângela Spotti Lopes. XVI Encontro Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em
Ciência da Informação, João Pessoa (PB), 2015.
Informação musical e interpretação: contribuições semióticas para o campo da organização da informação. BARROS, Camila
Monteiro; CAFÉ, Lígia Maria Arruda; ALMEIDA, Carlos Cândido de. XIV Encontro Nacional de Pesquisa e Pós-graduação em
Ciência da Informação, Florianópolis, SC, 2013.
Estudo do processo de indexação: o caso de bibliotecas dos institutos federais de educação, ciência e tecnologia (IF’s) da Região
Sudeste. SOUSA, Brisa Pozzi de; FUJITA, Mariângela Spotti Lopes. XIV Encontro Nacional de Pesquisa e Pós-graduação em
Ciência da Informação, Florianópolis, SC, 2013.
GERONIMO, Michele Brasileiro; BIZELLO, Maria Leandra. XIV Encontro Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Ciência
da Informação, Florianópolis, SC, 2013.
Periódico Arquivo & Administração: reflexões a partir de uma análise métrica. PUPIM, Eliana Kátia; MADIO, Telma Campanha
de Carvalho. XIV Encontro Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Ciência da Informação, Florianópolis, SC, 2013.
A noção de classificação na Arquivologia, Biblioteconomia e Museologia: abordagens teóricas. ALBUQUERQUE, Ana Cristina;
MADIO, Telma Campanha de Carvalho. XIV Encontro Nacional de Pesquisa e Pós-graduação em Ciência da Informação,
Florianópolis, SC, 2013.
Conhecimento e linguagem na organização do conhecimento: aspectos dialógicos a partir da concepção de Bakhtin. ARBOIT,
Aline Elis; GUIMARÃES, José Augusto Chaves. XIV Encontro Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Ciência da
Informação, Florianópolis, SC, 2013.
Representação de conteúdo em rede social de leitores: análise de folksonomia para compreensão das perspectivas de representação
de conteúdo de obras. ALVES, Roberta Caroline Vesu; MOREIRA, Walter; MORAES, João Batista Ernesto. XIV Encontro
Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Ciência da Informação, Florianópolis, SC, 2013.
Avaliação de linguagem documentária em bibliotecas acessíveis. VITORINI, Érica Fernanda; MOREIRA, Walter. XIV Encontro
Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Ciência da Informação, Florianópolis, SC, 2013.
Sobre o pensamento de Peirce e a organização da informação. ALMEIDA, Carlos Cândido de. XI Encontro Nacional de Pesquisa
e Pós-graduação em Ciência da Informação, Rio de Janeiro, RJ, 2010.
Arquivística pós-moderna, diplomática arquivística e arquivística integrada: novas abordagens de organização para a construção de
uma disciplina contemporânea. TOGNOLI, Natália Bolfarini; GUIMARÃES, José Augusto Chaves. XI Encontro Nacional de
Pesquisa e Pós-Graduação em Ciência da Informação, Rio de Janeiro, RJ, 2010.
Análise peirceana do processo de indexação: em busca de fundamentos para a organização da informação. ALMEIDA, Carlos
Cândido de; GUIMARÃES, José Augusto Chaves. IX Encontro Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Ciência da
Informação, São Paulo, 2008.
A indexação em catálogos on-line na percepção de usuários integrantes de grupos de pesquisa: uma contribuição ao desenvolvimento
de política de indexação em rede de bibliotecas universitárias. FUJITA, Mariângela Spotti Lopes; GONÇALVES, Maria
Carolina. IX Encontro Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Ciência da Informação, São Paulo, 2008.
Peirce e a Ciência da Informação: considerações preliminares sobre as relações entre a obra peirceana e a organização da informação.
ALMEIDA, Carlos Cândido de; GUIMARÃES, José Augusto Chaves. VIII Encontro Nacional de Pesquisa e Pós-graduação em
Ciência da Informação, Salvador, BA, 2007.
A organização de arquivos universitários: reflexo da arquivística integrada na implementação dos sistemas de arquivo. Representação
das necessidades de informação na organização da informação. EUCLIDES, Maria Luzinete; FUJITA, Mariângela Spotti Lopes.
VIII Encontro Nacional de Pesquisa e Pós-graduação em Ciência da Informação, Salvador, BA, 2007.
Bibliotecas digitais geográficas distribuídas: proposta de uma arquitetura para desenvolvimento. SILVA, Marcel Santos Silvana;
VIDOTTI, Silvana Aparecida Borsetti Gregório. VIII Encontro Nacional de Pesquisa e Pós-graduação em Ciência da
Informação, Salvador, BA, 2007.
Aspectos éticos em Organização e Representação do Conhecimento (O.R.C.). GUIMARÃES, José Augusto Chaves; PINHO,
Fabio Assis. VII Encontro Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Ciência da Informação, Marília, SP, 2006.
Interfaces hipertextuais para a representação da informação. GUIMARÃES, José Augusto Chaves; LIMA, Gercina Ângela Borém
de Oliveira; BRUZINGA, Graciane Silva. VII Encontro Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Ciência da Informação,
Marília, SP, 2006.
Carlos Cândido de Almeida & Mariana Vitti-Rodrigues
102
GT2Produção intelectual dos atuais docentes permanentes do PPGCI/Unesp
GT-2
Abordagem cognitiva e sociocognitiva da leitura documentária na formação inicial do indexador: análise da perspectiva individual
em contexto sociocultural. FUJITA, Mariângela Spotti Lopes. VII Encontro Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Ciência
da Informação, Marília, SP, 2006.
Ensino de Tratamento Temático da Informação (T.T.I.) nos cursos de Biblioteconomia do Mercosul: uma análise de capacitação
e produção científica docente com vistas ao delineamento de políticas integradas para área. GUIMARÃES, José Augusto
Chaves; DANUELLO, Jane Coelho; MENEZES, Pedro José. V Encontro Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Ciência da
Informação, Belo Horizonte, MG, 2003.
Política de indexação na visão dos indexadores. RUBI, Milena Polsinelli; FUJITA, Mariângela Spotti Lopes. V Encontro
Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Ciência da Informação, Belo Horizonte, MG, 2003.
Pesquisa terminológica para a elaboração de linguagem documentária. CERVANTES, Brígida Maria Nogueira; FUJITA,
Mariângela Spotti Lopes; NARDI, Maria Isabel Asperti. V Encontro Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Ciência da
Informação, Belo Horizonte, MG, 2003.
Formação e capacitação do indexador em leitura documentária no brasil: bases conceituais e técnicas. FUJITA, Mariângela Spotti
Lopes; SALAMENE, Jamile. IV Encontro Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Ciência da Informação, Brasília, DF, 2000.
Os serviços de análise e sua política de indexação. FUJITA, Mariângela Spotti Lopes; RUBI, Milena Polsinelli. IV Encontro
Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Ciência da Informação, Brasília, DF, 2000.
A leitura documentária na prática de indexação: análise evolutiva de tendências. FUJITA, Mariângela Spotti Lopes; SILVA, Maria
dos Remédios da. IV Encontro Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Ciência da Informação, Brasília, DF, 2000.
GT-3
Mediação da informação: uma análise das políticas de diversidade na prática mediação da informação: uma análise da diversidade
na prática. BENEDITO, Beatriz de Oliveira; RIBEIRO, Marcela Arantes; WOIDA, Luana Maia. XXII Encontro Nacional de
Pesquisa e Pós-Graduação em Ciência da Informação, 22., Porto Alegre, RS, 2022.
Mediação da informação em museus: perspectivas a partir dos textos de exposições. SIQUEIRA, iago Giordano de Souza;
ALMEIDA JÚNIOR, Oswaldo Francisco de. XXII Encontro Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Ciência da Informação,
22., Porto Alegre, RS, 2022.
Fenomenologia da mediação. OLIVEIRA, Heloá Cristina Camargo de; ALMEIDA JÚNIOR, Oswaldo Francisco de. XXII
Encontro Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Ciência da Informação, 22., Porto Alegre, RS, 2022.
Mediação cultural para o protagonismo social. ARRUDA, Maria Aparecida Jacques; CALDAS, Rosângela Formentini. XXI
Encontro Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Ciência da Informação, Rio de Janeiro, 2021.
Mediação da informação e políticas públicas para o enfrentamento à violência contra a mulher: pesquisa participativa em Bauru.
GUARALDO, Tamara de Souza Brandão; SANTOS, Célia Retz Godoy dos; MELO, Daniele Mendes de. XXI Encontro
Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Ciência da Informação, Rio de Janeiro, 2021.
Dissonâncias entre o PNLL e o ODS 4 da Agenda 2030 inviabilizam a promoção sustentável da leitura. CAMILLO, Everton
da Silva; CASTRO FILHO, Cláudio Marcondes de. XXI Encontro Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Ciência da
Informação, Rio de Janeiro, 2021.
Mulheres no espaço público: a mediação da informação no processo de conquistas sociais. BENEDITO, Beatriz de Oliveira;
RIBEIRO, Marcela Arantes; WOIDA, Luana Maia. XXI Encontro Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Ciência da
Informação, Rio de Janeiro, 2021.
Mediação e apropriação da informação: o usuário da política de cotas para o acesso ao ensino superior. RIBEIRO, Marcela Arantes;
ALMEIDA JÚNIOR, Oswaldo Francisco de. XXI Encontro Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Ciência da Informação,
Rio de Janeiro, 2021.
Mediação cultural em bibliotecas: contribuições conceituais. RASTELI, Alessandro; CALDAS, Rosângela Formentini. XVI
Encontro Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Ciência da Informação, João Pessoa (PB), 2015.
Mediação da informação em serviço de referência virtual: aplicação da matriz SWOT. DAMIAN, Ieda Pelógia Martins; SILVA,
Márcia Regina. XVI Encontro Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Ciência da Informação, João Pessoa (PB), 2015.
ALMEIDA, Marco Antonio; DAMIAN, Ieda Pelógia Martins. Humanidades digitais: um campo praxiológico para mediações
e políticas culturais? XVI Encontro Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Ciência da Informação, João Pessoa (PB), 2015.
Oralidade, mediação da informação e da literatura na escola. BORTOLIN, Sueli; CAVALCANTE, Luciane de Fatima Beckman;
SANTOS NETO, João Arlindo dos; ALMEIDA JÚNIOR, Oswaldo Francisco de. XVI Encontro Nacional de Pesquisa e Pós-
Graduação em Ciência da Informação, João Pessoa (PB), 2015.
A mediação da informação na teoria arquivística: aspectos epistemológicos. LOUSADA, Mariana; ALMEIDA JÚNIOR, Oswaldo
Francisco de. XIV Encontro Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Ciência da Informação, Florianópolis, SC, 2013.
Instrumentos de avaliação de competência informacional: um estudo do Information Literacy Test – ILT do Center for Assessment
and Research Studies (CARS) da James Madison University. SANTOS, Camila Araújo dos; CASARIN, Helen de Castro Silva. XI
Encontro Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Ciência da Informação, Rio de Janeiro, RJ, 2010.
Estudos pluridisciplinares da informação: ciência da informação, ética e linguagem - nº 3
103
GT2Produção intelectual dos atuais docentes permanentes do PPGCI/Unesp
GT-3
A competência informacional de graduandos de biblioteconomia da região sudeste: um enfoque nos processos de avaliação e uso
das fontes de informação. MATA, Marta Leandro da; CASARIN, Helen de Castro Silva. XI Encontro Nacional de Pesquisa e
Pós-Graduação em Ciência da Informação, Rio de Janeiro, RJ, 2010.
Panorama temático de trabalhos de conclusão de curso de ciências da informação e da documentação. CASTRO FILHO, Cláudio
Marcondes de; MOSTAFA, Solange Puntel. XI Encontro Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Ciência da Informação, Rio
de Janeiro, RJ, 2010.
CONEGLIAN, André Luis Onório; CASARIN, Helen de Castro Silva. Influência dos fatores psicológicos, demográficos e
interpessoais no comportamento informacional de pós-graduandos surdos. X Encontro Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em
Ciência da Informação, João Pessoal, PB, 2009.
BORTOLIN, Sueli; ALMEIDA JÚNIOR, Oswaldo Francisco de. O bibliotecário e a mediação oral literária. X Encontro
Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Ciência da Informação, João Pessoal, PB, 2009.
Dimensões da dinâmica sociocomunicacional no ciberespaço: construtos teóricos. OLIVEIRA, Walter Clayton de; VIDOTTI,
Silvana Aparecida Borsetti Gregório. IX Encontro Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Ciência da Informação, São Paulo,
2008.
Mediação da informação e múltiplas linguagens. ALMEIDA JÚNIOR, Oswaldo Francisco de. IX Encontro Nacional de
Pesquisa e Pós-Graduação em Ciência da Informação, São Paulo, 2008
Análise do comportamento informacional de pós-graduandos surdos. CONEGLIAN, André Luis Onório; CASARIN, Helen de
Castro Silva. VIII Encontro Nacional de Pesquisa e Pós-graduação em Ciência da Informação, Salvador, BA, 2007.
Tradição gaúcha em ambientes informacionais digitais. LUVIZOTTO, Caroline Kraus; POKER, Jose Geraldo Alberto
Bertoncini; VIDOTTI, Silvana Aparecida Borsetti Gregório. VIII Encontro Nacional de Pesquisa e Pós-graduação em Ciência
da Informação, Salvador, BA, 2007.
Biblioteca inclusiva: perspectivas internacionais para o atendimento a usuários com surdez. CONEGLIAN, André Luis Onório;
CASARIN, Helen de Castro Silva. VII Encontro Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Ciência da Informação, Marília,
SP, 2006.
O ambiente hipermídia no processo de construção do conhecimento. VIDOTTI, Silvana Aparecida Borsetti Gregório; VIEIRA,
Telma Antônia Marques. V Encontro Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Ciência da Informação, Belo Horizonte, MG,
2003.
Tecnologias de organização e implementação de sistemas de informação na web. CAMARGO, Liriane Soares de Araújo;
VIDOTTI, Silvana Aparecida Borsetti Gregório. V Encontro Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Ciência da Informação,
Belo Horizonte, MG, 2003.
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Gestão da informação em contexto organizacional: um estudo de caso de micro e pequenas empresas do setor têxtil e de confecção.
COLOMBO, Gustavo Gonçalves; VALENTIM, Marta Lígia Pomim. XXII Encontro Nacional de Pesquisa e Pós-graduação em
Ciência da Informação, Porto Alegre, RS, 2022.
A inter-relação dos fluxos informacionais e a gestão do conhecimento em ambientes organizacionais. VASSI, Vanderlei Ferreira;
VALENTIM, Marta Lígia Pomim; DAMIAN, Ieda Pelógia Martins. XXII Encontro Nacional de Pesquisa e Pós-graduação em
Ciência da Informação, Porto Alegre, RS, 2022.
Gestão da informação e processos inovativos no contexto organizacional: possibilidades e potencialidades. COLOMBO, Gustavo
Gonçalves; SILVA, Elaine da; WOIDA, Luana Maia; VALENTIM, Marta Lígia Pomim. XXI Encontro Nacional de Pesquisa e
Pós-graduação em Ciência da Informação, Rio de Janeiro, 2021.
Memória organizacional e valor da informação: proposta de modelo conceitual. SANTOS, Juliana Cardoso dos; VALENTIM,
Marta Lígia Pomim. XXI Encontro Nacional de Pesquisa e Pós-graduação em Ciência da Informação, Rio de Janeiro, 2021.
Envolvimento de pesquisadores em projetos e desenvolvimentos de inovação. SILVA, Elaine da; VALENTIM, Marta Lígia
Pomim. XXI Encontro Nacional de Pesquisa e Pós-graduação em Ciência da Informação, Rio de Janeiro, 2021.
Mapeamento arquivístico: uma proposta terminológica para diagnóstico de arquivo. ALMEIDA, Maria Fabiana Izídio de;
VITORIANO, Marcia Cristina Carvalho Pazin. XXI Encontro Nacional de Pesquisa e Pós-graduação em Ciência da Informação,
Rio de Janeiro, 2021.
Aspectos relevantes da aplicação da gestão do conhecimento na administração pública. MARTELO, Marcelo Ricardo;
BUSSADORI, Meiriellen Cristina Faria; RIPOLI, Simone Cristina Ceron; DAMIAN, Ieda Pelógia Martins; VITORIANO,
Marcia Cristina Carvalho Pazin. XXI Encontro Nacional de Pesquisa e Pós-graduação em Ciência da Informação, Rio de Janeiro,
2021.
Processo de avaliação de documentos de arquivo: uma revisão bibliográfica. AKAICHI, Tatianne; BIZELLO, Maria Leandra. XXI
Encontro Nacional de Pesquisa e Pós-graduação em Ciência da Informação, Rio de Janeiro, 2021.
Diagnóstico de preservação digital: estudo de caso da BVS Hanseníase. BOGADO, Andréa Cristina; GRÁCIO, José Carlos
Abbud; MADIO, Telma Campanha de Carvalho. XXI Encontro Nacional de Pesquisa e Pós-graduação em Ciência da
Informação, Rio de Janeiro, 2021.
Carlos Cândido de Almeida & Mariana Vitti-Rodrigues
104
GT2Produção intelectual dos atuais docentes permanentes do PPGCI/Unesp
GT-4
A relação do marketing digital com a gestão do conhecimento nas organizações. LUCCAS, Taciana Maria Lemes de; DAMIAN,
Ieda Pelógia Martins. XXI Encontro Nacional de Pesquisa e Pós-graduação em Ciência da Informação, Rio de Janeiro, 2021.
Estratégias de inovação e gestão do conhecimento. MORAES, Silvana de Souza; LEITE, Luciana Cristina; DAMIAN, Ieda
Pelógia Martins. XXI Encontro Nacional de Pesquisa e Pós-graduação em Ciência da Informação, Rio de Janeiro, 2021.
Inteligência competitiva organizacional: um modelo apoiado nos comportamentos de busca, compartilhamento e uso de
informação e de tecnologias de informações e comunicação. TEIXEIRA, iciane Mary Carvalho; VALENTIM, Marta Lígia
Pomim. XVI Encontro Nacional de Pesquisa e Pós-graduação em Ciência da Informação, João Pessoa (PB), 2015.
Tipos documentais e fluxos de informação como subsídios para o processo decisório em ambientes organizacionais.
NASCIMENTO, Natália Marinho do; VALENTIM, Marta Lígia Pomim. XVI Encontro Nacional de Pesquisa e Pós-graduação
em Ciência da Informação, João Pessoa (PB), 2015.
Gestão do conhecimento científico: proposta de um modelo para a área de ciência da informação da Universidade Estadual
Paulista (Unesp). GARCIA, Cristiane Luiza Salazar; VALENTIM, Marta Lígia Pomim. XIV Encontro Nacional de Pesquisa e
Pós-graduação em Ciência da Informação, Florianópolis, SC, 2013.
Memória organizacional e a constituição de bases de conhecimento. MOLINA, Letícia Gorri; VALENTIM, Marta Lígia Pomim.
XIV Encontro Nacional de Pesquisa e Pós-graduação em Ciência da Informação, Florianópolis, SC, 2013.
Gestão da informação e do conhecimento como subsídios para a geração de inovação. SILVA, Elaine da; VALENTIM, Marta
Lígia Pomim. XIV Encontro Nacional de Pesquisa e Pós-graduação em Ciência da Informação, Florianópolis, SC, 2013.
Comportamento informacional em ambientes empresariais: uma abordagem centrada em modelos mentais. CAVALCANTE,
Luciane de Fátima Beckman; VALENTIM, Marta Lígia Pomim. XI Encontro Nacional de Pesquisa e Pós-graduação em Ciência
da Informação, Rio de Janeiro, RJ, 2010.
Informação orgânica como subsídio no processo decisório: estudo nas empresas do setor varejista situadas na cidade de Marília/
SP. LOUSADA, Mariana; VALENTIM, Marta Lígia Pomim. XI Encontro Nacional de Pesquisa e Pós-graduação em Ciência da
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Portais corporativos: tecnologias de informação e comunicação aplicadas à gestão da informação e do conhecimento em empresas
de tecnologia de informação. VALENTIM, Marta Lígia Pomim; MOLINA, Letícia Gorri. XI Encontro Nacional de Pesquisa e
Pós-graduação em Ciência da Informação, Rio de Janeiro, RJ, 2010.
Em busca de um modelo de comportamento informacional de usuários de informação financeira pessoal. MATTA, Rodrigo
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Janeiro, RJ, 2010.
Ambiente organizacional no enfoque da área da ciência da informação: um estudo evolutivo. CALDAS, Rosângela Formentini;
LUCIANO, Débora de Moura. XI Encontro Nacional de Pesquisa e Pós-graduação em Ciência da Informação, Rio de Janeiro,
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Colaboração em comunidades mediadas pela Internet: fatores críticos de sucesso. ISONI, Miguel Maurício; VIDOTTI, Silvana
Aparecida Borsetti Gregório; BELLINI, Carlo Gabriel Porto. X Encontro Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Ciência da
Informação, João Pessoal, PB, 2009.
Cultura informacional voltada ao processo de inteligência competitiva organizacional no setor de calçados de São Paulo. WOIDA,
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Prospecção e monitoramento informacional no contexto da inteligência competitiva: avaliação do uso de tecnologias de informação
e comunicação (TIC) em empresas do Arranjo Produtivo Local (APL) de Jaú/SP. PACHECO, Cíntia Gomes; VALENTIM, Marta
Lígia Pomim. IX Encontro Nacional de Pesquisa e Pós-graduação em Ciência da Informação, São Paulo, SP, 2008.
Uso da inteligência competitiva em empresas brasileiras de produtos naturais. BARBALHO, Célia Regina Simonetti; VALENTIM,
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Ciência da Informação, Salvador, BA, 2007.
Percepções de segurança e ameaças em ambientes de tecnologia da informação ISONI, Miguel Maurício; VIDOTTI, Silvana
Aparecida Borsetti Gregório. VIII Encontro Nacional de Pesquisa e Pós-graduação em Ciência da Informação, Salvador, BA,
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Cultura informacional voltada ao processo de inteligência competitiva organizacional: a relação entre as pessoas, a informação, e
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Inteligência competitiva nas organizações privadas da região metropolitana de Londrina. VALENTIM, Marta Lígia Pomim;
CURTY, Renata Gonçalves; GELINSKI, João Vítor Vieira; MOLINA, Letícia Gorri; SANTOS, Juliana Cardoso Dos; UEMURA,
Guilherme Baracat; WOIDA, Luana Maia. V Encontro Nacional de Pesquisa e Pós-graduação em Ciência da Informação, Belo
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Biblioteca no ensino e aprendizagem da língua inglesa. CASTRO FILHO, Cláudio Marcondes de. V Encontro Nacional de
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Estudos pluridisciplinares da informação: ciência da informação, ética e linguagem - nº 3
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Radicalização política no Youtube: o papel dos sistemas algorítmicos na construção de regimes de informação. ALBUQUERQUE,
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Acesso à informação: uma análise do portal da Secretaria de Administração Penitenciária do Estado de São Paulo. ANDRADE,
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O “efeito Trump” e os desafios das políticas arquivísticas para documentos presidenciais no contexto das redes sociais. SILVA,
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Panorama das políticas informacionais e arquivísticas para acervos presidenciais nos estados unidos da américa. SILVA, Anahi
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O documento de arquivo como fonte de prova e o acesso à informação. MORAES, Maria Blassioli; BIZELLO, Maria Leandra.
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Metodologia MCDA/C aplicada em portais da transparência de municípios paulistas. RODRIGUEZ, Sonia Maria Troitiño;
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Tratamento precoce contra Covid-19: uma análise da desinformação no Twitter. ALBUQUERQUE, João Pedro Silva; RODAS,
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BASTOS, Flávia Maria; VIDOTTI, Silvana Aparecida Borsetti Gregório; ODDONE, Nanci. O direito de cópia da produção
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Currículo e formação do bibliotecário escolar no contexto ibero-americano. SALA, Fabiana; CASTRO FILHO, Cláudio
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A situação ocupacional dos egressos do curso de biblioteconomia da Unesp/Marília. OLIVEIRA, Ely Francina Tannuri de;
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Educação e ciência da informação: olhar sobre letramento informacional. REIS, Elismar Vicente; OLIVEIRA, Ely Francina
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Frameworks de media and information literacy: uma análise comparativa. CASARIN, Helen de Castro Silva; ANÇANELLO,
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Ensino de tratamento temático da informação nos cursos de Biblioteconomia do Mercosul: análise e perspectivas de um core
curriculum à luz da organização do conhecimento. GUIMARÃES, José Augusto Chaves; BARITÉ, Mário Guido; LIBERATORE,
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Perfis do profissional da informação: considerações a partir de um estudo de egressos. ALMEIDA, Marco Antonio; CASTRO
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Articulando o capital científico do tipo puro e a análise dos citers. ALVES, Bruno Henrique; OLIVEIRA, Ely Francina Tannuri
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Competência digital e informacional de docentes da educação superior: enfoque do quadro DIGCOMPEDU no Brasil. PAULA,
Rejane Sales de Lima; CASARIN, Helen de Castro Silva; LUCAS, Margarida. XXI Encontro Nacional de Pesquisa e Pós-
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Aspectos da coautoria interna e externa em publicações científicas de instituições multicampi: uma análise da Faculdade de
Tecnologia de Garça. ROCHA, Regina Ferreira da; CASTANHA, Rafael Gutierres; GRÁCIO, Maria Cláudia Cabrini. XXI
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Da conjuntura geopolítica à projeção científica dos países BRIC: uma análise cientométrica no período de 2001 a 2010. PRADO,
Marcos Aparecido Rodrigues do; OLIVEIRA, Ely Francina Tannuri de. XVI Encontro Nacional de Pesquisa e Pós-graduação em
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Aportes bibliométricos à produção científica nos principais periódicos da área de ciência da informação no brasil (2006-2010).
ALVES, Bruno Henrique; OLIVEIRA, Ely Francina Tannuri de. XVI Encontro Nacional de Pesquisa e Pós-graduação em
Ciência da Informação, João Pessoa (PB), 2015.
A Ciência como um sistema auto-organizado: a colaboração científica na perspectiva da autopoiese. HILÁRIO, Carla Mara;
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Análise da colaboração científica nos programas de pós-graduação em Ciência da Informação com enfoque nas coautorias.
GABRIEL JUNIOR, Rene Faustino; OLIVEIRA, Ely Francina Tannuri de. XIV Encontro Nacional de Pesquisa e Pós-graduação
em Ciência da Informação, Florianópolis, SC, 2013.
A produção científica periódica na temática indexação: análise bibliométrica no período de 2003 a 2012. DAL´EVEDOVE, Paula
Regina; FUJITA, Mariângela Spotti Lopes; TARTAROTTI, Roberta Cristina Dal’Evedove. XIV Encontro Nacional de Pesquisa
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Estudos de análise de cocitação de autores: uma abordagem teórico-metodológica para a compreensão de um domínio. GRÁCIO,
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da Informação, Florianópolis, SC, 2013.
Prospecção de projetos de pesquisa em Arquivologia: UFSM. VIANA, Gilberto Fladimar Rodrigues; MADIO, Telma Campanha
de Carvalho. XIV Encontro Nacional de Pesquisa e Pós-graduação em Ciência da Informação, Florianópolis, SC, 2013.
Fontes de informação utilizadas por advogados para prática profissional. SILVA, Marli Vitor da; CASARIN, Helen de Castro
Silva. XIV Encontro Nacional de Pesquisa e Pós-graduação em Ciência da Informação, Florianópolis, SC, 2013.
Análise das patentes registradas no âmbito da Universidade Estadual Paulista: primeiras aproximações. PAVANELLI, Maria
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Produção e comunicação da informação em CT&I – GT7 da Ancib: análise bibliométrica no período 2003/2009. GRÁCIO,
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da Informação, Rio de Janeiro, RJ, 2010.
Um estudo de coautorias na temática “cultura informacional” nos ENANCIBs. WOIDA, Luana Maia; OLIVEIRA, Ely
Francina Tannuri de; VALENTIM, Marta Lígia Pomim. XI Encontro Nacional de Pesquisa e Pós-graduação em Ciência da
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Teses da Pós-Graduação em Educação da Unesp/campus de Marília: um estudo das citações e cocitações no período de 2004 a
2009. CUSTÓDIO, Pollyana Ágata Gomes da Rocha; GRÁCIO, Maria Claudia Cabrini. XI Encontro Nacional de Pesquisa e
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A produção científica em organização e representação do conhecimento no Brasil: uma análise bibliométrica do GT-2 da Ancib.
OLIVEIRA, Ely Francina Tannuri de; GRÁCIO, Maria Claudia Cabrini. X Encontro Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação
em Ciência da Informação, João Pessoal, PB, 2009.
A construção do conhecimento científico: a web semântica como objeto de estudo. PINHEIRO, Cintia Braga Ferreira;
FERNEDA, Edberto. VIII Encontro Nacional de Pesquisa e Pós-graduação em Ciência da Informação, Salvador, BA, 2007.
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Fernanda de; SANTARÉM SEGUNDO, José Eduardo. XXII Encontro Nacional de Pesquisa e Pós-graduação em Ciência da
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Recuperação da informação em repositórios digitais: um estudo sobre ontology. CASTRO, William Pires de; SANTARÉM
SEGUNDO, José Eduardo. XXII Encontro Nacional de Pesquisa e Pós-graduação em Ciência da Informação, Porto Alegre,
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Metadados geoespaciais na web semântica: uma revisão da literatura. PEREIRA, Clayton Martins; SANTARÉM SEGUNDO,
José Eduardo. XXI Encontro Nacional de Pesquisa e Pós-graduação em Ciência da Informação, Rio de Janeiro, 2021.
A questão da qualidade em dados publicados como linked data: um mapeamento sistemático da literatura. JESUS, Ananda O
fluxo informacional nos processos de tomada de decisão pedagógicas em sistemas de gestão de aprendizagem. MARCHI, Késsia
Rita da Costa; BOTEGA, Leonardo Castro. XXI Encontro Nacional de Pesquisa e Pós-graduação em Ciência da Informação,
Rio de Janeiro, 2021.
Estudos pluridisciplinares da informação: ciência da informação, ética e linguagem - nº 3
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GT2Produção intelectual dos atuais docentes permanentes do PPGCI/Unesp
GT-8
Pupilometria na Ciência da Informação: os estudos com tecnologia de eye tracking em publicações de acesso aberto. TEIXEIRA,
Heytor Diniz; BARROS, Suellen Elise Timm; VIDOTTI, Silvana Aparecida Borsetti Gregório; RODAS, Cecílio Merlotti;
ALVES, Rachel Cristina Vesu. XXI Encontro Nacional de Pesquisa e Pós-graduação em Ciência da Informação, Rio de Janeiro,
2021.
Preservação digital dos documentos de arquivo na Universidade Estadual Paulista. GRÁCIO, José Carlos Abbud; MADIO, Telma
Campanha de Carvalho; RODRIGUEZ, Sonia Maria Troitiño; MORAES, Maria Blassioli. XXI Encontro Nacional de Pesquisa
e Pós-graduação em Ciência da Informação, Rio de Janeiro, 2021.
Requisitos de recuperação da informação: identificação e classificação com base nos conceitos de precisão e revocação. BRANDT,
Mariana Baptista; VIDOTTI, Silvana Aparecida Borsetti Gregório. XXI Encontro Nacional de Pesquisa e Pós-graduação em
Ciência da Informação, Rio de Janeiro, 2021.
Inteligência artificial e Ciência de Dados em crise institucional: modelo conceitual. CONEGLIAN, Caio Saraiva; TORINO,
Emanuelle; VIDOTTI, Silvana Aparecida Borsetti Gregório. XXI Encontro Nacional de Pesquisa e Pós-graduação em Ciência
da Informação, Rio de Janeiro, 2021.
SANCHEZ, Fernanda Alves; VIDOTTI, Silvana Aparecida Borsetti Gregório; VECHIATO, Fernando Luiz. Contribuições da
intencionalidade no contexto da encontrabilidade da informação. XXI Encontro Nacional de Pesquisa e Pós-graduação em Ciência
da Informação, Rio de Janeiro, 2021.
ROCHA, Cinéia Josefina; CARDOSO, Fabio Eder; BOTEGA, Leonardo Castro; RODAS, Cecílio Merlotti. Fusão de dados
e informações na prevenção da violência contra a mulher. XXI Encontro Nacional de Pesquisa e Pós-graduação em Ciência da
Informação, Rio de Janeiro, 2021.
Web semântica: introdução a recursos de visualização de dados em formato gráfico. SANTARÉM SEGUNDO, José Eduardo;
SOUZA, Jessica Oliveira de; CONEGLIAN, Caio Saraiva. XVI Encontro Nacional de Pesquisa e Pós-graduação em Ciência da
Informação, João Pessoa (PB), 2015.
Web semântica, dados ligados e dados abertos: uma visão dos desafios do Brasil frente às iniciativas internacionais. SANTARÉM
SEGUNDO, José Eduardo. XVI Encontro Nacional de Pesquisa e Pós-graduação em Ciência da Informação, João Pessoa (PB),
2015.
Design da informação e Ciência da Informação: uma aproximação possível. OLIVEIRA, João Augusto Dias Barreira e; JORENTE,
Maria José Vicentini. XVI Encontro Nacional de Pesquisa e Pós-graduação em Ciência da Informação, João Pessoa (PB), 2015.
Anonimização de metadados de imagem digital por meio do modelo k-anonimato. AFFONSO, Elaine Parra; SANT’ANA,
Ricardo César Gonçalves. XVI Encontro Nacional de Pesquisa e Pós-graduação em Ciência da Informação, João Pessoa (PB),
2015.
Aspectos da disseminação no processo de recuperação de dados de programas governamentais: um estudo do PRONAF.
MOREIRA, Fábio Mosso; SANT’ANA, Ricardo César Gonçalves. XVI Encontro Nacional de Pesquisa e Pós-graduação em
Ciência da Informação, João Pessoa (PB), 2015.
Contribuições teóricas e metodológicas da arquitetura da informação pervasiva para o processo editorial de livros eletrônicos.
OLIVEIRA, Henry Poncio Cruz de; LIMA, Izabel de França; VIDOTTI, Silvana Aparecida Borsetti Gregório. XVI Encontro
Nacional de Pesquisa e Pós-graduação em Ciência da Informação, João Pessoa (PB), 2015.
Proposta de metadados para descrição de recursos informacionais digitais criados dinamicamente. MODESTO, Lisandro Rogério;
FERNEDA, Edberto; SANT’ANA, Ricardo César Gonçalves. XIV Encontro Nacional de Pesquisa e Pós-graduação em Ciência
da Informação, Florianópolis, SC, 2013.
Princípios para utilização de ontologias na indexação automática. PICKLER, Maria Elisa Valentim; FERNEDA, Edberto. XIV
Encontro Nacional de Pesquisa e Pós-graduação em Ciência da Informação, Florianópolis, SC, 2013.
Um método de expansão automática de consulta baseada em ontologia. FERNEDA, Edberto; DIAS, Guilherme Ataíde. XIV
Encontro Nacional de Pesquisa e Pós-graduação em Ciência da Informação, Florianópolis, SC, 2013.
Perspectivas para o design de informação no âmbito da Ciência da Informação. OLIVEIRA, João Augusto Dias Barreira e;
JORENTE, Maria José Vicentini. XIV Encontro Nacional de Pesquisa e Pós-graduação em Ciência da Informação, Florianópolis,
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Disseminação da informação nos websites dos arquivos permanentes e as novas tecnologias de informação e comunicação.
GONÇALEZ, Paula Amorim; JORENTE, Maria José Vicentini. XIV Encontro Nacional de Pesquisa e Pós-graduação em
Ciência da Informação, Florianópolis, SC, 2013.
Ciclo de vida dos dados e o papel da Ciência da Informação. SANT’ANA, Ricardo César Gonçalves. XIV Encontro Nacional de
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Percepção dos usuários sobre o processo de acesso a dados sobre a saúde em sítios do Governo Federal. LOPES, Rita de Cássia
Cassiano; SANT’ANA, Ricardo César Gonçalves. XIV Encontro Nacional de Pesquisa e Pós-graduação em Ciência da
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Mapeamento do termo tecnologia em periódicos da CI no escopo do GT - Informação e Tecnologia. SANTOS, Plácida
Leopoldina Ventura Amorim da Costa; SIMIONATO, Ana Carolina; RODRIGUES, Fernando de Assis; ALENCAR, Cely
Martins; FERREIRA, Jaider Andrade; SILVA, Renata Eleuterio da; SANT’ANA, Ricardo César Gonçalves; ALVES, Rachel
Cristina Vesu; RODAS, Cecílio Merlotti; PÖTTKER, Luciana Maria Vieira; LOPES, Rita de Cássia Cassiano. XIV Encontro
Nacional de Pesquisa e Pós-graduação em Ciência da Informação, Florianópolis, SC, 2013.
Carlos Cândido de Almeida & Mariana Vitti-Rodrigues
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GT2Produção intelectual dos atuais docentes permanentes do PPGCI/Unesp
GT-8
Ensino de tecnologias de informação e comunicação: um diagnóstico nos cursos de graduação em Biblioteconomia, Arquivologia
e Museologia do Brasil. VIDOTTI, Silvana Aparecida Borsetti Gregório; OLIVEIRA, Henry Poncio Cruz de; LIMA, Izabel de
França. XIV Encontro Nacional de Pesquisa e Pós-graduação em Ciência da Informação, Florianópolis, SC, 2013.
Um método de indexação automática de documentos: aplicação em laudos de exames radiológicos. FERNEDA, Edberto;
GALVÃO, Maria Cristiane Barbosa; ROCHA, Joeli Espírito Santo da. XI Encontro Nacional de Pesquisa e Pós-graduação em
Ciência da Informação, Rio de Janeiro, RJ, 2010.
Repositório digital da Unati-Unesp: o olhar da arquitetura da informação para a inclusão digital e social de idosos. VECHIATO,
Fernando Luiz; VIDOTTI, Silvana Aparecida Borsetti Gregório. XI Encontro Nacional de Pesquisa e Pós-graduação em Ciência
da Informação, Rio de Janeiro, RJ, 2010.
Representação iterativa e folksonomia assistida para repositórios digitais. SANTARÉM SEGUNDO, José Eduardo; VIDOTTI,
Silvana Aparecida Borsetti Gregório. XI Encontro Nacional de Pesquisa e Pós-graduação em Ciência da Informação, Rio de
Janeiro, RJ, 2010.
Mensuração da disponibilização de informações e do nível de interação dos ambientes informacionais digitais da administração
municipal com a sociedade. SANT’ANA, Ricardo César Gonçalves; SANTOS, Plácida Leopoldina Ventura Amorim da Costa.
X Encontro Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Ciência da Informação, João Pessoa, PB, 2009.
Ambientes informacionais digitais acessíveis a minorias linguísticas surdas: cidadania e/ou responsabilidade social. CORRADI,
Juliane Adne Mesa; VIDOTTI, Silvana Aparecida Borsetti Gregório. X Encontro Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em
Ciência da Informação, João Pessoa, PB, 2009.
Arquitetura da informação para ambientes informacionais digitais. CAMARGO, Liriane Soares de Araújo; VIDOTTI, Silvana
Aparecida Borsetti Gregório. IX Encontro Nacional de Pesquisa e Pós-graduação em Ciência da Informação, São Paulo, SP, 2008.
Avaliação da usabilidade de ambientes informacionais digitais sobre envelhecimento humano no contexto da arquitetura
da informação: aplicação de avaliação heurística e testes de usabilidade com usuários idosos. VECHIATO, Fernando Luiz;
VIDOTTI, Silvana Aparecida Borsetti Gregório. IX Encontro Nacional de Pesquisa e Pós-graduação em Ciência da Informação,
São Paulo, SP, 2008.
Imagem, fotografia, imagem. JORENTE, Maria José Vicentini; MADIO, Telma Campanha de Carvalho; SANTOS, Plácida
Leopoldina Ventura Amorim da Costa. IX Encontro Nacional de Pesquisa e Pós-graduação em Ciência da Informação, São
Paulo, SP, 2008.
GT-9
Divulgação científica e cultural em serviços de redes sociais online: análise do Festival Online Museum Week. SILVA, Larissa
Lima da; RODRIGUES, Fernando de Assis; SANT’ANA, Ricardo César Gonçalves. XXI Encontro Nacional de Pesquisa e Pós-
graduação em Ciência da Informação, Rio de Janeiro, 2021.
Patrimônio cultural: um olhar sobre o modelo conceitual records in contexts. CARRASCO, Lais Barbudo; VIDOTTI, Silvana
Aparecida Borsetti Gregório. XXI Encontro Nacional de Pesquisa e Pós-graduação em Ciência da Informação, Rio de Janeiro, 2021.
GT-10
A estetização da colonização e o patrimônio dissonante: uma discussão necessária. CRIPPA, Giulia; DAMIAN, Ieda Pelógia
Martins. XXI Encontro Nacional de Pesquisa e Pós-graduação em Ciência da Informação, Rio de Janeiro, 2021.
A fotografia como documento e suporte à construção da memória. ELLIOTT, Ariluci Goes; MADIO, Telma Campanha de
Carvalho. XVI Encontro Nacional de Pesquisa e Pós-graduação em Ciência da Informação, João Pessoa (PB), 2015.
Arquivos pessoais e patrimônio documental: análise dos critérios de seleção dos registros de memória do mundo do Brasil - Unesco.
CRIVELLI, Renato; BIZELLO, Maria Leandra. XVI Encontro Nacional de Pesquisa e Pós-graduação em Ciência da Informação,
João Pessoa (PB), 2015.
Influência do colecionismo na representação da memória social: relações práticas e teóricas e suas contribuições para o
desenvolvimento da sociedade. SANTOS, Admeire Silva; BIZELLO, Maria Leandra. XIV Encontro Nacional de Pesquisa e
Pós-graduação em Ciência da Informação, Florianópolis, SC, 2013.
Memória, lugares e documentos: Centro de Documentação e Memória “Padre Antão Jorge – CSSR” do Santuário Nacional de
Aparecida. MOTTA, Bruna Gisele; BIZELLO, Maria Leandra. XIV Encontro Nacional de Pesquisa e Pós-graduação em Ciência
da Informação, Florianópolis, SC, 2013.
Fotografias como documento e memória: uma análise das imagens de romeiros da Cidade de Juazeiro do Norte-CE. ELLIOTT,
Ariluci Goes; MADIO, Telma Campanha de Carvalho. XIV Encontro Nacional de Pesquisa e Pós-graduação em Ciência da
Informação, Florianópolis, SC, 2013.
Cinema e memória: ver, guardar, relembrar. BIZELLO, Maria Leandra. XI Encontro Nacional de Pesquisa e Pós-graduação em
Ciência da Informação, Rio de Janeiro, RJ, 2010.
GT-11
Modelo de mapeamento semântico entre terminologias de saúde. GUALDANI, Fabrício Amadeu; BOTEGA, Leonardo Castro;
MIRANDA, Nelson Julio de Oliveira. XXII Encontro Nacional de Pesquisa e Pós-graduação em Ciência da Informação, Porto
Alegre, RS, 2022.
GT-12 Não há até o presente momento registro de trabalhos publicados no GT-12.
Fonte: BENANCIB (2023).
Estudos pluridisciplinares da informação: ciência da informação, ética e linguagem - nº 3
109
O Quadro 2 apresenta a produção dos atuais docentes permanentes
do PPGCI/Unesp publicada no repositório BENANCIB (2023). A pro-
dução intelectual dos docentes permanentes do PPGCI/Unesp ao longo
dos anos 1998 e 2021 possibilita conjeturar um recorte do ponto de vista
da arqueologia do saber de Foucault (2010), por conta da continuidade
de produtos do devir de alguns docentes constituírem-se como espaços
de formação intelectual de novos pesquisadores, outrora discentes e atual-
mente docentes permanentes do PPGCI/Unesp ou de outros programas,
e por este processo de produção evidenciar rupturas teóricas, conceituais,
metodológicas, e de influências de teóricos de disciplinas consideradas in-
terdisciplinares em relação à Ciência da Informação que, por sua vez, pos-
sibilitam descontinuidades sem com isso irromper com o antigo.
No que tange a continuidade destacam-se os docentes que possibili-
taram à Unesp a criação do PPGCI, em 1998, e também sua continuidade,
como: Helen de Castro Silva Casarin; João Batista Ernesto de Moraes;
José Augusto Chaves Guimarães; Mariângela Spotti Lopes Fujita; Marta
Lígia Pomim Valentim; Oswaldo Francisco de Almeida Júnior; Plácida
Leopoldina Ventura Amorim da Costa Santos; Silvana Aparecida Borsetti
Gregório Vidotti, cuja produção intelectual marcou e continua a marcar as
tendências de pesquisa do campo da Ciência da Informação, bem como se
permitiram e se permitem a emergência de novos interesses de pesquisa no
conjunto de seus seguidores, que por conta desta abertura, surgiram acep-
ções progressistas que parecem irromper algumas tendências identitárias de
recuo as origens da área.
Pode-se destacar as contribuições científicas de Carlos de Almeida
alicerçadas na Semiótica Peirceana e sua cocriação com discentes do
Programa como a ‘informação líquida’ e a ‘informação semiótica’ abrem
espaços de ruptura e descontinuidade sem alteração do já estabelecido; as
de Ricardo Sant’Ana com a emergência da Ciência dos Dados como cate-
goria ou objeto de estudo da Ciência da Informação; as de Marta Valentim
com a gestão do conhecimento e o uso da tríade dados, informação e co-
nhecimento a partir de aportes teóricos multidisciplinares; as de Oswaldo
Almeida Júnior a partir da definição do conceito de mediação da informa-
ção; entre outros.
Carlos Cândido de Almeida & Mariana Vitti-Rodrigues
110
Quadro 3: Correlação de artigos e GT da ANCIB publicados no
BENANCIB (1998-2021)
Docentes3/
GT4GT-1 GT-2 GT-3 GT-4 GT-5 GT-6 GT-7 GT-8 GT-9 GT-
10 GT-
11 GT-
12
CCA45----------
CMR-------2----
CMCF - - 1 1 - 2 - - - - - -
DMA-1----------
DMAS 2 2 - - - - - - - - - -
EF ------14----
EFTO - - - - - 2 9 - - - - -
HCSC - - 5 1 - 1 2 - - - - -
IPMD - - 2 3 - - - - - 1 - -
JACG 1 7 - - 1 1 - - - - - -
JESS -------6----
LCB -------2--1-
LMW - - - 3 - - 1 - - - - -
MCCP - - - 2 2 - - - - - - -
MCCG - 1 - - - - 6 - - - - -
MJVJ-------4----
MLB - 2 - 1 1 - - - - 4 - -
MSLF - 11 - - - - 1 - - - - -
MLPV - - - 18 2 1 1 - - - - -
OFAJ - - 7 - - - - - - - - -
RCVA -------2----
RCGS - - - - - - -- 7 1 - - -
RFC - - 2 1 - - - - - - - -
SABGV - 1 4 2 3 - - 11 1 - - -
SMTR - 2 - - 1 - - 1 - - - -
TSBG - - 1 - - - - - - - - -
TCCM - 3 - 1 - - 1 2 - 2 - -
WM -4----------
Total 7 39 22 33 10 7 22 41 2 7 1 0
Fonte: Elaboração própria a partir dos dados de pesquisa (2023).
O Quadro 3 demonstra que existe uma correlação positiva entre
produção científica dos docentes permanentes do PPGCI/Unesp com as
ementas dos GT do ENANCIB. Dois aspectos constituem norteadores
3 As siglas se referem às iniciais dos docentes do Programa de Pós-graduação em Ciência da Informação da
Universidade Estadual Paulista (Unesp), conforme apresentado no Quadro 1.
4 Os Grupos de Trabalho (GT) da Associação Nacional de Pesquisa e Pós-graduação em Ciência da
Informação (ANCIB) são compostos por 12 Grupos, conforme apresentado no Quadro 2.
Estudos pluridisciplinares da informação: ciência da informação, ética e linguagem - nº 3
111
para que o produto do devir dos produtores de conhecimento na Ciência
da Informação façam parte dos indicadores identitários da área. Os GT se
estabelecem em 1994, mas por conta da demanda de problemas epistêmi-
cos da área, relacionados à complexidade do seu objeto de pesquisa, sejam
eles, dados, informação e conhecimento, assim abriu-se espaço para que
outros nichos surgissem. Dessa maneira, a partir do Ano de 2008 inicia-se
o processo de institucionalização de outros GT, que possibilitou a congre-
gação de pesquisadores interessados em novas problemáticas fagocitadas
pela complexidade dos objetos de estudo da área, nomeadamente: dados,
informação e conhecimento, proporcionado o surgimento dos seguintes
GT: GT-8; GT-9; GT-10; GT-11 e, o mais recente, GT-12.
Vale destacar que as ementas dos GT do ENANCIB apesar de cons-
tituírem o universo do campo informacional como referenciado na ementa
do GT-1, os GT são singularidades que propiciam dar um sentido preciso
e um conteúdo determinável, uma vez que cada GT congrega um conjun-
to de pesquisadores que comungam dos mesmos quadros teóricos, concei-
tuais e metodológicos no âmbito do ensino e pesquisa na área de Ciência
da Informação enquanto Ciência Social Aplicada.
Quando analisadas as conexões dos artigos publicados por docentes
permanentes do PPGCI/Unesp e a sua relação com os GT, emerge a ques-
tão estatística que amplifica o carácter singular do produto do devir dos
produtores de conhecimento, bem como a sua elasticidade, prevalecendo
não só os interesses de pesquisa dos docentes seniores, aqui analisados en-
quanto guias de jovens pesquisadores que participam na perspectiva do
campo científico de Bourdieu (2004), ou na perspectiva paradigmática
de Kuhn (2009), ou ainda no contexto das organizações coercitivas de
Durkheim (2007), para destacar que a dispersão da produção de alguns
docentes permanentes do PPGCI/Unesp está relacionada aos interesses
dos orientandos, que mesmo dentro do campo científico, paradigma e/
ou organização coercitiva, lhes é propiciado pensar em teorias, conceitos,
métodos e tendências fora do escopo teórico-metodológico e conceptual
de seus mestres.
Os dados apresentados no Quadro 6 também destacam a identida-
de dos docentes e pesquisadores permanentes do PPGCI/Unesp, a partir
Carlos Cândido de Almeida & Mariana Vitti-Rodrigues
112
dos achados encontrados nos GT em que possuem maior quantidade de
produção. Contemplando os dados acima referenciados, dos 21 (vinte e
um) docentes permanentes do PPGCI/Unesp, Carlos de Almeida, ape-
sar de ter contribuído com 9 (nove) artigos, sendo 4 (quatro) no GT-1
e 5 (cinco) no GT-2, sua produção se aproxima mais do GT-1 ‘Estudos
Históricos e Epistemológicos da Ciência da Informação’, por conta de o
GT-2 ‘Organização e Representação do Conhecimento’ também relacio-
nar a epistemologia como fundamental no processo de construção de co-
nhecimento no âmbito da organização e representação do conhecimento.
Não é pretensão deste trabalho destacar individualmente a produ-
ção intelectual dos docentes permanentes em correlação com os GT do
ENANCIB, mas importa realçar que os GT representam a face oculta do
devir dos docentes enquanto corpo social dos subcampos de pesquisa da
Ciência da Informação, enquanto disciplina no universos científico da
Ciência.
Os pesquisadores mais produtivos no contexto do ENANCIB
se constituem em referências intelectuais não só para a comunidade do
PPGCI/Unesp, mas para o universo intelectual do campo científico da
Ciência da Informação no Brasil. Estes pesquisadores se constituem em
sustentáculo para a formação e garantia de continuidades e descontinuida-
des do saber no campo da Ciência da Informação, porque possibilitam que
seus processos de intervenção epistêmica dê lugar a outras interpretações
e, assim, possam surgir rupturas e descontinuidades ao longo do tempo no
âmbito da Ciência da Informação brasileira.
Os produtos do devir dos docentes permanentes se concentram do
GT-1 ao GT-11. Para melhor compreensão sem com isso relegar o menor
número para o esquecimento, contrariando o patrono intelectual da arque-
ologia do saber (Foucault, 2010) sobre a produção intelectual dos docentes
que constituem a categoria humana deste trabalho, os GT com mais acha-
dos intelectuais do ENANCIB são: GT-8 com 41 (quarenta e um) textos;
GT-2 com 39 (trinta e nove) textos; GT-4 com 33 (trinta e três) textos;
GT-3 e GT-7 com 22 (vinte e dois) textos, respectivamente; GT-1, GT-6
e GT-10 com 7 (sete) textos, respectivamente; GT-9 com 2 (dois) textos;
GT-11 com 1 (um) texto; e GT-12 com 0 (zero) textos. Alguns textos que
Estudos pluridisciplinares da informação: ciência da informação, ética e linguagem - nº 3
113
se encontram no GT-2 poderiam ter sido apresentados no GT-8, entre
outros, porque antes de 2008, como destacou-se anteriormente, alguns
GT ainda não haviam sido criados no ENANCIB. Contudo, os GT do
ENANCIB servem de parâmetro para linhas de pesquisa, grupos de pes-
quisa, bem como para o planejamento de disciplinas e elaboração de pro-
jetos de pesquisa no universo da pós-graduação em Ciência da Informação
no País.
4 produção dE conhEcimEnto no ppgci/unEsp: uma visão
foucaultiana E bachElardiana
A pergunta retórica feita por Borko (1968) no artigo intitulado
Information Science: what is it?, considerado por vários autores do campo
da Ciência da Informação em nível nacional e internacional, como sen-
do, um conceito fundamental para a instauração da área de pesquisa em
Ciência da Informação no mundo, possibilita estabelecer conexões com os
programas de pós-graduação em Ciência da Informação no mundo, assim
como os cursos, as linhas de pesquisa, as disciplinas, os grupos de pesquisa,
os projetos de pesquisa e as associações acadêmicas e profissionais são ins-
tituídas a partir da perspectiva de Borko e seu discurso sobre a Ciência da
Informação enquanto campo de pesquisa e ensino. Borko (1968, p. 3) de-
fine Ciência da Informação como sendo “[...] a disciplina que investiga as
propriedades e o comportamento da informação, as forças que governam
o fluxo da informação, e os significados do processamento da informação
para acessibilidade e a usabilidade ótimas [...]”.
Saracevic (1996, p. 47) quando destaca que a Ciência da Informação
“[...] dedica-se às questões científicas e à prática profissional, voltadas para
os problemas da efetiva comunicação do conhecimento e de seus registros
entre os seres humanos, no contexto social, institucional ou individual do
uso e das necessidades de informação”.
A produção intelectual no campo da Ciência da Informação não
possibilita ainda uma ruptura ou descontinuidade do complexo intelectual
construído desde a instauração do conceito de Borko (1968). Por ser um
campo de estudo emergente, a disciplina Ciência da Informação pode estar
Carlos Cândido de Almeida & Mariana Vitti-Rodrigues
114
no processo de acumulação de estoque de conhecimento relacionado aos
problemas suscitados no âmbito político, econômico, social, cultural, tec-
nológico e religioso, correlacionado ao objeto de estudo do campo, sejam
eles, dados, informação e conhecimento.
A comunidade científica da Ciência da Informação se constitui a
partir de micro comunidades que, por sua vez, se encontram representadas
em cursos de pós-graduação da área da Ciência da Informação e nos GT
do ENANCIB. Sua constituição e relações de poder podem ser visualiza-
das, por meio do seu corpo social e da representatividade dos programas,
bem como através dos docentes e pesquisadores atuantes nas coordenações
dos GT da ANCIB.
O ENANCIB se constitui na mostra dos produtos do devir de do-
centes, pesquisadores e discentes dos programas de pós-graduação, por
meio dos micropoderes estabelecidos no âmbito dos GT, enquanto escru-
tinadores dos saberes apresentados e avaliados por pares. O presente tra-
balho não pretende analisar as relações de poder que se estabelecem no
campo científico ou na comunidade científica da Ciência da Informação,
mas considera relevante realizar um escrutínio arqueológico da produção
intelectual dos docentes permanentes do PPGCI/Unesp, a partir de três ei-
xos temáticos, nomeadamente: 1) Ensino de disciplinas curriculares e a sua
relação com a pesquisa no quadro dos projetos de pesquisa dos docentes
permanentes do PPGCI/Unesp; 2) Pesquisa científica coletiva e individual
e a sua relação com a formação de novos docentes e pesquisadores em nível
de pós-graduação; 3) Ensino de disciplinas idealizadas pelos docentes e a
produção científica dos docentes permanentes do PPGCI/Unesp.
Tanto as disciplinas, assim como os projetos de pesquisa e produtos
(artigos, trabalhos em eventos, capítulos de livros etc.) do devir dos docen-
tes e pesquisadores do PPGCI/Unesp, passam por um crivo político inte-
lectual, uma vez que são avaliados por pares, seja no âmbito institucional,
nas instituições de fomento, nas organizações acadêmicas e/ou científicas
do campo da Ciência da Informação, quais sejam os participantes dos GT
ou membros com a competência intelectual instituídos por critérios polí-
tico-científicos para avaliar os textos submetidos aos eventos, e aprovados
Estudos pluridisciplinares da informação: ciência da informação, ética e linguagem - nº 3
115
como válidos para apresentação na mostra dos produtos da produção inte-
lectual dos docentes e discentes dos programas de pós-graduação.
O presente estudo, ao valer-se dos procedimentos de Foucault
(2010) em torno da arqueologia do saber e de Bachelard (2006) sobre o
ofício do historiador da Ciência e do ofício do epistemólogo, procura fazer
uma radiografia dos achados esquecidos, bem como das continuidades e
descontinuidades estabelecidas ao longo da curta historiografia do PPGCI/
Unesp associado aos GT do ENANCIB.
O projeto intelectual de Foucault (2010) encontra amparo na traje-
tória intelectual de Bachelard (2006). Foucault (2010) elabora conceitos e
constrói o seu conhecimento a partir do arquivo, conjunto de documen-
tos diversificados e multifacetados, extraindo conceitos a partir dos docu-
mentos do arquivo; e Bachelard (2006) ao esquematizar a sua abordagem
sobre epistemologia elaborou critérios que são utensílios do historiador
da Ciência e do epistemólogo, fazendo crer na possibilidade de se pensar
o procedimento de Foucault (2010) no contexto da arqueologia do saber,
como tendo sido patrocinado pelo projeto intelectual de Bachelard quan-
do este discorre sobre epistemologia.
Ao longo da história da Ciência, vários autores procuraram defini-la
a partir de critérios de demarcação entre o saber cientificamente coerente
e os saberes construídos, por meio de formações religiosas e/ou filosóficas,
assim como saberes considerados de cunho do senso comum. O lugar dos
discursos da Medicina, Direito, Biologia e Psicologia depende do princí-
pio de dominação e de hierarquia que se estabelece com outros tipos de
discursos do saber.
Contudo, Foucault (2010), ao instaurar a arqueologia do saber en-
quanto procedimento analítico do seu percurso intelectual, antes de 1969,
analisa a sua própria produção intelectual, sobretudo, as obras subordi-
nadas aos temas: 1. História da Loucura; 2. Nascimento da Clínica; 3. A
palavra e as coisas. As conclusões epistemológicas sobre essas três obras
possibilitam estabelecer um procedimento metodológico e de arguição de
fontes e de objetos emanados pelos discursos, médicos, de direito e de
poder. Entretanto, para Foucault (2010, p. 231) a arqueologia não se es-
Carlos Cândido de Almeida & Mariana Vitti-Rodrigues
116
tabelece como um método ou Ciência, segundo o autor “[...] é certo que
jamais apresentei a arqueologia como uma ciência, nem mesmo como os
primeiros fundamentos de uma ciência futura”.
Em síntese, Foucault (2010, p. 157) procura estabelecer o que de-
nominou pontos de separação entre a análise arqueológica e a história das
ideias, em quatro princípios diferentes: “[...] a propósito da determinação
da novidade; a propósito da análise das contradições; a propósito das des-
crições comparativas; a propósito, enfim, da demarcação das transforma-
ções”. O mesmo pode ser associado a diferenciação feita por Bachelard
(2006) quando diferencia o ofício do historiador da ciência e o ofício do
epistemólogo. Desse modo, considera-se estes dois discursos intelectual-
mente próximos.
A propósito da convergência e divergência entre epistemologia e ar-
queologia é analisada com algum pendor para a convergência entre os dois
procedimentos avaliativos dos achados científicos por Domingues (2020)
na recepção crítica feita na obra ‘A palavra e as coisas’ de Foucault, publi-
cada em 1966. A avaliação epistemológica feita por Domingues (2023) é
analisada em jeito de recepção crítica por Candiotto (2023), que ressalta a
importância da obra de Foucault para a compreensão do nascimento das
Ciências Humanas e dos limites e da possibilidade do método arqueológi-
co de Foucault, considerado como sendo um pensador camaleônico que se
posicionou sempre à margem de correntes de pensamento e de posiciona-
mentos disciplinares.
Retornando aos quatro princípios supracitados, Foucault (2010, p.
157-158) estabelece o seguinte:
1. No primeiro princípio, “[...] a arqueologia busca definir não os
pensamentos, as representações, as imagens, os temas, as ob-
sessões que se ocultam ou se manifestam nos discursos, mas os
próprios discursos, enquanto práticas que obedecem regras”;
este posicionamento está mais próximo do paradigma cunhado
por Kuhn (2009, p. 221) comumente aceito de que é aquilo
que membros de uma comunidade de cientistas ou pesquisado-
res partilham, em que uma comunidade científica consiste em
Estudos pluridisciplinares da informação: ciência da informação, ética e linguagem - nº 3
117
pesquisadores e pesquisadoras que partilham um paradigma.
Poder-se-ia também associar ao conceito de campo científico de
Bourdieu (2004), segundo o qual pesquisadores dominantes di-
tam as teorias, conceitos, métodos e tendências que determinam
o curso normal de uma comunidade científica, perpetuando a
dominação de alguns pesquisadores sobre outros. Ademais po-
de-se associar ao conceito de arqueologia foucaultiana as orga-
nizações coercitivas discutidas por Durkheim (2007) em que o
indivíduo dependendo do tipo de organização deve se submeter
a regras, práticas, tendências e crenças do grupo social em que
se encontra.
2. No segundo princípio, a arqueologia não procura encontrar a
transição contínua e insensível que liga, em declive suave, os dis-
cursos ao que os precede, envolve ou segue. O “[...] problema
dela é, pelo contrário, definir os discursos em sua especificida-
de; [...] segui-los ao longo de suas arestas exteriores para me-
lhor valorizá-los” (Foucault, 2010, p. 157). Assim sendo, este
posicionamento está mais próximo do ofício do epistemólogo
descrito por Bachelard (2006, p. 168) segundo o qual, este deve
“[...] esforçar-se por captar os conceitos científicos em sínteses
psicológicas efetivas, isto é, em sínteses psicológicas progressis-
tas, estabelecendo, a propósito de cada noção, uma escala de
conceitos e mostrando como um conceito produziu outro, se
ligou a outro”. Portanto, os conceitos são sínteses estabelecidas
num contexto histórico ou numa disciplina, em que procuram
responder aos problemas epistemológicos dessa época. A sínte-
se psicológica progressista resume o posicionamento intelectual
de um epistemólogo, resultando na superação de um obstáculo
conceitual, com isso, é possível estabelecer relações, diferenças e
semelhanças entre um conjunto de conceitos.
3. No terceiro princípio, a arqueologia não é ordenada pela figura
soberana da obra; não buscando compreender o momento em
que esta se destacou do horizonte anônimo. “Ela define tipos e
regras de práticas discursivas que atravessam obras individuais,
Carlos Cândido de Almeida & Mariana Vitti-Rodrigues
118
às vezes as comandam inteiramente e as dominam sem que nada
lhes escape [...]”. Na perspectiva de Bachelard (2006, p. 168)
“[...] o epistemólogo tem de tomar os fatos como ideias, inserin-
do-os num sistema de pensamento”.
4. Por quarto e último princípio, a arqueologia não procura recons-
tituir o que pode ser pensado, desejado, visado, experimentado,
almejado pelos pesquisadores e pesquisadoras no próprio ins-
tante em que proferiram o discurso. Não é o retorno ao próprio
segredo da origem; é a descrição sistemática de um discurso-ob-
jeto. Este posicionamento remete a diferença estabelecida por
Bachelard (2006) sobre continuidade e descontinuidade, em
que a continuidade seria aquilo que não muda, a continuidade
seria aquilo que resiste às transformações e a descontinuidade
seria uma espécie de reforma do saber ou ruptura de uma tra-
dição científica estabelecida, de uma ciência normal à revolução
científica, na perspectiva de Kuhn (2009).
A diferença entre arqueologia e história das ideias de Foucault
(2010) coincide com a diferença entre o ofício do historiador da Ciência
e o ofício do epistemólogo descrita por Bachelard (2006). A possibilidade
de uma arqueologia do saber só ganha relevância se for associada aos desa-
fios do epistemólogo, uma vez que seu papel do epistemólogo é avaliar o
produto do devir dos pesquisadores ou cientistas, estabelecendo critérios
de cientificidade, organização, funcionamento e relações interdisciplinares
estabelecidas na relação entre uma disciplina específica e outras disciplinas
científicas.
A arqueologia, diferentemente da epistemologia, não é uma Ciência,
ela se constitui como uma metáfora cunhada por Foucault (2010) para
produzir uma diferenciação com outras categorias de análise estabelecida
por outros teóricos relevantes na avaliação da Ciência do ponto de vista
histórico. Foucault se centra no estudo do arquivo, espaço dominado pelo
historiador.
Estudos pluridisciplinares da informação: ciência da informação, ética e linguagem - nº 3
119
O procedimento de Foucault (2010) sobre arqueologia e os qua-
tro princípios definidos como norteadores da possibilidade metodológica
instaurada pelo autor para avaliar a sua própria produção intelectual, an-
terior à publicação do livro ‘L’Archéologie du Savoir’ de 1969, em correla-
ção com a obra de Bachelard (2006) publicada originalmente em francês
L’epistemologie’, em 1971, que reúne um conjunto de textos publicados
pelo autor entre 1928 e 1951, possibilita adentrar no espaço de produção
intelectual dos docentes permanentes do PPGCI/Unesp e sua relação com
ensino, pesquisa e produção intelectual alicerçada nos eventos científicos
promovidos pela ANCIB, entre 1998-2021, anos que coincidem com a
institucionalização do PPGCI/Unesp e que a contribuição intelectual, pe-
dagógica e administrativa proporcionou que o Programa alcançasse pa-
drões elevados de excelência internacional, com as avaliações institucionais
efetuadas pela CAPES.
O primeiro eixo supracitado como parâmetro de análise do PPGCI/
Unesp, centra-se no ensino de disciplinas curriculares e a sua relação com
a pesquisa no quadro dos projetos de pesquisa dos docentes permanen-
tes do PPGCI/Unesp. Num conjunto de 191 (cento e noventa e uma)
disciplinas ministradas no Programa, por 21 (vinte e um) docentes, cada
uma com características singulares e relacionadas aos desafios do campo
científico da Ciência da Informação, a partir de preocupações individuais
e coletivas dos docentes permanentes, bem como dos desafios instaurados
pela complexidade das relações entre ensino, pesquisa e o meio político,
econômico, social, cultural e transversais, fagocitadas pela complexidade
do objeto de estudo da Ciência da Informação, ‘dados, informação e co-
nhecimento’, no âmbito da área de concentração ‘Informação, Tecnologia
e Conhecimento’.
Esses insights são determinantes para a criação de disciplinas e pro-
jetos de pesquisa no âmbito do Programa por parte do corpo de docentes
permanentes, visto que ao se aprovar uma disciplina específica, o Programa
garante a continuidade dos processos formativos alicerçados na área de
concentração, bem como nas linhas de pesquisa do Programa, de modo
que se mantenha atento aos desafios apresentados à área nos vários espaços
Carlos Cândido de Almeida & Mariana Vitti-Rodrigues
120
existentes: acadêmicos, científicos e profissionais, tanto nacionais quanto
internacionais.
As disciplinas ministradas pelos docentes permanentes do PPGCI/
Unesp acompanham os projetos de pesquisa, através de permanente ino-
vação, o que possibilita a produção de novos conhecimentos, bem como
de novos interesses de pesquisa suscitados pelo ambiente de pesquisa da
Ciência da Informação. As disciplinas lecionadas no Programa ao longo do
período em análise são replicadas em outros programas de pós-graduação
do País, a partir da inserção de egressos do PPGCI/Unesp, abrindo espaço
para outros movimentos intelectuais e projetos de pesquisa inovadores.
Os 183 (cento e oitenta e três) projetos de pesquisa estabelecidos
pelos docentes permanentes do Programa ao longo do período analisado
concentram interesses intelectuais dos discentes, alinhando-os aos interes-
ses dos docentes permanentes. Existe uma correlação significativa entre as
disciplinas lecionadas, os projetos de pesquisa estabelecidos por docentes
permanentes e, às vezes, por discentes progressistas, que, não sendo permi-
tidos a estabelecer projetos individuais por questões normativas, acabam
influenciando os seus mestres a instaurar projetos oriundos de seus inte-
resses intelectuais.
Existem disciplinas e projetos de pesquisa, que, apesar de estarem
centrados em linhas de pesquisa distintas, acabam sendo atrativas para
o universo de discentes e docentes com interesses distintos e comuns na
Ciência da Informação, destaque vai para disciplinas como ‘Métodos de
Pesquisa Aplicados à Ciência da Informação’; ‘Preparação de artigos de
periódicos: aspectos metodológicos e éticos’; ‘Recuperação de informação:
técnicas e tecnologias’; ‘Questões bibliométricas em produção e organiza-
ção da informação’; ‘Mediação da informação’, entre outras.
Ademais, a cooperação docente é notória em alguns projetos de pes-
quisa, isto é, verifica-se o agrupamento de docentes de diferentes linhas
de pesquisa e com interesses distintos no campo de pesquisa da Ciência
da Informação, atuando juntos em projetos de pesquisa de natureza
transversal.
Estudos pluridisciplinares da informação: ciência da informação, ética e linguagem - nº 3
121
O segundo eixo de análise se centra na pesquisa científica coletiva e
individual e a sua relação com a formação de novos docentes e pesquisado-
res em nível de pós-graduação. As linhas de pesquisa do PPGCI/Unesp são
a base do processo de produção de conhecimento científico do Programa,
uma vez que possibilitam agrupar pesquisadores, professores, discentes,
disciplinas, grupos de pesquisa, pessoal técnico administrativo em áreas de
pesquisa definidas, garantido que o conhecimento gerado e compartilhado
nestes subcampos possa enriquecer os discentes que, por sua vez, produ-
zem conhecimento novo ou incremental, de modo a alimentar e consoli-
dar o campo da Ciência da Informação como disciplina científica coerente
com os ditames da Ciência.
Conforme mencionado anteriormente o PPGCI/Unesp conta com
3 (três) linhas de pesquisa ancoradas na área de concentração denomina-
da ‘Informação, Tecnologia e Conhecimento’. As linhas de pesquisa dos
programas de pós-graduação acabam se ressentindo de cobranças institu-
cionais oriundas de instituições de fomento, o que as torna instituições
voltadas a polos de poder individual como mencionado por Bourdieu
(2004) quando se refere ao capital intelectual puro e ao capital intelectual
institucionalizado.
Os principais pesquisadores inseridos nas linhas ditam as ‘regras do
jogo’ no espaço interno, temas de pesquisa, métodos de pesquisa, teorias
e literatura pertinente para a construção de conhecimento novo ou in-
cremental na elaboração de artigos científicos, capítulos de livro e outros
materiais bibliográficos importantes no processo publicação da produção
intelectual.
As linhas de pesquisa do Programa, nomeadamente, ‘Informação
e Tecnologia’; ‘Produção e Organização de Conhecimento’; ‘Gestão,
Mediação e Uso da Informação’, parecem ser um espaço democrático de
realização acadêmica e profissional de seus participantes, por isso as avalia-
ções externas ao Programa são sempre reveladoras de excelência atribuída
ao PPGCI/Unesp.
A produção de conhecimento pode congregar um paradigma na
perspectiva de Kuhn (2009), como também de coerção na perspectiva de
Carlos Cândido de Almeida & Mariana Vitti-Rodrigues
122
Durkheim (2007). Todavia, para o caso concreto do PPGCI/Unesp, pa-
rece encontrar resistência, pela abertura demonstrada pelos pesquisadores
de produtividade em pesquisa, professores colaboradores e outros inter-
venientes no processo, porque estes são abertos a novas teorias, concei-
tos e métodos, elevando a geração de novo conhecimento produzido por
professores permanentes, professores colaboradores, professores visitantes,
discentes e egressos do PPGCI/Unesp.
O número de docentes permanentes e discentes associados às linhas
de pesquisa, assim como dos grupos de pesquisa, atesta não só a relevância
desses espaços, como sendo fundamentais para a formação de novas gera-
ções de pesquisadores, docentes, profissionais da informação, bem como
fundamentam e consolidam as subáreas de conhecimento dentro do cam-
po científico da Ciência da Informação, por meio da religação de saberes
desenvolvidos por egressos no processo de produção de conhecimento ori-
ginado por pesquisas individuais e/ou coletivas. Como mencionado ante-
riormente, os discentes mais produtivos do Programa continuam ligados
ao ensino, pesquisa e extensão contribuindo para a produção de novo co-
nhecimento no campo.
O Grupo de Pesquisa ‘Informação, Conhecimento e Inteligência
Organizacional’ (ICIO), fundado em 2004, é o Grupo que possui a maior
quantidade de temáticas de pesquisa desenvolvidas: 13 (treze) no total, e
que fazem parte 13 (treze) pesquisadores, 26 (vinte e seis) discentes e 3
(três) colaboradores estrangeiros. O Grupo de Pesquisa ‘Novas Tecnologias
em Informação’ (GPnti), fundado em 1990, conta com mais recursos hu-
manos, é constituído por 56 (cinquenta e seis) pesquisadores e 46 (qua-
renta e seis) discentes. Do ponto de vista estatístico o PPGCI/Unesp conta
com 13 (treze) grupos de pesquisas que se desdobram em 39 temas de
pesquisa, e um conjunto de 257 (duzentos cinquenta e sete) pesquisadores;
250 (duzentos e cinquenta) discentes (estudantes); 3 (três) técnicos; e 10
(dez) colaboradores estrangeiros. Desse modo, quanto aos indicadores de
recursos humanos, os grupos de pesquisa contam com cerca de 520 (qui-
nhentos e vinte) profissionais.
Em qualquer tipo de organização ou sistema os recursos humanos
a par do capital, informação, tecnologia, materiais se constituem em fato-
Estudos pluridisciplinares da informação: ciência da informação, ética e linguagem - nº 3
123
res de produção. Sendo o PPGCI/Unesp uma organização relacionada ao
ensino, pesquisa e extensão, os fatores de produção supracitados são parte
integrante do processo de produção de conhecimento, e propiciam a gera-
ção de novo conhecimento e a formação de capital humano de qualidade,
capaz de concorrer com o capital humano gerado em instituições similares
nas diversas universidades de excelência em nível mundial.
Evidencia-se e destaca-se a inserção dos egressos do Programa em
diversas instituições de ensino, atuando como docentes, profissionais da
informação e outras funções relevantes. Os ingressos do Programa se cons-
tituem nos inputs mais visíveis e os egressos os outputs gerados pelo sistema
de pós-graduação.
Tabela 1: Número de defesas de Mestrado e Doutorado por Linha de
Pesquisa e inserção profissional dos Egressos (2018-2020)
Linha de Pesquisa Mestrado Doutorado
2018 2019 2020 Total 2018 2019 2020 Total
L159 4 3 16 4 9 9 22
L269 7 4 20 12 12 7 31
L376 7 7 20 3 9 4 16
Total 24 18 14 56 19 30 20 69
Inserção Prossional 2018 2019 2020 Total 2018 2019 2020 Total
Docente de Ensino Superior 3 4 7 14 10 17 13 40
Doutorando do PPGCI/Unesp 9 8 0 17 0 0 0 0
Doutorando no PPGCI80 0 4 4 0 0 0 0
Prossional da Informação 15 4 2 21 8 9 4 21
Outras 0 2 1 3 1 4 3 8
Total 27 18 14 59 19 30 20 69
Fonte: Elaboração própria a partir da informação extraída do Website do PPGCI/Unesp (2023).
Linha de pesquisa ‘Informação e Tecnologia’.
Linha de pesquisa ‘Produção e Organização da Informação’.
Linha de pesquisa ‘Gestão Mediação e Uso da Informação’.
8 Egressos do mestrado acadêmico do PPGCI/Unesp que ingressaram em outros Programas de Pós-graduação
em Ciência da Informação.
Carlos Cândido de Almeida & Mariana Vitti-Rodrigues
124
O número de defesas realizadas pelos discentes do doutorado e mes-
trado no PPGCI/Unesp de 2018 a 2020 espelha os esforços conjuntos dos
atores do Programa em coerência com as linhas de pesquisa, disciplinas,
grupos de pesquisa etc., que possibilitaram a posterior inserção dos egres-
sos no mercado de trabalho.
Em relação ao Mestrado Acadêmico no período entre 2018 e 2020,
as Linhas de Pesquisa 2 e 3 foram as mais produtivas, com um cumulativo
de 20 (vinte) defesas por linha, num universo de 56 (cinquenta e seis) defe-
sas. Em relação a esse quantitativo, vale destacar a quantidade de docentes
distribuídos por linha, sendo que a Linha 2 possui maior quantidade de
docentes do que as outras linhas.
No quesito doutorado entre 2018 e 2020, a Linha 2 também foi a
mais produtiva, com um cumulativo de 31 (trinta e uma) defesas, seguida
da Linha 1 (um) com um cumulativo de 22 (vinte e duas) defesas, num
universo de 69 (sessenta e nove) defesas.
Um dos principais objetivos do PPGCI/Unesp é formar docentes e
profissionais da informação de excelência para atuarem nas Instituições de
Ensino Superior (IES) brasileiras, e este propósito encontra acolhimento
com a inserção profissional dos egressos do Programa nas mais variadas IES
e áreas de trabalho em que atuam os profissionais da informação formados
no PPGCI/Unesp.
A Tabela 1 (um) apresenta um total de 40 (quarenta) egressos do
doutorado e mestrado do PPGCI/Unesp (2018-2020) que atualmente es-
tão vinculados a IES na função de docente, gestor acadêmico e/ou peda-
gógico de programas de pós-graduação em Ciência da Informação. A este
número acrescenta-se 17 (dezessete) egressos do mestrado que continua-
ram a ligação com o PPGCI/Unesp cursando o doutorado acadêmico, e
4 (quatro) egressos do mestrado que estão cursando doutorado em outros
programas de pós-graduação em Ciência da Informação.
Vários egressos atuam como profissionais da informação nas mais va-
riadas organizações brasileiras totalizando de 21 (vinte e um) profissionais
capacitados pelo PPGCI/Unesp. A excelência do programa pode ser ava-
Estudos pluridisciplinares da informação: ciência da informação, ética e linguagem - nº 3
125
liada a partir do cruzamento destes elementos e sustentam que o Programa
é um autêntico sistema de organização do conhecimento.
O terceiro e último eixo de análise se fundamenta no ensino de dis-
ciplinas idealizadas pelos docentes e a produção científica dos docentes
permanentes do PPGCI/Unesp. O agrupamento de professores, pesquisa-
dores e discentes em contextos de produção de conhecimento, propicia o
aprofundamento de temáticas disciplinares, uma vez que os esforços inte-
lectuais e criativos deste grupo social se tornam mais concretos e profundos
na realização do trabalho acadêmico. O conjunto de disciplinas lecionadas
no PPGCI/Unesp parece orientar-se pelos interesses de pesquisa dos do-
centes vinculados ao Programa, visto que grande parte das disciplinas car-
rega as marcas dos projetos intelectuais de seus mentores.
O PPGCI/Unesp, além de apresentar disciplinas que espelham os
interesses intelectuais de seus professores, garante a coerência da formação
de docentes, pesquisadores e profissionais de excelência, por conta da or-
ganização de disciplinas em linhas de pesquisas.
Os discentes são orientados por professores do Programa com inte-
resses de pesquisa definidos que, por sua vez, alimentam as ideias projeta-
das pelos discentes em seus projetos de tese e dissertação. Neste quesito,
boa parte dos estudantes são convidados a integrar o foco intelectual de
seus orientadores, por estes serem guias e autoridades nas áreas de pesquisa
em que atuam. É difícil para um estudante, mesmo que seja independente,
fugir das marcas intelectuais de seu orientador.
Apesar de este trabalho assumir que existe uma relativa indepen-
dência dos estudantes, no que concerne a centralidade de intelectuais que
se tornam guias ou mestres e que os participantes do campo científico ou
paradigma os seguem sem questionar, portanto, contrariando os postula-
dos de Bourdieu (2004) e Kuhn (2009), sabe-se que estes postulados se
relacionam a estruturas paradigmáticas, em que o antigo já não consegue
responder aos problemas emergentes do campo ou disciplina como defen-
de Bachelard (1996), precipitando rupturas, originando a criação de novos
conhecimentos, teorias, conceitos e métodos.
Carlos Cândido de Almeida & Mariana Vitti-Rodrigues
126
O PPGCI/Unesp conta atualmente na estrutura curricular com um
universo de 62 (sessenta e duas) disciplinas, distribuídas nos cursos de dou-
torado e mestrado acadêmico. As disciplinas também estão distribuídas nas
linhas de pesquisa do Programa, e o número de disciplinas pode aumentar,
dependendo das necessidades do Programa e da disponibilidade dos pro-
fessores. Os professores do programa têm liberdade e iniciativa para criar
disciplinas, isto é, quando se verificam lacunas ou emergência de novos
problemas há a necessidade de se criar disciplinas que respondam aos no-
vos desafios disciplinares.
A produção intelectual dos docentes permanentes do PPGCI/
Unesp indexados no BENANCIB, se constitui em um contínuo de in-
dagações individuais dos docentes, bem como enquanto pesquisadores de
temáticas associadas às disciplinas que lecionam, aos projetos de pesquisa
que desenvolvem e aos interesses profissionais em que participam, visando
a formação de orientandos, no intuito de produzir conhecimento associa-
do às disciplinas, teses e dissertações.
Nesse contexto, boa parte da produção intelectual indexada no
BENANCIB é oriunda do esforço coletivo, isto é, da pesquisa de docentes
e discentes, evidenciando que o ENANCIB, enquanto espaço de divulga-
ção de pesquisa em andamento, constitui-se majoritariamente de trabalhos
coletivos.
Destacam-se nesta base de dados, trabalhos individuais de docen-
tes permanentes do Programa, nomeadamente: Maria Leandra Bizello
(2010); Ricardo César Gonçalves Sant’ana (2013); José Eduardo Santarém
Segundo (2015); Cláudio Marcondes de Castro Filho (2003); Marta Lígia
Pomim Valentim (1997); Oswaldo Francisco de Almeida Júnior (2008);
Mariângela Spotti Lopes Fujita (2006); Carlos Cândido de Almeida
(2010); Walter Moreira (2021). Dos 191 (cento e noventa e um) artigos
indexados na BENANCIB, só 10 (dez) trabalhos são de autoria única dos
docentes permanentes do PPGCI/Unesp. Vale destacar algumas produ-
ções envolvendo parcerias entre docentes permanentes do Programa e en-
tre docentes permanentes do Programa e docentes de outros Programas,
nomeadamente: Giulia Crippa; Ieda Pelógia Martins Damian (2021);
Maria José Vicentini Jorente; Telma Campanha de Carvalho Madio;
Estudos pluridisciplinares da informação: ciência da informação, ética e linguagem - nº 3
127
Plácida Leopoldina Ventura Amorim da Costa Santos (2008); Ricardo
César Gonçalves Sant’ana; Plácida Leopoldina Ventura Amorim da Costa
Santos (2009); José Eduardo Santarém Segundo; Silvana Aparecida
Borsetti Gregório Vidotti (2010); Ely Francina Tannuri de Oliveira;
Maria Cláudia Cabrini Grácio (2009); Maria Claudia Cabrini Grácio; Ely
Francina Tannuri de (2010); Maria Claudia Cabrini Grácio; Ely Francina
Tannuri de Oliveira (2013); Marco Antonio Almeida; Cláudio Marcondes
de Castro Filho (2010).
A produção de textos para o ENANCIB testemunha que, boa parte
da produção é de natureza coletiva, envolvendo docentes permanentes e
seus orientandos, bem como constitui um espaço de formação intelectual
dos discentes envolvidos nas atividades de pesquisa no Programa. Além
de ser um lugar de exposição de pesquisas científicas em andamento, o
ENANCIB proporciona uma atmosfera de sedimentação de temáticas de-
senvolvidas nas disciplinas, projetos de pesquisa, grupos de pesquisa, teses
e dissertações, envolvendo docentes e discentes do Programa.
Dos 191 (cento e noventa e um) trabalhos de docentes e discen-
tes do Programa, 173 (cento e setenta e três) trabalhos são produções co-
laborativas, envolvendo docentes permanentes e discentes. Este número
demonstra a participação ativa dos discentes no processo de produção de
conhecimento no âmbito do Programa, assim como no campo de pesquisa
da Ciência da Informação brasileira. A presente pesquisa foi realizada entre
05 de Agosto de 2023 a 27 de Setembro de 2023.
5 considEraçõEs finais
A arqueologia do saber de Foucault (2010) oferece uma perspectiva
para a análise do conhecimento humano, e tem implicações profundas no
que se refere ao percurso intelectual. Parte-se do pressuposto de que o co-
nhecimento é histórico e contingente, ou seja, ele não é uma representação
objetiva e universal da realidade, mas sim uma construção cultural que
varia ao longo do tempo e de acordo com contextos específicos.
Carlos Cândido de Almeida & Mariana Vitti-Rodrigues
128
Nessa perspectiva, é necessário examinar as diferentes formações dis-
cursivas que surgem em distintos momentos históricos, pois se constituem
em conjuntos de compreensões que, por sua vez, geram discursos e práticas
que se consolidam na medida em que são compartilhadas e/ou dissemina-
das por meio da produção científica. A arqueologia do saber propõe uma
análise das formações discursivas, objetivando identificar as relações de po-
der que estão envolvidas na produção de conhecimento.
No contexto do percurso intelectual, a arqueologia do saber implica
que não há uma linha direta e progressiva de desenvolvimento do pensa-
mento humano, mas sim uma multiplicidade de formações discursivas que
coexistem e competem em diferentes momentos históricos. Isso significa
que o percurso intelectual de um indivíduo ou de uma determinada comu-
nidade científica não é linear, mas sim um mosaico complexo de influên-
cias, mudanças e rupturas.
Nesse sentido, vale destacar que o poder está presente em todas as
formações discursivas e estas influenciam a constituição de teorias, concei-
tos, métodos e tendências, ou seja, o percurso intelectual de um indivíduo
ou de um grupo de indivíduos está inter-relacionado às estruturas de poder
de sua época.
A arqueologia do saber de Foucault (2010) nos convida a refletir
sobre a construção de conhecimento em suas múltiplas dimensões, uma
vez que há implicações profundas na maneira que entendemos a natureza
do conhecimento e a dinâmica do pensamento humano.
A proposta de Bachelard (2006) se concentrou na Epistemologia,
em especial na Filosofia do Conhecimento Científico, cuja contribuição é
significativa para se compreender o percurso intelectual humano, no con-
texto da geração de conhecimento científico.
Nessa perspectiva, destaca-se a ruptura epistemológica, momentos
em que teorias e conceitos passam por transformações e mudanças na ma-
neira com que os pesquisadores discutem seus objetos e fenômenos de
pesquisa; o racionalismo do obstáculo em que o pesquisador se depara com
preconceitos, crenças errôneas e concepções ingênuas que, por sua vez, in-
fluem negativamente na construção de conhecimento científico.
Estudos pluridisciplinares da informação: ciência da informação, ética e linguagem - nº 3
129
Além disso, Bachelard (1996, 2006) explorou a ideia de que diferen-
tes disciplinas científicas têm estruturas epistemológicas distintas, portan-
to, essas características moldam o percurso intelectual dos pesquisadores.
No âmbito da Ciência da Informação, considerada uma Ciência interdis-
ciplinar, esse aspecto é determinante para a ampliação da visão científica,
bem como para a compreensão da complexidade de objetos e fenômenos
pesquisados no campo. A contribuição de Bachelard é essencial para com-
preender a complexidade do processo de pesquisa científica.
Acredita-se que foi possível demonstrar, a partir dos dados e análises
aqui realizadas, a arqueologia do saber no percurso intelectual do Programa
de Pós-graduação em Ciência da Informação da Unesp. Parte significativa
dos egressos do PPGCI/Unesp tem alimentado os mais diversos Programas
de Pós-graduação em Ciência da Informação, de outros subsistemas de
ensino no Brasil e no exterior, bem como em diversas organizações de
vários sectores de atividade, atuando como profissionais da informação.
Ademais, o impacto do PPGCI/Unesp é notório na participação dos do-
centes e egressos em organizações profissionais e acadêmicas do Brasil e
do exterior, demonstrando a inserção intelectual, profissional, acadêmica e
associativa do Programa no âmbito nacional e internacional.
rEfErências
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131
4
CARTOGRAFIAS
ANTIEPISTEMICIDAS EM
BIBLIOTECONOMIA E CIÊNCIA
DA INFORMAÇÃO DESDE ÁFRICA:
EPISTEMOLOGIA DECOLONIAL
A PARTIR DA REPÚBLICA
DEMOCRÁTICA DO CONGO
ANTIEPISTEMICIDE
CARTOGRAPHIES IN LIBRARY
AND INFORMATION SCIENCE
FROM AFRICA: DECOLONIAL
EPISTEMOLOGY FROM THE R
DEMOCRATIC EPUBLIC OF CONGO
Gustavo Silva SALDANHA
IBICT
saldanhaquim@gmail.com
https://orcid.org/0000-0002-7679-8552
https://doi.org/10.36311/2025.978-65-5954-635-0.p131-170
Carlos Cândido de Almeida & Mariana Vitti-Rodrigues
132
Resumo: A epistemologia em Biblioteconomia e Ciência da Informação (BCI) tem, em
suas bases estudadas em diferentes partes do mundo, uma constituição epistemológica a
partir de e sobre África. Sua repercussão e a força das ideias desenvolvidas em milhares
de anos até a produção africana no século XXI é, no entanto, gradativamente apagada,
século a século, até a última virada de milênio, dentro dos processos de violência da
colonialidade. Estudos de epistemologia histórica e a práxis de teoria crítica e decolonial,
por exemplo, podem contribuir para redimensionar o espírito cartográfico de ideias no
campo. A pesquisa responde pelo projeto “Cartas filosófico-epistemológicas em Ciência
da Informação: cartografias narrativas das teorias da informação do século XXI para
ciência, sociedade e inovação”, sob fomento da Chamada CNPq Nº 04/2021 - Bolsas
de Produtividade em Pesquisa do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e
Tecnológico (CNPq). O corpus da atual etapa da pesquisa é constituído a partir das
consultas ao Fundo Meyriat e ao Fundo Estivals, com foco na Revue de Bibliologie e
sua doxografia. O desenvolvimento do recorte desta etapa da pesquisa nos leva ao papel
teórico-metodológico da Bibliografia como estrutura econômico-política na formação do
pensamento epistemológico colonialista a partir da questão da República Democrática
do Congo, como um território arquetípico, ao mesmo tempo que nos permite refletir
a decolonialialidade e antiepistemicídio em Biblioteconomia e Ciência da Informação a
partir do pensamento de autorias de África.
Palavras-chave: Epistemologia histórica; Biblioteconomia e Ciência da Informação;
Decolonialidade; Epistemicídio; Bibliografia.
Abstract: Library and Information Science (BCI) epistemology has, therefore, in its bases
studied in different parts of the world, an epistemological constitution from and about
Africa. Its repercussion and the strength of ideas developed over thousands of years until
African production in the 21st century is, however, gradually erased, century by century,
until the last turn of the millennium, within the processes of violence of coloniality. Studies
of historical epistemology and the praxis in critical and decolonial theory, for example, can
contribute to reshaping the cartographic spirit of the ideas in the field. e research responds
to the project “Philosophical-epistemological letters in Information Science: narrative
cartographies of 21st century information theories for science, society and innovation”,
supported by CNPq Call No. 04/2021 - Research Productivity Grants from the National
Council of Scientific and Technological Development (CNPq - Brazil). e corpus of
the current stage of research is made up of consultations with the Meyriat Fund and the
Estivals Fund, focusing on the Revue de Bibliologie and its doxography. e development
of this stage of research leads us to the theoretical-methodological role of Bibliography as an
economic-political structure in the formation of colonialist epistemological thought based
on the question of the Democratic Republic of Congo, as an archetypal territory, at the
same time that it allows us to reflect decoloniality and anti-epistemicity in Library Science
and Information Science based on the thoughts of African authors.
Keywords: Historical epistemology; Library and Information Science; Decoloniality;
Epistemicide; Bibliography.
Estudos pluridisciplinares da informação: ciência da informação, ética e linguagem - nº 3
133
1 introdução
Si l’Égypte est le pays de la bibliothèque d’Alexandrie, elle est aussi
le lieu d’organisation le plus vieux de la formation dans le domaine
de l’écrit et de la communication écrite en Afrique. (Bobutaka
Bateko, 2014, p. 139).
No início, era a estrutura epistemológica de África. É via o Egito e
territórios afins, como nos leva a reconhecer Bobutaka Bateko (2014) e a
literatura sobre a história das inscrições, que repertoriamos a construção
de nossas ideias em torno da escrita, do registro do conhecimento, de sua
preservação, da sua organização e, centralmente, de seu poder político nas
relações de circulação dos saberes. Em outras palavras, a epistemologia e a
economia política no campo dos registros do conhecimento têm em África
parte fundamental de suas primeiras fontes de metarreflexão e de práxis
para o exercício cartográfico das ideias. Não se trata, pois, de lançar e/ou
de enumerar uma frente nascitura. O exercício histórico está aqui, à escuta,
por exemplo, de Joseph Cimbalanga Mulamba (2014), reconhecer fontes
de nossa formação científica de África para o mundo, incluindo a co-consti-
tuição no e para o século XX nos estudos biblioteconômico-informacionais.
A epistemologia em Biblioteconomia e Ciência da Informação (BCI)
tem, pois, em suas bases estudadas em diferentes partes do mundo, uma
constituição epistemológica a partir de e sobre África. Sua repercussão e a
força do pensamento desenvolvidas em milhares de anos até a produção
africana no século XXI é, no entanto, gradativamente apagada, século a
século, até a última virada de milênio. Estudos de epistemologia histó-
rica e a práxis de teoria crítica e decolonial, por exemplo, podem contri-
buir para redimensionar o espírito cartográfico de ideias no campo. Por
exemplo, encontramos, segundo Dominique Hado Zidouemba (2013),
o papel revolucionário de Al-Kalkashandi. Com o trabalho bibliográfico
deste pesquisador tem-se, no século XV, a existência de uma geral teoria
da bibliologia em seu trabalho intitulado Sobh al’achá fi sin’at al-incha (Le
matin de l’héméralope ou l’art de la rédaction – “A manhã da ‘cegueira’ [ou
cegueira noturna] ou a arte da redação). (Hado Zidouemba, 2013). Esse
Carlos Cândido de Almeida & Mariana Vitti-Rodrigues
134
movimento de redimensionamento cartográfico é o exercício epistemoló-
gico-histórico proposto nesse texto.
A pesquisa responde pelo projeto “Cartas filosófico-epistemológicas
em Ciência da Informação: cartografias narrativas das teorias da informa-
ção do século XXI para ciência, sociedade e inovação”, pesquisa científica
sob fomento da Chamada CNPq Nº 04/2021 - Bolsas de Produtividade
em Pesquisa – Nível 1 – C - do Conselho Nacional de Desenvolvimento
Científico e Tecnológico (CNPq). O projeto realiza uma incursão teórica,
conceitual e bibliográfica sobre a filosofia da informação (ou seja, a cons-
trução de ideias e de conceitualidades para o plano epistemológico de re-
forma contínua de nossa episteme) constituída em BCI no século XXI, com
vistas à compreensão de seu impacto aplicado nos âmbitos social, cultural e
político na realidade contemporânea via suas transformações sociotécnicas.
As “Cartas filosófico-epistemológicas em Ciência da Informação
procuram tecer o mapa teórico-conceitual de construção de nosso pen-
samento sobre a informação via a produção científica em BCI orientada
para os aportes filosóficos e epistemológicos. O objetivo geral do projeto
em curso é constituir a cartografia narrativa filosófica e epistemológica,
sob a base da historicidade das ciências humanas e sociais, da filosofia da
informação tecida em BCI no contexto do século XXI.
Os caminhos desse recorte do estudo nos levam ao “coração” de
África, mais centralmente ao Congo, e à metodologia bibliográfica da co-
lonialidade como parte da reflexão para os estudos decoloniais e antie-
pistemicidas. Como aponta Cimbalanga Mulamba (2014), a bibliografia
geológica e da mineração do Congo Belga como ciência da escrita constitui
uma das ciências semiológicas do signo da escrita. Do mesmo modo, sua
teoria e sua expressão sistemáticas representam uma das ciências documen-
tais e midialógicas que abordam o suporte. No território da escrita como
uma categoria específica de sistemas de signos, a bibliografia geológica e da
mineração construiu historicamente os índices dos diferentes recursos mi-
nerais através dos símbolos e fórmulas, como os quatro minérios, a saber:
minério de ouro (Au), minério de cobre (Cu), minério de estanho (Sn) e
minério de zinco (Zn).
Estudos pluridisciplinares da informação: ciência da informação, ética e linguagem - nº 3
135
A cartografia da epistemologia biblioteconômico-informacional
aqui tecida segue os pressupostos de Cimbalanga Mulamba (2014) e Jean-
Pierre Manuana-Nseka (2014) de que toda a produção do conhecimento
em seus registros antevê as estruturas econômicas, ideológicas e políticas
que a conformam. Nesse sentido, como expressão econômico-política da
realidade, a bibliografia, antes de se constituir como estrutura para for-
mação do Instituto Internacional de Bibliografia, uma das bases da Liga
das Nações e da futura Organização das Nações Unidas (ONU), como
potencial instrumento de paz em seu pretenso renascedouro na segunda
metade do século XIX, ou, ainda, como solo para o desenvolvimento epis-
temológico em BCI, ela, a bibliografia, é um método objetivo, científico,
empírico, de colonialidade.
2 plano tEórico-mEtodológico das cartografias
[...] si la bibliologie est une part intégrante des SIC, tout chercheur
se réclamant de ce champ est obligé de prendre en compte les
acquis épistémologiques des SIC; plus concrètement, il faudrait
s’imprégner de l’ensemble des acquis théoriques généraux de ce
domaine. (Tambwe Kitenge, 2014, p. 129)
O corpus desta atual etapa da pesquisa é constituído a partir das
consultas ao Fundo Meyriat e ao Fundo Estivals, com foco na Revue de
Bibliologie e sua doxografia. O primeiro responde pela coleção que tem
Viviane Couzinet como legatária, disponível na École Nationale Supérieure
de Formation de l’Enseignement Agricole (Ensfea), em Toulouse, França.
Completa o primeiro levantamento os dados coletados no Centre de docu-
mentation et de recherche en sciences humaines et sociales (CDRSHS-UPS) do
Laboratoire d’Études et de Recherches Appliquées en Sciences Sociales (Lerass).
O segundo Fundo consultado responde pela visita e coleta de dados
na Maison de l’Écrit, em Noyers-sur-Serein, França, instituição criada por
Robert Estivals, Danièle Estivals e os teóricos ativistas do movimento crí-
tico no campo informacional francês a partir dos anos 1960, de tradição
marxiana, com grande repercussão no Leste Europeu e nas nações africanas
Carlos Cândido de Almeida & Mariana Vitti-Rodrigues
136
francófonas. Essa corrente procura trazer o confronto e as relações entre as
obras, por exemplo, de Nicolas Roubakine e de Karl Marx, para um mo-
delo de diagnóstico informacional dos fenômenos sociais. Como lembra
Bob Bobutaka Bateko (2010), da Université de Kinshasa, Congo, a Maison
representa o legado de uma vasta produção epistemológica constituída ao
longo de cinquenta anos pelo trabalho de Estivals e o grupo de vanguar-
distas esquematológicos.
Do ponto de vista dos corpora, o recorte das fontes retiradas dos
Fundos Jean Meyriat e Robert Estivals, a noção de África nesse estudo está
centrada no quadro da colonialidade francófona que nos revela o exercício
crítico da decolonialidade, ou seja, já parte do recorte dos cerca de 40 (qua-
renta) países e territórios do continente que comungam do idioma francês.
O desenvolvimento da perspectiva de recorte nos leva, por questões eco-
nômico-políticas na formação do pensamento epistemológico colonialista
em BCI no mundo, para a questão da República Democrática do Congo,
como um entreposto (não único) arquetípico para refletir, na “outra mar-
gem do rio”, a frente teórico-metodológica decolonial e anti-epistemicida.
De todo modo, aponta-se como parte do mapeamento do corpus, a produ-
ção em BCI em Egito, Argélia, Madagascar, Camarões, Tunísia, Costa do
Marfim, Senegal, Mali. Como parte do ativismo bibliográfico de objeto e
conteúdo dessa pesquisa, optamos aqui por trabalhar apenas e tão somente
com autorias oriundas e dedicadas à África.
No plano terminológico, uma questão relevante no âmbito do corpus
da pesquisa está na compreensão dos estudos comparados e na perspectiva do
olhar sobre o outro, especificamente, no uso macroconceitual da disciplina
em diferentes tradições. A produção africana, em diálogo com o histórico da
colonialidade do vocabulário internacional, nesse caso, centralmente, a fran-
cofonia oriunda, de um lado, da terminologia de Gabriel Peignot, Nicolas
Roubakine e, de outro lado, a terminologia da teoria do conhecimento de
Paul Otlet, bem como os modelos de institucionalização do campo biblio-
teconômico-informacional na França, responde por conceitos na linha da
historicidade como, respectivamente, bibliologie, documentation e sciences de
l’information et de la communication, science de l’écrit, na direção (na medida
Estudos pluridisciplinares da informação: ciência da informação, ética e linguagem - nº 3
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em que o processo de formalização institucional da pós-graduação avança)
dos estudos de information scientifique et technique (IST).
Ainda no plano terminológico, em razão da tradição da colonialida-
de co-fundadora de tradições em África, tais termos encontrarão lugar de
representante terminológico da macroárea ou área ou subárea do conhe-
cimento em cada país de África, representando, guardadas as condições
sociopolítico-pedagógicas de cada país, aquilo que no Brasil se constituiu
entre graduação e pós-graduação sob os termos “biblioteconomia”, “ciên-
cia da informação”, “documentação” ao longo do século XX. As verossimi-
lhanças, não sendo identitárias, guardam, nas diferentes demarcações para
estudos comparados, o desenvolvimento aproximado em seu conjunto de
relações institucional, pedagógico e científico do campo a partir dos estu-
dos em Biblioteconomia. Como observa Eddie Tambwe Kitenge (2014,
p. 129), “cette prédominance de la bibliothéconomie n’est pas un travers
typiquement congolais: elle trahirait un travers historique général que con-
naissent la plupart des pays (France, Belgique, Canada, pays du Maghreb,
etc.)”. Essa posição, da formação a partir de grupos de docentes, de depar-
tamentos e de escolas de Biblioteconomia e também da própria titulação
de “bibliotecário(a)”, pode ser vista igualmente em Jean-Pierre Manuana-
Nseka (2014).
Como aponta Bob Bobutaka Bateko (2014) para o caso do Congo,
os termos bibliologie, de origem epistemológica vinculada aos usos de
Gabriel Peignot, Nicolas Roubakine e Paul Otlet, e a expressão sciences de
l’information et de la communication, vinculada à tradição colonial francesa
de institucionalização do campo, demonstram os usos de cobertura das
ações acadêmico-científico-profissionais na tradição congolesa.
La formation universitaire et la recherche scientifique constituent
les piliers fondamentaux pour la survie et la pérennisation d’une
Entreprise scientifique. C’est ainsi que la Bibliologie qui est un
domaine des sciences de l’information et de la communication a
aussi comme point d’ancrage pédagogique « l’Institut Supérieur de
Statistique de Kinshasa » en République Démocratique du Congo.
(Bobutaka Bateko, 2014, p. 137)
Carlos Cândido de Almeida & Mariana Vitti-Rodrigues
138
Em outras palavras, a vastidão das expressões macro-epistêmicas de
nomenclaturas do campo representa em África também parte de sua plura-
lidade, abrangendo um conjunto estável, porém localmente reconstituído,
de conceitos e de práticas em torno de noções como livro, documento,
informação, a partir das institucionalizações da Biblioteconomia.
3 primEiras cartografias dE um itinErário dEcolonial:
contornos do mapa dE uma “Escola críticadEsdE áfrica
através dos fios da bibliografia
L’histoire des sciences montre en effet que le destin d’une discipline
scientifique ne tient pas uniquement à la cohérence de son
programme intrinsèque: elle montre qu’il dépend également de la
capacité personnelle des chercheurs à organiser la recherche au plan
institutionnel. Eddie (Tambwe Kitenge, 2014, p. 130).
Do ponto de vista epistemológico, para aquém e além das expres-
sões terminológicas, como nos permite problematizar Tambwe Kitenge
(2014), a compreensão das “escolas” em “Ciências da Informação e da
Comunicação”, com foco em BCI (quando observadas as verossimilhanças
das matrizes curriculares e, não, identidades), permite-nos identificar que a
existência de espaços de construção e de registro de ideias (de “escolas” em
formação) não depende apenas da presença de pessoas pesquisadoras em
um dado contexto histórico. A formação de uma “escola” está subordinada
à produção e à partilha de um mesmo paradigma, de um conjunto de for-
ças de resistência epistêmica e política, dentro de um contexto social mais
amplo, ou seja, político, econômico, cultural. Essas forças virão determinar
os princípios e os conceitos fundamentais de uma dada corrente epistemo-
lógica, ou de uma escola a ser constituída.
Com Jean-Pierre Manuana-Nseka (2014), nós podemos observar
o olhar crítico na formação de ideias de tais “escolas” de África na epis-
temologia em BCI dos estudos biblioteconômico-informacionais. Para
Manuana-Nseka (2014), o denominador comum da formação do pensa-
mento a partir do Congo está na teoria da bibliologia política, centralmen-
Estudos pluridisciplinares da informação: ciência da informação, ética e linguagem - nº 3
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te a relação entre poder e comunicação, desdobramento crítico do hori-
zonte da presente cartografia, ou seja, uma perspectiva crítica e decolonial.
O debate deste olhar sobre as escolas epistemológicas africanas no
espelho do Congo nos leva à reflexão histórico-materialista acerca da es-
trutura epistemológica epistemicida, entre o ouro e a escrita, que sustentou
a própria criação do discurso materializado em BCI no século XIX e no
século XX, a partir do processo colonizador e das práticas de massacre, de
saque, de extermínio dos saberes (como exemplo, pode-se rememorar as
riquezas que virão sustentar o desenvolvimento das coroas europeias no
século XIX, como Reino Unido e Bélgica, França e Alemanha, sustentando
a constituição de projetos democráticos liberais e ditaduras do território
informacional para o universo macropolítico internacional). Nesse sentido
econômico-político, pode-se observar forças que estruturaram a constitui-
ção de organizações como Instituto Internacional de Bibliografia – IIB –,
a Liga das Nações, de 1919, e a ONU, de 1948, frutos diretos do acúmulo
do capital oriundo de África (dentre outros territórios coloniais) e, em
particular, como aqui debatido, do Congo.
O caminho crítico encontra diferentes abordagens dialéticas para
uma decolonialidade não só da perspectiva de África para África, mas
África-mundo. Centralmente, encontramos em Joseph Cimbalanga
Mulamba (2014), a perspectiva de construção de uma dada episteme e suas
escolas na Europa claramente sustentadas pela posição da bibliografia da
mineração (integrando dialeticamente uma aparente distância empírica
entre ouro e urânio, de um lado, palavra e palavras sistematizadas – biblio-
grafias –, de outro lado). Em termos objetivos, via a bibliografia geológica
e da mineração do Congo Belga de 1885 a 1960 encontramos, no plano
econômico-político, uma ferramenta de informação e comunicação para
as potências coloniais europeias, incluindo para as políticas multilaterais,
como a que refletirá a futura construção da ONU.
Como demonstra Cimbalanga Mulamba (2014), a Bibliografia
Geológica de Mineração do Congo Belga de 1885 a 1960 constitui-se um
instrumento de informação e comunicação para as potências coloniais eu-
ropeias. Essa bibliografia serviu ao poder colonial em suas mais distintas
formas. A bibliografia econômico-política aqui lançada desde a primeira
Carlos Cândido de Almeida & Mariana Vitti-Rodrigues
140
bibliografia malgache (ou relativo à República Malgache, ou seja, a atual
República Democrática de Madagascar, ou, ainda, referente a quem é seu
natural ou habitante; o povo madagascarense, sua cultura, sua formação
social) serviu a missionários e cientistas estrangeiros, pelas necessidades de
evangelização e pelas descobertas de novas terras do espírito colonialista.
Cimbalanga Mulamba (2014) argumenta que, em todos os momen-
tos, o setor da mineração é sempre apresentado como uma alavanca privile-
giada para o crescimento e a redução da pobreza pelas instituições financei-
ras internacionais. A literatura histórica e econômica sobre este tema que
demonstra a importância da economia mineira na estruturação das socie-
dades modernas – do ouro aos recursos minerais que sustentam as revolu-
ções cibernéticas a partir de 1930 – ou seja, essa posição vai dar sustentação
econômica da estrutura informacional do Estado na Modernidade Tardia
do século XIX com o ouro e outros metais, às cibernéticas de primeira e
segunda ordem, no século XX e na virada para o século XXI, com o urânio,
por exemplo.
No mesmo argumento dialético, Eddie Tambwe Kitenge (2014)
aponta que, dentro de sua meta-análise crítica da formação de uma
escola epistemológica” em BCI em África, centralmente, em seu corpo
sócio-epistêmico-empírico no contexto da República Democrática
do Congo, é necessário que toda a comunidade vinculada aos estudos
biblioteconômico-informacionais reconheça a produção congolesa como
conquista epistemológica no período de 1980 à década de 2010. Esse
exercício nos leva ao mergulho nos marcos de formação do pensamento
em BCI de África ao Congo, do Congo ao mundo.
3.1 da formação dE pEssoas à construção dE idEias dEsdE a
colonialidadE
Sob o olhar de Bob Bobutaka Bateko (2014), compreendemos que
a formação universitária e a investigação científica são os pilares funda-
mentais para a sobrevivência e sustentabilidade de uma tradição científica.
É assim que a Bibliologia, segundo a terminologia epistêmica da BCI no
Congo, virá se constituir entre pessoas, sistemas, instituições. No plano
Estudos pluridisciplinares da informação: ciência da informação, ética e linguagem - nº 3
141
histórico, segundo o autor, alguns marcos são fundamentais nesse processo
de formação das escolas africanas em BCI, como
Em 1953, em Ibadan, Nigéria, durante o “Seminário sobre o
Desenvolvimento de Bibliotecas Públicas em África”, foi levan-
tada a necessidade de proporcionar formação profissional tendo
em conta as especificidades das bibliotecas africanas;
Em 1961, em Adis Abeba, na Etiópia, durante a “Conferência
dos Chefes de Estado Africanos sobre o Desenvolvimento da
Educação em África”, a Unesco insistiu na criação de centros
regionais e nacionais;
Em 1962, foi criado no Senegal o Centre Régional de Formation
des Bibliothécaires (CRFB);
Em 1967, o CRFB passará a ser desenvolvido via o decreto n.
67 / 1.235 de 15 de novembro de 1967, tornando-se a École
des Bibliothécaires, Archivistes et Documentalistes, com status de
instituto universitário;
Em 1970, durante a “Reunião sobre o Planejamento Nacional
dos Serviços de Documentação e Bibliotecas em África”, reali-
zada em Kampala, na Uganda, de 7 a 15 de dezembro, sob a
direção da Unesco, constatou-se que o número de bibliotecários
qualificados em África era insuficiente;
Em 1977, a República Democrática do Congo, após a forma-
ção desta disciplina científica organizada pela primeira vez no
Departamento de História das Universidades de Kinshasa e
Lubumbashi com os cursos de Biblioteconomia e Arquivologia,
começou a organizar estudos académicos e a formação les Sciences
de l’Information et de la Documentation no Institut Supérieur de
Statistique de Kinshasa;
Em Camarões, na Ecole Supérieure des Sciences et Technologies de
l’Information et de la Communication (ESSTIC), criada em 1982,
organiza-se formação em documentação e arquivística.
Carlos Cândido de Almeida & Mariana Vitti-Rodrigues
142
Na Costa do Marfim, em 1987, ocorre a abertura do Département
des Sciences de l’Information Documentaire, com sede em Abidjan.
(Bobutaka Bateko, 2014)
O recorte bobutaka-batekiano acima demonstra parte dos marcos
do percurso de cerca de 70 (setenta) anos de institucionalização em BCI
na África, sob o fomento da colonialidade de fruto histórico (pré-sécu-
lo XX) e da presença da Unesco em sua organização e desenvolvimen-
to já no decorrer do “Novecentos”. Outras travessias acadêmico-cien-
tíficas revelam caminhos semelhantes (ainda que não identitários). Por
exemplo, no contexto da Argélia, Rabah (2015) aponta que a criação,
sob a tutela do Ministério da Informação e Cultura da época (1964),
do Diploma Superior de Bibliotecários-Assistentes (DTBA) constitui a
primeira experiência no país para a formação no domínio da formação
em Biblioteconomia. Em 1975, tem-se, na Université d’Alger, o primeiro
Departamento de Biblioteconomia destinado à formação de bibliotecá-
rios, documentalistas e arquivistas no nível “licença”. Até a metade da
década de 2010, 11 (onze) dos 63 (sessenta e três) estabelecimentos de
ensino superior (universidades, centros universitários e grandes écoles, ou
seja, instituições acadêmicas fora do sistema universitário geral que se de-
senvolvem via concursos de estudantes) listados ao nível nacional ensina-
vam Biblioteconomia. Até 2015, Rabah (2015) aponta, o Departamento
de Biblioteconomia da Université d’Alger já havia diplomado 6.987 (seis
mil novecentos e oitenta e sete) pessoas profissionais bibliotecárias, do-
cumentalistas ou arquivistas.
No âmbito desse itinerário histórico-institucional, segundo Eddie
Tambwe Kitenge (2015), na abordagem da bibliologia política, o estudo
do modelo educativo, ou da instituição “de ensino”, é crucial: permite-nos
apreender os processos de criação das necessidades de consumo da escri-
ta num espaço histórico e dado nacional. A comunicação escrita tem, de
facto, uma particularidade: pressupõe uma capacidade de descodificação
da escrita. A travessia aqui passa pelo problema de aprender o código, de
estabelecer um modelo educativo de acordo com a ideologia dominante.
Estas razões tornam o estudo do sistema educativo, de cada regime político
Estudos pluridisciplinares da informação: ciência da informação, ética e linguagem - nº 3
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estudado, uma condição sine qua non para a análise do modelo bibliológi-
co correspondente em África e de África para o mundo.
Como aponta o pesquisador, a compreensão epistemológica dos fa-
tores sociais de construção do pensamento congolês em BCI não depende
de um olhar “de dentro do campo”. Trata-se de observar a formação sócio-
-histórica de uma dada ciência, nesse caso, a complexidade da constituição
das ciências sociais, dentro das quais está inserida a BCI. Os fundamentos
políticos que têm sustentado o funcionamento do sistema educativo e os
modos como um dado modelo educativo determinada as condições favo-
ráveis ao modelo dominante, colonialista, são claramente observados na
formação do campo, segundo Tambwe Kitenge (2015).
3.2 rotas africanas da dEcolonialidadE Em bibliotEconomia E
ciência da informação: as cartas do EpistEmicídio
Com Arab Abdelhamid (2014), podemos observar o princípio co-
lonial de formação e deformação do discurso local. Segundo o pesquisa-
dor, os primeiros trabalhos de investigação sobre a Argélia realizados pelos
franceses nos vários domínios remontam ao desembarque da força expe-
dicionária em 1830, quando uma constelação de estudiosos se interessou
pela primeira vez pelos estudos árabes, como a expedição ao Egito. No
domínio da escrita, foram realizadas pesquisas com o objetivo de locali-
zar, inventariar e explorar qualquer escrita suscetível de fornecer elementos
de informação ou de informação que permitisse a subjugação da “colô-
nia recém-conquistada”. Nas instruções elaboradas para a seção oriental
da “Escola Superior de Letras” de Argel, a “Academia de Escrita e Belas
Letras” recomendou a criação de um catálogo completo e, na medida do
possível, fundamentado das bibliotecas e coleções privadas da Argélia.
Como exemplo, como lembra Hado Zidouemba (2014), encontra-
mos o Senegal, um dos nove países da África Ocidental francófona, sendo
os outros 8 (oito), o Benin, o Burkina Faso, a Costa do Marfim, a Guiné, o
Mali, a Mauritânia, o Níger e o Togo. Anteriormente sob domínio colonial
francês, estes territórios, que se tornaram independentes a partir de 1960,
têm atualmente como objetivo principal a liquidação do subdesenvolvi-
Carlos Cândido de Almeida & Mariana Vitti-Rodrigues
144
mento e da construção de Estados modernos. Para conseguir isso, uma luta
central estava vinculada ao combate ao analfabetismo – sendo epistemolo-
gia e práxis em BCI forças centrais para a transformação. É a partir deste
foco que o nível científico, tecnológico e cultural dos povos conseguirá ele-
var-se através da criação (ou transferência) e difusão de conhecimento, sa-
ber-fazer e culturas mútuas. Como aponta Hado Zidouemba (2014), neste
processo, a comunicação escrita (especialmente livros e publicações) tem
um grande papel a desempenhar. Promover os livros e disponibilizá-los às
pessoas nas bibliotecas torna-se, a partir de então, uma prioridade, junto
aos dilemas da liberdade criativa das autorias e da reabilitação das culturas
e línguas nacionais para torná-las línguas literárias. Esse é o contexto socio-
político das condições nos territórios dos registros do conhecimento para o
desenvolvimento em BCI em cenários africanos.
3.3 uma Escola EpistEmológica congolEsa Em bibliotEconomia E
ciência da informação
Em um movimento epistemológico decolonial, Eddie Tambwe
Kitenge (2014) busca se questionar sobre a constituição de “escola congo-
lesa” em BCI – ou seja, da República Democrática do Congo (ou, ainda,
do Zaire – nomenclatura do território no período de 1971 a 1997 –, con-
texto da ditadura de Mobutu Sese Seko, que se sucedeu à independência
da coroa Belga na década de 1960). Para compreender as possibilidades de
um coletivo em torno de uma dada teoria do conhecimento, o pesquisador
nos convida, de um lado, a revisitar a Revolução Industrial na Europa e a
construção do discurso do “espírito científico”, donde parte a construção
das ciências sociais. Por outro lado, o autor aponta para os dilemas da
comunidade científica em torno do fenômeno dos meios de comunicação
que, durante o século XIX, assumiu uma magnitude sociológica sem pre-
cedentes (nomeadamente após o desenvolvimento da imprensa de grande
circulação e a reflexão teórica sobre o mesmo fenômeno diante de seus
impactos políticos). Esta era, que marca o nascimento da Sociologia, vê,
portanto, a “comunicação de massa” e as instituições informacionais se
tornarem um “problema social”. O próprio fenômeno resulta dos factos
conjugados da industrialização, do aumento dos processos intensivos de
Estudos pluridisciplinares da informação: ciência da informação, ética e linguagem - nº 3
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urbanização, da explosão demográfica, da diversificação dos fluxos migra-
tórios. Muitas pessoas pesquisadoras viriam, neste contexto, delinear as
bases teóricas sobre as quais se baseariam os primeiros estudos sobre os
meios de comunicação.
Ao buscar uma escola em BCI na República Democrática do
Congo, Eddie Tambwe Kitenge (2014) aponta para os primeiros traba-
lhos de “essência bibliológica”, vinculados à história da escrita no período
pré-colonialidade, centralmente demonstrados pelo trabalho de Kibanda
Mutungila, que dedicou uma tese de doutoramento ao assunto e o curso
sobre “História do livro”, em Kinshasa, Institut Facultaire des Sciences de
l’Information et de la Communication (IFASIC), 1988-1989, investigando
os sistemas de escrita e as formas de escrita.
Segundo Eddie Tambwe Kitenge (2014), três textos de acadêmicos
do país parecem prefigurar o que poderia ser definido como a “pré-histó-
ria da bibliologia” na República Democrática do Congo. Alguns notarão
a coincidência histórica: os três textos foram publicados no mesmo ano
(1979). O pesquisador lamenta que as pessoas bibliotecárias congolesas
prestem pouca atenção aos três textos, que são, de várias formas, os fun-
dadores da disciplina da formação e da epistemologia em BCI no país. O
primeiro texto é o livro de Pius Ngandu N’Kashama, sobre o fenômeno li-
terário no Zaire. As obras deste autor – que formalmente se enquadram na
crítica literária – abrem, no entanto, perspectivas para o estudo sistemático
da escrita, na medida em que objetivam de certa forma “o livro” como ma-
terial a ser analisado. Esta concepção levou Pius Pius Ngandu N’Kashama,
então professor de literatura na Universidade de Lubumbashi, a interessar-
-se pela situação da edição de livros no Zaire. Tambwe Kitenge (2014) afir-
ma que Ngandu N’Kashama é o primeiro acadêmico congolês a formular
temas desta natureza.
O segundo texto fundacional, apontado por Tambwe Kitenge
(2014), é de Kangafu Gudumbana, pesquisador da Universidade de
Kinshasa e diretor do Instituto Makanda Kabobi (escola do partido único,
o Movimento Popular da Revolução). Kangafu Gudumbana – que cita
constantemente Pius Ngandu N’Kashama – dedica o seu estudo, como
este, à edição zairense do livro. O estudo começa com uma bibliografia de
Carlos Cândido de Almeida & Mariana Vitti-Rodrigues
146
livros publicados no país, desde a época colonial até os anos de publicação
do estudo (1979). Através dos títulos publicados, Kangafu Gudumbana
conseguiu identificar os principais centros editoriais do livro no Zaire. Na
sua conclusão, o estudo tenta priorizar os problemas da edição no Zaire,
numerosos e inextricáveis: dizem respeito ao circuito de distribuição do
livro, à política de publicidade, ao aspecto técnico da impressão (ou seja, a
qualidade e a tipologia do papel, as máquinas, os recursos humanos), mas
também a todo um contexto social de difusão da cultura.
Ainda de acordo com Eddie Tambwe Kitenge (2014), Lukomo
Bivuatu Nsundi apresenta a tentação permanente de mergulhar os fatos
descritos nas teorizações macroeconómicas, sob o risco de distanciar o su-
jeito da realidade social local. Sua obra lançou uma nova luz sobre os pro-
blemas da publicação de livros no país. Os dados produzidos pelo estudo
de Lukomo Bivuatu Nsundi são numerosos e sistematizados. Suas con-
clusões apontam para a identificação da raiz do problema da construção
dos estudos do livro, da escrita e de sua organização no âmbito do nível
da formação de um pessoal qualificado, com domínio perfeito das técnicas
editoriais.
Conforme Eddie Tambwe Kitenge (2014), o final da década de 1980
foi marcado por reuniões de pessoas especialistas africanas, chamadas a re-
fletir sobre a situação do livro no continente. Os eventos técnico-pedagó-
gico-científicos deram origem ao Colloque Internationalsur l’édition du livre
en Afrique, em Bamako, no Mali. Como extensão do encontro, um grupo
de trabalho, composto por pessoas cientistas africanas, projetou a criação
de um Centre africain de formation aux métiers du livre. Ainda no mesmo
contexto, a Association Nationale des Editeurs zaïrois du Livre (Anedil), cujo
presidente participou ativamente das reuniões, deveria publicar o relatório
das atividades.
Conforme Eddie Tambwe Kitenge (2014), em 1988, o governo
do então Zaire virá propor uma formação no domínio do livro e da bi-
bliologia, em parceria com a Unesco (que fornecerá o financiamento) e o
Centre Wallonie - Bruxelles (instituição diplomática e cultural da comuni-
dade francófona da Bélgica), que dará o apoio acadêmico, com presença
de docentes da l’Université de l’Etat de Liège. Com isso, sob a direção de
Estudos pluridisciplinares da informação: ciência da informação, ética e linguagem - nº 3
147
Etienne Ngangura Kasole, a formação se inicia na entrada universitária
de 1988-1989, no Institut Facultaire des Sciences de l’Information et de la
Communication (IFASIC), de Kinshasa.
O currículo complementou outros cursos de formação em ciên-
cias e técnicas da comunicação (Jornalismo, Imprensa Escrita, Imprensa
Audiovisual e Relações Públicas) que esta universidade vinha organizando
desde a sua criação em 1973. Aberto a partir do ano letivo 1988/1989, a
opção foi articulada como especialização em Bibliologia, após três anos (o
chamado diploma de graduação, corresponde ao chamado “bacharelado 3”
no modelo educacional vigente no Zaira) de estudos gerais em ciências e
técnicas da informação e da comunicação. O foco era formar, ao final do
estágio “bacharelado 5”, pessoas “técnicas e investigadoras nas áreas do livro
e da bibliologia”, ou seja, profissionais e cientistas. (Tambwe Kitenge, 2014)
Ao todo, no âmbito pedagógico, 3 (três) foram os grandes objetivos
traçados pelas pessoas promotoras desta formação. O primeiro era central-
mente acadêmico: tratava-se de formar rapidamente, no mais alto nível
(ou seja, doutoramento), um corpo docente em BCI para substituir a co-
munidade docente de origem belga. O segundo objetivo era estritamente
científico: estruturar as bases para o surgimento, no Zaire, de uma tradição
de pesquisa em BCI. Foi necessário estabelecer o nicho de investigação
em Bibliologia, ao lado dos canais de Comunicação Social já existentes
(rádio, televisão, relações públicas, etc.) e onde existiam tradições de inves-
tigação, apesar das dificuldades estruturais. Finalmente, o terceiro e últi-
mo objetivo, particularmente apoiado pela Unesco, era ao nível prático e
profissional. Esperava-se, através da investigação empírica a realizar, dotar
os profissionais do livro, e toda a indústria da comunicação escrita nacio-
nal (imprensa periódica, edição de livros, bibliotecas, etc.), de elementos
de valorização do mercado. A investigação consistia em fornecer dados
técnicos suscetíveis de conduzir a aplicações concretas e, potencialmente,
contribuir para superar os obstáculos ao desenvolvimento da comunicação
no país. (Tambwe Kitenge, 2014)
Conforme Eddie Tambwe Kitenge (2014), ao implementar a for-
mação nesta área, o IFASIC criaria uma dinâmica geral em torno da bi-
bliologia e permitiria a difusão de sua estrutura epistemológica e aplicada
Carlos Cândido de Almeida & Mariana Vitti-Rodrigues
148
nos meios universitários. Os mimetismos ocorreram em várias direções. O
plano educacional se propagou por instituições que organizam o ensino de
“biblioteconomia” e/ou “ciências documentais”: os casos da Université de
Kinshasa (Unikin), da Université Protestante du Congo (UPC), do Institut
supérieur des statistiques (ISS). Essas instituições introduziram cursos de
Bibliologia em seus currículos. Houve também criações de cursos “biblio-
lógicos”, ainda que o currículo cubra apenas parcialmente a área biblioló-
gica (conforme a nomenclatura adotada no país em BCI), como no caso
da Université catholique de Kinshasa (FCK), de 1993. Observa-se, ainda,
a criação de centros de investigação e sociedades científicas portadoras do
conceito de “bibliologia”, como o Centre africain de bibliologie (Cab), cria-
do por Kibanda Mutingila; o Comité Zaïrois de l’Association Internationale
de Bibliologie, sob a direção de Etienne Ngangura Kasole.
Segundo Jean-Pierre Manuana-Nseka (2014), pode-se mapear as
tendências de uma escola congolesa em Bibliologia, ou a construção dos
estudos em BCI na República Democrática do Congo, a partir das re-
lações entre formação acadêmico-científica e as estruturas políticas. Seu
olhar parte da chamada “bibliologia política”, ou seja, da teoria do campo
em BCI que parte das relações entre poder e comunicação.
Para Jean-Pierre Manuana-Nseka (2014), pode-se compreender a
formação em BCI na República Democrática do Congo a partir de 4 (qua-
tro) gerações:
Il y a d’abord ceux de la première génération, à savoir : des
enseignants bibliologues. Il s’agit des Professeurs Etienne Ngangura
Kasole et Obadée Kibanda Matungila.
Parmi les acquis de cette première génération, ils ont créé en
1990 une Section Zaïroise de l’Association Internationale de
Bibliologie (Sezaib). Celle-ci a rayonné en produisant des travaux
bibliologiques qui ont révolutionné l’enseignement et la recherche
bibliologique en République Démocratique du Congo.
La deuxième génération des bibliologues congolais est venue
renforcer la première avec l’arrivée du Professeur François-Xavier
Budim’Bani Yambu et la présence de trois jeunes bibliologues
confirmés avec des thèses de doctorat en SIC : Eddie Tambwe,
Denis Nzonkatu Et Jean-Pierre Manuana. Monsieur François-
Estudos pluridisciplinares da informação: ciência da informação, ética e linguagem - nº 3
149
Xavier Budim’Bani a amené des recherches sur la scribalité et s’est
intéressé également à l’éditologie.
En ce qui concerne la génération des jeunes chercheurs, celle-ci a
fait élargi le champ d’études en bibliologie. Les recherches d’Eddie
Tambwe ont été centrées sur la bibliologie politique tandis que
celles de Denis Nzonkatu et Jean-Pierre Manuana respectivement
sur l’archivistique et la sociologie de la bibliographie.
La troisième génération est constituée des étudiants faisant partie
de l’Association des Amis de Robert Estivals pour le développement
de la Bibliologie en Afrique, en sigle ARES. Je peux signaler avec
bonheur l’émergence de deux chercheurs en phase de terminer leurs
recherches doctorales. Ceux-ci se distinguent avec des publications
dans la revue Schéma et Schématisation. Il s’agit de Bercky Kitumu
et Bob Bobutaka.
La quatrième génération est en cours de finalisation de leurs
travaux de DEA au Département des Sciences et Techniques
documentaires de l’Université de Kinshasa et à la Faculté des
Communications Sociales de l’Université Catholique du Congo.
Les travaux de Paul Tete Wersey, Joseph Cimbalanga Mulamba et
Farida Eliaka Bombende peuvent être signalés. (Manuana-Nseka,
2014, p. 132-133)
A longa citação permite, cronologicamente, a partir das gerações,
observar o percurso da construção epistemológica que, sob o olhar de
Manuana-Nseka (2014), manifesta-se através de um denominador co-
mum: a teoria bibliológica política. Trata-se, pois, da construção - e da
compreensão de tal construção - de um olhar crítico sobre a epistemologia
histórica em BCI oriundo da República Democrática do Congo.
4 dEntro da mina do EpistEmicídio: dos usos coloniais à crítica
dEcolonial da bibliografia
La bibliographie géologique et minière du Congo belge comme
science de l’écrit, constitue l’une des sciences sémiologiques à partir
du critère du signe d’écriture et en même temps l’une des sciences
documentologiques et médialogiques par son support. L’écrit
étant une catégorie spécifique des systèmes de signes. En effet, la
bibliographie géologique et minière comme son nom l’indique
Carlos Cândido de Almeida & Mariana Vitti-Rodrigues
150
régie des indices de différentes ressources minérales au travers
des symboles et formules étudiés dans le cours de chimie (ou de
physique) que l’on appelle écriture chimique. Prenons un exemple
en passant de quatre minerais, à savoir : le minerai de l’Or (Au), le
minerai de Cuivre (Cu), le minerai de l’Etain (Sn), et le minerai de
Zinc (Zn). (Cimbalanga Mulamba, 2014, p. 161)
Como nos relata Joseph Cimbalanga Mulamba (2014), no século
XIX, através do Rio Congo, as expedições colonizadoras de cunho econô-
mico-político-científica avançaram em território africano, de oeste a leste
adentro pela via do regime colonial belga. As publicações de estudos geo-
lógicos e mineiros do Regime Colonial Belga desde a fundação do Estado
Independente do Congo até o período do Congo sob a administração co-
lonial da Bélgica, incluindo a conferência geográfica em 1876 convocada
pelo Rei Leopoldo II, em Bruxelas, permitiram aos colonizadores europeus
explorar conjuntamente a África Central.
Segundo Cimbalanga Mulamba (2014), destacam-se aqui as expe-
dições de Burton e Speke, em 1857, que alcançaram o Lago Tanganica;
Baker, em 1864, que chegou ao Lago Albert; Schwinfurt que, saindo de
Cartum em 1869, penetrou no interior até ao Rio Uélé. Foi a partir de
1816 que o inglês Tuckey inaugurou assim o período das explorações
científicas do século XIX na África Central. De 1874 a 1878, o Congo
foi explorado por Henry Morton Stanley por conta própria e depois pela
Associação Internacional do Congo.
Como demonstraram-nos Jean-Pierre Manuana-Nseka (2014) e
Eddie Tambwe Kitenge (2014), os estudos em BCI em África se cons-
tituíram a partir desses dados de construção da colonialidade. Trata-se,
como Arab Abdelhamid (2014) aponta sobre o caso da Argélia, o princípio
colonial de formação e deformação do discurso local, via o massacre dos
corpos e epistemicídio, o massacre dos saberes. Como aponta Cimbalanga
Mulamba (2014), todas essas expedições e explorações fizeram parte da
pesquisa e os resultados apresentados durante as diversas reuniões técnicas.
Eles constituíram no conjunto dos escritos elaborados pela Bélgica para a
exploração e comercialização de recursos minerais, o exemplo de escritos
sobre a bibliografia geológica do Congo Belga de 1885 a 1960, abundante
Estudos pluridisciplinares da informação: ciência da informação, ética e linguagem - nº 3
151
bibliografia escrita por vários geólogos exploradores, principalmente, o ge-
ólogo Jules Cornet, que realizou o primeiro estudo científico dos recursos
minerais de Katanga, de 1891 a 1893.
A partir de 1904, inicia-se a extração do ouro; em seguida, os miné-
rios de cobre, diamante, estanho, zinco, urânio. Em termos estatísticos, a
exploração mineral se desenvolveu a um ritmo acelerado: 141 milhões de
francos em 1920, 1.012 milhões de francos em 1930, quase 6 mil milhões
de francos em 1947. Ainda no período colonial, o Congo Belga era o maior
país do mundo produtor de urânio, diamantes e cobalto. Partindo deste
quadro sinótico, a história diz-nos que a riqueza do subsolo de Katanga
e Kasai em particular constituiu, como já foi dito, “um escândalo geo-
lógico”. Deste modo, é, pois, sob e sobre esses dados, como nos conduz
Cimbalanga Mulamba (2014), que uma dada “ciência da escrita” virá se
constituir via colonialidade no território do Congo, partindo do setor mi-
neral do regime colonial belga.
4.1 comprEEndEndo o rEgimE da construção gEopolítica
histórica do congo a partir do olhar dE tambwE KitEngE
Sobre a especificidade do regime do Congo Belga, para compreen-
der o regime colonial, faz-se necessário partir das ambições pessoais do
rei belga Leopoldo II (1835-1909) (filho de Leopoldo I). Pouco depois
da sua entronização, Leopoldo II organizou a “Conferência Internacional
de Geografia” em Bruxelas (12 a 19 de setembro de 1876), que levou à
criação da “Associação Internacional para a Exploração e Civilização da
África Central”). Cada Estado participante é representado por um Comitê
Nacional. A ideia era delimitar uma zona de comércio livre no centro de
África. (Tambwe Kitenge, 2015)
De acordo com Tambwe Kitenge (2015), podemos observar a cons-
trução de um regime que leva, de um lado, à construção da epistemologia
e da práxis em BCI, de outro, em paralelo, à construção de uma estrutura
informacional (a teoria em BCI co-constituída para fundamentar um regi-
me político propriamente dito) para o desenvolvimento de uma colonia-
lidade. Esse regime é observado, de modo claro, em suas estruturas de po-
Carlos Cândido de Almeida & Mariana Vitti-Rodrigues
152
der, simbólica, linguística e técnica, teológica, econômica e jurídica. Essa
construção, como a seguir aprofundaremos com Cimbalanga Mulamba
(2014), é uma das formas sociotécnicas de compreensão do epistemicídio
como método e do exercício decolonial via epistemologia histórica como
revelação crítica dos regimes de massacre dos saberes.
Para o Estado Leopoldino, a utilidade de formar agentes subordina-
dos eficazes e dedicados justapõe-se a um duplo programa: por um lado,
difundir o “amor ao nome belga, o respeito e a simpatia pelo empreendi-
mento da colonização”, e, por outro lado, “ampliar o reino de Cristo e pro-
ceder à conversão dos pagãos”. Em junho de 1890, o próprio Governador
Geral do Congo definiu a finalidade das colônias escolares a serem criadas
no Estado, orientadas para definir o futuro da mão de obra local via recru-
tamento regular de soldados e de artesãos, criando colônias educacionais
(agrícolas e industriais) para crianças nativas. (Tambwe Kitenge, 2015)
Deste modo, o regime constituído via o Estado do Congo Belga,
nascido em outubro de 1908, herdará – do Estado Independente do
Congo – esta filosofia educativa, marcada pela Convenção de 1906, entre
a Santa Sé e o Estado do Congo Belga. Na mesma linha, as missões católi-
cas criaram, em 1913, um programa de formação de catequistas nativos. O
regime colonial se estabelece através de uma educação de base religiosa em
postos centrais, em capelas/escolas. Em 1919, é criado um projeto especí-
fico de ensino para o Congo Belga via o Ministério das Colônias Belgas.
O objetivo era propor métodos administrativos de controle das institui-
ções de formação organizadas e geridas pelas Missões Nacionais. (Tambwe
Kitenge, 2015)
A proposta, emanada do Estado colonial, foi rejeitada pela Igreja
Católica - através da Assembleia de superiores eclesiásticos reunidos em
Kisantu - cidade da província do Baixo Congo – no mês de julho de 1919.
A igreja exigia independência e liberdade de ação. Na prática, estes desejos
traduzir-se-ão nestas três inovações principais: definição de política lin-
guística na educação; generalização do ensino pós/primário ou secundário;
e introdução do ensino superior e universitário. Portanto, definição da po-
lítica linguística no sistema educativo. Para compreender o alcance de tal
medida, é necessário reconsiderar todo o contexto da questão linguística
Estudos pluridisciplinares da informação: ciência da informação, ética e linguagem - nº 3
153
no Congo Belga. Isto porque a natureza utilitária do sistema educativo tem
estado na origem das dificuldades das autoridades em levar a cabo uma
política linguística coerente. (Tambwe Kitenge, 2015)
Assim como nos demonstra o olhar crítico de Manuana-Nseka
(2014) e Cimbalanga Mulamba (2014), Tambwe Kitenge (2015) nos
convida a observar, nas colônias francesas, seguindo a chamada “política
assimilacionista”, o ensino destinado às populações originárias, desde o
primeiro ano do ensino primário, em francês, língua do colonizador, como
parte do projeto epistemicida. Nas colônias portuguesas, o mesmo princí-
pio é observado em todos os níveis de ensino. Por outro lado, os britânicos,
através da sua filosofia colonial, a regra indireta, aplicaram uma política
de ensino baseada nas línguas indígenas nas escolas primárias. O inglês é
reservado para casos que exijam seu uso: os casos de escolas de ensino fun-
damental, profissional e superior (Tambwe Kitenge, 2015).
4.2 a dialética linguística do EpistEmicídio
Os regimes que conformam a construção do duplo (epistemologia e
práxis em BCI) bem como a próxima estrutura do metarregime do projeto
da colonialidade belga, a partir do domínio via linguagem, virão consti-
tuir a futura teorização e a formação em BCI na República Democrática
do Congo, bem como sua própria condição crítica epistemológico-histó-
rica, conforme os passos legados, por exemplo, por Jean-Pierre Manuana-
Nseka (2014) e Eddie Tambwe Kitenge (2014), Arab Abdelhamid (2014)
Cimbalanga Mulamba (2014).
De acordo com Tambwe Kitenge (2015), o regime do Congo Belga
hesita entre as duas concepções coloniais vinculadas a políticas de gestão
linguística. A primeira é que apenas as línguas locais são veículos de edu-
cação. O argumento apresentado pelos defensores desta visão está relacio-
nado à ideia de que o desenvolvimento cultural de uma “raça humana
de acordo com sua própria condição só pode ser feito na linguagem da
comunidade e, portanto, negligenciar o desenvolvimento da linguagem de
uma comunidade seria esterilizar uma parte importante de sua vida social
Carlos Cândido de Almeida & Mariana Vitti-Rodrigues
154
e causar um efeito deprimente em sua cultura geral em sua manifestação
externa.
Ao lado da concepção que visava a manutenção das línguas indíge-
nas na difusão do conhecimento, uma segunda tendência procurava im-
portar a língua europeia em todos os níveis de educação e da vida social.
Existem várias razões para esta tendência: primeiro, uma aplicação prática;
o movimento de industrialização levantaria necessariamente a questão de
a mão-de-obra entregue nas fileiras dos nativos e, por isso, de um elevado
nível de formação correspondente a este requisito. Este tipo de formação
só poderia - pensando-se - ser ministrado na língua europeia. (Tambwe
Kitenge, 2015)
No plano de uma dialética da dominação, o aparato da opressão
pela via da linguagem constitui-se, dadas as observações de Eddie Tambwe
Kitenge (2014, 2015), Jean-Pierre Manuana-Nseka (2014) e Arab
Abdelhamid (2014), um modo claro de operacionalização do regime de
informação opressor. Não há, em um sentido de consolidação da colonia-
lidade, a possibilidade de dominação, do espírito à cultura, da cultura às
relações socioeconômicas, sem o domínio da língua, a extinção convenien-
te das expressões da cultura para massacre das identidades locais e a impo-
sição de limites de outras manifestações originárias da cultura do território
para fins de controle e assimilação.
Em 1948, explica-nos de modo claro Tambwe Kitenge (2015), uma
reforma educacional aponta para línguas dos povos originários como ve-
ículos de instrução nas escolas de ensino fundamental e ensino médio.
Da multidão de línguas locais, porém, o legislador manteve as quatro lín-
guas nacionais dominantes, a saber, Swahili, Linguala, Kikongo, Tshiluba,
abrangendo todo o território nacional. As quatro línguas vernáculas servi-
riam ao poder colonial como instrumento de comunicação com as massas.
O regime na construção não só do campo BCI no Congo, como da
própria fundamentação do Estado Colonial Belga sobre o Congo, estrutu-
ra-se, pois, como demonstra Tambwe Kitenge (2015), como sistema polí-
tico de condicionamento mental para o projeto de exploração econômica
Estudos pluridisciplinares da informação: ciência da informação, ética e linguagem - nº 3
155
da colonialidade, onde linguagem e metalinguagem são co-constituidoras
(ferramentas e alimento) do epistemicídio.
4.3 do nascimEnto da bibliografia do sEtor minEral do rEgimE
colonial bElga ou do nascimEnto do rEgimE colonial bElga
como partE dE construção dos rEgimEs EpistEmológicos Em
bibliotEconomia E cncia da informação do, no E para o mundo
Como explica Cimbalanga Mulamba (2014), vários séculos depois
da “descoberta” europeia da foz do Rio Congo, em 1482, por Diego Cão, o
século XIX permitiu que outros exploradores revelassem as potencialidades
da bacia fluvial de um dos maiores rios do mundo. Em 1860, o Duque de
Brabant, regressando da Grécia, trouxe como lembrança da viagem a Sière-
Orban, um pequeno pedaço de mármore, vindo da galeria de arengas de
Atenas, onde colocara o seu retrato em miniatura, rodeado das palavras:
A Bélgica precisa de uma colónia”. O que o Duque de Brabant sonhou,
Leopoldo II realizou com energia indomável. O Rei Leopoldo I já tinha
pensado na criação de estabelecimentos belgas em países ultramarinos. Por
sua vez, Leopoldo II procurou vários pontos do planeta onde pudesse, em
benefício da Bélgica, concretizar esta ideia de dinastia.
Em setembro de 1876, a sua escolha recaiu sobre a África Central,
território ainda não explorado até ali pelos massacres europeus. Nos ma-
pas, havia um grande espaço em branco em seu lugar – o centro africano,
conforme observado acima em Tambwe Kitenge (2014), apresentar-se-ia,
pois, ao projeto colonial belga.
Interessado nas riquezas minerais do Congo, em contato com o jor-
nalista, explorador e viajante anglo-americano Henry Morton Stanley, o Rei
Leopoldo II, durante o mesmo ano, convocou uma conferência geográfica
internacional em Bruxelas, que levou à criação da Association Internationale
Africaine (AIA), cujo objetivo era abrir a África à “civilização” e abolir o
comércio de escravos. Esta conferência, realizada em Bruxelas, define uma
área de ação dentro do continente africano, limitada a norte pelo Sudão e
pelo Egito, a sul pela bacia do Rio Zambeze, a leste e a oeste pelos oceanos.
Neste contexto, a história contemporânea considera que foi a viagem do
Carlos Cândido de Almeida & Mariana Vitti-Rodrigues
156
explorador português Diego Cão que introduziu o Ocidente na foz do Rio
Congo. (Cimbalanga Mulamba, 2014)
Segundo Cimbalanga Mulamba (2014), dois anos depois, em 30 de
outubro de 1878, Leopoldo II concluiu um acordo com Henry Morton
Stanley para a criação de postos no Congo e a negociação de tratados com
os chefes locais em nome da Association Internationale Africaine (AIA), que
mais tarde se tornou o Comité d’Etudes du Haut Congo na sigla CEHC.
O regime nas estruturas de metalinguagem já estava dado em territó-
rio europeu – método e aplicação em BCI para o epistemicídio. Mapas de
África disponíveis na Europa, junto de relatórios de viagens, bibliografias e
outras fontes documentais, incluindo minerais in natura e suas descrições,
demonstram o modo como os regimes sustentados pela documentação,
centralmente a bibliografia da área geológica, orientam o processo de ex-
ploração, de invasão, de massacre e de saque, como etapas de construção
do poder colonial. Com base em dados empíricos oriundos de uma cien-
tificidade documentalista, as decisões para concepção da complexificação
dos regimes de poder para sustentação da colonialidade se constituem, sen-
do a formação de uma escola congolesa em BCI parte do olhar crítico da
própria formação do estado colonial belga estruturado em dinâmicas teó-
ricas, metodológicas e empíricas em BCI, como os princípios de descrição
bibliográfica e tomadas de decisão a partir de sistemas de classificação (de
pessoas, de lugares, de artefatos, de fontes minerais).
4.4 bibliografia E colonialidadE: co-constituiçõEs
no fundamEnto crítico da EpistEmologia histórica Em
bibliotEconomia E ciência da informação na rElação mundo-
áfrica-mundo
Tomado como base o pensamento epistemológico de Bobutaka
Bateko (2013), afirmamos com o pesquisador que palavra escrita é um fato
social e, consequentemente, um fato político. Os diferentes sistemas polí-
ticos procederam ao controle e transmissão de saberes através de recursos
gráficos. Nos modelos de regulação da sociedade, a palavra escrita sempre
desempenhou um papel capital. Deste modo, a intrínseca e imbricada rela-
Estudos pluridisciplinares da informação: ciência da informação, ética e linguagem - nº 3
157
ção entre formação epistemológica em BCI e formação dos estados moder-
nos, chegando até as formações coloniais e o método epistemicida, aponta
para a fundamentação política da formação do campo biblioteconômi-
co-informacional. Assim, em seu vocabulário epistemológico, Bobutaka
Bateko (2013) aponta para “bibliologia política” como um ramo da biblio-
logia e uma teoria bibliológica cuja quintessência é a explicação dos mode-
los bibliológicos envolvendo exclusivamente dados relativos ao sistema de
escrita, suas relações entre poder e política. Em termos diretos, objetivos,
segundo Bobutaka Bateko (2013), a bibliologia política, ou seja, a constru-
ção de uma lente para compreensão da epistemologia em BCI passa pela
via política e é verdadeiramente explicada sob o rigor científico da relação
entre o Estado e a comunicação escrita. Esse é o fundamento do campo
que pode ser observado na relação de co-constituição do Estado Colonial
Belga a partir da foz do Rio Congo e da própria escola congolesa em BCI.
Cimbalanga Mulamba (2014) explica-nos que, atraído pelas poten-
cialidades do Congo, o Rei dos Belgas, Leopoldo II, criou, em outubro
de 1882, a Association Internationale du Congo (AIC), transformada, em
1883, num Etat Indépendant du Congo (EIC). Isto recebeu consagração
internacional na Conferência de Berlim em 1885. E, em 26 de fevereiro de
1885, foi a Ata Final da Conferência de Berlim que estabeleceu o Estatuto
Convencional da Bacia do Rio Congo.
O plano de ação, adotado pela conferência, incluía o estabelecimen-
to de postos permanentes na África Central com vistas a desenvolver o co-
nhecimento do continente africano (logo, produção intensa de documen-
tação de e sobre o Congo para exploração, colonialidade, epistemicídio) e
a trazer ali “paz e civilização”. Como nos demonstra Cimbalanga Mulamba
(2014), um complexo plano de trabalho para organização do regime de
informação colonial se constitui na esfera documental – como a Ata supra-
citada e metadocumental, ou seja, o conjunto bibliográfico para formação
do regime. Examinando o plano da conferência, a ideia de desenvolver o
conhecimento do continente africano faz-nos pensar, segundo o pesqui-
sador, num artigo publicado em 1951 intitulado: “Une vaste entreprise de
prospection minière au Congo belge”, que define as grandes linhas do progra-
ma previsto por um grupo de concessionários e pela colônia, para o estudo
Carlos Cândido de Almeida & Mariana Vitti-Rodrigues
158
geológico e mineiro da bacia central. Uma bibliografia para colonialidade
se constitui como ferramenta fundamental para exploração. Documentos
escritos para estrangeiros para dar a conhecer a imensa riqueza do Congo
Belga, por exemplo, com a publicação, em 1895, de Les Richesses minérales
du Congo, são publicados. É por isso, aponta Cimbalanga Mulamba (2014)
em diálogo com Jean-Pierre Manuana-Nseka, que os bibliógrafos coloniais
estavam sujeitos às estruturas da política colonial e que era comum tais bi-
bliógrafos criarem modelos bibliológicos que respondessem aos interesses
da colonização.
Face a este processo histórico, político e econômico através das explo-
rações e operações de mineração do Congo Belga, somos levados a afirmar,
como Jean-Pierre Manuana-Nseka (2014), que os estudos publicados pelo
coletivo Papier blanc, encre noire atestam, desde 1876, data da Conférence
Géographique de Bruxelles, a existência de uma abundante produção edito-
rial sobre o Congo que continuou até o fim do império colonial belga. Esta
atividade editorial era regularmente listada por reconhecidos bibliógrafos
coloniais. (Cimbalanga Mulamba, 2014). Em outras palavras, a bibliogra-
fia se constitui como um construto teórico e metodológico para elaboração
preliminar – o plano de edificação – do regime colonial na bacia do Rio
Congo, regime este que, por sua vez, será fundamental para a construção
de um regime global, incluindo as macroestruturas de multilateralidade
geopolítica do Instituto Internacional de Bibliografia, da Liga das Nações
e da futura Organização das Nações Unidas.
Essa co-construção bibliográfica, revela Cimbalanga Mulamba
(2014), por exemplo, do período de 1885 a 1908, testemunha a origem
do modelo bibliológico do sistema econômico no setor geológico e da mi-
neração do regime colonial belga. A partir daí, pode-se dizer, segundo o
pesquisador, que a bibliografia também se apresenta como uma técnica
de informação do leitor, parte da bibliologia, supondo uma coleta e uma
classificação dos documentos impressos agrupados em diretórios com o
objetivo de facilitar a leitura – e, assim, estabelecer as bases para a forma-
lização do regime de informação colonial do local para o global, do Rio
Congo ao Oceano Atlântico, do Oceano Atlântico à Bruxelas, nas relações
Mundo-África, África-Mundo.
Estudos pluridisciplinares da informação: ciência da informação, ética e linguagem - nº 3
159
Neste sentido, a bibliografia geológica e da mineração nasceu da von-
tade política colonial belga que fez com que o estatuto político do Estado
do Congo Belga derivasse do primeiro artigo da Constituição Belga, revi-
sada em 1893, que estipula as colônias, as possessões de outros mares ou
protetorados ultramarinos que a Bélgica possa adquirir são regidos por leis
especiais. Dentre estas, a lei que legisla sobre a investigação e exploração de
substâncias minerais para todo o território nacional, demarcado por decre-
to de 16 de dezembro de 1910, território esse bibliografado anteriormente
e, a partir dos dados bibliográficos, passível de se tornar lei, de chegar à
Constituição. (Cimbalanga Mulamba, 2014)
No plano da documentação como estrutura para o regime colonial,
Cimbalanga Mulamba (2014) aponta para existência de mapas de jazidas
de minério no Congo Belga, imagens de prospecção e exploração, ou seja,
toda uma plataforma científica para evidências de introdução de outras
formas científicas, da Geologia à Política, do ouro ao poder, no território
massacrado – a bibliografia como arma epistemicida.
Se a bibliografia constituiu essa estrutura, esta é, pois, mecanismo
para promoção da interação e uma garantia importante para o apoio po-
lítico e de comunicação. Na visão de Bobutaka Bateko (2013), numa so-
ciedade, os governantes e os governados devem interagir para o seu bom
funcionamento. Desde que os agrupamentos humanos se organizaram em
sociedade, em comunidade, a comunicação sempre foi muito útil. Este
processo de troca vertical de informações ocorre de cima para baixo para
a gestão e de baixo para cima para a população; ou ainda este processo é
horizontal entre os povos. A bibliografia se constituirá, pois, no plano da
colonialidade, papel central na formação vertical da estrutura de poder
belga no Congo.
O regime colonial procurará, pela via da verticalidade, reestruturada
pelas políticas da linguagem, via uma metalinguagem já permitida pela
teoria e pela metodologia bibliográficas, em falsa horizontalidade, estabe-
lecer as relações de poder e de segregação. A escrita e a escrita da escrita (a
metaprodução de dados gráficos ou a bibliografia propriamente dita, da
sua estrutura descritiva mínima ao complexo de suas classificações), serão
estratégicas para as bases desse regime.
Carlos Cândido de Almeida & Mariana Vitti-Rodrigues
160
Com demonstra Tambwe Kitenge (2014), a reflexão sobre a cons-
trução dos sistemas de escrita sob o regime colonial traz à tona duas épo-
cas bibliológicas, ou duas etapas de conformação da epistemologia e da
práxis em BCI no Congo, ambas dependentes dependendo das condições
políticas e econômicas. A primeira época, que vai de 1885 a 1940, é a da
dualidade bibliológica: educação rudimentar para pessoas negras; ausência
do quadro legislativo da escrita, para melhor reprimir os elementos inde-
pendentes; ausência de atividades em torno do livro, existência de uma
imprensa de evangelização para as pessoas negras, e de uma imprensa tra-
dicional para as pessoas assentadas, brancas; bibliotecas apenas para a co-
munidade de colonos.
Conforme Tambwe Kitenge (2014), a segunda fase da construção
em BCI no contexto da colonialidade se dá entre 1940 e 1960, via o
regime colonial do Congo Belga no modelo nacionalista. Consagra-se
aqui a mutação política que vê a “elite negra”, historicamente colocada
subjugada pelo poder colonial e, portanto, conformista, desenvolvendo
um modo de oposição. É o surgimento de uma nova configuração biblio-
lógica: a padronização do ensino pela generalização do ensino secundá-
rio e pela instituição de ensino superior e universitário; estabelecimento
do quadro legislativo para a escrita; surgimento do livro como política
no território congolês; declínio dos periódicos missionários e coloniais;
ascensão de uma imprensa de protesto e independência, acesso às biblio-
tecas pela elite das populações originárias. Essas mudanças no quadro de
relações entre linguagem e metalinguagem fazem parte das alterações de
estruturas que virão conduzir à queda, em junho de 1960, do regime co-
lonial do Congo Belga e consagrar o advento do Estado conhecido como
República Democrática do Congo.
Como lembra Bobutaka Bateko (2013), a palavra escrita como meio
social e político desempenha um papel importante na regulação da socie-
dade. Se o primeiro uso da escrita foi mágico-religioso, a partir de então
a escrita desempenhou um papel importante na socialização dos textos
jurídicos. O fundamento, pois, da epistemologia em BCI, desde suas raízes
bibliográficas clássicas, como forma de conhecimento pré e pós-formação
de uma escola congolesa de estudos biblioteconômico-informacionais está,
Estudos pluridisciplinares da informação: ciência da informação, ética e linguagem - nº 3
161
pois, diretamente vinculado à política, à informação como parte constitu-
ída e construtora da política. Da colonialidade à decolonialidade, a biblio-
grafia estará, pois, presente como infraestrutura e estrutura, ferramenta
epistemicida e ferramenta de autonomia, de luta anti-epistemicida.
Bobutaka Bateko (2013) recorre ao princípio político da funda-
mentação da bibliografia na invenção da Modernidade Europeia para a
compreensão das relações de poder que permitem ao plano teórico e apli-
cado da bibliografia constituir-se como base para colonialidade e como
construto para sua derrocada. A “obra de referência”, segundo o episte-
mólogo, no campo da bibliografia política (e, dizemos nós, da biblio-
grafia como política), está em Bibliographia politica, de Gabriel Naudé,
publicada em 1633. Como afirma Bobutaka Bateko (2013), trata-se de
um tratado para compreendermos a expressão da edificação do campo
bibliográfico na e para política. Junto da obra, lembra-nos o epistemoló-
go, no mesmo contexto temporal do século XVII, surgem outras biblio-
grafias críticas de obras dedicadas à política, ou seja, ao imbricamento
da bibliografia ao poder. A experiência de conformação da epistemologia
em BCI na República Democrática do Congo é um outro modelo dessa
força. A organização social é o ambiente preferido para estimular a pes-
quisa em bibliologia política. Como diz-nos Bobutaka Bateko (2013),
é evidente que o poder político, ao utilizar a palavra escrita, procura
assegurar o controle do aparelho de dominação política, impondo a sua
hegemonia. Mas também é sobre esse mesmo modo metalinguístico que
as estruturas poderão vir a ruir.
Como afirma Cimbalanga Mulamba (2014), a bibliografia geológica
e da mineração do Congo Belga de 1885 a 1960 constituiu um instrumen-
to de informação e comunicação para as potências coloniais europeias, na
medida em que esta bibliografia serviu à potência colonial em todas as
suas formas. O mesmo acontece com a primeira bibliografia malgaxe, que
serviu aos missionários e cientistas estrangeiros, movidos respectivamente
pelas necessidades de evangelização e pelas descobertas de novas terras.
Carlos Cândido de Almeida & Mariana Vitti-Rodrigues
162
5 um arQuétipo da Economia política Em bibliotEconomia E
ciência da informação: o ciclo EpistEmicida dos rEgimEs dE
podEr, do mundo ao congo, do congo ao mundo
Ainsi, pour conclure, la Bibliographie Géologique Minière du
Congo Belge de 1885 à 1960 est un instrument d’information
et de communication pour les puissances coloniales européennes
dans la mesure où cette bibliographie a servi le pouvoir colonial
sous toutes ses formes. (Cimbalanga Mulamba, 2014, p. 168)
De acordo com Eddie Tambwe Kitenge (2014), a tradição interpre-
tativa é considerar o livro como “uma ferramenta de desenvolvimento
da mesma forma que a agricultura e a indústria. Pensava-se, então, que
não era possível conceber qualquer política de desenvolvimento coerente
sem integrar uma política cultural de comunicação escrita. Pode-se, aqui,
recordar, segundo o teórico, os papéis de instrumento privilegiado desem-
penhados pela escrita, nas atividades intelectuais, na vida social (educação,
cultura, saúde pública), na política, na economia. É neste contexto que, no
âmbito da ação da Unesco, serão publicados dois relatórios: o primeiro, de
1977, editado pelo americano Datus Smith sobre todos os países africanos;
o outro elaborado pelo francês Jean-Michel Sivry, de 1986, dedicado espe-
cificamente ao Zaire (República Democrática do Congo). As conclusões a
que chegaram os dois especialistas não poderiam ser mais alarmistas.
Para Datus Smith, no relatório de 1977, Eddie Tambwe Kitenge
(2014), “nos países africanos, os problemas da edição de livros não dizem
necessariamente e diretamente respeito à economia. Também entram em
jogo fatores sociais, políticos, ideológicos e psicológicos que, em muitos
casos, exercem uma influência maior na indústria do livro do que os fato-
res económicos tradicionais”. Em 1986, no relatório de Jean-Michel Sivry,
aponta-se que os obstáculos enfrentados pela indústria livreira zairense di-
zem respeito a quase todo o processo de comunicação escrita: analfabetis-
mo; o baixo poder aquisitivo da população; o desinteresse do Estado em
relação ao livro; a falta de pessoal qualificado; a inadequação e desorgani-
zação dos circuitos de distribuição. (Tambwe Kitenge, 2014)
Estudos pluridisciplinares da informação: ciência da informação, ética e linguagem - nº 3
163
As observações de Tambwe Kitenge (2014) demonstram como a co-
lonialidade é constituída pela via da opressão da linguagem, incluindo o
uso da sistemática bibliográfica, assim como reconstrói a partir de usos e
reusos da palavra escrita, em regimes de informação que circulam entre
saquear formações culturais e depois reconstituí-las à luz de um fomento
que, por sua vez, advém de recursos econômicos retirados do próprio ter-
ritório, como toda a exploração mineral do vale do Rio Congo e a susten-
tação de modelos econômicos do capitalismo ocidental.
Esse exercício de compreensão dialética, com foco em uma decolo-
nialidade pela via da compreensão política da bibliografia, pode ser visto
na própria reflexão epistemológico-histórica da escola congolesa em BCI.
Conforme Eddie Tambwe Kitenge (2014), mais de trinta anos após o seu
surgimento no ambiente universitário congolês, pode-se argumentar que
a República Democrática do Congo constitui um campo propício ao de-
senvolvimento de uma ciência da comunicação escrita no contexto institu-
cional (com universidades que organizam expressamente cursos em BCI).
No Congo, o pesquisador destaca a produção teórica oriunda da cidade de
Kinshasa, via instituições universitárias principais como Institut Facultaire
des Sciences de l’Information et de la Communication, Université de Kinshasa,
Institut Supérieur des Statistiques e Université catholique du Congo.
Segundo Jean-Pierre Manuana-Nseka (2014), os trabalhos resul-
tantes das gerações em BCI na República Democrática do Congo revo-
lucionaram a bibliologia e constituem hoje conquistas em um modelo
de expressão internacional, incluindo seu papel epistemológico-históri-
co-crítico. O denominador comum, como já citado, na visão teórica de
Manuana-Nseka (2014), está justamente na reflexão crítica que a pers-
pectiva do arquétipo-Congo em BCI é trabalhada: a política. Conforme
nos trouxe Cimbalanga Mulamba (2014), no plano de desenvolvimento
teórico, metodológico e profissional em BCI, a República Democrática
do Congo caracterizou-se pela coexistência de dois modelos: o da antiga
potência colonial que se manifesta em dois níveis: o primeiro relativo ao
período das expedições e explorações de jazidas geológicas e da mineração,
e o segundo do período da mineração industrial.
Carlos Cândido de Almeida & Mariana Vitti-Rodrigues
164
A partir de cartografias contemporâneas do pensamento em BCI
oriundo de África, como aquelas de Bobutaka Bateko (2013), Cimbalanga
Mulamba (2014) e Tambwe Kitenge (2015), atingimos uma reflexão epis-
temológico-histórica, de ordem crítica, sobre o epistemicídio na formação
do pensamento em BCI, assim como na própria constituição de estados,
com uso, dentre outras armas, do próprio ferramental tecido em BCI no
Ocidente, como a bibliografia (a bibliografia aqui compreendida como
arma epistemicida de táticas de guerra e de extinção para formação da
colonialidade).
A evidência da reflexão sobre epistemicídio na construção da co-
lonialidade belga na África Central pode ser vista nas afirmações de
Tambwe Kitenge (2015), para quem o significado político de um modelo
do desenvolvimento colonial belga sobre o Congo sustentou um modelo
educativo fundado em um “minimalismo” que o encolheu no universo
intelectual e cultural das populações originárias. A ação do poder polí-
tico se voltou para manutenção das sociedades locais em um isolamento
intelectual propício ao projeto global de exploração econômica, com e a
partir dos sistemas de escrita, com toda a caixa de ferramentas bibliográ-
ficas como aparato de dominação.
Por outro lado, os mapas do conhecimento epistemológico em BCI
de África, a partir do arquétipo da República Democrática do Congo,
apontam para fundamentos do pensamento africano sobre a teorias da es-
crita, desde Alexandria, até as configurações modernas, pós-independência,
orientadas para uma compreensão do lugar emancipatório da bibliografia
via a construção de uma epistemologia em BCI do Congo para o mundo.
Essa riqueza teórica é-nos apresentada de modo decolonial e anti-epistemi-
cida em pesquisas epistemológico-históricas e econômico-políticas em BCI
a partir de fontes como Bobutaka Bateko (2013), Cimbalanga Mulamba
(2014) e Tambwe Kitenge (2015).
O percurso da presente cartografia nos leva a resultados (também
estes, bibliográficos, via as condições empíricas permitidas pela produção
do conhecimento de África para o mundo) sobre como com e pela biblio-
grafia, regimes de informação coloniais foram constituídos e, ao mesmo
tempo, a própria estrutura de um regime global de poder se co-constituiu
Estudos pluridisciplinares da informação: ciência da informação, ética e linguagem - nº 3
165
sobre o dorso de cada território massacrado. É justamente em uma rela-
ção África-mundo, no arquétipo do Congo ao planeta, que parte de rele-
vância geopolítica internacional enorme se constitui. Em outras palavras,
entre o Congo e a Bélgica de Leopoldo II, temos evidências manifestas de
constituição de um modelo de Modernidade pós-Iluminista fundada da
proposta de globalização do conhecimento como estrutura de dominação
na virada do século XIX para o XX. Estamos a tratar sobre, justamente, a
possibilidade econômico-política de financiamento e de desenvolvimento
dos projetos de Paul Otlet para construção do Instituto Internacional de
Bibliografia, da Bélgica para o mundo, na década de 1890, bem como das
bases político-econômicas para futura constituição da Liga das Nações e
Organização das Nações Unidas, ainda tendo o território belga como uma
de suas sedes de configuração discursiva e bélica multilateral.
Em termos objetivos, é com os recursos minerais e com o dinheiro
dos territórios explorados, sendo o Vale do Rio Congo e suas sociedades
violentamente dominadas, que
a) o regime de informação global do século XX se estrutura;
b) as grandes potências multiplicam seu poder político, econômico
e bélico;
c) a cibernética de primeira ordem se elabora (não podemos projetar
a cibernética dos anos 1930 sem a presença dos recursos minerais, da
economia gerada por esses recursos e, centralmente, da exploração
da classe trabalhadora congolesa) a partir de tal epistemicídio no
contexto da colonialidade belga;
d) a formação do poderio bélico ocidental no âmbito da Segunda
Guerra Mundial, centralmente dos Estados Unidos da América,
com a bomba atômica como signo da força e da violência, esta, a
bomba, só possível diante de recursos minerais dentre os quais, parte
considerável é oriunda do Vale do Rio Congo;
e) a política internacional multilateral de centralidade europeia e,
posteriormente, americano-europeia, a partir do fim da Segunda
Guerra Mundial, cria modelos de financiamento controlado e vi-
Carlos Cândido de Almeida & Mariana Vitti-Rodrigues
166
giado para países dizimados pela colonialidade, como o Congo (e o
Brasil);
f) a cibernética tecida entre a rede mundial de computadores e o
capitalismo de plataforma nas últimas duas décadas do Século XX,
igualmente dependentes de minerais como aqueles presentes nas
minas congolesas ainda hoje, ou seja, de um buraco no coração da
África, advém, diretamente, da parte central de invenção de toda a
tradição do Vale do Silício nos Estados Unidos da América.
Estamos a apontar, objetivamente, para o dinheiro que sustentou
a manutenção das coroas europeias no século XX e o desdobramento da
Revolução Industrial na corrida colonial tardia, bem como do alicerce
para Segunda Guerra Mundial, para Cibernética, para a Rede Mundial de
Computadores, dos componentes básicos de aviões, de aeronaves espaciais,
de foguetes, de usinas nucleares, turbinas, aos dispositivos eletrônicos, de
suas baterias, das peças de computadores pessoais aos smartphones, che-
gando aos carros elétricos. Nas duas pontas (por exemplo, de um lado, o
massacre colonial com a invasão da Bacia do Rio Congo no século XIX
e, de outro, o fomento para o desenvolvimento das terras massacradas,
via recursos da Unesco para criação de uma escola em BCI no Congo), a
bibliografia constitui, como arma política e científica, social e tecnológica,
lugar central de formalização e de funcionamento dos regimes de poder,
entre o global e o local, de opressão e de controle.
6 considEraçõEs finais
Toutes ces recherches des explorations et des exploitations du
secteur géologique et minier du Congo belge ont donné lieu à
une production éditoriale importante étudiée par les bibliographes
coloniaux. (Cimbalanga Mulamba, 2014, p. 166)
A abertura para estudos comparados e internacionais na produção
do pensamento de África no campo biblioteconômico-informacional re-
presenta uma das fontes da pesquisa. As cartografias da construção episte-
Estudos pluridisciplinares da informação: ciência da informação, ética e linguagem - nº 3
167
mológica em BCI no século XXI nos apontam caminhos para reconstituir
formações discursivas de nossa historicidade em um plano crítico. O pen-
samento africano em BCI torna-se, nesse contexto, elemento-chave para
a reflexão sobre decolonialidade e anti-epistemicídio no olhar epistemoló-
gico biblioteconômico-informacional. Esse ponto de observação de nossa
construção permite-nos não apenas repensar os discursos de formação de
uma teoria do conhecimento em BCI, suas escolas, suas tradições teóricas
e metodológicas, seus cânones bibliométricos ocidentais e suas efemérides
coloniais.
Esse ângulo nos leva à compreensão de outra linha de debate para
além de uma dada episteme – como a constituição no campo biblioteco-
nômico-informacional de e a partir de África. Com o prisma proposto e
aplicado ao estudo, constituiu-se uma reflexão sobre a própria constituição
econômico-política da sociedade dos séculos XIX e XX, de formação e de
reformulação de estados nacionais ocidentais às grandes transformações
do século XX, na geopolítica internacional e na revolução informacional,
chegando ao plano do liberalismo de plataformas digitais no contexto
do século XXI. O olhar sobre o arquétipo do Congo demonstra como
construtos macropolíticos do século passado, como a Organização das
Nacionais Unidas e a Internet têm, em África, sua estrutura, seu passado,
seu presente, seu futuro.
Nas cartografias epistemológicas em BCI do século XXI, os corpora vi-
sitados na pesquisa, em fontes como Bobutaka Bateko (2013), Cimbalanga
Mulamba (2014) e Tambwe Kitenge (2015), demonstram-nos a construção
em corrente epistemológica crítica, de abordagem decolonial, sob o conceito
de bibliologia política, a partir do diálogo com a tradição francesa, evocan-
do, porém, a autonomia do pensando de África. Reafirmado, por exemplo,
o olhar crítico de Cimbalanga Mulamba (2014), a bibliografia geológica e
de mineração do Congo Belga de 1885 a 1960, constituiu um instrumen-
to de informação e comunicação para as potências coloniais europeias, na
medida em que esta bibliografia serviu a potência colonial em todas as suas
formas. Estabelece-se, pois, uma bibliografia econômico-política, conforme
Cimbalanga Mulamba (2014), que sustenta o próprio regime colonial de
informação nascedouro e seus desdobramentos políticos e tecnológicos. A
Carlos Cândido de Almeida & Mariana Vitti-Rodrigues
168
revelação das bases coloniais e seus métodos é apontada por obras como
de Arab Abdelhamid (2014), Joseph Cimbalanga Mulamba (2014) e Eddie
Tambwe Kitenge (2015). Por sua vez, a esfera decolonial, no plano episte-
mológico histórico, com foco em uma epistemologia política, como crítica
historiográfica à formação de escolas africanas, como o caso da tradição con-
golesa, é observada em Dominique Hado Zidouemba (2013, 2014), Bob
Bobutaka Bateko (2013, 2014), Jean-Pierre Manuana-Nseka (2014), Eddie
Tambwe Kitenge (2014).
O movimento decolonial e anti-epistemicida é observado, metodo-
logicamente, na crítica de Eddie Tambwe Kitenge (2014). Na procura do
epistemólogo pela formação de uma escola congolesa em BCI, tendo em
conta as experiências internacionais, descritas através da evocação da his-
tória das “escolas”, as pessoas pesquisadoras congolesas em BCI deverão
ser capazes de estabelecer “um programa de organização”. A criação de um
tal programa só pode ser o resultado de uma reflexão coletiva. Na visão de
Tambwe Kitenge (2014), este programa de organização deveria incluir não
apenas um programa de investigação, mas um sistema geral de organização
de investigação.
A ênfase de compreensão do lugar da política na construção crítica
de uma epistemologia em BCI no Congo e sua escola autônoma é cla-
ramente manifestada pela tradição visitada no século XXI, tradição esta
capaz de repensar as dinâmicas de colonialidade e epistemicídio a partir
dos massacres empreendidos no Vale do Rio Congo, e apontar para os ca-
minhos remotos e contemporâneos de emancipação. As cartografias epis-
temológicas do século em curso, no plano Brasil-África, são um convite
crítico à reconstrução epistemológico-histórica de nosso passado e de nos-
so futuro em BCI.
rEfErências
ABDELHAMID, Arab. La recherche bibliologique en Algérie sous le Régime colonial
français. Revue de Bibliologie: schéma et schématisation, Paris, n. 80, p. 35-50, 2014.
Estudos pluridisciplinares da informação: ciência da informação, ética e linguagem - nº 3
169
BOBUTAKA BATEKO, B. Bibliographie politique, bibliologie politique et
communication politique. Revue de Bibliologie: schéma et schématisation, Paris, n. 79,
p. 55-70, 2013.
BOBUTAKA BATEKO, B. La bibliologie à l’Institut Supérieur de Statistique de
Kinshasa. Revue de Bibliologie: schéma et schématisation, Paris, n. 80, p. 137-154, 2014.
BOBUTAKA BATEKO, B. Noyers-sur-Serein: centre de la Bibliologie et la Maison
du Schématisme. Revue de Bibliologie: schéma et schématisation, Paris, n. 72, p. 65-76,
2010.
CIMBALANGA MULAMBA, J. La bibliographie géologique et minière du Congo
belge de 1885 à 1960: un instrument d’information et de communication pour les
puissances coloniales européennes. Revue de Bibliologie: schéma et schématisation, Paris,
n. 80, p. 155-170, 2014.
HADO ZIDOUEMBA, D. Histoire de la bibliologie: de l’école médiévale
arabomusulmane à l’école francophone, jusqu’aux années 1980. Revue de Bibliologie:
schéma et schématisation, Paris, n. 79, p. 71-94, 2013.
HADO ZIDOUEMBA, D. La politique du livre et de la lecture au Sénégal (1960-
1990). Revue de Bibliologie: schéma et schématisation, Paris, n. 80, p. 95-113, 2014.
MANUANA-NSEKA, J-P. Les tendances de l’école congolaise en bibliologie. Revue de
Bibliologie: schéma et schématisation, Paris, n. 80, p. 131-135, 2014.
RABAH, A. L’enseignement de la Bibliothéconomie à L’université D’alger: Quelle
formation? Pour quel métier? Revue de Bibliologie: schéma et schématisation, Paris, n.
81, p. 63-78, 2015.
TAMBWE KITENGE, E. Le système éducatif comme élément de reproduction du
modèle colonial: cas du Congo belge. Revue de Bibliologie: schéma et schématisation,
Paris, n. 81, p. 81-99, 2015.
TAMBWE KITENGE, E. Une école bibliologique en RD Congo?: interrogations
critiques et méthodologiques sur une (possible) existence d’une « école » congolaise.
Revue de Bibliologie: schéma et schématisation, Paris, n. 80, p. 117-130, 2014.
agradEcimEntos
Agradecemos à Regina Marteleto, Viviane Couzinet, Daniele Estivals,
Robert Estivals pelo acesso à documentação dos fundos Meyriat em
Toulouse, França, e Noyers-sur-Serein, França.
Carlos Cândido de Almeida & Mariana Vitti-Rodrigues
170
financiamEnto
A pesquisa foi desenvolvida a partir do fomento da Coordenação de
Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), do Conselho
Nacional para o Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), e da
Fundação Carlos Chagas Filho de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de
Janeiro (Faperj).
PARTE II
INFORMAÇÃO,
ÉTICA INFORMACIONAL E
FAKE NEWS
173
5
PERSPECTIVAS ETIMOLÓGICAS
SOBRE A VERDADE E SUAS
RELAÇÕES COM AS FAKE NEWS
ETYMOLOGICAL PERSPECTIVES ON
TRUTH AND ITS RELATIONSHIP
WITH FAKE NEWS
Maria Lívia Pachêco de OLIVEIRA
UFPB
maria.livia@academico.ufpb.br
https://orcid.org/0000-0003-2945-7656
https://doi.org/10.36311/2025.978-65-5954-635-0.p173-192
Carlos Cândido de Almeida & Mariana Vitti-Rodrigues
174
Resumo: O desenvolvimento das tecnologias de informação e comunicação e a formação
de novas redes de relacionamento impactam as dinâmicas dos fenômenos informacionais,
como é o caso das fake news. Apesar da disseminação de notícias falsas estar presente na
história da humanidade, os recursos tecnológicos atuais em conjunto com as mudanças
sociais têm alterado o poder de influência das fake news. Para contribuir com o debate,
realiza-se uma discussão sobre as origens etimológicas do termo verdade, reunindo as três
concepções mais influentes para o significado ocidental do que se entende por verdade.
Ao analisar as definições etimológicas, elabora-se uma análise de como tais fundamentos
da verdade estão presentes nas notícias falsas, em uma tentativa de destacar elementos
danosos utilizados de forma a gerar um simulacro da verdade. Os achados indicam que
o excesso de evidência e de confiança devem ser explorados em torno de iniciativas de
contenção das fake news.
Palavras-chave: Fake News; Verdade; Etimologia; Desinformação; Competência em
informação.
Abstract: e development of information and communication technologies and the
formation of new social networks have affected the dynamics of information phenomena,
such as fake news. Although the dissemination of fake news has been present in human
history, current technological resources along with social changes have altered the
influential power of fake news. To contribute to this debate, a discussion is held on
the etymological origins of the term truth, bringing together the three most influential
conceptions of what is meant by truth in the West. By analyzing the etymological
definitions, an analysis is made of how these foundations of truth are present in fake
news, in an attempt to highlight harmful elements used to generate a simulacrum of
truth. ese findings indicate that the excess of evidence and trust should be explored in
initiatives to prevent fake news.
Keywords: Fake News; Truth; Etymology; Disinformation; Information competence.
Estudos pluridisciplinares da informação: ciência da informação, ética e linguagem - nº 3
175
1 introdução
A preocupação em torno da capacidade de lidar com o volume infor-
macional, e sobre os desdobramentos sociais das relações humanas em de-
corrência do excesso de informação, tem sido uma discussão permanente
entre diversas áreas do saber. Isto porque os fenômenos informacionais são
capazes de alterar as dinâmicas sociais em duas direções distintas: tanto é
possível que tais fenômenos possam fomentar a construção e a partilha do
conhecimento com vias ao progresso social, quanto podem se tornar força
motriz na geração da desordem e do caos social.
Dentre tais fenômenos, destaca-se a desinformação, que significa
“[...] uma informação falsa, enganosa e/ou imprecisa, que pode ser criada
propositalmente com prejuízo a alguém [...].” (Moura; Furtado; Beluzzo,
2019, p. 38). Nessa mesma linha, Fallis (2015) afirma que a desinformação
se caracteriza como informação do tipo enganosa e deliberadamente as-
sim constituída. Dentre as possibilidades de formatação da desinformação,
tem-se a circulação de informação em um simulacro de notícias jornalís-
ticas e similares, nomeada de fake news. Além da necessidade preeminente
do uso da informação e da comunicação para a manutenção das redes de
relacionamentos que formam a tessitura social, há um interesse genuíno
entre os indivíduos de receber, elaborar e partilhar informações sobre o
mundo e seus elementos, sejam eles concretos ou abstratos. Para tal, com-
partilha-se informações obtidas por meio da experiência, da observação, da
reprodução de discursos ou até mesmo da imaginação. Possuir informação
torna-se uma necessidade humana, tanto por ser um meio que conecta o
mundo tangível ao mundo conceitual, quanto por satisfazer o intrínseco
desejo humano da busca por novos saberes.
Nesta movimentação da informação, não há limite para a quanti-
dade de combinações possíveis entre fatos, dados, opiniões, pensamentos,
mentiras, distorções, entre outros. Quando tratamos sobre boatos e ru-
mores, é possível observar que suas estruturas não são baseadas apenas em
mentiras e falsidades, mas também no acesso e na exposição de informa-
ções pessoais e sigilosas que estão ligadas a dinâmicas de poder. Isto pode
ter repercussões não apenas em termos de moralidade e dignidade huma-
na, mas também em relações políticas e econômicas.
Carlos Cândido de Almeida & Mariana Vitti-Rodrigues
176
No que tange às especificidades da linguagem humana, ressalta-se
que, para além da capacidade de transmitir informações sobre o mundo
concreto, a aptidão em falar sobre coisas, entidades e ideias é a caracterís-
tica mais marcante desta linguagem (Harari, 2015). A habilidade de criar
narrativas fictícias, acreditar em lendas, deuses e mitos contribui para a
formação de imaginários coletivos e para a disseminação de informações
específicas, promovendo crenças compartilhadas pertinentes para determi-
nadas comunidades.
A formação de redes de narrativas é comumente identificada como
ficções, construções sociais ou realidades imaginadas. A realidade imagina-
da não é uma mentira, pois ela “[...] é algo em que todo mundo acredita
e, enquanto essa crença partilhada persiste, a realidade imaginada exerce
influência no mundo.” (Harari, 2015, p. 38). Todavia, a realidade imagi-
nada também pode não ser verdadeira em termos factuais e lógicos, e isto
permite que a informação esteja em uma zona de suspeição, afastando a
possibilidade de uma classificação dual entre verdade e mentira.
É neste conjunto de conceitos que debatemos o fenômeno das fake
news. Pretende-se estabelecer uma discussão que permita entender, em ní-
vel inicial, como as concepções etimológicas do termo “verdade” afetam as
problemáticas em torno das notícias falsas. Sugere-se que a base que funda-
menta a ideia da verdade deve ser explorada como elemento importante na
discussão das fake news, visto que as características que forjam o conceito
de verdade podem servir como elementos ambíguos, tornando a incum-
bência da identificação da mentira, do erro, da falsidade e da distorção em
uma tarefa complexa que requer frentes de intervenção especializadas.
Há um extenso espaço de observação entre a dicotomia verdade/
mentira, em que se reconhece a impossibilidade do oposto de uma das
partes significar exatamente a outra. Explorar tais conceitos é um esforço
teórico em torno do fenômeno informacional das fake news e da desinfor-
mação como um todo, pois visa apreender as características que fortalecem
e mantém as notícias falsas em evidência.
Estudos pluridisciplinares da informação: ciência da informação, ética e linguagem - nº 3
177
2 Explorando a Etimologia do tErmo vErdadE
O entendimento da verdade move filósofos e suas correntes teóricas
em busca da compreensão das questões humanas, sendo este um proble-
ma primário a partir do qual outras discussões podem ser contempladas.
Pensar a verdade requer considerar fatores objetivos e subjetivos presentes
em dinâmicas culturais, sociais e emocionais. Compreender a etimologia
da palavra “verdade” é uma oportunidade para perceber as dificuldades
relacionadas à informação quando se pretende classificá-la na dicotomia
verdadeiro/falso.
A compreensão da verdade na tradição ocidental é derivada de três
concepções principais, originárias do grego, do latim e do hebraico. A pri-
meira origem etimológica da verdade remonta à língua grega:
Em grego, verdade se diz aletheia, significando: não-oculto, não-
escondido, não dissimulado. O verdadeiro é o que se manifesta aos
olhos do corpo e do espírito; a verdade é a manifestação daquilo
que é ou existe tal como é. O verdadeiro se opõe ao falso, pseudos,
que é o encoberto, o escondido, o dissimulado, o que parece ser
e não é como parece. O verdadeiro é o evidente ou o plenamente
visível para a razão. (Chauí, 2000, p. 123).
Na concepção grega, a verdade reside nas coisas, na maneira como
elas são apresentadas e na forma como podem ser examinadas pela razão.
O que se contradiz a isto é considerado falso, oculto e não sujeito à veri-
ficação. O legado desse conceito de verdade é a exigência de concretude:
algo é verdadeiro porque se apresenta como tal; é verdadeiro porque a evi-
dência física confirma sua veracidade; é verdadeiro porque todas as partes
estão reveladas e não há necessidade de justificativas adicionais.
Quando a concepção de verdade derivada da aletheia predomina,
a evidência se torna elemento central na determinação da verdade, fun-
damentada em uma lógica racional da realidade, assim, “uma ideia é
verdadeira quando corresponde à coisa que é seu conteúdo e que existe
fora de nosso espírito ou de nosso pensamento” (Chauí, 2000, p. 124).
Reconhece-se que a evidência é a principal qualidade da verdade aletheia,
um princípio profundamente enraizado na cultura ocidental.
Carlos Cândido de Almeida & Mariana Vitti-Rodrigues
178
A segunda origem etimológica provém do latim, apresentando uma
característica distinta daquela encontrada no grego.
Em latim, verdade se diz veritas e se refere à precisão, ao rigor e à
exatidão de um relato, no qual se diz com detalhes, pormenores
e fidelidade o que aconteceu. Verdadeiro se refere, portanto, à
linguagem enquanto narrativa de fatos acontecidos, refere-se
a enunciados que dizem fielmente as coisas tais como foram ou
aconteceram. Um relato é veraz ou dotado de veracidade quando a
linguagem enuncia os fatos reais. (Chauí, 2000, p. 123).
A linguagem influencia a verdade, posto que a precisão não está nas
próprias coisas, como na aletheia, mas sim no relato, no discurso e na nar-
rativa. A veracidade do relato é alcançada quando a linguagem ordena os
eventos, encadeando-os de forma lógica à razão, especialmente quando se
trata de eventos passados ou observações feitas após o fenômeno em ques-
tão. A verdade se fundamenta na coerência da sequência de informações,
fatos e situações. Ao passo que aletheia preza pela evidência, buscando a
transparência das coisas como elas se apresentam, veritas constrói sua ver-
dade na lógica argumentativa, enunciando de modo a expressar a verdade
(Chauí, 2000).
Por fim, a terceira origem etimológica da verdade aqui estudada é
hebraica, chamada de emunah.
Em hebraico verdade se diz emunah e significa confiança. Agora são
as pessoas e é Deus quem são verdadeiros. Um Deus verdadeiro ou
um amigo verdadeiro são aqueles que cumprem o que prometem,
são fiéis à palavra dada ou a um pacto feito; enfim, não traem a
confiança. (Chauí, 2000, p. 123).
A verdade é pautada na confiança em uma primeira instância, po-
dendo ser mais considerada que os próprios fatos (como em aletheia) ou
na narrativa que a expressa (na concepção de veritas). A confiança em uma
autoridade superior pode ser suficiente para determinar a verdade, seja essa
autoridade encontrada na fé religiosa, no carisma de líderes influentes ou
na confiança em um amigo. As convenções universais ilustram a prevalên-
Estudos pluridisciplinares da informação: ciência da informação, ética e linguagem - nº 3
179
cia de emunah, como os acordos científicos que estabelecem a validade de
um fenômeno dentro de um conjunto de conceitos e regras universalmen-
te reconhecidas. Assim, verdade em emunah é fundamentada no consen-
so estabelecido por autoridades reconhecidas em um determinado grupo
(Chauí, 2000).
Reunindo as três origens etimológicas apresentadas, o entendimen-
to do termo verdade é uma síntese destas três concepções. Como afirma
Chauí (2000, p. 124): “Aletheia se refere ao que as coisas são; veritas se
refere aos fatos que foram; emunah se refere às ações e às coisas que serão.
A verdade é formada pelos critérios de realidade (aletheia), linguagem (ve-
ritas) e confiança (emunah).
Chauí (2000) acrescenta a este apanhado de definições a teoria prag-
mática, em que a verdade é determinada por critérios práticos. Resultados
e aplicações práticas são verificadas na experiência, isto é, a verdade prag-
mática necessita da verificabilidade dos seus resultados. Esta perspectiva se
aproxima da aletheia, tendo como adicional a necessidade de constatação
factual, pois, partindo desta concepção da verdade, as coisas são passíveis
de experimentação, essência esta do pragmatismo.
veritas e emunah se aproximam por meio da coerência dos enun-
ciados, sendo possível chegar a consensos. As concepções fundantes sobre a
verdade são diferentes, mas podem corroborar entre si (aletheia/pragmatis-
mo e veritas/emunah) ou se contraporem (aletheia/pragmatismo ou veritas/
emunah).
Sintetizando as concepções apresentadas, Chauí (2000, p. 125)
afirma:
Na primeira teoria (aletheia/correspondência), as coisas e as
ideias são consideradas verdadeiras ou falsas; na segunda (veritas/
coerência) e na terceira (emunah/consenso), os enunciados, os
argumentos e as ideias é que são julgados verdadeiros ou falsos; na
quarta (pragmática), são os resultados que recebem a denominação
de verdadeiros ou falsos.
Carlos Cândido de Almeida & Mariana Vitti-Rodrigues
180
Refletir sobre as origens etimológicas da verdade permite que os
elementos identificados como essenciais em cada vertente possam servir
de base para a análise das características que consolidam o entendimento
coletivo sobre o que é verdade. Também, pode-se analisar como as fake
news utilizam dessas mesmas perspectivas para construir “verdades alterna-
tivas”, expressão esta, inclusive, utilizada para validar distorções e opiniões
infundadas.
Sintetizando os conceitos, tem-se as seguintes possibilidades: a ver-
dade é passível de constatação; a verdade é validada pela ciência; a verdade
leva à transparência e a lucidez; a verdade é produzida pela natureza; a
verdade é o que se crê e o que se experimenta. A oposição de tudo isto
descreve as características que remetem à mentira: falta de dados, evidên-
cias ou experimentos; não é autêntico nem genuíno, não contribui para a
transparência ou clareza. Todavia, no mesmo raciocínio sobre a verdade, a
mentira pode representar o que se acredita, considerando crenças pessoais
e experiências de vida.
A intersecção entre verdade e mentira também ocorre no domínio
das ideias, dos sentimentos e das emoções. É nesse lugar que a desinfor-
mação, a mentira e as fake news podem assumir proporções universais.
Embora seja viável categorizar fatos com base em valores, não é possível
classificar crenças, emoções e sentimentos usando os mesmos métodos e
rótulos.
Chauí (2000) aponta três opostos à verdade: a ignorância, a incer-
teza e a insegurança. A ignorância reside no completo desconhecido, em
que não há consciência da ausência do conhecimento de algo, devido à sua
incompreensão total ou à falta de percepção de sua existência. As crenças
pessoais e coletivas são responsáveis por manter tal estado de ignorância,
sendo úteis em desempenhar uma função de preservação da ordem. A in-
certeza vai além da ignorância, pois traz consigo dúvida e desconfiança,
manifestando-se como um estado de hesitação diante do que antes era
considerado verdadeiro ou do que foi recém-descoberto pela ausência de
ignorância. A condição seguinte é a insegurança. Quando confrontados
com a percepção de que o conhecimento e a experiência acumulada não
são suficientes para satisfazer uma nova necessidade de entendimento, os
Estudos pluridisciplinares da informação: ciência da informação, ética e linguagem - nº 3
181
indivíduos são lançados em um estado de insegurança tão profunda que
desperta a vontade de retornar à estabilidade, buscando sentir-se menos
incertos e mais próximos da verdade.
A aspiração por transcender a incerteza representa a busca pela ver-
dade. Essa “vontade de verdade1” (Camargo, 2008) persiste no ser humano
ao longo de toda a vida, em uma incessante necessidade de discernir entre
o que é verdadeiro e o que não é, relativizando o que é percebido como real
e o que é imaginário.
Desde a infância, as distinções feitas pelas crianças entre “a mentira
e “de mentira” sugerem que elas conseguem discernir que “de mentira” re-
fere-se a uma “realidade imaginada”, um mundo de criações, que é distinto
de “a mentira”, a qual envolve uma violação séria da confiança e da segu-
rança em relação aos seus pontos de referência de verdade. Fatalmente, as
pessoas se deparam com situações de decepção enquanto tentam distinguir
a verdade da mentira, o que as coloca em um estado de busca pela verdade
(Chauí, 2000).
A decepção, a incerteza e a insegurança são estados inerentes ao dese-
jo de conhecer. Sem essas instabilidades, o indivíduo conservar-se-ia em um
estado de certeza, independentemente de corresponder (ou não) a algum
tipo de verdade. Chauí (2000) enfatiza que uma das maiores dificuldades
na busca da verdade é paradoxalmente um elemento que deveria ser um
aliado: a informação. O excesso de informação é um fator que neutraliza
o processo de busca pela verdade, já que a tendência natural do indivíduo
é assumir que a informação é intrinsecamente legítima e verdadeira. Vale
ressaltar que a autora fez essa observação há mais de vinte anos, antes da
presença significativa da internet na comunicação em massa.
Ao considerar o contexto atual, podemos fortalecer a tese de Chauí
(2000), ajustando-a para incluir as dimensões da realidade virtual, da co-
municação instantânea e da multiplicidade de atores sociais que desempe-
nham papéis simultâneos como produtores, disseminadores e espectadores
da informação. É importante notar a dificuldade do indivíduo em dedicar
Segundo Camargo (2008, p. 95), Nietzsche entende que a “vontade de verdade” decorre de uma “vontade
de engano”. A vontade de engano seria a necessidade de se alçar um determinado valor à categoria de
verdade para fazê-lo mais forte e mais poderoso a fim de que se possa acreditar nele.
Carlos Cândido de Almeida & Mariana Vitti-Rodrigues
182
tempo para verificar e comparar diferentes fontes de informação, tornan-
do-o vulnerável à desinformação, mesmo quando a fonte é um especialista
ou uma autoridade reconhecida.
Apesar dos desafios enfrentados na busca pela verdade, ou mesmo na
prévia intenção de iniciar esse processo, os problemas informacionais po-
dem ativar uma força contrária à apatia. Isso pode levar o indivíduo a agir
com obstinação, contestação e demandar explicações, sentindo liberdade
para buscar o conhecimento. Essa segunda forma de busca da verdade, que
não surge necessariamente da frustração ou decepção, é a busca da verdade
na atitude filosófica (Chauí, 2000).
Assim, o sujeito necessita passar pelas situações de decepção2, in-
certeza3 e insegurança4 para que sua vontade pela verdade seja despertada.
Na abordagem filosófica, a busca pela verdade transcende a supressão da
incerteza; envolve também questionar as próprias verdades estabelecidas,
tornando-se assim um processo que requer um alto nível de criticidade.
Pode-se afirmar que não há possibilidade de um estado de verdade perma-
nente, uma vez que a percepção humana é influenciada pelas experiências
individuais, e, portanto, está sujeita a mudanças.
No entanto, é importante reforçar que o erro, a mentira e a falsida-
de não precisam, necessariamente, substituir uma verdade em suspeição.
Quando se questiona ou debate uma verdade estabelecida, não é prudente
apressar-se para substituí-la por uma “nova” verdade, pois isso pode resul-
tar igualmente em erro, falsidade e engano, especialmente se a substituição
for baseada em uma percepção superficial.
Movidas pelo anseio por “liberdade de expressão”, “democracia
e “participação social”, ou ainda, pela “vontade da verdade”, conforme
Nietzsche (1888), as pessoas têm buscado ocupar espaços de fala, assu-
mindo papéis de autoridade, na tentativa de satisfazer o desejo de per-
Decepção, no sentido aqui referido, diz respeito a uma frustração em relação ao que se tinha como verdade
instituída, e que, em algum momento, a mesma não mais se confirmou.
A incerteza se assemelha a um estado de dúvida, momento este em que se racionaliza a necessidade de
reafirmar ou contestar uma determinada verdade.
4 A insegurança desperta a busca por evidências, provas e novos discursos possíveis para que o estado de
segurança na verdade seja reestabelecido.
Estudos pluridisciplinares da informação: ciência da informação, ética e linguagem - nº 3
183
tencimento à sociedade como um todo (ainda que de forma superficial),
ecoando discursos que repetem seus próprios pontos de vista, muitas vezes
sem verificar as informações ou questionar a “verdade” que individualmen-
te construíram, situada em um contexto específico, diferente daquele em
que é aceita.
3 as caractErísticas fundantEs do tErmo vErdadE E suas
rElaçõEs com as Fake News
Ao considerar a necessidade das práticas informacionais para a cons-
trução e manutenção de redes de informação que sustentam a tessitura
social, admite-se a pluralidade de formas e interlocutores em que tais prá-
ticas estão implicadas. Neste sentido, o fator da desordem da informação
(Wardle; Derakhshan, 2017) aparece como um elemento desafiador, so-
bretudo nos espaços virtuais. Participar das práticas informacionais é uma
necessidade e também um desejo dos indivíduos, visto seu intrínseco an-
seio de atuação social.
Partindo do letramento básico até as mais complexas habilidades
para o trato da informação, muitos são os obstáculos para o sujeito, desde
as questões de desigualdade social que o impede de participar efetivamente
dos processos coletivos que envolvem a informação, até a dificuldade que
surge a partir do excesso informacional, entre elas a desinformação. Esta,
atualmente personificada e atuante através das fake news, torna ainda mais
inatingível o objetivo de que a informação seja um elemento de desenvol-
vimento humano e social.
Dentre muitas definições possíveis, sintetiza-se as fake news como um
tipo de informação elaborada com o intuito de ludibriar, enganar, contradi-
zer e confundir, geralmente estruturadas em um simulacro de informação
jornalística, como as notícias. Elas são consideradas um tipo de desinfor-
mação, e diferenciam-se de gêneros como sátiras, charges, paródias e outras
manifestações pautadas no humor ou na ironia. O impacto das fake news
consiste em sua rápida propagação, sua produção desafixada de um ponto
central e da dificuldade em identificar sua ilegitimidade (Oliveira, 2020).
Carlos Cândido de Almeida & Mariana Vitti-Rodrigues
184
Os esforços para a identificação e contenção das fake news exige a
reunião de várias frentes de atuação, desde as soluções tecnológicas quanto
às punitivas, com o estabelecimento de leis e penas. Contudo, reconhe-
ce-se que é necessário pensar em contrapartidas em longo prazo, que en-
volvam uma mudança comportamental dos sujeitos em torno do excesso
informacional. As modificações nos currículos acadêmicos são exemplos
de atitudes concretas em torno dos fenômenos informacionais.
Na ciência da informação e áreas afins, as habilidades para o manejo
da informação são tratadas pelo conceito de competência em informação,
que representa o “[...] processo contínuo de internalização de fundamentos
conceituais, atitudinais e de habilidades necessárias à compreensão e intera-
ção permanente com o universo informacional e sua dinâmica, de modo a
proporcionar um aprendizado ao longo da vida.” (Dudziak, 2008, p. 143).
As pesquisas sobre competência em informação, abordando suas dimensões
e características, têm como objetivo entender as habilidades necessárias para
que os indivíduos ajam de forma autônoma no ambiente da informação.
A competência em informação deriva do termo central information literacy,
que de acordo com a American Library Association (ALA)5 é um conjunto de
habilidades que demanda dos indivíduos a capacidade de reconhecer quan-
do a informação é necessária e ter a competência de localizar, avaliar e utilizar
as informações necessárias de maneira eficaz (ALA, 2020).
Atualmente, não basta possuir um nível moderado de competência
em informação para detectar notícias falsas produzidas com alta qualidade
técnica. Identificar fontes e verificar referências antes de conferir credi-
bilidade à informação tornou-se uma tarefa desafiadora. A disseminação
de informações falsas bem elaboradas é acompanhada por uma rede de
desinformação, incluindo o uso de sites enganosos, imagens manipuladas,
autores e instituições respeitáveis usados como recurso de autoridade para
enganar o leitor (Oliveira, 2020).
 A American Library Association (ALA) é um grupo que promove internacionalmente as bibliotecas e a
educação literária. É a maior e mais antiga organização do gênero no mundo inteiro, com mais de 64.600
membros. Foi fundada em 1876 em Filadélfia e registrada em 1879 em Massachusetts. A sua sede é
atualmente em Chicago.
Estudos pluridisciplinares da informação: ciência da informação, ética e linguagem - nº 3
185
Os indivíduos estão desafiados a transitar entre inúmeras possibi-
lidades de fontes de informação, que se apresentam em uma variedade
de formas. Essa capacidade de discernimento refere-se a um conjunto de
habilidades que permitem ao sujeito compreender, pelo menos de forma
básica, os processos de criação, distribuição e reformulação da informação,
o que é conhecido como atuação autônoma para o trato com a informação.
Entretanto, essa autonomia não deve ser interpretada como individualis-
mo; é fundamental destacar a importância da capacidade de cooperação
entre os indivíduos e da construção colaborativa da informação.
A autonomia que se entende como necessária para o uso da infor-
mação em contextos complexos liga-se ao conceito de protagonismo social
a que se refere Gomes (2019). Trata-se de uma resposta à desinformação e
à disseminação de informações falsas; não há solução para esses problemas
que não envolva a necessidade de criticar, contextualizar e reinterpretar
as “verdades” que circulam, em um esforço coletivo para superar as in-
justiças sociais, a alienação e a manipulação em massa por meio da (des)
informação.
Além de considerar a complexidade do desenvolvimento de com-
petência em informação e de outras habilidades intelectuais, aponta-se,
também, que o próprio senso comum, reforçado culturalmente pelas tro-
cas interpessoais e pelo sistema educacional, possui força de atuação na
concepção do que é verdadeiro e falso. Desse modo, relaciona-se as três
origens etimológicas aqui apresentadas com algumas características encon-
tradas nas fake news.
Quando se examina a verdade em aletheia, percebe-se que a evi-
dência é a sua base. Em uma rápida análise, seria possível concluir que a
evidência é indispensável para a análise de uma determinada situação, to-
davia, a evidência em excesso é um complicador para a manifestação de um
pensamento crítico por meio do estado de dúvida (Bezerra; Scheneider;
Brisola, 2017). O ato de duvidar, no sentido de estabelecer um momento
reflexivo diante das evidências expostas, permite que o sujeito inicie um
ciclo de questionamentos, expondo suas necessidades informacionais que
serão úteis para se chegar a uma nova ideia, em um movimento relativa-
mente autônomo diante da informação.
Carlos Cândido de Almeida & Mariana Vitti-Rodrigues
186
Considerando isto, o excesso de evidência pode se tornar um impe-
ditivo para a autonomia, visto que quanto mais elaborada for a evidência,
menor será a intensidade do questionamento e da busca investigativa, e
consequentemente, da instauração da dúvida. Assim, as pessoas passam a
atuar com menor grau de autonomia, visto que tudo que se julga necessá-
rio já está posto, sendo este um lugar propício para manipulações de dados
e informações, tornando mais fácil a inserção da desinformação.
As notícias falsas frequentemente são apresentadas com um alto ní-
vel de evidência, utilizando elementos como imagens, vídeos, áudios, re-
ferências a leis e declarações de autoridades, entre outros. Esses elementos,
devido à sua aparência de veracidade, muitas vezes dificultam a instauração
do estado de dúvida. Como resultado, a evidência tem sido cada vez mais
uma informação que não provoca ação crítica por parte do indivíduo, mas
sim o impulsiona a compartilhar a mesma, acreditando estar contribuindo
para o debate coletivo como um cidadão consciente.
Em se tratando da verdade advinda do termo veritas, a precisão de
um relato, com uma a narração detalhada de um acontecimento, interfere
no grau de veracidade sobre determinado fato. A coesão interna dos fatos
narrados pode ser realizada de modo a preencher as lacunas formadas pelos
questionamentos básicos, a saber, questões sobre os sujeitos envolvidos, o
tempo, o lugar, as circunstâncias, etc. Pode-se ter como exemplo, uma versão
dada a partir de uma observação sobre um acontecimento qualquer. Quanto
mais coesão e coerência linguística, somadas à argumentação de ideias, mais
provável que este relato pareça ser uma espécie de tradutor da verdade.
A linguagem se torna uma influente ferramenta para descrever
a “verdade”, e a “realidade”, visto que o uso de uma coerência lógica da
narração dos fatos faz com que se deixe de questionar detalhes, ou que
se ignore episódios alheios que não se adequam à narrativa. Uma síntese
bem construída, especialmente quando se utiliza a linguagem apropriada
a determinado caso – como a linguagem técnica, faz com que o interlo-
cutor se sinta convencido do fato contado. Durante crises sociais, como a
mais recente pandemia mundial enfrentada entre 2019 e 2022, muitas fake
news circularam em simulacro de artigos científicos, estudos e similares,
Estudos pluridisciplinares da informação: ciência da informação, ética e linguagem - nº 3
187
demonstrando o poder da linguagem bem articulada na propagação das
fake news.
As sínteses prontas, sejam elas narradas textual ou verbalmente, tam-
bém reduzem a capacidade crítica e a instauração da dúvida, ainda mais
quando tais narrativas sofrem “recortes”, são descontextualizadas ou conec-
tadas com outros assuntos dos quais não foram originalmente conectadas.
Considerando que as fake news são, em geral, motivadas por emo-
ções, crenças pessoais e teses aceitas coletivamente, retornamos ao sentido
em emunah para tecer algumas colaborações. Emunah remete à confiança
instituída no outro, visto que este apresenta características ou status que
por si só representa fidelidade, confiança e segurança. Dá-se tal confiança a
partir dos papéis estabelecidos nas relações, como na força dos líderes po-
líticos ou sobre entidades abstratas presentes em crenças religiosas. Porém,
em uma perspectiva particular, tal confiança pode ser conferida a um ami-
go, um professor, ou a alguém em que deposita admiração e respeito.
A verdade em emunah lida com sentimentos, emoções e percepções.
O papel do outro é fundamental enquanto um porta-voz da verdade, ou
um mediador confiável da mesma. Nisto, substitui-se facilmente evidên-
cias e narrativas, como em aletheia e veritas. Emunah possui um viés de
fé, de convicção e de esperança na verdade. Nota-se que este componente
pode tanto ser válido para reforçar evidências e narrativas consideradas
honestas, como pode se sobressair contrariamente diante de fatos compro-
vados, levando ao descrédito instituições renomadas, como à ciência.
Ao reunir as características da verdade em aletheia, veritas e emunah,
pode-se presumir quanto a concepção de verdade ocidental é multifacetada.
Envolve uma combinação de fatores capazes de relativizar os fatos mesmo
diante de verdades universalmente aceitas. Por um lado, tais características
são oportunas quando utilizadas em prol do desejo de conhecer, como um
incentivo à busca pelo conhecimento. Em contrapartida, tais componentes
fundantes do conceito de verdade podem ser explorados contrariamente a ela.
Ao compreender a lógica que fundamenta a verdade, permite-se que
as informações falsas, a mentira e a desinformação como um todo, sejam
expostas de modo a se assemelharem à verdade. As características apresen-
Carlos Cândido de Almeida & Mariana Vitti-Rodrigues
188
tadas nas três origens do termo verdade podem ser combinadas em graus
diferenciados, para atingir com mais eficácia determinado grupo.
Onde houver baixo letramento e competência informacional,
emunah certamente será considerada em primeira instância. Considerando
a dificuldade de decodificar e de analisar informação, apela-se para a fé no
outro, na confiança estabelecida previamente e que fortalece os vínculos
entre os sujeitos. Emunah repousa na segurança gerada em algo que se diz
honesto, digno e confiante.
Aletheia é bem explorada em evidências que não exigem espaço para
questionamentos, como as imagens, sejam elas descontextualizadas, altera-
das ou construídas, especialmente sob o uso de inteligência artificial. O cri-
vo da razão é substituído pela força semântica da imagem, da síntese posta
com rapidez e alto impacto. Já veritas pode fundamentar uma explicação
que aparentemente faz sentido, e quanto mais recursos e argumentos, me-
nos se pensará em reunir novas informações. Veritas é capaz de ludibriar
o sujeito em uma falsa sensação de aprofundamento e de criticismo, pre-
enchendo a lacuna da incerteza pautada numa racionalização vazia e falsa.
Fake news elaboradas com alto grau de conhecimento de tais fatores,
muitas vezes combinando todos eles, dificultam o acesso à decepção, à
incerteza e à insegurança, elementos estes que estimulam a busca pela ver-
dade. Quanto mais se conhece sobre a verdade, mais recursos podem ser
explorados em prol da desinformação.
Adiciona-se a isto elementos que definem a sociedade contempo-
rânea considerada pós-moderna, como a tendência à desconfiança nas
instituições, o individualismo acentuado e o hedonismo, a fragmentação
do tempo e do espaço e o excesso de relativismo. Essas motivações são
enraizadas na cultura específica de cada sociedade, sujeitas a uma rápida
avaliação lógica pelos indivíduos, com base em suas experiências passadas
e no contexto particular e coletivo em que estão inseridos.
O reconhecimento de tais características torna-se oportuno para a
reflexão sobre possibilidades de intervenção sobre as fake news. Destaca-se
que um único método de checagem de fatos, por exemplo, dificilmente
Estudos pluridisciplinares da informação: ciência da informação, ética e linguagem - nº 3
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será capaz de intervir em termos tão complexos descritos nas três vertentes
etimológicas da verdade apresentadas no texto.
De igual modo, as barreiras tecnológicas criadas tendem a estar em
descompasso com a quantidade de inovação em inteligência artificial;
isto impulsiona os métodos punitivos de combate às fake news, os quais
têm dilemas éticos a percorrer. Afastando-se desta visão pouco otimista,
acredita-se que a via educativa desponta como uma espécie de solução
adaptativa, que embora requeira tempo, deverá ser capaz de contornar o
fenômeno das fake news e outros mais advindos da desinformação.
4 considEraçõEs finais
As fake news não se resumem a mentiras que desaparecem quando os
dados e as evidências são verificadas. Elas têm o poder de influenciar mo-
bilizações sociais, estimular aglomerações, instigar sentimentos de medo e
caos social, bem como difamar, caluniar e destruir reputações, e, em casos
extremos, mas não raros, podem incitar ações criminosas. Este fenômeno
tem fundamento em questões emocionais e afetivas, e ganham forma e
impulso nas redes sociais, tornando-se difícil de ser combatido.
Opiniões formadas com base em experiências individuais podem ser
consideradas como informação relevante, criando uma disparidade entre
a divulgação de informações de qualidade, embasadas em fatos, pesquisas
e dados, e a divulgação apenas para expressar opiniões pessoais e ser va-
lidado por outros com pontos de vista semelhantes. Isso evidencia ainda
mais a urgência no desenvolvimento de competências em informação e na
promoção de um discurso mais profundo sobre como desenvolver tais ha-
bilidades para além dos ambientes educacionais formais (Oliveira, 2020).
Os elementos recorrentes que legitimam informações falsas variam
em termos de manipulação e sofisticação, podendo ser facilmente identifi-
cados em algumas situações e exigir expertise técnica em outras. No entan-
to, simplesmente identificar esses elementos não é o bastante para conter
a disseminação de desinformação, pois geralmente estão inseridos em uma
estrutura complexa de outros dados que não se baseiam na verdade, mas
Carlos Cândido de Almeida & Mariana Vitti-Rodrigues
190
que, deliberadamente, utilizam os princípios fundamentais do conceito de
verdade em sua construção.
O desejo das pessoas de participar ativamente das redes de infor-
mação, especialmente como produtores e disseminadores de conteúdo, é
um sinal promissor para a criação de uma cultura de colaboração e enga-
jamento social. Embora isso não seja novo para os campos da informação
e comunicação, quando visto em relação às fake news, requer uma análise
mais criteriosa de novos elementos cruciais, especialmente na complexa
interação entre informação, competência e protagonismo.
Com base na literatura examinada, destaca-se a importância de dois
elementos atuantes na propagação das fake news: o excesso de evidência e
o excesso de confiança. À primeira vista, o excesso de evidências pode pa-
recer ser benéfico para a verificação da informação, proporcionando uma
sensação de maior precisão e profundidade. Isso porque, quanto mais da-
dos disponíveis, mais detalhada e esclarecedora a informação aparenta ser,
eliminando dúvidas e abordando minúcias.
Em casos de informações mal estruturadas, típicas de fake news, com
erros evidentes e falhas perceptíveis até mesmo para pessoas minimamente
alfabetizadas em diferentes áreas, a falta de evidência é um indicador de
alerta para questionamentos. No entanto, os formatos de desinformação
têm se tornado cada vez mais complexos, e esses, justamente, são reforça-
dos por uma variedade de evidências, o que reduz a disposição do indiví-
duo para reflexão e debate, pois o apresentado parece ser suficiente para
validar a narrativa proposta.
O excesso de evidências contribui para um estado passivo por parte
do sujeito, tornando a autonomia no uso da informação dependente de
uma reconfiguração tanto da postura crítica individual quanto coletiva.
Esse problema é agravado pela falta de uma cultura educacional que pro-
mova a autonomia, especialmente diante da entrada abrupta em um am-
biente hiperconectado e saturado de informações.
O segundo elemento complicador identificado é o excesso de con-
fiança. Nesse caso, a confiança na autoridade de quem fala torna-se difícil
de ser contestada. Embora esse não seja um fenômeno novo, uma vez que
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a confiança sempre foi essencial para a sobrevivência, sendo a base da co-
municação entre os indivíduos, é preciso reconhecer que sem ela a socie-
dade não teria conseguido enfrentar os desafios impostos pelo clima, pelo
ambiente e pela organização social.
Mais uma vez, a atenção se volta para a concepção de verdade emunah
e para um desafio adicional: a multiplicidade de autoridades de fala. Com
a internet, a produção e o compartilhamento de informações tornaram-
se acessíveis a um grande número de pessoas, independentemente de
sua autoridade socialmente reconhecida por meio de títulos, cargos ou
habilidades. A confiança no que é apresentado pelo outro, sem um exame
crítico, amplifica as chances de disseminação da desinformação, e é neste
ponto que os elementos subjetivos devem ser considerados nas tentativas
de combate a esse fenômeno.
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193
6
O CENÁRIO DE DISRUPÇÃO NA
ESFERA PÚBLICA MEDIADA POR
SISTEMAS AUTOMATIZADOS:
DESINFORMAÇÃO E EROSÃO DA
CONFIANÇA
THE SCENARIO OF DISRUPTION IN
THE PUBLIC SPHERE MEDIATED
BY AUTOMATED SYSTEMS:
DISINFORMATION AND EROSION OF
TRUST
Renata MIELLI
MCTI/CGI.br
renatavmielli@gmail.com
https://orcid.org/0000-0002-4513-6214
Anderson Vinícius ROMANINI
USP
vinicius.romanini@usp.br
https://orcid.org/0000-0001-6558-0550
https://doi.org/10.36311/2025.978-65-5954-635-0.p193-211
Carlos Cândido de Almeida & Mariana Vitti-Rodrigues
194
Resumo: O capítulo examina as transformações no debate público a partir da mediação
algorítmica nas plataformas sociodigitais. A análise se baseia em uma abordagem semiótica
e no conceito de esfera pública de Habermas, discutindo como o uso de algoritmos
de aprendizagem de máquina direciona a produção e circulação de informações. Os
autores exploram a influência de discursos morais e emocionais na formação de crenças,
ressaltando o impacto da microsegmentação de conteúdos e o aumento da desinformação.
Referenciando também em autores como Bourdieu e Castells, o artigo aborda como
a estruturação das plataformas digitais reconfigura as relações de poder e a confiança
pública, gerando fragmentação e intensificando o discurso de ódio. A análise crítica
dos autores destaca como essas dinâmicas afetam negativamente a democracia e a vida
social, ao mesmo tempo em que levantam desafios éticos relacionados à manipulação
informacional por sistemas automatizados.
Palavras-chave: Desinformação; Comunicação; Plataformas Sociodigitais; Internet;
Semiótica.
Abstract: is chapter examines the transformations in public debate as a result of
algorithmic mediation on socio-digital platforms. e analysis is based on a semiotic
approach and Habermas’ concept of the public sphere, discussing how the use of machine
learning algorithms directs the production and circulation of information. e authors
explore the influence of moral and emotional discourses on the formation of beliefs,
highlighting the impact of content microsegmentation and the increase in disinformation.
In addition, by referencing authors such as Bourdieu and Castells, this chapter addresses
how the structuring of digital platforms reconfigures power relationships and public
trust, generating fragmentation and intensifying hate speech. e authors’ critical analysis
highlights how these dynamics negatively affect democracy and social life, while raising
ethical challenges related to the manipulation of information by automated systems.
Keywords: Disinformation; Communication; Sociodigital Platforms; Internet; Semiotics.
Estudos pluridisciplinares da informação: ciência da informação, ética e linguagem - nº 3
195
1 introdução
Nós somos uma espécie comunicacional. Um dos fatores chave que
determinaram o desenvolvimento da humanidade é a nossa capacidade
muito particular de nos comunicarmos através de palavras organizadas a
partir da estrutura racional do nosso pensamento. De acordo com Deacon
(1997), a evolução humana está profundamente vinculada à essa nossa ha-
bilidade de manipular símbolos e significados através da linguagem, o que
nos diferencia de outras espécies. É exatamente a possibilidade de expressar
ideias, opiniões, perspectivas, pontos de vista, sentimentos, emoções, por
quaisquer meios (corporal, linguagem, sensorial) o que permite a interrela-
ção entre sujeitos, garantindo tanto a preservação da singularidade, quanto
da diversidade, seja no contexto da busca de unidades e continuidades ou
em processos de transformações e rupturas.
Este é o papel central da comunicação na sociedade, ser um processo
de trocas simbólicas e mediações que organizam nossa ação no mundo.
A complexidade da evolução humana e, portanto, das relações entre
os sujeitos, acompanhada do desenvolvimento de novos dispositivos tec-
nológicos para intermediar essas relações, trouxeram novas possibilidades
para realizar a comunicação como ação e objeto, como na definição formu-
lada por Sodré (2014, p. 15):
[…] o fazer organizativo das mediações imprescindíveis ao comum
humano, a resolução aproximativa das diferenças pertinentes em
formas simbólicas. As coisas, as diferenças aproximam-se como
entidades comunicantes porque se encadeiam no vínculo originário
(uma marca de limites, equiparável ao sentido) estabelecido pelo
símbolo.
Esta perspectiva se sobressai no contexto de uma sociedade hiper-
midiatizada, em que o surgimento de novos aparatos sociotécnicos altera
profundamente as formas de organização dos processos comunicacionais.
McLuhan (1964) destacava que as mudanças nos meios de comunicação
impactam diretamente a maneira como a informação é percebida e como
os sujeitos interagem. Com a ascensão da era digital e das redes de comu-
Carlos Cândido de Almeida & Mariana Vitti-Rodrigues
196
nicação em massa, Castells (1996) argumenta que os fluxos de informação,
mediados por redes eletrônicas, reestruturam as interações sociais, políticas
e culturais. Estes novos mecanismos de mediação não apenas alteram a for-
ma como as pessoas enviam e recebem informações, mas também desafiam
a construção de parâmetros comuns para o debate público, criando novas
dinâmicas de poder e participação social.
A superexposição de mensagens a que estamos submetidos pode ge-
rar o que Houser (1992) denomina “desagregação da mente social”, um
fenômeno no qual as estruturas simbólicas que sustentam a coesão social
começam a se fragmentar. Essa fragmentação pode levar à desintegração
da esfera pública, conforme a multiplicidade de discursos e informações
contraditórias mina os mecanismos de confiança que, embora frágeis, ain-
da sustentavam o debate público. Nesse cenário, o colapso dos referenciais
comuns torna cada vez mais difícil a construção de diálogos e consensos
sobre temas de interesse social, contribuindo para uma crise de significado
e uma crescente polarização.
Além disso, o surgimento de novas e mais sofisticadas técnicas de
manipulação de imagens, sons e textos, potencializadas pela Inteligência
Artificial, aprofunda o cenário de insegurança informacional. Segundo
Coeckelberg (2023), essas tecnologias ampliam a incerteza sobre “no que
e em quem acreditar”, criando um ambiente em que a autenticidade das
informações se torna cada vez mais difícil de verificar. Nesse contexto, não
apenas a dúvida é fomentada, mas também o fortalecimento de interações
baseadas na validação de perspectivas individuais e em estímulos cogniti-
vos que respondem a conteúdos de caráter moral e emocional.
Esse cenário é ideal para a proliferação da desinformação, definida
como conteúdos criados com o propósito de causar danos e obter benefí-
cios específicos, de acordo com a conceituação da Unesco (2019, p.7):
[...] tentativas deliberadas (frequentemente orquestradas) para
confundir ou manipular pessoas por meio de transmissão de
informações desonestas. Isso geralmente é combinado com
estratégias de comunicação paralelas e cruzadas e um conjunto
de outras táticas, como hackear ou comprometer pessoas,
Estudos pluridisciplinares da informação: ciência da informação, ética e linguagem - nº 3
197
frequentemente elaborada com recursos e acentuada pela tecnologia
automatizada.
Essa desinformação não é aleatória, é produzida em escala industrial
e com o intuito de atingir um alvo de forma milimétrica, a partir dos dados
e metadados que são coletados pelas plataformas sem nosso consentimento
e, muitas vezes, sem o nosso conhecimento.
Coeckelbergh (2023) destaca que a coleta e o uso de dados por siste-
mas de inteligência artificial, voltados para maximizar a eficiência e o con-
trole sobre o comportamento dos usuários, permitem que os alvos sejam
atingidos de maneira calculada e eficaz. Sublinha os dilemas éticos dessa
prática, ressaltando que, em um ambiente digital onde a automação e o
aprendizado de máquina moldam a distribuição de informações, os indi-
víduos tornam-se cada vez mais vulneráveis à manipulação. Esse processo
desafia as bases da confiança e da autonomia no espaço informacional, com
consequências profundas para a democracia e a vida social.
Diante disso, um dos desafios mais importantes da sociedade con-
temporânea é encontrar os mecanismos mais adequados para enfrentar o
atual contexto de desinformação, discurso de ódio, e desintegração da es-
fera pública trazidos pelos novos modelos de produção e distribuição da
informação.
2 a Evolução dos mEios dE comunicação E sEu impacto social
Ao longo da história, o controle sobre os instrumentos de comuni-
cação tem sido um elemento central na disputa de ideias e na manuten-
ção do poder político na sociedade. Segundo Bourdieu (1997), o domínio
sobre os meios de comunicação é uma forma de capital simbólico, o que
significa que aqueles que controlam esses aparatos tecnológicos exercem
influência decisiva sobre a construção das representações sociais e políticas.
Historicamente, esse controle foi exercido tanto pelo Estado quanto pelo
setor privado, frequentemente associado ao poder político dominante.
A cada salto tecnológico, a forma como a comunicação se estru-
turava ditava um padrão de uso que reforçava a hegemonia das ideias na
Carlos Cândido de Almeida & Mariana Vitti-Rodrigues
198
sociedade. O rádio, por exemplo, foi crucial para os objetivos culturais
e políticos do nazismo na Alemanha, atuando como um meio de difu-
são massiva da ideologia do regime. Bourdieu (1997) argumenta que os
meios de comunicação funcionam como mecanismos de perpetuação das
relações de poder, organizando os discursos hegemônicos em diferentes
momentos históricos.
Em cada ciclo evolutivo das tecnologias de comunicação, surgia a
ideia de que um novo suporte técnico substituiria os anteriores. Temia-
se, por exemplo, que o rádio acabaria com os jornais, ou que a televisão
iria suplantar o rádio, e mais recentemente, que a internet enterraria os
jornais e revistas. Na realidade, como aponta Bourdieu, o que ocorre é
uma reacomodação dos papéis desses veículos dentro de um ecossistema
comunicacional que se retroalimenta, ampliando as formas de exercício da
dominação política e cultural, ao invés de eliminá-las.
O ecossistema atual é composto tanto pelos antigos meios de comu-
nicação de massa quanto pelas novas plataformas sociodigitais. Nos meios
tradicionais, a informação fluía de um único pólo emissor para muitos re-
ceptores. No entanto, com as plataformas digitais, a produção de conteúdo
se tornou de muitos para muitos, mediada por algoritmos de aprendizado
de máquina e inteligência artificial. Segundo Romanini e Mielli (2021),
essa mediação algorítmica intensifica a superabundância informativa e re-
define o processo de relevância e visibilidade dos conteúdos, sem necessa-
riamente considerar a qualidade da mensagem.
Anteriormente, as instituições tradicionais (como empresas de jorna-
lismo e partidos políticos) conferiam credibilidade e autoridade às informa-
ções. Porém, no novo padrão de comunicação de muitos para muitos, o
protagonismo do debate público foi transferido para influenciadores digitais.
Romanini e Mielli (2021) destacam que, nesse ambiente, o conteúdo perde
relevância em detrimento de fatores externos, como a popularidade do emis-
sor e os critérios algoritmos que determinam a distribuição. A superabun-
dância informativa e a ação dos algoritmos, frequentemente opaca, moldam
o fluxo das mensagens, promovendo a circulação de conteúdos que atendem
a interesses econômicos e aumentam a alienação dos usuários.
Estudos pluridisciplinares da informação: ciência da informação, ética e linguagem - nº 3
199
Neste novo ambiente, o próprio conteúdo da mensagem perde cada
vez mais relevância. O que importa são um conjunto de fatores externos
a ele: o porta voz da mensagem (sua popularidade digital), os critérios
algoritmos para segregar o público e distribuir a mensagem, o design da
plataforma e a dinâmica do fluxo de circulação dos conteúdos que ocorre
num ambiente de superabundância informativa. Nas plataformas sociodi-
gitais, estes fatores todos se imbricam num contexto no qual o tempo de
exposição do usuário aos conteúdos é cada vez menor.
Lang (2013) alerta que a percepção das mensagens é influenciada
por vários fatores, dentre os quais relevância motivacional, as característi-
cas estruturais que despertam a atenção, o ritmo, o ambiente, e o tempo
em que se dá a interação entre uma mensagem e um ser humano inserido
em um ambiente. Assim, a comunicação não é a mensagem e não é o que o
ser humano recebeu, mas sim um conjunto de fatores determinado pela in-
teração do tempo extra da mensagem, do ser humano e do meio ambiente.
A variação da relevância motivacional, ou as características
estruturais que despertam a atenção, ou o ritmo em que a mensagem
é apresentada, ou o ambiente no qual é percebida influenciam quais
aspectos da mensagem são selecionados para processamento posterior,
quão bem esses aspectos são armazenados e sua acessibilidade,
relevância e influência no tempo, quando uma pessoa está tomando
uma decisão sobre como agir. (Lang, 2013, p. 219, tradução nossa).
Essa abordagem tem relevância particular para compreender os pro-
cessos de produção de sentido no atual cenário do ecossistema informacio-
nal, no qual além dos meios de comunicação tradicionais (jornais, revistas,
rádio, televisão), há também um conjunto novo de fontes informativas di-
gitais a partir da internet: sites, ferramentas de buscas, aplicações variadas,
plataformas de redes sociais, serviços de mensageria, assistentes virtuais
baseados em IA (Siri, Alexa) e agora os Large Language Models (LLMs) de
Inteligência Artificial como o Lhama, ChatGPT entre outras IAs generati-
vas como MidJourney e Gemini.
Carlos Cândido de Almeida & Mariana Vitti-Rodrigues
200
3 gatilhos Emocionais para amplificar a dEsinformação E
formar crEnças
A circulação de informação e notícias nas plataformas sociodigitais
é mediada por mecanismos de direcionamento de conteúdos estruturados
por dados pessoais, que perfilizam1 os usuários com base em seus hábitos
de navegação e em um modelo desenvolvido para avaliar indivíduos a par-
tir de cinco traços de personalidade mapeados por estudos de comporta-
mento: (i) extroversão, (ii) amabilidade, (iii) consciência ou confiabilidade,
(iv) estabilidade emocional, (v) intelecto (Goldberg, 1992).
Esses cinco fatores – Big Five – favorecem exatamente a dissemina-
ção de conteúdos de caráter moral-emocional de acordo com cada perfil.
Esse processo tem se sofisticado a partir das tecnologias digitais de captura
de dados pessoais, particularmente com a ubiquidade das redes sociais, que
reúnem bilhões de usuários em suas plataformas, interagindo de forma
permanente.
Uma das consequências disso é a fragmentação do debate público,
no qual as crenças são formadas por vieses de confirmação de posições pré-
-estabelecidas, conceitos e preconceitos. Sem choque de posições a partir
de pluralidade e diversidade de ideias, as opiniões das pessoas são validadas
e alimentadas principalmente a partir dos métodos da autoridade e da te-
nacidade, conforme descrito por Peirce2 (1992, p. 109, EP1).3
Esse ambiente concorre para a corrosão das premissas clássicas de
uma esfera pública de debates, baseada em processos comunicativos que
De acordo com (Doneda, 2020, p. 148, 149) profiling são técnicas voltadas à elaboração de perfis de
comportamento de uma pessoa ou grupos a partir de informações disponibilizadas direta ou indiretamente.
Essas informações são tratadas com auxílio de métodos estatísticos e de técnicas de inteligência artificial,
para obter dados sobre os hábitos, preferências pessoais, interesses, desejos de consumo, localização
geográfica, posições políticas ou outras características assemelhadas. Esse perfil pode ser utilizado para traçar
um quadro das tendências de futuras decisões e comportamentos.
Os quatro métodos de fixação das crenças desenvolvidos por Peirce em seu texto de 1877, e Fixation
of Belief (EP 1:109), são os métodos da tenacidade, da autoridade, a priori e o científico. O método da
tenacidade é o mais primitivo para fixar crenças, o mais individual. O método da autoridade é determinado
pela palavra de uma autoridade constituída (instituição ou pessoa), que usa da sua posição de liderança para
impor uma crença coletiva. O método a priorístico apela ao gosto individual, ao sentimento, e transforma
a crença em capricho. O método científico é aquele alcançado a partir do diálogo de uma comunidade de
interessados, que se aproxima da verdade como ideal normativo.
Neste trabalho EP é citação para e Essencial Peirce - v.1 (EP 1, 1992).
Estudos pluridisciplinares da informação: ciência da informação, ética e linguagem - nº 3
201
buscam, a partir de critérios de validade, chegar a um consenso social.
Usamos o conceito de esfera pública oferecido por Habermas, como sendo
os espaços sociais onde ocorrem os processos de comunicação e debate so-
bre temas de interesse público, para estabelecer as relações de pressão entre
a sociedade e o Estado. (Habermas, 2011, 2019).
As plataformas de redes sociais se orientam funcionalmente para a
acumulação de capital, numa nova economia política que tem a mineração
de dados como meio de negócio. O que se opõe ao conceito de esfera pú-
blica habermasiana, que deveria ter como orientação normativa a produ-
ção de um entendimento sobre questões da vida em comum. E, sem esfera
pública, a política democrática não é possível.
O design imposto pelas plataformas agrava este cenário, porque des-
loca de uma forma radical o que poderíamos chamar de ato de fala (para
usar o termo de Habermas), para as imagens (fotos, memes e cada vez mais
os vídeos curtos). Ao determinarem de forma impositiva a forma que a
comunicação precisa ter: textos de 280 caracteres (Twitter), vídeos de 15
segundos (stories Instagram) ou 60 segundos (Reels) essas plataformas vão
desenhando também conteúdos que se adaptam a esses formatos.
Os tipos de conteúdos que se adequam a esses formatos efêmeros são
aqueles que acionam a atenção e estimulam uma reação de forma instan-
tânea, sem a necessidade de uma reflexão mais larga, conteúdos de disparo
rápido no sistema cognitivo que são as emoções. Peirce refletiu sobre o
papel da atenção como fator fundamental para colocar ênfase sobre os ele-
mentos objetivos da consciência, produzindo efeitos sobre ela e afetando o
nosso conhecimento e influenciando o pensamento, porque
[...] ela afeta fortemente a memória, um pensamento sendo
lembrado por um tempo maior quanto maior for a atenção
originalmente dada a ele. [...] quanto maior a atenção, mais estreita
a ligação e mais exata a sequência lógica do pensamento. (Peirce,
1992, p. 46, EP 1, Tradução nossa)
É exatamente assim que nos conectamos com os conteúdos que cir-
culam nas plataformas de redes sociais: memes, vídeos curtos, fotos, pe-
Carlos Cândido de Almeida & Mariana Vitti-Rodrigues
202
quenos textos vão sendo “carregados” nos nossos feeds/timelines, com base
em decisões algorítmicas. Vamos rolando esses feeds e reagimos aos conte-
údos que capturam a nossa atenção.
A captura da atenção pela disseminação desses conteúdos também
se favorece pela repetição provocada pelo compartilhamento das mesmas
postagens ou por mensagens semelhantes, gerando mecanismos de associa-
ção por indução.
A atenção é levantada quando o mesmo fenômeno se apresenta
repetidamente em ocasiões diferentes, ou o mesmo predicado em
diferentes sujeitos. Vemos que A tem certa característica, que B tem
a mesma, C tem a mesma; e isso excita nossa atenção, de modo
que dizemos: “Estes têm essa característica.” Assim, a atenção é
um ato de indução; mas é uma indução que não aumenta nosso
conhecimento, porque nosso “estes” não cobrem mais do que as
instâncias experimentadas. Em suma, é um argumento baseado na
enumeração. (Peirce, 1992, p. 46, EP 1, Tradução nossa)
Esse mecanismo de associação pela captura da atenção, repetição e
reforço é um dos recursos que favorece a desinformação. Mielli e Romanini
(2022) apontam como esses conteúdos são favorecidos pelo design que im-
põem a abundância e a velocidade, onde nossa atenção é capturada por es-
tímulos morais/emocionais – de disparo rápido no sistema cognitivo – que
acionam nossa percepção essencialmente a partir dos elementos icônicos e
indiciais das mensagens, nos levando a reagir por reflexo e nos prendendo
num ciclo que desloca o equilíbrio do processo semiótico no sentido dos
elementos de primeiridade e secundidade4. Esse modelo limita as possibi-
lidades de reflexão, que nos permitiria extrair os elementos de terceiridade
das trocas simbólicas. Nesse ambiente, as crenças são formadas por viés
Para Peirce, o signo é alguma coisa que professa representar outra coisa de maneira a determinar um efeito,
que é o resultado da representação. Na semiótica peirceana esse processo é triádico: algo que representa,
algo que é representado e algo que se coloca como efeito dessa representação. Ícones, índices e símbolos
passam a ser derivados dos três diferentes tipos de relação que um signo pode ter com seu objeto. O ícone
tem uma relação monádica, por semelhança, quando signo e objeto possuem a mesma propriedade, ou por
exemplificação, quando o objeto é uma propriedade que o signo possui. O índice apresenta uma relação
diádica com seu objeto, por possuir uma conexão real com ele. Apenas o símbolo possui uma relação
genuinamente triádica e, portanto, intrinsecamente lógica, tendo um poder de representação que se dá
por convenção arbitrária. Peirce estrutura, a partir dessas relações, 3 categorias elementares: a primeiridade
(ícone), a secundidade (índice) e a terceiridade (símbolo). (Romanini, 2016).
Estudos pluridisciplinares da informação: ciência da informação, ética e linguagem - nº 3
203
de confirmação de posições pré-estabelecidas, conceitos e preconceitos.
Prevalece o desentendimento. Sem o choque de posições a partir de plu-
ralidade e diversidade informativas, as crenças são validadas e alimentadas
principalmente a partir da autoridade e da tenacidade.
A distribuição de conteúdos por seleção algorítmica, descritos por
Pariser (2011) como “bolhas de filtro”, conectam pessoas com valores se-
melhantes, isolando grupos em bolhas de afinidade. Esse fenômeno impede
um debate público saudável, no qual ideias diferentes podem se confrontar
e levar a consensos racionais. Em vez disso, reforçam-se preconceitos e opi-
niões pré-existentes, criando uma “guerra de posições”. Como os usuários
não compreendem as regras de mediação dos algoritmos, suas crenças são
moldadas de maneira opaca, limitando a exposição a conteúdos divergen-
tes e tornando o ambiente de informação controlado e previsível.
Ao estudar como as dinâmicas sociais estão se estruturando na rede,
Castells (2003) já afirmava que o poder atua sobre a mente humana por
meio de mensagens comunicativas (informação). Por isso a importância
em compreender como se processam essas mensagens e como isso se tra-
duz em ações na esfera pública, na dimensão política individual e coletiva.
Analisando as relações entre emoção, cognição e política, ele apontava que
a mudança social tem sua raiz na motivação emocional, individual ou co-
letiva, e afirmava que um dos “gatilhos” sociais para a mobilização pode ser
a raiva, constantemente aumentada pela percepção de uma injustiça e pela
necessidade da identificação do responsável pela situação. A partir do com-
partilhamento e da descoberta de outras pessoas com o mesmo sentimen-
to, a interação e a ação comunicativa crescem e induzem ações coletivas.
Estudo publicado em 2017 no periódico norte-americano Proceedings
of the National Academy of Sciences (PNAS) dos Estados Unidos mostrou
como as mensagens de cunho moral e emocional têm mais reações por
parte dos usuários e são mais compartilhadas em redes sociais. Analisando
uma amostra de tweets, o artigo mostrou como a presença de palavras mo-
rais-emocionais nas mensagens aumentaram sua transmissão em aproxi-
madamente 20% por palavra.
Carlos Cândido de Almeida & Mariana Vitti-Rodrigues
204
O efeito da linguagem moral-emocional foi observado além
da linguagem distintamente moral e distintamente emocional,
assim como outros fatores conhecidos por aumentar a difusão de
mensagens online. Este trabalho é consistente com explicações da
psicologia moral que destacam a natureza social e emocional do
discurso moral. Ele também amplia as teorias atuais ao identificar
um processo de transmissão social da difusão de informações. Ao
fazer isso, este trabalho levanta questões relacionadas ao papel da
influência social no domínio da moralidade, como a forma que
as mensagens online podem afetar atitudes morais. Essas questões
são mais importantes do que nunca, dado o crescente uso das
mídias sociais para fins políticos. (Brady et al., 2017, p. 7316.
Tradução nossa5.)
Com a centralidade das redes sociais na intermediação do debate
público, controladas por algoritmos e dados, as emoções passaram a ser o
principal mecanismo de captura da atenção. Segundo Floridi (2010), o im-
pacto ético da desinformação é amplificado nesse ambiente digital, onde as
interações emocionais moldam comportamentos dentro e fora das redes. Já
Capurro (2013) destaca que a manipulação da informação digital intensi-
fica o discurso de ódio e a desinformação, cujos efeitos são potencializados
pela rapidez e profundidade com que atingem a sociedade, ameaçando a
democracia e a vida das pessoas.
Por isso a desinformação e o discurso de ódio ganham tanta potência
atualmente. Apesar do uso de discursos morais, com forte apelo emocio-
nal, não ser novidade no debate político e de narrativas que recorrem ao
medo e que reforçam preconceitos como mecanismos de persuasão sempre
terem sido, com maior ou menor intensidade, utilizadas para influenciar
a tomada de decisão das pessoas, hoje eles geram impactos muito mais
rapidamente e de forma ainda mais profunda e perigosa para a democracia
e para a vida das pessoas.
“e effect of moral-emotional language was observed over and above distinctly moral and distinctly
emotional language as well as other factors that are known to increase online diffusion of messages. is
work is consistent with accounts of moral psychology that highlight the social and emotional nature of
moral discourse. It also extends current theories by identifying a social transmission process of information
diffusion. In doing so, this work fosters questions pertaining to the role of social influence in the domain
of morality such as how online messages can affect moral attitudes. ese issues are more important than
ever, given the growing use of social media for political purposes.” (Brady et al., 2017, p. 7316).
Estudos pluridisciplinares da informação: ciência da informação, ética e linguagem - nº 3
205
4 rEgular plataformas para garantir dirEitos E fortalEcEr a
dEmocracia
Os vários escândalos envolvendo o papel das plataformas em pro-
cessos políticos e eleitorais, os impactos da desinformação na pandemia
de Covid, entre outros, aprofundaram a urgência de se debruçar sobre
mecanismos de regulação das plataformas e produção de parâmetros para
recuperar a qualidade da informação.
No Brasil, as eleições e os acontecimentos de 08 de janeiro reaque-
ceram o debate em torno do projeto de lei 2.630/2020 (Brasil, 2020) que
tramita na Câmara dos Deputados e propõe medidas regulatórias para
a operação das Plataformas de Redes Sociais, Serviços de Mensageria e
Ferramentas de Busca no país.
Essas plataformas tornaram-se o espaço onde bilhões de pessoas pri-
vadas passaram a se expressar de forma pública. No entanto, ao invés de
terem qualificado o debate na sociedade – possibilitando o choque de opi-
niões distintas num contexto democrático – elas se tornaram um ambiente
fértil para a proliferação de desinformação, discurso de ódio e conteúdos
antidemocráticos.
Isso ocorre diante de uma perigosa omissão das plataformas para
conter a disseminação desses conteúdos, tanto na aplicação de suas polí-
ticas próprias, quanto na observância da legislação nacional e nos poucos
compromissos que firmaram para garantir que conteúdos de desinforma-
ção, de ódio e antidemocráticos não ganhassem o alcance que tiveram du-
rante a pandemia e nos processos eleitorais.
Contudo, o debate sobre regulação das Big Techs (os cinco maio-
res conglomerados empresariais de tecnologia: Alphabet, Meta, Apple,
Microsoft e Amazon) e criação de instrumentos de enfrentamento à desin-
formação é repleto de nuances e desafios. Seja pelo dilema em se apontar
o que é ou não um conteúdo desinformativo, a quem caberia esse papel,
se isso de fato é desejável e que outras consequências negativas poderiam
trazer, qual a responsabilidade das plataformas nesse processo, o papel do
Estado etc.
Carlos Cândido de Almeida & Mariana Vitti-Rodrigues
206
A discussão precisa ser precedida de definições de escopo regula-
tório, que obrigações e outras medidas adotar, sanções, responsáveis pela
implementação e fiscalização da regulação entre outros. Esses aspectos são
importantes porque o objetivo da regulação é conter e não dar mais poder
para empresas que já são poderosas demais. O valor de mercado da Alphabet
(Google/Youtube, e etc), Meta (Facebook/WhatsApp/Instagram), Apple,
Microsoft e Amazon somados, chegam a impensável cifra de US$ 7 tri-
lhões (Maia, 2024), o que as colocaria na posição de 3ª maior economia
do mundo, atrás de China e EUA.
Esse debate precisa contar com um processo de ampla escuta da so-
ciedade: terceiro setor, academia, setor empresarial e inclusive agentes pú-
blicos variados. O Marco Civil da Internet (BRASIL, 2014) é um exemplo
de como uma participação ampla pode gerar uma lei que se transformou
em referência internacional.
Além disso, é preciso tomar cuidado para não transpor automati-
camente modelos de responsabilidade de outros meios de comunicação
para as plataformas. Quando se discute que é necessário responsabilizar
civilmente as Big Techs pelos conteúdos postados por seus usuários, o que
se tem em mente é a ideia de equiparar as plataformas às empresas jornalís-
ticas. Mas tratam-se de modelos totalmente distintos. Nas empresas jorna-
lísticas a produção é própria, daí fazer todo sentido que esta se responsabi-
lize pelos conteúdos gerados. No caso das plataformas, não. Quem produz
os conteúdos somos nós. A ideia de criar obrigações de monitoramento e
exclusão de conteúdos e contas, e vincular essas obrigações a multas, pode
gerar efeitos negativos, ao conferir a empresas privadas o papel de decidir o
que circula (ou não) de conteúdo de forma ainda mais discricionária para
evitar sanções.
Por outro lado, as plataformas digitais não podem ser consideradas
neutras, pois o modelo de negócios dessas empresas define o que cada usu-
ário recebe, com que velocidade e o alcance do conteúdo. Dantas (2020)
argumenta que essas decisões são moldadas por relações de poder econô-
mico, como o impulsionamento de anúncios, além de mecanismos auto-
matizados de seleção e recomendação. Assim, o controle dessas empresas
Estudos pluridisciplinares da informação: ciência da informação, ética e linguagem - nº 3
207
sobre a circulação de informações está diretamente relacionado à explora-
ção econômica da audiência e à maximização do valor informacional.
Vale lembrar que elas já tomam decisões sobre conteúdos e contas a
partir de suas políticas próprias. Porém, todos estes aspectos da operação
das plataformas são opacos. A sociedade não conhece claramente os crité-
rios utilizados, os mecanismos usados para moderar conteúdos, o volume
de conteúdos que sofreram moderação, etc. Todas informações indispen-
sáveis para se propor um modelo regulatório que não gere incentivo para
que as plataformas sejam mais proativas na remoção de conteúdos, o que
pode trazer graves perigos à liberdade de expressão.
Outro cuidado é não cair na tentação de transpor de forma automá-
tica soluções regulatórias encontradas em outros países, com contextos ju-
rídicos, sociais, culturais e econômicos diferentes dos nossos. O que pode
ser adequado para a Alemanha, por exemplo, pode não ser adequado para
o Brasil.
Ao lado dos aspectos regulatórios, também é fundamental que a so-
ciedade encontre mecanismos para promover e valorizar os conteúdos jor-
nalísticos. A queda da tiragem e venda de jornais e revistas, a redução de
audiência em telejornais, o fechamento de alguns veículos, o aumento de
demissões, entre vários outros indicadores mostram uma retração da ativi-
dade econômica de empresas jornalísticas. O aspecto econômico que en-
volve a crise no modelo de negócios da indústria do jornalismo se agravou
nos últimos anos com a migração tanto da audiência quanto das verbas de
publicidade para as Big Techs.
A preocupação é internacional e tem mobilizado empresários do se-
tor e jornalistas a buscarem alternativas de financiamento para a atividade
jornalística, bem como medidas para promover um jornalismo de qualida-
de que possa fazer frente aos impactos da disseminação de desinformação.
Muitas iniciativas legais têm sido debatidas e aprovadas em muitos
países para impor obrigações das plataformas remunerarem os conteúdos
jornalísticos como forma de balancear a assimetria econômica entre em-
presas de jornalismo e Big Techs. Este caminho até o momento tem tido
consequências diversas. Em alguns países, algumas das plataformas des-
Carlos Cândido de Almeida & Mariana Vitti-Rodrigues
208
continuaram serviços voltados à circulação de notícias, como no Canadá.
Em outros países, há a preocupação dos modelos adotados gerarem ainda
mais concentração econômica nas grandes empresas de comunicação.
Ao lado disso, organismos internacionais têm procurado produzir
guias, padrões e recomendações voltadas ao enfrentamento à desinforma-
ção e à literacia digital. Com este objetivo, a Unesco lançou a publicação
“Jornalismo, Fake News e Desinformação: Manual para a produção e trei-
namento em jornalismo” (Unesco, 2019). Em junho de 2023 foi lançado
um “Policy Brief” (United Nations, 2023) sobre Integridade da Informação
em Plataformas Digitais, que propõe uma agenda comum e medidas para
criar um ambiente digital mais inclusivo, seguro e transparente. Em de-
zembro de 2023, Canadá e Holanda publicaram a Declaração Global
sobre integridade da informação (SECOM, 2023), assinada por muitos
países, inclusive o Brasil.
5 conclusão
As redes sociais desintegraram a esfera pública. Muitos especialistas
consideram que estamos vivendo num cenário de caos ou insegurança in-
formacional. Isso porque a distribuição automatizada de conteúdo é feita
não com base na premissa de criar um ambiente democrático e de diálogo
para o debate público, mas com base nos fatores que determinem a maior
permanência do usuário conectado e interagindo na plataforma. Isso gera
um sistema de direcionamento de conteúdos para bolhas de eco, e as pes-
soas reagem, interagem e compartilham mais intensamente os conteúdos
por viés de confirmação e afinidade de grupo.
A partir dos métodos de fixação das crenças elencados por Peirce e
uso das emoções para direcionamento algorítmico de conteúdos em pla-
taformas sociodigitais, favorecem a recepção em chave emocional (primei-
ridade) e a reação irrefletida (segundidade) sem a possibilidade de uma
mediação racional (terceiridade), que permita checar a razoabilidade das
opiniões por meio da experiência com a realidade e o debate justificado e
fundamentado. As opiniões são formadas pelos métodos da tenacidade e
autoridade, trazendo consequências nocivas à democracia, motivados pelo
Estudos pluridisciplinares da informação: ciência da informação, ética e linguagem - nº 3
209
discurso de ódio e desinformação. Estamos presos num ambiente de pro-
dução de crenças emotivo-reativas em bolhas de ressonância digital.
Ou seja, há uma tendência à polarização, onde você não fala mais,
não se comunica com um público amplo, como se fazia na tevê, rádio,
jornal ou revista. Agora você fala para a sua audiência que é segmentada
por perfilamento psicométrico – parâmetros psicológicos que estruturam
os algoritmos para manter as pessoas mais tempo conectadas e engajadas
por estímulos emocionais e condicionamento cognitivo.
No mundo fabricado das aparências temos a impressão que estamos
falando ou que podemos falar para muitas pessoas, basta usarmos melhor
as redes sociais e enfrentar o cenário de desinformação, esforço que têm
sido buscado em muitos países do mundo. Contudo, o problema é sistêmi-
co e está relacionado com o modelo de negócios das Big Techs, cujo design
e o estímulo à interação são usados como fator de captura da atenção, para
maximizar o extrativismo de dados que orienta a dinâmica de distribui-
ção e recomendação algorítmica de forma personalizada. Também com a
absurda concentração econômica em torno dessas empresas. As questões
regulatórias e de governança apontadas acima são urgentes e essenciais,
mas, medidas estruturantes mais profundas para reduzir a dependência
tecnológica dos países em relação a essas empresas são indispensáveis para
conter a máquina que dá vazão à desinformação, bem como os discursos
de ódio e os antidemocráticos.
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212
213
7
UM CONVITE À ÉTICA
INFORMACIONAL
AN INVITATION TO
INFORMATIONAL ETHICS
João Antonio de MORAES
UFU
moraesunesp@yahoo.com.br
https://orcid.org/0000-0001-6057-5138
Rafael Rodrigues TESTA
UNICAMP
rafaeltesta@gmail.com
https://orcid.org/0000-0002-7052-1376
https://doi.org/10.36311/2025.978-65-5954-635-0.p213-238
Carlos Cândido de Almeida & Mariana Vitti-Rodrigues
214
Resumo: O presente capítulo é um convite ao leitor e à leitora para adentrar às discussões
atuais em Ética Informacional. Para tanto, estruturamos essa apresentação em duas
partes: na primeira explicitamos o contexto e a fundamentação teórica a partir das quais
têm sido estruturadas as bases desse novo ramo de investigação filosófica. Em seguida,
dentre o grande número de problemas que compõem a agenda da Ética Informacional,
selecionamos alguns que julgamos relevantes para a compreensão dos impactos da
inserção de tecnologias digitais na vida cotidiana dos indivíduos. Sem a pretensão de
abarcar todas as discussões existentes em Ética Informacional, esperamos contribuir para
despertar no leitor e na leitora um olhar ético acerca dos caminhos futuros da sociedade
contemporânea.
Palavras-chave: Ética Informacional; Sociedade da Informação; Tecnologias digitais;
Complexidade; Internet.
Abstract: is chapter is an invitation to the reader to the current debate on Informational
Ethics. To do so, we structured this presentation in two parts: first we explain the context
and the theoretical basis on which the foundations of this new branch of philosophical
research have been structured. Subsequently, among the large number of problems that
comprise the Informational Ethics agenda, we have selected some that we believe are
relevant to understanding the impacts of the insertion of digital technologies into the
daily lives of individuals. Without pretending to cover all the existing discussions in
Informational Ethics, we hope to contribute to awakening the reader an ethical perspective
on the future paths of contemporary society.
Keywords: Information Ethics; Information Society; Digital technologies; Complexity;
Internet.
Estudos pluridisciplinares da informação: ciência da informação, ética e linguagem - nº 3
215
1 introdução: o porQ dE uma ética informacional1
De enciclopédias compostas por inúmeros volumes ao Wikipedia.
De máquinas de escrever aos computadores. Dos orelhões aos celulares.
Das fitas cassete ao Spotify. Das locadoras de VHS ao Netflix. Das filas para
pagar contas aos aplicativos de banco. Das máquinas fotográficas analógi-
cas aos filtros do Instagram. Dos mapas em papel aos sistemas de GPS. A
depender da idade do leitor e da leitora, alguns dos exemplos mencionados
não são sequer conhecidos, sendo necessária uma pesquisa no Google para
esclarecê-los2. Essas mudanças ilustram a revolução informacional que vem
ocorrendo na organização da sociedade nas últimas décadas.
Atualmente é comum denominar os dias atuais por “era da infor-
mação” e a sociedade que vivemos por “sociedade da informação”. Esses
rótulos decorrem do papel que as tecnologias de comunicação e informa-
ção (TICs) assumiram na rotina cotidiana dos indivíduos. O elemento
catalisador das mudanças provocadas na sociedade foi o surgimento e po-
pularização da internet3. Popularização essa que se iniciou com a geração
dos computadores pessoais (PC, do inglês personal computer), por volta dos
anos 2000: o computador deixou de ser utilizado apenas em setores milita-
res, pesquisa, indústria e comércio e começou a fazer parte do dia a dia dos
indivíduos. Ainda, tal popularização avançou à medida que as tecnologias,
agora digitais4, se tornaram menores, mais potentes e mais baratas5.
A “sociedade da informação” se configura a partir de dois momen-
tos. O primeiro ocorre quando as tecnologias digitais tornam os indivíduos
participantes ativos da nova estrutura social. Enquanto que nas tecnologias
Este capítulo consiste em uma versão revisada e atualizada das ideias sobre Ética Informacional apresentadas
nos livros Implicações éticas da virada informacional na filosofia (2014) e O paradigma da complexidade e a
Ética Informacional (2019), ambos de autoria de João Antonio de Moraes.
Exemplos do choque cultural entre crianças de hoje e tecnologias antigas podem ser observados nos vídeos
https://www.youtube.com/watch?v=mkt1uZ9DYok e https://www.youtube.com/watch?v=OwqplfETr2E.
Para mais informações sobre o surgimento e evolução da internet ver https://www.youtube.com/
watch?v=S7d371WsIt0.
Distingue-se entre dois tipos de tecnologias, as pré-digitais e as digitais, sendo que o limiar entre elas é,
essencialmente, a internet (Floridi, 2014). As tecnologias pré-digitais seriam o telégrafo, jornal, máquina
fotográfica, televisão, entre outros artefatos informacionais tradicionais em seu formato anterior ao
surgimento da internet. Já as tecnologias digitais são os notebooks, smartphones, tablets, câmeras de vigilância,
etc., os quais podem estar conectados em rede.
Cf. Lei de Moore (Moore, 1998).
Carlos Cândido de Almeida & Mariana Vitti-Rodrigues
216
pré-digitais os usuários eram, em sua grande maioria, apenas receptores de
informação; com as tecnologias digitais esses mesmos usuários também
podem contribuir com informação para a rede (eles podem gerar e com-
partilhar informação, em tempo real). Daí, o segundo momento: as novas
possibilidades de (inter)ação via tecnologias digitais têm promovido mu-
danças profundas nos hábitos coletivos dos indivíduos, especialmente em
virtude da relação de dependência dos usuários com esse tipo de tecnologia
para desempenhar ações cotidianas. O que até então era apenas uma fer-
ramenta se tornou essencial em diversas formas de expressão humanas: tra-
balho, educação, entretenimento, relacionamento, cidadania, entre outras.
Atualmente, não é exagero afirmar que é praticamente impossível viver em
sociedade sem a utilização de tecnologias digitais.
Durante a pandemia do COVID-19 (nos anos 2020 e 2021) foi pos-
sível observar o grau de dependência e a forma como as tecnologias digitais
costuram o tecido social: a necessidade do distanciamento social ressaltou
a mediação tecnológica para algumas ações e acelerou a digitalização de
outras. No trabalho, ampliaram-se situações de home office ou regime hí-
brido com o uso de ferramentas como Microsoft Teams ou Google Meet; na
educação surgiram diversos cursos de Graduação a distância (EaD), além
de faculdades optarem por fornecer parte da carga horária nesse formato,
amparada em novas leis6, com a utilização de Moodle e Google Workspace;
no entretenimento houve o crescimento7 no uso de uma variedade de apli-
cativos, seja para troca de mensagens (Whatsapp), compartilhamento de
situações ao longo do dia (Instagram), acesso e compartilhamento de víde-
os curtos (TikTok) e/ou longos (Youtube), acesso a filmes (Netflix, Disney+,
HBOmax, entre outros), ou, até mesmo, para acompanhar a programação
de um canal de televisão (o que evidencia a tecnologia nas situações mais
triviais); para relacionamentos afetivos os indivíduos utilizam, por exem-
plo, aplicativos como Tinder e Grinder; em relação a expressões da cidada-
nia foram criados aplicativos como Meu INSS, ConectSUS, e-Título, CNH
Digital, RG Digital, e, em virtude da pandemia, o Auxílio Emergencial.
Cf. Portaria nº 2.177, de 6 de dezembro de 2019.
Conforme a pesquisa State of App Marketing 2021, em 2021 houve um aumento de 55% no número de
downloads de aplicativos no Brasil em relação a 2019 (AppsFlyer; AppAnnie, 2021). Vale ainda ressaltar que
o Brasil figura em 2º lugar entre os países em que os usuários passam mais tempo on-line (Andrade, 2024).
Estudos pluridisciplinares da informação: ciência da informação, ética e linguagem - nº 3
217
Nos exemplos mencionados destacamos dois tipos de relação entre
indivíduos e tecnologias digitais: as dos usuários que podem optar por uti-
lizá-las e aquelas em que a dinâmica da vida em sociedade (da informação)
impõe seu uso. No segundo tipo podemos situar os usos para expressar a
cidadania, relações de trabalho e de educação; situações que independem
da vontade do usuário, sendo necessário se submeter ao uso das tecnologias
para poder usufruir desses âmbitos (durante a pandemia da COVID-19,
por exemplo, a dificuldade de algumas pessoas em utilizar o aplicativo
Auxílio Emergencial, criando barreiras significativas para acessar o suporte
financeiro do governo, evidenciou claramente a problemática da divisão
digital e ressaltou a persistente desigualdade no acesso à tecnologia).
Já o primeiro tipo engloba os aplicativos de entretenimento e rela-
cionamento; os usuários podem, por exemplo, escolher participar (ou não)
das redes sociais on-line. No que diz respeito aos de entretenimento, essa
escolha do usuário merece nossa atenção. Os algoritmos empregados em tais
aplicativos, como os de reprodução automática (autoplay8) e de rolagem in-
finita, são projetados no intuito de aumentar o engajamento dos usuários,
mantendo-os mais tempo nas plataformas. Esses aplicativos se aproveitam de
ferramentas como filtros bolha e câmaras de eco para direcionar o conteúdo
que será apresentado ao usuário a partir de suas preferências pessoais, ampa-
radas no histórico de uso. Dada uma seleção de conteúdo precisamente ade-
quada às crenças pessoais do usuário, tais aplicativos capturam sua atenção,
incentivando a continuidade do consumo de conteúdo, contribuindo para
uma dependência digital comparável a outros tipos de vícios. Ao influencia-
rem sutilmente o comportamento do usuário, esses aplicativos destacam um
ponto crítico: não apenas o acesso e a competência tecnológica são desiguais,
mas também a vulnerabilidade dos usuários aos mecanismos ocultos de en-
gajamento digital. A autonomia dos usuários em rede é colocada em xeque
(Calvo et al., 2020) (adiante essa questão fará parte do problema da pri-
vacidade informacional). Assim, diante dos mecanismos de funcionamento
desses aplicativos, em que medida podemos, de fato, dizer que é possível não
utilizá-los em atividades cotidianas?
Cf. Felipe Neto (2023).
Carlos Cândido de Almeida & Mariana Vitti-Rodrigues
218
Outro fator que evidencia a complexidade dessa questão é o rápido
crescimento do número global de usuários de internet. Conforme o Digital
2023: Global Overview Report9 (2023), na última década (2013-2023)
houve um crescimento de 103,5% no número de pessoas conectadas em
rede, representando atualmente 5.15 bilhões de pessoas (68% da popula-
ção mundial). Desse rápido crescimento, ainda destacamos que 92,3% do
acesso é realizado por dispositivos móveis, um dado relevante, pois, por
estar na “palma da mão”, os usuários manipulam informação (recebendo
e compartilhando) de forma “imediata”, “espontânea” e “em tempo real”,
se tornando cada vez mais imersos no ambiente digital10 (e, assim, mais
vulneráveis aos mecanismos de Economia da atenção11). Assim, conforme
discutiremos adiante, escolher não participar do ambiente digital não é
algo simples, além do que também implica em estar alheio a benefícios
culturais, econômicos, educacionais, dentre as outras camadas da socieda-
de essencialmente mediadas por tecnologias digitais.
É justamente a partir do grau de imersão tecnológica dos indivíduos
decorrente da digitalização do cotidiano que entendemos a “sociedade da
informação”. Essa sociedade é fruto da relação íntima entre indivíduos e
tecnologias digitais que culmina na reformulação do entendimento que
os indivíduos possuem de si e de suas interações com outros indivíduos e
com o ambiente (Moraes, 2019)12. Devido à influência que as informações
disponíveis no meio exercem no direcionamento das ações, novas possibi-
lidades de agir no mundo estariam surgindo, as quais não parecem ser pas-
síveis de análise segundo as perspectivas éticas tradicionais. Questões sobre
o que é “certo” e “errado”, sobre “o que fazer” e “como agir” se colocam.
Cf. https://datareportal.com/reports/digital-2023-global-overview-report.
10 Uma pesquisa realizada na Inglaterra em 2017 constatou que 1/3 das pessoas que responderam à pesquisa
disseram olhar seus smartphones em até cinco minutos após acordarem, enquanto 55% admitiram fazê-lo
em até 15 minutos. A pesquisa indicou, ainda, que 79% dos envolvidos relataram utilizar seus smartphones
uma hora antes de dormir (Chapman, 2017). No Brasil, de acordo com o relatório Digital 2023: Global
Overview, os cidadãos dedicam, em média, nove horas diárias ao uso de smartphones e outros dispositivos
eletrônicos. Esse dado revela que mais da metade do período em que os brasileiros estão acordados é
consumido pelo engajamento com telas digitais.
11 Cf. Bhargava e Velasquez (2021).
12 Há uma diversidade de definições acerca da expressão “sociedade da informação”. Conforme Webster
(2006), cada uma delas é desenvolvida com um enfoque num cenário específico, mas compartilham
do pressuposto segundo o qual a informação está produzindo alterações quantitativas na dinâmica dos
indivíduos, promovendo também um tipo de organização social qualitativamente nova.
Estudos pluridisciplinares da informação: ciência da informação, ética e linguagem - nº 3
219
Ao descompasso entre novas possibilidades de ação e teorias éticas tradi-
cionais, Moor (1985) denomina policy vacuum. Neste contexto, a Ética
Informacional se apresenta como uma alternativa para fornecer às teorias
éticas tradicionais “novos” princípios morais para avaliação de uma ação,
uma vez que possui um universo de problemas ampliado.
2 ética informacional: fundamEntos tEóricos E modElos
Uma vez que trata de questões de cunho moral, a Ética Informacional
pode ser concebida como uma teoria moral para a “sociedade da infor-
mação”, lidando com problemas práticos da denominada Filosofia da
Informação.
Brevemente, a Filosofia da Informação pode ser caracterizada como
uma área filosófica que investiga a natureza conceitual e princípios básicos
da informação, além de metodologias teóricos-informacionais e computa-
cionais aplicadas a problemas filosóficos (Floridi, 2011; Adams; Moraes,
2016). Ela resulta de uma “virada informacional” na Filosofia (Adams,
2003) em que a informação é admitida como ingrediente fundamental
para a análise de certos problemas filosóficos através de uma perspecti-
va mecanicista e representacionista. Destaca-se, aqui, o artigo Computing
Machinery and Intelligence, no qual Turing (1950, p. 436) propõe a tese
segundo a qual “pensar é calcular”. Dado que computadores digitais ope-
ram a partir de cálculos e manipulam regras para organização de símbo-
los; se considerarmos que pensar consiste, principalmente, na atividade de
manipulação de símbolos, de acordo com um conjunto de regras lógicas,
constituindo algoritmos; então computadores digitais, pretensamente, po-
deriam pensar.
O impacto da tese de Turing gerou uma aproximação entre Filosofia
e Ciência, mais especificamente a Ciência Cognitiva, de modo que uma
vez entendido o pensamento inteligente de forma mecânica, seria pos-
sível a construção de modelos mecânicos da estrutura e dinâmica deste
tipo de pensamento. Esse entendimento fomentou o desenvolvimento de
modelos mecânicos da mente, dando origem a diversas abordagens como
a Inteligência Artificial (IA), as Redes Neurais Artificiais, a Cognição
Carlos Cândido de Almeida & Mariana Vitti-Rodrigues
220
Incorporada e Situada, a Robótica Social, entre outras (Frankish; Ramsey,
2014). Dado o papel dos computadores no desenvolvimento de teorias, a
produção teórica (filosófico-científica), ocorreu concomitante ao aprimo-
ramento tecnológico, durante a segunda metade do século XX.
A Filosofia da Informação possui, dentre outros, o seguinte conjunto
de problemas: “o que é informação?”, “qual a relação entre informação,
conteúdo informacional e significado?”, “qual a relação entre informação
e verdade?”, “qual a relação entre estados mentais e estados informacio-
nais?”, “a realidade poderia ser reduzida a termos informacionais?”, “o co-
nhecimento pode ser explicado via informação?”, e, por fim, a que motiva
nossa discussão: “a informação pode fundamentar uma teoria ética?”.
Antes, porém, de explicitar as principais características da Ética
Informacional, convém questionar: seria realmente necessária uma nova
Ética para compreender os impactos das tecnologias digitais na socieda-
de? Uma vez que a Ética Informacional está inspirada em modelos éticos
tradicionais13, por que não analisá-los, por exemplo, segundo a tradicional
perspectiva deontológica14? A avaliação de uma teoria é realizada a partir
do grau de satisfação quando os princípios que a sustentam fundamen-
tam uma decisão confiável para a ação moral (Timmons, 2013). Quando
essa decisão é comprometida, surgem limitações promovendo a carência de
aplicabilidade da teoria. Entendemos que é justamente essa carência que
está presente nas propostas de teorias éticas deontológicas quando situadas
no contexto das novas possibilidades de ação geradas pelas tecnologias di-
gitais, próprias da “sociedade da informação”.
Quilici-Gonzalez et al. (2014, p. 170) destacam que segundo o
Deontologismo os indivíduos não deveriam mentir, pois se assim o fizes-
sem a sociedade humana entraria em colapso. Kant (2002, p. 3) susten-
ta tal recomendação na seguinte passagem: “Pois, ela [a mentira] sempre
13 Denominamos éticas tradicionais as correntes clássicas da Ética em História da Filosofia, tais como: Ética
das Virtude, Deontologismo e Consequencialismo.
14 Os adeptos da teoria deontológica, ilustrada principalmente pela teoria ética kantiana (Kant, 2003, 2004),
propõem princípios morais fundamentados no que deve ser, ou não deve ser, feito. Nesse âmbito, ao invés
das ações dos indivíduos serem guiadas por escolhas individuais, elas devem se pautar em obrigações morais,
denominadas por Kant “máximas” e “leis universais”, que configuram princípios de conduta que perdem
seu aspecto subjetivo para se aplicarem a quaisquer tipos de ação, a qual passa a ser regida pelo que o filósofo
chama imperativo categórico.
Estudos pluridisciplinares da informação: ciência da informação, ética e linguagem - nº 3
221
prejudica outrem, mesmo que não a um outro homem, pelo menos sim
à humanidade em geral, na medida em que torna inutilizável a fonte do
direito”. Dado que as tecnologias digitais possibilitam aos indivíduos o de-
sempenho de ações no ambiente on-line em modo anônimo, no contexto
da ética deontológica, este tipo de ação seria moralmente errado. Porém,
esta prática poderia ser positiva em regimes totalitários, uma vez que os
indivíduos seriam forçados a esconder suas preferências políticas de modo
a poder contestar o regime e, eventualmente, combatê-lo.
Holgate, em diálogo com Capurro (2017, nota de rodapé 4), argu-
menta que a realidade digital contemporânea é substancialmente diferente
da que Kant conheceu, sugerindo que o filósofo teria dificuldades para en-
tender e se adaptar aos “sapatos cibernéticos” da era atual. Holgate (2017)
observa que as normas éticas e etiquetas tradicionais não se aplicam inte-
gralmente ao mundo digital, onde as regras são distintas e estão constante-
mente evoluindo. Ele exemplifica essa distinção ao mencionar casos como
o de Edward Snowden15 e as atividades do Wikileaks16, argumentando que,
no contexto cibernético, tais ações representam uma forma de redistribui-
ção de acesso e controle da informação, diferenciando-se significativamen-
te dos crimes tradicionais de roubo de propriedade material. Estes atos são
vistos como contribuições positivas para a comunidade e a sociedade em
termos de informação.
Assim como as transformações sociais ocorridas durante a segun-
da metade do século XX contribuíram para a constituição de um cenário
informacional, acadêmico e social, a partir do qual se tornou possível a
delimitação de uma Filosofia da Informação, Capurro (2015) destaca que
transformações sociais tiveram, também, grande importância para o iní-
cio do surgimento de reflexões que motivaram propostas para uma Ética
Informacional. Seu surgimento, portanto, pode ser caracterizado como
um movimento “de baixo para cima” (bottom-up), de problemas práticos a
teorias, no contexto da “sociedade da informação”. Capurro destaca duas
motivações.
15 Cf. Greenwald (2015).
16 Cf. Assange (2015).
Carlos Cândido de Almeida & Mariana Vitti-Rodrigues
222
A primeira motivação remonta ao contexto pós-Segunda Guerra
Mundial, no qual inicia-se um movimento crítico acerca dos avanços tec-
nológicos na sociedade. Isso ocorre, segundo Capurro (2015), amparado
no “pecado” cometido pelos físicos que, sem tal reflexão ética, promoveram
a criação da bomba atômica. Destacam-se, por exemplo, os trabalhos de
Weizenbaum (1976) e Wiener (1968): o primeiro ao criticar seu próprio
software Eliza (que desempenhava as funções de um terapeuta) e o se-
gundo ao entender que “as novas tecnologias informacionais situaram os
seres humanos na presença de outra potencialidade social de importância
desconhecida para o bem e para o mal” (Wiener, 1968, p. 27). A segunda
motivação diz respeito à organização de debates sobre a crise ecológica em
virtude do avanço das tecnologias e do modo como essas afetam o meio
ambiente (e.g., para produzir um PC de mesa com um monitor CRT de
17 polegadas são necessários 1.500 litros de água, enquanto que e o con-
sumo de energia do Facebook é similar ao da Alemanha) (Moraes, 2019).
Capurro (2015) considera que há um atraso nos estudos filosófi-
cos acerca do debate interdisciplinar da Ética Informacional, em virtu-
de da complexidade presente nas discussões provenientes dessa área, uma
vez que envolvem diversas causas distintas: economia, política, legislação,
entre outras. Embora não se estabeleça uma concepção única de Ética
Informacional, há um consenso segundo o qual ela é caracterizada como
uma área filosófico-interdisciplinar que visa refletir sobre questões éticas rela-
cionadas aos impactos da inserção de tecnologias digitais na vida cotidiana.
Três vertentes se destacam na tentativa de fundamentação de pa-
râmetros que delimitam as fronteiras dessa nova área de investigação fi-
losófico-interdisciplinar. Num viés antropocêntrico destaca-se a teoria de
Capurro (2006, 2010): a avaliação de uma ação moral é considerada a
partir da relação do digital com o ambiente e apenas seres humanos se-
riam capazes de desempenhar tal relação de juízo moral. Representada por
Quilici-Gonzalez et al. (2010, 2014) está a abordagem biocêntrica: am-
pliando o escopo de análise, os autores desenvolvem sua reflexão conside-
rando os seres vivos a partir de relações informacionais que possibilitam
a disposição para ação no ambiente (denominadas affordances), também
digital. Em uma terceira perspectiva, Floridi (2013, 2014) desenvolve sua
teoria ética pautada na informação como elemento fundamental para a
Estudos pluridisciplinares da informação: ciência da informação, ética e linguagem - nº 3
223
análise de questões morais. Com uma abordagem mais radical, na teoria
ética proposta por Floridi (2014) passa-se de uma ontologia materialista,
na qual os objetos, processos físicos e indivíduos situados e incorporados
exercem um papel central na concepção de mundo, para uma ontologia in-
formacional, na qual a informação (imaterial) é o elemento central. Em tal
perspectiva, as formas de vida natural dos indivíduos, assim como os arte-
fatos, envolvem relações informacionais inseridas em um mundo de dados,
conhecimento e comunicação. Nesse contexto, as tecnologias digitais e os
organismos compartilhariam de uma mesma ontologia informacional. Em
outras palavras: no primeiro viés, Capurro (2006, 2010) desenvolve uma
teoria ética com uma proposta intercultural, entre as sociedades humanas;
os autores do segundo viés consideram que os seres vivos em geral, e não
apenas os seres humanos, podem ser considerados agentes morais em al-
gum grau; e Floridi (2013, 2014) caracteriza a Ética Informacional como
uma proposta infocêntrica, extrapolando as duas perspectivas supracitadas.
Diante das vertentes indicadas, Moraes e D’Ottaviano (2018, p.
321, itálico dos autores) propõem a seguinte caracterização geral de Ética
Informacional: “Uma Ética Informacional é uma extensão de um subsistema
de princípios morais de um sistema ético tradicional”. Um sistema S’ estende
um sistema S quando todos os princípios de S são preservados (válidos)
em S’, sendo que neste podem ser incorporados novos princípios. Os au-
tores utilizam as noções de sistema e subsistema no sentido proposto por
Bresciani Filho e D’Ottaviano (2000). De um modo geral, um sistema é
uma estrutura com funcionalidade, uma estrutura considerada como um
universo não vazio de elementos munido de relações. Assim, uma teoria
ética é entendida como um sistema ético, no qual os princípios morais
que compõem tal sistema formam a base dos elementos que caracterizam
o universo da estrutura. A organização dos elementos e relações entre eles
caracterizam a funcionalidade do sistema ético, isto é, o modo como sua
aplicação contribui para a ordenação social. Portanto, um sistema ético
informacional é gerado por um subconjunto dos princípios morais que
constituem o sistema ético original.
A caracterização geral de Ética Informacional preserva, ao menos, o
princípio da regra de ouro – “Faze aos outros todas as coisas que desejas
que os outros te façam” (Hertzler, 2005, p. 161) – presente nas vertentes
Carlos Cândido de Almeida & Mariana Vitti-Rodrigues
224
centrais da ética tradicional, como um princípio moral aplicável à comple-
xidade da nova dinâmica da “sociedade da informação”. Considerando as
três vertentes mencionadas, na proposta ética de Capurro (2006, 2010),
a noção de “outro” da regra de ouro é o ser humano, enquanto no viés de
Quilici-Gonzalez (2010, 2014) o papel do “outro” pode ser ocupado pelos
seres vivos como um todo. Já em relação à ética informacional de Floridi
(2013, 2014) a expressão da regra de ouro requer uma reformulação da
noção de “outro” considerando a mudança de perspectiva ontológica do
filósofo: neste caso, referir-se ao “outro” diz respeito a qualquer entidade
informacional, que pode extrapolar o âmbito dos seres vivos.
Sendo assim, a partir da caracterização geral mencionada, a Ética
Informacional pode ser analisada como constituída a partir de alguns prin-
cípios morais de teorias éticas tradicionais, mas que pode também apresen-
tar novos princípios para avaliar moralmente as possibilidades de ação que
surgem da relação entre o indivíduo e as tecnologias digitais. Caso a Ética
Informacional preserve todos os princípios da ética tradicional na qual está
inspirada, temos um caso de uma extensão do próprio sistema ético.
3 alguns problEmas da ética informacional
A agenda de problemas da Ética Informacional é constituída por
questões de cunho moral que emergem da análise das relações entre indi-
víduos e tecnologia digitais e das novas possibilidades de (inter)ação entre
eles e deles com o mundo. O caráter de novidade desses problemas se
expressa tanto em sua originalidade, como na reformulação (atualização)
de problemas já existentes em função de um contexto social digital. Ainda,
por um lado, as tecnologias digitais moldam e influenciam o modo como
os indivíduos interagem com o mundo, possibilitando novas formas de
interpretação e, por outro, criam novos ambientes com os quais os indiví-
duos não estão habituados.
O grau de complexidade dos problemas tratados pela Ética
Informacional reflete a complexidade da “sociedade da informação”. Em
especial, no que tange a imbricação dos “mundoson-line e offline: o “mun-
doon-line (digital) estaria “transbordando” no “mundooffline (analógi-
Estudos pluridisciplinares da informação: ciência da informação, ética e linguagem - nº 3
225
co) e se misturando a ele. Para os jovens (nascidos após os anos 2000) essa
imbricação constituiria vivências indiferenciadas, dado que a distinção en-
tre as experiências subjetivas de ambas viria a se tornar única (Sorj, 2016).
Nesse contexto, explicitaremos alguns problemas da Ética Informacional
considerando, principalmente, as questões que eles apresentam, de modo
que o leitor e a leitora possam compreender a complexidade mencionada.
3.1 cEnsura (no sEntido oposto à libErdadE dE ExprEssão)
Sobre a censura poderíamos indagar: todo tipo de informação é pas-
sível de publicação na rede ou precisaríamos de uma norma reguladora do
que poderia ser disponibilizado em ambiente on-line? No caso da adoção
da segunda posição, quem seria o responsável pela demarcação dos limites
desse conteúdo? Na Constituição brasileira (Art. 5º, inciso IX) entende-se
a liberdade de expressão como um direito fundamental do indivíduo, po-
rém seguindo alguns parâmetros: a presença de mensagens ofensivas, com
conteúdo de homofobia, pedofilia, racismo, entre outras, é tida como uma
infração à Constituição (Lei 7.716/8917).
Um aspecto deste tópico constitucional passível de discussão num am-
biente on-line é o inciso IV do artigo quinto, Capítulo I do Título II (“Dos
Direitos e Garantias Fundamentais”): “é livre a manifestação do pensamento,
sendo vedado o anonimato” (Brasil, 1988). Em outras palavras, diz Tavares
(2010): “A Constituição baniu o anonimato e a censura. Não há qualquer
abrigo para esses dois comportamentos sob o manto do ordenamento jurí-
dico brasileiro”. Neste contexto, destaca-se um dos impactos das tecnologias
digitais na organização social, uma vez que um certo grau de anonimato é
uma das possibilidades de interação do indivíduo no ambiente on-line, para
acessar e produzir conteúdo (que, como vimos, pode ser fazer necessário
em contextos de repressão ditatorial, ou em situações sociais permeadas por
preconceitos). De modo a adequar a atuação dos indivíduos neste ambiente
à Constituição seria “correto” proibir o anonimato? Uma resposta positiva
a esta questão seria um passo a caminho da constituição da sociedade da
vigilância; por outro lado, uma resposta negativa implicaria o desrespeito
17 Cf. https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l7716.htm
Carlos Cândido de Almeida & Mariana Vitti-Rodrigues
226
ao inciso mencionado18. Em situações on-line, quando se desrespeita os pa-
râmetros constitucionais e as leis específicas vigentes (as Leis 12.737/1219 e
12.965/1420), ocorrem crimes cibernéticos (outros exemplos são: roubo de
identidade, espionagem industrial, cyberbullying e, recentemente, a emergên-
cia de ambientes de guerra cibernética).
3.2 privacidadE informacional
O problema da privacidade informacional consiste na dificuldade de
se analisar os limites daquilo que pode ser considerado privado por um
indivíduo, ou grupo, dadas suas ações cotidianas mediadas por tecnologias
digitais (Moraes, 2014). Há três expressões deste problema. A primeira
refere-se ao aumento do grau de dificuldade gerado pela inserção de tec-
nologias digitais na vida cotidiana dos indivíduos no que diz respeito à
proteção da privacidade. Uma vez que os hábitos comuns dos indivíduos
têm se constituído no ambiente on-line, há um crescente fornecimento
de informação por meio de tais tecnologias como, por exemplo, em suas
redes sociais. Informações que usualmente não seriam divulgadas antes da
presença das redes sociais on-line são agora compartilhadas sem uma refle-
xão crítica. Isto ocorre devido a aceitação tácita das tecnologias digitais e
a familiaridade que tais indivíduos, em especial os mais jovens, possuem
com tais tecnologias; além, dos mecanismos de rolagem automática e re-
produção automática que fazem com que os usuários permaneçam por
mais tempo em uso. Considerando que tal conduta parece fazer parte da
identidade pessoal dos indivíduos desta nova geração, destaca-se a segunda
expressão do problema da privacidade informacional: a reformulação da
própria noção de privacidade.
Tradicionalmente caracterizada como a informação pessoal que é
passível de acesso apenas ao próprio indivíduo ou a quem ele conside-
re confiável (Schoeman, 1984), atualmente a privacidade possui caráter
18 Em âmbito nacional, há uma crescente discussão acerca da possibilidade de aplicação da Constituição de
1988 em assuntos do meio online. Novos projetos de lei têm sido propostos, os quais são acompanhados de
perto por grupos (e.g., CGI.br) que lutam para que os direitos dos usuários não sejam colocados em risco
em prol de uma sociedade da vigilância.
19 Cf. https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2012/lei/l12737.htm
20 Cf. https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2014/lei/l12965.htm
Estudos pluridisciplinares da informação: ciência da informação, ética e linguagem - nº 3
227
múltiplo: “Tipos diferentes de informação são vistos como mais ou me-
nos privados; escolher o que guardar ou revelar é um processo intenso e
contínuo” (Marwick; Murgia-Diaz; Palfrey, 2010, p. 13). A internet passa
a ser concebida como um espaço “semipúblico”, ponderado a partir de
benefícios sociais que podem fornecer. Dentre os benefícios alcançados por
tal exposição está a possibilidade de se diferenciar dos demais usuários das
redes sociais, conseguindo, assim, superar a sensação de ansiedade gerada
pela tipificação dos indivíduos no ambiente on-line – alimentando, tam-
bém, a “cultura narcisista” (Alex Primo, 2009). Tal tipificação decorreria
da redução dos indivíduos (e de suas identidades pessoais) a bits de infor-
mação: dado que a constituição da identidade pessoal envolve também o
reconhecimento de diferenças, uma vez que os indivíduos são digitaliza-
dos em bits, as diferenças são diluídas e as identidades pessoais tipificadas
(Capurro; Eldred; Nagel, 2013).
A terceira expressão do problema da privacidade informacional ex-
trapola o mero acesso à informação pessoal sem autorização e se situa no
debate acerca de vigilância e poder. Conforme Greenwald (2015), pre-
servar algum grau de privacidade é um fator componente da liberdade
e felicidade humanas. Também por isso, a privacidade foi declarada um
direito fundamental da humanidade reconhecida pelas Nações Unidas
no Art. 12 da Declaração dos Direitos Humanos (United Nations General
Assembly, 1948). Quando o indivíduo desconfia que sua privacidade esteja
em risco, ele deixa de agir espontaneamente, uma vez que pode estar sendo
observado. A vigilância é mantida tanto por organizações privadas como
pelo Estado e, em grande parte das vezes, por meio da colaboração en-
tre eles (conforme divulgado por Edward Snowden em Junho de 201321).
Mas qual seria o problema de ter informações pessoais obtidas pelo Estado
ou por organizações privadas? No âmbito do senso comum, a justificação
de tal vigilância (e, consequentemente, de casos de invasão de privacida-
de) dá-se pela defesa do bem comum e da soberania; porém, Greenwald
(2015, p. 173) nos propõe outra resposta a essa questão na seguinte pas-
sagem: “se a pessoa não consegue fugir ao olhar atento de uma autoridade
superior, não há escolha senão seguir os ditames que a autoridade impõe”.
21 Cf. Greenwald, MacAskill e Poitras (2013).
Carlos Cândido de Almeida & Mariana Vitti-Rodrigues
228
Por conseguinte, quando se está em constante observação e julgamento, o
indivíduo não é realmente livre.
No que tange aos riscos à privacidade dos indivíduos frente a situ-
ações de vigilância e poder, é fundamental considerar o impacto das leis
de proteção de dados, como a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD22)
no Brasil, na configuração da privacidade informacional (Doneda, 2019).
Essas leis estabelecem diretrizes rigorosas para a coleta, uso e armazena-
mento de informações pessoais, reforçando o direito à privacidade e ofe-
recendo aos indivíduos maior controle sobre seus dados. Sob tais regula-
mentações, as entidades que coletam dados devem garantir transparência
na gestão dessas informações e fornecer meios para que os usuários possam
acessar, corrigir ou excluir seus dados pessoais. Este marco legal represen-
ta um passo significativo na luta contra a invasão de privacidade e o uso
indevido de dados em ambientes digitais, contribuindo para uma maior
segurança e confiança dos indivíduos nas tecnologias digitais, apesar dos
desafios persistentes relacionados à vigilância e ao poder exercido tanto por
entidades privadas quanto pelo Estado.
3.3 ia gEnErativa E ia confiávEl
As ações da vida cotidiana dos indivíduos estão repletas de uso de fer-
ramentas e sistemas que envolvem IA: Siri (da Apple) e Alexa (da Amazon),
como assistentes de voz; o Google Translator como ferramenta de tradução;
e algoritmos presentes em ferramentas de streaming como Netflix, Spotify e
Youtube realizam sugestões de conteúdo a partir da aprendizagem de com-
portamentos do usuário. A presença da IA no processo de digitalização da
vida humana já não é novidade e, é neste ambiente familiar, que sistemas
de GPT-4 (Generative Pre-trained Transformer 4) como o chatbot ChatGPT
se inserem.
Modelos computacionais de IA de linguagem natural como o GPT-
4, apresentado por meio de sistemas de fácil uso como o ChatGPT, aumen-
tam o grau de interatividade do usuário, pois este não necessitará conhecer
22 Lei nº 13.709, de 14 de agosto de 2018. Cf. https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2018/
lei/l13709.htm
Estudos pluridisciplinares da informação: ciência da informação, ética e linguagem - nº 3
229
uma linguagem de programação para se relacionar com o sistema; essa in-
teração se dará por meio de uma conversa. Assim, o sistema computacional
se torna “parceiro de discurso”, apresentando um alto grau de refinamento
nas respostas fornecidas às perguntas feitas por humanos.
O recente impacto do ChatGPT em setores importantes da sociedade
e seu uso potencial levantam pontos de reflexão: esclarecer o deslumbre que
a novidade tecnológica produz; pensar formas de letramento digital para seu
uso eficiente (Grizzle; Calvo, 2016); e definir parâmetros éticos para direcio-
nar o desenvolvimento desta tecnologia e balizar as ações dos usuários. Esses
pontos contribuem para enfrentar questões éticas que surgem do uso de tec-
nologias de IA generativa, tais como: i) viés nos dados de treinamento – os
modelos generativos são treinados a partir de um grande conjunto de dados,
no caso GPT-4 esses dados são oriundos do que há disponível na internet
(desde artigos e livros a fóruns de internet), de modo que conteúdos discri-
minatório, injusto ou ofensivo podem estar presentes nas respostas geradas
(Hernandes, 2023); ii) desinformação e manipulação de informação – o
ChatGPT tem potencial para constituir cenário de produção massiva de fake
news que podem ser amplamente criadas e divulgadas, ocasionando impacto
profundo na formação de crenças dos indivíduos, além de influenciar suas
tomadas de decisão (Kaufman, 2022); iii) propriedade intelectual e plágio –
a quem pertence o conteúdo gerado pela IA? O jornal e New York Times
processou a OpenAI (criadora do ChatGPT) por violação de direitos autorais
dado que a empresa utilizou artigos do jornal para alimentar seu modelo
de IA (France Presse, 2023); e iv) impacto nos mercado de trabalho – a
automação alimentada por IA generativa pode levar à substituição de certos
trabalhos humanos (e.g., Jornalismo, Marketing, Recrutamento e Recursos
Humanos, Programação), o que levanta questões éticas sobre como lidar
com a perda de empregos e garantir a transição suave para uma sociedade
mais automatizada (Belli; Hora, 2023).
Questões éticas referentes à IA Generativa ilustram a preocupação
com o futuro da IA e sua presença na sociedade. Em 2021, a UNESCO
publicou o documento Recomendações sobre a Ética da Inteligência Artificial,
(UNESCO, 2021) o qual sugere o fomento de ações concretas que pautem
eticamente o desenvolvimento de sistemas de IA, mitigando possíveis efei-
tos danosos. À guisa de tal discussão, a noção de IA Confiável (Trustworthy
Carlos Cândido de Almeida & Mariana Vitti-Rodrigues
230
AI) ganha destaque (European Commission, 2019). Este conceito se refere
ao desenvolvimento e uso de sistemas de IA que são seguros, justos, trans-
parentes e responsáveis. A ideia central é que, além de ser tecnicamente
eficiente e comercialmente viável, a IA deve ser eticamente alinhada com
valores humanos e princípios morais. Isso envolve garantir que a IA seja
utilizada de maneira a respeitar a privacidade dos indivíduos, promover a
não-discriminação, manter a transparência nas decisões automatizadas e
assegurar a responsabilidade dos desenvolvedores e usuários desses sistemas.
Em um mundo onde a IA está cada vez mais presente em aspectos
críticos da vida cotidiana, a confiabilidade torna-se um imperativo ético,
assegurando que tais tecnologias sejam utilizadas de forma a beneficiar a
sociedade como um todo, ao invés de causar danos inadvertidos ou re-
forçar desigualdades existentes. A IA Confiável representa, portanto, um
esforço para harmonizar o avanço tecnológico com as necessidades e di-
reitos humanos, almejando um futuro no qual a tecnologia é moldada e
restringida por considerações éticas, tanto quanto por inovações técnicas.
3.4 govErnança da intErnEt
Os debates sobre a governança da internet consistem no estabele-
cimento de leis e políticas que regem o fornecimento e uso da internet
(Dubois; Dutton, 2014, p. 238). Este debate é complexo, pois a internet
se configura como um ambiente de cooperação instantânea, de alcance
global, relativamente barato, podendo ser acessada por diversos tipos de
dispositivos e compreendendo a relação entre indivíduos de forma descen-
tralizada, i.e., em rede. Ou seja, não há um governo ou entidade específica
que se configure como autoridade central para deliberar sobre o que ocorre
no ambiente digital. Ainda, nesse cenário, o elemento que se destaca é o
próprio indivíduo, usuário da internet, que adquire um novo potencial de
expressão no mundo, podendo, em certa medida, participar ativamente de
assuntos de interesse global.
Um dos problemas recentes analisados no contexto da governança
da internet é o da cidadania digital. Mossberger, Tolberg e Mcneal (2007,
p. 1) caracteriza a cidadania digital como: “a capacidade de participar em
Estudos pluridisciplinares da informação: ciência da informação, ética e linguagem - nº 3
231
sociedade online”. Em outras palavras, de modo a se expressar enquanto
cidadão digital, o indivíduo necessita possuir a habilidade de interagir na
sociedade da informação” de forma responsável, utilizando as tecnolo-
gias digitais com um know-how básico em suas ações cotidianas. Isto, pois
apenas assim seria possível que o indivíduo incorporasse os padrões de
conduta apropriados para o ambiente on-line. Mas haveria uma diferença
entre ser um cidadão no ambiente offline e no ambiente on-line? Conforme
indicamos, esses dois ambientes seriam duas realidades que não estão sepa-
radas, mas que também não podem ser confundidas (Sorj, 2016). Em ou-
tras palavras, offline e on-line seria duas formas de expressão do indivíduo,
duas faces da mesma moeda, na qual o papel de cidadão digital poderia ser
desempenhado, de modo a usufruir das tecnologias digitais para promover
conhecimento cultural e/ou bem-estar econômico.
3.5 divisão digital
O tópico da divisão digital23 estaria relacionado, de modo geral, a
situações em que lacunas se constituem entre “ter” e “não ter” no que diz
respeito às tecnologias digitais. Porém, ela extrapola o mero ter e não ter
tais tecnologias, podendo também ocorrer em relação às diferenças nas
possibilidades de acesso à informação, ou acesso a dispositivos apropriados
para o uso das tecnologias digitais (hardware e software), níveis de alfabeti-
zação, habilidades de manipulação sobre as tecnologias digitais, entre ou-
tros (Himma; Bottis, 2014). Três níveis de análise contextual se destacam
neste cenário: i) global, referente à desigualdade entre nações; ii) nacional,
quando há desigualdade entre estados; e iii) local, no caso de desigualdade
entre pessoas e/ou grupos. Além disso, a caracterização da divisão digital é
realizada a partir de fatores como: idade, gênero, status econômico e social,
educação, etnia, tipo de família (rural ou urbana), etc.
Himma e Bottis (2014) argumentam que o ponto central da consti-
tuição da divisão digital está nas lacunas que surgem da possibilidade, ou
não, de um acesso significativo das tecnologias digitais, de modo que os in-
divíduos possam obter vantagens culturais e econômicas a partir de sua uti-
23 Este tópico da Ética Informacional também pode ser encontrado na literatura expresso nos termos “brecha
digital”, “abismo digital” e “exclusão digital”.
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232
lização (conforme a noção de cidadania digital). Em outras palavras, consi-
dera-se na parte excluída da divisão digital aquela parcela da população que
utiliza as tecnologias digitais apenas para entretenimento superficial (e.g.,
realizar o download de músicas ou assistir vídeos por streaming), no sentido
de tais indivíduos não serem capazes de utilizar a informação obtida para
promoção de conhecimento cultural e/ou bem-estar econômico. O fato de
a parcela mais pobre da população mundial compor a maior parte daqueles
que estão excluídos da “sociedade da informação”, não possuindo acesso
às tecnologias digitais e ao seu uso de modo significativo, faz com que um
círculo vicioso se mantenha em relação às desigualdades sociais em âmbito
mundial. A seguir, ampliamos esta análise.
Moraes e Testa (2020) argumentam que a divisão digital pode ser
caracterizada como sistêmica. É sistêmica pois (i) está presente em todo
o ciclo de vida das tecnologias digitais – com impactos éticos relativos ao
desenvolvimento, desenho e uso de tais tecnologias, e (ii) afeta deliberada-
mente todos os usuários, tendo em vista os mecanismos elaborados pelos
desenvolvedores para manter os usuários utilizando as plataformas e se be-
neficiar econômica e politicamente de tal uso. A “divisão digital sistêmica
é relativa não apenas ao acesso e à alfabetização digital, mas também à
habilidade de pensamento crítico sobre os impactos das tecnologias digi-
tais sobre nossa forma de entender e agir nos ambientes on-line e offline.
Uma vez situados no lado “excluído” da divisão digital, os indivíduos não
possuem ferramentas ou habilidades eficazes para reivindicar seu direito
à participação na sociedade da informação (classificada pela ONU como
um Direito da Humanidade): por um lado, eles têm sua voz menosprezada
por aqueles que detêm os recursos tecnológicos e consideram que a divisão
digital não é um problema (i.e., empresas desenvolvedoras de tecnologia
que se apoiam no avanço tecnológico incessante); por outro, quando con-
siderados no desenvolvimento da “sociedade da informação”, os indiví-
duos “excluídos” ficam reféns dos direcionamentos que lhe são impostos,
sem a possibilidade de manifestação contrária, nem conhecimento crítico
e técnico para isso.
Enfim, discutimos questões éticas que compõem a agenda da Ética
Informacional oriundas da remodelagem que as tecnologias digitais têm
gerado nas interações humanas. Os tópicos apresentados evidenciam a
Estudos pluridisciplinares da informação: ciência da informação, ética e linguagem - nº 3
233
complexidade da sociedade da informação e a necessidade de se criar alter-
nativas para que os indivíduos mantenham sua autonomia e desenvolvam
pensamento crítico ao lidar com as tecnologias que permeiam sua reali-
dade; dois atributos individuais que os problemas da Ética Informacional
colocam em análise.
4 considEraçõEs finais
A era da informação trouxe consigo uma revolução na forma como
interagimos com o mundo ao nosso redor. Com o advento da internet e
das tecnologias digitais, o acesso e a disseminação de informações torna-
ram-se instantâneos e onipresentes. Embora esses avanços tenham trazido
benefícios inegáveis, eles também apresentam desafios éticos complexos
que precisam ser compreendidos e abordados. A Ética Informacional surge
como um campo de estudo dedicado a explorar esses desafios.
Conforme argumentamos, a Ética Informacional é uma área de in-
vestigação filosófico-interdisciplinar dinâmica e em constante evolução,
refletindo as mudanças rápidas na tecnologia e na sociedade. O convite ao
leitor e à leitora para adentrar à complexidade da Ética Informacional, e
iniciar um entendimento acerca de suas características, princípios e proble-
mas, corrobora a colocação de Capurro expressa em entrevista à Marefat e
Sangari (2014), segundo a qual um aspecto importante de se compreender
a Ética atual é a “responsabilidade individual e social em relação ao impac-
to das nossas escolhas à luz da influência da ciência e da tecnologia”. Isto
é, estar consciente não apenas dos impactos das tecnologias digitais na so-
ciedade, mas também das consequências que nossas escolhas podem gerar
em relação a tais tecnologias.
A Ética Informacional oferece uma base para entender melhor as com-
plexidades da nossa era digital e para desenvolver soluções que sejam éticas,
justas e benéficas para todos. É uma área que desafia, mas também inspira a
continuarmos a explorar o vasto potencial das tecnologias digitais em nos-
sa vida cotidiana. Mais uma vez apoiados em Capurro (apud Küchemann,
2015) concluímos com a seguinte metáfora: o ambiente digital pode ser en-
tendido como o mar, cabendo a nós aprender a “nadar” no caos digital, ainda
Carlos Cândido de Almeida & Mariana Vitti-Rodrigues
234
assim correndo o risco de “nos afogarmos”. A Ética Informacional se situa
como um guia que nos permite agir com habilidade e integridade neste am-
biente de modo a construir uma sociedade democrática.
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239
PARTE III
INFORMAÇÃO E
LINGUAGEM
241
8
PROCESSAMENTO DA
INFORMAÇÃO E PRAGMÁTICA
DA LEITURA DA FICÇÃO:
IMAGINAÇÃO, HABITUAÇÃO,
AFETO
INFORMATION PROCESSING AND
THE PRAGMATICS OF READING
FICTION: IMAGINATION,
HABITUATION, AFFECTION
Pedro Ramos Dolabela CHAGAS
UFPR
dolabelachagas@gmail.com
https://orcid.org/0000-0003-0336-489X
https://doi.org/10.36311/2025.978-65-5954-635-0.p241-263
Carlos Cândido de Almeida & Mariana Vitti-Rodrigues
242
Resumo: Discuto a leitura da narrativa do texto ficcional como o processamento de
informações articuladas para a produção, no leitor, de efeitos mentais e afetivos de vários
tipos. Inicialmente, trato da construção imaginária dos entes ficcionais durante a leitura;
em seguida, falo do texto ficcional como um mundo possível estruturado de acordo com
princípios internos de coerência, e apresentado ao leitor através de enunciados produzidos
para orientar seus processos cognitivos de várias maneiras. Abordo as maneiras como o
processamento mental da informação textual é afetivizado, o que determina a qualidade
da relação do leitor com o enredo e o mundo ficcional. Ao estruturar o percurso está a
distinção entre duas acepções do termo “informação” que são importantes para a teoria da
leitura: a informação como unidade que demarca uma diferença em relação ao contínuo
do mundo ficcional, e como a redução do espectro de alternativas na compreensão dos
entes ficcionais.
Palavras-chave: Imaginação; Ficção; Pragmática; Leitura; Afeto.
Abstract: I discuss the reading of the fictional text narrative as the processing of
information articulated for the production, in the reader, of mental and affective effects of
various kinds. Initially, I deal with the imaginary construction of fictional entities during
reading; then, I talk about the fictional text as a possible world structured according
to internal principles of coherence, and presented to the reader through enunciations
produced to guide their cognitive processes in diverse possibilities. I address the ways in
which the mental processing of textual information is affectivized, which determines the
quality of the readers relationship with the plot and the fictional world. By structuring
this discussion pathway, two meanings of the term “information” that are important for
reading theory emerges: information as a unit that demarcates a difference in relation to
the continuum of the fictional world and as the reduction of the spectrum of alternatives
in understanding fictional entities.
Keywords: Imagination; Fiction; Pragmatics; Reading; Affection.
Estudos pluridisciplinares da informação: ciência da informação, ética e linguagem - nº 3
243
1 introdução
Caracteriza o interesse pela leitura da ficção – e pela arte, em geral
– a expectativa da novidade; tudo que parecer previsível ou redundante
num conto, novela ou romance receberá um juízo negativo. Mas o termo
novidade” deve ser entendido com comedimento, pois aquilo que nos
parece novo emerge sobre um fundo de redundância: se algo é radical-
mente diferente do que já conhecemos, a falta de familiaridade, o excesso
de estranhamento – da linguagem, dos personagens, da lógica do enredo
– podem tornar o mundo ficcional impenetrável, diminuindo o prazer e
o envolvimento na leitura. Alguma capacidade de mapeamento do texto
é necessária para que o leitor processe o mundo ficcional, a evolução do
enredo, a textura da linguagem, os temas e valores evocados. Veremos que
essa capacidade é determinada pelo seu conhecimento do mundo real –
cuja experiência lhe fornece esquemas de pessoas, lugares, situações –, e
pelo seu conhecimento da literatura, que o familiariza com esquemas de
personagens, mundos e conflitos tradicionalizados na história da ficção.
Esse é o tema deste capítulo: discutir como o leitor da narrativa fic-
cional escrita processa as informações textuais, para vivenciar um mundo
desconhecido. Quanto mais diversificada for sua experiência de vida, e
quanto mais literatura ele tiver lido, maior será seu repertório interpretati-
vo. Munido de esquemas relativamente pessoais e compartilhados em varia-
das medidas, com o avanço da leitura ele chega à sensação de conhecer com
intimidade o mundo ficcional, o que revela duas implicações do conceito
de informação para a atividade da leitura. Inicialmente, informação é toda
unidade que demarcar sua diferença no fluxo da leitura, distinguindo-se do
fundo formado pelos estados regulares – comparativamente estáticos – do
mundo ficcional; é o que acontece quando o leitor adquire consciência ini-
cial dos elementos mais salientes do enredo. Com o desenrolar da leitura,
a compreensão desses elementos adquire robustez pela progressiva redução
do espectro de alternativas relativo à sua interpretação, permitindo que o
leitor a eles se habitue, sentindo conhecê-los suficientemente bem – é o
segundo processo informacional determinante para a leitura.
No decorrer da leitura, informações geram informações: a organi-
zação sintática e semântica das palavras grafadas no papel tem um valor
Carlos Cândido de Almeida & Mariana Vitti-Rodrigues
244
informacional potencial, que só será efetivado em processos mentais de
atribuição de relevância (à informação textual) por cada leitura, em cada
processo de leitura: o processamento mental do texto estrutura a experi-
ência imaginativa, enativa (relativa à evocação de experiências perceptuais
e sensações corpóreas) e afetiva (relativa aos estados de ânimo e ao envol-
vimento emocional) da leitura, gerando as experiências da compreensão,
imaginação cinestésica e sensorial, empatia e aversão no acompanhamento
dos personagens. Resultante da poiesis autoral, o texto articula símbolos
linguísticos para orientar a atividade mental de um leitor que, à sua manei-
ra, esquematizará as informações textuais em produtos imaginários, ética e
esteticamente valorados, com os quais ele se envolverá afetivamente.
É um processo complexo, cujos elementos principais buscarei des-
crever sem ambição de completude: falarei da condição imaginária dos
efeitos da linguagem, da composição de mundos ficcionais em textos cons-
truídos para a comunicação com o leitor, dos modos básicos e culturali-
zados de afetivização – i.e. de produção de envolvimento emocional – da
leitura, cada tema recebendo seu subcapítulo específico. Ao final, retoma-
rei as acepções de informação que se fertilizam mutuamente na experiência
da leitura: a diferença que demarca uma unidade, a redução de alternativas
no processo interpretativo. Em conjunto, elas permitem conhecer, habitu-
ar-se, fazer inferências interpretativas e prever estados futuros dos mundos
ficcionais. Comecemos pela linguagem.
2 a imaginação como produto da lEitura
Em certa língua, alguém escreve coisas; num nível elementar, um
texto de ficção é uma prática cultural linguística – é o seu meio semiótico.
Que efeitos o texto produz, quais são seus poderes causais? Num nível
fundamental, isso é perguntar sobre os efeitos da linguagem: pela propo-
sição de Daniel Dor (2015), podemos entender a linguagem como uma
tecnologia de instrução da imaginação. Estimular a imaginação humana
explicaria sua função evolutiva e, de roldão, as motivações da escrita e os
efeitos da leitura da ficção.
Estudos pluridisciplinares da informação: ciência da informação, ética e linguagem - nº 3
245
Para identificar a importância original da linguagem, Dor (2015)
descreve a experiência humana como um fenômeno privado. Sim, nos-
sas vidas mentais são intersubjetivas e determinadas pela socialização, mas
nossa experiência abrange tudo que nos acontece como criaturas mentais
– sentir, pensar, compreender, ver, ouvir, imaginar, desejar, agir, reagir, mo-
vimentar-se integram a vida consciente, a experiência de sermos nós mes-
mos em seus aspectos bioculturais constitutivos. Esses vários aspectos da
experiência são interligados holisticamente, de maneira dinâmica, gerando
estados mentais em transições contínuas, que formam uma experiência
individualmente específica – enquanto a linguagem, como um sistema de
manipulação de símbolos, opera de outra maneira. Categorizações expe-
rienciais e categorizações linguísticas são bem diferentes; na experiência
corporificada do mundo, cada um traz suas lembranças e histórias de in-
teração, usa estratégias diferentes de compreensão, tem capacidades dife-
rentes de atenção e percepção, diferentes concepções sobre as coisas; temos
idade, gênero, status social, força física, desenvolvimento emocional, curio-
sidades por coisas diferentes. Por isso vivemos em mundos experienciais
diferentes, incomensuravelmente mais numerosos do que a quantidade
de palavras e construções sintáticas que a linguagem oferece. Experiências
não podem, ademais, ser diretamente comunicadas a outras mentes; não
podemos comunicar nossos estados mentais diretamente uns aos outros.
Mas Dor (2015) propõe que a linguagem reduz a solidão epistêmica que
caracteriza a experiência humana, e essa é sua função evolutiva: a lacuna
experiencial entre os falantes não desaparece, mas a linguagem evoluiu para
reduzi-la ao possibilitar a instrução da imaginação alheia.
O recurso à metáfora da tecnologia visa descrever como a linguagem
opera: como toda tecnologia, ela não tem função geral, tendo se desenvol-
vido para uma função específica; no caso, ela teria surgido para permitir
que falantes instruíssem ouvintes a imaginar conteúdos distantes da expe-
riência presente, e/ou que os ouvintes não poderiam ter conhecido direta-
mente. O falante manipula um código, um esquema de coordenadas que
leva o ouvinte a revolver conteúdos de memória, que serão reconstruídos
e recombinados numa experiência imaginária. Essa é a função para a qual
a linguagem evoluiu: instruir-nos a imaginar certas coisas, de acordo com
intenções de comunicação.
Carlos Cândido de Almeida & Mariana Vitti-Rodrigues
246
Originalmente, sua evolução teria sido motivada pela função comu-
nicativa baseada na confiança: ao acreditarmos nos interlocutores, podí-
amos experimentar uns para os outros. Mas essa mesma tecnologia pôde
ser usada para a mentira e, logo, para a ficção, que estão livres dos limites
da experiência. Nelas, o falante imagina artificialmente uma intenção ex-
periencial, um mundo diferente daquele que ele experiencia: os primeiros
mentirosos e os primeiros ficcionistas não imaginavam ao ouvir, mas ima-
ginavam para falar. Dor (2015) sugere que os primeiros mentirosos prova-
velmente eram bons ouvintes, pois mentir requer uma boa compreensão
do mundo experiencial da vítima. Eles provavelmente sabiam controlar e
suprimir suas emoções, e impedir que seus sistemas de comunicação tra-
íssem suas intenções. É claro que ficções não são mentiras, mas é evidente
que essas capacidades são importantes para o ficcionista: imaginar con-
teúdos inexistentes antes de falar sobre eles, compreender o mundo ex-
periencial do ouvinte para antecipar os efeitos mentais da comunicação,
controlar a própria expressão para manejar as reações emocionais dos ou-
vintes. Com a linguagem, as pessoas podem se comunicar não apenas sobre
experiências pessoais que elas tenham identificado mutuamente, mas sobre
combinações inovadoras dessas experiências. Elas podem inventar entida-
des imaginadas e falar sobre elas: mitigada a dependência da experiência,
desenvolveram-se dissociados da experiência, baseados na imaginação e
mundos comunicados pela linguagem – ou melhor, existentes apenas na
linguagem que os comunica.
De posse da linguagem, podemos, portanto, usá-la para inúmeras
coisas, mas a ideia é que as funções para as quais ela evoluiu permanecem
as mesmas, incluindo a escrita. A função de instrução da imaginação é
exercida pela fala e pelo texto, que também trabalha intencionalmente para
instruir a imaginação do leitor – de várias maneiras, como acontece numa
sequência como esta:
Na semana anterior à partida para Arrakis, quando a agitação dos
últimos preparativos chegara a um furor quase insuportável, uma
velha veio visitar a mãe do menino, Paul.
Era uma noite quente no Castelo Caladan, e as pedras antigas que
serviam de lar à família Atreides havia vinte e seis gerações exalavam
Estudos pluridisciplinares da informação: ciência da informação, ética e linguagem - nº 3
247
aquela sensação de suor resfriado que costumavam adquirir pouco
antes do tempo virar. [...]
À meia-luz de uma luminária suspensa que pairava perto do chão,
o menino, acordado, viu uma volumosa forma feminina parada à
porta, um passo à frente de sua mãe. A velha era a sombra de uma
bruxa: os cabelos eram um emaranhado de teias de aranha a cobrir-
lhe as feições obscuras, e os olhos cintilavam feito joias.
– Ele não é pequeno para a idade, Jéssica? – perguntou a velha. Sua
voz chiava e arranhava como um baliset desafinado.
A mãe de Paul respondeu, com seu suave contralto: – É fato
conhecido que os Atreides começam a crescer tarde, Vossa
Reverência. [...]
– Está acordado e nos ouve – disse a velha. – O tratantezinho
dissimulado – ela riu disfarçadamente.
– Mas a realeza precisa ser dissimulada. E se ele for realmente o
Kwisatz Haderach... bem… (Herbert, 2015, p. 6)
Eles partirão para Arrakis; uma senhora que parece uma bruxa, de
cabelos semelhantes a uma teia de aranha e voz de baliset desafinado vai
ao castelo de pedra em que os Atreides moravam há vinte e seis gerações; a
mãe de Paul fala num contralto suave que os Atreides demoram para cres-
cer; “sua Reverência” percebe que o jovem entreouvia a conversa e é sim-
pática à sua astúcia – pois talvez ele fosse o Kwisatz Haderach. Com tanta
coisa nova, o valor informacional da passagem é elevado e seu estímulo à
imaginação é evidente, para estimular a curiosidade pela estória. Mas não
se pode dizer que haja menos instrução da imaginação na prosa realista:
Na planície rasa, sob a noite sem estrelas, de uma escuridão e
espessura de tinta, um homem caminhava sozinho pela estrada
real que vai de Marchiennes a Montsou, dez quilômetros retos de
calçamento cortando os campos de beterraba. A sua frente, não
enxergava nem mesmo o solo negro e somente sentia o imenso
horizonte achatado através do sopro do vento de março, rajadas
largas como sobre um mar, geladas por terem varrido léguas de
pântanos e terras nuas. Nem sombra de árvore manchava o céu;
a estrada desenrolava-se reta como um quebra-mar em meio à
cerração ofuscante das trevas.
[...] Percorrera uma distância aproximada de duzentos passos
quando, bruscamente, numa volta do caminho, os fogos
Carlos Cândido de Almeida & Mariana Vitti-Rodrigues
248
reapareceram próximos dele sem que o homem chegasse a
compreender como podiam elevar-se tão alto no céu morto, iguais
a luas enevoadas. [...] Era uma massa pesada, um amontoado de
construções de onde se levantava a silhueta da chaminé de uma
fábrica. Raros clarões saíam das janelas sujas, cinco ou seis lampiões
tristes pendiam do lado de fora das vigas de madeira enegrecidas do
edifício, alinhando vagamente perfis de cavaletes gigantescos. […]
Só então o homem se deu conta de que aquilo era uma mina e a
vergonha tomou conta dele. Para que tentar? Não haveria trabalho...
[…] (Zola, 1979, p. 5)
Nossa imaginação não trabalha menos, ela não é menos solicitada
por um texto como esse: temos que imaginar a planície, o caminhante so-
litário, campos de beterraba, vento de março, as metáforas da escuridão de
tinta, da estrada como um quebra-mar, dos fogos subindo como luas ene-
voadas, dos lampiões tristes. Em Duna (Herbert, 2015) e Germinal (Zola,
1979), a linguagem instrui a imaginação do leitor pela manipulação dos
seus dois componentes centrais: na terminologia de Dor (2015), eles são a
paisagem simbólica”, com palavras que estabilizam modelos coletivamen-
te codificados do mundo, e o “protocolo de comunicação” (a sintaxe), con-
junto de regras normativas para o uso da linguagem. Esses componentes
foram construídos lentamente, num investimento coordenado de mapea-
mento e demarcação das formas de falar compartilhadas: longos históricos
de uso comum tornaram os efeitos das palavras controláveis por falantes e
ouvintes, enquanto sintaxes – como normas de uso das palavras – se con-
solidavam. Do protocolo sintático e da identificação mútua do significado
emergem modelos mutuamente identificáveis do mundo, permitindo a
instrução da imaginação.
Mas palavras se correlacionam apenas parcialmente com os conte-
údos que emergem nas mentes de cada leitor ou ouvinte. Seus significa-
dos são flexíveis, ambíguos, variáveis e sensíveis ao contexto. Dor (2015)
comenta que a propriedade “frágil”, por exemplo, é semanticamente co-
nectada a certos objetos, propriedades e antônimos (“robusto”, “forte”),
mas no mundo analógico da experiência corporificada, os objetos nunca
são simplesmente frágeis ou robustos, com linhas claras de demarcação. A
rede semântica emergiu e evolui em processos de identificação experiencial
Estudos pluridisciplinares da informação: ciência da informação, ética e linguagem - nº 3
249
mútua, à medida que os falantes chegam a acordos sobre distinções e rela-
ções entre elementos dignos de comunicação. É um processo não planeja-
do, em que sinais e relações são acrescentados à paisagem simbólica, para
atender as necessidades dos falantes, em suas redes de comunicação. Esse
processo não produz definições claras dos conceitos, mas apenas relações
relativamente contextuais e convencionais entre eles e seus objetos típicos
de referência. Isso basta, na maioria das comunicações, como definição
aproximativa: se queremos que os outros imaginem um objeto com deter-
minadas propriedades, o modelo simplificado da paisagem simbólica nos
oferece pontos de referência discretos, fixados por identificação mútua,
com os quais podemos fazê-lo.
Não há apenas lacunas experienciais entre indivíduos; há lacunas em
nós mesmos, como usuários da linguagem. Se um mesmo símbolo funcio-
na como instrutor da imaginação para indivíduos diferentes, podem variar
as redes de relações que os indivíduos estabelecem entre os símbolos e os
fatos da experiência. A identificação mútua é sempre uma questão de grau;
um ouvinte ou um leitor podem imaginar algo diferente daquilo que o
falante pretendia. Na mediação entre a experiência privada e o mundo so-
cial, o falante manipula a linguagem para socializar uma intenção privada,
enquanto o ouvinte privatiza essa mensagem socializada. Idealmente, uma
instância de instrução é bem-sucedida na medida em que o ouvinte tem
uma experiência imaginativa semelhante à intenção do falante, mas todo
sucesso é relativo: a lacuna experiencial permanece, e toda comunicação é
uma aproximação. A função da linguagem não é dizer o que as coisas são,
mas direcionar o ouvinte a um conjunto de distinções, indicando, em geral
ou nos limites daquela comunicação, quais coisas devem ser apreendidas
como diferentes e quais estão ligadas entre si. A influência da linguagem
sobre a experiência será maior quando a experiência só for possível pela
linguagem, ou seja, quando o domínio experiencial existir apenas como
imaginação instruída pela linguagem – como acontece na leitura da ficção.
Neste ponto vale perguntar como opera a imaginação. Farei esse es-
clarecimento apelando a uma definição compatível à teoria de Dor, mas
de maior extensão: falo da proposição de Stephen Asma e Rami Gabriel
(2019), que retornarão adiante em nossa discussão. Segundo eles, a ima-
Carlos Cândido de Almeida & Mariana Vitti-Rodrigues
250
ginação tem uma arquitetura cognitiva intermediária entre os sentidos e
a percepção, o juízo e a avaliação, produzindo novas combinações de re-
presentações e/ou propriedades – incluindo representações contrafactuais
– no cruzamento de domínios diferentes de pensamento e experiência. Ela
pode ser limitada pela compreensão (pela cognição governada por regras)
ou ocorrer como “jogo livre” (não limitado pela teleologia e pela raciona-
lidade). Ela é dotada de intencionalidade nos seus componentes e em suas
motivações, ou seja, é direcionada a elementos presentes e a resultados
futuros. Ela é capaz de subsumir tokens em tipos, estimular inferências ba-
seadas ou não na linguagem (baseadas em imagens, por exemplo), recrutar
sistemas afetivos e emocionais, podendo ocorrer voluntária ou involunta-
riamente (em sonhos, na divagação). Mas ela emerge de uma base pré-pro-
posicional, da qual produz significado ao criar realidades virtuais compos-
tas de elementos recordados e/ou construídos, a priori não comprometidas
com o estabelecimento de símbolos ou conceitos correspondentes a fatos
e experiências reais.
Operamos no nível mais elevado de construção imaginativa quando
temos controle voluntário sobre a sua composição, conduzindo simulações
de resultados. Representações ricas em informação envolvem associações,
protótipos, conceitos em representações offline (i.e. dissociadas da expe-
riência sensorial imediata), construídas sob o controle executivo que, no
nosso caso, toma um sistema de símbolos linguísticos como um repertório
organizável intencionalmente. O resultado é que os produtos da imagina-
ção não são registros do real, mas modos de avaliação; mesmo quando não
são proposicionais, eles podem produzir conhecimento não declarativo –
relativo, por exemplo, à produção musical, à execução de atividades físicas,
à organização do espaço, entre outros exemplos de práticas que comportam
e acolhem uma atividade imaginativa não necessariamente mediada pela
linguagem. De maneira geral, a imaginação é uma capacidade ativada con-
tinuamente em nossa experiência do mundo e em nossas trocas linguísti-
cas; num sentido específico, certas produções humanas são concebidas pela
estruturação intencional de produções imaginativas – como a literatura.
Voltando a Dor (2015), ele propõe que quanto mais a experiência
é determinada por aquilo que as palavras me forçam a imaginar, maior
Estudos pluridisciplinares da informação: ciência da informação, ética e linguagem - nº 3
251
valor informacional as palavras terão. O valor comunicativo da linguagem
se manifesta em seu grau máximo quando alguém é instruído a construir
imaginativamente uma experiência que ele jamais teve, algo que a leitu-
ra da ficção se notabiliza por proporcionar. A linguagem é mais decisiva
quando a comunicação experiencial é impossível, e é secundária quando
a comunicação experiencial é eficaz: uma emoção, por exemplo, pode ser
suficientemente comunicada pelo olhar, tom de voz ou movimento cor-
poral, mas para instruir a imaginação sobre uma experiência emocional, a
linguagem deve dissecar o contínuo analógico da experiência real, dando
nomes a pontos daquele contínuo que possam ser mutuamente identifica-
dos pelo ouvinte – usando palavras como “felicidade”, “tristeza”, “raiva”,
ciúme”, “confiança”.
Fica, então, este rendimento desta discussão: durante a leitura, nos-
sos estados conscientes são direcionados à imaginação de conteúdos instru-
ídos pelo texto. O efeito mental das informações textuais é a imaginação
personalizada de um mundo singular, instruído por um texto cujo valor
informacional vem da combinação de símbolos linguísticos para envolver
e orientar a atenção do leitor – vejamos, a partir de agora, como o texto
estrutura seu potencial de comunicação.
3 o tExto: mundo ficcional, EnrEdo, pragmática da comunicação
Iniciar a leitura é mapear um mundo desconhecido, uma construção
operada não exatamente no texto, mas pelo texto: não se trata de um mun-
do “representado no texto” – como se um mundo existisse fora do texto,
mesmo que apenas na mente do autor –, mas de um mundo construído
textualmente, e que, portanto, existe com as propriedades que nos são da-
das a conhecer, apenas no meio semiótico que o veicula. Uma noção de
mímese pressuporia a existência de um único mundo real como domínio
de referência, do qual as entidades ficcionais seriam derivadas. É certo que
todo autor toma como base elementos do real (tipos, categorias, estruturas,
fatos culturais). Mas também é certo que todo autor, mesmo no registro
realista, adapta e recombina esses elementos para as finalidades da constru-
ção de mundo que está a empreender: por isso prefiro basear minha com-
Carlos Cândido de Almeida & Mariana Vitti-Rodrigues
252
preensão da ficção numa teoria como a de Lubomir Dolezel (1998), que,
fundamentada no diálogo com teorias de mundos possíveis, trata ficções
como trabalhos de poiesis autoral, cujas propriedades e elementos cons-
tituintes são, em princípio, independentes das propriedades, estruturas e
modos de ser da realidade. Isso faz com que os componentes potenciais
dos mundos ficcionais sejam ilimitados (ou inscritos nos limites da pró-
pria imaginação humana), sob a influência de fatores estéticos e culturais
variáveis. Isso não implica que limites não existam: uma vez construídos,
mundos ficcionais são moldados por restrições globais internas, incluindo
critérios de veracidade e plausibilidade que delimitam um número finito
de entes compossíveis e possibilidades de desenvolvimento do enredo. Essa
autolimitação é uma propriedade central para a nossa discussão; vejamos
o que ela significa.
Dolezel (1998) fala de mundos narrativos, que têm o enredo e sua
corrente causal de eventos como um elemento central. Cada mundo apre-
senta propriedades estáveis – cidades, paisagem natural, normas e leis –,
além de personagens antropomorfizados, com vida mental, intenções e ca-
pacidade de ação. Em regra, há vários personagens em interação, cujas mo-
tivações e ações definem “eventos” (a transformação de um estado inicial
em um estado final, ao longo de determinado tempo). Ações pressupõem e
revelam a intencionalidade dos agentes, mas acidentes, tentativas, omissões
e falhas podem ser importantes, assim como operações mentais sem cone-
xão com ações práticas (personagens contemplam, interpretam, pensam,
sonham). Mas é a estruturação das possibilidades modais que confere pos-
sibilidades de ação aos agentes, permitindo a elaboração de enredos. Um
regime de modalidades rege as restrições (globais e pessoais) internas ao
mundo, que são de quatro tipos principais: aléticas, deônticas, axiológicas
e epistêmica.
Restrições aléticas ditam o que é possível, impossível e necessário,
incluindo relações de casualidade, tempo-espaço e capacidade de ação dos
personagens. Pode ser que leis e normas do mundo real determinem o
que é possível, impossível, e necessário, pode ser que o mundo ficcional
tenha elementos fisicamente impossíveis, mágicos, sobrenaturais. O ope-
rador alético opera nos níveis físico, instrumental e mental; suas restrições
Estudos pluridisciplinares da informação: ciência da informação, ética e linguagem - nº 3
253
podem regular o mundo como um todo ou variar de acordo com o perso-
nagem – elas podem impor limitações e possibilidades de existência e ação
que serão globais naquele mundo, ou variáveis de acordo com as dotações
individuais dos agentes.
Restrições deônticas determinam o que é proibido, permitido e obri-
gatório; restrições axiológicas determinam o que é valorizado e desvaloriza-
do no mundo ficcional (assim como as condições para alterar valorações).
Mais uma vez, ambas podem ser globais ou variáveis entre os agentes. Por
fim, modalidades epistêmicas regulam a distribuição desigual de conheci-
mento entre os personagens, identificando mentiras, rumores, falsas cons-
tatações, de acordo com a extensão da ignorância e do conhecimento dos
agentes sobre o próprio mundo ficcional, e moldando intenções e as inte-
rações entre eles. Nesse ponto, em convergência com Dolezel, Marie-Laure
Ryan (1991) propõe que enredos abordam as discrepâncias e conflitos entre
o mundo real textual e os mundos privados dos personagens. Se o “mundo
do conhecimento” de um personagem inclui um sistema de proposições
conhecidas, acreditadas e ignoradas por ele, isso estabelece para ele um do-
mínio prospectivo, antecipando desdobramentos possíveis a partir da sua
situação atual, em maior ou menor conflito com os domínios prospectivos
dos demais personagens e daquilo que é verdadeiro no próprio mundo
ficcional (o “mundo real textual”). Pode ocorrer que o personagem esteja
enganado ou iludido sobre coisas que ele considera reais, pode ocorrer
que seu conhecimento seja limitado. O mesmo vale para o “mundo das
obrigações” e seu sistema de compromissos e proibições sociais e morais
(que especificam ações como permitidas, obrigatórias e proibidas), para o
mundo dos desejos” (que define, para cada personagem, o que é “bom”,
mau” e “neutro”), para “mundos fingidos” (personagens que enganam os
outros ou a si mesmos), e para “mundos de fantasia” (sonhos, alucinações,
fantasias e estórias inventadas pelas personagens).
Em regra, Ryan (1991) propõe que os personagens querem fazer
com que o mundo real textual coincida com seus mundos privados, agindo
para que isso aconteça: o enredo começa quando ocorre com um conflito
entre mundos do universo narrativo, e termina com o final dos conflitos
produtivos (aqueles que os agentes agiam para solucionar). Um conflito
Carlos Cândido de Almeida & Mariana Vitti-Rodrigues
254
se dá entre o mundo real textual e um dos mundos de um domínio pri-
vado, ou entre mundos de um mesmo domínio privado, ou dentro de
um mesmo mundo privado, ou entre os mundos privados de diferentes
personagens – sempre pressupondo algum conflito básico com o mundo
real textual. Os conflitos mais frequentes envolvem o mundo real textual
e os mundos de desejo das personagens (quando o desejo do agente não é
satisfeito no mundo real textual, gerando alguma demanda pessoal). Um
conflito ocorre dentro do domínio da própria personagem quando a satis-
fação de um dos seus mundos exige a não satisfação de outro: ela pode ter
desejos contraditórios, pode manifestar fidelidade a regras incompatíveis,
ou pode ser incapaz de delinear fronteiras entre os próprios mundos (ela
pode ser mentalmente instável ou confusa, por exemplo). Conflitos entre
os mundos privados de diferentes personagens ocorrem quando a realiza-
ção de um deles exige a não satisfação do outro. Conflitos podem existir
objetivamente, ou envolverem um conflito epistêmico (quando alguém
identifica um conflito onde não há conflito algum).
Da perspectiva deste capítulo, todos esses elementos descritos por
Ryan e Dolezel integram o quadro estruturado de informações textuais
pelo qual o leitor aprenderá a conhecer e interpretar o mundo ficcional.
Tendo falado do texto, passemos agora à leitura.
4 o tExto E a lEitura
Mundos ficcionais e as suas estruturas, modalidades, agentes e con-
flitos: o leitor passa a conhecê-los apenas ao iniciar a leitura. Ele não entra
desarmado na leitura, porém; seu conhecimento prévio é decisivo para o
processamento do texto. Mais do que isso, o texto é construído para esti-
mular sua atividade mental: são mundos concebidos para serem comunica-
dos pelos enunciados de narradores e personagens – enunciados de fontes
ficcionais, mas que, pelos pressupostos da pragmática linguística, o leitor
processará como processa enunciados de fontes reais. Toda a apresentação
do mundo ficcional transcorre em atos de comunicação que visam caracte-
rizar os elementos do mundo ficcional, articular diálogos, especificar “esti-
los mentais” dos personagens, afetivizar a leitura.
Estudos pluridisciplinares da informação: ciência da informação, ética e linguagem - nº 3
255
A leitura é um processo semiótico, em que – pela teoria de Paul
Kockelman (2012) – o leitor aplica, à informação textual, esquemas indi-
vidualizados, mas sempre socialmente compartilhados nalguma medida.
Kockelman (2012) propõe que, imerso em modos de vida, normas sociais
e práticas culturais, todos temos “ontologias”, i.e. conjuntos de pressuposi-
ções relativas à constituição subjacente do mundo e seus padrões salientes.
São pressupostos relativamente contextuais, flexíveis e adaptáveis, adqui-
rindo maior ou menor força e explicitação em cada situação, com graus
variados de coerência lógica, normativa e causal. Ontologias podem ser
mais ou menos aplicáveis em contextos diferentes; seus pressupostos po-
dem basear-se em categorias, teorias, experiências pessoais, conectando-se
a valores morais, políticos, existenciais, à dimensão primária do afeto e da
experiência corporal, às práticas e justificações de tradições e instituições.
Para os nossos interesses, importa entender que ontologias orientam
a seleção das informações às quais o leitor atribuirá maior relevância, es-
truturando as relações do leitor com as relações que os símbolos textuais
estabelecem entre si. Pressupostos ontológicos esquematizam a seleção, va-
loração e ordenação (hierárquica, causal) das informações textuais, subs-
tanciando o conhecimento e a interpretação dos entes ficcionais: os pressu-
postos que o leitor traz à leitura determinam como ele lerá um texto que é,
por sua vez, estruturado como um longo ato de comunicação (com os tipos
de leitor que o autor imagina alcançar, em seu contexto de produção).
Para entendermos como essa intenção de comunicação é articulada
no texto, sumarizarei algumas conclusões de um bom compêndio recen-
te de pragmática da ficção (Locher; Jucker, 2017). Seguindo Culpeper e
Fernandez-Quintanilla (2017), comecemos pela caracterização das per-
sonagens – que, num texto de ficção, são estruturadas pelos aportes do
narrador, pela apresentação do personagem por si mesmo ou por outros
personagens, e por índices textuais explícitos ou implícitos. Embora o lei-
tor recorra ao conhecimento de pessoas reais ao processá-los, suas carac-
terísticas não são inferidas como as de pessoas reais. Os comportamentos
dos personagens são completos: pessoas reais seguem vivendo além dos
nossos encontros com elas, enquanto o texto nos dá acesso a todo o quadro
comportamental existente de um personagem, substanciando nossas infe-
Carlos Cândido de Almeida & Mariana Vitti-Rodrigues
256
rências com completude. Assim os comportamentos têm mais significado:
em relação a pessoas reais, sabemos que há ocasiões em que elas agem de
maneira consistente com suas personalidades e disposições típicas, e outras
em que seu comportamento tem uma causa contextual; quanto aos perso-
nagens, se todo comportamento é um ato ostensivo de comunicação com
o leitor e, por isso, supostamente relevante, isso tende a fazer que o leitor a
presuma que todo comportamento seu será significativo, indicando traços
de personalidade. Com isso, mais esforço interpretativo é dedicado aos
comportamentos de personagens ficcionais, cujas ações são sempre inter-
pretadas como relevantes para a sua caracterização.
Ao processar a informação textual para construir mentalmente o
personagem, o leitor emprega “esquemas sociais” que, adquiridos na sua
experiência de vida, sintetizam conhecimento sobre o mundo, eventos,
pessoas e ações. Os próprios autores recorrem a tais esquemas, esperando
que os leitores produzam inferências sobre os personagens a partir de es-
quemas que eles esperam que os leitores possuam (podendo manipulá-los
para efeitos imprevistos). Isso permite economia de expressão, pois os au-
tores, ao apelarem ao conhecimento tácito compartilhado com os leitores,
induzem-nos a inferir muita informação não codificada no texto – “impli-
caturas”, no vocabulário da pragmática de inspiração griciana. O mesmo
vale para esquemas de personagens consolidados na história da ficção, os
tipos de personagens com os quais os leitores terão se familiarizado em
seus históricos de leitura: eles também são manipuláveis pelos autores, para
economia de expressão. Mas esquemas não são estáticos ou normativos: a
qualquer momento o leitor pode acessar um subesquema que se adapte
melhor às informações textuais, recategorizar essas informações, ou com-
biná-las de maneira ad hoc, produzindo um esquema novo.
Paralelamente, diálogos e falas sugerem os estilos mentais e visões de
mundo dos personagens, formando conjuntos de informações que ofere-
cem indícios cumulativos dos seus enquadramentos do – ou daquilo que
eles projetam como – real: a “visão de mundo” engloba suas representações
mentais recorrentes da realidade que ele habita; o “estilo mental” agrupa
seus processos mentais, incluindo pensamentos, memórias, intenções, de-
sejos, avaliações, sentimentos, emoções, ainda que nem sempre seja fácil
Estudos pluridisciplinares da informação: ciência da informação, ética e linguagem - nº 3
257
distinguir o estilo mental da visão de mundo (pois o estado psicológico de
um personagem geralmente influencia sua visão de mundo e vice-versa).
Como tudo mais, diálogos e falas são feitos para o leitor, situando os per-
sonagens na estória, indicando regimes modais, comunicando relações de
causalidade, encenando eventos, guiando interpretações e juízos, dirigindo
a atenção a elementos do enredo, fazendo revelações sobre os personagens,
aderindo a convenções de gênero (Bednarek, 2017). Diálogos podem ter
funções estéticas, de persuasão ideológica, explorar o humor, a ironia, a
inovação linguística, a intertextualidade, o comentário, a alegoria – além
da função básica de estruturar a continuidade da narrativa.
Diálogos são fundamentais, em especial, para a expressão da pos-
tura (stance) avaliativa, epistêmica e afetiva de narradores e personagens,
diante de elementos pontuais do enredo ou como estilo mental próprio.
Expressa-se postura através de expressões avaliativas, epistêmicas e afetivas
que influenciam como a estória é percebida e avaliada (Landert, 2017).
Posturas afetivas expressam emoções (em verbos como “amar”, adjetivos
como “feliz”, advérbios como “infelizmente”); posturas epistêmicas tratam
do grau de certeza ou confiabilidade da informação (em expressões como
tenho certeza”, “certamente”, “duvido”). Posturas podem ser expressas de
forma implícita, pela representação de gestos, expressões faciais e posturas
corporais; meios paralinguísticos incluem o tom, intensidade e duração
da fala, além do uso de fontes especiais e letras maiúsculas; posturas em
relação aos conteúdos podem também ser sugeridas implicitamente, me-
diante o apelo a avaliações culturais difundidas. Na comunicação entre as
personagens, expressões de postura sobre as pessoas, as situações e as coisas
ajudam a caracterizar as relações entre eles: eles avaliam a si mesmos e aos
outros, dizendo o que acham bom, ruim, desejável, belo, correto ou apro-
priado, e por esses meios revelando as características das suas relações uns
com os outros.
Por fim, o texto traz representações de emoções (Langlotz, 2017),
mais uma vez de função comunicativa, oferecendo informações sobre per-
sonagens, contextos e situações. Elas devem ser compreendidas a partir
do conhecimento desenvolvido sobre o mundo ficcional e o contexto do
enredo, sendo importantes na indexação das posturas dos personagens em
Carlos Cândido de Almeida & Mariana Vitti-Rodrigues
258
relação a outros personagens, a objetos de interação e a situações especí-
ficas. Emoções podem ser descritas, enunciadas ou expressas através da
linguagem emotiva; um vasto repertório de indicadores de emoção pode
envolver, ademais, canais comunicativos variados. O corpo é um canal co-
municativo, com suas expressões faciais, gestos, movimentos; a prosódia e
o ritmo da fala são outros canais, incluindo a altura da fala, seu timbre e
duração, a qualidade da voz, a repetição de vocábulos. No discurso ficcio-
nal, emoções tipicamente envolvem objetos, causas ou eventos provocado-
res: elas são causadas por estímulos construídos e posicionados para cap-
turar a atenção do leitor. E elas são quase sempre avaliativas, envolvendo
algum processo cognitivo que leva em consideração os objetivos do agente
numa situação específica, bem como a relevância da situação para a sua
vida e bem-estar; tal como emoções reais, elas variam na valência, inten-
sidade e duração. A representação textual de emoções ficcionais costuma
enfatizar as alterações fisiológicas e corpóreas dos personagens, indicando
suas tendências de ação, reação e expressão. Ficções também exploram os
modos como as expressões de emoção são reguladas pelos personagens,
sob motivações pertinentes ao enredo e a parâmetros determinados pelas
modalidades narrativas.
Da perspectiva deste capítulo, todos esses são tipos de informação
que o texto oferece ao mapeamento do leitor, seja de maneira ostensiva,
seja como apelo à sua capacidade inferencial. Segmentos textuais são lidos
sequencialmente, motivando a construção imaginativa de entes dotados de
propriedades estáveis, integrados em mundos ficcionais progressivamente
coerentes, e envolvidos em relações conflitivas cuja evolução dá forma ao
enredo. Esse processo de conhecimento e relação com a ficção é afetiva-
mente modulado: a leitura é afetivizada desde o primeiro instante, o que
condiciona a intensidade e qualidade do interesse do leitor pelos persona-
gens, pelo enredo e pelo próprio mundo ficcional. A afetivização da experi-
ência condiciona, afinal, o enquadramento da informação textual em toda
a extensão da leitura – passemos a ela.
Estudos pluridisciplinares da informação: ciência da informação, ética e linguagem - nº 3
259
5 afEto E valor
As proposições sobre a “mente emocional” de Asma e Gabriel (2019)
nos permitem entender como a afetivização da experiência é coextensiva à
leitura, efetivando-se de maneira infraconsciente e apenas ocasionalmente
gerando efeitos emocionais conscientes. Eles situam os afetos num nível
funcional básico, anterior aos processos cognitivos e comportamentais
conscientes, mas com poderes causais sobre a motivação comportamen-
tal, a atenção e a ação. A valência afetiva codetermina o conteúdo dos
processos mentais: na origem, valores afetivos são sinais internos que ma-
nifestam fenomenicamente certas necessidades corporais, manifestando-se
como sensação corporal de fundo, tendência de resposta e recompensa,
afeto central e emoção inconsciente; essa atividade elementar faz com que
a mente seja saturada de sentimentos. Sentimentos e afetos fornecem mol-
duras semânticas elementares para a experiência corporificada do mundo:
parte substancial da experiência humana não produz significados, e os sig-
nificados que emergem dela raramente estabelecem correspondência entre
um signo e um referente, mas sim uma relação afetivizada com o ambiente
físico, a interação social e os artefatos culturais.
O que mais interessa à teoria da leitura é o processamento secundá-
rio, que inclui emoções sociais (moldadas pela aprendizagem e pelo condi-
cionamento social) e emoções de processamento terciário (sustentadas pela
linguagem, pelo controle executivo e pelo planejamento do futuro), entre-
laçadas a capacidades cognitivas superiores. Essas emoções são avaliativas,
mesmo quando não associadas a representações (crenças, julgamentos), e
mesmo quando envolvem apenas certa categorização das coisas pela asso-
ciação a imagens de memória (e não a um conceito formal abstrato). Asma
e Gabriel (2019) propõem que categorias sem afetos são vazias; afetos
sem categorias são cegos: certa organização categorial avaliativa motiva as
emoções; ao mesmo tempo, emoções estão implicadas na avaliação, como
categorias, dos objetos da experiência. Afetos desempenham um papel im-
portante na estrutura semântica das representações e permeiam a relação
com os conceitos linguísticos – que não existem para nós como formas pla-
tônicas, mas como representações que nos ajudam a navegar no ambiente
físico e social: a linguagem permite explorar analogicamente os afetos, dis-
Carlos Cândido de Almeida & Mariana Vitti-Rodrigues
260
sociando-os das suas funções primárias e secundárias. Nesse domínio cog-
nitivo de símbolos e conceitos, cognição e capacidade de simulação, o afeto
é dissociado do aqui-e-agora da experiência real, mas permanece funcional
como impulso motivacional – pois ele é anterior e mais básico do que
as capacidades cognitivas superiores, incluindo a linguagem. A linguagem
permite, sim, uma dissociação entre conceitos e afetos reais. Ao fomentar a
imaginação, porém, na comunicação simbólica o domínio conceitual não
constitui um sistema (sintático e semântico) totalmente dissociado do cor-
po, da percepção, da emoção, pois representações linguísticas são marcadas
pela valência afetiva: um grau substancial de afeto colore nossas palavras,
permeando nossos exercícios de simulação. É assim que emoções morais,
por exemplo, desenvolvidas como modo de regulação das relações sociais
– incluindo as reações às normas sociais, compreendidas como formas de
gestão dos afetos no convívio interpessoal –, são mediadas conceitualmen-
te, i.e. motivam certa associação entre conceitos e emoções: os conceitos,
nesse caso, podem ser descritos como domesticações (de nível secundário
e terciário) de afetos de nível primário, que levam ao “embaraço”, “angús-
tia”, orgulho”, e assim por diante. Essas palavras pressupõem a influência
modeladora de mecanismos de habituação promovidos pela deliberação
racional e pelo contexto cultural, apresentando-se como conceitos afetivos
e culturalizados em igual medida.
Tem-se, então, que na escrita do texto de ficção a escolha das pala-
vras é motivada pela antecipação dos seus efeitos afetivos. A informação
textual é afetivamente processada: o leitor não apenas “entende” o texto,
pois seu engajamento com a leitura é condicionado pelo envolvimento
afetivo com os elementos do enredo e do mundo ficcional que viemos
discutindo. A afetivização permeia cada frase, enquadrando a percepção
dos conflitos, a interpretação das motivações, a caracterização dos lugares e
personagens, a valoração das ações. De acordo com o comentário anterior
sobre a representação textual das emoções, nada garante que haverá coinci-
dência entre elas e as emoções que elas motivarão no leitor: a representação
ficcional de uma emoção, como fonte de informação sobre o personagem,
pode ser processada afetivamente de maneiras diferentes, por leitores dife-
rentes (a disjunção pode até atender a intenções autorais; um autor pode
Estudos pluridisciplinares da informação: ciência da informação, ética e linguagem - nº 3
261
querer provocar riso pelo sofrimento do personagem, ou vice-versa). Mas
o que mais nos interessa a esta altura é estabelecer que, na leitura da ficção,
“informação” e “afeto” se condicionam mutuamente, estruturando não
apenas a compreensão do mundo e a relação com o enredo, mas também,
e especialmente, o mapeamento do texto e a atribuição de relevância às
informações textuais.
6 comEntários finais
Instrução à imaginação, ficção como construção de mundo, o texto
como comunicação com o leitor, a leitura como experiência afetiva: todos
esses processos pressupõem os efeitos cognitivos do processamento da in-
formação textual. Antecipei que duas acepções do termo “informação” são
particularmente importantes na atividade da leitura: a informação como
unidade que demarca uma diferença em relação a um “fundo” menos sa-
liente; a informação como redução do espectro de alternativas na cognição
de certo elemento.
No primeiro caso, a atribuição de relevância e a aplicação de esque-
mas mentais pelo leitor é decisiva para o conhecimento e a afetivização
da relação com os entes ficcionais. É um processo em que sequências de
símbolos linguísticos são agregados na imaginação de entes relativamente
complexos – lugares, personagens, conflitos, dotados de várias proprieda-
des sincronicamente atuantes. A identificação de elementos relevantes é
concomitante à projeção de regularidade e estabilidade ao mundo em que
eles despontam, que é assim posicionado como “fundo” em que eles se
destacam como “figura”. Cada leitor imagina e afetiviza esses elementos
de maneira diferente, mas para todos chega o momento da habituação –
em que os entes inicialmente desconhecidos se tornam familiares. Isso é
resultado do segundo processamento informacional indicado, pelo qual o
leitor afunila possibilidades alternativas até chegar, intuitivamente, a uma
construção pessoal dos entes ficcionais dotada de estabilidade.
Um tipo de processamento da informação complementa o outro:
inicialmente, o leitor adquire consciência de elementos salientes, focando
neles a sua atenção; daí ele refina progressivamente sua imaginação des-
Carlos Cândido de Almeida & Mariana Vitti-Rodrigues
262
ses elementos, conferindo maior granularidade à sua fisicalidade, psico-
logia, poder modal, e tudo mais que lhe for pertinente. Inúmeros símbo-
los serão processados imediatamente como novidade – Arrakis, Kwisatz
Haderach, campos de beterraba. Outras unidades demandarão maior po-
der de inferência do leitor, como na construção do perfil psicológico de
um personagem complexo. Os produtos da leitura são mentais, resultante
da cognição corporificada do texto: o leitor imagina gestos, movimentos
corporais, pontos de vista, lugares e paisagens; ele compreende estruturas,
motivações, intenções e ações; ele afetiviza suas relações com os persona-
gens. Informações codificadas no texto instruem o leitor a conhecer os
elementos (estáticos e dinâmicos) e modalidades narrativas que estruturam
o mundo ficcional, a compreender o enredo e detectar elementos a serem
acompanhados, permitindo-lhe habituar-se àquelas novidades.
Esse padrão básico pode ser manipulado de inúmeras maneiras. Há
textos que estimulam o terror, o suspense, o humor, ou mesmo a inde-
cidibilidade, a ambiguidade, a polissemia, a indeterminação – como em
Melville, Kafka, Cortázar. Mas entendo que o jogo informacional é sempre
o mesmo, sejam quais forem os efeitos visados.
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264
265
9
TEORIA DA INTERPRETAÇÃO:
PERCURSO ENTRE A EXPRESSÃO E
O CONTEÚDO
THEORY OF INTERPRETATION: A
PATHWAY BETWEEN EXPRESSION
AND CONTENT
Alexandre Robson MARTINES
UNESP
alexandre.martines@unesp.br
https://orcid.org/0000-0002-4524-0978
https://doi.org/10.36311/2025.978-65-5954-635-0.p265-309
Carlos Cândido de Almeida & Mariana Vitti-Rodrigues
266
Resumo: A linguagem materializa a informação, dando a esta sentido. A informação ganha
forma passível de interação à medida que elementos semânticos são vinculados e, assim,
são constituídos enunciados. Frente a isso, o objetivo deste estudo é analisar algumas
teorias da linguagem com o fito de explorar seus fundamentos para apontar caminhos que
corroborem a constituição de uma teoria da interpretação, ao menos debater sobre alguns
primeiros fundamentos e, assim, demonstrar as diferenças de análise direcionadas a explorar
o plano da expressão e o plano do conteúdo. Para tanto, aplicou-se uma metodologia de
natureza qualitativa, exploratória, já que busca evidenciar os fundamentos teóricos das
teorias exploradas, assim também se caracteriza como uma pesquisa bibliográfica, cujo
direcionamento é constituir o estudo da arte sobre interpretação através de análises críticas.
A linguagem atua como dínamo de significação, possibilitando que uma mente amplie
sua compreensão sobre objetos, fenômenos e eventos, graças ao conjunto sígnico em sua
complexidade de semiose, portanto a linguagem é constituída de signos, os quais ativam
a cognição, gerando significação para alguém, devido à sua capacidade e funcionalidade
de estar no lugar dos objetos, dos fenômenos e dos eventos tratados. Portanto, o plano
da expressão, através do composto semântico que lhe compõe, é capaz de gerar sentido,
já que seus componentes manifestam um conteúdo imediato através da imanência do seu
significado, porém, sem o processo de discursividade, não é possível acessar o plano do
conteúdo de modo pleno, direcionado às substâncias presentes, total ou parcial.
Palavras-chave: Tratamento da informação; Plano da Expressão; Análise conceitual;
Modelo de Interpretação; Discurso.
Abstract: Language materializes information and gives meaning to it. Information
takes a form that is susceptible to interaction because semantic elements are bounded;
thus, utterances are constituted. In this perspective, the aim of this study is to analyze
some theories of language with the aim of exploring their foundations to show ways to
corroborate the constitution of a theory of interpretation, at least to debate some initial
foundations and thus present the differences in analysis aimed at exploring the expression
and content. To achieve this, a qualitative, exploratory methodology was applied,
since it seeks to highlight the theoretical foundations of the theories explored. It is also
characterized as a bibliographical research, whose aim is to constitute the state of the art
of interpretation through critical analysis. Language acts as a dynamo of signification,
enabling a mind to broaden its understanding of objects, phenomena and events, as a
result of the sign set in its complexity of semiosis. erefore, language is made up of
signs, which activate cognition, generating meaning for someone due to its capacity and
functionality to be in the place of objects, phenomena and events. erefore, expression,
through the semantic compound that composes it, is capable of generating meaning, since
its components manifest an immediate content through the immanence of its meaning;
however, without the process of discursivity, it is not possible to access the perspective of
content to the fullest, directed at the substances present, in whole or in part.
Keywords: Information processing; Expression; Conceptual analysis; Interpretation
model; Discourse.
Estudos pluridisciplinares da informação: ciência da informação, ética e linguagem - nº 3
267
1 introdução
A linguagem materializa a informação, dando a esta sentido. A in-
formação ganha forma passível de interação à medida que elementos se-
mânticos são vinculados e, assim, são constituídos enunciados. Os enun-
ciados são a comunhão de elementos linguísticos, em níveis de articulação,
que constituem a base estrutural de um texto, como os aspectos fonéticos,
morfológicos, sintáticos e semânticos. O texto é o resultado discursivo, que
engloba as camadas de saberes que inter-relacionam fatores temáticos e fi-
gurativos, em sua aspectualização, somado aos fatores de intencionalidade,
fatores de pragmática, intertextualidade e interdiscursividade, além da pos-
sível presença de marcas de poder, de controle ou de ideologia. Com isso, a
interpretação é a interação contínua com a informação e, principalmente,
com os discursos que geram a significação dessa informação, a qual se rea-
liza através de uma jornada cognitiva, explorando a vivência e a experiência
da mente que interpreta na configuração de seu background – conjunto de
saberes de uma mente decorrente à experiência e à capacidade cognitiva de
representar a realidade.
A linguagem assume um papel fundamental na consolidação da in-
formação enquanto esta se perfaz em unidades de sentido até alcançar a
complexidade de constituir conhecimento. Assim, para que haja instru-
mentos de representação e mediação que estabeleçam confluência entre
informação, cognição e conhecimento, estabeleceu-se a teoria do conceito,
inicialmente como logopeia disposta semanticamente para estudar como o
conceito espelha a realidade e afeta a mente.
Nessa perspectiva, para compreender as relações semânticas, os
efeitos de sentido, a distinção entre os efeitos oriundos da expressão e o
percurso gerativo, ou a ação do signo que se executam para alcançar o
conteúdo, é preciso que se aplique teorias da linguagem, sejam da linha da
linguística, sejam acerca dos fundamentos da filosofia. Com isso, para que
se possa analisar as camadas de saberes que se perfazem na constituição de
um texto e explorar os fatores que efetivem a significação, é preciso que se
apresente uma teoria da interpretação.
Carlos Cândido de Almeida & Mariana Vitti-Rodrigues
268
A interpretação é resultante da correlação entre informação e conhe-
cimento, já que a informação ativa o conhecimento, e o conhecimento,
por sua vez, amplia a potência de sentido e significação da informação.
Porém, esse processo não é simples, tampouco deve ser entendido como
uma atividade superficial, pois entre a mente e a realidade há percalços
bastante complexos para que a atividade de representação, mediação, des-
crição, ação e de comunicação possam ocorrer.
Desse modo, a interpretação requer a aplicação de conceitos, os
quais não devem ser confundidos com nomes, já que os conceitos são
complexos cognitivos, oriundos da experiência social-cultural com a reali-
dade (Lakoff, 1998, 2018; Lakoff; Johnson, 2009), que expressam cenas,
práticas, condutas, comportamentos, ações, métodos, técnicas, estratégias,
objetos, fenômenos, eventos, formas de vida, sendo esses elementos com-
preendidos por conjuntos de linguagem, que possam ser entendidas como
jogos de linguagem (Wittgenstein, 2014), os quais, muitas vezes, são siste-
matizados através de terminologia (Barros, 2006; Almeida, 2003, 2006), já
que esta atua como um registro formal, técnico-científico em uma língua,
com a função de especificar determinado conhecimento (Cabré, 1999,
2003, 2010).
A interpretação, portanto, não se limita a uma atividade de reconhe-
cimento dos elementos linguísticos que constituem a materialização da in-
formação, tampouco pode ser considerada fluente por indicar fundamen-
tos conceituais na superfície do texto como indicadores do conhecimento,
através de revocação temática. A interpretação é um processo complexo,
que projeta a informação como ativadora de backgrounds. Para tanto, a
linguagem é o instrumento para analisar essa ativação.
Sendo assim, é preciso destacar que os aspectos linguísticos estão
alinhados à expressão, desse modo é possível, através de seus elementos,
estabelecer efeitos de sentido, todavia a relação linguagem, background,
realidade permite que esses fenômenos sejam discursivizados, assim pro-
movendo a significação resultante de combinações de possibilidades, de
outras informações, de conhecimentos já experienciados. Frente a isso, o
acesso ao conteúdo é uma atividade de interpretação que não se realiza no
Estudos pluridisciplinares da informação: ciência da informação, ética e linguagem - nº 3
269
imediatismo, mas, sim, através de análises profundas das manifestações de
sentido que um texto possa promover.
Diante desses aspectos, o objetivo deste estudo é analisar algumas te-
orias da linguagem com o fito de explorar seus fundamentos para apontar
caminhos que corroborem a constituição de uma teoria da interpretação,
ao menos debater sobre alguns primeiros fundamentos e, assim, demons-
trar as diferenças de análise direcionadas a explorar o plano da expressão e
o plano do conteúdo.
Para a realização deste estudo, aplicou-se uma metodologia de na-
tureza qualitativa, exploratória, já que busca evidenciar os fundamentos
teóricos das teorias exploradas, assim também se caracteriza como uma
pesquisa bibliográfica, cujo direcionamento é constituir o estudo da arte
sobre interpretação através de análises críticas, tendo em vista que a análise
se realiza a partir dos conceitos que circundam aspectos de interpretação
e, dessa forma, permitindo a realização de inferências e a constituição dos
resultados.
Desse modo, esta pesquisa busca tratar dos elementos mínimos da
constituição do texto, além dos aspectos que configuram a construção do
texto como enunciado, enunciação e discurso, como também os funda-
mentos que evidenciam as características da expressão em sua forma lin-
guística e as características do conteúdo em sua condição de interação, de
experiência e ação, de conhecimento e de background.
2 ElEmEntos mínimos da linguagEm: fatorEs Estruturais E sua
ExprEssão
A informação é o elo entre uma mente e o objeto, o fenômeno, ou
o evento, assim sua função é dar forma à percepção, à apreensão e ao en-
tendimento das coisas que circundam aquelas mentes que interagem com
a realidade e, desse modo, ativa o processo de cognição. A informação
permite que a mente compreenda a realidade, visto que constrói elementos
significativos através da linguagem, os quais estabelecem a representação
Carlos Cândido de Almeida & Mariana Vitti-Rodrigues
270
dessas coisas do mundo, por conseguinte a mediação necessária para ga-
nhar sentido e realizar raciocínios.
Diante disso, a informação é atuante quando ganha sentido (Capurro,
1991; Buckland, 1991, 1997; Capurro; Hjørland, 2003; Araújo, 2018).
Sendo assim, o reconhecimento da informação em uma atividade de com-
preensão entre humanos ou entre humanos e máquinas ocorre mediante
à materialidade em linguagem, pois a linguagem é o recurso simbólico
capaz de representar, mediar, descrever, apontar ações e comunicar sobre
a realidade.
A linguagem atua como dínamo de significação, possibilitando que
uma mente amplie sua compreensão sobre objetos, fenômenos e eventos,
graças ao conjunto sígnico em sua complexidade de semiose, portanto a
linguagem é constituída de signos, os quais ativam a cognição, gerando
significação para alguém, devido à sua capacidade e funcionalidade de estar
no lugar dos objetos, dos fenômenos e dos eventos tratados (Silveira, 2007;
Santaella, 2008, 2020; Peirce, 2017).
Nessa disposição, a linguagem viabiliza o acesso ao conhecimento
através da constituição de conceitos (Dahlberg, 1978a, 1978b; Hjørland,
2009), pois estes são capazes de fundamentar o significado das coisas do
mundo e estabelecer uma espécie de modelo nuclear que, atuando como
construtos, viabilizam práticas, cenas, estratégias, definições, atributos,
que, quando recuperados através da correlação de signos na constituição
de enunciados, promovem um efeito mental (Lakoff, 1998, 2018; Lakoff;
Johnson, 2009) capaz de revelar e demonstrar como comunidades social-
mente construtoras de discursos compreendem os objetos e os fenômenos
e, assim, criam elementos simbólicos para representá-los aos integrantes do
grupo e àqueles que se aproximam para conhecer mais sobre a dinâmica de
seus construtos (Fontanille, 2008, 2016; Hjørland, 2009; Smiraglia, 2015;
Barité, 2015).
A linguagem pode ser verbal e não-verbal. Por sua vez, a linguagem
verbal se apresenta nas dinâmicas sociais, pois está presente na atividade
corriqueira dos indivíduos (Fiorin, 2007; Mussalim; Bentes, 2011), ou
seja, a relação entre sujeitos ou a relação entre sujeitos e máquinas é norte-
Estudos pluridisciplinares da informação: ciência da informação, ética e linguagem - nº 3
271
ada pela presença constante da linguagem verbal, pois somente ela é capaz
de descrever as coisas do mundo, assim acaba sendo essencial para afetar as
ações e estabelecer a comunicação (Searle, 2002). Nessa linha, a linguagem
verbal se caracteriza por efetivar traços peculiares referentes à cultura de
grupos sociais, assim sua manifestação ocorre através de línguas (Câmara
Júnior, 1975).
Nesse propósito, as línguas são sistematizadas em estruturas basilares
– perfazendo uma gramática – responsáveis pela articulação, consequente-
mente responsáveis pela transmissão e compreensão da informação (Neves,
2018). Assim, os elementos que fazem parte dessas estruturas pertencem
à expressão de uma língua, evidenciando sua forma. Desse modo, a gra-
mática de uma língua é constituída por fonologia, morfologia, sintaxe, as
quais isoladas ou articuladas geram aspectos de significado, explorados na
semântica (Bechara, 2006).
Durante muito tempo, os estudos formais acerca da estrutura da
linguagem foram fundamentados em gramáticas. A gramática surge com
os gregos, porém é na gramática de Port-Royal (Arnauld; Lancelot, 2001),
que se estabelecem modelos de tratamento dos elementos mínimos da
linguagem, assim gerando estudos à base de tradições, as quais, a partir
do século XIX, foram norteadas pelos modelos de vernáculos oriundos
da literatura Romântica, que refletiam os usos da língua pela burguesia e
não registravam as variações linguísticas de outros grupos sociais (Faraco,
2006, 2016; Fiorin, 2007; Mussalim; Bentes, 2011).
Com o fortalecimento da linguística no cenário científico – decor-
rente da publicação do Curso de Linguística Geral, assinado por Ferdinand
de Saussure, em 1916, material organizado pelos discípulos do mestre
genebrino, já que Saussure não publicou em vida, deixando anotações e
registros decorrentes de suas aulas – as preocupações acerca de uma abor-
dagem científica da linguagem ganharam força (Fiorin, 2007). Saussure
apresenta sua tese sobre a semiologia e qual relação esse campo do saber
teria com a linguística e com a psicologia, assim apontando um elemento
que merecia a atenção de seus estudos: a langue (Saussure, 2006).
Carlos Cândido de Almeida & Mariana Vitti-Rodrigues
272
Saussure desenvolveu, inicialmente, estudos acerca da fonética do
Indo-Europeu, assim sua preocupação estava centrada em tratar a língua
como sistema, pouco se dedicou a tratar sobre o processo de sentido e sig-
nificação, porém evidencia o signo como ponto central da constituição de
uma língua e dedica momentos do Curso para tratar do valor linguístico
(Milani, 2016). Apresentando a dicotomia: significante – a imagem acús-
tica mental – e o significado – o conceito – (Saussure, 2006), a semiologia
estabeleceu parâmetros iniciais que se tornariam precursores para tratar os
fundamentos da gramática de forma científica (Milani, 2016).
Estudos vieram na sequência, muitos voltados para os aspectos for-
malistas da língua, como o caso de Leonard Boomfield (1973). Contudo,
é a partir de Louis Hjelmslev, na década de 1930, que os aspectos formais
da língua são vistos como condutores para se acessar o conteúdo, sendo
apresentado como funtivos (Hjelmslev, 2013).
Hjelmslev (2013) apresenta o plano da expressão e o plano do con-
teúdo, assim a junção dos planos proporcionaria uma semiótica, ou seja,
Hjelmslev (2013) reconhece que há a necessidade de apontar uma ação,
uma evolução, uma ampliação da expressão para se chegar ao conteúdo,
ou seja, a interpretação não deve se limitar à expressão, por mais que esta,
consoante Hjelmslev (2013), apresente uma substância; o acesso ao conte-
údo é doravante um processo semiótico.
É válido destacar que Émile Benveniste (1999, 2014, 2020) realizou
um importante estudo sobre as formas mínimas da linguagem. Assim como
ele, Ullmann (1966); Martinet (1968); Coseriu (1981, 1986); Fillmore
(1987); Meillet (2021) apontaram contribuições importantes para que os
elementos mínimos fossem estudados como objetos científicos e, assim,
deixassem de ser tratados à base da tradição da gramática. Outrossim,
Benveniste (1999, 2014, 2020), ao recuperar os elementos mínimos e sua
atuação na sistematização de uma língua, evidenciou que há diferenças im-
portantes entre significado e sentido, visto que este ocorre na manifestação
do enunciado, bem como fatores morfológicos, como pronomes, verbos
e advérbios são fundamentais para marcar a presença da enunciação na
construção do discurso, de acordo com as marcas dêiticas, que posicionam
na enunciação os actantes, o tempo e o espaço.
Estudos pluridisciplinares da informação: ciência da informação, ética e linguagem - nº 3
273
Frente a esses fatores de cunho epistemológicos, é válido destacar que
não é intenção desta investigação tratar dos fatores formais das unidades
mínimas, discutindo aqui fundamentações sobre fonologia, morfologia e
sintaxe, mas, sim, tratar de estratégias de interpretação que envolvem as
unidades mínimas, já que elas são a base para a construção do enunciado.
Além disso, é necessário ressaltar o porquê a informação se materiali-
za em linguagem, já que entre o fenômeno e a interação entre mentes para
a sua compreensão, há a incidência de sons, que determinam oralmente
a diferença entre um signo e outro, até alcançar merismas, características
mínimas da articulação vocal de um fonema (Benveniste, 1999, 2014),
visto que a diferença entre [pato] e [bato] é a substituição do fonema [p]
pelo fonema [b], uma mudança em que há fatores de ordem morfológica
e sintática, já que substitui um objeto pelo outro e esses se encaixam na
organização da sentença, no caso, da palavra. Por outro lado, o que dife-
rencia [p] de [b] como fonemas são merismas, já que [p] é um fonema de
característica oclusiva bilabial voseada, enquanto [b] é oclusiva bilabial não
voseada (Bechara, 2006).
Além disso, os aspectos da forma atrelados à fonologia possibilitam
efeitos de sentido, sejam decorrentes ao registro variacional do falante que
caracteriza fatores culturais, sociais na constituição linguística de sua ex-
pressão comunicacional, sejam as figuras de linguagem do campo da har-
monia, em destaque a aliteração de consoantes, assonância de vogais, a
paronomásia, o eco e a onomatopeia, somado aos efeitos rítmicos presentes
em poesias, bem como a rima. Outro fator importante nos aspectos da so-
noridade responsável por criar efeitos de sentido na expressão é a melopeia,
situação em que a combinação de sons é capaz de criar uma imagem.
Frente a isso, observa-se a seguinte situação:
I. tique-taque.
A onomatopeia tique-taque é uma expressão cujo conteúdo ime-
diato, ou melhor, a forma do conteúdo (Hjelmslev, 2013) é o som de um
relógio, porém não é possível evidenciar qual relógio, quais são as circuns-
Carlos Cândido de Almeida & Mariana Vitti-Rodrigues
274
tâncias desse som, se o som é apenas resplandecente no ambiente, ou há
sujeitos interagindo com o som, entre tantas outras possibilidades que é
impossível resgatar, visto que a informação não está discursivizada.
Os recursos sonoros presentes na composição de sua expressão reme-
tem à passagem do tempo, porém esse aspecto está atrelado às sensações
oriundas do som proferido pela engrenagem do relógio, como também a
mudança do fonema vocálico [i] para o [a]. A vogal [i] é uma vogal alta,
posterior e fechada, enquanto a vogal [a] é uma vogal baixa, central e mé-
dia (Bechara, 2006), ou seja, quando os fonemas que compõem “tique-ta-
que” são proferidos, há uma sensação de boca fechada, decorrente da vogal
[i], para a sensação de boca aberta, devido à vogal [a], assim o próprio
movimento da boca faz analogia a uma engrenagem se mexendo em uma
transformação de movimento, devido à sensação de um movimento mecâ-
nico de abrir e fechar do maxilar.
Nessa outra ocorrência:
II. “ao longe, o vento vai falando de mim”.
Nesse verso, da poesia 4º motivo da rosa (Meireles, 2001, p. 71),
da poetisa brasileira Cecília Meireles, reconhece-se uma aliteração advinda
dos fonemas consonantais [l], [v], [f], [n] e [m], os quais promovem uma
melopeia, ou seja, o som efetiva a sensação imagética do vento. É válido
destacar que a assonância das vogais [a], [o], [e] e [i] oferecem a sensação
de leveza, como se a vogal [a] representasse um objeto leve flutuando para
cima, enquanto a nasalização das vogas [o] e [e] em sequências criam a
imagem de voo e, por sua vez, a vogal [i] representa uma extensão, uma
projeção ao infinito.
Nesse conjunto sonoro, dividido em quatro seguimentos rítmicos:
1. [ao longe]; 2. [o vento]; 3. [vai falando]; 4. [de mim], as consoantes [l]
e [n] presentes no primeiro seguimento e repetidas no terceiro provocam
a sensação de leveza e extensividade. Além disso, nos seguimentos dois e
três, em que ocorre a apresentação do tema do verso “vento”, a aplicação
dos fonemas [v] e [f] – fricativas linguodentais vozeada [v] e não-vozeada
Estudos pluridisciplinares da informação: ciência da informação, ética e linguagem - nº 3
275
[f] (Bechara, 2006), efetivam a melopeia do vento, enquanto o conjunto
de vogais e o verbo no gerúndio criam a sensação do vento passando.
Por mais que a expressão sonora promova grandes contribuições para
a leitura e interpretação do poema, é preciso a correlação do enunciado e
dos discursos para explorar com mais profundidade o conteúdo da poesia,
pois essa análise viabiliza a forma e a substância do plano da expressão.
No próximo seguimento:
III. “seus lábios são labirintos”.
Nesse verso, da canção Refrão de um Bolero (Refrão…, 1991), do
grupo musical Engenheiros do Havai, reconhece-se a aliteração dos fone-
mas consonantais [s], [l], [b], como também o eco [labi-] e a assonância
das vogais [a] [e/i], [o/u]. Essa sequência permite que a frase que apresenta
como sujeito a palavra lábios crie uma melopeia em que ocorre a sensação
imagética de um beijo, devido a posição do aparelho fonador enquanto os
fonemas são pronunciados. De fato, os fatores sonoros contribuem para a
composição morfossintática, já que há uma informação metafórica de que
os lábios são labirintos, permitindo a interpretação parcial de que os beijos
pertencentes a quem o eu-lírico canta a canção, representam uma aventura
e um desafio, pois, depois dessa entrega, o eu-lírico não sairá ileso.
Entretanto, realizar esse tipo de interpretação, sem estabelecer crité-
rios de verificação de como o plano da expressão percorre até o conteúdo, é
estabelecer uma análise parcial, característica de uma abordagem heurísti-
ca, estágio inicial dos processos de interpretação, marcado pela construção
de hipóteses e necessidade de fundamentação da coerência entre estágio
virtual da significação e o estágio real.
Os exemplos evidenciam casos recorrentes na linguagem literária,
em que o uso do plano da expressão vinculada à sonoridade corrobora a
construção dos efeitos de sentido do poema, porém é importante destacar
que, por se tratar de uma linguagem plurissignificativa, a literatura permite
vários estágios de interpretação e, por isso, torna-se interessante estabelecer
critérios para destacar as marcas da expressão e quais fundamentos permi-
Carlos Cândido de Almeida & Mariana Vitti-Rodrigues
276
tem alinhá-los ao conteúdo, que transita do estágio da heurística para a
hermenêutica, aplicação filosófica que verifica os fundamentos aplicados à
significação que possibilita acesso ao conteúdo (Gadamer, 1997).
De todo modo, é importante evidenciar que analisar as partes de um
texto amplia a abordagem heurística, direcionando às práticas da herme-
nêutica, contudo não significa que a interpretação é plena, ou melhor, não
assegura o acesso ao conteúdo, pois é necessário explorar o enunciado, o
contexto e os elementos discursivos presentes na produção da significação
(Gadamer, 1997).
Ademais, a partir da oralidade, os grupos sociais desenvolveram a
escrita, assim surgiram as palavras. As palavras pertencentes a uma língua
são denominadas léxicos (Dubois et al., 1998). Os estudos sobre os léxi-
cos são conduzidos pela lexicologia, lexicografia e morfologia (Dubois et
al., 1998). Por sua ordem, a lexicologia estuda a natureza da palavra, seu
registro, sua posição no estrato social e, alinhado à etimologia, a origem
da palavra, assim permitindo compreender como se constitui o significa-
do (Dubois et al., 1998). A lexicografia é responsável pela dicionarização
da palavra, assim permitindo seu agrupamento, seja através da correlação
semântica, seja devido à composição da família cognata (Dubois et al.,
1998). Já a morfologia estuda a função das palavras, ou seja, a qual clas-
se de palavras pertence, como substantivo, verbo, pronome etc., além de
analisar seu desenvolvimento, ou seja, aspectos vinculados à derivação e à
composição das palavras (Dubois et al., 1998).
Evidentemente que toda palavra apresenta uma forma e um conteú-
do. Essa forma é constituída de fonemas e letras, e o conteúdo é o significa-
do (Hjelmslev, 2013), ou seja, uma descrição inicial sobre a representação
da realidade, isto é, funções semânticas estabelecidas social e convencional-
mente para que uma determinada palavra cumpra em seu estado latente.
Por mais que semanticamente o significado apresente um conteúdo,
este não deve ser confundido com o conteúdo que a palavra assume quan-
do inserida em um enunciado, o qual devido à aplicação de um contexto,
de uma intencionalidade e de uma correlação entre as palavras, promoven-
do uma aspectualização temática e/ou figurativa projetada em um discurso
Estudos pluridisciplinares da informação: ciência da informação, ética e linguagem - nº 3
277
(Fontanille, 2008, 2015), permite o efeito de sentido e a constituição da
significação, os quais não são resultados imediatos de elementos mínimos,
mas, sim, resultantes de um processo discursivo-semiótico.
Destaca-se, como exemplo, o léxico maçã. Maçã é um substantivo
simples, comum, concreto e primitivo (Bechara, 2006). É um léxico que
nomeia uma espécie de fruto, oriundo da macieira, uma árvore cuja deno-
minação é derivada da palavra maçã. É possível estabelecer relações semân-
ticas com suas propriedades, como casca, polpa, sementes, ou ainda com
a cor de sua casca: vermelha, verde; bem como seu tipo: argentina, fuji,
royal, gala etc. Também é possível aplicar o denominado campo semânti-
co e estabelecer maçã como fruta, como alimento, como bebidas etc., ou
ainda, como meronímia, relacionar maçã a produtos de limpeza, devido
ao aroma, ou como elementos que se vendem no mercado, por exemplo.
Esses fatores apresentados podem ser estudados pela lexicologia, le-
xicografia e morfologia. Entretanto, o conceito maçã pode remeter-se à
tecnologia, à física, à mitologia, à religião, pois o objeto maçã foi inserido
em contextos diversos ampliando a significação do conceito, ou seja, a
expressão maçã não representa, sem o advento do discurso, o conteúdo,
pois somente as marcas contextuais podem evidenciar qual dos diversos
sentidos está sendo aplicado.
Desse modo, fica claro que organizar a informação utilizando apenas
formas mínimas, como o léxico, é passível de não efetivar os traços de sen-
tido e significação suficientes para evocar o conceito, pois o apontamento
do léxico vem a evidenciar o significado decorrente do plano da expressão
e do plano do conteúdo constituído de modo genérico, dicionarizado, per-
dendo, assim, os diversos desdobramentos da significação.
No seguinte exemplo:
IV. Confidência do Itabirano
Alguns anos vivi em Itabira.
Principalmente nasci em Itabira.
Por isso sou triste, orgulhoso: de ferro.
Carlos Cândido de Almeida & Mariana Vitti-Rodrigues
278
Noventa por cento de ferro nas calçadas.
Oitenta por cento de ferro nas almas.
E esse alheamento do que na vida é porosidade e comunicação.
A vontade de amar, que me paralisa o trabalho,
vem de Itabira, de suas noites brancas, sem mulheres e sem
horizontes.
E o hábito de sofrer, que tanto me diverte, é doce herança itabirana.
De Itabira trouxe prendas diversas que ora te ofereço:
esta pedra de ferro, futuro aço do Brasil,
este São Benedito do velho santeiro Alfredo Duval;
este couro de anta, estendido no sofá da sala de visitas;
este orgulho, esta cabeça baixa...
Tive ouro, tive gado, tive fazendas.
Hoje sou funcionário público.
Itabira é apenas uma fotografia na parede.
Mas como dói! (Andrade, 2010, p. 66)
Nessa poesia, escrita pelo poeta brasileiro Carlos Drummond de
Andrade, observa-se que as palavras Itabira e ferro são as que aparecem
com mais frequência ao longo do corpo do texto. Há a recorrência de
seis aparições da palavra Itabira ou de suas derivações como itabirano ou
itabirana e há quatro aparições da palavra ferro, entretanto o texto não
tem como tema central o ferro, e Itabira. Embora seja parte do assunto,
é, na verdade, o contexto para que o eu-lírico apresente sua condição de
vida, assim o tema central é a vida do eu-lírico, morador de Itabira, que
é reconhecido pela desinência número-pessoal dos verbos, isto é, não há
a presença no enunciado de palavras que marquem o eu-lírico, assim na
contagem de frequência de palavras que aparecem na expressão, não seria
contabilizado o tema central.
Frente a isso, reconhece-se que o plano da expressão apresenta as
palavras, porém não é a frequência de sua aparição no enunciado que esta-
belece o tema central ou efetiva o acesso ao conteúdo. Evidentemente que
esses fatores recuperados no plano da expressão são fundamentais para es-
tabelecer o percurso dos estágios da heurística e hermenêutica para acessar
o conteúdo, todavia não se pode entender como um ato imediato.
Estudos pluridisciplinares da informação: ciência da informação, ética e linguagem - nº 3
279
Outro elemento mínimo, pertencente à gramática de uma língua é a
sintaxe. A sintaxe é responsável pela organização dos termos em uma frase,
assim constituindo uma sentença. Somado a isso, é na sintaxe que ocorre a
cópula, aspecto da lógica em que há a ampliação semântica do objeto devi-
do à relação entre o sujeito e o predicado, ou melhor, a valência verbal ar-
ticula a ação da informação fazendo que o predicado, também visto como
atributo, seja alinhado à referência do objeto, ampliando seu sentido.
Especialistas alinhados à lógica, como Carnap (1937, 1943, 1948);
Frege (1984, 2002, 2009); Wittgenstein (2014); Peirce (2017) apontam a
importância da construção sintática para constituição da informação, pois
efetiva a proposição, ou seja, há mecanismos linguísticos para efetivar o
raciocínio. De fato, desde Aristóteles, a lógica é marcada pela relação sin-
tática, efetivando os fundamentos e os atributos presentes nas sentenças e
a aplicação de uma síntese cruzando os resultados, como ocorre em: Todo
homem é mortal, em que o predicado ‘mortal’ constitui um atributo ao
sujeito ‘homem’.
Em sua linha, Chomsky (1976, 1979, 2009a, 2009b, 2014, 2018a,
2018b) evidenciou a sintaxe como elemento fundamental da construção
do processo gerativo da gramática universal, assim apontou que o funda-
mento sintático é um recurso inato, portanto ontogenético da raça huma-
na, sendo responsável pelo diferencial na construção do sentido.
De todo modo, a sintaxe é um recurso linguístico fundamental para
a complexidade da informação, portanto há a incidência da lógica, por isso
é um fundamento tão explorado na filosofia da linguagem.
Por outro lado, estudos tradicionais construíram uma noção equi-
vocada acerca da sintaxe, ou seja, tratando esse processo linguístico como
gerador máximo do sentido, além de entender a frase como unidade fun-
damental da proposição. De fato, os estudos de Chomsky (1976, 1979,
2009a, 2009b, 2014, 2018a, 2018b) e Frege (1984, 2002, 2009) corrobo-
raram esse equívoco, pois leituras superficiais das teorias apontaram coin-
cidências no tratamento da sintaxe. Em sua concepção sobre a linguagem,
Chomsky (1976, 1979, 2009a, 2009b, 2014, 2018a, 2018b), ao apresen-
tar a concepção do parsing, aponta a sintaxe como recurso transformacio-
Carlos Cândido de Almeida & Mariana Vitti-Rodrigues
280
nal na geração do sentido, e Frege (1984, 2002, 2009) estabelece a relação
entre sentido e referência, porém as duas teorias são bastante complexas e
não devem ser vistas de modo reduzido alinhado à constituição da frase.
Assim, observa-se o exemplo:
V. O rei da França é careca.
Nesse exemplo famoso nas discussões sobre sentido e referência,
apresentados por Frege (1984, 2002, 2009), sob aspectos da gramática
gerativa, há a incidência da informação careca para ampliar a intensividade
informacional sobre o rei da França, possibilitando que o leitor saiba que
um dos atributos desse rei é ser careca. Já na teoria do Frege (1984, 2002,
2009), essa frase não pode ser entendida como uma expressão passível de
sentido, pois a referência não existe, isto é, a França por ser uma república,
não possui rei. Assim, enquanto uma abordagem está vinculada ao sentido
proposto pelos aspectos linguísticos, a outra não se satisfaz, pois em con-
fronto com o extralinguístico percebe que não é possível haver sentido, já
que a construção não corresponde à realidade.
Estudos sobre o enunciado, encabeçados por Beaugrande e Dressler
(1997); Van Dijk (2019, 2020); Drucot (2020) demonstram que a sintaxe
é importante para a geração do sentido, como apontaram Chomsky (1976,
1979, 2009a, 2009b, 2014, 2018a, 2018b) e Frege (1984, 2002, 2009),
cada um a seu modo, todavia há uma relação entre as frases na composição
do enunciado, que as teorias lógica e transformacional não levaram em
consideração. Van Dijk (2019, 2020) estabelece a diferença entre microes-
truturas e macroestruturas, ou seja, microestrutura estaria para os elemen-
tos mínimos: fonologia, morfologia e sintaxe; macroestrutura, por sua vez,
volta-se para a composição dos parágrafos e do texto como um todo, ou
seja, o sentido construído no bojo do enunciado.
Frente a esses apontamentos, os elementos que compõem a frase são
pertencentes à expressão, o resultado da sintaxe, como mecanismo gerativo
apresenta acesso ao conteúdo, contudo esse conteúdo é particular, pois
caracteriza a compreensão de uma frase, ou seja, há acesso somente ao con-
Estudos pluridisciplinares da informação: ciência da informação, ética e linguagem - nº 3
281
teúdo da sentença e isso não deve servir como suficiente para representar o
conteúdo de texto como o todo.
A frase, por seu turno, não é empregada sozinha, isolada, marcada
apenas pelos elementos presentes na sua estruturação. Se assim fosse, o
fluxo informacional construído poderia produzir resultados incompatíveis
com a realidade. De fato, a frase, como sentença, constitui um enunciado
e, assim, está inserida em um discurso, ancorada em um contexto e marca-
da por registros de intencionalidade e aspectualização. Portanto, os resul-
tados semânticos advindo de uma análise da proposição sob viés sintático
não deve ser interpretado como o conteúdo pleno.
Em suma, os elementos mínimos são necessários e fundamentais
para a composição do texto, visto que como elementos mínimos são res-
ponsáveis por sistematizar a estrutura textual que consolida o enunciado
para que este possa atuar como arena da significação, já que estabelece as
articulações entre os elementos e ampliando o sentido, pois, nessa correla-
ção que cresce, ocorre a tessitura dos elementos, através da progressão te-
mática, ou seja, as unidades estabelecem redes semânticas mais complexas,
atualizando os sentidos e dinamizando sua aplicação conforme contexto,
intencionalidade, focalização e aspectualização, fator que, alinhado ao con-
texto, gera cadeias semânticas.
Desse modo, uma proposta de interpretação deve articular ferramen-
tas, práticas e métodos para averiguar os elementos da expressão nos seus
estágios de imanência, conforme aponta Hjelmslev (2013) para criar um
recurso hermenêutico de verificação das condições significativas do enun-
ciado, para, assim, sistematizar as camadas de saberes que se aplicam a esse
enunciado na configuração da enunciação e na construção dos discursos.
3 o Enunciado E a construção sEmântica: os ElEmEntos da ExprEssão
E do contEúdo
A informação é conduzida para a interpretação na consolidação de
um enunciado, pois é no enunciado que o fluxo informacional ganha di-
recionalidade, visto à constituição de sentenças, à base de elementos lin-
Carlos Cândido de Almeida & Mariana Vitti-Rodrigues
282
guísticos, responsáveis pela dinâmica da tessitura de um texto, ou seja,
a constituição de enunciado conduz a informação para a construção do
sentido, ou seja, sem o enunciado, a informação não se sistematiza para
que uma mente possa apreendê-la.
De fato, muitas informações podem ser transmitidas ao se utilizar
apenas uma frase, na formatação de um período simples, todavia é impor-
tante destacar que essa frase isolada na enunciação compõe um conjunto
maior de informações que é o contexto. Desse modo, a informação sozinha
não compõe o sentido, mas, sim, o sentido é decorrente de um conjunto
informacional já articulado e presente na constituição da experiência dos
interlocutores. Por isso, a produção do sentido no fluxo informacional de-
pende de fatores cognitivos, os quais ativam conhecimentos que compõem
o background de uma mente (Lakoff, 1998, 2018; Lakoff; Johnson, 2009).
Nesse sentido, é importante refletir sobre os fundamentos linguísti-
cos e conceituais que consistem na efetivação de um enunciado, por conse-
guinte como este se configura em texto. Pode-se compreender texto como
conjunto de elementos de sentido e de recursos em que ocorrem os proce-
dimentos de significação, isto é, o texto é a complexa organização dos sa-
beres necessários para que os interlocutores se posicionem e, assim, possam
manifestar a condução de fatores linguísticos, extralinguísticos, discursivos
para promover a semiose, por conseguinte a significação. Para Fontanille
(2019, p. 85), texto é “[…] aquilo que se dá a apreender, o conjunto dos
fatos e dos fenômenos que ele presta a analisar”, assim ocorre a identifica-
ção das “[…] primeiras microfiguras do plano da expressão”, as quais “[…]
não são ainda unidades discursivas, porque elas não são necessariamente
pertinentes de uma interpretação semântica”, visto que essa camada textual
apenas oferece a forma do conteúdo semântico advindo da imanência de
suas partes.
Esse conjunto de microfiguras apresenta uma união de fenômenos
ao mesmo tempo. Sendo a aplicação de elementos linguísticos para funda-
mentar a sua base, os fatores na manifestação da enunciação e a construção
de fatores manifestados e manifestantes que permitem o reconhecimento
daquilo que está na tessitura do texto. Esses elementos também emitem
marcas daquilo que é implícito, pois há elementos lógicos que perfazem
Estudos pluridisciplinares da informação: ciência da informação, ética e linguagem - nº 3
283
o entendimento acerca do que é pertencente à realidade, à ficção ou à
construção de hipóteses sobre a existência das coisas, as quais podem ser
pensadas, pois são discursivizadas.
Diante disso, o discurso é “[…] um conjunto de proposições or-
ganizadas; o discurso concebido como o produto de uma enunciação”,
ou melhor, a complexidade da substância do conteúdo ocorre na semiose
doravante ao discurso, pois este trata-se de “[…] um conjunto cuja signifi-
cação não resulta da simples adição ou combinação da significação de suas
partes” (Fontanille, 2019, p. 86).
Desse modo, o texto não deve ser entendido como mero conjunto
de frases e de sentenças, constituídos pela aplicação dos elementos míni-
mos da gramática de uma língua. Outrossim, o texto é a materialização da
informação, sistematizando as diretrizes do fluxo informacional, tanto o
que está manifestado no enunciado, como aquilo que é manifestante na
enunciação e nas camadas de saberes que perfazem o contexto e o discurso.
Sendo assim, há o enunciado, uma das esferas que compõem o texto,
ou melhor, a esfera em que se manifesta o linguístico e o lógico, por isso,
muitas vezes, texto e enunciado são tratados como sinônimos, além da
confusão de que a expressão do enunciado é o próprio conteúdo.
O enunciado é a esfera em que ocorre a tessitura textual, por conse-
guinte a progressão temática é uma camada na qual os aspectos semânticos
são constituídos decorrentes da sistematização morfossintática, ou seja, é
a camada em que se configuram as sentenças e ocorre a construção das
proposições, exposições, descrições e dos argumentos, estabelecendo a co-
esão e a coerência, permitindo a conexão entre os elementos linguísticos e
constituir campos semânticos ou rede semânticas dependendo dos modais
presentes no enunciado.
Observando o exemplo a seguir:
VI. Além, muito além daquela serra, que ainda azula no horizonte,
nasceu Iracema.
Iracema, a virgem dos lábios de mel, que tinha os cabelos mais
negros que a asa da graúna, e mais longos que seu talhe de palmeira.
Carlos Cândido de Almeida & Mariana Vitti-Rodrigues
284
O favo da jati não era doce como seu sorriso; nem a baunilha
recendia no bosque como seu hálito perfumado.
Mais rápida que a corça selvagem, a morena virgem corria o sertão
e as matas do Ipu, onde campeava sua guerreira tribo, da grande
nação tabajara. O pé grácil e nu, mal roçando, alisava apenas a
verde pelúcia que vestia a terra com as primeiras águas.
(Alencar, 2006, p. 26)
Esse excerto pertence ao livro Iracema, do escritor brasileiro José de
Alencar. Trata-se do início do capítulo II, onde ocorre a apresentação da
protagonista da obra que leva como título o seu nome Iracema. Esse re-
corte (Alencar, 2006, p. 26) apresenta a composição de um enunciado,
composto por elementos mínimos da gramática da língua portuguesa. Esse
exemplo apresenta um conjunto de informações que são reconhecidas nas
marcações linguísticas, porém há fatores que são recuperados devido ao
contexto e ao conhecimento de mundo do leitor. Explorando os fatores
linguísticos presentes no enunciado, é possível reconhecer de imediato que
há a apresentação da personagem devido a composição da primeira senten-
ça, em que evidencia o nascimento, fazendo uso do verbo, e finaliza com a
apresentação do nome: Iracema.
O segundo parágrafo é iniciado pelo nome Iracema e, na sequên-
cia, utilizando-se de apostos e símiles – figura de linguagem que efetiva a
comparação -, Iracema é comparada à natureza. Assim, a rede semântica
se constitui com a correlação de palavras como mel, asa da graúna, talhe
de palmeira, favo da jati, baunilha, bosque, corça selvagem, sertão, matas do
Ipu e verde pelúcia. Além disso, na composição sintática, além dos apostos,
há o uso recorrente de oração subordinada adjetiva explicativa: ambos os
recursos sintáticos são aplicados com a função de ampliar a caracterização
do sujeito.
Nessa dinâmica, a rede semântica construída efetiva uma extensivi-
dade informacional sobre Iracema, somada ainda à informação de que ela
pertencia a uma guerreira tribo, a grande nação tabajara. Frente a isso, ob-
serva-se que o enunciado é responsável por direcionar as práticas de inter-
pretação, no entanto não o é suficiente, pois é necessário distinguir as figu-
ras e os temas presentes e como se estabelecem no contexto para efetivar a
Estudos pluridisciplinares da informação: ciência da informação, ética e linguagem - nº 3
285
significação, ou seja, como esses fatores são discursivizados para possibilitar
o reconhecimento da aspectualização, da focalização e da intencionalidade.
Desse modo, fica claro que uma análise presa ao enunciado, é, por-
tanto, uma análise que se apega ao sentido manifestado apenas no plano
da expressão. Nessa linha, deve-se entender que, ao realizar a leitura do
excerto, é possível entender um pouco sobre Iracema personagem, mas
não expressa praticamente nada do que acontece em Iracema livro, ou seja,
analisar o enunciado e sua expressão é recuperar informações importantes,
contudo não são suficientes para compreender o livro como um todo.
Nessa perspectiva, é válido refletir melhor sobre o plano da expressão
e o plano do conteúdo. Inicialmente, trata-se de uma construção conceitual
de Hjelmslev, na década de 1930, desenvolvida em sua obra Prolegômenos
a uma teoria da linguagem, Hjelmslev (2013) busca discutir sobre a semi-
ótica, como efeito de significação, assim explorando em sua Glossemática
processos denominados metassemiótica, a qual é constituída por dois fun-
tivos: plano da expressão e plano de conteúdo.
De fato, Hjelmslev (2013) indica que esses funtivos são uma evolu-
ção da concepção de Saussure sobre o signo, ou seja, o plano da expressão
seria a evolução do significante e o plano do conteúdo, do significado.
No entanto, não se deve entender como uma correlação imediata, já que
Hjelmslev (2013) apresenta uma discussão sobre a forma e a substância,
assim efetivando a forma e a substância da expressão e a forma e a substân-
cia do conteúdo.
Nessa construção, Hjelmslev (2013) indica a necessidade de se ana-
lisar esses elementos no nível de imanência de cada um. Somado a isso,
é possível estabelecer o plano da expressão como elementos da fonologia
e do conteúdo como elementos associados à semântica, pois a forma da
expressão está para os fonemas, e a substância da expressão para a forma-
ção das palavras; já a forma do conteúdo seria a composição morfológica,
enquanto a substância do conteúdo seria o resultado da interpretação ad-
vinda da metassemiótica (Hjelmslev, 2013).
Outrossim, esses fundamentos foram aplicados à semiótica de linha
francesa através dos estudos de A. J. Greimas. Assim, Greimas (1966) apre-
Carlos Cândido de Almeida & Mariana Vitti-Rodrigues
286
senta o percurso gerativo do sentido, o qual através da análise dos três
planos: profundo – em que ocorre a aplicação do quadrado semiótico,
através de uma composição lógica e aplicabilidade sintática, chega-se a um
resultado semântico -, o qual é atrelado ao segundo plano: narrativo – em
que ocorre a modelização dos elementos da narrativa, destacando os fatores
de manipulação e competência, em que os modais saber, fazer, querer, poder
e ser são diretrizes para os aspectos tímicos na performance dos sujeitos e
objetos que desencadeiam a sanção final (Fiorin, 2007). Desse modo, esses
modais perfazem o processo de aspectualização apresentando o terceiro
nível: o discursivo, as figuras e os temas que, ao serem discursivizados,
apresentam o conteúdo do texto analisado.
Nessa linha, Greimas e Fontanille (1993) buscam sistematizar a
concepção de expressão como recursos gerais que compõem a informação,
e conteúdo como o resultado realizado da significação. Fontanille (2008,
2015, 2016) apresenta o percurso gerativo da expressão, o qual é através
das cenas práticas que se evidenciam as formas de vida, ou seja, trata-se
de um percurso composto por seis níveis de pertinência: signo-figura,
texto-enunciado, objeto, prática, estratégica e formas de vida. Cada nível
é analisado pelo nível de imanência correlativa ao conjunto de elementos
presentes na expressão de cada nível, assim permitindo que em um processo
de aspectualização das figuras e dos temas em congruência na configuração
discursiva seja possível alcançar o conteúdo.
Frente a essas abordagens, fica claro que a análise imediata das infor-
mações permite o acesso à expressão, por mais que explore diversos fatores
de sua imanência, contudo esses objetos figurativos iniciais não são discur-
sivizados, portanto não alcançam o conteúdo, ou ainda, esses resultados se-
mânticos não são suficientes para promover a semiose, já que não apresen-
tam todos os fatores que constituem o raciocínio, consequentemente não
permitem que uma mente tenha acesso a todos os fatores informacionais
que poderiam ativar conhecimentos, em outras palavras, o background do
texto não foi explorado.
Apontados esses fatores, deixa clara a importância de pensar o pro-
cesso de interpretação como camadas de saberes, pois a dinâmica entre
recursos que provocam sentido e geram a significação é bastante complexa.
Estudos pluridisciplinares da informação: ciência da informação, ética e linguagem - nº 3
287
A conexão entre enunciado e discurso é fundamental para a constituição
da valência das figuras e dos temas que compõem a aspectualização, ou
seja, a conexão entre esses elementos consiste um cinturão semântico na
esfera do enunciado, permitindo que se aplique fundamentos da coesão e
da coerência, os quais são responsáveis pela efetividade da isotopia.
Greimas e Courtés (2016, p. 276) definem isotopia como “a itera-
tividade, no decorrer de uma cadeia sintagmática”, proporcionando atri-
butos semânticos, “[…] que garantem ao discurso-enunciado a homoge-
neidade”, assim possibilitando uma “[…] leitura uniforme do discurso, tal
como resulta das leituras parciais dos enunciados que o consistem, e da
resolução de suas ambiguidades que é orientada pela busca de uma leitura
única” (Greimas; Courtés, 2016, p. 276). A aplicação da isotopia no pro-
pósito de interpretação é fundamental para estabilizar a informação em um
fluxo temático ou figurativo que garanta a sua uniformidade.
Entretanto, antes de aprofundar como a concepção de isotopia pro-
move a relação de congruência na análise do enunciado na relação com
o discurso, é importante destacar como a Linguística Textual analisa os
elementos de coesão e de coerência.
Assim, entende-se que coesão é o mecanismo linguístico, manifesta-
do na superfície do enunciado, responsável por garantir que a progressão
temática e argumentativa se efetue decorrente de uma união, promovendo
uma unidade capaz de efetivar as partes do enunciado na construção do
fluxo informacional. Sendo assim, a coesão está atrelada aos fatores linguís-
ticos, pois sua dinâmica está vinculada aos fatores morfossintáticos, ou seja,
a correlação entre substantivos, a substituição de referentes pelo pronome,
a condução da frase pelas conjunções e pelos operadores argumentativos,
fatores que podem interferir na constituição da enunciação, já que revela
fatores dêiticos na relação enunciado, enunciador, enunciatário e discurso.
Segundo Koch (2018a, p. 45), coesão é vista como “[…] o fenôme-
no que diz respeito ao modo como os elementos linguísticos presentes na
superfície textual se encontram interligados entre si, por meio de recursos
também linguísticos, formando sequências veiculadoras de sentidos”. A
coesão é responsável pela unidade linguística que se perfaz no enunciado
Carlos Cândido de Almeida & Mariana Vitti-Rodrigues
288
e que permite que a informação se interlaça através dos direcionamentos
pelos aspectos referenciais e sequenciais.
Outrossim, a coesão pode ser classificada como coesão referencial
e coesão sequencial. A coesão referencial é responsável pela manutenção
do tema durante a progressão temática e pode acionar mecanismos como
substantivos, pronomes, adjetivos, desinências verbais para garantir que
os referentes apresentados nas sentenças sejam recuperados nas frases que
seguem, apresentando fatores de relação de anáfora e catáfora para a pro-
jeção ao correferente, ou seja, um termo que se efetiva como referente em
momentos distintos na construção do enunciado (Koch, 2018a, 2018b).
Desse modo, ocorre o fenômeno de anáfora quando o enunciado apresen-
ta um referente e um remissivo; enquanto o fenômeno de catáfora ocorre
uma disposição inversa, ou melhor, há a presença de um remissivo, depois
há a presença do referente (Maingueneau, 1996).
Analisando o seguinte exemplo:
VII. Dario vinha apressado, guarda-chuva no braço esquerdo e,
assim que dobrou a esquina, diminuiu o passo até parar, encostando-
se à parede de uma casa. Por ela escorregando, sentou-se na calçada,
ainda úmida de chuva, e descansou na pedra o cachimbo.
Dois ou três passantes rodearam-no e indagaram se não se sentia
bem. Dario abriu a boca, moveu os lábios, não se ouviu resposta.
O senhor gordo, de branco, sugeriu que devia sofrer de ataque.
(Trevisan, 2001, p. 272)
Esse excerto compõe o conto Uma vela para Dario (Trevisan, 2001,
p. 272), de Danton Trevisan, escritor brasileiro. Esses dois parágrafos de-
monstram a aplicação da coesão em progressão anafórica, em que Dario,
protagonista da história, inicia o primeiro parágrafo, portanto há a presen-
ça do referente, na sequência um conjunto de informações atuam como
remissivo, em destaque o verbo dobrou, visto que a frase em que esse verbo
é núcleo não possui sujeito marcado no enunciado, mas devido à desinên-
cia número-pessoal – terceira pessoa do singular – e a progressão temática,
permite reconhecer uma elisão do sujeito, que no caso é Dario, assim como
ocorrem com os verbos diminuiu e encostando-se.
Estudos pluridisciplinares da informação: ciência da informação, ética e linguagem - nº 3
289
No final do primeiro período do primeiro parágrafo, surge a infor-
mação de uma parede de uma casa, na sequência de progressão anafórica,
no segundo período ainda no primeiro parágrafo, a parede é recuperada
pelo pronome pessoal remissivo ela, enquanto Dario é recuperado pelos
verbos escorregando e sentou-se. No segundo parágrafo, em seu primeiro
período, é o pronome pessoal no que atua como remissivo de Dario. Já no
segundo período, Dario se repete com a finalidade de ajustar o referente na
progressão temática, e o verbo moveu efetiva uma nova elisão do referente,
como também ocorre na frase seguinte, já que o termo dele cuja função é
complemento nominal de resposta não está marcado no enunciado.
A coesão também pode ser aplicada em construções mais comple-
xas, explorando interdiscursos, ou seja, trazer para o enunciado a presen-
ça de algo que não está mencionado no cotexto, mas é possível inferir
devido ao contexto, assim quando há fatores presentes no cotexto sufi-
cientes para promover a análise da expressão é denominado de endofórico
e quando é necessário recuperar na extensão do contexto, mas não vem
marcado no enunciado é denominado de exofórico (Koch, 2018a, 2018b;
Maingueneau, 1996)
Por exemplo:
VIII. Corrida pra vender cigarro
Cigarro pra vender remédio
Remédio pra curar a tosse
Tossir, cuspir, jogar pra fora
Corrida pra vender os carros
Pneu, cerveja e gasolina
Cabeça pra usar boné
E professar a fé de quem patrocina
Eles querem te vender
Eles querem te comprar
Querem te matar a sede
Eles querem te sedar
(Terceira…, 2001)
Carlos Cândido de Almeida & Mariana Vitti-Rodrigues
290
Nesse excerto, da canção Terceira do Plural (Terceira…, 2001), da
banda Engenheiros do Havai, há um cinturão semântico constituído com
a ajuda da coesão. Na primeira estrofe, a palavra que aparece no final do
verso é repetida no início do verso seguinte. Além disso, é preciso fazer
uso da catálise – fenômeno linguístico-discursivo que recupera todo um
discurso construído em outro momento através de uma palavra ou sen-
tença – para saber que se trata de produtos comercializáveis e símbolos do
capitalismo, visto que estão relacionados a negócios que giram em torno de
corridas de automóveis, em que os principais patrocinadores são empresas
de cigarro e de fármacos.
De fato, para que esse efeito exofórico seja compreendido é preciso
explorar a construção do discurso, já que as figuras são tematizadas, como
corrida, cigarro e remédio (figuras) representando os interesses capitalistas
nas propagandas (tema). Outro ponto que merece destaque na construção
do sentido, é que o enunciado apresenta, na terceira estrofe, a constante
presente do pronome pessoal eles, que devido ao fato de não ter sido men-
cionado no enunciado faz crer que se trata de uma catáfora, no entanto o
referente não aparece no enunciado ao longo da canção, deixando a inter-
pretação para os elementos discursivizados.
Por sua vez, a coerência é o cinturão semântico responsável pela cons-
tituição de uma cadeia de sentidos no plano da expressão e é responsável
por iniciar sua transição para o plano do conteúdo, ou melhor, a coerência
permite compreender a relação entre as partes do enunciado e a relação
do enunciado com o contexto, efetivando a congruência entre enunciado,
enunciação e discurso. Consoante com Koch, (2018a, p. 52) coerência é
como “[…] os elementos subjacentes à superfície textual vêm a constituir,
na mente dos interlocutores, uma configuração veiculadora de sentidos”.
Além disso, é graças à coerência que a aspectualização ganha forma e
na relação sintaxe-semântica se efetiva a isotopia. Assim, elementos como
conhecimento de mundo e partilhado, focalização, intertextualidade, as-
pectualização, relevância, consistência direcionalidade, intencionalidade,
inferência e aceitabilidade são fundamentais para que a coerência se realize.
Estudos pluridisciplinares da informação: ciência da informação, ética e linguagem - nº 3
291
Analisando o seguinte exemplo:
XIX. MAR PORTUGUÊS
Ó mar salgado, quanto do teu sal
São lágrimas de Portugal!
Por te cruzarmos, quantas mães choraram,
Quantos filhos em vão rezaram!
Quantas noivas ficaram por casar
Para que fosses nosso, ó mar!
Valeu a pena? Tudo vale a pena
Se a alma não é pequena.
Quem quer passar além do Bojador
Tem que passar além da dor.
Deus ao mar o perigo e o abismo deu,
Mas nele é que espelhou o céu. (Pessoa, 1993, p. 76)
Nesse poema do poeta português Fernando Pessoa, há uma cons-
trução semântica que efetiva a progressão temática e, por conseguinte,
a coerência. Observa-se que há a relação Mar Português com as Grandes
Navegações portuguesas dos séculos XV e XVI, isso evidencia o conheci-
mento de mundo. Inicialmente, o eu-lírico clama pelo mar, chamando-lhe
de mar salgado, na sequência questiona metaforicamente a porção de sal
que o constitui, sendo esse decorrente das lágrimas daqueles que sofreram,
sejam as mães, as noivas, os filhos, sejam os marinheiros, fator que está pre-
sente no conhecimento compartilhado.
Nessa construção do enunciado, sal conecta semanticamente às pa-
lavras mar e lágrimas, assim como o substantivo lágrimas e o verbo cho-
rar constituem um campo semântico, bem como o substantivo noivas e
o verbo casar. Na sequência, a frase passar além do Bojador faz alusão ao
Cabo da Boa Esperança, um dos primeiros lugares conquistados pela coroa
portuguesa no processo de expansão marítima. Ademais, o substantivo dor
estabelece uma relação semântica com lágrimas e, assim, a cadeia semânti-
ca frente às conquistas além-mar vai se construindo.
Somado a isso, a presença das palavras perigo e abismo constituem
uma relação de intertexto por alusão às histórias medievais de fim do mun-
Carlos Cândido de Almeida & Mariana Vitti-Rodrigues
292
do, onde havia grandes perigos e monstros marinhos nos confins do mun-
do, mais uma vez o elemento de conhecimento partilhado, além de várias
figuras, estabelecem critérios para aspectualização temática das conquistas
de Portugal, como sofrimentos e descontentamentos dos portugueses.
Por fim, como menção à vitória, a relação semântica entre Deus e
céu, propondo já no plano do conteúdo que valeu a pena passar pela dor,
pelos perigos e pelo Bojador, pois o mar é espelho do céu, uma metáfora
para demonstrar o grande alcance dos portugueses, demonstrando a inten-
cionalidade do poeta, bem como aspectos da focalização e do direciona-
mento da poesia em que retrata a dor (portugueses na condição humana),
os desafios, a coragem e as conquistas portuguesas (portugueses na condi-
ção divina, como retratado por Camões em Os Lusíadas).
Outro ponto essencial para o estudo do enunciado é a progressão
temática e como, na construção de sua tessitura, ocorre a disposição dos te-
mas e sua sequenciação. Trata-se de como a informação amplia sua referên-
cia, ou melhor, é através da progressão temática que as informações sobre
um determinado tema ampliam a potencialidade semântica desse mesmo
tema, através de outros temas, que, devido à aplicação ao tema inicial, são
chamados de remas (Van Dijk, 2019, 2020). Portanto, na terminologia
da Linguística Textual, tema é o referente da sentença, o sujeito da frase;
enquanto o rema é a informação, logo o predicado.
A relação tema e rema pode apresentar alguns modelos de construção
do enunciado, assim chamados de sequencial, de linear, de série, de espiral
e de radial. A organização do enunciado não segue uma regra fixa, mas re-
conhecer a orientação da progressão temática colabora para a identificação
dos temas, para a construção dos campos e redes semânticas, bem como
a constituição de proposições e, assim, a construção dos recortes informa-
cionais na apresentação dos conceitos, visto que o enunciado oferece, em
sua tessitura, a possibilidade de demarcação dos atributos do conceito na
apresentação das sentenças (Van Dijk, 2019).
Nesse sentido, o enunciado apresenta duas possibilidades: a) apre-
sentar recortes dos aspectos de intensividade do conceito, ou seja, conso-
ante às informações que já afetaram o produtor textual na confecção de
Estudos pluridisciplinares da informação: ciência da informação, ética e linguagem - nº 3
293
sua experiência, tal enunciado tem a função de delimitar a abrangência do
conceito conforme à necessidade informacional e ao contexto incidentes
na produção textual; b) permitir que a predicação seja instrumento para
ampliar a extensividade do conceito, ou seja, diante da percepção e dos
mecanismos de representação e mediação da realidade e da informação.
O produtor do texto diante da consolidação da experiência que se desen-
volveu frente à interação com os objetos relacionados ao tema ou figuras,
promove a tal enunciado a função de ampliar os atributos pertinentes ao
conceito, renovando sua composição como simulacro de fluxos informa-
cionais, ou seja, cenas mentais em que se é possível efetivar a compreensão
desse conceito, afetando, assim, a mente para a construção do conheci-
mento decorrente de um processo cognitivo.
Destacando a organização do enunciado, é válido afirmar que os se-
guimentos de progressão temática podem vir misturados, ou seja, como de-
pende das estratégias de construção informacional, o fato de ser sequencial,
linear, série, espiral e radial não é uma norma, porém há a possibilidade de
interferir no sentido. Diante disso, estruturalmente, uma progressão linear
apresenta um tema e uma sequência de remas; já a serial apresenta algumas
séries de conjuntos informacionais, cada qual iniciada por um tema dife-
rente, ao qual há a conexão de alguns remas; por fim, na sequência radial, a
relação tema e rema se expande, ou seja, os remas podem, nos períodos ou
parágrafos seguintes, tornarem-se temas (Van Dijk, 2019, 2020).
Observa-se o exemplo a seguir:
X. O todo sem a parte não é todo,
A parte sem o todo não é parte,
Mas se a parte o faz todo, sendo parte,
Não se diga, que é parte, sendo todo.
Em todo o sacramento está Deus todo,
E todo assiste inteiro em qualquer parte,
E feito em partes todo em toda a parte,
Em qualquer parte sempre fica o todo.
(Matos e Guerra, 2005, p. 42)
Carlos Cândido de Almeida & Mariana Vitti-Rodrigues
294
Nesse excerto do soneto barroco (Moisés, 2005, p. 42), do poeta
brasileiro Gregório de Matos e Guerra, é possível notar a aplicação de fun-
damentos da lógica para debater a relação entre todo e parte. Explorando
fundamentos da retórica, o poeta busca aplicar esses fundamentos à atua-
ção de Deus. Destacando a construção da progressão temática, observa-se
que, no primeiro verso da primeira estrofe, todo é tema, na sequência parte
e todo são remas. Já no segundo verso, inverte-se, parte é tema, enquanto
todo e parte são remas. Assim, os dois versos são apresentados em uma
progressão linear, contudo construindo uma organização serial, já que evi-
dencia a definição de cada tema.
Na sequência do soneto, nos versos três e quatro da primeira estrofe,
observa-se a distinção de parte em relação ao todo, desse modo o tema é
todo e a troca entre todo e parte constituem uma grande sequência de re-
mas. Já na segunda estrofe, há a retomada do todo para associá-lo ao tema
Deus, com isso a progressão se formata em uma estrutura radial, visto que
na sequência todo e parte formam um espiral trocando as funções de tema
e de rema na construção da informação.
Nessa abordagem, entende-se que a validação do tema no enunciado
é um mecanismo de exposição do conceito, visto que o conceito é um fe-
nômeno que envolve definições linguísticas de seus predicados e atributos
com fundamentações mentais constituintes de frames, responsáveis pela
designação do ser, de modo ontológico, como suas aplicações, sejam práti-
cas, cenas, estratégias, formas de vida, epistemas, métodos, de natureza tele-
ológica, portanto o conceito é um simulacro entre signos que atuam como
fenômenos linguísticos e signos que indicam a representação e mediação
daquilo que está na realidade, na composição do extralinguístico.
Desse modo, o enunciado é responsável pela tematização e figurati-
zação dos conceitos para que, na construção das sentenças, estabeleça-se a
isotopia e permita que os conceitos sejam discursivizados e, assim, transi-
tem da esfera da ontologia para a esfera dos argumentos, sob a qual recai os
fundamentos lógicos na construção do raciocínio.
Sendo assim, a construção do enunciado é o primeiro estágio da
evocação dos fundamentos de intensividade e extensividade do conceito
Estudos pluridisciplinares da informação: ciência da informação, ética e linguagem - nº 3
295
em princípios linguísticos para atender a necessidade decorrente dos fluxos
informacionais, os quais apenas são produzidos consoante o background
que uma mente possui sobre a linguagem e sobre a realidade para poder
efetivar o simulacro.
Assim, entre linguagem, realidade, conceito e ativação dos conhe-
cimentos para efetivar os simulacros que permitem a expressão alcançar o
conteúdo, há um contexto que, motivado pelos objetos, fenômenos, even-
tos, actantes, tempo e espaço, canaliza esse simulacro para a discursivização
e, assim, aplica diversas camadas de saberes na consolidação do conteúdo.
Antes de debater o ponto ápice da interpretação, é importante des-
tacar que contexto pode ser entendido como ambientação para localizar
ou explicar as coisas de uma realidade, ou seja, quando se busca “[…]
indicar que algum fenômeno, evento, ação ou discurso tem que ser estuda-
do em relação ao seu ambiente, isto é, com as condições e consequências
que constituem o seu entorno” (Van Dijk, 2020, p. 19), assim evidencia-
-se as características formais do contexto. Desse modo. ao efetivar que o
enunciado está ancorado na realidade e esta dialoga com um conjunto
informacional responsável pela constituição de uma cadeia de enunciados
e enunciações que permita transitar do fenomenológico para o discursivo
na construção do simbólico
Frente a isso, destaca-se o seguinte exemplo:
XI. Áporo
Um inseto cava
cava sem alarme
perfurando a terra
sem achar escape.
Que fazer, exausto,
em país bloqueado,
enlace de noite
raiz e minério?
Eis que o labirinto
(oh razão, mistério)
presto se desata:
Carlos Cândido de Almeida & Mariana Vitti-Rodrigues
296
em verde, sozinha,
antieuclidiana,
uma orquídea forma-se.
(Andrade, 2010, p. 260)
Essa poesia, do poeta brasileiro Carlos Drummond de Andrade,
apresenta um processo de construção de sentido bastante complexo.
Primeiramente, é necessário recuperar o significado do léxico áporo, o qual
pode ser sinônimo de inseto que cava a terra, uma espécie de orquídea ver-
de e, o mais usual, uma ação que requer grande desafio, de difícil solução.
De fato, essa informação é fundamental para a construção do con-
texto. Somado a isso, no primeiro verso, o inseto é apresentado; já a or-
quídea, no último; por sua vez, uma ação de difícil resolução é a própria
expressão da poesia, pois explorando os aspectos sonoros, a palavra inseto
é constituída por três sílabas: [in-se-to]. Um inseto normalmente emite
sons, os quais podem ser representados pelo som sibilar, nesse caso [se],
que na formação da palavra, já está entre outras sílabas, criando a melopeia
do inseto preso.
Não obstante, ao longo da poesia, palavras como sem, escape, fazer,
exausto, país, enlace, raiz, eis, mistério, presto, se, desata, sozinha, forma-se,
representam, no plano da expressão, o caminho que o inseto faz ao cavar
a terra, o qual ao passar pelo labirinto, palavra que por si só forma uma
melopeia, presto se desata, para que no último verso, através da palavra
forma-se, haja o surgimento de um novo ser, que se formou decorrente à
trajetória, além da presença do pronome se, posterior ao um hífen demons-
trando liberdade.
Em suma, o enunciado é fundamental para relação entre os elemen-
tos mínimos para efetivar toda a força e potencial da semântica, além de ser
no enunciado que os elementos que constituem a enunciação e o discurso
são marcados. O enunciado não deve ser confundido com o texto, pois o
texto é a junção de todos esses elementos, contudo o enunciado é a bússola
para encaminhar as estratégias de interpretação.
De fato, há muito material semântico na construção do enunciado.
Muitas vezes, o enunciado oferece quase todos os elementos, chegando a
Estudos pluridisciplinares da informação: ciência da informação, ética e linguagem - nº 3
297
ser bem próximo daquilo que será manifestante no discurso, todavia é fun-
damental evidenciar que todo desdobramento produzido no enunciado
pertence ao plano da expressão, ou seja, o plano da expressão tem muito a
oferecer em relação ao sentido, mas a significação apenas se efetiva no dis-
curso e, somente analisando o discurso, é possível verificar percursos de sig-
nificação, evolução dos signos até a semiose e, assim, alcançar o conteúdo.
É importante destacar que há muita informação oriunda do plano
da expressão, já que sua resolução explora fundamentos da imanência de
cada nível analisado, assim acessando pequenas frações do conteúdo, con-
tudo é necessário evidenciar que ainda não é o conteúdo pleno, já que no
discurso há tantas outras camadas de saberes.
4 o discurso E suas camadas informacionais: articulaçõEs dos sabErEs
para alcançar o contEúdo
O discurso é linguístico. A manifestação discursiva é decorrente da-
quilo que se efetiva no enunciado e na enunciação. A informação é mo-
delizada e já não está necessariamente vinculada aos fatores lógicos que
constituem a relação com a realidade. Ela não depende apenas da lógica
para a verificação da verdade; o discurso pressupõe a existência de um ethos
que garanta a veridicção e a fidúcia (Greimas; Fontanille, 1993).
O enunciado e a enunciação são níveis responsáveis por textualizar
os elementos responsáveis pela interação linguagem e extralinguístico. O
discurso, é bem verdade, pode se conectar a outros discursos, mas suas
marcas de conexão são viabilizadas pela construção do enunciado e da
enunciação, ou melhor, pelas marcas linguísticas que se perfazem no enun-
ciado e revelam diretrizes na enunciação (Van Dijk, 2019; Ducrot, 2020).
Sendo assim, o discurso é o nível de manifestação da informa-
ção e, assim, permite que esta seja disponibilizada para a comunicação
(Maingueneau, 1996). Frente a isso, é no discurso que os conceitos se
alinham aos outros, com isso a informação delimita sua aplicação e seus
aspectos de intensividade; por outro lado, é graças ao discurso que os as-
pectos de extensividade acontecem e se conectam a outros saberes e, assim,
Carlos Cândido de Almeida & Mariana Vitti-Rodrigues
298
a informação gera informatividade, possibilitando a interação cognitiva e a
aquisição de conhecimentos.
Além disso, o discurso permite a manifestação da retórica, enquanto
é no enunciado que se perfaz a semântica, através dos adventos da isotopia,
bem como é no enunciado que se configura a presença da lógica, pois é
nesse nível que se efetivam as proposições e as sínteses. Por sua vez, é na
enunciação que fatores da pragmática se efetuam como elementos manifes-
tantes, pois nesse nível há as marcas de dêixis, apontando os aspectos con-
dutores do ato, como actantes, espaço e tempo (Benveniste, 1999, 2014).
Além disso, na enunciação também ocorrem as marcas de catálise, pres-
supostos, implícitos e implicaturas (Grice, 1989, 2001; Van Dijk, 2019,
2020; Ducrot, 2020).
De todo modo, os níveis: enunciado, enunciação e discurso não se
manifestam de qualquer modo, visto que as marcas discursivas são respon-
sáveis pela demarcação da intencionalidade, da aspectualização, da dire-
cionalidade e da situacionalidades (Koch, 2018a; Van Dijk, 2019). Nessa
linha, o discurso se realiza sob condições de materialidade de aspectos in-
formacionais importantes para efetuar a interpretação, já que evidencia a
presença de sujeitos, que se posicionam frente a aspectos sociais, históri-
cos, culturais, políticos, ideológicos e científicos (Bakhtin, 2011, 2016;
Pêcheux, 1997). Sendo assim, o discurso é um ato único, porém suas
marcas podem ser reproduzidas por outros discursos, os quais atualizam o
conhecimento e como os objetos discursivizados afetam as mentes e con-
tribuem para a realização da semiose.
Outrossim, os discursos revelam formas de vida e, através destas, a
constituição de um ethos (Fontanille, 2019). Somado a isso, demarcam os
fluxos informacionais que representam essas formas de vida, como tam-
bém fluxos informacionais que manifestam as intencionalidades e as trocas
simbólicas, por isso os discursos são responsáveis pelo dialogismo, aspecto
que permite que interlocutores compartilhem seus conhecimentos e neces-
sidades informacionais, sob o qual há a incidência da alteridade (Bakhtin,
2011, 2016).
Estudos pluridisciplinares da informação: ciência da informação, ética e linguagem - nº 3
299
Desse modo, os discursos são demarcados por gêneros textuais, ou
gêneros de discurso (Bakhtin, 2011, 2016), que efetivam modelos sociais
de discurso, os quais são aplicados decorrente às situações de interação,
ou seja, os gêneros discursivos são a materialização das necessidades infor-
macionais posta em fluxo de troca e alcance cultural e social. Decorrente
a isso, os discursos norteiam as estratégias para interação com os sistemas
informacionais, e os gêneros discursivos são as ferramentas de interação
entre sistemas, documentos e usuários.
Frente a essas disposições, entende-se que o discurso é resultante
da relação enunciado, enunciação, sujeito, interação, alteridade (Bakhtin,
2016), necessidade informacional e disposição dos conceitos no fluxo in-
formacional. Dessa maneira, aponta-se que, para explorar aspectos de sen-
tido e significação produzidos no discurso, é preciso explorar três esferas
que o compõem, as quais serão analisadas de modo isolado para fins des-
critivos e de análise científica, no entanto, na aplicabilidade, ocorrem todas
ao mesmo momento, sem distinção de suas particularidades:
a) aspectualização figurativa e temática, em que se efetiva a congru-
ência da narratividade e as isotopias com a construção dos valores,
da intencionalidade, das manifestações interdiscursivas;
b) conexão entre os saberes, em que se recuperam os fatores inter-
discursivos, sua contribuição para a construção do sentido e da
significação, bem como a recuperação parcial ou total de sua ma-
nifestação original e contextual;
c) marcas discursivas, em que se reconhece a presença ou a ausência
de fenômenos sociais, históricos, políticos e ideológicos, por um
lado, efetiva a marcação do sujeito no ato de fala; por outro, para
que as estratégias de comunicação, viabilizada por instituições,
demarquem o poder midiático de quem está no controle.
O fenômeno linguístico da aspectualização é decorrente da cons-
trução do enunciado e da enunciação (Greimas; Fontanille, 1993). Nessa
esfera, os elementos que marcam a construção do texto são verbalizados
Carlos Cândido de Almeida & Mariana Vitti-Rodrigues
300
e, assim, atuam como condutores do plano da expressão para o plano do
conteúdo. Isso é possível porque o que reverbera no discurso está ancorado
no enunciado, com isso os conceitos oriundos da isotopia dos temas e das
figuras presentes são canalizados pelas proposições e demarcam a intencio-
nalidade dos construtos textuais.
Outro ponto importante na análise da aspectualização é o processo
simbólico, ou seja, as marcas culturais inerentes às escolhas lexicais que
compõem o enunciado, assim permitindo que se acompanhe as narra-
tivas de cunho social, político, ideológico, cultural ou científico que se
desenham consoante ao gênero discursivo adotado. Frente a isso, não é
condizente com o gênero discursivo artigo científico, que se espera uma
interlocução à base de epistemologias e metodologias, que os argumentos
presentes nos resultados apresentem uma aspectualização de cunho polí-
tico ou ideológico, pois isso afetaria a constituição do ethos e dos valores
deônticos que perfazem o gênero discursivo.
Na inter-relação da esfera de aspectualização e de conexão entre os
saberes, ocorre a interdiscursividade, bem como a interdisciplinaridade.
Nesse aspecto, as marcas da aspectualização constituídas no enunciado
e na enunciação permitem a conexão entre os diversos saberes, os quais
são necessários para tratar do tema abordado. Evidentemente, esse tipo de
abordagem sobre a constituição do discurso ocorre frente a uma análise da
complexidade (Morin, 2015), visto que um tema é abordado consoante
os elementos necessários para sua compreensão, não havendo limites da
presença das áreas do conhecimento, ou seja, os saberes são evocados con-
forme à constituição das formas de vida.
Nessa esfera, há o recorte temático, já que um texto é produtor de
vários discursos, portanto é possível interpretar vários recortes, consoante
as construções de isotopia. Isso ocorre porque os conceitos são direciona-
dos para a construção dos argumentos que representam as formas de vida e,
assim, permitem que afetem o interlocutor conforme seu conhecimento de
mundo, por isso, no processo discursivo, é possível a modelização do com-
portamento, construindo frames, que estabelecem os modelos cognitivos,
os quais ampliam a experiência e efetivam a conduta e o hábito embora
sejam oriundas de modelos sociais (Lakoff, 1998, 2018). Essa conexão de
Estudos pluridisciplinares da informação: ciência da informação, ética e linguagem - nº 3
301
saberes permite criar hipóteses, testar as informações e averiguar os resulta-
dos confrontando com os fundamentos de verdade, como recursos lógicos,
jurídicos, culturais conforme os instrumentos de veridicção e inquirição.
No entanto, essa esfera discursiva, devido à sua influência na mo-
delização cognitiva das pessoas, permite a constituição de conceitos sem
que estes sejam alinhados aos critérios de inquirição da verdade, ou seja,
por se tratar de composição discursiva, está atrelada à retórica (Pêcheux,
1997) e, por ser de natureza linguística, possibilita a criação de mundos
ficcionais, de seres imaginários, como também permite a criação de fake
news e pós-verdade.
Na transição da esfera que efetiva as camadas de saberes e modeli-
zação do comportamento para a esfera das marcas discursivas, há o pro-
cesso de institucionalização do discurso, já que valores são revigorados
por instituições públicas e privadas e muitos saberes são objetificados
para a facilitação do seu entendimento por parte da massa (Foucault,
1979, 2006, 2007, 2015; Pêcheux, 1997). A institucionalização da infor-
mação permite estratégias de manipulação, efetivando as marcas de po-
der e a presença sobreposta aos dispositivos de controle (Foucault, 1979,
2006). Esse tipo de discurso é responsável pela dominação ideológica,
pela mobilização de ações de grupos e pelo apagamento de informações
fundamentais para a compreensão do cenário em que fenômenos e even-
tos ocorrem (Pêcheux, 1997).
Essa esfera discursiva pode ser perigosa e corroborar a falta de es-
tratégias de manutenção da democracia. Há diversas ações que marcam
pequenos pontos de interesse informacional de um grupo, no entanto es-
sas ações apagam informações importantes para a compreensão do todo
(Foucault, 1979).
Essa terceira esfera do discurso quase nunca se aplica para se obter
acesso ao plano do conteúdo em sua completude como fazem as outras
duas esferas; ao contrário, essa terceira esfera discursiva se mantém devido
às estratégias indevidas de interpretação à base do plano da expressão.
Com isso, evidencia-se que o discurso é o caminho para transitar
do plano da expressão para o plano do conteúdo, visto que o processo
Carlos Cândido de Almeida & Mariana Vitti-Rodrigues
302
de discursivização é complexo, bem como é combustível para a semiose.
Entretanto, o discurso pode ser uma estratégia de subjetivação e contro-
lar corpos através das necessidades informacionais dos grupos envolvidos
(Foucault, 2007, 2015).
Assim, o ato discursivo é marcado por fragmentos do plano da ex-
pressão que não permitem ou não motivam as mentes envolvidas a bus-
carem fundamentos informacionais para compreender o processo de sig-
nificação de modo complexo. Esse tipo de discurso consolida o efeito de
sentido à base da retórica, sem critérios de verificação da verdade, ou seja,
a base deôntica não se aproxima da lógica, tampouco o processo de inqui-
rição das informações é um instrumento presente em constante na cons-
trução do conhecimento.
Em suma, embora a discursividade seja fundamental para a consti-
tuição das figuras e dos temas responsáveis pela uniformidade à isotopia,
somado ao potencial de agregar diversas camadas de saberes a fim de ativar
experiências em uma mente e, assim, gerar semioses; reconhece-se, por sua
vez, que o discurso é modelizador de comportamento devido a sua forma
enunciativa, a qual nem sempre, a depender do contexto e das interações,
vai requerer fundamentos lógicos ou estratégias de verificação da informa-
ção, visto que basta a identificação de parte de elementos simbólicos nas
formas de vida, com isso o discurso pode servir de instrumento de manipu-
lação, por conseguinte de motivações ideológicas indevidas ou apagamen-
tos de informações decorrentes da manifestação de poder.
5 considEraçõEs finais
A informação afeta a mente e, com isso, motiva essa mente a buscar
interpretar seu sentido. Esse sentido se perfaz com a organização de signos
que constituem um conjunto de aspectos semânticos para evidenciar sua
composição. Esse conjunto de signos se manifesta através do plano da ex-
pressão, o qual ganha valor devido às regras a que esses signos são submeti-
dos, por tanto há inicialmente uma gramática, especulativa ou normativa,
para organizar o significado.
Estudos pluridisciplinares da informação: ciência da informação, ética e linguagem - nº 3
303
Decorrente a essa organização dos signos, é possível haver uma ins-
trumentalização para materializar a informação em linguagem, por conse-
guinte mecanismos de interação com essa linguagem possibilitam a com-
preensão da informação.
A sistematização da informação em linguagem permite a constitui-
ção de construtos que realizam um sincretismo entre linguagem e obje-
tos, fenômenos ou eventos da realidade, assim constituindo conhecimen-
tos sobre o mundo, sistematizado em conceitos. Os conceitos, por sua
vez, através de recursos linguísticos, são compiladores de informações que
constituem os atributos das coisas do mundo representadas através da lin-
guagem, os quais promovem a mediação entre realidade e mente, como
por exemplo, através de frames.
Sendo assim, buscou-se demonstrar como os elementos mínimos da
linguagem são fundamentais para a constituição do enunciado e para a de-
marcação da enunciação. Somado a isso, também foi demonstrado como
esses fatores são fundamentais para a constituição do plano da expressão
e como este é gerador de sentido. Com isso, demonstrou-se que o plano
da expressão, através do composto semântico que lhe compõe, é capaz de
gerar sentido, já que seus componentes manifestam um conteúdo ime-
diato através da imanência do seu significado, porém, sem o processo de
discursividade, não é possível acessar o plano do conteúdo de modo pleno,
direcionado às substâncias presentes, total ou parcial.
Além disso, esta pesquisa também demonstrou que o discurso é
composto por esferas. Desse modo, evidenciou os processos que relacio-
nam discurso, enunciado e enunciação para a composição do texto. Com
isso, apresentou a necessidade de aplicação de elementos de verificação de
verdade para confirmar a legitimidade da informação. Por outro lado, tam-
bém demonstrou que uma das esferas discursivas pode gerar manipulação
da informação, e como o discurso é modelizador de comportamento, pode
comprometer a manutenção da democracia.
Carlos Cândido de Almeida & Mariana Vitti-Rodrigues
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310
311
10
DESCLASSIFICAÇÃO E
LINGUÍSTICA DECOLONIAL:
INSTRUMENTOS E
TERRITÓRIOS POSSÍVEIS
CONTRA A COLONIALIDADE
INFORMACIONAL
DECLASSIFICATION AND
DECOLONIAL LINGUISTICS:
POSSIBLE TOOLS AND TERRITORIES
AGAINST INFORMATIONAL
COLONIALITY
Marco Donizete Paulino da SILVA
UFSCar
marco_donizete@yahoo.com.br
https://orcid.org/0000-0003-1401-7180
Luciana de Souza GRACIOSO
UFSCar
luciana@ufscar.br
https://orcid.org/0000-0002-6320-4946
https://doi.org/10.36311/2025.978-65-5954-635-0.p311-336
Carlos Cândido de Almeida & Mariana Vitti-Rodrigues
312
Resumo: Compreendemos que pensar as disputas linguísticas no contexto de sistemas
linguísticos normativos (território amplificado de nossa reivindicação) exige que se
considere que tal normatização atende aos interesses relacionados aos grupos de poder que
colonizam as teias de interações sociais de maneira ostensiva – colonizar, nesse aspecto,
é utilizar a força para impor ao outro sua forma de ver o mundo. Orientando-nos, dessa
maneira, pelo objetivo geral de: realizar interação dialógica entre sedimentações teóricas
(artigos científicos) sobre os temas problematizados – considerações sobre o conceito
de Epistemografia (visando processo desclassificatório) e proposição de um processo
classificatório decolonial pela questão da Linguagem Documentária, da Ciência da
Informação, considerando comunidades identitárias na ordem LGBTQIAPN+ em suas
expressões comunicacionais situadas pelo campo de estudos da Linguística Decolonial.
Com o intuito de caracterizar a presente investigação, ela foi considerada de abordagem
exploratória, utilizando-se de método orientado por procedimentos hermenêuticos-
dialéticos, visando síntese interpretativa que possibilite identificar espaços e instrumentos
passíveis de consideração para aplicação dos temas investigados. Constituindo-se em seu
final de súmula de considerações gerais sobre percurso investigativo realizado, tendo por
fio condutor exemplificações sobre usos e silenciamentos da expressão “todes”, na ordem
da Linguagem Neutra.
Palavras-chave: Desclassificação; Epistemografia; Linguagem Documentária; Linguagem
Neutra; Decolonização.
Abstract: We understand that thinking about linguistic disputes in the context of
normative linguistic systems (amplified territory of our claim) requires us to consider
that such standardization serves the interests related to power groups that colonize
the webs of social interactions in an ostentatious way. Colonizing, in this respect,
is using force to impose on the other their way of seeing the world. In this way, we
are guided by the general objective of: conducting a dialogical interaction between
theoretical sedimentation (scientific articles) on problematized themes—considerations
on the concept of Epistemography (aiming at a declassification process) and proposing
a decolonial classification process through the issue of Documentary Language,
Information Science, considering the LGBTQIAPN+ identity communities in their
communicational expressions situated in the field of Decolonial Linguistics studies. In
order to characterize this research, which was considered to have an exploratory approach,
using a method guided by hermeneutic-dialectic procedures, an interpretative synthesis
was aimed at making it possible to identify spaces and instruments that can be considered
for the application of the themes investigated. Its final section is a summary of general
considerations about the research conducted, using as a guiding thread examples of the
use and silencing of the expression “todes”, in the context of Neutral Language.
Keywords: Declassification; Epistemography; Documentary Language; Neutral
Language; Decolonization.
Estudos pluridisciplinares da informação: ciência da informação, ética e linguagem - nº 3
313
1 introdução
Neste trabalho, a Linguagem é entendida como um campo de dispu-
tas políticas, refletindo, em sua conformação, dinâmicas contemporâneas
pelas quais os indivíduos se comunicam, tendendo a absorver formas de
interação eficientes do ponto de vista comunitário, mas também, corren-
do o risco de serem subordinados por padrões normativos, corporativos
e sistêmicos, determinados pelo detentor do poder político imanente a
cada tempo histórico e social, com variações dialógicas inerentes também
às condições éticas proporcionais ao plano democrático – com tendências
mais manipuladoras quando operadas por grupos fascistas ou ditatoriais,
como movimentos recentes da extrema direita no Brasil (Marzullo, 2023),
no período de 2018-2022, posterior ao golpe de 2016.
Aragão (1992) parafraseia dois conceitos de Jurgen Habermas
(2016a), inerentes à nossa abordagem, o de:
1) Mundo da Vida, definido como um pano de fundo que interliga
as interações cotidianas dos indivíduos como uma força vital que dinamiza
o processo comunicacional, ou seja, um:
[...] horizonte não-tematicamente dado, não questionado, em que
os participantes de comunicação se movem mutuamente, quando
se referem tematicamente a algo no mundo [...], seja este mundo
o mundo exterior natural, o mundo exterior social, ou o mundo
interior subjetivo. (Aragão, 1992, p. 45)
2) Ação Comunicativa - ou agir comunicativo - (Habermas, 2016a)
que é definido como um processo em que: “[...] os participantes da co-
municação buscam alcançar entendimento sobre uma situação: sobre seus
planos de ação, para coordená-los através de um acordo que é obtido atra-
vés de definições das situações que admitem consenso [...]” (Aragão, 1992,
p. 52).
Esses dois pressupostos são essenciais para formulação da problemá-
tica aqui abordada no contexto da Ciência da Informação, assim como de
todas as considerações resultantes de nossas ponderações acerca das dinâ-
micas informacionais na ótica de um mundo objetivo, social e subjetivo
Carlos Cândido de Almeida & Mariana Vitti-Rodrigues
314
– componentes indissociáveis do mundo da vida, e, portanto, tão diversos
quanto complexos em sua constituição.
Nessas condições, vemos a exigência de contextualização do ser hu-
mano nessas dimensões do Mundo da Vida e da Ação Comunicativa, ou
seja, admitindo-o como um agente central das dinâmicas operacionais do
processo de argumentação de pretensões de verdade sobre suas realidades,
que se dimensionam em categorias informacionais não-estanques, mas in-
terdependentes, enquanto arcabouços de uma tríade identitária: cidadão,
na esfera social (mundo social); indivíduo, na esfera objetiva (mundo obje-
tivo); e, sujeito, na esfera subjetiva (mundo subjetivo). Todas entrelaçadas
por uma noção identitária que dá unidade ao ser.
Conceitos adjacentes a essa nossa proposição orbitam em torno de
questões que dizem respeito à diversidade cultural derivada de comunida-
des, também identitárias, que se articulam comunicacionalmente por meio
de expressões que não se guiam, necessariamente, por uma lógica normati-
va padrão (orientada por uma base colonial).
Compreendemos que pensar as disputas linguísticas no contexto de
sistemas linguísticos normativos (território amplificado dessa reinvindi-
cação) exige que se considere que tal normatização atende aos interesses
relacionados aos grupos de poder que colonizam as teias de interações so-
ciais de maneira ostensiva – colonizar, nesse aspecto, é utilizar a força para
impor ao outro sua forma de ver o mundo, independente das necessidades
desse outro, aprisionando-o tanto pelos espaços quanto pelos instrumentos
linguísticos.
Habermas (2016b) aborda a noção de colonização pela ótica de um
instrumento de burocratização dos sistemas que avançam sobre as inte-
rações (mediatização) do mundo da vida, impondo formas de controles
burocráticos a ordens comunitárias que possuem ações comunicativas pró-
prias, diversificadas e vitalizantes de seu modo de existência. Nesse sentido,
a imposição se daria por um projeto de padronização extrema de formas
de vida desviantes que se mantém por meio de lastros identitários, sendo
tais lastros ignorados em favor de uma normatização sistêmica hierarqui-
camente estabelecida.
Estudos pluridisciplinares da informação: ciência da informação, ética e linguagem - nº 3
315
Nesse sentido, a resistência em manter uma forma própria de comu-
nicação (Jesus, 2012) é considerada uma ação decolonial, movida por um
processo de descolonialidade (identificação da lógica colonial que oprime),
e posteriormente, um projeto decolonial (planejamento das ações perti-
nentes para reformulação de uma revisão libertária).
Desse modo, os espaços-territórios e instrumentos focalizados em
nossa investigação se delimitam, respectivamente, pelos campos-espaços
da Biblioteconomia, Ciência da Informação (CI) e Linguística (já que tra-
tamos da Linguagem), tendo-se por instrumentos os processos de classi-
ficação (e seus Sistemas), dimensionados pela ótica de uma Linguagem
Documental (ou Linguagem Documentária) (LD) - um conceito interdis-
ciplinar tanto da Ciência da Informação quanto da Linguística, definido,
por meio de paráfrase dos autores à Gutiérrez (1998), como: “[...] um
dispositivo léxico construído artificialmente e com fins de análise e re-
cuperação de um determinado sistema de informação.” (Almeida, Farias,
Matias, 2020, p. 12)
Prosseguindo nessa intermediação, o conceito de LD será considera-
do por meio de duas noções adjacentes: 1) a de Epistemografia Interativa,
que tem por meta a desclassificação dos instrumentos da LD, por García
Gutiérrez (2006, 2013); e, 2) a de Linguística Decolonial, que objetiva
investigar temas que envolvem o desenvolvimento de críticas pós-coloniais
à Linguística, por Severo (2013, 2016, 2017) e Severo e Makoni (2023).
Consideramos que ambas as proposições avançam no sentido por
nós advogado, ou seja, de aprofundamento da questão decolonial tanto
pelo campo da Ciência da Informação quanto da Linguística, aferindo,
como objeto de discussão o conceito de Linguagem Neutra (uso de ex-
pressões do domínio comunicativo da comunidade LGBTQIAPN+ (Jesus,
2012) que se desvencilham das abordagens tradicionais (gerativismo, fun-
cionalismo e o estruturalismo) - pensando-se esse tradicional como espaço
territorial imposto pelo pensamento dominante, uma gramática situada
em domínios generalizados de comunicação social). Esses usos são inter-
pretados como direitos linguísticos dessa comunidade (Pimentel, 2023),
entendendo-se as ações coercitivas de cerceamento e tentativas de silencia-
mento dessas expressões, violações desses direitos.
Carlos Cândido de Almeida & Mariana Vitti-Rodrigues
316
De forma geral, o conceito de Direitos Linguísticos aborda questões
relacionadas à criação, aplicação e análise das normas que protegem as
línguas e, especialmente, os direitos de uso delas por parte de indivíduos
e grupos falantes, independentemente de serem minoritários ou não, vi-
sando propor mecanismos de mediação de conflitos linguísticos surgidos
das relações de poder presentes em contextos multilíngues (Abreu, 2020).
Embora não seja objetivo deste estudo avançar na discussão jurídica
sobre o assunto, considerou-se relevante consubstanciar o tema enquan-
to constituinte da relação linguística entre mundo da vida e mundo dos
sistemas, inclusive na questão do risco de uma legislação sobre expressões
de uso comunicativo (Jesus, 2012) entre agentes identificados por uma
ordem de valores comunitários (caso dos indivíduos, cidadãos e sujeitos
LGBTQIAPN+) (Pimentel, 2023). Assim, a forma expressiva Linguagem
Neutra é defendida como expressão legítima das condições identitárias de
uma comunidade linguística em processo de afirmação de suas necessida-
des objetivas, sociais e subjetivas.
Caracterizamos a presente investigação como de abordagem qualitativa
e exploratória, com uso do método hermenêutico-dialético, visando síntese
interpretativa que possibilite identificar espaços e instrumentos passíveis de
consideração para aplicação dos temas investigados, orientando-se pelo obje-
tivo geral de: realizar interação dialógica entre sedimentações teóricas (artigos
científicos) sobre os temas problematizados em torno das LDs – considerações
sobre o conceito de Epistemografia (visando processo desclassificatório) e pro-
posição de um processo classificatório decolonial considerando comunidades
identitárias na ordem LGBTQIAPN+ em suas expressões comunicacionais
(Jesus, 2012; Pimentel, 2023), situadas pelo campo de estudos da Linguística
Decolonial.
Exigindo-se, nessas condições, como objetivos específicos: anali-
sar os conceitos de Epistemografia e desclassificação pela ótica de García
Gutiérrez (2006); analisar o conceito de Linguística Decolonial pela óti-
ca de Severo (2013, 2016, 2017) e Severo e Makoni (2023); estabelecer
relações dialógicas pelas sedimentações teóricas interpretadas nessas duas
proposições e as bases interativas da comunidade LGBTQIAPN+ (Jesus,
2012; Pimentel, 2023); sintetizar bases de convergência entre as relações
Estudos pluridisciplinares da informação: ciência da informação, ética e linguagem - nº 3
317
estabelecidas nesse diálogo; e, apontar possíveis espaços e instrumentos de-
colonizadores da Ciência da Informação.
Espera-se, por meio dessa discussão, estabelecer caminhos – instru-
mentos e espaços - que possam auxiliar nos processos de decolonização dos
espaços classificatórios da Biblioteconomia e da Ciência da Informação,
promovendo a inclusão de comunidades identitárias que diversificam os
conteúdos informacionais desses dois campos teóricos-metodológicos. Tais
instrumentos e espaços-territórios serão balizados ao final desse texto em
uma súmula investigativa de considerações gerais, abordando o percurso
argumentativo realizado, e ilustrando nossas percepções por meio de exem-
plificações sobre usos e silenciamentos da expressão “todes”, na ordem da
Linguagem Neutra como esfera decolonial.
2 EpistEmografia E dEsclassificação como prinpios para as lds
Inicialmente, convém observar que nem todos os conceitos apre-
sentados por García Gutiérrez (2006, 2013) foram abordados nessa seção,
mas apenas aqueles que se tornaram basilares no recorte de nossa abor-
dagem, cabendo, portanto, o reconhecimento de uma prevalente inten-
sificação em detrimento de uma extensividade conceitual, sobretudo pela
limitação espacial dessa articulação, o que certamente pode ser amplificado
por pesquisas futuras nos âmbitos aqui abarcados.
O termo Epistemografia é definido como: “[...] uma configuração
transdisciplinar que tem como objeto a organização horizontal e interati-
va dos conhecimentos [...]” (García Gutiérrez, 2006, p. 104), resultando,
na compreensão do autor, na necessidade de desclassificação do conheci-
mento ocidental, visando expor a teia de relações de poder que silenciam
comunidades inteiras, não pertencentes aos nichos de interesse da classifi-
cação normativa, observando-se, em nota (García Gutiérrez, 2013, p. 95),
a circunstancialização do conceito como possibilidade de expansão de uma
organização plural dos conhecimentos – entendendo-se esse “plural” como
uma concepção holística do conhecimento.
Carlos Cândido de Almeida & Mariana Vitti-Rodrigues
318
Desse modo, a inserção do conceito de Epistemografia questiona
o uso do conceito de Epistemologia - no contexto de dois trabalhos aqui
considerados (García Gutiérrez, 2006, 2013) -, como um instrumento do
poder, colonizador por natureza, uma vez que abrange, administra e con-
diciona as construções de conhecimento na ótica de um território delimi-
tado pelas condições políticas de um tempo histórico, ou seja, o que não
contempla essa ótica hegemônica é excluído do arcabouço autorizado – vi-
sando o processo de manutenção/estabilização do espaço epistemológico.
Assim, a noção de centro-periferias é abordada tanto em sentido
denotativo (espaços geográficos – norte/sul, centro/periferia, etc...) quan-
to em sentidos conotativos (espaços simbólicos – categorizados como
espaços de inclusão dogmático-cognitiva em contraponto a uma cate-
goria não-dogmática (de excluídos: favelas, marginais, bueiros, esgotos,
etc...) que condicionam as estruturas classificatórias como hierarquias
dominantes-dominadoras.
A grande crítica, ao longo dos dois textos (García Gutiérrez, 2006,
2013) é o prejuízo que essa exclusão resulta, eliminando a diversidade de
vozes (e culturas) do horizonte holístico que o mundo do conhecimento
– Mundo da Vida - apresenta. Ainda que uma idealização – uma vez que
contemplar a inserção da totalidade de culturas e conhecimentos seja uma
circunstância virtual (um objetivo sempre além das realidades concretas)
-, essa ideia de inclusão é identificada pelo autor (García Gutiérrez, 2006,
2013) como uma meta eutópica (lugar presente de realização), que, em suas
palavras, é contraposta a uma meta utópica (lugar futuro de realização).
Nessa perspectiva, a busca utópica de um processo epistemológico
finalizado – um projeto sempre futuro, nunca finalizado, sempre se auto
delineando pela ideia de perfeição -, deveria ceder lugar, ou pelo menos
compartilhar esse espaço de construção, pela possibilidade de iniciativas,
realizações paralelas. Considerando-se que García Gutiérrez (2006, 2013)
não sugere a derrubada de todas as classificações, mas sim o questionamen-
to dessas estruturas por meio de “frestas” – o que ele chama de fissuras – em
que conhecimentos marginalizados ou ignorados possam ser considerados
como participantes estruturais não submissos, mas de igual valor.
Estudos pluridisciplinares da informação: ciência da informação, ética e linguagem - nº 3
319
Por essa via, a hierarquização classificatória das LDs (verticalização
estrutural em que conceitos são submetidos a uma ordem de valor epis-
têmico) deveria ser revisada em favor de uma horizontalização conceitual
em que todos os elementos da estrutura se constituíssem pela possibilidade
de presença e não pelo lugar que ocupam tradicionalmente. A disciplina
militar é utilizada pelo autor para simbolizar essa subordinação institucio-
nalizada pela tradição, pois, em sua concepção: “A epistemologia militariza
a concepção pluralista do mundo. Os conceitos seriam confinados em um
quartel, uniformizados, ordenados e submetidos a uma férrea e inquestio-
nável hierarquia.” (García Gutiérrez, 2013, p. 98, tradução nossa)1.
Se pensarmos a Ciência como um sistema colonizador e coloniza-
do – um sistema ao mesmo tempo social e orgânico - também teremos
esse comportamento defensor, aprofundado pela percepção dessa condição
sistêmica, representativa tanto para um organismo biológico quanto epis-
têmico e sociológico, pois:
[...] tanto o mundo biofísico, como o universo do conhecimento,
são produtos de Recolonização incessante. Nenhum organismo
vivo consegue erradicar as bactérias porque se o fizer, outras viriam
a colonizá-lo, e, se desfizesse de todas, ele se transformaria em pós-
orgânico, posto que as próprias bactérias são condição e sintoma
dos biossistemas. (García Gutiérrez, 2013, p. 96, tradução nossa)
Assim, a visão do autor busca conciliar sua proposta de desclassificar
mantendo o que ainda prevalece como exigência – o conteúdo – em detri-
mento da forma – a estrutura - reconfigurada. Desclassificar, nesse sentido
atribuído por Gutiérrez (2013) não despreza os avanços obtidos pela con-
dição colonizadora, hierárquica e normalizadora da Ciência – impossível
de ser desfeita, localizada no passado -, mas supõe a possibilidade de rea-
bilitação dessa estrutura pelo reconhecimento– e necessária revelação – de
Esse controle, não é uma exclusividade do espaço militar, diga-se de passagem, mas sua condição de
espaço disciplinar se estabelece no cumprimento de um habitus corporificado, que sempre é balizado pela
condecoração de quem o cumpre ou pela hostilização de quem o questiona – comportamento observado
em todo sistema de normas, mas ali radicalizado (um exemplo dessa radicalização, é a pena de morte para
casos de motim ou revolta, art. 368 do cap. 05 do Código Penal Militar. Disponível em: https://www.
planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del1001.htm).
Carlos Cândido de Almeida & Mariana Vitti-Rodrigues
320
suas frestas, dos conteúdos submersos estruturalmente no presente, um
mundo compostado, acessível por brechas, espaços intersticiais.
Dois marcos importantes são trazidos no artigo de Gutiérrez (2013),
prefixados na condição de: 1) propriedades dicotômicas da produção de
conhecimento; e, 2) postulados para o processo desclassificatório.
No que tange à propriedades dicotômicas epistemológicas, elas são
sintetizadas em quatro: 1- divisão binária do mundo em pares contrapostos
(bem/mal; masculino/feminino; leal/desleal; etc.); 2) oposição desses pares
como forças antagônicas inconciliáveis, resultando em disputa de valor ou
de submissão a normas; 3) subordinação que ordena pela condição de um
juízo de valor a cada combinação, chancelada pelo pensamento (poder)
dominante; 4) generalização e exclusão negativa que estabelece primazias e
desvantagens nesse ordenamento de classes.
Cabendo, em relação aos três postulados desclassificatórios sugeri-
dos, observá-los como propostas de promoção de uma desconstrução das
propriedades mencionadas, utilizando-se do recurso da contradição em
uma condição pós-epistemológica, sendo caracterizados pelas necessidades
de: 1) Não essencialismos, reconhecimento que a instância de determinado
conhecimento tem um regime aberto, podendo ser a apresentada, outra,
ou muitas mais além das possibilidades polihieráquicas, ou privilegiadas;
2) Estratégias de contradição em decorrência da diversa pluralidade con-
ceitual, sendo o caráter de “não-ser” também uma possibilidade nessa flu-
ência (não já soberania em “ser”); e, 3) Superposição dissolutiva, que tende
a favorecer uma superação do constructo dicotômico: ao invés do “ser ou
não ser”, a coadunação harmônica de opostos, “ser e não ser”.
3 podErEs, disputas E libErdadEs: linguística dEcolonial nos
Estudos informacionais
Os estudos informacionais são indissociáveis dos estudos da lingua-
gem. Ao longo da trajetória de ensino e pesquisa em Biblioteconomia,
Documentação e Ciência da Informação, disciplinas e linhas de pesquisas
relacionadas a diferentes correntes e movimentos linguísticos são ofereci-
Estudos pluridisciplinares da informação: ciência da informação, ética e linguagem - nº 3
321
das e estudadas. Mais recentemente, a vinculação indissociável entre a lin-
guagem-informação está ainda mais consistente, em função dos desdobra-
mentos e avanços nos usos de mediadores tecnológicos computacionais,
nos processos comunicativos de toda ordem: seja no plano do mundo da
vida, ou do mundo dos sistemas.
Frente a esse constructo, cabe a nós, agentes destes campos, acompa-
nhar e constantemente atualizar as agendas de pesquisa e desenvolvimento
de produtos e serviços de informação, para que estejam sempre alinhados
às múltiplas concepções e estruturas da linguagem, pois a sociedade se in-
forma e se comunica, via linguagem.
De modo muito consistente, linhas de investigação importantes são
seguidas no plano da construção das pesquisas em Ciência da Informação,
relacionadas à linguagem. Gatto, Martinez e Almeida (2022), por exem-
plo, sistematizaram, em boa medida, as principais variações sobre as cor-
rentes relacionadas a Linguística, que fazem parte, inclusive, das estrutu-
ras curriculares de Cursos de Biblioteconomia e Ciência da Informação,
no Brasil (o Cognitivismo, Estruturalismo, Funcionalismo, Gerativismo,
Linguística Textual, Análise do Discurso, a Semiótica, a Pragmática, dentre
outras), vertentes que, até o momento, subsidiam os estudos informacio-
nais em diferentes frentes, seja para fundamentar a construção de instru-
mentos de representação e recuperação da informação, seja para compreen-
der melhor os fenômenos envolvidos nas ações de mediação, apropriação e
uso da informação pela sociedade.
Ao mesmo tempo, temos constatado cada vez mais o quanto que
determinados modelos e estruturas desenvolvidas pela área da Ciência
da Informação, muitas vezes sustentadas por teorias linguísticas, acabam
por desconsiderar elementos que atravessam a própria linguagem e sua
construção social, interseccional e intercultural, reconhecendo, entretanto,
como grato contraponto, um conjunto de autores e autoras que se dedi-
cam a problematizar os limites das compreensões assumidas pelo campo
em relação à informação e à linguagem, considerando o impacto desta
limitação, principalmente em relação à Organização do conhecimento,
como por exemplo, Pinho e Milani (2020), que enfatizam a importân-
cia dessas abordagens pelas contribuições da Linguística, Terminologia e
Carlos Cândido de Almeida & Mariana Vitti-Rodrigues
322
Teoria Crítica, pelas quais se reforça a ausência de neutralidade na organi-
zação do conhecimento.
Neste cenário é que consideramos oportuno trazer, aos estudos in-
formacionais, mais uma perspectiva de aproximação dos estudos da lin-
guagem: o da Linguística Decolonial. Sobretudo para que seja possível ao
campo informacional considerar, em suas matrizes linguísticas, os fenô-
menos extralinguísticos (históricos, sociais, econômicos, coloniais, dentre
outros) que, por vezes, são determinantes para a constituição da própria
linguagem. Conforme observado por Ocampo González (2023, p. 1, tra-
dução nossa): “[...] as ciências da linguagem através da crítica pós-colo-
nial tornam-se um território problematizador, cuja tarefa busca interrogar
os conceitos por meio dos quais são montados seus principais objetos de
conhecimento.
A pergunta necessária a ser feita, diante desta proposta, seria en-
tão: Por que precisamos de uma Linguística Decolonial na Ciência da
Informação? Na tentativa de esboçar uma pretensa resposta, trazemos as
vozes de alguns autores decoloniais para reforçarmos os argumentos em
defesa daquilo que estamos propondo neste texto, e que diz respeito à
necessidade de aproximação da Linguística Decolonial na composição dos
estudos da linguagem em Ciência da Informação.
Mignolo (2008) nos alerta sobre a urgência em abrirmos espaços,
nos nossos discursos, para outras gramáticas, outras formas de pensar a
relação linguagem e mundo, asseverando que, caso contrário: “[...] per-
maneceremos no domínio da oposição interna aos conceitos modernos
e eurocentrados, enraizados nas categorias de conceitos gregos e latinos e
nas experiências e subjetividades formadas dessas bases, tanto teológicas
quanto seculares.” (Mignolo, 2008, p. 288).
Nesta mesma via, a filósofa boliviana, Silvia Cusiaquianqui (Utopía
ch’ixi, 2018), nos conclama a pensarmos o quanto precisamos recuperar a
potência metafórica da linguagem para repensarmos a realidade, tomando
cuidado com os dicionários, que se propuseram a expurgar toda a potência
de pensamento conceitual das línguas nativas.
Estudos pluridisciplinares da informação: ciência da informação, ética e linguagem - nº 3
323
Baseados nessas prerrogativas, defendemos a responsabilidade do
campo informacional em considerar, como parte de suas relações indisso-
ciáveis com a linguagem, a necessidade de um estreitamento teórico, me-
todológico e político, com a Linguística Decolonial, pois, tal como indica
Rocha e Megale (2023, p. 3):
O reconhecimento do caráter multimodal e multissemiótico do
processo comunicativo, bem como da intrínseca relação entre
língua nomeada, linguagem e poder, possibilitou a emergência de
perspectivas voltadas para a prática e ressaltou o caráter dinâmico,
processual, semiótico, culturalmente híbrido e axiologicamente
marcado das práticas linguísticas.
Para dar continuidade a esta proposta, nos apoiaremos, de modo
mais direcionado, aos estudos desenvolvidos pela pesquisadora Cristine
Gorski Severo, que tem por pauta temática o desenvolvimento de críticas
pós-coloniais à Linguística. Nessa perspectiva, a colonialidade é marcada
por um modelo epistemológico descritivo/explicativo, apagando percur-
sos de singularidades histórica e localmente demarcadas (Severo, 2017),
complementando-se, ainda, que o contexto europeu foi considerado como
quase único fundamento da história geral da Linguística, na qual se evi-
denciam as línguas greco-latinas e europeias.
Desse modo, a imposição linguística se torna instrumento de poder e
controle de pessoas, corpos e espíritos, durante a empreitada colonial tam-
bém da língua. Ao se modelar a fala, modela-se também o pensamento e a
ação. Segundo Severo (2017), as línguas originárias de países colonizados
foram “discursivizadas” de modo que outras relações com a linguagem fo-
ram propositadamente construídas pela imposição de outros vocabulários,
outras estruturas gramaticais, de modo que mecanismos linguísticos - es-
pecialmente utilizados para configuração de dicotomias -, foram utilizados
para promoverem relações sociais hierárquicas, diferenciações descontextu-
alizadas de corpos e gêneros, produzindo noções sobre as relações de poder.
Nesta perspectiva, o “Novo Mundo” deveria falar uma “Nova
Língua”, inferiorizando, submetendo, dominando os espaços e agentes
existentes, resultando, paradoxalmente, que essa nova maneira de falar de-
rivasse no ato de silenciar falantes discordantes. E essa discursivização au-
Carlos Cândido de Almeida & Mariana Vitti-Rodrigues
324
toritária, construída politicamente como um recurso de domesticação de
pessoas e territórios, favoreceu que as trajetórias e experiências dos povos
nativos e culturas originárias existentes se tornassem: “[...] alvo de práti-
cas colonizadoras e modernizadoras, como a cristianização, a folcloriza-
ção, a cientificização e a escolarização, cada qual com sua especificidade.
(Severo, 2016, p. 12).
Indo além dessas críticas de relações de poder entre nações, via lin-
guagem, observamos o risco de extrapolação desses contextos históricos
colonizados, reforçando-se, nos dias atuais, por diferentes eventos, dentre
eles, o hiper capitalismo e os grupos de prestígio criados a partir dele.
Severo (2013) analisou a dimensão da “Política Linguística” por uma
base foucaultiana, em que a relação entre a(s) Política(s) Linguística(s) e as
questões de poder, em sua dinâmica:
[...] não é uma variável exterior ao funcionamento das línguas, mas
seu próprio motor de constituição e circulação. A compreensão
das sutilezas desta dinâmica possibilita tanto uma ampliação dos
campos de intervenção da política e planejamento linguísticos,
como um olhar crítico sobre certas aplicações e conceitos que,
no final das contas, visam a reproduzir o status quo ou uma certa
política autoritária e legitimadora de grupos de prestígio. (Severo,
2013, p. 470).
A noção de Direitos Linguísticos, apresentada na introdução des-
te trabalho pela perspectiva de Abreu (2020), converge para um plano
de reflexão mais global, em itinerário recente da autora (Severo, Makoni,
2023), em que é sinalizada a relevância de que as línguas locais, originárias,
comuns, sejam constantemente valorizadas, repercutindo, dessa condição
de valorização, o enriquecimento holístico por meio da contribuição de
uma constituição diversa, encaminhando-nos para a construção de um
comum global”, em que povos não sejam injustiçados e excluídos, assu-
mindo-se uma perspectiva linguística de integração decolonial, com todas
as línguas tendo igual valor, devendo, portanto, serem reconhecidas tanto
em seus contextos quanto em seus usos.
Estudos pluridisciplinares da informação: ciência da informação, ética e linguagem - nº 3
325
Assim, Severo e Makoni (2023) defendem que a construção do diá-
logo intercultural é o caminho necessário, em todas as áreas, para que um
pleno e justo desenvolvimento social seja possível, o que, a nosso ver, dialo-
ga incontestavelmente com as premissas de García Gutiérrez (2006, 2013)
acerca das pretensões da Epistemografia e da Desclassificação, apresentadas
na seção anterior.
4 Espaços E fErramEntas para dEsEnvolvimEnto dEmocrático:
ciência da informação como campo colEtor
A base desse subtópico será a revisão que Carlos Alberto Ávila
Araújo (2023) realizou por meio de seu trabalho Um Mapa da Ciência da
Informação: História, Subáreas e Paradigmas, no qual se evidencia o proces-
so de construção do campo da Ciência da Informação, prevalecendo, em
nossa abordagem e recorte, a consideração sobre temas e conceitos tidos
como relevantes nos aportes teóricos trazidos até agora.
Primeiramente, parece-nos relevante, como base de articulação,
mencionar os quatro fatores principais pelos quais Araújo (2023) abor-
da a historiografia de desenvolvimento da Ciência da Informação, na
perspectiva de um campo originado da expansão conceitual e factual da
Biblioteconomia, em condições de períodos de avanço: 1) pós-custodial
(século XV-XX); 2) especializado (1909); 3) da informação científica
(1930-1950); e, 4) de tecnologias de informação [e comunicação] (ainda
em desenvolvimento pelo incremento constante dessas tecnologias).
Depois disso, Araújo (2023) fundamenta sua revisão pela divisão
desse processo em três blocos temporais (foco dessa nossa seção): 1) origem
e consolidação; 2) virada cognitiva; e, 3) virada sociocultural.
Cabendo ao período de origem e consolidação do campo (1960-
1970) o reconhecimento de três ideias centrais:
[...] de que a problemática informacional é essencialmente uma
questão de transporte, transferência de dados; de que a dinâmica
mais importante é a busca de informação e sua “entrega” aos
sujeitos; e de que os documentos circulam em sistemas (sistemas de
Carlos Cândido de Almeida & Mariana Vitti-Rodrigues
326
informação) os quais podem ser mapeados em termos de funções
e papéis dentro da sua própria lógica de funcionamento. (Araújo,
2023, p. 53)2.
A chamada Virada Cognitiva (1980-1990), que se caracterizou por
uma dinâmica orientada por outras três ideias:
[...] o conhecimento humano é cumulativo, se dá pela entrada
e processamento de novos dados; de que os sujeitos devem ser
estudados em sua dimensão mentalista, isto é, como produtores e
consumidores de dados, interagindo com sistemas de informação;
e de que os sujeitos podem ser estudados individualmente, em
seus processos de sentir falta, buscar e usar informação, para que
sistemas sejam desenhados conforme suas necessidades. (Araújo,
2023, p. 56)
Questões advindas do período de origem resultaram nas subdivisões
em campos de estudo da informação que impactaram o período de Virada
Cognitiva evoluindo, posteriormente, no período de Virada Sociocultural
(limiar do século XXI- ainda em processo) - demarcada, historicamente,
pela reflexão de superação tanto do modelo físico quanto cognitivo. Em
razão dessa convergência, e pelo nosso interesse de síntese, a análise dessas
subdivisões serão conjugadas, e se darão pela consideração dos campos de
estudos em: representação da informação, estudos de usuários da informa-
ção; e dimensão política da informação (democratização).
Na busca de sistematização, a evolução desses subcampos é apre-
sentada em um quadro interpretativo (Quadro 1), visando análise com-
parativa pelas alíneas a, b e c (apresentadas na sequência), por meio da
contraposição do estado dos subcampos de um período para o outro, con-
siderando-se nossos imperativos investigativos, já citados.
Resultantes pelas Teorias classicamente reconhecidas pelo campo: Teoria Matemática da Comunicação, de
Shannon e Weaver; e a Teoria Sistêmica.
Estudos pluridisciplinares da informação: ciência da informação, ética e linguagem - nº 3
327
Quadro 1: Contraposição de evolução de subcampos, interpretado de
Araújo (2023).
Subcampo Virada Cognitiva Virada Sociocultural
Representação da
informação - Avanço dos estudos em
linguagens de representação,
sistemas de informação, e
seus usuários
- Enfoque em tecnologias digitais;
- Consideração de novos padrões de
codificação, controle de vocabulário e
ontologias;
- Consideração de possibilidades de
inovação nos termos de descrição,
classificação e organização da informação
(organização colaborativa, classificação
facetada, etc.).
Usuários da
informação - Consideração do
comportamento de busca
informacional pelo usuário
- Ampliação de consideração do nível
individual para critérios de relevância de
comportamento coletivo
Dimensão
política da
informação
(democratização)
- Inferência de uma
responsabilidade social no
desenvolvimento nacional;
- Critérios de parametrização
internacional, resultando
hierarquização entre nações
- Abordagem do conceito de sociedade
em rede a partir de uma economia de
aprendizagem, ou pela noção de capitalismo
cognitivo
- Estudos sobre cadeias de produção
e análise de circulação, no contexto
informacional
Fonte: baseado em Araújo (2023).
a) Subcampo de eStudoS de repreSentação da informação (Quadro 1).
Desse avanço foi exigido, em um primeiro momento, que tarefas de
organização, classificação, indexação de informação, considerassem: “[...]
não apenas o escopo dos documentos concretos existentes, das fontes in-
formacionais disponíveis, mas também o âmbito dos conhecimentos exis-
tentes nos campos aos quais pertencem essas fontes.” (Araújo, 2023, p.
55), ou seja, os contextos e estruturas sócio epistemológicas seriam bases de
orientação para as práticas de classificação documental, citando-se como
instrumentos dessa abordagem: os tesauros e o sistema de Classificação
Facetada3.
Tanto o tesauro quanto a Classificação Facetada são instrumentos das LDs em que a explicitação do contexto,
ou dos universos de conhecimento, são relevantes para inserção/compreensão dos termos e conceitos que
os constituem enquanto conteúdo terminológico que representa um documento (item informacional) a ser
recuperado. Um usuário de um sistema de informação, ao buscar um tema, visando recuperação de um
item informacional, recorre ao termo ou conceito que representa o conteúdo temático deste item.
Carlos Cândido de Almeida & Mariana Vitti-Rodrigues
328
O que derivou no momento seguinte - pelo desenvolvimento de
tecnologias digitais, padrões (normatização) tanto das estruturas quanto
das formas de coleta/tratamento dos conteúdos -, questionamentos sobre
se os sistemas de organização do conhecimento contemplavam princípios
de hierarquia e níveis de representação da realidade social e comunitária
que pretendiam atender.
Um instrumento relevante desse questionamento, em relação à nos-
sa proposta, é o das folksonomias (ou indexação social) no contexto da
web – uma forma de indexação “livre” da informação (etiquetagem/tags),
constituindo-se como tentativa de inclusão do agente/usuário como prota-
gonista do processo indexador -, definindo-se pela dinâmica em que: “[...]
os próprios usuários fazem a descrição de um mesmo recurso, resultando
numa descrição intersubjetiva, realizada por meio de contratos semânti-
cos.” (Araújo, 2023, p. 59).
Também se destaca, no segundo momento, com a mesma dispo-
sição da folksonomias -, a tendência na construção de sistemas de classi-
ficação que considerem as características de comunidades interpretantes
– proposição da linha de estudos de análise de domínio -, pela noção de
comunidades discursivas, perspectiva pela qual se busca entender como
diferentes grupos [comunidades] criterizam a organização e representação
da informação, o que parece se alinhar com as bases de uma decolonização
das estruturas de representação4.
b) Subcampo de eStudoS de uSuárioS da informação (Quadro 1).
Na Virada Cognitiva, a consideração do comportamento de busca
pelo usuário tenta prever uma circunstância interna de ausência de um de-
terminado conhecimento pela ação externa da busca de uma informação, o
que parece, a nosso ver, redutível em nível individual e factual – pois, o que
se consegue, no máximo, é identificar uma informação faltante, o que não
é o mesmo que um conhecimento “incompleto”. Nesse sentido, fazendo
Noção similar, ou pelo menos baseada metodologicamente, aos estudos de garantia literária, da
Biblioteconomia.
Estudos pluridisciplinares da informação: ciência da informação, ética e linguagem - nº 3
329
interligação com nossa preleção inicial, seria definir o todo por um recorte
desse todo, ou seja, o mundo da vida por um dos seus sistemas.
A ampliação desses estudos na Virada Sociocultural supera, nas des-
crições fornecidas por Araújo (2023), aqui interpretadas, a dicotomia in-
divíduo/social – a abordagem ecológica do ambiente informacional é uma
dessas anuências, outra é a de práticas informacionais que se constituem
pela influência mútua entre cultura e indivíduo, refletidas na realidade que
os envolvem. Ou seja, considera-se como fundamental a ideia de que os
laços sociais e culturais prescrevem a observação de uma ecologia informa-
cional entre agentes e comunidades que possa contribuir na construção
dos ambientes epistemológicos eficientes no entorno de uma sócio dinâ-
mica interativa.
As práticas comunicacionais se entrelaçam com as necessidades in-
formacionais destes agentes e grupos.
c) Subcampo de eStudoS da dimenSão política da informação
(Quadro 1).
Tendo por enfoque essa dimensão política da informação, no primei-
ro período se dá, pela inferência identificada na revisão de Araújo (2023),
a contraposição entre componentes/nações - países ricos/países pobres,
desenvolvidos/em desenvolvimento, primeiro mundo/terceiro mundo -,
estabelecendo escalas de valor/lugar (hierarquias) que priorizam alguns em
detrimento de outros, dando voz aos destacados nesses podiums virtuais
estabelecidos – o nível de cognição, aqui, é responsabilizado pelo lugar
hierárquico ocupado.
Essa condição é questionada no período de Virada Sociocultural em
termos de estrutura e autonomia parcial de seus agentes – com o conceito
de rede se estabelecendo como diretriz (por isso a ideia de democratização),
destacando-se, ainda, a ideia de um regime informacional.
A epistemologia que García Gutiérrez (2006, 2013) tanto critica se
instala, a nosso ver, nessa condição de regime, conformando tanto as “con-
dições de existência” quanto os discursos e enunciações delas resultantes.
Carlos Cândido de Almeida & Mariana Vitti-Rodrigues
330
As cadeias de produção e circulação funcionam, então, como aspectos nor-
mativos ou operacionais condicionantes, sobretudo pela discussão de sua
capacidade de imersão e interação dimensionais à vida humana (sociedade,
cultura, economia, política, etc...), ou seja, em nossa acepção, o entranha-
mento/invasão entre componentes do mundo da vida e do mundo dos
sistemas se interpõem como temática necessária para a decolonização in-
formacional, pois subjazem como instrumentos de perpetuação do poder
dominante.
Sobressaem-se, por fim, na descrição de Araújo (2023), assuntos re-
lacionados à salvaguarda e acesso democráticos: “[...] registros vinculados
a processos de construção de identidades [...], inclusão de minorias e po-
pulações marginalizadas em contextos multiculturais [...] e dimensões de
poder envolvidas com a governança eletrônica [...].” (Araújo, 2023, p. 62),
convergindo com as premissas de García Gutiérrez (2006, 2013).
5 alguns apontamEntos pErtinEntEs para nossa discussão
Observa-se, então, que o preceito de direitos linguísticos é reforçado
em relação à comunidade por nós objetivada na investigação, ou seja, iden-
tificada pela sigla LGBTQIAPN+, entendendo-se que ações coercitivas de
cerceamento, ou tentativas de silenciamento de expressões comunicativas
dessa categoria, incidem em violações desses direitos - observando-se, o
caráter colonizador dessas coerções. Isto porque, ações coloniais se caracte-
rizam, no sentido aqui atribuído, pela sistemática de intervenção no modus
comunicativo da comunidade LBTQIAPN+, por não corresponderem ao
status quo padronizado, imputando a essas categorias fora da “norma” uma
inadequação irreal, pois, a realidade dessas comunidades reside na liber-
dade de se expressarem comunicacionalmente, afirmando, inclusive, por
essas expressões, sua existência.
A não binaridade reconhecida, por exemplo, no uso do termo “to-
des”, é uma adequação surgida de um reconhecimento do ser não binário,
que, enquanto cidadão, .indivíduo e sujeito, manifesta-se existente pela
própria condição de não binário, assim como, reconhecer-se pela binari-
dade se expressa pelo uso dos termos “todas e todos”, que são usados como
Estudos pluridisciplinares da informação: ciência da informação, ética e linguagem - nº 3
331
imposição do padrão linguístico normativo, como única via comunicativa
no universo colonial.
A Linguagem Neutra, espaço de existência do termo “todes”, é re-
gida, portanto, em nossa interpretação, pelo princípio afirmativo de re-
conhecimento de igualdade e direito de inclusão dessas comunidades na
ordem de um Mundo da Vida e de uma Ação Comunicativa voltada ao en-
tendimento, parametrizando-se essa defesa pelas noções de Epistemografia,
desclassificação e Linguística Decolonial, como territórios e instrumentos
informacionais passíveis de consideração no projeto de retificação do pro-
cesso de LD na Ciência da Informação (decolonização informacional).
Retomando García Gutiérrez (2013) para justificar essa consideração,
observa-se a demonstração do autor em como a linguagem determina
condições de desigualdade por meio das propriedades dicotômicas da
epistemologia tradicional, pelo uso de prefixos que “subtraem” o valor
positivo atribuído a termos raízes, exemplificando-se: “[...] in-(fiel),
des-(leal), não-(ortodoxo), a-(normal), etc.)” (García Gutiérrez, 2013,
p. 104, tradução nossa), produzindo “inadequações”, ou desvalorização
terminológica.
Nesse sentido, o termo “Todes” como referencial identitário de uma
comunidade de falantes LGBTQIAPN+ em uma estrutura normativa pa-
triarcal, em que “Todos” e “Todas” são a regra/norma de comunicação
de tratamento social tradicional e convencionalmente estabelecida entre
falantes que se substanciam pelo uso da vogal “o” ou “a”, respectivamente
para o gênero masculino e feminino, relegam quem não o faz a uma cate-
goria marginal.
A não binaridade não pode ser legislada, sendo uma liberdade deriva-
da de um direito constitucional do ser se reconhecer enquanto indivíduo,
cidadão e sujeito – considerando-se, portanto, inconstitucional a tentativa
de legislar a quebra desse protocolo - uso da vogal “e” na terminação da
raiz do termo “tod_”. Assevera-se: seu uso não constitui crime5 ou mesmo
contravenção, mas se nota, no entanto, a tentativa de condicionamento
Percebe-se a intenção de grupos reacionários a movimentos progressistas em legislar em pautas de
comportamento relacionados a costumes, sobretudo quando oferecem “riscos” à visão fundamentalista
religiosa.
Carlos Cândido de Almeida & Mariana Vitti-Rodrigues
332
constante pela sedimentação colonial da dicotomia apresentada na vida so-
cial e política, reforçando-se e se auto fortalecendo dessa pretensa dinâmica
interdependente de propriedades dicotômicas binárias como estandarte de
uma ordem patriarcal como se ela fosse uma “lei natural”.
A mesma questão, a partir dos postulados apresentados por García
Gutiérrez (2013), pode ser abordada pelo conceito de “superposição dis-
solutiva” (ser e não ser) que, interessantemente, enquadra o termo “todes
não pela via da exclusão dos termos “todas” e “todos”, podendo ser usado
em conjunto (inclusive em uma mesma oração), associando-o a uma mar-
gem de direcionamento inclusivo para além dos normativamente aceitos
pela terminologia patriarcal.
Todes são aqueles que se deixam conduzir pela identidade múltipla,
sem pertencimentos biológicos outorgados pela anatomia, pela gramática
corporativa convencional (Jesus, 2012; Pimentel, 2023), ou ainda, pelos
preconceitos estabelecidos por uma ordem conservadora reacionária.
Por fim, no tocante aos instrumentos desclassificatórios, considera-
se interessante aprofundar o estudo presente pela investigação dos graus de
assertividade dos usos de:
- Folksonomia (Indexação Social): se ela considera não só a contri-
buição das comunidades (e indivíduos) na atribuição de termos sugeridos
às listas terminológicas, mas também, a inclusão desses termos nestas listas
– ou seja, a folksonomia e indexação social precisam ouvir suas comunida-
des e deixarem que elas se reconheçam em seus produtos finais; ou,
- Mapas conceituais: por questionamentos de sua estruturação hie-
rárquica que se nutre do valor conceitual atribuído por um sistema nor-
mativo em detrimento de sua condição de termo em uso por um direito
societário, cabendo, portanto, reconhecer seus sentidos em territórios múl-
tiplos (função da especialidade de seu uso) sem induzir submissão ou ideia
de desvalorização do termo.
Para se exemplificar essa observação, voltemos ao termo “todes” con-
siderando apenas sua posição em uma estrutura classificatória. Hierárquica
e convencionalmente poderia ser classificado como um conceito alternati-
Estudos pluridisciplinares da informação: ciência da informação, ética e linguagem - nº 3
333
vo de forma de tratamento em relação aos termos “todas” e “todos” em um
mapa sobre estrutura linguística:
Formas padrão de tratamento binário
Todos, Todas.
Forma alternativa de tratamento (não binário)
Todes
Nesta concepção, a nosso ver, sua condição “alternativa” o situa em
uma relação de ordem hierárquica de uso (submetido à posição dos ter-
mos normatizados). No entanto, conservando-se a garantia de direitos de
expressão de identidades, entende-se que identidades não são formas alter-
nativas de existência, mas, sim, formas de afirmação de existência diversa,
portanto, exigem respeito igualitário na ordem civil, ainda que não corres-
pondam a um padrão normativo. Sugerindo-se, simplesmente:
Formas de tratamento diversamente inclusivas
Todos, Todas, Todes.
Nesta via, sua condição hierárquica em uma estrutura de mapa con-
ceitual não estaria subjugada a uma função alternativa, mas sim, equitati-
vamente equivalente à localização do termo Todos e Todas, os três termos
contemplando um nível de formas de tratamento de igual valor pelo crité-
rio de inclusão e diversidade.
6 considEraçõEs gErais
Retornando aos nossos objetivos, traçados na introdução deste texto,
entendemos que a interação dialógica foi alcançada pela interlocução pro-
movida pelo processo de interpretação hermenêutico-dialética entre autores
apresentados nas seções sobre Epistemografia/desclassificação e Linguística
Decolonial, sobretudo pela intersecção promovida pela seção de revisão
do processo de desenvolvimento de Ciência da Informação. Seções, estas,
conciliadas como objetivos específicos, cabendo retomar, portanto, algu-
mas considerações gerais sobre essa interação entre componentes teóricos
e metodológicos, visando um maior esclarecimento das relações desses es-
Carlos Cândido de Almeida & Mariana Vitti-Rodrigues
334
paços-territórios potencialmente epistemográficos e seus instrumentos de
promoção de uma decolonização informacional.
Concluindo-se que as disputas entre situações de colonização da lin-
guagem pela ordem de sistemas de valores patriarcais – norma sistêmica
que busca coagir, silenciar e cooptar formas de expressão da comunidade
LGBTQIAPN+ (foco de nosso estudo) - acontecem no âmbito de siste-
mas autoritários e inconstitucionais, pois tentam obstruir o direito de livre
expressão comunicacional entre pessoas de comunidades divergentes da
norma-padrão que os grupos conservadores defendem.
Cabendo salientar que a diversidade cultural é entendida como com-
ponente produtivo de uma dinâmica social saudável e inclusiva do mundo
da vida, pois garante acesso e uso de direitos de existência mútua e poten-
cialmente enriquecedores da teia societária em nível de ação comunicativa
comunitária (grupos identitários) e humana, em sua dimensão objetiva
(indivíduo), política (cidadão) e subjetiva (sujeito).
Neste sentido, defende-se que expressões da linguagem neutra não
devem ser silenciadas por sistemas com ações estratégico-normativas de
ordem conservadora ou reacionária, devendo ser, ao contrário, abrigadas
pelos sistemas de representação do conhecimento, buscando-se estimu-
lar pesquisas de desclassificação de sistemas de linguagem documentária
(LDs) de vertentes decoloniais que visem inclusão de terminologias episte-
mograficamente consolidadas.
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UTOPÍA ch’ixi. Entrevista de Silvia Rivera Cusicanqui com condução de Yael Weiss.
Produção de Revista de la Universidad de México e TV UNAM. Ciudad de México:
Revista de la Universidad de México, 2018. 1 vídeo (30 min). Publicado pelo canal TV
UNAM. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=pHJkCqe2gAk. Acesso
em: 28 set. 2023.
337
GLOSSÁRIO
Carlos Cândido de ALMEIDA
UNESP
carlos.c.almeida@unesp.br
https://orcid.org/0000-0002-8552-1029
Mariana VITTIRODRIGUES
UNESP
mvittirodrigues@gmail.com
https://orcid.org/0000-0002-4764-2575
A breve peça terminológica abaixo arrolada foi compilada e sistematizada
pelos organizadores. Para tanto, foram coletados e selecionados os prin-
cipais termos e definições elaborados pelos autores dos capítulos das co-
letâneas: “Estudos Pluridisciplinares da Informação: Filosofia, Tecnologia
e Semiótica” (Coleção Estudos em Ciência da Informação, nº 2) e
“Estudos Pluridisciplinares da Informação: Ciência da Informação, Ética e
Linguagem” (Coleção Estudos em Ciência da Informação, nº 3). O crité-
rio de pertinência dos termos incluídos na lista deu-se pela representativi-
dade da temática dos livros. Em alguns casos, os organizados do glossário
adicionaram termos e complementaram as definições. Espera-se que este
breve glossário seja útil para a compreensão dos livros supracitados e para
o estudo do tema.
https://doi.org/10.36311/2025.978-65-5954-635-0.p337-354
Carlos Cândido de Almeida & Mariana Vitti-Rodrigues
338
Abordagem interdisciplinar: Uma abordagem interdisciplinar é a colabo-
ração entre diferentes áreas para entender questões complexas, combinan-
do conhecimentos e métodos para uma visão aprofundada. Em contraste
com uma abordagem disciplinar única, essa metodologia busca combinar
conhecimentos, metodologias e perspectivas provenientes de diversas áre-
as, visando oferecer uma compreensão mais holística e abrangente de um
determinado fenômeno ou problema. O propósito é estabelecer uma siner-
gia entre os conhecimentos específicos de cada disciplina, a fim de alcançar
compreensão mais completa e integrada do assunto em análise.(Valdirene
Aparecida Pascoal e Maria Eunice Quilici Gonzalez).
Afeto: instrumento de autorregulação do bem-estar ou/e de regulação das
relações sociais de um organismo, manifestado como expressão corporifi-
cada de uma avaliação infraconsciente de informações ambientais (físicos
e cultualizados) ou/e internas ao corpo, que são valoradas de acordo com
condições e motivações contextuais do organismo, motivando expres-
sões físicas e respostas comportamentais de algum tipo. (Pedro Dolabella
Chagas).
Affordance: possibilidades de ação que o ambiente oferece para um orga-
nismo incorporado e situado. As affordances constituem e caracterizam o
modo como o organismo vive, constituindo o seu nicho, o qual expressa o
processo co-evolutivo organismo-ambiente. (Juliana Moroni).
Arqueologia do saber: Método de investigação nas Ciências Humanas,
denominado pelo por Michel Foucault de arqueologia ou método arque-
ológico. Descreve o domínio do saber por meio da prática discursiva em
uma estrutura específica ou em um campo específico. (Marta Lígia Pomim
Valentim e Augusto Júnior Macucule).
Bolha de Simplicidade: Quando uma fonte externa de fenômenos prende
o observador numa armadilha nômica dentro da qual o observador é enga-
nado (devido a fonte ser suficientemente mais complexa que o observador)
a demonstrar que uma teoria (ou modelo) é globalmente ótima, apesar
desta ser apenas localmente ótima. (Ricardo Peraça Cavassane, Felipe S.
Abrahão e Itala M. Loffredo D’Ottaviano)
Estudos pluridisciplinares da informação: ciência da informação, ética e linguagem - nº 3
339
Ciência da Informação: 1. “Ciência da Informação é a disciplina que in-
vestiga as propriedades e o comportamento informacional, as forças que
governam os fluxos de informação, e os significados do processamento da
informação, visando à acessibilidade e a usabilidade ótima. A Ciência da
Informação está preocupada com o corpo de conhecimentos relacionados
à origem, coleção, organização, armazenamento, recuperação, interpreta-
ção, transmissão, transformação, e utilização da informação. Isto inclui a
pesquisa sobre a representação da informação em ambos os sistemas, tanto
naturais quanto artificiais, o uso de códigos para a transmissão eficiente da
mensagem, bem como o estudo do processamento e de técnicas aplicadas
aos computadores e seus sistemas de programação. É uma ciência interdis-
ciplinar derivada de campos relacionados, tais como a Matemática, Lógica,
Linguística, Psicologia, Ciência da Computação, Engenharia da Produção,
Artes Gráficas, Comunicação, Biblioteconomia, Administração, e outros
campos científicos semelhantes. Têm ambos componentes, de ciência pura
visto que investiga seu objeto sem considerar sua aplicação, e um compo-
nente de ciência aplicada, visto que desenvolve serviços e produtos.” (Borko,
1968, p. 3). (Elaborado por Marta Lígia Pomim Valentim e Augusto Júnior
Macucule). 2. De modo geral, cabe à ciência da informação (i) “a análise dos
processos de construção, comunicação e uso da informação” e (ii) “a concep-
ção dos produtos e sistemas que permitem sua construção, comunicação,
armazenamento e uso.” (Le Coadic, 1996, p. 26).
Codificação Neural: A codificação neural descreve o estudo do processa-
mento das informações através dos neurônios. O objetivo desses estudos é
qual tipo de informação é utilizada e como a informação é transformada à
medida que passa de uma fase de processamento para outra. O campo da
codificação neural procura sintetizar as informações provenientes de vários
níveis de análise e explicar como o comportamento integrado surge da ati-
vidade cooperativa de populações de neurônios formando assembleias no
cérebro. (Diogo Fernando Massmann).
Codificação: representação dos caracteres ou símbolos constituintes de
uma mensagem ou um evento utilizando-se um outro alfabeto de símbo-
los mais conveniente e com palavra de código pré-especificada. (João E.
Kogler Jr.).
Carlos Cândido de Almeida & Mariana Vitti-Rodrigues
340
Competência em informação: conjunto de habilidades que demanda dos
indivíduos a capacidade de reconhecer quando a informação é necessária e
ter a competência de localizar, avaliar e utilizar as informações necessárias
de maneira eficaz. (Maria Lívia Pacheco de Oliveira).
Complexidade: Coexistência dos contrários no sistema. (Marivalde
Moacir Francelin). Um sistema complexo pode ser definido como um
conjunto de objetos interdependentes, o que implica que a modificação ou
retirada de qualquer objeto pertencente ao sistema afeta as propriedades do
mesmo (Bresciani, 2013). (Mariana Vitti-Rodrigues)
Compreensão de um termo: A compreensão é formada pelas caracte-
rísticas, qualidades ou formas que são relativas a um termo. No caso do
exemplo do termo homem, a compreensão de homem seria formada por
animal, racional, bípede etc. (Alexandre Augusto Ferraz).
Comunicação: Qualquer procedimento pelo qual uma mente afeta outra
mente. Além da fala escrita e oral, a comunicação envolve música, artes
pictóricas, teatro, balé e, de fato, todo comportamento humano. Em algu-
mas situações pode ser desejável usar uma definição mais ampla de comu-
nicação. Tal definição envolveria procedimentos por meio dos quais um
mecanismo (por exemplo um equipamento automático para rastrear um
aeroplano e computar suas prováveis posições futuras) afeta outro mecanis-
mo (por exemplo um míssil guiado perseguindo este aeroplano). (Marcos
Antonio Alves).
Criatividade: caracteriza-se como um processo gerativo de estruturas ori-
ginais, por meio da combinação, exploração, ou transformação de um es-
paço conceitual vigente, cujo resultado possui algum tipo de valor (Runco
e Jaeger 2012; Boden 1996). Boden (1999, p.76) distingue dois tipos de
criatividade: P-Criativa e H-Criativa: “uma ideia valiosa é P-Criativa se a
pessoa em cuja mente a ideia surgiu não poderia já ter tido a mesma ideia.
Por contraste, uma ideia valiosa é H-Criativa se esta ideia for P-Criativa e
ninguém mais, em toda história humana, já teve esta ideia antes.” (Mariana
Vitti-Rodrigues).
Estudos pluridisciplinares da informação: ciência da informação, ética e linguagem - nº 3
341
Dado: “Dado é qualquer elemento identificado em sua forma bruta que,
por si, não conduz a uma compreensão de determinado fato ou situação
(OLIVEIRA, p. 275, 276, 2004).
Decodificação: processo inverso ao da codificação, de restituir à sua forma
original uma mensagem codificada. (João E. Kogler Jr.).
Desinformação: Informação deliberadamente criada com o intuito
de ludibriar, enganar, contradizer e confundir. (Maria Lívia Pacheco de
Oliveira).
Desordem da informação: conjunto de múltiplas transgressões do uso
da informação, de modo que esta se torne divergente da informação con-
siderada como legítima e verdadeira, com base na história, nos fatos, no
contexto e na ciência. (Maria Lívia Pacheco de Oliveira).
Dicisigno: um signo duplo composto por um ícone e um índice remático
estruturados por uma sintaxe que gera um interpretante de existência, i.e.,
uma afirmação que reivindica que a estrutura representada pela colocaliza-
ção entre ícone e índice espelha um fato (que é o objeto do signo-veículo
que o representa por descrição e referência).(Mariana Vitti-Rodrigues).
Documento: “O documento é um valor informacional que se atribui ao
objeto, ou seja, é o produto da significação ou da função atribuída a uma
coisa institucionalizada num determinado contexto. A materialidade do
documento é ulterior à fisicalidade da informação num suporte. Todo do-
cumento: (a) representa algo e pode ser representado; (b) é uma expressão
simbólica de poder/saber.” (Rabello, 2019, p. 25). (Rodrigo Rabello).
Entropia de Shannon: valor médio da quantidade de informação de um
conjunto de mensagens ou eventos. (João E. Kogler Jr.).
Entropia: Medida da incerteza de uma variável randômica. Trata-se da
medida da desordem. Quanto mais desordenada uma fonte, maior a sua
quantidade de entropia. A entropia está em proporção inversa à ordem.
(Marcos Antonio Alves).
Carlos Cândido de Almeida & Mariana Vitti-Rodrigues
342
Epistemologia histórica da Ciência da Informação: teorias do conhe-
cimento baseadas na historicidade local, contextual e dialética de mani-
festação da pluralidade e da horizontalidade de teorias, de métodos, de
conceitos e de práxis co-constituídos por pessoas pesquisadoras de, em e
para Ciência da Informação. (Gustavo Silva Saldanha).
Decolonialidade biblioteconômico-informacional: perspectiva episte-
mológica tecida do local para o global via a compreensão de construtos
teórico-metodológicos em Ciência da Informação como parte da dialéti-
ca do colonialismo epistêmico, fruto dos processos econômico-políticos
de formação da cientificidade moderna de origem europeia e americana.
(Gustavo Silva Saldanha).
Epistemicídio biblioteconômico-informacional: fundamento do massa-
cre de saberes a partir do uso de teorias e de conceitos, de métodos e téc-
nicas oriundas do pensamento biblioteconômico-informacional hegemôn-
nico para exploração e para extinção de epistemologias locais. (Gustavo
Silva Saldanha).
Estrutura Intelectual: Refere-se à organização das capacidades cognitivas
e mentais de um indivíduo ou grupo, que influenciam a maneira de pen-
sar, processar informações, tomar decisões e compreender o mundo ao seu
redor. (Marta Lígia Pomim Valentim e Augusto Júnior Macucule).
Ética Informacional: área filosófico-interdisciplinar que visa refletir sobre
questões éticas relacionadas aos impactos da inserção de tecnologias digi-
tais na vida cotidiana. Conforme Moraes (2019), a ética informacional é
uma extensão de um subsistema de princípios morais de um sistema ético
tradicional. A Ética Informacional pode ser analisada como constituída a
partir de alguns princípios morais de teorias éticas tradicionais, mas que
pode também apresentar novos princípios para avaliar moralmente as pos-
sibilidades de ação que surgem da relação entre os indivíduos e as tecnolo-
gias digitais. (João Antonio de Moraes e Rafael Rodrigues Testa).
Extensão de um termo: A extensão de um termo é definida como a tota-
lidade de objetos reais que se aplicam a um termo. Um dos exemplos que
podemos encontrar no texto de Peirce (1982, p. 272-286) é em relação ao
Estudos pluridisciplinares da informação: ciência da informação, ética e linguagem - nº 3
343
termo homem. A extensão deste termo é composta por todos os homens
que conhecemos, incluindo os possíveis (passados e futuros). (Alexandre
Augusto Ferraz).
Fake news: Tipo de desinformação geralmente estruturada em um simu-
lacro de informação jornalística, como as notícias. (Maria Lívia Pacheco
de Oliveira).
Ficção: ato de poiesis autoral que produz um “mundo possível”, entendido
como um quadro, situação ou enredo a priori não limitado por proprie-
dades do mundo real, habitado por entes selecionados ou inventados no
próprio processo de construção de mundo, regrado por modalidades de
existência e ação internas a ele mesmo, e que, na interface com o públi-
co, indica pragmaticamente a sua própria condição de invenção. (Pedro
Dolabella Chagas).
Filosofia da Informação: Analisa o conceito de informação a partir de
uma perspectiva histórica e sistemática, tendo surgido a partir do cres-
cente interesse da noção de informação nas humanidades, e, em especial,
em diferentes áreas da Filosofia, como lógica, ética, estética e ontologia
(Adriaans 2024). Filósofos da informação buscam investigar a relação en-
tre informação e verdade, informação e dados, informação, significado e
conhecimento, fake News, dentre outros temas. Além de interesses sobre
as consequências éticas do crescente uso de tecnologias da informação e da
comunicação para a ciência e sociedade.
Fisicalidade da informação: “Corresponde às propriedades físicas do ob-
jeto-suporte de informação que permite sua existência no espaço e no tem-
po.” (Rabello, 2019, p. 24). É o pressuposto do conceito de informação
registrada.
Forma: (i) Possui o “ser de predicado” (Peirce, 1998, p. 544); (ii) É uma
disposição; um real potencial (Peirce, 1998, p. 388). No item (ii) forma
pode ser vista como uma proposição condicional, em seu sentido pragmáti-
co, afirmando que algumas coisas sob determinadas condições funcionarão
de determinada maneira – trata-se do próprio hábito que está incorporado
no objeto (Peirce, 1998, p. 544) e que pode ser representado mediante
Carlos Cândido de Almeida & Mariana Vitti-Rodrigues
344
um símbolo ou um conceito (hábito mental). Peirce segue a via media na
qual “forma” tem ambos os caracteres de primeiridade e de terceiridade
(Emmeche; Queiroz; El-hani, 2010, p. 641). (Alexandre Augusto Ferraz).
Ícone: “[...] é um signo que se refere ao objeto que denota por meio de seus
próprios caracteres” (Peirce, CP 2.247, 1903, tradução nossa). (Mariana
Vitti-Rodrigues).
Identidade de gênero: Gênero com o qual uma pessoa se identifica, que
pode ou não concordar com o gênero que lhe foi atribuído quando de
seu nascimento. Diferente da sexualidade da pessoa. Identidade de gêne-
ro e orientação sexual são dimensões diferentes e que não se confundem.
Pessoas transexuais podem ser heterossexuais, lésbicas, gays ou bissexuais,
tanto quanto as pessoas cisgênero. (JESUS, 2012, p. 24). (Marco Donizete
Paulino da Silva e Luciana de Souza Gracioso).
Imaginação: agenciamento de conteúdos mentais, substâncias físicas e/ou
capacidades corporais em ações e/ou produtos imprevistas, cujas funções
serão integradas aos contextos de experiência, produção, juízo e ação em
que ela acontece, podendo gerar resultados momentâneos ou de longa sub-
sistência no tempo. (Pedro Dolabella Chagas).
Índice: é um signo “[…] que se refere ao objeto que denota por meio de
ser realmente afetado por este objeto”, como pegadas na areia (Peirce CP
2.248, 1903, tradução nossa). (Mariana Vitti-Rodrigues).
Informação (Etimologia): 1. derivada da palavra latina informare, cujo
significado é dar forma (Capurro 2009). 2. o que dá forma, unidade de
sentido. (Marivalde Moacir Francelin).
Informação (Ciência da Informação): No contexto da Ciência da
Informação, informação é gerada por seres humanos e para seres hu-
manos, dependendo de uma forma de registro que possibilita sua per-
manência no tempo e no espaço. De acordo com Le Coadic (1996,
p.5), “informação comporta um elemento de sentido. É um significado
transmitido a um ser consciente por meio de uma mensagem inscrita em
um suporte espacial-temporal: impresso, sinal elétrico, onda sonora, etc.
Estudos pluridisciplinares da informação: ciência da informação, ética e linguagem - nº 3
345
Essa inscrição é feita graças a um sistema de signos (linguagem), signo
este que é um elemento da linguagem que associa um significante a um
significado”.
Informação (Teoria Matemática da Comunicação): Medida da liberda-
de de escolha quando se seleciona uma mensagem. Relaciona-se não ao
que realmente se diz, mas ao que se poderia dizer. Nessa perspectiva, só
pode haver informação onde há dúvida e dúvida implica na existência de
alternativas – donde escolha, seleção, discriminação”. (Marcos Antonio
Alves).
Informação (Teoria Peirceana): 1. Lógico-Proposicional: O total de sím-
bolos traduzidos que são medidos pelo quanto de compreensão o termo
tem além do que é necessário para limitar sua extensão (Peirce, 1982, p.
287). (Alexandre Augusto Ferraz). 2. Semiótica: “o processo de comu-
nicação da forma disponível no objeto por meio da constituição de um
dicisigno formado pela colocalização entre índice-ícone” (Vitti-Rodrigues;
Emmeche, 2017, p. 300, tradução nossa). 3. Grafos Existenciais: uma
abordagem diagramática da informação por meio do estudo da lógica das
relações em que a atribuição de necessidade e possibilidade às proposições
é concebida de acordo com um dado estado de informação (Silveira 2008).
Informação ecológica: informação prenhe de significado, disponível no
ambiente para ser captada diretamente. Conjunto de invariantes que emer-
gem de processos auto-organizados, ajustando-se, propiciando a instancia-
ção de significado (Juliana Moroni).
Internet: caracteriza-se como uma estrutura topológica distribuída e se
caracteriza como uma rede livre-de-escala. Considerando seu propósito
inicial de constituir um sistema de comunicação militar, preocupou-se
que a internet possuísse uma estrutura que não fosse vulnerável a possíveis
inimigos. Paul Baran, responsável por desenvolver o projeto, a construiu
com uma estrutura distribuída, similar ao sistema de rodovias, de modo a
ser redundante o bastante para que, mesmo com a queda de qualquer nó,
outros caminhos alternativos fossem possíveis para a conexão entre os nós
restantes. Barabási (2002, p. 145) faz a seguinte consideração: “embora
Carlos Cândido de Almeida & Mariana Vitti-Rodrigues
346
tenha sido construída pelo homem [...], a internet está mais próxima de
um ecossistema do que de um relógio suíço”. (João Antonio de Moraes e
Rafael Rodrigues Testa).
Interpretante: Um signo, ou representamen, é aquilo que, sob certo aspec-
to ou modo, representa algo para alguém. Dirige-se a alguém, isto é, cria,
na mente dessa pessoa, um signo equivalente, ou talvez um signo mais
desenvolvido. Ao signo assim criado denomino interpretante do primeiro
signo. O signo representa alguma coisa, seu objeto. Representa esse obje-
to não em todos os seus aspectos, mas com referência a um tipo de ideia
de que eu, por vezes, denominei fundamento do representamen (Peirce,
1960a, p. 135, grifos do autor); “[...] informação é o tipo de interpretante
no qual símbolos são traduzidos em novos e mais desenvolvidos símbolos.
(Nöth, 2013, p. 145). (Alexandre Augusto Ferraz).
Invariante: padrões informacionais que apresentam constância no pro-
cesso de dinamicidade da relação organismo-ambiente. As invariantes são
classificadas por Gibson (1986) em estruturais, isto é, propriedades que
permanecem constantes em meio a alterações no ambiente, e transforma-
cionais, isto é, padrões de mudança que permanecem constantes, possi-
bilitando a identificação da ação dos organismos no ambiente. (Juliana
Moroni).
Leitura: processo cognitivo que parte da visão sequencial dos símbolos lin-
guísticos grafados no papel para articulá-los semioticamente nas unidades
maiores de significado, que substanciam tanto a compreensão, interpreta-
ção e valoração de conteúdos processados como intenções de comunicação
do texto, quanto as experiências qualitativas relativas à imaginação, enação
e afetivização emergentes na relação estabelecida pelo leitor com aqueles
conteúdos. (Pedro Dolabella Chagas).
LGBTQIAPN+: Sigla que contempla a inclusão das identidades de gê-
nero em sua diversidade de expressões, representadas na sigla pelos ter-
mos de Lésbica; Gays; Bissexuais; Transexuais; Queer; Intersexo; Assexual;
Pansexual; Não-binário, mais o sinal (+) para indicar ampliação/adição de
outros agentes reconhecidos nesse movimento, compondo uma pauta po-
Estudos pluridisciplinares da informação: ciência da informação, ética e linguagem - nº 3
347
lítica de reconhecimento de direitos civis e de inclusão pelas iniciais que
compõem a sigla, uma diversidade de identidades de gêneros dentro de
uma diversidade de indivíduos e classes sociais. (Pimentel, 2023). (Marco
Donizete Paulino da Silva e Luciana de Souza Gracioso).
Linguística Decolonial: Linguística Decolonial é uma proposta crítica
que tem sido desenvolvida no campo da linguística, e que possui uma
abordagem interdisciplinar pois envolve estudos de áreas como antropo-
logia, sociologia, estudos culturais, comunicacionais e informacionais. Tal
abordagem se propõe a questionar as narrativas dominantes que têm per-
petuado a desvalorização de determinadas línguas e culturas e, nesse senti-
do, problematiza as normas linguísticas e os sistemas de conhecimento que
foram historicamente dominados por perspectivas eurocêntricas. Portanto,
busca analisar e problematizar as influências do colonialismo no estudo e
na compreensão das línguas e das práticas linguísticas. Seu objetivo cen-
tral é ampliar o espaço de expressão das línguas e perspectivas que his-
toricamente foram marginalizadas, promovendo, assim, a valorização da
diversidade linguística e cultural. (SEVERO; MARKONI, 2022). (Marco
Donizete Paulino da Silva e Luciana de Souza Gracioso).
Materialidade da informação: Manifesta-se nos enunciados, sejam eles
registrados ou não. Corresponde a dimensões epistêmica, política e ética da
informação. Alcança maior perenidade e força com o processo de inscrição.
Compõe e está composta em redes ou regimes de relações. A materialidade
da informação, em tais redes, é operacionalizada em práticas orientadas
por determinados modos de institucionalidade. (Rodrigo Rabello).
Mensagem: objeto essencial da comunicação entre um emissor e um des-
tinatário, composto por um arranjo sequencial ou espacial ordenado de
elementos oriundos do alfabeto da linguagem utilizada na comunicação.
(João E. Kogler Jr.).
Modos de institucionalidade: Correspondem a configurações de redes
sociotécnicas em suas variadas manifestações. Eles se apresentam em ao
menos três disposições ou enfoques: formal, semiformal e informal. Tais
modos estabelecem ou podem estabelecer relações entre si, algo que indica
Carlos Cândido de Almeida & Mariana Vitti-Rodrigues
348
o seu caráter situacional, temporário e transitório. Orientam as práticas
dos atores responsáveis pela circulação, perenidade e força da materialidade
dos enunciados. (Rodrigo Rabello).
Nicho: parte do ambiente na qual os organismos deixam suas marcas; ele
delimita a identidade do organismo no seu processo coevolutivo com o
ambiente. Expressa a relação dinâmica organismo-ambiente. Nessa relação
dinâmica, no processo coevolutivo, segundo Schmidt (2007), elementos
naturais e socioculturais estão interligados, propiciando informações para
que o organismo direcione suas ações.. (Juliana Moroni).
Objetos: coisas, acontecimentos e fenômenos (in)formados. (Marivalde
Moacir Francelin).
Ordem: Definida a partir da distribuição da probabilidade dos eventos
de uma fonte. Uma fonte totalmente desordenada é aquela cujos eventos
ou mensagens possuem a mesma probabilidade de ocorrência. Já a ordem
máxima ocorre quando um evento possui probabilidade absoluta de ocor-
rência. Quanto mais díspares forem as probabilidades de ocorrência dos
eventos, mais ordenada é a fonte. (Marcos Antonio Alves).
Palavra de código: cadeia de símbolos usados na codificação para repre-
sentar os caracteres ou símbolos originais de uma mensagem. (João E.
Kogler Jr.).
Paradoxo dos Big Data: Trata-se da contradição entre a expectativa de
que, quanto maior a quantidade de dados analisados, maior a chance de
encontrar correlações não-espúrias; e a realidade de que, quanto maior a
quantidade de dados analisados, maior a ocorrência de correlações espú-
rias que podem, inclusive, atrapalhar na detecção de correlações não-espú-
rias que possam eventualmente estar presentes nos dados. (Ricardo Peraça
Cavassane, Felipe S. Abrahão e Itala M. Loffredo D’Ottaviano)
Pensamento: articulação de sentidos e juízos em torno de questões sobre
unidades e contrários. (Marivalde Moacir Francelin).
Percepção direta: não envolve inferências, proposições e representações
mentais. Dinâmica, contínua e panorâmica, a percepção direta capta in-
Estudos pluridisciplinares da informação: ciência da informação, ética e linguagem - nº 3
349
formação do ambiente, sem a necessidade da mediação de representações
mentais. (Juliana Moroni).
Pragmática: qualquer processo empírico de comunicação linguística, em
que enunciados orais ou escritos produzem reações em ouvintes ou leito-
res a partir de conteúdos ostensivamente codificados neles mesmos, ou de
conteúdos inferidos pelos destinatários (indutiva, dedutiva ou abdutiva-
mente), em atendimento ou não às intenções do escritor ou falante. (Pedro
Dolabella Chagas).
Processamento Informacional: O processamento informacional é defi-
nido de acordo com a natureza da informação e o tipo de instância de
processamento. Aqui, neste texto, o leitor vai encontrar referência à in-
formação natural e aos processamentos recorrente e global de informação.
A informação natural é transmitida em um meio material e ecológico de
um emissor à um receptor, podendo ser um sistema orgânico ou artificial.
Os processamentos recorrente e global ocorrem no contexto neural, mas
o primeiro depende de loops feedforward–feedback de atividade em áreas
primárias no cérebro, enquanto que, o segundo é caracterizado por proces-
samento, primeiramente, paralelo e distribuído, multimodal e heteromo-
dal, mas depois é predominantemente localizado em áreas pré-frontais e é
serial. (Diogo Fernando Massmann).
Processo: apesar de ser um termo complexo, pode-se caracterizar um pro-
cesso como um conjunto ordenado de itens. Processos podem ser tanto
discretos, como uma sequência de eventos; ou contínuos, em termos de
fluxo. A característica comum a todos os processos é a relação entre o tem-
po e ordenação dos elementos presentes em um determinado processo. Em
síntese, “processos são tipicamente utilizados para representar as mudanças
que ocorrem no mundo real, ao longo do tempo, em diferentes escopos
(Gudwin, este livro – elaboração Mariana Vitti-Rodrigues).
Realismo: pode ser caracterizado, de forma abrangente, como uma cor-
rente filosófica que afirma a existência de fenômenos independentes de
nossas crenças, vontades, pensamentos, e visões de mundo. Há vários tipos
de realismos que exploram diferentes questões e perspectivas. Por exem-
Carlos Cândido de Almeida & Mariana Vitti-Rodrigues
350
plo, na defesa da existência de objetos inobserváveis, ou da realidade dos
universais, na afirmação que gerais possuem um estatuto independente da
coleção de objetos particulares. (Mariana Vitti-Rodrigues)
Racismo ambiental: O termo cunhado, no início dos anos 80, por
Benjamin Franklin Chavis Jr., líder afro-americano da luta pelos direitos
civis nos Estados Unidos. Através de manifestações da população negra
norte-americana, exigia-se justiça ambiental, na medida em que a distri-
buição dos impactos ambientais negativos como a poluição do ar, con-
taminação da água de rios e solo recaia majoritariamente na população
historicamente marginalizada, vulnerabilizada, invisibilizada e silenciada.
(Dias, 2023). (Juliana Moroni)
Reciprocidade: troca de informação entre organismo e ambiente, no qual
ambos estão intrinsecamente interconectados, formando uma unidade. A
reciprocidade indica a inseparabilidade entre organismo-ambiente, bem
como as implicações recíprocas das ações de um no outro. Segundo Large
(2003), na concepção ecológica nada existe em isolamento, na medida em
que o ambiente é considerado como um todo, com estruturas entrelaçadas
(nesting), as quais expressam o dinamismo que permeia as relações de reci-
procidade entre organismos e ambiente. A reciprocidade é essencial para a
construção do nicho e percepção de affordances. (Juliana Moroni).
Redes sociais on-line: se caracterizam como uma “estrutura dinâmica e
complexa formada por pessoas com valores e/ou objetivos em comum,
interligadas de forma horizontal e predominantemente descentralizada
(SOUZA; QUANDT, 2008, p. 32). Nelas os usuários preenchem seus
perfis com uma grande variedade de informações pessoais. Outro fator
importante a ser considerado no uso de tais redes sociais via aplicativos é
estar na “palma da mão”, o que facilita a inserção de informação de forma
“imediata”, “espontânea” e “em tempo real”, se tornando um hábito com
o passar do tempo. (João Antonio de Moraes e Rafael Rodrigues Testa).
Relação triádica: A relação triádica é um modelo descritivo que delineia
a interação entre três entidades distintas. Esta configuração específica é
caracterizada pela interdependência entre três elementos ou indivíduos,
Estudos pluridisciplinares da informação: ciência da informação, ética e linguagem - nº 3
351
cada um conectado aos outros dois de maneira singular e determinante.
Tal estrutura triádica é observada em uma variedade de contextos, incluin-
do interações sociais, processos comunicativos, sistemas complexos e até
mesmo na estruturação de sistemas de pensamento filosófico. Na teoria
semiótica de Charles Sanders Peirce, por exemplo, a relação triádica é fun-
damental, abrangendo um signo (representação), um objeto (aquilo que
o signo representa) e um interpretante (a interpretação ou efeito do signo
sobre um intérprete). (Valdirene Aparecida Pascoal e Maria Eunice Quilici
Gonzalez).
Relativismo: pode ser definido, em geral, como uma corrente filosófica em
que a atribuição de verdade, valor ou significado a proposições ou crenças
depende do contexto em que determinadas asserções são feitas. Há vários
tipos de relativismo, os que reivindicam uma atenuação da atribuição de
verdade e falsidade no contexto geral, ou relativismos que focam em aspec-
tos específicos como, por exemplo, o realismo conceitual, histórico, moral,
epistêmico, conceitual (Rios 2021). (Mariana Vitti-Rodrigues)
Representações Mentais: A definição de representação mental não remete
para algo abstrato, mas se baseia no discurso neurocientífico recente que
relaciona a definição com a codificação neural e o processamento infor-
macional. Isso apontou para certos desafios na forma de como os termos
representação” e “código”, neural e informacional, são comumente usa-
dos na neurociência. Nesse sentido, a “representação mental” pode estar
correlacionada com o conteúdo que ela representa, pode ter uma função
causal no organismo, como efeitos sobre o controle cognitivo do compor-
tamento, e pode representar um objetivo ou propósito que serve ao com-
portamento. Em todos esses casos, a representação resulta da codificação e
processamento no cérebro, mesmo que, em introspecção, a sua dinâmica
temporal pareça outra. (Diogo Fernando Massmann).
Semiose: “[…] uma ação, ou influência, que é, ou envolve, uma coopera-
ção entre três elementos, como um signo, seu objeto, e seu interpretante,
esta influência trivalente não sendo de forma alguma redutíveis a ações en-
tre pares” (Peirce, 1998, p. 411, EP2.411/1907, tradução nossa).(Mariana
Vitti-Rodrigues).
Carlos Cândido de Almeida & Mariana Vitti-Rodrigues
352
Signo: uma relação indissociável entre três correlatos que cumprem três
funções lógicas distintas, objeto do signo que determina o signo-veículo
que, por sua vez, determina o interpretante do signo ou signo mais desen-
volvido. Signo também pode ser caracterizado como um meio para a co-
municação de uma forma (Peirce, 1998, p. 544, EP2:544/1909). (Mariana
Vitti-Rodrigues).
Símbolo: Um símbolo é um Representamen cujo caráter representativo
consiste exatamente em ser uma regra que determinará seu Interpretante
(Peirce, 1960a, p. 165). (Alexandre Augusto Ferraz).
Sistemas: 1. Estruturas que conformam modelos (Marivalde Moacir
Francelin). 2. “um sistema é uma estrutura cujos elementos exercem
funções (atividades); é uma estrutura em funcionamento, caracterizando-
se, portanto, como uma estrutura com funcionalidade.” (D’Ottaviano e
Bresciani, 2004, p. 6).
Sociedade da Informação: há uma diversidade de definições acerca da
expressão sociedade da informação. Conforme Webster (2006), cada uma
delas é desenvolvida com um enfoque num cenário específico, mas com-
partilham do pressuposto segundo o qual a informação está produzindo
alterações quantitativas na dinâmica dos indivíduos, promovendo também
um tipo de organização social qualitativamente nova. Dentre tais defini-
ções, destacam-se cinco: (i) tecnológica – as inovações tecnológicas que
surgiram a partir de 1970 produziram uma reconstrução do mundo social
em função de seu impacto (TOFFLER, 1980; ANGEL, 1995); (ii) econô-
mica – ocorreu o aumento do valor econômico das atividades informacio-
nais (JONSCHER, 1999); (iii) profissional – houve um crescimento das
oportunidades de trabalho informatizadas (BELL, 1976; PERKIN, 1990);
(iv) espacial – o poder das redes informacionais para conectar diferentes
locais (geográficos) afetou as organizações sociais em seu tempo e espaço,
assumindo alcance global e instantâneo (CASTELLS, 1996); e (v) cultu-
ral – o conteúdo informacional gerado tem alterado os rumos da moda,
literatura, cinema, entretenimento televisivo, entre outras expressões cul-
turais. Para Moraes (2019), a sociedade da informação reúne aspectos de
tais definições, mas possui um enfoque mais profundo na digitalização da
Estudos pluridisciplinares da informação: ciência da informação, ética e linguagem - nº 3
353
sociedade, de modo a analisar a relação íntima entre indivíduos/TIC a qual
culmina na reformulação do entendimento que os indivíduos possuem
de si e de suas interações com outros indivíduos e com o ambiente. (João
Antonio de Moraes e Rafael Rodrigues Testa).
Tecnologias digitais: pode-se distinguir entre dois tipos de tecnologias, as
pré-digitais e as digitais, sendo que o limiar entre elas é, essencialmente, a
internet (Floridi, 2005, 2014). As tecnologias pré-digitais seriam o telégra-
fo, jornal, máquina fotográfica, televisão, entre outros artefatos informa-
cionais tradicionais em seu formato anterior ao surgimento da internet. Já
as tecnologias digitais são os notebooks, smartphones, tablets, câmeras de
vigilância, etc., os quais podem estar conectados em rede. Uma diferença
importante entre os modos de atuação dos dois tipos de tecnologias é a re-
lação destas com seus usuários. Enquanto que nas tecnologias pré-digitais
os usuários eram, em sua grande maioria, apenas receptores de informação,
nas tecnologias digitais estes mesmos usuários também podem contribuir
com informação para a rede (eles podem gerar e compartilhar informação,
em tempo real, ao invés de estarem apenas passivos à informação disponí-
vel). (João Antonio de Moraes e Rafael Rodrigues Testa).
Teoria crítica em Ciência da Informação: formulação histórica da teo-
ria dialética dos estudos biblioteconômico-informacionais como parte da
crítica do Iluminismo e ao Positivismo como correntes epistemológicas
co-constituidoras da Ciência da Informação. (Gustavo Silva Saldanha).
Teorias unificadas: Teorias unificadas são construções teóricas que bus-
cam integrar e harmonizar múltiplos conceitos, princípios e fenômenos de
diversas áreas ou disciplinas do conhecimento. Seu propósito fundamental
é oferecer uma estrutura explanatória abrangente e coesa, capaz de unificar
e explicar fenômenos aparentemente distintos em busca de significação
objetiva. (Valdirene Aparecida Pascoal e Maria Eunice Quilici Gonzalez).
Zemblanidade: O oposto da serendipidade: enquanto a serendipidade diz
respeito a uma descoberta surpreendente e benéfica, produto de um aci-
dente e da atenção e conhecimento necessários para que ela seja identifica-
da, a zemblanidade é um resultado esperado e prejudicial, que ocorre ne-
354
cessariamente em um determinado contexto e é produto de incompetência
e/ou negligência. (Ricardo Peraça Cavassane, Felipe S. Abrahão e Itala M.
Loffredo D’Ottaviano).
355
PARA SABER MAIS
Carlos Cândido de ALMEIDA
UNESP
carlos.c.almeida@unesp.br
https://orcid.org/0000-0002-8552-1029
Mariana VITTIRODRIGUES
UNESP
mvittirodrigues@gmail.com
https://orcid.org/0000-0002-4764-2575
Nesta seção, encontra-se a classificação das indicações de biblio-
grafia feitas pelos autores e autoras dos capítulos dos livros “Estudos
Pluridisciplinares da Informação: Filosofia, Tecnologia e Semiótica” (Coleção
Estudos em Ciência da Informação, nº 2) e “Estudos Pluridisciplinares da
Informação: Ciência da Informação, Ética e Linguagem” (Coleção Estudos
em Ciência da Informação, nº 3). A bibliografia foi sistematizada pelos
organizadores das coletâneas e é imprescindível para compreender mais
amplamente os assuntos tratados nestes dois livros. A lista a seguir está
dividida por grandes temas de interesse e não refletem a divisão de partes
e/ou capítulos.
https://doi.org/10.36311/2025.978-65-5954-635-0.p355-364
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informação Ecológica
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365
SOBRE OS AUTORES
alExandrE robson martinEs
Doutorando em Ciência da Informação pelo PPGCI-Unesp/Marília-SP (FFC);
doutorado sanduíche (estancia doctoral) 2023-2024, na Universidad de Murcia,
Murcia, Espanha. Mestre em Ciências da Informação pelo programa PPGCI -
Unesp - Marília/SP (2020). Graduado em Letras - Inglês - Faculdades Integradas
Regionais de Avaré (2005) e graduado em Pedagogia para Licenciados pela
Universidade Nove de Julho (2014). Professor de Língua Portuguesa, Literatura,
Filosofia e Sociologia. Experiente na área de Letras-Linguagem, com ênfase
em Linguística, Sociolinguística, Morfologia, Sintaxe, Semiologia, Semiótica,
Semântica, Análise do Discurso, Linguística Textual, Pragmática, Filosofia
da Linguagem e Representação Social, com trabalhos práticos em produção,
correção, avaliação e análise de texto para vestibular, texto acadêmico-cientí-
fico. Além disso, pesquisador nas áreas da Ciência da Informação, Ciência da
Documentação, Organização do Conhecimento, Representação e Recuperação
da Informação, Teoria do Conceito, com ênfase nas disciplinas de Análise
Documental, Linguagem Documental, Linguística Documental, Semiótica
Documental, Terminologia, Indexação, bem como o complemento de interes-
ses científicos em estudos acerca de metodologia científica, de epistemologia, da
informatividade, da comunicação e da representatividade, ainda destacando ob-
jetos, sistemas e mediação informacional, além da aplicabilidade da linguística
computacional, mente computacional, processamento em linguagem natural e
cognição no desenvolvimento de competências linguística, semiótica, comunica-
cional e informacional e aquisição de conhecimento.
Lattes iD: http://lattes.cnpq.br/3594532968978800
Orcid iD: https://orcid.org/0000-0002-4524-0978
E-mail: alexandre.martines@unesp.br
Carlos Cândido de Almeida & Mariana Vitti-Rodrigues
366
andErson vinícius romanini
Professor livre-docente da Escola de Comunicações e Artes (ECA) da Universidade
de São Paulo (USP). Integra os programas de pós-graduação PPGCOM
(Comunicação) e PGEHA (Estética e História da Arte). Pesquisador na área de
semiótica e teoria da comunicação, tem foco em estudos sobre a filosofia da lingua-
gem, epistemologia da comunicação e a obra de Charles S. Peirce. Como jornalista,
foi repórter, editor ou colaborador em diversos meios de comunicação, nas quais
cobriu assuntos de cultura, ciência e sustentabilidade. Foi presidente da Sociedade
Brasileira de Ciência Cognitiva (SBCC) de 2017 a 2021. É editor-científico da
revista Semeiosis (Revista Transdisciplinar de Semiótica e Design e autor do livro
Peirce and Biosemiotics (Springer).
Lattes iD: http://lattes.cnpq.br/6215760548706506
Orcid iD: https://orcid.org/0000-0001-6558-0550
E-mail: vinicius.romanini@usp.br
augusto júnior macuculE
Docente da Escola Superior de Jornalismo (ESJ), Maputo, Moçambique.
Atualmente é Doutorando do Programa de Pós-graduação em Ciência da
Informação da Universidade Estadual Paulista (Unesp), vinculado à linha de
pesquisa: Gestão, Mediação e Uso da Informação. Graduado em Administração
Pública pelo Instituto Superior de Relações Internacionais. Membro do grupo de
pesquisa Informação, Conhecimento e Inteligência Organizacional. Integrante
do projeto de pesquisa Inteligência organizacional e inteligência social no con-
texto do big data: análise de dados para a geração de diferenciais competitivos.
Diretor do curso de Publicidade e Marketing da ESJ, gestão 2014-2019. Chefe
do Departamento de Auditoria Interna da ESJ, gestão 2019-2023.
Lattes iD: http://lattes.cnpq.br/0511199309151030
Orcid iD: https://orcid.org/0000-0001-6014-0070
E-mail: augusto.j.macucule@unesp.br
Estudos pluridisciplinares da informação: ciência da informação, ética e linguagem - nº 3
367
carlos cândido dE almEida
Docente do Departamento de Ciência da Informação da Universidade Estadual
Paulista “Júlio Mesquita Filho” (UNESP), campus de Marília, com atuação nos
cursos de Arquivologia, Biblioteconomia, Mestrado e Doutorado em Ciência da
Informação. Professor visitante na Universidad Carlos III de Madrid (Espanha,
2021) e Universidad Nacional de Misiones (Argentina, 2012). Pós-Doutor em
Biblioteconomia e Documentação pela Universidad de Zaragoza, Espanha.
Doutor em Ciência da Informação pela UNESP, mestre em Ciência da Informação
pela Universidade Federal de Santa Catarina e graduado em Biblioteconomia
pela Universidade Estadual de Londrina. Tem interesse nas áreas: Epistemologia,
Ciência da Informação, Semiótica, Comunicação, Organização da Informação,
Organização do Conhecimento e Mediação.
Lattes iD: http://lattes.cnpq.br/3901317157203491
Orcid iD: https://orcid.org/0000-0002-8552-1029
E-mail: carlos.c.almeida@unesp.br
gustavo silva saldanha
Pesquisador titular – Instituto Brasileiro de Informação em Ciência e Tecnologia
do Ministério de Ciência, Tecnologia e Inovação (IBICT MCTI) ; professor asso-
ciado – Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (Unirio) ; Bolsista de
Produtividade 2 CNPq MCTI. Bacharel em Biblioteconomia pela Universidade
Federal de Minas Gerais (UFMG) (2006); Mestre em Ciência da Informação
pelo Programa de Pós-Graduação em Ciência da Informação da UFMG (2008);
especialista em Filosofia Medieval pela Faculdade São Bento do Rio de Janeiro
(2009); Doutor em Ciência da Informação pelo Programa de Pós-Graduação
em Ciência da Informação do acordo de cooperação do Instituto Brasileiro de
Informação em Ciência e Tecnologia (IBICT) e da Universidade Federal do Rio
de Janeiro (UFRJ) - PPGCI IBICT UFRJ (2012). Realizou, sob o fomento da
Capes, o estágio pós-doutoral na Université Toulouse III Paul Sabatier, França
(2017-2018).
Lattes iD: http://lattes.cnpq.br/6143079905555041
Orcid iD: https://orcid.org/0000-0002-7679-8552
E-mail: saldanhaquim@gmail.com
Carlos Cândido de Almeida & Mariana Vitti-Rodrigues
368
joão antonio dE moraEs
Atualmente é professor substituto do Instituto de Filosofia da Universidade
Federal de Uberlândia (UFU). Doutor em Filosofia pela UNICAMP; Mestre,
Licenciado e Bacharel em Filosofia pela UNESP. Autor dos livros “Implicações
éticas da virada informacional na Filosofia” (EDUFU, 2014) e “O paradigma da
complexidade e a Ética Informacional” (CLE-UNICAMP, 2019), além da orga-
nização de outros títulos e publicação de artigos nos temas Ética Informacional,
Filosofia da Informação e Ciência Cognitiva. É membro do Grupo Acadêmico de
Estudos Cognitivos (UNESP), do Grupo Interdisciplinar CLE Auto-Organização
(UNICAMP) e do International Center for Information Ethics (ICIE). Foi
Presidente da Sociedade Brasileira de Ciência Cognitiva (2019-2021).
Lattes iD: http://lattes.cnpq.br/8415778053156923
Orcid iD: https://orcid.org/0000-0001-6057-5138
E-mail: moraesunesp@yahoo.com.br
luciana dE souza gracioso
Doutora em Ciência da Informação (IBICT/UFF). Professora Associada do
Departamento de Ciência da Informação da UFSCar. Docente do Programa
de Pós-Graduação em Ciência da Informação (PGCI/UFSCar). Bolsista
Produtividade CNPQ (PQ/2).
Lattes iD: http://lattes.cnpq.br/4898201916360294
Orcid iD: https://orcid.org/0000-0002-6320-4946
E-mail: luciana@ufscar.br
marco donizEtE paulino da silva
Doutor em Ciência, Tecnologia e Sociedade (UFSCar). Professor em
Biblioteconomia. Bacharel em Biblioteconomia e Ciência da Informação. Atuante
em temáticas culturais e artísticas.
Lattes iD: http://lattes.cnpq.br/1474293377346927
Orcid iD: https://orcid.org/0000-0003-1401-7180
E-mail: marco_donizete@yahoo.com.br
Estudos pluridisciplinares da informação: ciência da informação, ética e linguagem - nº 3
369
maria lívia pachEco dE olivEira
Doutora e mestra em Ciência da Informação pelo Programa de Pós-graduação
em Ciência da Informação da Universidade Federal da Paraíba. Bacharela em
Comunicação Social, com habilitação em Relações Públicas. Professora adjunta
da Universidade Federal da Paraíba - departamento de comunicação, curso de
Relações Públicas, e professora do Programa de Pós-graduação em Ciência da
Informação da Universidade Federal de Alagoas. Integrante do Grupo de Pesquisa
Observinter - Observatório de Estudos Interdisciplinares da Informação - CNPq.
Tem interesse nas áreas de competência crítica em informação, comunicação or-
ganizacional, desinformação e infoethics.
Lattes iD: http://lattes.cnpq.br/6242230957935100
Orcid iD: https://orcid.org/0000-0003-2945-7656
E-mail: maria.livia@academico.ufpb.br
mariana vitti-rodriguEs
Pós-doutorado em Filosofia da Informação e Tecnologia pela Universidade
Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (2024). Doutorado em Filosofia da
Ciência pela Universidade de Copenhagen (2019). Mestrado em Filosofia pela
Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (2014). Bacharelado em
Filosofia (2012) e Licenciatura Plena em Filosofia (2010) pela mesma universi-
dade. Tem interesse nos conceitos de informação, abdução, significado, serendi-
pidade, amizade, e estilos de pensar e fazer ciência, bem como nas consequências
epistemológicas e éticas da crescente automação da prática científica para os pro-
cessos de descoberta científica.
Lattes iD: http://lattes.cnpq.br/4365289597123626
Orcid iD: https://orcid.org/0000-0002-4764-2575
E-mail: mvittirodrigues@gmail.com
Carlos Cândido de Almeida & Mariana Vitti-Rodrigues
370
marivaldE moacir francElin
Professor da Universidade de São Paulo (USP). Graduado em Biblioteconomia
e doutor em Ciência da Informação. Docente dos cursos de graduação em
Biblioteconomia e Ciência da Informação (CBD) e de pós-graduação em Ciência
da Informação na Escola de Comunicações e Artes (PPGCI/ECA). Pesquisa o
campo epistemológico da Ciência da Informação e os conceitos na Organização
do Conhecimento. Pesquisa o campo epistemológico da Ciência da Informação e
os conceitos na Organização do Conhecimento.
Lattes iD: http://lattes.cnpq.br/2052055753251299
Orcid iD: https://orcid.org/0000-0002-9576-7743
E-mail: marivalde@usp.br
marta lígia pomim valEntim
Professora Titular da Universidade Estadual Paulista (Unesp). Pós-doutorado pela
Universidad de Salamanca (USAL), Espanha. Livre Docente em Informação,
Conhecimento e Inteligência Organizacional pela Unesp. Presidente da Asociación
de Educación e Investigación en Ciencia de la Información de Iberoamérica y
el Caribe (EDICIC), gestão 2021-2023. Atuou como Supervisora do Instituto
de Políticas Públicas de Marília (IPPMAR), gestão 2021-2023. Atuou como
Coordenadora do Programa de Pós-graduação em Ciência da Informação da
Unesp, gestão 2017-2021. Atuou como Presidente da Associação Brasileira de
Educação em Ciência da Informação (ABECIN), gestão 2016-2019. Foi bolsista
Produtividade em Pesquisa (PQ-1D), do Conselho Nacional de Desenvolvimento
Científico e Tecnológico (CNPq), no período entre 2002 a 2023.
Lattes iD: http://lattes.cnpq.br/1484808558396980
Orcid iD:https://orcid.org/0000-0003-4248-5934
E-mail: valentim@valentim.pro.br
Estudos pluridisciplinares da informação: ciência da informação, ética e linguagem - nº 3
371
pEdro ramos dolabEla chagas
Professor Adjunto de Literatura Brasileira e Teoria Literária da Universidade
Federal do Paraná (UFPR). Mestre em Teoria Literária pela Universidade Federal
de Minas Gerais, Doutor em Literatura Comparada pela Universidade do Estado
do Rio de Janeiro, Doutor em Estética e Filosofia da Arte pela UFMG. Desenvolve
projetos de pesquisa sobre teoria e história do romance, narratologia cognitiva e
pragmática da leitura da ficção. Tem experiência em literatura hispanoamericana
e norteamericana. É autor de “‘1970’: Arte e Pensamento” (EdUFMG) e “Todos
eles romances: a variação do gênero no Brasil, 1960-1980” (EdUNICAMP).
Lattes iD: http://lattes.cnpq.br/0096272280433688
Orcid iD: https://orcid.org/0000-0003-0336-489X
E-mail: dolabelachagas@gmail.com
rafaEl rodriguEs tEsta
Doutor em Filosofia pela UNICAMP; Mestre e Bacharel pela mesma instituição.
Possui experiência em Lógica Matemática, Epistemologia Formal e no ensino
e divulgação da Lógica e da Filosofia. Realizou pós-doutorados no Centro de
Lógica, Epistemologia e História da Ciência (CLE-UNICAMP); na Faculdade
de Ciências Exatas e da Engenharia da Universidade da Madeira (FCEE-UMa,
Portugal); e no Instituto de Filosofia e Ciências Sociais da Universidade Federal
do Rio de Janeiro (IFCS-UFRJ). Dentre seus trabalhos de pesquisa e divulga-
ção, destaca-se a investigação dos impactos éticos, lógicos e epistemológicos das
Inteligências Artificiais.
Lattes iD: http://lattes.cnpq.br/0450974769891807
Orcid iD: https://orcid.org/0000-0002-7052-1376
E-mail: rafaeltesta@gmail.com
Carlos Cândido de Almeida & Mariana Vitti-Rodrigues
372
rEnata vicEntini miElli
Jornalista. Doutora em Ciências da Comunicação pela Escola de Comunicação e
Artes da USP. É coordenadora do Comitê Gestor da Internet no Brasil (CGI.br)
e Assessora Especial da Ministra de Ciência, Tecnologia e Inovação. Presidente do
Conselho de Administração do Núcleo de Informação e Coordenação do Ponto
BR (NIC.br). Possui graduação em Comunicação Social pela Faculdade Cásper
Líbero (2003). Comissão Permanente de Comunicação do Conselho Nacional
de Direitos Humanos entre 2015 e 2022. Integrou o Conselho de Comunicação
da Câmara dos Deputados entre 2019-2020. Foi Coordenadora Geral do Fórum
Nacional pela Democratização da Comunicação (FNDC) entre 2016-2020 e in-
tegrou a Executiva do FNDC entre 2011-2020. Integrou a Câmara de Conteúdos
e Direitos Autorais do Comitê Gestor da Internet no Brasil (CGI.br) entre 2022
e 2023 e a Câmara de Universalização e Inclusão Digital do Comitê Gestor da
Internet no Brasil (CGI.br) entre 2013 - 2020. Foi coordenadora do Centro de
Estudos da Mídia Alternativa Barão de Itararé entre 2010 e 2023. Integrou a
Coalizão Direitos na Rede entre 2016 e 2023.
Lattes iD: http://lattes.cnpq.br/3096487542895956
Orcid iD: https://orcid.org/0000-0002-4513-6214
E-mail: renatavmielli@gmail.com
rodrigo rabEllo
Professor Adjunto da Faculdade de Ciência da Informação da Universidade de
Brasília (UnB). Professor Permanente do Programa de Pós-Graduação em Ciência
da Informação da UnB. Bacharel em Biblioteconomia pela Universidade Estadual
Paulista Júlio de Mesquita Filho (UNESP). Doutor em Ciência da Informação
pela UNESP. Realizou estágios de pós-doutorado em Ciência da Informação
no Instituto Brasileiro de Informação em Ciência e Tecnologia (IBICT) e na
UnB. Integra o Grupo de Pesquisa Fundamentos Teóricos da Informação, tam-
bém na condição de vice-líder. Temas de interesse: fundamentos da Ciência da
Informação, estudos epistemológicos, políticos, sociais, histórico-conceituais so-
bre informação, documento, usuário e não-usuário de informação, sujeito infor-
macional, práticas informacionais.
Lattes iD: http://lattes.cnpq.br/3092147925440268
Orcid iD: https://orcid.org/0000-0001-7217-1608
E-mail: rdgrabello@unb.br
catalogação na publicação (cip)
Telma Jaqueline Dias Silveira
CRB 8/7867
normalização
Janaína Celoto Guerrero de Mendonça
CRB-8 6456
Lucas Corrêa da Cunha Silva
CRB 3: CE1626
Giovanna Karolline Lemes de Lima
capa E diagramação
Gláucio Rogério de Morais
produção gráfica
Giancarlo Malheiro Silva
Gláucio Rogério de Morais
assEssoria técnica
Renato Geraldi
oficina univErsitária
Laboratório Editorial
labeditorial.marilia@unesp.br
formato
16 x 23cm
tipologia
Adobe Garamond Pro
2025
sobrE o livro
  ,
  
Carlos Cândido de Almeida
Mariana Vii-Rodrigues
(Organizadores)
ESTUDOS
PLURIDISCIPLINARES DA
INFORMAÇÃO
ESTUDOS PLURIDISCIPLINARES DA INFORMAÇÃO
  ,   
Carlos Cândido de Almeida | Mariana Vii-Rodrigues (Orgs.)
Programa CAPES-PRInt-UNESP, Código de Financiamento 001
Processo: 88887.571329/2020-00.
Auxílio para impressão: CAPES-PROEX - Auxílio - 1628/2024 -
Processo: 88881.974501/2024-01
Coleção Estudos em
Cncia da Informão
3
Coleção Estudos em
Cncia da Informão
Nº 1 - Estudos críticos em organização do
conhecimento
Organizadores: Carlos Cândido de Almeida,
Rosa San Segundo e Daniel Martínez-Ávila
Nº 2 - Estudos pluridisciplinares da informação:
filosofia, tecnologia e semiótica
Organizadores: Carlos Cândido de Almeida e
Mariana Vitti-Rodrigues
Nº 3 - Estudos pluridisciplinares
da informação: ciência da informação, ética e
linguagem
Organizadores: Carlos Cândido de Almeida e
Mariana Vitti-Rodrigues
3
PPGFIL
PPGFIL
"Como é de se presumir, o diálogo entre
cientistas da informação, cientistas da
computação, filósofos e outros especialistas
e as convenções sobre os termos de toda e
qualquer discussão nem sempre são fáceis de
atermar.
A ideia original de reunir os estudos da ci-
ência da informação, ciência da computação,
filosofia e outras áreas sobre o tema informa-
ção ficou extremamente complexa, como
devia de ser. Para tanto, foi recomendado se-
parar o projeto em duas coletâneas: a primei-
ra, intitulada “Estudos pluridisciplinares da
informação: filosofia, tecnologia e semiótica
(Coleção Estudos em Ciência da Informação;
2) e a segunda, intitulada “Estudos pluridis-
ciplinares da informação: ciência da informa-
ção, ética e linguagem” (Coleção Estudos
em Ciência da Informação; 3). A leitura do
conjunto permitirá uma compreensão mais
adequada das perspectivas realistas e relativis-
tas da informação, embora estas classificações
não sejam sempre as mais adequadas para
abarcar a complexidade das contribuições
dos diversos autores."

