FORMAÇÃO INICIAL DE PROFESSORAS E
PROFESSORES PARA A EDUCAÇÃO
INFANTIL NO BRASIL:
o que sabemos e quais as contribuições
da teoria histórico-cultural e da atividade de estudo?
Monalisa Gazoli
FORMAÇÃO INICIAL DE PROFESSORAS E PROFESSORES PARA
A EDUCAÇÃO INFANTIL NO BRASIL
Programa PROEX/CAPES:
Auxílio Nº 0039/2022
Processo Nº 23038.001838/2022-11
Monalisa Gazoli
Doutora em Educação (Unesp-Marília/
SP) e membro do GEPEDEI – “Grupo
de Estudos e Pesquisa sobre Especici-
dades da Docência na Educação Infan-
til” e do grupo de pesquisa Implicações
Pedagógicas da teoria Histórico-Cultu-
ral (ambos vinculados à Unesp-Marília/
SP). Pesquisa principalmente sobre os
temas: Alfabetização, Educação infantil
e Formação de professor para a Educa-
ção Infantil. É autora do livro Série de
leitura Proença (1926-1928) e o ensino
da leitura no estado de São Paulo (Edi-
tora Cultura Acadêmica, 2011); coorga-
nizadora do livro Educação e humani-
zação de bebês e de crianças pequenas:
conceitos e práticas pedagógicas (Editora
Ocina Universitária, 2020); e autora de
capítulos de livros, artigos cientícos e
trabalhos completos publicados em anais
de eventos nacionais e internacionais.
A Educação Infantil ocupou, ao menos entre 2006 e 2019, es-
paço restrito na formação inicial do pedagogo (atual locus de for-
mação dos professores e das professoras para essa etapa escolar).
Nesse livro (resultado de tese de doutorado em Educação PPGE
Unesp-Marília/SP) aborda-se essa realidade e defende-se que a “ati-
vidade prossional/de estudo” contribui à formação inicial de profes-
soras e professores para a Educação Infantil à medida que possibilita o
desenvolvimento do pensamento teórico dos graduandos essencial à
compreensão dos fenômenos educativos por meio de generalização,
abstração, análise e síntese. Assim, esses têm a oportunidade de desen-
volver a capacidade de agir sobre os fenômenos educativos para além de
suas aparências imediatas, estabelecendo princípios generalizados de
ação mediados por abstrações teóricas. O desenvolvimento do pensa-
mento teórico possibilita, portanto, articular teoria e prática (unidade
formativa), pois o agir é subsidiado pelo pensar que considera não ape-
nas o fenômeno observável, mas o conjunto de relações que o constitui.
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FORMAÇÃO INICIAL DE PROFESSORAS E PROFESSORES
PARA A EDUCAÇÃO INFANTIL NO BRASIL:
o que sabemos e quais as contribuições da Teoria Histórico-
cultural e da atividade de estudo?
Monalisa Gazoli
Monalisa Gazoli
FORMAÇÃO INICIAL DE PROFESSORAS E PROFESSORES
PARA A EDUCAÇÃO INFANTIL NO BRASIL:
o que sabemos e quais as contribuições da Teoria Histórico-
cultural e da atividade de estudo?
Marília/Oficina Universitária
São Paulo/Cultura Acadêmica
2024
UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA
FACULDADE DE FILOSOFIA E CIÊNCIAS FFC
UNESP - campus de Marília
Diretora
Dra. Claudia Regina Mosca Giroto
Vice-Diretora
Dra. Ana Claudia Vieira Cardoso
Conselho Editorial
Mariângela Spotti Lopes Fujita (Presidente)
Célia Maria Giacheti
Cláudia Regina Mosca Giroto
Edvaldo Soares
Franciele Marques Redigolo
Marcelo Fernandes de Oliveira
Marcos Antonio Alves
Neusa Maria Dal Ri
Renato Geraldi (Assessor Técnico)
Rosane Michelli de Castro
Conselho do Programa de Pós-Graduação em Educação -
UNESP/Marília
Henrique Tahan Novaes
Aila Narene Dahwache Criado Rocha
Alonso Bezerra de Carvalho
Ana Clara Bortoleto Nery
Claudia da Mota Daros Parente
Cyntia Graziella Guizelim Simões Girotto
Daniela Nogueira de Moraes Garcia
Pedro Angelo Pagni
Auxílio Nº 0039/2022, Processo Nº 23038.001838/2022-11, Programa PROEX/CAPES
Parecerista: Amanda Valiengo (Professora do Departamento de Cncias da Educação (DECED) e Mestrado em
Educação (PPEDU) da Universidade Federal de São João del Rei, MG).
Capa: Imagem gratuita Pixabay
Ficha catalográfica
G291f Formação inicial de professoras e professores para a educação infantil no Brasil: o
que sabemos e quais as contribuições da Teoria Histórico-cultural e da atividade de
estudo? / Monalisa Gazoli. Marília : Oficina Universitária ; São Paulo : Cultura
Acadêmica, 2024.
383 p. : il.
Inclui bibliografia
ISBN 978-65-5954-480-6 (Impresso)
ISBN 978-65-5954-481-3 (Digital)
DOI: https://doi.org/10.36311/2024.978-65-5954-481-3
1. Educação. 2. Educação de crianças. 3. Professores alfabetizadores - Formação. 4.
Formação profissional. 5. Prática profissional. I. Título.
CDD 370.115
Catalogação: André Sávio Craveiro Bueno CRB 8/8211
Copyright © 2024, Faculdade de Filosofia e Ciências
Editora afiliada:
Cultura Acadêmica é selo editorial da Editora UNESP
Oficina Universitária é selo editorial da UNESP - campus de Marília
Para Jorge, Júlio César e Toddy.
“O jovem Rambaldo jamais teria imaginado que as
aparências pudessem revelar-se tão enganadoras:
desde que chegara ao acampamento descobrira que
tudo era tão diferente do que parecia...”
Ítalo Calvino (2005, p. 18)
“Recusar a identificação da figura da professora com a da tia não
significa, de modo algum, diminuir ou menosprezar a figura da
tia, da mesma forma como aceitar a identificação não produz
nenhuma valoração a tia. Significa, pelo contrário, retirar algo
fundamental à professora: sua responsabilidade profissional de
que faz parte a exigência política por sua formação permanente.”
Paulo Freire (2006, p. 11)
AGRADECIMENTOS
Meus sinceros agradecimentos:
a Elieuza, mestre em materializar o conceito humanização;
aos amigos e companheiros do “Grupo de Estudos e Pesquisa
sobre Especificidades da Docência na Educação Infantil” (Gepedei-
Unesp-Marília/SP) e do Grupo de Pesquisa “Implicações Pedagógicas
da Teoria Histórico-Cultural” (Unesp-Marília/SP);
aos funcionários da Faculdade de Filosofia e Ciências, da
Universidade Estadual Paulista, campus de Marília/SP;
à Dr
a
. Amanda Valiengo e à Profª. Dr
a
. Marta Sforni, pelas
profícuas orientações quanto ao relatório para exame geral de
qualificação de doutorado;
ao Prof. Dr. José Carlos Libâneo, à Dr
a
. Stela Miller, à Dr
a
.
Sandra Aparecida Pires Franco e à Dr
a
. Amanda Valiengo, pela
participação na banca de defesa da tese de doutorado em Educação
da qual deriva, em parte, este livro;
à Dr
a
. Maria Sílvia Rosa Santana, à Dr
a
. Bárbara Cortella
Pereira de Oliveira e à Profª. Dr
a
. Rosane Michelli de Castro pelo
aceite à suplência da banca de defesa da mencionada tese; e
aos meus familiares pela paciência e incentivo, em especial à
minha irmã Amanda Américo pelos diálogos sempre provocadores de
reflexão e estudos.
SUMÁRIO
Prefácio | Elieuza Aparecida de Lima...............................................15
Apresentação.................................................................................21
Introdução....................................................................................23
1 Quais conceitos operativos são utilizados neste livro?
.....................................................................................................43
1.1 O que é Pedagogia?
PARTE 1
O que sabemos sobre a formação inicial de professoras e
professores para a Educação Infantil no Brasil?
2 Qual a produção bibliográfica brasileira sobre formação inicial de
professoras e professores para a Educação Infantil em curso de
Pedagogia (2006-2019)?................................................................77
2.1 Como foram localizados e selecionados para análise textos
brasileiros sobre formação inicial de professoras e professores para a
Educação Infantil?
2.2 Qual a vinculação institucional e quem pesquisa sobre formação
inicial de professoras e professores para a Educação Infantil, no
Brasil?
2.3 Quais cursos de Pedagogia têm aspectos investigados nos textos
selecionados para análise?
2.4 Quais conclusões são possíveis a partir dos dados apresentados
sobre a produção bibliográfica brasileira (2006-2019) quanto à
formação inicial de professoras e professores para a Educação Infantil
em cursos de Pedagogia?
3 O que sabemos sobre formação inicial de professoras e professores
para a Educação Infantil, no Brasil?..............................................127
3.1 O que sabemos quanto à produção científica sobre formação
inicial de professoras e professores para a Educação Infantil?
3.2 O que sabemos quanto à legislação sobre formação inicial de
professoras e professores para a Educação Infantil?
3.3 O que sabemos sobre a organização curricular do curso de
Pedagogia, com ênfase na formação inicial de professoras e
professores para a Educação Infantil?
3.4 O que sabemos sobre o espaço da formação de professoras e
professores para a Educação Infantil no curso de Pedagogia?
3.5 O que sabemos sobre estágio na Educação Infantil no curso de
Pedagogia?
3.6 O que sabemos sobre as concepções dos graduandos em
Pedagogia sobre Educação Infantil?
3.7 O que sabemos sobre os limites e as contribuições do curso de
Pedagogia à formação de professoras e professores para a Educação
Infantil?
PARTE 2
Quais as contribuições da Teoria Histórico-Cultural e da
Atividade de estudo à formação inicial de professoras e professores
da Educação Infantil?
4 Quais as propostas brasileiras à formação inicial de professoras e
professores para a Educação Infantil?............................................203
4.1 O que é proposto à formação inicial de professoras e professores
para a Educação Infantil, no Brasil?
4.2 O que propõem os pesquisadores brasileiros partidários da Teoria
Histórico--Cultural à formação inicial de professoras e professores
para a Educação Infantil?
5 “Atividade de estudo”: uma possibilidade à formação inicial de
professoras e professores para a Educação Infantil?........................267
5.1 Quais as principais características do desenvolvimento psíquico
humano, segundo pesquisadores da Teoria Histórico-Cultural?
5.2 O que é “atividade de estudo”?
5.3 Quais as principais características da “atividade profissional/de
estudo”?
5.4 Quais contribuições a “atividade profissional/de estudo” propicia
à formação inicial de professoras e professores para a Educação
Infantil?
Considerações finais....................................................................349
Referências..................................................................................357
15
https://doi.org/10.36311/2024.978-65-5954-481-3.p15-20
PREFÁCIO
Que beleza a de sermos educados para o uso dos olhos
e disciplinar tanta coisa que há para ver.
Valter Hugo Mae
A beleza sensível das palavras de Valter Hugo Mae é fio
delicado extraído do livro “Contra Mim” (2020). A sensibilidade e a
força das palavras do escritor orientam generosamente as tessituras
deste prefácio, considerando a complexidade do processo de formação
inicial de professoras e professores para a Educação Infantil no Brasil
temática do livro escrito por Monalisa Gazoli. Cada página da obra
firma, à luz do conhecimento científico, como esse processo
formativo docente pode orientar, intencional e conscientemente, o
uso e o aperfeiçoamento dos olhos, do pensamento, da atenção, da
comunicação, da imaginação, da criação e de outras tantas
capacidades especificamente humanas nos estudantes de cursos de
Pedagogia.
Essa fonte de inspiração literária da epígrafe dialoga com
princípios da Teoria Histórico-Cultural. Poeticamente, afirma a
complexidade do processo de formação humana e, no conjunto, da
constituição da identidade docente, com especial atenção ao seu
caráter social e cultural e ao papel da educação escolar e do professor
do Ensino Superior nesse processo. Como o teor dos escritos de
Monalisa Gazoli sustentada em ombros de gigantes, tais como
Vygotski, Leontiev, Davídov, Elkonin nos leva a depreender, que
16
os processos formativos desenvolventes podem compor uma poesia
pedagógica capaz de humanizar as pessoas desde bebês, mediante a
garantia do acesso e da relação com bens materiais e imateriais a
linguagem, os valores e normas sociais, a ciência, a arte, dentre outros
produzidos e acumulados ao longo da história humana,
provocadores de movimentos e avanços no desenvolvimento cultural
ao longo da vida.
O acesso e a apropriação desse acervo cultural são conquistas
e direitos do professor em formação inicial (e daquele no exercício da
profissão docente), constituindo a sofisticação do seu pensamento e
sua consciência e possibilitando a ele condições mais ampliadas de
compreensão da realidade social para nela atuar e transformar. Este
entendimento embasa as análises e discussões realizadas pela estudiosa
em torno do tema “Formação inicial de professoras e professores para a
Educação Infantil no Brasil: o que sabemos e quais as contribuições da
Teoria Histórico-Cultural e da atividade de estudo?”, evidenciando
como a atividade de estudo torna-se processo essencial para sucessivas
aproximações do professor em relação ao pensamento teórico. Nas
palavras da autora, “[...] O desenvolvimento do pensamento teórico
possibilita articular teoria e prática, pois o agir é subsidiado pelo
pensar que considera, não apenas, o fenômeno observável, mas o
conjunto de relações que o constitui” (Monalisa Gazoli).
A apropriação do conhecimento científico é fonte dessa forma
de pensar teoricamente e pode oferecer e deflagrar, no professor, em
processo de constituição de seu perfil profissional, maneiras mais
sofisticadas de compreensão acerca do papel e do valor do seu próprio
trabalho, da complexidade e incompletude de sua formação e de
aspectos de sua profissionalidade expressada em autoria e poética
pessoal no trabalho diário com as crianças e colegas de profissão.
17
As reflexões apresentadas ao longo da obra ratificam, assim, a
atividade de estudo como conjunto de ações de generalização, análise,
abstração, análise e síntese (Monalisa Gazoli). Essas capacidades são
inerentes ao pensamento teórico e exigidas como parte de uma
consciência capaz de compreender a realidade social particular-
mente a educação escolar e o trabalho docente, para além de seus
aspectos superficiais, considerando as múltiplas determinações que a
compõem. Nesse processo formativo essencial à constituição do perfil
profissional docente, o professor apreende conhecimentos que o
humanizam e, dialeticamente, assume condições para que seu
trabalho tenha como resultado a humanização das jovens gerações e a
sua própria.
As centenas de páginas do livro evidenciam desafios, embates,
discussões e problemáticas em torno do tema em pauta, dentre os
quais: “Quais conceitos operativos são utilizados neste livro?”, “Qual
a produção bibliográfica brasileira sobre formação inicial de
professoras e professores para a Educação Infantil em curso de
Pedagogia (2006-2019)?”, “O que sabemos sobre formação inicial de
professoras e professores para a Educação Infantil, no Brasil?”, “Quais
as propostas brasileiras à formação inicial de professoras e professores
para a Educação Infantil?” e “‘Atividade de estudo’”: uma
possibilidade à formação inicial de professoras e professores para a
Educação Infantil?”.
O exercício de discussões realizado evidencia, portanto, a
complexidade, exigências, desafios e possibilidades da formação
inicial de professoras e professores para a Educação Infantil,
reconhecendo, por exemplo, aspectos da recente história dessa etapa
da escolaridade no Brasil, das marcas da maternagem, do papel da
educação escolar na infância e o do professor nesse processo.
18
Da ótica da compreeno e perspectiva de superação de uma
realidade social marcada pelo contínuo movimento de distancia-
mento do professor de possibilidades de humanização, os programas
e cursos de formação docente podem revigorar o processo necessário
de apropriação teórica pelo professor como substrato para a tomada
de consciência sobre suas escolhas didático-metodológicas. Conforme
Facci (2004), a formação docente exige apropriação de conheci-
mentos culturais produzidos pela humanidade ao longo de sua
história, compreendendo-a como processo promotor de humanização
do professor, efetivada pela transformação da consciência desse sujeito
em contínua constituição de sua profissionalidade.
Processos formativos com perspectiva desenvolvente criam
condições para que futuros professores e profissionais atuantes
possam, como a ciência tem afiançado, usufruir de tempos, relações,
espaços e materiais (T-R-E-M) (Akuri, 2022) para suas apropriações
e objetivações, considerando a prática concreta como objeto de seus
estudos, reflexões e projeções para a constituição do perfil profissional
docente. Nessas práticas formativas, as escolas tornam-se ambientes
para apropriações e objetivações culturais dos professores e das
crianças, configuradas como comunidades democráticas e
potencializadoras das atividades de ensino e aprendizagem dirigidas
ao desenvolvimento humano (Libâneo, 2016).
Ao encontro dessas assertivas, nos fios e resultados da pesquisa
de Monalisa Gazoli são traçados e sistematizados conhecimentos
teórico-científicos dirigidos à compreensão de aspectos do processo
da constituição de um perfil profissional do professor da Educação
Infantil, a partir de práticas formativas iniciais direcionadas às
especificidades da atuação docente, considerando as múltiplas
determinações e as potencialidades do trabalho pedagógico
(Guimarães; Arenhart; Santos, 2017).
19
O êxito desse processo formativo pode alicerçar e ampliar a
constituição de um perfil profissional do professor da Educação
Infantil capaz de compor suas próprias poesias materializadas em
ambientes pedagógicos onde as crianças possam se expressar, aprender
a olhar, escutar e pensar no seio das relações sociais vividas nesse lugar
potencialmente humanizador.
As notas ora apresentadas são um modo de convidar a leitora
e o leitor a um diálogo profícuo com a autora das páginas seguintes,
a partir de tramas de uma composição científica dedicada ao exercício
essencial de ampliação e cultivo do “uso dos olhos” para tanto o que
há para ver, conhecer, se apropriar, discutir sobre uma temática
desafiadora e aberta, tal como a questão da formação inicial de
professoras e professoras para a Educação Infantil em dialética relação
com a atividade de estudo.
Ao final deste prefácio, de mãos dadas com a arte narrada por
Valter Hugo Mae, especialmente o excerto trazido como epígrafe,
assumo, portanto, o privilégio de anunciar o texto de Monalisa Gazoli
como uma tessitura de fios escrita para assegurar: “estaremos sempre
à procura” daquilo que nos torne grandes como profissionais
dedicados à criança, à infância e a uma educação desenvolvente.
Elieuza Aparecida de Lima
Marília, dezembro de 2023
despedindo-se do perfume da primavera...
20
Referências
AKURI, J. G. M. Atividade de estudo para a formação teórica de
professores: implicações para a organização de um currículo
humanizador na creche. 2022. 169 f. Tese (Doutorado em
Educação) Faculdade de Filosofia e Ciências, Universidade
Estadual Paulista (Unesp), Marília, 2022.
FACCI, M. G. D. Valorização ou esvaziamento do trabalho do
professor: um estudo crítico-comparativo da teoria do professor
reflexivo, do construtivismo e da psicologia vigotskiana. Campinas,
SP: Autores Associados, 2004.
GUIMARÃES, D. de O; ARENHART, D.; SANTOS, N. de O.
Educação infantil pós-LDB/1996: formação inicial de professores e
práticas pedagógicas. Revista Contemporânea de Educação, Rio de
Janeiro, v. 12, n. 24, p. 362-379, maio 2017.
LIBÂNEO, J. C. Políticas educacionais no Brasil: desfiguramento
da escola e do conhecimento escolar. Cadernos de Pesquisa, v. 46, n.
159. p. 38-62. jan/mar. 2016.
MAE, Valter Hugo. Contra Mim. Rio de Janeiro: Biblioteca Azul,
2020.
21
APRESENTAÇÃO
Nasci no penúltimo dia de 1984, portanto não participei do
movimento pelas “Diretas já!” nem das demais manifestações em prol
da redemocratização política do Brasil. Ainda assim, não foi menos
frustrante para mim todas as pseudodiscussões decorrentes da
polarização irracional ocorridas no segundo semestre de 2018 quanto
às eleições para presidência da República que resultou na lastimável
vitória de Jair Bolsonaro. Não por acaso, escolhi uma frase do
educador Paulo Freire como uma das epígrafes deste livro (ainda que
seus textos não sejam utilizados como referencial teórico), assumo,
assim, posicionamento político em defesa do profissionalismo
docente, em especial dos professores da Educação Infantil, tão
duramente desrespeitados por esse governo (desgoverno?).
Filha de pais alheios às discussões políticas, tive os primeiros
contatos com pensamentos relativos a esse aspecto no extinto curso
oferecido pelo Centro Específico de Formação e Aperfeiçoamento do
Magistério (Cefam) quando já tinha dezesseis anos, ou seja, ao longo
dos vários anos que cursei o hoje denominado Ensino Fundamental
foi-me negligenciada (não por acaso) uma formação política
(compreendida como atividade humana que permite a convivência
respeitosa entre grupos e pessoas) que possibilitasse a mim, e a outros,
compreender além das aparências dos fenômenos.
Se fosse fato isolado, tal aspecto poderia ser compreendido
como defasagem de formação individual, ocorre, no entanto, que a
negligência quanto à formação política dos alunos parece ter
intenções escusas como a manutenção do status quo. Compreendo
22
que um problema dessa magnitude necessite de múltiplas ações,
dentre as quais modelos de formação inicial e continuada de
professores que permitam formar-se criticamente de maneira a
contribuir com a formação política de seus alunos.
Assim, este livro, resultado de pesquisa acadêmico-científica,
é uma forma de investigar possibilidades de transformar tal realidade
ao refletir sobre o processo formativo inicial de professoras e
professores. Considero que tal transformação ocorre por meio da
superação (por incorporação) do conhecimento de senso comum ao
conhecimento científico. Esse modo de conhecimento possibilita
alteração das relações que os sujeitos estabelecem com a realidade
imediata a partir da apropriação de saberes histórico e socialmente
elaborados.
Apesar do foco ser a formação inicial de professoras e
professores para a Educação Infantil, abordo, também, aspectos da
formação do Pedagogo, visto que o curso de Pedagogia é, atualmente,
o locus de formação desse profissional.
Ao longo do texto, optei por utilizar a primeira pessoa do
singular não como indicação de que a síntese e as análises realizadas
resultam de considerações singulares e/ou individuais, mas como
forma de exercício autoral e de assunção das propostas apresentadas.
O que se segue, portanto, é síntese de múltiplos diálogos (presenciais,
por meio de texto oral, e a distância no tempo e no espaço , por
meio de texto escrito). Apesar de escrito em primeira pessoa, as
considerações apresentadas resultam de conhecimento acumulado
histórica e socialmente.
23
INTRODUÇÃO
Iniciei trajetória como professora do Ensino Superior em
março de 2012 como professor-pesquisador de curso de Pedagogia
vinculado ao Plano Nacional de Formação de Professores da
Educação Básica (Parfor presencial). Permaneci nessa função até
junho de 2014 ministrando aulas referentes às disciplinas Didática I;
Didática II; Educação infantil: cuidar, brincar e educar; Metodologia
da alfabetização I; e Metodologia da alfabetização II.
Nesse início de carreira profissional no Ensino Superior fui
confrontada com realidade didática que conhecia apenas na condição
de aluna de graduação e pós-graduação
1
e, desde então, venho
buscando desenvolver ações didático-pedagógicas que, coerentemente
com os princípios da Teoria Histórico-cultural, contribuam para o
desenvolvimento integral dos alunos (futuros professores) por meio
de apropriações teórico-práticas que resultem em ações que,
efetivamente, contribuam para o desenvolvimento dos alunos com as
quais atuarão, por meio da apropriação da cultura humana elaborada.
Os fundamentos epistemológicos dessa teoria decorrem do
materialismo histórico-dialético marxista a partir do qual o homem é
considero em seus aspectos individuais (biológicos) e sociais
1
Cursei graduação em Pedagogia (2004 a 2007) e mestrado em Educação (2008 a 2010) na
Faculdade de Filosofia e Ciências da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita
Filho” (Unesp) Marília/SP. Em pesquisa de mestrado, investiguei, em perspectiva histórica,
a produção bibliográfica de e sobre o professor paulista Antonio Firmino de Proença (1880-
1926), especialmente a série de livros de leitura de sua autoria. Dentre os aprendizados
decorrentes dessa atividade, destaco o hábito de recorrer às notas de rodapé de página para
explicações complementares ao texto principal. Assim, neste livro, o leitor será convidado a
complementar as informações principais por meio das abundantes notas de rodapé.
24
(culturais). Nesse sentido, o homem é compreendido em processo de
desenvolvimento do qual demandas fatores filo e ontogenéticos
(RIGON; ASBAHR; MORETTI, 2016).
Além dessa experiência profissional, atuei concomitante-
mente como professora de Educação Infantil (entre 2010 e 2016, com
intervalos), na rede pública municipal de ensino de Lins/SP. Nesse
período, pude constatar as lacunas de minha formação acadêmica,
assim como a necessidade de reflexões didáticas elaboradas que
subsidiassem minha atuação como docente em creche e pré-escola
2
.
Para não extrapolar os objetivos desta introdução, não
ampliarei considerações quanto às mudanças ocorridas no projeto
político-pedagógico do curso de Pedagogia da Unesp-Marília/SP após
2006, pois, como se sabe, mudanças significativas ocorreram na
organização desse curso em decorrência da publicação da Resolução
do Conselho Nacional de Educação n
o
. 01, desse ano (BRASIL,
2006). Limito-me a indicar que, no período em que cursei graduação
não eram oferecidas disciplinas obrigatórias referentes à Educação
Infantil, como ocorre atualmente. No quarto ano do curso, o
graduando optava por uma habilitação específica, dentre as quais
optei por “Administração escolar”. Assim, quando iniciei atividades
como professora de Educação Infantil, possuía apenas conhecimentos
preliminares sobre este nível de escolarização, decorrentes do curso de
magistério realizado em nível médio, no Centro Específico de
Formação e Aperfeiçoamento do Magistério (Cefam), na cidade de
Lins/SP, entre 2000 e 2003.
2
Utilizo aspas no termo “pré-escola” por ser essa a denominação oficial à educação
institucional oferecida às crianças de quatro e cinco anos. Considero, entretanto, que o
prefixo “pré” é utilizado equivocadamente, pois encaminha à compreensão de que tais
instituições não são, ainda, escola, diferentemente do que é determinado na Lei de Diretrizes
e Bases da Educação Nacional (LDBN) (BRASIL, 1996) e em outros documentos oficiais.
25
Aprofundei os conhecimentos adquiridos como professora de
Educação Infantil durante a elaboração das aulas que ministrei como
professora da disciplina “Educação Infantil: cuidar, brincar e educar”
(entre fevereiro e junho de 2013), junto ao curso de Pedagogia do
UniSALESIANO, nessa mesma cidade
3
. Tive, então, a oportunidade
de refletir não somente sobre processos educativos para crianças da
Educação Infantil, mas também para futuros professores desse nível
de escolarização, auxiliando-os a se apropriarem de conceitos
científicos sobre a educação da infância, de forma a resultar em ações
de ensino intencionais e planejadas que possam contribuir à formação
integral das crianças com as quais interagirão. Isso evidenciou a
necessidade de conhecimentos específicos sobre a formação do(a)
futuro(a) professor(a) de Educação Infantil.
Dessas experiências, resultaram questões que busco responder
neste livro decorrente de pesquisa acadêmico-científica em nível de
doutorado desenvolvida junto ao Programa de Pós-Graduação em
Educação da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita
Filho” (PPGE-Unesp-Marília/SP), sob orientação da Prof
a
. Dr
a
.
Elieuza Aparecida de Lima e vinculada ao “Grupo de Estudos e
Pesquisa sobre Especificidades da Docência na Educação Infantil”
(Gepedei-Unesp-Marília/SP) e ao Grupo de Pesquisa “Implicações
Pedagógicas da Teoria Histórico-Cultural” vinculados à mesma
universidade. Por meio da pesquisa empreendida, busco contribuir
para a formação inicial de professoras e professores para a Educação
Infantil por meio de princípios decorrentes da Teoria Histórico-
3
Além dessa disciplina, entre março de 2012 e junho de 2014, ministrei aulas referentes às
disciplinas: “Didática I e II”; e “Metodologia da alfabetização I e II”. Desde 2017, como
professora contratada, ministro diversas disciplinas aos graduandos em Pedagogia na mesma
instituição, dentre as quais: “Didática I a IV” e “Metodologia da Matemática nos anos iniciais
do Ensino Fundamental I e II”.
26
Cultural, por considerar que essa corrente teórica apresenta
importantes contribuições para discutir a complexidade do processo
de humanização efetivado por meio de processos educativos
intencionalmente voltados a esse fim.
Cabe destacar que as crianças são seres sociais e que seu
professor necessita de formação específica para lhes garantir a
efetivação de direitos sociais, religiosos, culturais, políticos e peda-
gógicos (BRASIL, 1996). Assim, “Pensar na garantia desses direitos
da criança, em especial a um bom ensino, nos remete à reflexão sobre
a função do professor da infância, cuja atuação implica inten-
cionalidade, preparação teórica e prática e profissionalidade
constituída em cursos de formação inicial e em serviço.” (CASTRO;
LIMA, 2012, p. 130).
Nesse sentido, considero que os resultados apresentados
podem contribuir para a investigação desse processo formativo, visto
que possibilitam refletir sobre princípios orientadores de ensino que
venham a promover o desenvolvimento integral do sujeito (aluno de
graduação e crianças com as quais interagirá). Dentre tais resultados,
a investigação quanto à atividade principal” (ELKONIN, 2017)
guia do desenvolvimento humano em cada fase da vida pode indicar
possibilidades profícuas à formação da professora e do professor para
a Educação Infantil.
As características da “atividade profissional/de estudo”
(“atividade guia” durante a juventude) coincidem com as da
“atividade de estudo”, embora os motivos não sejam os mesmos. Por
volta dos sete anos, a atividade guia do desenvolvimento da criança é
a “atividade de estudo” porque, a partir da entrada no primeiro ano
do Ensino Fundamental, “[...] a criança sente-se, talvez pela primeira
vez, ocupada com um assunto muito importante. [...] O próprio lugar
de sua atividade na vida adulta, na vida ‘verdadeiramente real’ que a
27
cerca, torna-se diferente.” (LEONTIEV, 2016, p .61). A partir desse
momento do desenvolvimento, a criança almeja compreender os
fenômenos sociais, naturais etc. de maneira mais detalhada do que
fizera até então. A partir desse novo motivo, passa a buscar (quando
orientada para tal) respostas que demandam um novo tipo de
atividade, a de estudo.
Em situação adequada de ensino, tal atividade acompanha o
indivíduo durante toda a vida posterior, mas, durante a juventude, os
motivos que lhe impulsionam sofrem alterações. Quando o sujeito
inicia um curso em nível superior (graduação), o estudo assume
função de preparação ao mundo do trabalho assalariado
4
.
Por isso, as considerações de Davydov
5
(1987; 2019a; 2019b)
sobre “atividade de estudo”, embora enfatizem o processo de
desenvolvimento infantil, podem esclarecer também o processo de
apropriação de conhecimentos por parte das professoras e dos
professores em formação inicial. Como destaca Libâneo (2004a, p.
135), “Davydov não investigou diretamente a aplicação de sua teoria
à formação de professores, mas sendo seu objetivo aprofundar a
compreensão da aprendizagem como atividade, isso nos permite
compreender a formação de professores como aprendizagem.”. Ainda
segundo Libâneo (2004a, p. 135, grifo meu),
[...] de acordo com a teoria do ensino desenvolvimental, o
desenvolvimento ocorre quando o ensino é formulado em
4
O termo trabalho foi adjetivado, ao longo deste livro, como forma de distingui-lo do
conceito de trabalho para Marx (1983), a saber, atividade humana por meio da qual o
homem transforma a natureza externa a ele, ao mesmo tempo que modifica sua própria
natureza.
5
O nome desse pesquisador é grafado de diferentes formas nas publicações consultadas:
Davydov, Davýdov, Davidov e Davídov. Opto pela grafia “Davydov”. Nas citações literais e
nas referências bibliográficas mantenho a grafia utilizada pelo autor ou editor do texto.
28
relação à atividade principal dos alunos. Nesse caso, os autores
russos que estudam a periodização dos estágios do
desenvolvimento entendem que, para alunos que concluíram a
educação básica, a atividade de aprendizagem já foi adquirida e
não é mais a atividade principal. Entretanto, Chaiklin
precisamente desenvolveu pesquisa para comprovar que a análise
de contdo ainda é necessária para estudantes pós-educação
sica e o ensino pode ser desenvolvimental, mesmo que a
atividade principal desses alunos não seja a atividade de
aprendizagem, e que o papel e o significado da análise do assunto
podem ser melhor apreciados tendo como pano de fundo a
atividade de aprendizagem
6
. Ou seja, a atividade de
aprendizagem ainda ocupa uma boa parte do trabalho desses
alunos.
Assim, investigar as contribuições que a “atividade
profissional/de estudo” pode oferecer à formação inicial do professor
para a Educação Infantil é justificada pela evidência quanto à
constatação de que:
Na produção acadêmica brasileira observa-se uma lacuna entre
as teorias que versam sobre a aprendizagem e aquelas que, por
princípio, deveriam se ocupar da organização didática da
atividade de ensino. Assim, considerando que a função principal
da escola é a socialização do conhecimento produzido
historicamente e consolidado nas diversas áreas do conheci-
mento, entendemos que o domínio desses conteúdos e dos meios
de favorecer sua apropriação pelos estudantes são conhecimentos
necessários ao professor. (SFORNI, 2015, p. 378).
Como defende Libâneo (2004a), a concepção histórico-social
da aprendizagem, especialmente relacionada à “Teoria do ensino
6
Compreendida como “atividade de estudo”.
29
desenvolvimental” (LIBÂNEO, 2004a), proposta por Davydov, e a
teoria da atividade, proposta por Leontiev, são contribuições teóricas
relevantes à formação dos professores, porque:
Essas teorias podem motivar especialmente aqueles investiga-
dores dos campos da didática e da formação de professores
convencidos da relevância da formação teórica dos professores,
da necessidade de adquirirem maior efetividade no uso das
instrumentalidades do trabalho docente e da importância dos
contextos culturais e institucionais em que se dão o ensino e a
aprendizagem. (LIBÂNEO, 2004a, p. 115).
O objeto em análise é amplo e complexo, assim, para atingir
os objetivos estabelecidos, foi necessário realizar recorte temporal à
revisão bibliográfica empreendida. Estabeleci, então, como marcos de
pesquisa os anos 2006 e 2019 em decorrência do primeiro ser o ano
de publicação da Resolução do CNE/CP n
o
. 01, que define as DCN-
Pedagogia (BRASIL, 2006a) e o segundo ser o ano de início da
pesquisa e o ano de publicação da Resolução do CNE/CP nº. 2, que
define novas Diretrizes Curriculares Nacionais para a Formação
Inicial de Professores para a Educação Básica e institui a Base
Nacional Comum para a Formação Inicial de Professores da
Educação Básica (BNC-Formação) (BRASIL, 2019).
Ambos os documentos legais são relevantes à pesquisa
desenvolvida, pois, como se sabe, o curso de licenciatura em
Pedagogia é definido no artigo 4º. das DCN-Pedagogia (BRASIL,
2006a) como locus da formação inicial da professora e do professor
para a Educação Infantil.
O curso de Licenciatura em Pedagogia destina-se à formação de
professores para exercer funções de magistério na Educação
30
Infantil e nos anos iniciais do Ensino Fundamental, nos cursos
de Ensino Médio, na modalidade Normal, de Educação
Profissional na área de serviços e apoio escolar e em outras áreas
nas quais sejam previstos conhecimentos pedagógicos. (BRASIL,
2006a, p. 11, grifo meu).
Ainda nesse documento estabelece-se, no artigo 5º. que:
O egresso do curso de Pedagogia deverá estar apto a:
[...]
II - compreender, cuidar e educar crianças de zero a cinco anos,
de forma a contribuir, para o seu desenvolvimento nas
dimensões, entre outras, física, psicológica, intelectual, social
[...]. (BRASIL, 2006a, p. 11).
Nesse sentido, explicita-se a compreensão quanto à ação
docente intencional e organizada por parte do professor do curso de
Pedagogia que possibilite ao aluno (futuro docente da Educação
Infantil) empreender processo educativo junto às crianças com as
quais atuará.
Como marco temporal final à pesquisa bibliográfica,
estabeleci o ano de 2019, pelos motivos indicados. A Resolução do
CNE/CP nº. 2, de 2019 (BRASIL, 2019) está demandando
7
reorganização nos cursos de licenciatura (no geral, e da Pedagogia, em
7
Quando da promulgação dessa resolução, em 2019, fixou-se o prazo de dois anos, a partir
de sua publicação, para a implantação, por parte das Instituições de Ensino Superior (IES),
das alterações definidas e instituídas por esse instrumento legal (BRASIL, 2019, p. 12). Em
2022, entretanto, por conta dos “[...] prejuízos institucionais inerentes às medidas necessárias
de afastamento compulsoriamente determinado pela Pandemia da COVID-19, no início do
ano de 2020 e que, em diversas medidas e variadas formas, ainda perdura.” (BRASIL, 2021,
p. 01) e dos diversos posicionamentos de instituições de Ensino Superior enviados ao CNE
(BRASIL, 2021, p. 01) ampliou-se esse prazo para três anos. Assim, tais alterações ainda estão
em curso.
31
particular), inclusive acarretando alterações à formação inicial de
professoras e professores para a Educação Infantil.
Uma das alterações decorrentes desse documento legal é o que
alguns grupos consideram como:
[...] o engessamento e a bipartição do processo formativo,
especialmente no curso de Pedagogia, com a formação separada
entre Educação Infantil e Anos Iniciais do Ensino Fundamental,
expressa no retorno das habilitações, conforme Grupo II Art.
13:
Formação de professores multidisciplinares Educação
Infantil (mínimo 1.600 horas);
Formação de professores multidisciplinares Anos Iniciais do
Ensino Fundamental (mínimo 1.600 horas);
Gestão Escolar (400 horas o que implica em ampliar o
curso em mais um semestre letivo Art. 22). (FORUM...,
2021, não paginado).
Isso posto, elegi como objeto de pesquisa a formação inicial
de professoras e professores para a Educação Infantil formulação
recorrentemente citada com objetivo de demarcar o que considero
campo de pesquisa em constituição. A partir do estabelecimento desse
objeto de pesquisa busquei responder a seguinte questão norteadora:
quais as contribuições da “atividade profissional/de estudo” à
formação inicial da professora e do professor para a Educação Infantil?
A hipótese norteadora de pesquisa foi a de que a “atividade
profissional/de estudo” pode contribuir para a formação inicial de
professoras e professores para a Educação Infantil porque possibilita
compreender período importante do desenvolvimento humano, ou
seja, compreender como essa atividade contribui para o
desenvolvimento dos graduandos em Pedagogia (atual locus de
formação inicial desses futuros profissionais). Pautar a formação em
32
destaque em conhecimentos sobre as características dessa atividade-
guia permite investigar o desenvolvimento do pensamento teórico da
futura e do futuro professor de creche e “pré-escola, requerendo a
apropriação de princípios generalizados de ação sobre os processos de
ensino e de aprendizagem.
Essa hipótese decorre do conceito “atividade profissional/de
estudo” considerada por Elkonin (2017) a atividade que guia o
desenvolvimento humano durante a juventude, ou seja, a partir dos
18 anos de idade. O conceito “atividade de estudo”, proposto por
Davydov (1987; 1988; 2019a; 2019b), também pode contribuir à
formação inicial de professoras e professores para a Educação Infantil
à medida que possibilita a superação de ações pedagógicas tradicionais
segundo as quais se privilegia conhecimentos empíricos em
detrimento de conhecimentos teóricos.
Para Libâneo (2004b, p. 12),
[...] Davydov destaca a peculiaridade da atividade da
aprendizagem, entre outros tipos de atividade, cujo objetivo é o
domínio do conhecimento teórico, ou seja, o domínio de
símbolos e instrumentos culturais disponíveis na sociedade,
obtido pela aprendizagem de conhecimentos das diversas áreas
do conhecimento. Apropriar-se desses conteúdos das ciências,
das artes, da moral significa, em última instância, apropriar-se
das formas de desenvolvimento do pensamento. Para isso, o
caminho é a generalização conceitual, enquanto conteúdo e
instrumento do conhecimento.
Nesse sentido, Libâneo (2004a, p. 136, grifo meu) destaca
que:
Aplicando o ensino desenvolvimental à formação de professores,
a atividade de aprendizagem da profissão consiste em que os
professores adquiram conhecimento teórico, isto é, que
33
reproduzam conscientemente as compreensões teóricas
desenvolvidas em uma matéria, de modo a poder explicar as
importantes relações estruturais que caracterizam essa matéria.
Com efeito, se a atividade principal do futuro professor é a de
promover a atividade de aprendizagem de seus futuros alunos,
nada mais oportuno que o professor aprenda sua profissão na
perspectiva em que irá ensinar aos seus alunos. Além disso,
sendo correto entender que a base do ensino desenvolvimental é
a estrutura psicológica da atividade, com base na qual são criadas
tarefas para melhor promover a aprendizagem, será importante
estabelecer as características da atividade profissional do
professor, de modo que isso se constitua como referência para o
currículo.
A efetivação desse projeto de formação ocorre por meio dos
fundamentos indissociáveis do Ensino Superior: ensino-pesquisa-
extensão (MARTINS, 2008). Nesse sentido, a organicidade desses
processos:
[...] pressupõe a formação superior como síntese de três grandes
processos, quais sejam: processos de transmissão e apropriação do
saber historicamente sistematizado, a pressupor o ensino;
processos de construção do saber, a pressupor a pesquisa e os
processos de objetivação ou materialização desses conheci-
mentos, a pressupor a intervenção sobre a realidade e que, por
sua vez, retornam numa dinâmica de retro-alimentação do
ensino e da pesquisa. (MARTINS, 2008, p. 77).
Sem desconsiderar tal indissociabilidade, privilégio os
aspectos relativos ao ensino em decorrência dos limites temporais
estabelecidos para o término da pesquisa. Considero, todavia, que seja
necessário ampliar a análise para os demais processos (pesquisa e
34
extensão
8
) como forma de buscar compreender o objeto em análise
em sua totalidade. Tal tarefa demanda, por sua vez, trabalho de outros
pesquisadores, em decorrência da amplitude do objeto investigado.
Em relação ao processo de ensino, explicito que:
Pelos processos de transmissão e apropriação do conhecimento
coloca-se o formando em relação com o produto da ciência, com
as teorias e tecnologias historicamente elaboradas. Nesses
processos, o professor desempenha o papel insubstituível de
ensinar, conduzindo os alunos em assimilações cada vez mais
complexas do acervo científico-cultural e metodológico-técnico
necessários aos domínios da realidade da qual faz parte como ser
social, e sobre a qual irá intervir. Assim, o bom ensino é aquele
que promove a construção de conhecimentos (que não se
identificam apenas com informações) convertidos em capacidade
de atuação [...]. (MARTINS, 2008, p. 77-78).
Isso posto, estabeleci como objetivo geral de pesquisa
compreender quais as contribuições da “atividade profissional/de
estudo” à formação inicial de professoras e professores para a
Educação Infantil. Para tanto, defini como objetivos específicos:
8
Um instrumento legal a ser analisado, por exemplo, é a Resolução n
o
. 07, de 18 de dezembro
de 2018, que estabelece as Diretrizes para a Extensão na Educação Superior Brasileira e
regimenta o disposto na Meta 12.7 da Lei nº. 13.005/2014, que aprova o Plano Nacional de
Educação PNE 2014-2024. No artigo 4º. dessa resolução, determina-se que “As atividades
de extensão devem compor, no mínimo, 10% (dez por cento) do total da carga horária
curricular estudantil dos cursos de graduação, as quais deverão fazer parte da matriz curricular
dos cursos” (BRASIL, 2018a, p. 49). Assim, parte considerável dos cursos de graduação
necessitam ser destinadas a tarefas extensionistas, o que demanda reflexões para que essas
sejam realizadas de maneira adequada e que, de fato, promovam “[...] a interação
transformadora entre as instituições de ensino superior e os outros setores da sociedade, por
meio da produção e da aplicação do conhecimento, em articulação permanente com o ensino
e a pesquisa.” (BRASIL, 2018a, p. 49).
35
- conhecer e analisar a produção bibliográfica brasileira sobre
formação inicial de professoras e professores para a Educação
Infantil publicada/publicizada
9
entre 2006 e 2019;
- investigar propostas brasileiras à formação inicial de
professoras e professores para a Educação Infantil,
especialmente as decorrentes da Teoria Histórico-Cultural; e
- compreender o conceito “atividade de estudo” e as principais
características da “atividade profissional/de estudo”.
A técnica de pesquisa utilizada foi a bibliográfica empreendida
por meio dos seguintes procedimentos:
a) Localização das fontes bibliográficas;
b) Seleção das fontes bibliográficas com base em critérios
de exclusão e inclusão; e
c) Análise das fontes bibliográficas eleitas como corpus de
pesquisa:
c.1) leitura das fontes;
c.2) fichamento dos textos eleitos como corpus de pesquisa
10
;
c.3) seleção das informações relevantes à pesquisa;
c.4) categorização das informações selecionadas; e
c.5) análise dos textos mediante categorias estabelecidas.
A etapa de leitura das fontes bibliográficas foi desenvolvida
com base nas indicações de Salvador (1986 apud LIMA; MIOTO,
2007, p. 41), a saber: leitura de reconhecimento do material
bibliográfico; leitura exploratória do material; leitura seletiva por
9
Utilizo o verbo publicar para livros, capítulos de livros e artigos científicos e o verbo
publicizar para teses e dissertações.
10
Registro meus agradecimentos à pesquisadora e amiga Dr
a
. Kátia de Moura Graça Paixão
pela sugestão de organizar os dados de pesquisa em quadro síntese.
36
meio de critérios estabelecidos; leitura reflexiva ou crítica
11
; e leitura
interpretativa.
A pesquisa bibliográfica foi realizada mediante textos
publicados em livros, capítulos de livros e artigos científicos e
publicizados em teses e dissertações (como apresento no segundo
capítulo deste livro). Para análise desses textos, foi utilizada
metodologia de “análise da configuração textual” a qual consiste em
analisar:
[...] o conjunto de aspectos constitutivos de determinado texto,
os quais se referem: às opções temático-conteudísticas (o quê?) e
estruturais formais (como?), projetadas por um determinado
sujeito (quem?), que se apresenta como autor de um discurso
produzido de determinado ponto de vista e lugar social (de
onde?) e momento histórico (quando?), movido por certas
necessidades (por quê?) e propósitos (para quê), visando a
determinado efeito em determinado tipo de leitor (para quem?)
e logrando determinado tipo de circulação, utilização e
repercussão [...]. (MORTATTI, 2000, p. 31).
A partir desses procedimentos, busquei conhecer a produção
bibliográfica brasileira sobre formação inicial de professoras e
professores para a Educação Infantil publicada/publicizada entre
2006 e 2019. Dessas ações, resultou o instrumento de pesquisa
12
11
Na concepção marxiana, crítica não é “[...] se posicionar frente ao conhecimento existente
para recusá-lo ou, na melhor das hipóteses, distinguir nele o ‘bom’ do ‘mal’. Em Marx, a
crítica do conhecimento acumulado consiste em trazer ao exame racional, tornando-os
conscientes, os seus fundamentos, os seus condicionamentos e os seus limites ao mesmo
tempo em que se faz a verificação dos conteúdos desse conhecimento a partir dos processos
históricos reais.” (PAULO NETTO, 2011, p. 18).
12
A expressão “instrumento de pesquisa” é tomada de empréstimo da área de arquivologia,
segundo a qual é compreendida como ferramenta utilizada “[...] para descrever um arquivo,
ou parte dele, tendo a função de orientar a consulta e de determinar com exatidão quais são
37
intitulado Produção bibliográfica brasileira sobre formação inicial
de professoras e professores para a Educação Infantil em curso de
Pedagogia (2006-2019) (GAZOLI, 2021). Por meio da elaboração
desse instrumento foi possível organizar o conjunto de referências de
textos localizados durante a fase de localização das fontes
bibliográficas sobre o objeto em análise. Tais referências foram
elaboradas de acordo com a Norma Brasileira de Referências (NBR
6023), da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT-2018)
(ASSOCIAÇÃO..., 2018)
13
.
Recorri a citações literais como forma de dar voz aos
pesquisadores citados. Em alguns casos, tais citações são longas pois
considerei necessário manter a argumentação do autor na íntegra de
forma a contribuir com a compreensão do leitor e sustentar a
argumentação empreendida. Assim, utilizei com moderação o recurso
à paráfrase, pois busquei primeiro apresentar literalmente as
considerações dos autores para, em seguida, empreender análise sobre
elas.
Dos procedimentos realizados foi possível formular a tese de
que a “atividade profissional/de estudo” contribui à formação inicial
de professoras e professores para a Educação Infantil à medida que
e onde estão os documentos. [...] Os instrumentos de pesquisa referem-se ao acesso e ao
controle de um acervo, geralmente permanente, e com pelo menos uma identificação ou
organização mínima. Têm como função principal disponibilizar documentos para consulta.
Apresentam-se na forma de guias, inventários, catálogos e índices [...]. (LOPES, 2002, p. 13-
14).
13
Parte do formato desse instrumento decorre de aprendizagens ocorridas durante pesquisas
em nível de iniciação científica (em 2007, como graduanda do curso de Pedagogia) e
mestrado (em Educação, entre 2008 e 2010), desenvolvidas junto ao PPGE-Unesp-
Marília/SP e sob orientação da Prof
a
. Dr
a
. Maria do Rosário Longo Mortatti, a quem registro
meus agradecimentos. Dessas aprendizagens resultou, dentre outros, o texto intitulado:
“Bibliografia de e sobre Antonio Firmino de Proença: um instrumento de pesquisa”
(GAZOLI, 2010).
38
possibilita o desenvolvimento do pensamento teórico dos graduandos
essencial à compreensão dos fenômenos educativos por meio de
generalização, abstração, análise e síntese. Assim, têm a oportunidade
de desenvolver a capacidade de agir sobre tais fenômenos para além
de suas aparências imediatas, estabelecendo princípios generalizados
de ação mediados por abstrações teóricas. O desenvolvimento do
pensamento teórico possibilita articular teoria e prática, pois o agir é
subsidiado pelo pensar que considera, não apenas, o fenômeno
observável, mas o conjunto de relações que o constitui. Em síntese,
defende-se a formação inicial de professoras e professores para a
Educação Infantil alicerçada nos princípios da “atividade
profissional/de estudo”, a qual possibilita ao futuro profissional
condições de conceber e vivenciar a unidade teoria e prática, atuando
a partir de princípios teóricos decorrentes das ações de generalização,
abstração, análise e síntese.
Como decorrência da pesquisa realizada, apresento, neste
livro, materialização discursiva dos dados localizados, selecionados e
analisados. Assim, no Capítulo 1, apresento os conceitos operativos
utilizados, pois, como estes não são neutros, mas definidos a partir de
posicionamentos filosóficos, epistemológicos, históricos etc.,
necessidade de explicitá-los a partir da matriz teórica eleita.
Na sequência (Capítulo 2), apresento a produção
bibliográfica brasileira sobre formação inicial de professoras e
professores para a Educação Infantil publicada/publicizada entre
2006 e 2019. No Capítulo 3, analiso essa produção de forma a situar
o objeto de pesquisa e destacar os limites e as contribuições dessa
formação, nesse período.
No Capítulo 4, abordo as propostas brasileiras a essa
formação, especialmente as decorrentes da Teoria Histórico-Cultural
como forma de encaminhar a discussão para as contribuições da