A autora possui Graduação em Licen-
ciatura (2021) e Bacharelado (2022) pela
Faculdade de Ciências, Tecnologia e
Educação (FCTE - UNESP) - Campus
de Ourinhos. Atualmente, está cursando
o Mestrado em Educação na Faculdade
de Filosoa e Ciências (FFC - UNESP)
- Campus de Marília. Tem experiência
na área de Geograa, com ênfase no en-
sino geográco, atuando principalmente
nos seguintes temas: atividades geográ-
cas extracurriculares e a Didática da Ge-
ograa. Participa do grupo de pesquisa
nomeado Núcleo de pesquisa em ensino
de Geograa: articulação entre a uni-
versidade e a escola de Educação Básica,
situado na Faculdade de Ciências, Tec-
nologia e Educação (FCTE - UNESP)
- Campus de Ourinhos. Também, parti-
cipa do Grupo de Estudos e Pesquisas so-
bre Cultura e Instituições Educacionais
(GEPCIE). O e-mail para contato é:
gabriele.barbosa@unesp.br.
O livro está dividido em duas
partes. A primeira corresponde aos
aspectos históricos da Geograa es-
colar, incluindo a relação entre a Ge-
ograa moderna e os princípios da
Escola Nova. A segunda parte traz as
orientações escolanovistas sobre o uso
dos métodos de ensino em Geograa,
as orientações metodológicas desti-
nadas aos professores de Geograa,
contidas no texto “Notas de Didática
da Geograa” (1960), o estudo diri-
gido e a aula expositiva, a técnica da
observação direta, escrita por Eloísa
de Carvalho, em 1960 e a atualidade
das técnicas de ensino de Geograa
que envolvem a saída à campo. Os te-
mas indicam que houve o destaque à
época para as propostas de inovações
pedagógicas vindas da Escola Nova,
envolvendo as práticas de ensino, as
atividades extracurriculares e os re-
cursos didáticos, enquanto elementos
mediadores no processo de aprendi-
zagem dos conceitos geográcos.
METODOLOGIAS DE ENSINO DE GEOGRAFIA NO PERÍODO ESCOLANOVISTA (1960)
METODOLOGIAS DE ENSINO
DE GEOGRAFIA NO PERÍODO
ESCOLANOVISTA (1960)
Gabriele Barbosa Luiz
Programa PROEX/CAPES:
Auxílio 0039/2022
Processo Nº 23038.001838/2022-11
Gabriele Barbosa Luiz
Neste livro, Gabriele Barbosa Luiz apresenta o contexto escolar
relacionado a metodologia do ensino de Geograa em decor-
rência da inuência do movimento educacional da Escola Nova.
Através disso, podemos compreender os variados aspectos in-
dicados para a intervenção do ensino de Geograa nas escolas,
principalmente ao processo ativo de construção do conhecimen-
to, auxiliando na busca de outros caminhos para os problemas
do presente e compactuando com o avanço da prossão docente.
Também, dispõe de uma fundamentação teórica, com as orien-
tações de prossionais que trouxeram as experiências necessárias
para a garantia da formação de alunos autônomos no período
escolanovista, bem como a demonstração dessas características
na atualidade, contando com alguns exemplos realizados duran-
te a ação docente. Dessa forma, tem-se uma contribuição para a
área da Educação.
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METODOLOGIAS DE ENSINO DE GEOGRAFIA
NO PERÍODO ESCOLANOVISTA (1960)
Gabriele Barbosa Luiz
GABRIELE BARBOSA LUIZ
METODOLOGIAS DE ENSINO DE GEOGRAFIA NO
PERÍODO ESCOLANOVISTA (1960)
Marília/Oficina Universitária
São Paulo/Cultura Acadêmica
2024
UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA
FACULDADE DE FILOSOFIA E CIÊNCIAS FFC
UNESP - campus de Marília
Diretora
Dra. Claudia Regina Mosca Giroto
Vice-Diretora
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Conselho Editorial
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Cláudia Regina Mosca Giroto
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Rosane Michelli de Castro
Conselho do Programa de Pós-Graduação em Educação -
UNESP/Marília
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Alonso Bezerra de Carvalho
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Daniela Nogueira de Moraes Garcia
Pedro Angelo Pagni
Auxílio Nº 0039/2022, Processo Nº 23038.001838/2022-11, Programa PROEX/CAPES
Parecerista: Maria do Carmo Monteiro Kobayashi (UNESP - Faculdade de Ciências - Departamento de
Educação).
Capa: Imagem gratuita de Ondřej Šponiar por Pixabay
Ficha catalográfica
Luiz, Gabriele Barbosa.
L953m Metodologias de ensino de geografia no período escolanovista (1960) / Gabriele
Barbosa Luiz. Marília : Oficina Universitária ; São Paulo : Cultura Acadêmica,
2024.
87 p. :il.
CAPES
Inclui bibliografia
ISBN 978-65-5954-476-9 (Impresso)
ISBN 978-65-5954-477-6 (Digital)
DOI: https://doi.org/10.36311/2024.978-65-5954-477-6
1. Ensino - Metodologia. 2. Geografia Estudo e ensino 1960-1969. 3. Escola
nova. I. Título.
CDD 370.150
Catalogação: André Sávio Craveiro Bueno CRB 8/8211
Copyright © 2024, Faculdade de Filosofia e Ciências
Editora afiliada:
Cultura Acadêmica é selo editorial da Editora UNESP
Oficina Universitária é selo editorial da UNESP - campus de Marília
“Não há ensino sem pesquisa e pesquisa sem ensino”
(FREIRE, 1996, p. 32).
SUMÁRIO
Prefácio | Márcia Cristina de Oliveira Mello......................................9
Introdução....................................................................................11
1. As orientações escolanovistas sobre os métodos de ensino em
Geografia......................................................................................25
1.1. Eloísa de Carvalho: os aspectos da vida e da obra......................37
1.2. As orientações metodológicas destinadas aos professores de
Geografia, contidas no texto “Notas de Didática da Geografia”
(1960)...........................................................................................49
1.3. O Estudo dirigido e a aula expositiva.......................................57
1.4. A técnica da observação direta, escrita por Eloísa de Carvalho,
em 1960........................................................................................63
1.5. A atualidade das técnicas de ensino de Geografia que envolvem a
saída à campo................................................................................71
Considerações finais......................................................................79
Referências Bibliográficas..............................................................81
9
Prefácio
É com intenso orgulho que apresento este livro de Gabriele
Barbosa Luiz que traz os resultados de pesquisa realizado junto ao
Núcleo de Pesquisa em Ensino de Geografia da FCTE/UNESP, com
o auxílio da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo
(FAPESP).
A autora apresenta alguns dos aspectos da história do Ensino
de Geografia no período da Escola Nova brasileira, momento de
intensa produção sobre as práticas pedagógicas, especialmente
desenvolvidas por professores e professoras, dentre eles e elas
destacou-se a geógrafa Eloísa de Carvalho.
Dentre as fontes documentais, Gabriele apresenta a carta
escrita por Eloísa de Carvalho na década de 1940, quando a professora
buscava um lugar ao sol no campo pedagógico, escolhendo com
coragem o Ministro da Educação à época como interlocutor.
Os resultados da pesquisa dão voz a uma professora de
Geografia, representativa de um dos sujeitos ocultos das práticas
pedagógicas, cujas histórias foram muitas vezes silenciadas, assim
como de tantas mulheres professoras que atuaram no passado recente
no campo educacional brasileiro. Suas ideias representam fatos que
aconteceram socialmente, mas que certamente aconteceram
anteriormente ou simultaneamente no campo cultural, já que os
silêncios podem significar que debates foram abandonados ou
ocultados, e que agora ganham evidência nas pesquisas cujo percurso
https://doi.org/10.36311/2024.978-65-5954-477-6.p9-10
10
teórico e metodológico se alinham à pesquisa de fundo histórico
desenvolvida com seriedade por Gabriele.
Assim, a autora revela aspectos das práticas de ensino de
Geografia que mexem com a gênese das orientações didáticas
destinadas aos professores, quando foram fortemente marcadas pelo
uso de recursos didáticos e processos de ensino ativos, que
acrescentaram outras variáveis possíveis ao processo ensino-
aprendizagem, não ingenuamente.
Neste sentido, a leitura do livro possibilitará o encontro com
os sentidos atribuídos à técnica da observação direta, proposta por
Eloísa de Carvalho, que assumiu os princípios pedagógicos da
participação ativa do sujeito na construção de sua aprendizagem. Tais
princípios auxiliam na compreensão de modelos pedagógicos que
marcaram uma época e influenciaram os professores de hoje,
especialmente aqueles que se engajam na luta política pela educação.
Márcia Cristina de Oliveira Mello
Outubro de 2023
11
Introdução
Albuquerque (2011) destacou as características importantes
de dois momentos do percurso histórico da constituição da Geografia
como disciplina escolar no Brasil. O primeiro correspondeu a
constituição do saber escolar geográfico e a institucionalização da
disciplina. O segundo esteve relacionado a articulação entre as ideias
da Geografia moderna ou científica e as inovações pedagógicas
propostas pela Escola Nova, especialmente, trazidas pelo professor
Carlos Miguel Delgado de Carvalho (1884-1980).
No primeiro momento, entre a década de 1830 e 1910, a
disciplina Geografia se compôs com os propósitos e as finalidades
específicas, de acordo com o papel da escola da época e influenciada
pela abordagem da Geografia clássica. As práticas escolares da
Geografia envolviam os métodos, os conteúdos e os materiais
didáticos que priorizassem uma abordagem geográfica fundada em
nomenclaturas, referente aos países e as cidades estrangeiras e tinham
a memória como o centro do processo de ensino. Um marco
importante daquela época foi a legitimação da Geografia como
disciplina escolar, com a criação do Colégio Pedro II, em 1837, cujo
modelo pedagógico orientou o currículo das escolas em nosso país
(Albuquerque, 2011).
Nas primeiras décadas do século XX, houve a divulgação dos
preceitos da Escola Nova no Brasil, “[...] abarca o período entre 1911
e a década de 1930 [...]” (Albuquerque, 2011, p. 21). Na mesma
época, tivemos a influência da recém-criada Geografia moderna no
12
país e a sua articulação com a Pedagogia científica, sucedendo a
institucionalização de uma Geografia acadêmica, com a finalidade de
formar professores para o então ensino secundário. Sequencialmente,
foram criados os cursos superiores de Geografia e História, que
possibilitaram uma relação com os debates na academia, interferindo
diretamente na elaboração do currículo e na política de formação dos
professores, definindo então um novo olhar sobre o ensino de
Geografia.
Delgado de Carvalho contribuiu significativamente para que
a Geografia se renovasse do ponto de vista institucional, teórico e
metodológico, no contexto da introdução da Geografia moderna na
escola brasileira. A meta do autor era trazer as inovações para os
professores, nas abordagens dos conteúdos e das metodologias, por
meio de uma orientação científica que articulasse a Geografia e a
Pedagogia.
No que se referem aos instrumentos, as técnicas e os recursos
didáticos para o ensino de Geografia, Delgado de Carvalho foi
ampliando, a partir de seu manual de ensino Methodologia do ensino
geographico: introducção aos estudos de Geographia moderna (1925),
as possibilidades de usos das representações gráficas; da observação
sistemática; da orientação pelo professor do local ou objeto a ser
representado; da leitura de mapas - contribuindo na explicação do
texto geográfico; de figuras ou gráficos; do diagrama; do cartograma;
do estereograma; e da visualização efetiva dos acidentes geográficos ou
a visualização das representações sólidas; am dos recursos auxiliares
do mapa e do texto geográfico, que abrangiam as gravuras, as
fotografias, os cartões postais, as projeções fixas e as fitas
cinematográficas.
13
A proposta de renovação pedagógica das escolas brasileiras do
início do século XX teve proximidade com a Pedagogia de Dewey
(1934-2001), que influenciou diretamente na elaboração do currículo
de formação docente, valorizando o contato entre a teoria e a prática,
tendo o educando como um elemento central da aprendizagem.
Dewey considerou, em suas propostas, os resultados das pesquisas das
ciências experimentais e a constituição de uma Filosofia da Educação.
As suas ideias tiveram uma grande importância no debate pedagógico
e influenciaram as propostas curriculares.
Uma intervenção marcante da época, do ponto de vista da
ciência geográfica, foi introduzida por Pierre Monbeig (1908-1987),
Aroldo de Azevedo (1910-1974) e Maria Conceição Vicente de
Carvalho (1906-2002). Este grupo de professores e alunos da
Universidade de São Paulo (USP) fizeram parte de uma comissão,
formada pela Associação dos Geógrafos Brasileiros (AGB), para
redigir uma proposta contendo os conteúdos, as orientações
metodológicas e as idealizações para o currículo de Geografia na escola
secundária, no ano de 1935. Eles “[...] contribuíram para a criação do
currículo, introduzindo interpretações científicas sobre “o que’’
ensinar e “como” ensinar os conteúdos geográficos [...] uma
renovação quanto ao método e análise dos fatos geográficos(Mello;
Cuani Junior, 2020, p. 7).
Monbeig, Azevedo e Carvalho estabeleceram uma
importância aos aspectos psicológicos no processo de aprendizagem
do aluno. A aprendizagem deveria ocorrer de modo gradativo e
paciente, considerando a realidade do aluno e conforme as abstrações
fossem sendo codificadas, a complexidade dos assuntos poderia ser
aumentada. A seleção de conteúdos deveria ocorrer na intenção de
que os alunos se sentissem motivados ao estudo geográfico, com a
14
busca da integração dos elementos físicos, humanos, culturais e o
incentivo aos alunos no interesse pelos estudos em nível superior.
Assim, seria “[...] garantido ao estudante uma formação cultural e
reflexiva sobre as questões que abrangem a sociedade e o espaço [...]”
(Mello; Cuani Junior, 2020, p. 11).
Esta proposta de currículo, caracterizada pela orientação
escolanovista, foi elaborada entre o otimismo pedagógico e o
patriotismo nacionalista, já que “Na década de 1930, com as
mudanças sociais e econômicas que o Brasil passava, as relações
pedagógicas também se moldaram para atender as necessidades de
uma ascendente economia industrial(Mello; Cuani Junior, 2020, p.
13).
Ainda, segundo Castro (1967), a fundamentação psicológica
das Ciências da Educação e a sua orientação sistemática representaram
a base para se entender o desempenho escolar. Desta forma,
Os problemas fundamentais da Didática referem-se aos objetivos
da atividade escolar, aos conteúdos a aprender, à direção técnico-
metodológica da aprendizagem e à função do professor, mas
situando-se todos em relação ao aluno, referem-se à linha
evolutiva de seu desenvolvimento (Castro, 1967, p. 12).
Naquele momento, além de Dewey, foram essenciais as
contribuições de Jean Piaget (1896-1980) e a sua Psicologia genética
para a Didática. Nesse sentido, Piaget ressaltou a gênese das funções
adaptativas dos homens e os mais variados aspectos da evolução
mental da criança. Com Piaget, foi aberto um campo de investigações
sobre o desenvolvimento cognitivo da criança, dispondo de um ponto
de vista integrador na Psicologia, em que procurou demonstrar um
grau de integração entre as etapas do desenvolvimento da inteligência.
15
A Psicologia do desenvolvimento considerava que o estudante seria
um ser em contínua evolução. Toda e qualquer conduta, para Piaget,
poderia ser analisada e compreendida em quatro aspectos: energético,
afetivo, funcional (dinâmico) e cognitivo (estrutural) (Castro, 1967).
Certamente, a Didática do ensino de Geografia foi marcada
pela teoria piagetiana, de base escolanovista, pensada no segundo
momento da história do ensino de Geografia no Brasil, conforme
delimitado por Albuquerque (2011).
Além de Delgado de Carvalho - legítimo representante da
Didática da Escola Nova - Antonio Firmino de Proença (1880-1946)
e João Toledo (1879-1941) debruçavam-se sobre a questão da escolha
de métodos e técnicas de ensino ativos para a Geografia escolar. Eles
tiveram publicados os manuais de ensino Como se ensina Geographia,
de autoria de Proença, e Didactica: nas escolas primárias, de João
Toledo.
Santos (2005) desenvolveu o estudo minucioso sobre esses
manuais de ensino. A pesquisadora destaca que eles estabeleciam
orientações, dentre tantas outras, para o uso de atividades
extracurriculares - aquelas aplicadas antes ou depois das atividades da
sala de aula, em ambiente externo a ela - como a observação dos
acidentes geográficos ao redor da escola e em forma de excursão, assim
como a visualização do pátio, em tabuleiro de areia e chão de terra.
A observação está presente na Geografia desde a antiguidade,
seja ela direta ou indireta, através de relatos de viagens. Desta forma,
a orientação metodológica indicava que “O ensino da Geografia
também deveria ser iniciado pela observação, seja ela direta, na
localidade, seja indiretamente, sobre os lugares longínquos(Santos,
2005, p. 83).
16
As atividades didáticas sugeridas por Carvalho, Proença e
Toledo traziam os exercícios cartográficos, com a utilização de
recursos didáticos. Entre eles, havia a observação dos mapas murais;
as estampas; as gravuras; os cartões postais; o cinematógrafo; a
modelagem; o uso de cadernos com os contornos das cartas; os
esboços cartográficos; os diagramas; os globos; os compêndios; as
monografias; e as lanternas de projeção. Assim, a cartografia auxiliava
na aprendizagem dos contornos das regiões, bem como as suas
posições e as suas distâncias. Também, as lembranças históricas dos
lugares poderiam ser recuperadas através das informações e dos
traçados dos mapas.
De acordo com Santos (2005), Carvalho, Proença e Toledo
avançaram quanto a forma de se ensinar Geografia à época e
criticavam o ensino geográfico tradicional, revelando ser um erro
iniciar o estudo pela análise da sala de aula, sem considerar a relação
com a realidade, transformando a aula de Geografia em uma aula de
linguagem, contendo apenas os termos abstratos e as simbologias.
Para os autores,
O aprendizado, assim, deveria se dar de forma prática, na qual os
alunos deveriam interagir com os materiais que levavam ao
conhecimento e com a natureza [...] deveria se dar sempre através
do concreto, da participação ativa do aluno observando a
natureza ou através da manipulação de materiais auxiliadores do
ensino. Tratava-se de aprender com o próprio esforço (Santos,
2005, p. 109).
Sobre o contexto de produção da Didática da Geografia, de
base escolanovista, Batista (2018a) analisou o movimento pedagógico
da Escola Nova, incluindo os novos métodos de ensino contidos nas
17
premissas do Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova, de 1932. O
pesquisador sustenta que desde a primeira metade do século XX, o
ensino de Geografia foi pensado por um grupo restrito de intelectuais,
que conduziram uma hegemonia pedagógica, com as metodologias
ativas. É a partir desse movimento, que podemos entender muitas
discussões presentes até os dias atuais no discurso da Geografia
escolar, como, por exemplo, a apropriação dessas orientações na Base
Nacional Comum Curricular (BNCC) para a reorganização do
Ensino Médio.
O Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova representou um
marco importante de ruptura na década de 1930, sendo um
documento que prescrevia as transformações pelas quais as
instituições de ensino deveriam passar na época, envolvendo as
temáticas baseadas em valores democráticos, como o laicismo, a
educação gratuita e obrigatória. O Manifesto procurava romper com
o ensino verbalista e a prática docente tradicional, considerando a
educação democrática fundamentada na “hierarquia das capacidades”
(Batista, 2018a). Era apoiado nos estudos científicos e experimentais
das áreas educacionais, considerando a criança como o foco do
processo de ensino, assim como pregava uma reforma urgente na
formação de professores e a sugestão de recursos, conforme “[...] a
imprensa, o disco, o cinema e o rádio(Azevedo et al, 2010, p. 62
apud Batista, 2018a, p. 92).
O planejamento do ensino direcionava a busca de uma
revolução educacional, por meio das metodologias de ensino ativas e
participativas, ligadas a construção de uma nova nação. Portanto,
“[...] muitas das questões colocadas por esse Manifesto agiriam
enquanto distribuidoras dos arranjos argumentativos hegemônicos
nas décadas seguintes acerca da educação brasileira (Batista, 2018a,
18
p. 89). Como consequência, tornou-se responsabilidade conjunta do
estado e dos professores no desenvolvimento de práticas pedagógicas
aproximadas aos ideais de protagonismo do aluno, introduzindo-o no
mundo científico através de sua experiência cotidiana, acrescentando
o conhecimento escolar multidisciplinar e significativo.
Além disso, era constatado também uma insuficiência do
ensino frente as novas demandas sociais, determinando uma
necessidade de melhoria qualitativa e quantitativa para transformar o
Brasil em um país desenvolvido e geopoliticamente poderoso. As
mudanças estruturais de ordem filosóficas e sociais eram necessárias.
As novas propostas incluíam o saber científico, o progresso
econômico e a ordem. “É daí que se postulou o Manifesto como uma
frente de ação, e a Escola Nova como uma forma estratégica de
operacionalidade(Vidal, 2013, n.p apud Batista, 2018a, p. 89).
O ensino deveria ser, então, uma atividade dirigida em
concordância ao desenvolvimento natural, as etapas específicas de
crescimento e a concepção de mundo presente na vida nos alunos,
considerando o tempo e o espaço escolar. Os conteúdos
considerariam a sua natureza “socialmente útil” (Azevedo et al, 2010,
p. 40 apud Batista, 2018a, p. 91), atrelados ao meio vivo e natural,
aos interesses, as necessidades e as atividades dos alunos.
A essência pedagógica para a Escola Nova envolvia, portanto,
o trabalho da criança na sala de aula e em atividades extracurriculares.
Caberia ao professor encontrar as estratégias didáticas para submeter
os conteúdos aos interesses dos alunos, assim como a articulação da
escola ao meio social, a solidariedade, o serviço social e a cooperação.
A nova escola seria guiada pelo alcance das experiências concretas da
vida, seguindo a premissa de que:
19
[...] o aluno aprende pelo trabalho que faz em vista das suas
necessidades; essas são “espontâneas”, “alegres” e “fecundas” e,
transformando-se de acordo com as etapas da evolução
intelectual da idade da criança, que vai se adaptando às demandas
“psicobiológicas do momento” (Batista, 2018a, p. 91).
Ao questionar se houve, de fato, uma aplicação do
escolanovismo em sala de aula, Batista (2018b) argumenta que foram
raros os momentos em que o ensino de Geografia se voltou para si
mesmo e para as suas próprias teorias pedagógicas, com a falta de uma
Filosofia da Geografia escolar, que poderia ter promovido um estudo
atento e permanente desse conhecimento. “Desde a Didática Magna
de Jan Comenius, cujo lema maior seria elaborar um método
universal para ensinar tudo a todos, a autoria docente vem sendo
posta em xeque quase que diariamente (Batista, 2018a, p. 88).
Diante as bases da Pedagogia de Comenius (1592-1670), os
professores foram perdendo a sua autonomia pedagógica,
transformando-se em reprodutores de teorias e metodologias que
outros mais capacitados elaboravam. Assim, a interferência
Comeniana esteve presente na prática pedagógica e “[...] os
professores permaneceram sendo vistos num papel subalterno,
situação intensificada pelas próprias autoridades universitárias
presentes nas Faculdades de Educação. Essas, com efeito, continuam
a responder como o ensino de Geografia deveria ser(Corazza, 1996,
n.p; Alves, 2015, n.p apud BATISTA, 2018a, p. 88).
Por outro lado, na década de 1940, em consonância com o
debate acadêmico escolanovista, foi criado o periódico Boletim
Geográfico, com o intuito de modernizar o pensamento geográfico
brasileiro, consequentemente refletir sobre o processo de ensino e
aprendizagem da Geografia. O periódico operou enquanto veículo de
20
divulgação das informações geográficas e acadêmicas em formato de
Boletim, tendo o seu lançamento em abril de 1943. “[...] essa revista,
de 1943 a 1970, trazia seções específicas destinadas à educação, sendo
a principal delas a “Contribuição ao ensino(Batista, 2018a, p. 94-
95).
O Boletim ganhou fôlego devido “[...] a qualidade dos
materiais apresentados, assim como a rigidez técnica dos conteúdos
descritos, o que, na visão de Préve (1989), demonstrava um respeito
com o professor da Escola Básica e uma preocupação em mantê-lo
atualizado (Ibid., p. 95). Entre os autores colaboradores do
periódico, estavam renomados geógrafos, técnicos e professores.
Neste livro, destacaremos a contribuição de Eloísa de Carvalho.
Complementarmente, o Boletim Geográfico incentivava a
orientação metodológica para a formação de alunos protagonistas e
dinâmicos, que “[...] estudam o meio, propõem soluções para
problemas contiguamente localizados e, é claro, desenvolvem o gosto
pela intervenção” (Ibid., p. 95). Desse modo, alcançou avanços na
expansão da Pedagogia ativa no ensino de Geografia.
Por meio da Pedagogia ativa, as atividades e os recursos
didáticos eram destacados como determinantes no processo de
aprendizagem. A partir disso, nessa perspectiva, estavam incluídas as
excursões geográficas, os estudos dirigidos, a solução dos problemas,
as imagens e os textos jornalísticos. Todos eles estariam repletos de
elementos essenciais para a execução da atividade reflexiva pelos
alunos, induzida pela Pedagogia ativa, envolvendo a dimensão
ilustrativa, heurística e a experimentação.
Os alunos também precisariam observar, analisar, ir a campo,
inovar, criar, difundir, e, se isso não fosse possível, a escola deveria
21
fornecer um conjunto de materiais que simulassem esses contatos,
incluindo as gravuras, as imagens, as coleções e os museus internos.
Nas décadas de 1940 e 1950, os autores do Boletim
consideravam a organização curricular do ensino secundário, em que
os conteúdos eram voltados para os estudos sobre o universo, trazendo
a Geografia Física, a Geografia Geral, a Geografia da População, os
principais países de cada continente e, finalizando, os estudos sobre o
Brasil. Teoricamente, os professores recebiam as orientações didáticas
sobre os usos dos recursos e das técnicas de ensino utilizadas em sala
de aula, para o processo de ensino desses conteúdos. Geralmente, as
técnicas abordavam as atividades para as aulas expositivas, com uma
preocupação destinada para a técnica do estudo do meio.
A partir disto, eram indicados os usos de recursos variados,
como os filmes, os museus, os laboratórios, os perfis causais, os
pluviômetros, os livros didáticos, o globo, o flanelógrafo, a
esquematização no quadro, a sala-ambiente, o atlas geográfico escolar,
as cartas e projeções, as ilustrações e os desenhos didáticos.
Os recursos audiovisuais tiveram uma maior atenção após a
segunda guerra mundial “[...] tendo por base teorizações da psicologia
[...] empirista nos limites do método intuitivo [...]” (Préve, 1989, p.
211). Muitas experiências relacionadas a Didática da Escola Nova e
ao ensino de Geografia foram consideradas como bem-sucedidas pelo
periódico e publicadas no Boletim Geográfico. Dentre elas, selecionou-
se a técnica da observação direta - descrita por Eloísa de Carvalho,
para análise.
Para a autora, uma das técnicas de ensino capazes de favorecer
o processo de ensino-aprendizagem em Geografia, frente aos seus
objetivos, seria a observação direta sobre a natureza. Tal processo era
considerado fundamental para a compreensão da Geografia local, em
22
uma constante sintonia entre a natureza e a sala de aula. Esta
orientação é encontrada nas premissas de Antonio Firmino de
Proença, quando indicava que o ensino deveria ter uma sequência
lógica dos fatos, partindo das particularidades que constituem o seu
aspecto geral.
A orientação moderna para o ensino de Geografia divulgada
em nosso país, conforme Albuquerque (2011), entre 1911 e 1930, se
manteve presente, pelo menos no campo teórico, até os anos de 1970,
quando foi substituída por novos contextos, problemas e proposições
vinculadas a perspectiva da Pedagogia Tecnicista e a introdução da
disciplina de Estudos Sociais no currículo das escolas. Nesse sentido,
os “modos de dizer” nem sempre corresponderam nas escolas a “arte
de fazer” (Chartier, 2000).
Por outro lado, Rocha (1996) esclarece que após 1970,
ocorreram os debates referentes a Geografia crítica articulada com as
produções pedagógicas, principalmente aquelas fundadas na
Pedagogia dos conteúdos, com a vertente do Dermeval Saviani ou na
Educação Popular, defendida por Paulo Freire, que incentivaram
grandes debates e possibilitaram as experiências significativas para
certos avanços no ensino de Geografia.
Assim, certamente tivemos muitas experiências de professores,
escolas e instituições que se esforçaram para superar a forma
tradicional de se ensinar Geografia, diante ao descontentamento
relacionado a esse modelo de ensino e a necessidade de reformulação
da educação.
Os resultados demonstrados neste livro revelam que a
apreensão de conceitos e métodos já existentes tem uma importância
significativa para o educador, tornando-se um alicerce para a sua
formação e possibilitando as condições de avanço na prática escolar.
23
Por estas razões, inicialmente, tornou-se importante
compreender melhor as orientações escolanovistas sobre os métodos
de ensino em Geografia, evidenciando o contexto da produção escolar
à época. Também, identificou-se as técnicas de ensino da Geografia
utilizadas na escola secundária brasileira, especialmente as que dão
encaminhamentos para as atividades extracurriculares, do início do
século XX até a década de 1960. Nesse sentido, os dados coletados
foram sistematizados em formato de quadros e gráficos, considerando
o tipo de atividade, os autores e o ano de publicação. Após, foi
ressaltado os aspectos da vida e a contribuição da professora Eloísa de
Carvalho. Para isso, destacou-se as orientações metodológicas
destinadas aos professores de Geografia, contidas no texto “Notas de
Didática da Geografia” (1960). Sequencialmente, foi detalhada a
técnica da observação direta. Por fim, demonstrou-se a atualidade das
técnicas de ensino de Geografia que envolvem a saída à campo,
contendo os exemplos da aplicação de alguns exemplos práticos.
A investigação consistiu em pesquisa bibliográfica e
documental. Desse modo, utilizou-se o acervo da Faculdade de
Filosofia, Ciências e Letras, da Universidade de São Paulo, incluindo
os periódicos da época escolanovista, principalmente os artigos do
Boletim Geográfico, cujos temas se aproximam do ensino e as outras
fontes documentais, tais como os relatórios da universidade.
A fonte privilegiada de pesquisa foi o texto “Notas de Didática
da Geografia”, escrito por Eloísa de Carvalho, em 1960. Para o relato
de vida da autora, foram utilizados os arquivos referentes a extinta
Universidade Nacional de Filosofia, como as cartas, predominantes
no Dicionário histórico-biográfico brasileiro, do Centro de Pesquisa
e Documentação de História Contemporânea do Brasil da Fundação
Getúlio Vargas, disponível no site: http://cpdoc.fgv.br/.
24
Este texto apresenta os resultados de uma pesquisa
desenvolvida na Universidade Estadual Paulista (UNESP), nos anos
de 2020 e 2021. O interesse pela temática surgiu durante a graduação,
no âmbito do Núcleo de Pesquisa em Ensino de Geografia.
A seguir, na figura 1 abaixo, foram sintetizadas as principais
ideias referentes aos procedimentos de pesquisa.
Figura 1 - Procedimentos de pesquisa
Fonte: Elaborado pela autora (2021).
25
1.
As orientações escolanovistas sobre os métodos
de ensino em Geografia
Saviani (2012) conceitua a concepção pedagógica Nova ou
Moderna, como sendo uma concepção pedagógica renovadora,
fundamentada em um pensamento filosófico, que é conduzido pela
existência, vida e atividade. Baseado nisso, a natureza humana passou
a ser mutável, motivada por sua existência. No que diz respeito a esse
padrão, a sua disseminação teve como referência o paradigma
escolanovista. De acordo com o panorama moderno, a educação
aderiu a criança como um modelo de ampliação para a investigação
sobre o meio educativo pedagógico. Os interesses dessas análises
tornaram-se as vivências, o psicológico, os métodos, o aluno, o
interesse e a espontaneidade, utilizando uma Pedagogia focada na
orientação experimental, com o auxílio da Biologia e da Psicologia.
Castro (1967) demonstra que na época, o movimento da
Escola Nova revelou o caráter psicológico voltado para o
entendimento relacionado ao conhecimento da criança e do
adolescente para a ação educativa. Buscando expandir essa concepção
no ensino, houve o auxílio, mediante a orientação do professor na
compreensão do desenvolvimento do educando e o seu ajuste à
sociedade. No decorrer disso, era constatado a compreensão do
processo de desenvolvimento que conduzia o indivíduo desde o
nascimento até a adolescência, considerando os fenômenos de
hereditariedade, crescimento, maturação, aprendizagem e vida social.
26
Assim, como evidencia Santos (2005), a metodologia do
ensino de Geografia passou a considerar os exemplos das
recomendações de exploração da Geografia local e o uso do recurso
da imaginação, com as atividades que levassem os alunos a imaginar
a direção dos elementos geográficos, aliado a atuação do ser humano
no espaço territorial, na economia, na política e na sociedade.
Como reforçam Mello e Cuani Junior (2020), o modo de
pensar o ensino de Geografia no Brasil, com a orientação da Geografia
moderna, foi associado aos princípios da Didática da Escola Nova,
introduzida como um campo de ensino e pesquisa. Os manuais de
ensino, como os de Delgado de Carvalho, consideravam a atividade
do aluno como o ponto de partida para as aulas de Geografia,
envolvendo os interesses e as necessidades das crianças. A
aprendizagem aconteceria por meio de algo concreto, que
possibilitasse observar a natureza ou através da utilização de recursos
didáticos capazes de auxiliar os alunos nas lembranças de paisagens e
na compreensão dos elementos geográficos.
Além disso, foram introduzidas as novas concepções sobre a
sociedade, o homem, a criança, o aluno, o ensino e aprendizagem. “A
nova concepção de aluno tinha em vista promover o desenvolvimento
‘natural’ do educando, possibilitando a sua formação de
personalidade, o que alterou assim o aspecto interno da escola
(Mello; Cuani Junior, 2020, p. 4-5).
Carvalho acreditava que a escolha do conteúdo geográfico
deveria iniciar-se pelo meio em que vivia o aluno, refletindo sobre a
sala de aula e a escola, prosseguindo para o estudo dos conceitos
relacionados aos fenômenos geográficos. Para ele, a forma de ensinar
Geografia estava diretamente associada ao exercício da observação
direta do meio, considerando o papel essencial do professor, as
27
interferências do fator humano e as atividades do homem. Dessa
maneira, o ensino geográfico se efetivava de maneira simplificada,
composto pela construção simulada, por exemplo, dos acidentes
geográficos em tabuleiros de areia, das molduras de argila, da
atividade de construir, localizar e completar os mapas. Carvalho
também incentivava o método de ensino por meio dos círculos
concêntricos, partindo do grau de complexidade menor até o mais
alto, na presença dos assuntos mais próximos da realidade do aluno e
avançando o aprendizado para a escala global. “Dessa forma, o ensino
partiria de palestras com os alunos sobre os lugares que conhecessem
para, depois, definir geograficamente, o assunto em questão(Santos,
2005, p. 80).
João Toledo estipulava que as primeiras lições de Geografia
deveriam ser ensinadas concretamente, vendo as paisagens locais,
conferindo as denominações dos acidentes geográficos encontrados
no decorrer do passeio, seguido por um diálogo traçado pelo
professor. Após o passeio, recomendava-se a elaboração de desenhos,
retratando as características dos cenários encontrados. Para o autor, a
natureza era uma grande colaboradora no entendimento do ensino
progressivo, necessitando a provocação da curiosidade nos alunos, o
estímulo para a busca de um maior conhecimento sobre o tema e a
divisão correta dos tempos destinados a cada um dos ramos da
Geografia. O roteiro dessa atividade englobava os assuntos
conhecidos pelos alunos e, aos poucos, iria evoluindo, rumo aos
conteúdos desconhecidos (Santos, 2005).
Proença ressaltava a observação dos fatos da localidade dos
alunos, ocasionando os elementos de comparação e a construção de
imagens das coisas distantes. Ele defendia o método de concentração,
agrupando os assuntos que tivessem relações entre si e estudando-os
28
em conjunto, com o auxílio da ilustração de lugares, da natureza, da
vida social e da localização nos mapas, através dos exercícios
cartográficos.
O ensino deveria ter uma sequência lógica dos fatos, partindo
das particularidades que constituem o seu aspecto geral e envolvia o
concreto antes do abstrato. “Aplicados a Geografia, quer isto dizer
que a observação das coisas e a consideração dos fatos hão de proceder
a formulação das definições, leis e princípios” (Proença, s/d, p. 35
apud Santos, 2005, p. 82).
Diante os aspectos recomendados pelos autores, a observação
direta sobre a natureza era fundamental para a compreensão da
Geografia local, em uma constante sintonia entre natureza e os
conteúdos escolares. Ao ar livre, estava o incentivo a imaginação das
crianças sobre o que existiria além do horizonte.
A Geografia escolar brasileira no século XX passou por
questionamentos significativos, associados as orientações teórico
metodológicas, implementadas durante a sua consolidação como
disciplina nos currículos do século XIX, marcado pela aplicação do
modelo da Geografia tradicional em sua prática de ensino. Apoiada
em mudanças, perante os fatores sócio históricos, a Geografia frente
a transformação da Educação brasileira debateu uma nova proposta
de ensino, iniciada oficialmente com a reforma Luiz Alves-Rocha Vaz.
Conforme Romanelli (1993, p. 45) apud Rocha (2000, p. 1),
[...] no campo das ideias, as coisas começaram a mudar-se com
movimentos culturais e pedagógicos em favor de reformas mais
profundas; [...] no campo das aspirações sociais, as mudanças
vieram com o aumento da demanda escolar impulsionada pelo
ritmo mais acelerado do processo de urbanização ocasionado
pelo impulso dado à industrialização [...].
29
Por meio disso, era garantido o entusiasmo pela educação e o
otimismo pedagógico, em um cenário de discussões ligadas a
necessidade de ampliação do acesso a escolarização, bem como as
formas de se repensar a escola, por parte das funções, das técnicas, dos
currículos e das metodologias. Esse período foi acompanhado pelo
conflito entre os professores que defendiam a concepção tradicional
da Geografia e aqueles que eram favoráveis a renovação do ensino.
Segundo Rocha (2000), a reforma Luiz Alves-Rocha trouxe as
alterações na educação escolar brasileira, mediante a vertente de
professores que estavam empenhados em renovar o ensino de
Geografia. A prioridade da reforma era beneficiar os dois níveis do
ensino, representados pelo ensino secundário e o ensino superior.
Diante as diversas modificações, estava a ampliação do curso
secundário para seis anos e a inserção do regime seriado. Em meio a
isso, acabou sendo imposto a uniformização de um currículo para
todos os estabelecimentos oficiais do ensino secundário no país,
tornando obrigatório os conteúdos indicados pelo Colégio Pedro II.
Também, notou-se a introdução de uma educação voltada a
consolidação do nacionalismo, com o intuito de atender os interesses
dos detentores do poder.
No Brasil, foi manifestado um processo de transformação
paradigmática da Geografia escolar, com destaque para a penetração
da Geografia Moderna nas salas de aulas. No decorrer do processo de
realização dessa nova concepção para os currículos oficiais, de modo
a tornar-se o ensino padrão, foi verificado a cooperão do professor
Delgado de Carvalho como o mentor principal do novo currículo
ordenado para a disciplina.
O professor Carlos Miguel Delgado de Carvalho efetivou os
seus estudos na Europa, obtendo a influência das ideias liberais e
30
democráticas, convertendo-se em um defensor do progresso e da
liberdade do indivíduo. Para ele, o objeto de estudo da Geografia seria
a Terra, verificada como o ambiente modificado pelos seres humanos,
propondo um conhecimento mais científico e defendendo o
entendimento sobre a Geografia elementar. Nas aulas de Geografia
humana, ressaltava a relevância da antropogeografia e o uso do
método comparativo, estudando o universo com base na intervenção
dos seus habitantes. Ferraz (1995, p. 55-56) apud Rocha (2000, p. 6)
aponta que o método comparativo era um método científico, de
fundamentação positivista-funcionalista:
[...] consistia em descrever a realidade estudada de forma
objetiva, empiricamente comprovada, racionalmente exata, de
maneira a inviabilizar dúvidas e contradições. Para tal, a indução,
análise e síntese eram elementos cruciais, pois, ao se estudar a
realidade como um todo, dividir-se-ia este todo em partes,
descrevendo suas características principais após criteriosa
observação, estabelecer-se-iam as relações que cada parte tinha
com a outra e, somar-se-iam estas várias partes para se ter a noção
do todo sistematizado.
Nessa concepção, o principal assunto de estudo seria o meio
em que vivia o aluno. Após, eram acrescentadas as informações sobre
as noções de outras regiões, seguido por um caráter comparativo e o
conhecimento sobre a Geografia da Pátria. O novo programa de
ensino adotado pelo Colégio Pedro II abrangia as inovações do
Delgado de Carvalho, caracterizado pelos seguintes aspectos:
[...] restituir aos fenômenos o seu quadro natural, graças à escolha
das regiões naturais como base dos estudos fisiográficos; à
preocupação de relacionar o máximo possível as questões da
31
“geografia pura” com as de geografia econômica [...] e
finalmente, à resolução decidida de atualizar os assuntos, com a
correta manutenção ou adoção de pontos práticos e a supressão
de outros considerados menos necessários (Rocha, 2000, p. 8).
Posteriormente a reforma Luiz Alves, o novo programa de
ensino da Geografia para a educação secundária do Brasil adotou a
orientação moderna, difundida por Carvalho. O programa do
primeiro ano foi organizado através dos estudos de astronomia, com
a função de estudar a forma da Terra, os movimentos do planeta e
aplicar a confecção de cartas geográficas. A segunda parte desse
programa era focado no estudo de fisiografia e a terceira parte estava
atribuída a Geografia humana. Na quarta divisão, encontrava-se a
Geografia geral, definida pela fisiografia e a antropogeografia. Nesse
sentido, era abordada a divisão regional, fundamentada nas diferenças
naturais das áreas existentes na superfície terrestre, consolidando o
conceito de região natural. A divisão política aparecia como um
complemento.
No segundo ano, a proposta de ensino tinha relação com o
nacionalismo. Assim, era valorizado o conhecimento da Geografia
nacional, contendo os aspectos da geologia do território brasileiro,
especialmente a economia local. Juntamente a isso, considerava o
estudo regional, repleto pelos elementos naturais da paisagem, as
características fisiográficas e a atuação humana. O quinto ano era
direcionado para a astronomia e a cosmografia.
Delgado de Carvalho publicou um comentário sobre as
características do ensino geográfico, na Revista Brasileira de Geografia,
no ano de 1945. O seu discurso ressaltava a necessidade de abordagem
sobre a existência do conjunto de fenômenos na Geografia,
considerando as diversas relações entre eles. Para isso, seria designado
32
uma interdependência entre os aspectos físicos e humanos. Desta
maneira, o aperfeiçoamento do ensino aconteceria através da
contextualização sobre a relação entre o homem e a natureza,
predominando a seleção de informações correspondentes as diversas
idades, conduzindo para a realidade do aluno, a descrição geográfica
e a utilização da ilustração. Era destacado também a contribuição do
mestre, cabendo assim ao professor o dever de ajustador e organizador
de uma sala-ambiente.
Paralelamente, Aroldo de Azevedo publicou um programa de
Geografia para o curso secundário, na sessão de Contribuição ao
ensino, da Revista Brasileira de Geografia, no ano de 1951. Ele
determinou os programas para as séries ginasiais, sugerindo as noções
de Geografia Física, Geografia Humana e Geografia Econômica. A
partir dessa percepção, reconhecia que o estudo do mundo deveria ser
realizado conforme os aspectos físicos, humanos, políticos,
econômicos e culturais. Além disso, o autor acreditava que os
professores precisavam adquirir um papel preponderante no auxílio
da formação de personalidades, de modo a conhecer os alunos, as suas
representações sociais e os saberes que traziam no decorrer de suas
vidas.
33
Figura 2 - Sumário contendo o texto publicado por Aroldo de Azevedo, no
Boletim Geográfico
, em 1951, intitulado “Programa de Geografia para o Curso
Secundário”, disponibilizado na seção “Contribuição ao ensino.
Fonte: Azevedo (1951).
34
Figura 3 - Sumário contendo o texto publicado por Delgado de Carvalho, na
Revista Brasileira de Geografia
, em 1945, intitulado “As três características do
ensino Geográfico”, disponibilizado em “Comentário.
Fonte: Carvalho (1945).
Dentre o debate pedagógico da época, encontrou-se o
destaque a saída de campo. Claval (2013) menciona as convicções do
trabalho de campo, indicando o seu pioneirismo no século XVIII, a
35
sua estabilização no decorrer no século XIX e o seu triunfo no início
do século XX.
Alexander von Humboldt (1769-1859) foi um físico,
naturalista e geógrafo, que disseminou a distribuição dos aspectos das
paisagens pelo espaço, colaborando para a evolução da Geografia na
virada do século XVIII para o XIX. Para ele, a realidade estaria repleta
de diferentes tipos de paisagens, persistindo a necessidade de
apreender sobre as características de sua fisionomia, através das saídas
de campo, proporcionando a oportunidade de captar as
especificidades, a diferenciação qualitativa e as individualidades.
Assim, a compreensão do mundo estava guiada pela experiência
prática, contando com o auxílio dos textos, dos desenhos, das imagens
e dos mapas.
No século XIX, o trabalho de campo foi sendo aprimorado de
acordo com a evolução das infraestruturas, que permitiam apreciar as
paisagens locais, mediante o levantamento sistemático dos dados ou a
verificação das informações em campo. Ao longo desse período, foi
propiciado o valor cívico do trabalho de campo e era útil para a
formação cidadã dos alunos. Dessa maneira, “[...] o leva a conhecer o
mundo assim como ele é e ensina-o a se movimentar dentro dele, a
tirar partido da organização particular de cada espaço(Claval, 2013,
p. 4). No final dessa época, foram acrescentadas as análises
sistemáticas, possibilitando uma maior compreensão dos dados
estatísticos. Devido a isso, as saídas a campo passaram a ser
conduzidas com a utilização dos mapas topográficos, temáticos e
geológicos.
Na metade do século XX, as bases da pesquisa científica foram
incorporadas ao trabalho de campo. Logo, foram incorporados os
modelos hipotético-dedutivos, adicionando os dados coletados por
36
pessoas externas e investigando os documentos referentes aos locais.
Nesse momento, permanecia o contato direto com o campo, mas,
também, havia a prática do campo tradicional, para a idealização de
lugares distantes.
37
1.1.
Eloísa de Carvalho: os aspectos da vida e da obra
A Eloísa de Carvalho foi filha do oficial do exército capitão
José Batista de Carvalho. Durante o percurso da sua carreira
profissional, foi uma Geógrafa, professora de Geografia, tornou-se
pesquisadora e técnica do Instituto Brasileiro de Geografia e
Estatística (IBGE). Ainda, viajou para a França, junto ao “Institut de
Géographie de Faculte de Lettres” da Sorbonne, Strasbourg, Lyon,
Grenoble e Montpelier, com o intuito de obter o seu aperfeiçoamento
profissional. Ela também participou da elaboração do mapeamento
das expedições geográficas do IBGE em 1944 e 1950, conforme se
observa no Quadro 1.
Quadro 1 - Participação da Eloísa de Carvalho na elaboração do mapeamento
das expedições geográficas do IBGE
Ano
Área
pesquisada
Objetivo Pesquisadores
Fonte de
referência
1944
Paraná e Santa
Catarina -
trecho
Guarapuava-
Laranjeiras
Estudos de
geomorfologia,
climatologia e
Geografia
humana
Eloísa de
Carvalho
Geográfico,
v.2, n.24,
mar. 1945,
1950
Rio de Janeiro,
Minas Gerais e
Paraná
Programa da I
Reunião Pan-
Americana de
Consulta sobre a
Geografia
Orlando
Valverde,
Marília Veloso,
Eloísa de
Carvalho e
outros
Boletim
Geográfico,
v.12, n.2,
abr./jun.
Fonte: Abrantes (2014).
38
Org.: Elaborado pela autora (2021).
Assumiu o cargo de chefe da seção dos estudos sistemáticos
no Conselho Nacional de Geografia (CNG). O alcance dessa função
possibilitou a disseminação das obras relacionadas as orientações
sobre a Didática da Geografia, no contexto escolanovista. Também,
teve publicado o livro Geografia do Brasil: roteiro de uma viagem,
organizado em coautoria com o Antonio Teixeira Guerra (1924-
1968). Além disso, teve os textos publicados na Revista Brasileira de
Geografia, intitulados “A produção agrícola no Brasil” (1959), em
coautoria com a Hilda da Silva; “A lavadeira” (1948a) e “Favelas”
(1948b), disponibilizados na seção “Tipos e aspectos do Brasil”.
A sua educação secundária ocorreu no Colégio Pedro II, com
o término do curso ginasial em 1936, prosseguindo para o curso
complementar de Medicina em 1938, devido a pressão da família. Em
1939, ingressou na Universidade do Distrito Federal para cursar
História, porém, acabou sendo transferida para a Faculdade Nacional
de Filosofia, da Universidade do Brasil. Nesse local, formou-se na
seção de Geografia e História. Lecionou no curso preparatório da
Faculdade Nacional de Filosofia, na instituição La-Fayette, do Rio de
Janeiro, por dois anos. Encerrou, em 1942, o curso de Didática na
Faculdade Nacional de Filosofia (Carvalho, 1943; Abrantes, 2014).
39
Figura 4 - Sumário indicando os textos publicados por Eloísa de Carvalho, na
Revista Brasileira de Geografia
, em 1948, intitulados “A lavadeira” e “Favelas”,
disponibilizados na seção “Tipos e aspectos do Brasil.
Fonte: Carvalho (1948a; 1948b).