Nesse começo do século XXI,
muito tem se falado sobre ética ou
mais precisamente sobre a falta dela.
A repercussão desse tema evidencia,
sem dúvida, uma importante preocu-
pação a essa dimensão tão relevante
em se tratando da formação huma-
na e por outro lado, um “mal-estar”
existencial e moral da sociedade que
infelizmente, cada vez mais desnuda a
necessidade de mais estudos e pesqui-
sas na área. E a Educação, não pode
se furtar dessa discussão, justamente
porque a formação das novas gera-
ções depende do seu trabalho.
Se desejamos sujeitos autô-
nomos moralmente falando, preci-
samos pensar na formação ética dos
educadores das mais diversas áreas e
contextos. Precisamos reetir e agir
através de ações que possibilitem a
construção de uma cultura do “au-
torrespeito”, condição essencial para a
formação dos demais valores morais.
O leitor encontrará nesse livro
reexões sobre a formação ética do
educador inspiradas em nossa prática
prossional e também frutos de nossas
inquietações a respeito da sociedade
atual e o que falta nela quando pensa-
mos nessa temática.
Por m, consideramos que a
formação ética depende de dimensões
intelectuais e afetivas, ambas devem
ser trabalhadas pela educação, seja
ela dada no contexto familiar, seja
pelos professores. E a formação ética
dos educadores é ponto nodal para a
formação dos educandos. E é essa, a
contribuição dada, com a publicação
dessa obra.
Boa leitura!
Programa PROEX/CAPES:
Auxílio Nº 0039/2022
Processo Nº 23038.001838/2022-11
Acreditamos veementemente que a escola deve estar comprometida
com a formação ética e moral dos estudantes, que deve priorizar a
defesa da dignidade humana e da justiça social. Além de priorizar o
desenvolvimento de competências intelectuais, a escola deve priorizar
valores éticos e morais, já que visamos a construção de uma sociedade
mais justa, harmônica e democrática.
Esta coletânea reúne 16 capítulos que versam sobre a formação ética do
educador nos mais diversos contextos, fruto de estudos e pesquisas de
alunos, egressos e professores vinculados ao Programa de Pós-Gradua-
ção em Educação da UNESP – Campus de Marília, a quem agradece-
mos o auxílio concedido para a publicação do livro.
Cuidar da formação do professor (seja ela inicial ou continuada) não se
restringe ao “ensino” tecnicista de métodos e procedimentos. Cuidar
desses aspectos são importantes, mas precisamos pensar nos fundamen-
tos teóricos que as sustentam, sem corrermos o risco de um “reducio-
nismo pedagógico”. Precisamos considerar a formação ética de nossos
estudantes, que pressupõe uma formação adequada dos educadores no
tocante a isso.
Sendo assim, vivemos o desao de reconhecer que a educação tradi-
cional está reforçando a heteronomia e deve ser superada por práticas
pedagógicas democráticas se desejamos, sujeitos moralmente autôno-
mos. E é essa, a nossa preocupação, quando nos propusemos a escrever
a presente obra, a qual tivemos o cuidado de torná-la acessível a todos
os interessados na temática.
A FORMAÇÃO ÉTICA DO EDUCADOR
EM CONTEXTOS DIVERSOS
Patrícia Unger Raphael Bataglia
Priscila Caroline Miguel
Matheus Estevão Ferreira da Silva
(Organizadores)
A FORMAÇÃO ÉTICA DO EDUCADOR EM CONTEXTOS DIVERSOS
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A FORMAÇÃO ÉTICA DO EDUCADOR
EM CONTEXTOS DIVERSOS
Patrícia Unger Raphael Bataglia
Priscila Caroline Miguel
Matheus Estevão Ferreira da Silva
(Organizadores)
Patrícia Unger Raphael Bataglia
Priscila Caroline Miguel
Matheus Estevão Ferreira da Silva
(Organizadores)
A FORMAÇÃO ÉTICA DO EDUCADOR EM
CONTEXTOS DIVERSOS
Marília/Oficina Universitária
São Paulo/Cultura Acadêmica
2024
UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA
FACULDADE DE FILOSOFIA E CIÊNCIASFFC
UNESP - campus de Marília
Diretora
Dra. Claudia Regina Mosca Giroto
Vice-Diretora
Dra. Ana Claudia Vieira Cardoso
Conselho Editorial
Mariângela Spotti Lopes Fujita (Presidente)
Célia Maria Giacheti
Cláudia Regina Mosca Giroto
Edvaldo Soares
Franciele Marques Redigolo
Marcelo Fernandes de Oliveira
Marcos Antonio Alves
Neusa Maria Dal Ri
Renato Geraldi (Assessor Técnico)
Rosane Michelli de Castro
Conselho do Programa de Pós-Graduação em Educação -
UNESP/Marília
Henrique Tahan Novaes
Aila Narene Dahwache Criado Rocha
Alonso Bezerra de Carvalho
Ana Clara Bortoleto Nery
Claudia da Mota Daros Parente
Cyntia Graziella Guizelim Simões Girotto
Daniela Nogueira de Moraes Garcia
Pedro Angelo Pagni
Auxílio 0039/2022, Processo 23038.001838/2022-11, Programa PROEX/CAPES
Parecerista: Profa. Dra. Luciana Nogueira da Cruz (UNESP - Campus de São José do Rio Preto)
Capa: Imagem gratuita Freepik
Ficha catalográfica
F724 A formação ética do educador em contextos diversos / Patrícia Unger Raphael Bataglia,
Priscila Caroline Miguel, Matheus Estevão Ferreira da Silva (org.). Marília :
Oficina Universitária ; São Paulo : Cultura Acadêmica, 2024.
414 p. : il.
CAPES
Inclui bibliografia
ISBN 978-65-5954-472-1 (Impresso)
ISBN 978-65-5954-473-8 (Digital)
DOI: https://doi.org/10.36311/2024.978-65-5954-473-8
1. Epistemologia genética. 2. Educação - Brasil. 3. Professores - Formação. 4.
Ética. I. Bataglia, Patrícia Unger Raphael. II. Miguel, Priscila Caroline. III. Silva,
Matheus Estevão Ferreira da. IV. Título.
CDD 370.114
Catalogação: André Sávio Craveiro BuenoCRB 8/8211
Copyright © 2024, Faculdade de Filosofia e Ciências
Editora afiliada:
Cultura Acadêmica é selo editorial da Editora UNESP
Oficina Universitária é selo editorial da UNESP - campus de Marília
HOMENAGEM
(IN MEMORIAN)
:
GEORG LIND (1947-2021)
Georg Lind faleceu, em sua casa em Konstanz (Alemanha),
em 30 de novembro de 2021, após uma curta doença, aos 74 anos.
Ele tornou-se conhecido mundialmente pelo seu vasto programa de
pesquisa, considerado um dos maiores em Psicologia Moral (HASTE;
LIND, 2002), em torno do constructo kohlberguiano de
competência moral. Esse programa é comumente associado à
elaboração que ele fez de uma metodologia de avaliação da
competência moral, o Moral Competence Test (MCT). No entanto,
seu programa inclui os vários estudos longitudinais, transculturais, de
intervenção e experimentais que desenvolveu ao longo de toda sua
carreira acadêmica, desde a década de 1970.
Lind também foi um dos críticos à visão reducionista da
Psicologia Moral, voltada ao aspecto cognitivo do desenvolvimento
moral, e esteve envolvido no movimento para expandir os horizontes
desse campo de pesquisa, junto a outros psicólogos, filósofos e
educadores morais. Nesse sentido, propôs a chamada teoria do duplo
aspecto (LIND, 2000) procurando ressaltar que a competência moral
integra tanto a cognição como a afetividade, concebendo-os como
aspectos distintos, porém inseparáveis. O compromisso que seu
trabalho passou a assumir com a Democracia é revelado pela potência
do constructo de competência moral para se alcançar uma sociedade
verdadeiramente plural e democrática.
Nascido em 24 de junho de 1947 em Gleisweil (Alemanha),
desde a infância Lind era confrontado com o problema de aplicar
valores morais. Um questionamento que sempre o perseguiu foi
Como podemos evitar que uma ditadura nazista aconteça
novamente na Alemanha ou em qualquer outro lugar?”. Dentre as
soluções falhas e elitistas que pensavam na época, era a de implantar
uma ditadura anunciada, que elevaria seu povo à democracia por
meios ditatoriais, ou a de dar o voto apenas para pessoas que tinham
alta escolaridade. Lind foi compreender uma solução melhor graças
aos trabalhos de John Dewey, Lawrence Kohlberg, Jean Piaget e
outros, que é a Educação. Em seus estudos, Lind passaria a defender
que a Educação parece ser a única maneira de estabilizar e desenvolver
uma sociedade democrática.
Lind se formou em 1966 na Southmoreland High School,
Pensilvânia, Estados Unidos, e em 1967 na Gymnasium Weierhof,
Bolanden, Alemanha. Estudou Psicologia como major e filosofia,
economia e linguística como minors nas universidades de Mannheim,
Braunschweig e Heidelberg, na Alemanha. Obteve, em 1973, seu
Mestrado em Psicologia, pela Universidade de Heidelberg, em 1984,
seu Ph.D. em Ciências Sociais, pela Universidade de Konstanz, e em
1991, seu segundo Ph.D., agora em Filosofia, pela Universidade
Católica de Eichstätt, sendo todas universidades alemãs.
Como o próprio Lind (2021, online) escreveu uma vez em seu
blog pessoal: Tenho vários interesses de pesquisa, mas meu tema
principal, que remonta aos meus tempos de escola, é a competência
moral-democrática, essencial para a democracia como modo de vida.
Desde 1973 tenho estado envolvido na pesquisa e no ensino deste
tópico”.
Dado seu interesse pela Psicologia Moral desde seus tempos
de estudante, foi no trabalho do psicólogo estadunidense Lawrence
Kohlberg, dentro da tradição piagetiana, que Lind direcionou seus
estudos.
Lind debruçou-se sobre a literatura de mensuração e, em
1977, desenvolveu o primeiro instrumento objetivo e experimental
de medição da competência moral, o MCT (na época ainda chamado
de Moral Judgment Test (MJT)MJT), inspirado na Moral Judgment
Interview (MJI) de Kohlberg (COLBY; KOHLBERG, 1987). Hoje,
o MCT foi validado em 41 idiomas e tem sido continuamente
usado em pesquisa.
Apesar de ter se deparado com as ideias de Kohlberg em 1972,
e de trabalhar com elas em pesquisa a partir de 1973, Lind foi
conhece-lo pessoalmente em 1978, quando Kohlberg deu uma
palestra em Starnberg (Alemanha). Na ocasião, ficou impressionado
com a sua receptividade às críticas muito duras, e a capacidade de
suportá-las, de alguns presentes na plateia à sua teoria. Lind sentiu
que Kohlberg foi o primeiro a entender quais eram as intenções e
potencialidades de sua pesquisa. Kohlberg o convidou para ir à
Universidade de Harvard, onde ele lecionou de 1968 a 1987, e
apresentar seu trabalho, o que fez Lind conhecer vários de seus
colaboradores. Ambos mantiveram relativo contato desde então, até
a morte precoce de Kohlberg em 1987. Além de uma metodologia de
mensuração da competência moral, Lind também elaborou uma
metodologia que pudesse desenvolvê-la, o Konstanz Method of
Dilemma Discussion (KMDD) (LIND, 2006; 2019).
Lind ingressou como professor de Psicologia na Universidade
de Konstanz em 1993, sendo posteriormente nomeado professor
adjunto em 1999, onde atuou até sua aposentadoria em 2010.
Também atuou como professor visitante na Universidade Humboldt,
em Berlim (Alemanha), na Universidade de Illinois, em Chicago
(Estados Unidos), e na Universidade de Monterrey, em Monterrey
(México), além de ser convidado, inclusive depois de sua
aposentadoria, por várias outras universidades e instituições para dar
palestras e workshops, além de cursos de treinamento do KMDD em
muitos países, e de continuar com suas atividades de pesquisa, o que
fez até o final de sua vida.
Sua morte inesperada chocou não a nós, mas a sua família,
colegas de pesquisa, ex-alunos e pessoas que o conheceu, tanto na
Alemanha como no exterior. Lind deixou a sua esposa, Gisela Kusche,
e seus três filhos, Gregor, Antonio e Glenda. Lastimamos esta grande
perda também para o campo da Psicologia Moral.
Marília, 01 de agosto de 2023.
Prof. Me. Matheus Esteo Ferreira da Silva
Doutorando pelo Programa de Pós-graduação em Educação (PPGE) da
Faculdade de Filosofia e Ciências (FFC), Universidade Estadual Paulista
“Júlio de Mesquita Filho” (UNESP), Campus de Marília
Prof.ª Ma. Priscila Caroline Miguel
Doutoranda pelo Programa de Pós-graduação em Educação (PPGE) da
Faculdade de Filosofia e Ciências (FFC), Universidade Estadual Paulista
“Júlio de Mesquita Filho” (UNESP), Campus de Marília
Profa. Dra. Patricia Unger Raphael Bataglia
Professora Associada do Departamento de Educação e Desenvolvimento
Humano e do Programa de Pós-graduação em Educação (PPGE) da
Faculdade de Filosofia e Ciências (FFC), Universidade Estadual Paulista
“Júlio de Mesquita Filho” (UNESP), Campus de Marília
Referências
COLBY, A.; KOHLBERG, L. The measurement of moral
judgment: theoretical foundtation and research validation.
Cambridge: Cambridge University Press, 1987.
HASTE, H.; LIND, G. An interview with Georg Lind. Journal of
Group Tensions, v. 31, n. 2, p. 187-215, 2002.
LIND, G. O significado e medida da competência moral revisitada:
um modelo do duplo aspecto da competência moral. Psicol. Reflex.
Crit., v. 13, n. 3, p. 399-416, 2000.
LIND, G. Effective moral education: The Konstanz Method of
Dilemma Discussion. Hellenic Journal of Psychology, v. 3, p. 189-
196, 2006.
LIND, G. How to teach moral competence. New: Discussion
Theater. Berlin: Logos-Publisher, 2019.
LIND, G. Moral-democratic competence: Promoting deliberation
and discussionreducing violence, deceit, or bowing down to
others. 2021. Disponível em: https://mct2kmdd.com/dr-georg-
lind/. Acesso em: 05 jan. 2023.
SUMÁRIO
PRECIO ........................................................................................... 15
Raul Aragão Martins
APRESENTÃO ............................................................................... 23
Priscila Caroline Miguel, Matheus Estevão Ferreira da Silva, Patrícia Unger
Raphael Bataglia
O CONCEITO DE SOCIALIZAÇÃO SOB A ÓTICA DA
EPISTEMOLOGIA GENÉTICA: UM SABER NECESSÁRIO A
FORMAÇÃO DOCENTE ................................................................... 29
iago Corado Lima
O TEMA DA VIOLÊNCIA NA FORMAÇÃO DE PROFESSORES . 55
Angel Sthefani Ramalho, Cristiane Paiva Alves
O PAPEL DA PSICOLOGIA ESCOLAR NO ENFRENTAMENTO À
EVASÃO DE ALUNOS ....................................................................... 69
Vilma Aparecida Bianchi
CLIMA ESCOLAR NA EDUCAÇÃO BRASILEIRA: RELAÇÕES,
DESAFIOS E PERSPECTIVAS DA GESTÃO EDUCACIONAL NOS
ÚLTIMOS DEZ ANOS ....................................................................... 97
aís São João Castellini
UMA REFLEXÃO SOBRE O USO DAS METODOLOGIAS ATIVAS
NO ENSINO DO PROEJA INTEGRADO A EDUCAÇÃO
PROFISSIONAL ................................................................................ 119
Cristina do Socorro Ribeiro da Costa
A IMPORTÂNCIA DAS COMPETÊNCIAS SOCIAIS NA
EDUCAÇÃO DO/NO CAMPO ....................................................... 133
Andreia do Nascimento Lima, Henrique Tahan Novaes
A FORMAÇÃO CONTINUADA DO EDUCADOR COMO
OPORTUNIDADE DE CONSTRUÇÃO DE AÇÕES REFLETIDAS
............................................................................................................ 149
Graziella Diniz Borges, Patrícia Unger Raphael Bataglia
A FORMAÇÃO ÉTICA DO(A) FUTURO(A) EDUCADOR(A):
AVALIAÇÃO DO JUÍZO MORAL NA GRADUAÇÃO EM
PEDAGOGIA ..................................................................................... 177
Matheus Estevão Ferreira da Silva, Alessandra de Morais, nia Suely
Antonelli Marcelino Brabo
BRINCADEIRA É COISA SÉRIA! POSSIBILIDADE PARA SE
TRABALHAR COM A FORMAÇÃO ÉTICA DO EDUCADOR ... 203
Cristiane Paiva Alves, Bruna Assem Sasso dos Santos, bio Luiz de Almeida
Bertacini
FORMAÇÃO DE PROFESSORES NA ÁREA DA SAÚDE:
COMPETÊNCIA MORAL E EMPATIA .......................................... 229
Fernanda Moerbeck Cardoso Mazzetto, Patrícia Unger Raphael Bataglia,
Cristiane Paiva Alves, Juliana Gonçalves Herculian
O USO DE METODOLOGIAS ATIVAS COLABORA NA
FORMAÇÃO ÉTICA DO FUTURO MÉDICO? ............................. 253
Priscila Caroline Miguel, Juliana Gonçalves Herculian
A IMPORTÂNCIA DAS METODOLOGIAS ATIVAS NA
FORMAÇÃO DE PROFISSIONAIS DA SAÚDE DA ATUALIDADE
............................................................................................................ 285
Cláudia Érika S. do Nascimento Lima
O FAZER ÉTICO DO EDUCADOR: DESAFIOS E PERSPECTIVAS
NA FORMAÇÃO E LICENCIATURA EM PSICOLOGIA ............. 303
aísa Angélica o da Silva Bereta
A FORMAÇÃO ÉTICA DO(A) FUTURO(A) PSICÓLOGO(A):
AVALIAÇÃO DA COMPETÊNCIA MORAL NA GRADUAÇÃO EM
PSICOLOGIA .................................................................................... 333
Matheus Estevão Ferreira da Silva, Patrícia Unger Raphael Bataglia
METODOLOGIAS ATIVAS E O ENSINO TRADICIONAL: UMA
REFLEXÃO NA FORMAÇÃO NA LICENCIATURA EM
MATEMÁTICA ................................................................................. 355
Jerusa Ainoã Palheta de Souza Cardoso
A PSICOLOGIA MORAL NA FORMAÇÃO CONTINUADA DE
PROFESSORES EM UM MESTRADO PROFISSIONAL .............. 381
Rita Melissa Lepre, Eduardo Silva Benetti
SOBRE OS AUTORES E AUTORAS ............................................... 409
15
Prefácio
O livro “A formação ética do educador em contextos
diversos”, organizado pelas professoras Patrícia Unger Raphael
Bataglia e Priscila Caroline Miguel e pelo doutorando Matheus
Estevão Ferreira da Silva, da Universidade Estadual Paulista
UNESP, Campus de Marília, constitui-se um exemplo de produção
científica de alta qualidade, realizado por um grupo de pesquisadores
e estudantes de pós-graduação. A história dele começa na disciplina
“A formação ética do educador”, que foi ofertada no Programa de
Pós-Graduação em Educação (PPGE) da UNESP/Marília, no ano de
2023, por uma das organizadoras deste livro, a professora Patrícia
Unger Raphael Bataglia, ao qual somaram-se dois grupos de estudo:
o primeiro, o Grupo de Estudos e Pesquisas em Psicologia Moral e
Educação Integral (GEPPEI), também sediado na UNESP de
Marília, e o segundo, o Grupo de Estudos e Pesquisas em
Desenvolvimento Moral e Educação (GEPEDEME), da UNESP,
Campus de Bauru.
A ênfase no primeiro parágrafo em “grupo” e “qualidade” é
devido à complexidade da vida moderna, em que as pessoas estão
envolvidas em muitas atividades, o que não torna fácil agrupá-las em
torno de um objetivo comum, como a produção de livro em que é
discutido a formação ética dos educadores. Esta tarefa foi realizada
com a orientação das organizadoras do livro, que souberam motivar
https://doi.org/10.36311/2024.978-65-5954-473-8.p15-22
16
os alunos e pesquisadores na produção dos capítulos. O resultado é
um texto de alta qualidade, que começa prestando homenagem a
Georg Lind (1947-2021), um dos grandes pesquisadores da área de
Desenvolvimento Moral. Seu trabalho deixou duas grandes marcas.
A primeira a construção de um instrumento para medir a
competência moral e, a segunda, o desenvolvimento de uma
metodologia para a concretização de uma Educação Moral, o
Konstanz Method of Dilemma Discussion” (KMDD).
O livro está organizado com uma apresentação, em que as
organizadoras expõem a motivação e objetivo dele, voltado para a
reflexão da formação de pessoas pelo sistema educacional brasileiro,
que tem um arcabouço legal forte, fundamentado na Constituição e
na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), mas que
precisa de estudos para mostrar os melhores caminhos para uma
educação emancipadora do ser humano. Entendo que este livro, com
seus 16 capítulos, apresenta uma reflexão coerente, baseada em fortes
evidências científicas e em teóricos da área da Moralidade Humana,
especialmente Jean Piaget, Lawrence Kohlberg e Georg Lind.
O primeiro capítulo, “O conceito de socialização sob a ótica
da epistemologia genética: um saber necessário a formação docente”,
é de Thiago C. Lima. O autor é Educador Físico, Mestre em
Educação e atualmente Doutorando em Educação. O texto é parte
do seu mestrado em Educação, defendido em 2020 no PPGE, da
UNESP/Marília. A compreensão do processo de socialização permite
ao educador conhecer adequadamente como as crianças se inserem na
sociedade e a Epistemologia Genética sistematiza esta construção.
Apropriando-se deste saber os docentes poderão conhecer melhor seus
17
alunos e, desta forma, conduzir a sua disciplina para que ela faça parte
da formação social do aluno.
O segundo capítulo, “O tema da violência na formação de
professores”, foi escrito por Angel Sthefani Ramalho e Cristiane Paiva
Alves. A primeira autora é Licenciada em Física e Mestranda no
PPGE da UNESP/Marília e, a segunda, é Terapeuta Ocupacional,
Mestre e Doutora em Educação Especial pela UFSCAR e,
atualmente, docente da Faculdade de Filosofia e Ciências e do PPGE,
da UNESP/Marília. Neste capítulo analisam o Projeto CONVIVA,
da Secretária Estadual da Educação (SEDUC), especialmente a pauta
“Conflito e Convivência”, para a qual apresentam críticas e sugestões.
O terceiro capítulo, “O papel da psicologia escolar no
enfrentamento à evasão de alunosé de Vilma Aparecida Bianchi. Ela
é Psicóloga, com Mestrado em Psicologia e, atualmente Doutoranda
em Psicologia. Trabalha com crianças e adolescentes com deficiências.
O seu texto é uma revisão da literatura, que discute o papel da
Psicologia no enfrentamento da evasão escolar, as práticas de ensino
que tem sentido para os alunos e a relação da escola com a
comunidade. Ela o conclui considerando a importância do trabalho
do Psicólogo Escolar, com uma atuação preventiva, envolvendo todos
os atores da escola: alunos, professores e os funcionários.
O quarto capítulo, “Clima escolar na educação brasileira:
relações, desafios e perspectivas da gestão educacional nos últimos dez
anos”, é de Thaís São João Castellini. Ela é Pedagoga e Mestre em
Educação pelo PPGE/UNESP de Marília. O seu texto expõe uma
revisão da literatura sobre o Clima Escolar, mostrando um
crescimento das investigações sobre este tema.
18
O quinto capítulo, Uma reflexão sobre o uso das
metodologias ativas no ensino do PROEJA integrado a educação
profissional”, é de Cristina do Socorro Ribeiro da Costa. Ela é
Licenciada em Letras e Mestranda em Educação no PPGE/UNESP
de Marília. O seu texto discute as metodologias ativas, especialmente
na educação de jovens e adultos.
O sexto capítulo, “A importância das competências sociais na
educação do/no campo”, é de Andreia do Nascimento Lima e
Henrique Tahan Novaes. A primeira autora é graduada em
Administração Pública e Mestranda em Educação no PPGE/UNESP
de Marília. O segundo autor, é professor da Faculdade de Filosofia e
Ciências da UNESP de Marília e Coordenador do PPGE da mesma
Faculdade. O texto discute as competências sociais na educação, com
ênfase nas atividades envolvendo a educação desenvolvida no campo.
O sétimo capítulo, “A formação continuada do educador
como oportunidade de construção de ações refletidasé de Graziella
Diniz Borges e Patrícia Unger Raphael Bataglia. A primeira autora é
Mestre e Doutora em Educação, professora na Educação Básica e
Superior. A segunda autora é Psicóloga, Mestre e Doutora na mesma
área. Atualmente é professora associada na Faculdade de Filosofia e
Ciências da UNESP de Marília, onde atua na graduação e no PPGE.
O texto discute as possibilidades de diálogo entre a práxis de Paulo
Freire, o educador reflexivo de Schon e a tomada de consciência de
Piaget.
O oitavo capítulo, “A formação ética do(a) futuro(a)
educador(a): avaliação do juízo moral na graduação em pedagogia”,
tem autoria tripla. O primeiro autor é Matheus Estevão Ferreira da
Silva, Pedagogo, Mestre em Educação e Doutorando em Educação
19
no PPGE/Unesp de Marília. A segunda autora é Alessandra de
Morais, Psicóloga, Mestre e Doutora em Educação. Atualmente é
professora da Faculdade de Filosofia e Ciências da UNESP de Marília
e, a terceira autora, é Tânia Suely Antonelli Marcelino Brabo,
Pedagoga, Mestre em Educação e Doutora em Sociologia. Ela é
professora da Faculdade de Filosofia e Ciências da UNESP de
Marília. O texto apresenta resultados de uma pesquisa sobre o juízo
moral de alunos do 1
o
e 4
o
ano de um curso de Pedagogia, na qual
aplicaram o teste DIT-2. Os resultados mostraram que o desempenho
do desenvolvimento moral do 1
o
para o 4
o
ano não se alterou. Este
resultado é discutido em relação a formação ética do futuro educador.
O nono capítulo, Brincadeira é coisa séria! possibilidade para
se trabalhar com a formação ética do educador”, é de Cristiane Paiva
Alves, Bruna Assem Sasso dos Santos e Fábio Luiz de Almeida
Bertacini. A primeira autora foi apresentada no segundo capítulo.
A segunda autora é Pedagoga com Mestrado e Doutorado em
Educação e, o terceiro autor, é Psicólogo e Mestrando em Educação
no PPGE da UNESP de Marília. O texto apresenta a possibilidade de
trabalho na formação ética do educador com a brincadeira “Escravos
de Jó”.
O décimo capítulo, Formação de professores na área da
saúde: competência moral e empatia”, é de Fernanda Moerbeck
Cardoso Mazzetto, Patrícia Unger Raphael Bataglia, Cristiane Paiva
Alves e Juliana Gonçalves Herculian. A primeira autora, a Fernanda,
é Doutora em Enfermagem e Docente da Faculdade de Medicina de
Marília. Atualmente está realizando um estágio pós-doutoral junto ao
PPGE da UNESP de Marília. A segunda e a terceira autora, a Patrícia
e a Cristiane, foram apresentadas em capítulos anteriores. A última
20
autora, a Juliana, é Enfermeira, com Mestrado em Enfermagem e
atualmente é Doutoranda em Educação no PPGE da UNESP de
Marília. O texto discute a formação moral dos educadores na área de
saúde, especialmente os conceitos de empatia e competência moral.
O cimo primeiro capítulo “O uso de metodologias ativas
colabora na formação ética do futuro médico?”, é de Priscila Caroline
Miguel e Juliana Gonçalves Herculian. A primeira autora é Psicóloga,
Mestre e Doutoranda em Educação e, a segunda autora, foi
apresentada no capítulo anterior. A partir da distinção de ética e
moral, apresentada por La Taille, e as teorias de desenvolvimento
moral de Piaget e Kohlberg, discutem a formação ética do futuro
médico e o papel das metodologias ativas nesta empreitada.
O décimo segundo capítulo, “A importância das
metodologias ativas na formação de profissionais da saúde da
atualidade”, é de Cláudia Érika S. do Nascimento Lima. A autora é
enfermeira e atualmente é Mestranda no PPGE da UNESP/Marília.
Traz novas possibilidades de discussão das metodologias ativas na
formação de profissionais de saúde.
O décimo terceiro capítulo, “O fazer ético do educador:
desafios e perspectivas na formação e licenciatura em psicologia”, é de
Thaísa Angélica Déo da Silva Bereta. A autora é Psicóloga, com
mestrado, doutorado e pós-doutorado em Educação. Atualmente é
docente e coordenadora do Curso de Psicologia do Centro
Universitário de Adamantina e docente no Curso de Psicologia da
Faculdade da Alta Paulista. O texto apresenta, inicialmente, a questão
ética e a moralidade, para, em seguida, discutir a formação oferecida
nos cursos de Psicologia.
21
O décimo quarto capítulo, “A formação ética do(a) futuro(a)
psicólogo(a): avaliação da competência moral na graduação em
psicologia”, é de Matheus Estevão Ferreira da Silva e Patrícia Unger
Raphael Bataglia. Ambos autores foram apresentados em capítulos
anteriores. O texto apresenta uma pesquisa com alunos de um curso
de Psicologia, que foram avaliados quanto a sua competência moral,
pelo teste desenvolvido por G. Lind. Os resultados não apresentaram
progresso na competência moral dos alunos do primeiro para o quinto
ano.
O cimo quinto capítulo, Metodologias ativas e o ensino
tradicional: uma reflexão na formação na licenciatura em
matemática”, é de Jerusa Ainoã Palheta de Souza Cardoso. A autora
é Licenciada em Matemática e Mestranda em Educação no PPGE da
UNESP de Marília. O texto discute a formação de licenciandos em
Matemática, que predomina o ensino tradicional, e discute pesquisas
atuais sobre as possibilidades de metodologias ativas no ensino desta
área do conhecimento.
O último capítulo, o décimo sexto, “A psicologia moral na
formação continuada de professores em um mestrado profissional”, é
de Rita Melissa Lepre e Eduardo Silva Benetti. A primeira autora é
Psicóloga, com Mestrado e Doutorado em Educação. Ela é professora
associada da Faculdade de Ciências, da UNESP de Bauru e Líder do
Grupo de Estudos e Pesquisas em Desenvolvimento Moral e
Educação (GEPEDEME). O segundo autor é Mestre em Docência
para Educação Básica e Professor Recreacionista na rede municipal de
Catanduva, SP. O texto discute pesquisas apoiadas na Psicologia
Moral direcionadas para a formação do professor-pesquisador.
22
Resultados mostram o papel importante desta área de conhecimento
para a formação de professores.
Os textos apresentados neste livro apresentam várias
possibilidades de discussão e implantação de propostas voltadas para
a formação ética do educador. Este saber traz uma rie de implicações
para a comunidade científica, para os formadores de professores da
Educação Básica, para os professores que estão no exercício da
profissão e para os licenciandos, que serão os futuros professores.
Finalizo este prefácio parabenizando os organizadores e todos os
autores pela brilhante obra que estão disponibilizando para toda a
comunidade brasileira.
São José do Rio Preto, SP, 25 de setembro de 2023.
Raul Aragão Martins
Professor Associado do Departamento de Educação
Universidade Estadual Paulista - UNESP
Campus de São José do Rio Preto
23
Apresentação
Dizem que um livro tem sempre muitas histórias para contar.
E, com esta obra, por nós organizada, não poderia ser diferente. O
livro A formação ética do educador em contextos diversos nasce das
histórias de alguns alunos e alunas que cursaram a disciplina A
formação ética do educador, que foi ofertada no Programa de Pós-
Graduação em Educação (PPGE) da Faculdade de Filosofia e
Ciências (FFC), Universidade Estadual “Júlio de Mesquita Filho”
(UNESP), Campus de Marília, durante o primeiro semestre de 2023
pela Profa. Dra. Patrícia Unger Raphael Bataglia.
Logo depois, soma-se a este livro histórias de membros do
Grupo de Estudos e Pesquisas em Psicologia Moral e Educação
Integral (GEPPEI), também sediado na FFC/UNESP de Marília, e
de alguns colegas convidados, como de membros do Grupo de
Estudos e Pesquisas em Desenvolvimento Moral e Educação
(GEPEDEME), sediado na Faculdade de Ciências (FC) da UNESP,
Campus de Bauru, os quais também participam e colaboram em
pesquisas com o GEPPEI.
São histórias que fazem parte do percurso acadêmico de cada
um de seus autores e autoras que assumem um objetivo em comum:
para uma educação que seja, de fato, humanizadora, integral e
democrática, faz-se necessário pensar a formação ética dos(as)
educadores(as) que nela atuam. Não acreditamos no desenvolvimento
de cidadãos e cidadãs autônomos moralmente falando, sem a presença
https://doi.org/10.36311/2024.978-65-5954-473-8.p23-28
24
de educadores(as) éticos(as) em sua formação. se é capaz de
construir um ambiente sociomoral que de fato colabore para a
construção da autonomia moral de seus(suas) educandos(as), se os(as)
educadores(as) realmente tenham uma formação ética.
Vale salientar que, com a redemocratização do Brasil, uma
série de documentos e parâmetros são promulgados na tentativa de
(re)organizar a Educação Básica até o Ensino Superior nessa direção.
Desde a Constituição Federal (BRASIL, 1988) enfatiza-se a
necessidade da construção de uma sociedade livre, justa e solidária,
que promova o bem-estar de todos e tenha a garantia da educação
como um dos direitos fundamentais dos brasileiros e brasileiras.
Em consonância com a Constituição, temos como destaque a
Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), que apresenta
o seguinte objetivo: “o aprimoramento do educando como pessoa
humana, incluindo a formação ética e o desenvolvimento da
autonomia intelectual e o pensamento crítico” (BRASIL, 1996, p.
24). Em 1997, temos também a promulgação dos Parâmetros
Curriculares Nacionais (PCNs) (BRASIL, 1997), que defendem a
transformação das relações sociais nas dimensões econômica, política
e cultural, garantindo a todos(as) a efetivação do direito à cidadania.
E, no âmbito educativo, o mesmo documento apresenta
fundamentos que “permitem orientar, analisar, julgar, criticar as ações
pessoais, coletivas e políticas na direção da democracia” (p. 21). Não
obstante, também cita a ética como um de seus temas transversais, uma
vez que “[...] o modo como se o ensino e a aprendizagem, isto é,
as opções didáticas, os métodos [...] que conformam a experiência
educativa, ensinam valores, atitudes, conceitos e práticas sociais” (p.
26). Com isso, emana-se desse documento a compreensão de que a
25
escola influencia na formação ética e em valores morais dos(as)
educandos(as), seja de forma direta e sistematizada ou indireta e não
planejada, consciente ou inconscientemente (SILVA et al., 2020).
Sendo assim, a contribuição da escola é, ou deveria ser, a de
desenvolver um projeto de educação comprometido com a
intervenção na realidade para que de fato possamos transformá-la, ou
seja, que favoreça o desenvolvimento da autonomia e o aprendizado
da cooperação e da participação social. E não conseguiremos isso se
tratarmos os valores morais apenas como conceitos ideais e não
incluirmos essa perspectiva de formação na transmissão de conteúdos
das áreas de conhecimento escolar.
O documento que norteia a formação inicial de
professores(as) para a Educação Básica atualmente é a Base Nacional
Comum para a Formação Inicial de Professores para a Educação Básica
(BNC-Formação). Esse documento preconiza que as competências
específicas destes profissionais se enquadrem em três dimensões
fundamentais, que se complementam na prática docente, são elas: a)
conhecimento profissional: envolve dominar e saber ensinar os objetos
do conhecimento, demonstrar saber como os estudantes aprendem,
reconhecer o contexto de vida dos estudantes, além de conhecer a
estrutura e a governança dos sistemas educacionais; b) prática
profissional: abrange planejar as ações de ensino que resultem em
efetivas aprendizagens, criar e saber gerir os ambientes de
aprendizagem, avaliar o desenvolvimento do educando, a
aprendizagem e o ensino, bem como conduzir as práticas pedagógicas,
as competências e as habilidades dos objetos do conhecimento e, por
fim, c) engajamento profissional: que implica em comprometer-se com
o próprio desenvolvimento profissional e com a aprendizagem dos
26
estudantes, participar do Projeto Político-Pedagógico da escola e da
construção de valores democráticos e engajar-se, com as famílias e
com a comunidade, visando melhorias no ambiente escolar (BRASIL,
2019).
A BNC-Formação (BRASIL, 2019), com base nos mesmos
princípios das competências gerais estabelecidas pela Base Nacional
Comum Curricular (BNCC) (BRASIL, 2017) apesar das várias
fragilidades e limitações desse documento maior (MIGUEL; SILVA;
MIGUEL, 2023) –, salienta que a formação docente requer o
desenvolvimento, pelo(a) licenciando(a), das competências
supracitadas bem como das aprendizagens essenciais, que envolvem
os aspectos intelectual, físico, cultural, social e emocional de sua
formação, visando o desenvolvimento pleno das pessoas, ou seja, a
Educação Integral.
Então, considerando todo esse aparato normativo, que
sustenta a perspectiva de formação que defendemos, junto às
profícuas discussões geradas na referida disciplina ofertada no PPGE
e nos encontros dos GEPPEI e GEPEDEME sobre ela, organizamos
esta obra. O livro foi composto por 16 capítulos que contam a história
e trajetória de pesquisa de vários pesquisadores e pesquisadoras, os
quais abordam a formação ética, por exemplo, nos cursos de
Licenciaturas em Matemática e Pedagogia, Medicina, Psicologia; a
Psicologia Moral na formação continuada de professores em um
Mestrado Profissional; o papel do psicólogo escolar no enfrentamento
à evasão de alunos; o uso das brincadeiras para o trabalho com a
formação ética do educador; a importância da socialização; o tema da
violência na formação de professores; e, por fim, a importância das
27
metodologias ativas na formação de profissionais da área da Saúde na
atualidade.
Esperamos contribuir com estas pesquisas, que fazem parte
das nossas histórias, não para a divulgação das pesquisas
desenvolvidas em nosso Programa de Pós-Graduação e Grupos de
Estudos e Pesquisas, mas também para o avanço científico dos temas
abordados. Afinal, uma das funções primordiais da Universidade é a
produção de conhecimento científico, ancorado em um tripé
constituído por ensino, pesquisa e extensão. Além de contribuir com
a comunidade científica, tivemos o cuidado de tornar acessível a todos
os interessados e interessadas e em busca de uma formação ética que
realmente eduque na e para a consolidação da democracia de nosso
país.
Priscila, Matheus e Patrícia
(Os organizadores)
Referências
BRASIL. Presidência da República. Casa Civil. Constituição da
República Federativa do Brasil de 1988. 1988. Disponível em:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm.
Acesso em: 15 jan. 2022.
BRASIL. Lei de diretrizes e bases da educação nacional: Lei
9.394, de 20 de dezembro de 1996, que estabelece as diretrizes e
bases da educação nacional. 11. ed. Brasília: Câmara dos Deputados,
Edições Câmara, 2015[1996].
28
BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Básica.
Base Nacional Comum Curricular. Brasília: MEC/SEB, 2017.
BRASIL. Resolução CNE/CP n. 2, de 20 de dezembro de 2019.
Define as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Formação
Inicial de Professores para a Educação Básica e institui a Base
Nacional Comum para a Formação Inicial de Professores da
Educação Básica (BNC-Formação), 2019. Disponível em:
http://portal.mec.gov.br/index.php?option=com_docman&view=do
wnload&alias=135951-rcp002-19&category_slug=dezembro-2019-
pdf&Itemid=30192. Acesso em: 24 jul. 2023.
BRASIL. Parâmetros curriculares nacionais: apresentação dos temas
transversais, ética. Secretaria de Educação Fundamental. Brasília:
MEC/SEF, 1997.
MIGUEL, J. C.; SILVA, M. E. F. da; MIGUEL, P. C. A Educação
Infantil na BNCC: desafios à consolidação de direitos de
aprendizagem e desenvolvimento. Revista Brasileira de Educação
do Campo, v. 8, e16076, p. 1-27, 2023.
SILVA, M. E. F. da; MORAIS, M. L. de; BATAGLIA, P. U. R.;
MORAIS, A. de; BRABO, T. S. A. M. À sombra da educação
tradicional: quando a educação e formação em valores se voltam
para gênero e sexualidades. Revista Humanidades e Inovação, v. 7,
n. 8, p. 96-111, 2020.
29
O Conceito de Socialização Sob a Ótica da
Epistemologia Genética: Um Saber Necessário a
Formação Docente
Thiago Corado LIMA
1
Introdução
A formação ética do educador, assunto central deste livro, é
um tema caro para o campo da Educação, exclusivamente frente a
conjectura em que este capítulo pretende desenvolvê-lo: a
compreensão do conceito de socialização sob a ótica da Epistemologia
Genética.
Este capítulo estrutura-se como um recorte da pesquisa de
Lima (2020), que buscou apresentar o conceito de socialização a
partir da teoria da Epistemologia Genética.
A formação ética do educador perpassa pela compreensão de
alguns conceitos, os quais são evidenciados em sua práxis educativa,
esta incide diretamente na formação dos estudantes. A prática/ação
docente ética envolve um processo dinâmico, dialético, entre o fazer
e o pensar sobre o fazer, ou seja, uma práxisação e reflexão.
1
Doutorando em Educação pela Faculdade de Filosofia e Ciências (FFC), Universidade
Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” (UNESP), Campus de Marília, São Paulo, Brasil.
E-mail: corado.lima@unesp.br.
https://doi.org/10.36311/2024.978-65-5954-473-8.p29-54
30
Sendo assim, a ação docente no cenário escolar perpassa por
uma genuína tomada de consciência, por meio da qual manifestam-
se suas concepções epistemológicas acerca dos processos de ensino-
aprendizagem, logo os objetivos da educação, os quais, aos nossos
olhos devem servir para “libertar os sujeitos, emancipando-os para
além da vida acadêmica, ou, dos muros da escola, proporcionando-os
uma consciência crítica do mundo e do conhecimento.
Nesse sentido a formação ética do educador deve abarcar um
sentido maior à Educação, quer seja, um modelo educacional que
valorize em suas práticas o desenvolvimento e a construção da
autonomia do discente enquanto ser humano, a responsabilidade de
estar em uma relação que deve ser ética, a responsabilidade social pelo
ensino-aprendizagem e sua aplicação na sociedade, o posicionamento
frente aos problemas sociais e com isso decidir quais decisões a serem
tomadas, o que se pode resumir que o espaço educacional não é um
espaço de repetições ou de comodismo, mas é um espaço dinâmico
em que o diálogo deve acontecer com respeito e ética, e o papel do
professor, para que isto aconteça, é essencial.
Esse capítulo tem por objetivo conduzir o leitor a uma
reflexão sobre o conceito de socialização observado a partir dos
pressupostos teóricos da Epistemologia Genética, buscamos
evidenciar que a compreensão do referido conceito contribui para a
formação ética dos educadores pois aponta para a construção de um
modelo de Educação Integral, com foco na formação humana, que
oportuniza o desenvolvimento da autonomia e a emancipação dos
sujeitos.
A leitura e compreensão da obra de Jean Piaget (1975; 1982;
1993; 1994) permitiu-nos tomar consciência do significado
31
verdadeiro da socialização, possibilitou-nos descobrir que a
compreensão desse conceito estava na explicação dos processos pelo
qual o sujeito constrói o conhecimento e que havia um caminho
alternativo para superar os paradigmas epistemológicos evidenciados
no percurso histórico da Educação brasileira refletidos na prática de
ensino dos professores; permitiu-nos ainda observar que no
pensamento de Piaget havia uma teoria do conhecimento
indissociável da transformação da realidade, o que levou-nos a
questionar a passividade do aluno e a sujeição à autoridade e aos
conteúdos do currículo escolar, motivando-nos a romper com os
modelos de ensino pautados na transmissão de conhecimentos, os
quais fundamentam-se no empirismo e apriorismo.
Contudo, o que queremos salientar é que a compreensão do
conceito de socialização sob a ótica da Epistemologia Genética
tornou-se para nós um desafio intelectual, pois supera alguns
paradigmas ao apresentar como condição essencial para a construção
do conhecimento a liberdade de agir e pensar do sujeito, tendo como
pressuposto a necessidade do mesmo em tomar consciência da prática
e da realidade vivida (ação e reflexão).
Quando nos referimos à socialização, estamos apontando para
a capacidade do sujeito em cooperar, isso refere-se à capacidade do
mesmo em coordenar pontos de vista, um processo que envolve as
relações externas do sujeito com o outro/objeto de conhecimento, e a
construção de estruturas cognitivas que possibilitam a capacidade do
sujeito de descentrar-se, romper o egocentrismo inicial e assim,
cooperar intelectualmente de maneira recíproca, o que lhe possibilita
construir conhecimentos e desenvolver sua autonomia em todos os
campos de sua vida.
32
Se no começo da nossa pesquisa a obra de Piaget foi um
instrumento teórico para compreender a socialização (Lima, 2020),
com o tempo o pensamento desse autor se tornou um objetivo central
da nossa formação intelectual. Logo, tomamos consciência que o
pensamento desse autor nos permitiria construir uma Educação como
atividades emancipatórias e civilizatórias.
O Conceito de Socialização Sob a Ótica da
Epistemologia Genética
As ideias de Jean Piaget (1896 – 1980) representam um salto
qualitativo na compreensão do desenvolvimento humano,
principalmente em relação à construção do conhecimento na medida
em que é evidenciada uma tentativa de integração entre o sujeito e o
mundo por meio da ação e reflexão. Para o autor, a tese da construção
do conhecimento - construtivismo - ultrapassa as teses empiristas e
aprioristas e o conhecimento humano é fruto da socialização do
sujeito com o mundo. Por meio dela, o sujeito constrói esquemas
solidários e dialéticos.
Na obra “Estudos sociológicos”, Piaget (1973), evidenciou
alguns aspectos da socialização e buscou explicar o desenvolvimento
do egocentrismo para descentração nas relações do sujeito com o
outro e com o objeto de conhecimento.
De acordo com o pensamento de Piaget (1973), a
socialização, estrutura-se sobre os aspectos da cooperação e pode ser
definida como a capacidade que o sujeito constrói de coordenar as
próprias ações e pensamentos às ações e pensamentos do(s) outro(s)
(trocas dos pontos de vista), por meio da capacidade de descentração
e reversibilidade do pensamento, através de sucessivas tomadas de
33
consciência. Isso em relação a pessoas e ao próprio objeto de
conhecimento.
A capacidade do sujeito de coordenar pontos de vista
colocando-se como expectador do(s) outro(s) com quem se relaciona
e buscando entender as proposições destes, corresponde a uma
capacidade de assimilação, trata-se de uma capacidade cognitiva e
inicia-se a partir da ação do sujeito sobre o mundo. Podemos dizer
que na assimilação o sujeito, em sua relação com o objeto, o interpreta
e o torna parte de seus esquemas, incorporando-o. No entanto, por
conta da resistência do objeto nessa corporação, o sujeito age sobre
essa resistência, modificando suas estruturas. Chamamos esse outro
processo de acomodação.
Mas não basta somente a disposição de escutar o outro, é
necessário que existam mecanismos que possibilitem superar o
egocentrismo inicial, dando condições para que a criança consiga
olhar o outro para além de si. Nesse sentido, a atividade intelectual
do sujeito se inicia com uma indiferenciação entre sua relação com o
mundo e a consciência de si mesmo, graças também à indiferenciação
entre a assimilação e a acomodação, ou seja, não tendo o
conhecimento de si e nem do objeto propriamente dito, mas de sua
utilização, a inteligência se desenvolve pelo conhecimento de sua
interação. Ao passo que evoluem a diferenciação e a coordenação
entre a assimilação e a acomodação, e, por consequência, ocorre a
multiplicação e a diferenciação dos esquemas, o sujeito se percebe
como parte do todo, ao mesmo tempo em que se diferencia dele; com
isso, distingue sua ação sobre o mundo, da resistência dos objetos à
sua ão e as particularidades destes diferenciando o próprio
funcionamento intelectual de sua experiência física. Na medida em
34
que a assimilação e a acomodação superam o estado inicial de “falso
equilíbrio” entre as necessidades do indivíduo e a resistência das coisas
e atinge o genuíno equilíbrio, isto é, uma harmonia entre a
organização interior e a experiência externa, a perspectiva do sujeito a
respeito do universo se transforma radicalmente, passando de um
egocentrismo integral à objetividade.
Destarte, segundo Piaget (1973), a evolução na relação da
assimilação e da acomodação que se no plano da inteligência
prática (inteligência sensório-motora) se constituirá em um processo
análogo no plano da inteligência verbal e reflexiva, assim como no
âmbito das relações sociais do sujeito.
Pretendemos aqui apresentar o processo de socialização sob a
ótica de Piaget (1973) observado nos estádios do desenvolvimento da
inteligência, a saber: sensório-motor, pré-operatório, operatório
concreto e operatório formal.
Inicialmente, na inteligência sensório-motora, é impossível
falar em socialização da inteligência, pois esse período constitui-se por
uma inteligência puramente individual e adaptativa. Observa-se que
a imitação não exerce influência sobre a inteligência. A coordenação
dos esquemas sensório-motores será possível quando a criança
tentar resolver, por ela mesma, os problemas práticos apresentados. A
capacidade da criança em buscar objetos perdidos (objeto
permanente) é o primeiro momento da conquista de uma autonomia
prática.
O pensamento é centrado, por isso mesmo ele não é
socializado, o que dependerá de uma diferenciação através da
crescente descentração do pensamento e que, consequentemente, é
promovida por meio da socialização entre os pares, ou seja, por meio
35
da ação do sujeito sobre o mundo. Assim: “[...] o egocentrismo é o
estado de indiferenciação que ignora a multiplicidade das
perspectivas, enquanto que a objetividade supõe, ao mesmo tempo,
uma diferenciação e uma coordenação dos pontos de vista” (PIAGET;
INHELDER, 1955/1976, p.256).
Num segundo momento, no estádio pré-operatório, a criança
ainda não consegue cooperar, entretanto avança em sua capacidade
de diferenciar-se do outro. Esse é marcado cognitivamente pelo
aparecimento da capacidade de representar. Essa capacidade é
anunciada pela imitação, diferida na transição entre esta etapa e a
anterior, na qual a criança aplica os movimentos sem a presença de
um modelo atual. Essa possibilidade se deve à construção de uma
imagem mental (uma imitação interiorizada) sobre ações e objetos. O
período da inteligência pré-operatória caracteriza-se também pelo
surgimento da função simbólica, possibilitando transformações nas
ações e nos objetos com a finalidade de adaptar o real ao eu. A
manifestação da função simbólica acontece na linguagem, no desenho
e no jogo simbólico, sendo que a linguagem equivale a um conjunto
de sinais coletivos onde nem todos são compreendidos de antemão,
mas são assimilados na medida em que se ampliam e vão se
completando por sinais individuais.
De acordo com Piaget (1973), as trocas interindividuais
caracterizam-se “por um egocentrismo que permanece a meio
caminho do individual e do social e que pode se definir por uma
indiferenciação relativa do ponto de vista próprio e do ponto de vista
do outro (p. 179). As coações intelectuais são assimiladas à
mentalidade egocêntrica e a transformam superficialmente.
36
O estádio operatório traz a possibilidade cognitiva da criança
de cooperar. Num primeiro momento, a operação relaciona-se ao
concreto, a criança não realiza hipóteses de pensamento, o que
provavelmente se tornará possível posteriormente no estádio
operatório formal. Piaget (1973) aponta que existe nesse momento
um “nítido progresso da socialização: a criança se torna capaz de
cooperação, isto é, não pensa mais em função dela só, mas da
coordenação real ou possível dos pontos de vista (p. 180). Sendo
assim, o progresso se exprime por meio da reflexão, da colaboração,
de exposições ordenadas, de regras comuns, de relações de
reciprocidade e então torna-se possível perceber uma íntima relação
entre o desenvolvimento das operações lógicas e a cooperação.
Segundo Piaget (1973),
A formação da lógica na criança, primeiramente, evidencia dois
fatos essenciais: que as operações lógicas procedem da ação e que
a passagem da ação irreversível às operações reversíveis se
acompanha necessariamente de uma socialização das ações,
procedendo ela mesma do egocentrismo à cooperação. (p. 95).
O pensamento em comum possibilita a conservação e a
reversibilidade e favorecem a substituição de objetos por sinais. Logo,
“um agrupamento é um sistema de conceitos (classes ou relações)
implicando uma coordenação dos pontos de vista e uma posição em
comum do pensamento.” (PIAGET, 1973, p.181).
Outra característica presente nesse momento é a de
conservação, por meio das operações concretas a criança compreende
que podemos mudar o formato dos materiais sem que sua composição
37
seja alterada. Simultânea à capacidade de operar, a conservação dos
elementos fornece condições para a reversibilidade.
Do ponto de vista do desenvolvimento da capacidade de
cooperar, a conservação permite que o sujeito mantenha duas
proposições, dois ou mais pontos de vista diferentes, e consiga
relacioná-los, coordenando-os. A capacidade de substituir seu próprio
ponto de vista pelo do sujeito com quem se relaciona, na intenção de
compreendê-lo, é possibilitado por meio da conservação.
Por conseguinte, no estádio das operações formais não
mais a dependência pelos materiais concretos e o sujeito parte das
proposições que ele elabora embasado na operação de pensamento.
Nessa direção, para Piaget e Inhelder (1955/1976), “[...] o
pensamento formal parte da hipótese, isto é, do possível, em vez de
limitar-se a uma estruturação direta dos dados percebidos” (p.190).
O pensamento formal é, na realidade, essencialmente hipotético
dedutivo: a dedução não mais se refere diretamente a realidades
percebidas, mas a enunciados hipotéticos, isto é, a proposições
que se referem a hipóteses ou representam dados apenas como
simples dados, independente de seu caráter real: a dedução
consiste, então, em ligar entre essas suposições, e delas deduzir
suas consequências necessárias, mesmo quando sua verdade
experimental não ultrapassa o possível (PIAGET e INHELDER,
1955/1976, p.189).
Nesse momento, a descentração cognitiva está cada vez mais
relacionada com a objetividade, o que possibilita que o sujeito
compreenda as relações sociais para além do seu ponto de vista. O
pensamento operatório proporciona a capacidade de cooperar
efetivamente.
38
A socialização pressupõe a capacidade de ter consciência de si
próprio como sujeito, se dissociando do objeto, não considerando seu
ponto de vista como único, ou seja, a premissa é de que a criança
consiga relacionar-se com outras de maneira recíproca. Portanto,
adaptar-se ao meio é construir um conjunto de relações e situar-se
entre elas por uma atividade de coordenação intelectual que torna
necessária a descentralização e reciprocidade nos pontos de vista. Ao
passo que as capacidades cognitivas da criança se desenvolvem, os
aspectos das relações tornam-se qualitativamente melhores.
Nessa direção, podemos afirmar que pensar com objetividade,
característica do pensamento formal, exige “tomada de consciência”,
que segundo Piaget (1974/1977), significa a capacidade que o sujeito
constrói de dominar os processos do pensamento, conceituando-os e,
com isso, generalizando-os. Na perspectiva do autor, a tomada de
consciência, emerge de uma construção contínua que não é dada a
priori, trata-se de uma construção sucessiva proveniente da relação
entre sujeito e objeto. É preciso destacar que esse processo não se trata
de uma “iluminação ou uma “apropriação”, mas uma construção
progressiva em diferentes níveis de Tomada de Consciência, que
ocorrem por um processo que evolui das ações práticas à
conceituação.
Deste modo, Piaget (1974/1977) afirma que (n)a Tomada de
Consciência: 1) supõe uma conceituação, pois implica em
coordenações; 2) as ações do sujeito são assimiladas (reconstrução); 3)
pode ocorrer sem conflitos com esquemas anteriores (composição
progressiva); 4) o conflito leva o sujeito a pensar (corrigir o esquema
anterior); 5) ao “recalcar” o sujeito economiza na solução, evitando o
conflito. Em resumo, para ele, a tomada de consciência é:
39
[...] um processo de conceituação que reconstrói e depois
ultrapassa, no plano da semiotização e da representação, o que
era adquirido no plano dos esquemas de ação. Não há, portanto,
diferença de natureza, numa tal perspectiva, entre a tomada de
consciência da ação própria e o conhecimento das sequências
exteriores ao sujeito, comportando ambos uma elaboração
gradativa de noções a partir de um dado, quer este consista em
aspectos materiais da ação executada pelo sujeito, quer em
aspectos materiais das ações que são realizadas entre os objetos
(PIAGET, 1974/1977, p. 204).
É por meio de sua ação que o sujeito organiza e transforma o
meio e a si mesmo, e são os processos internos que garantem a
organização e reorganização dos esquemas tornando-os mais
complexos e organizando-se na direção dos conceitos. Esta
inteligência prática, este saber fazer inicial, permite a interação da
criança com o meio e também de poder se apropriar do mundo
construindo níveis sucessivos e provisórios de tomada de consciência,
cada vez mais complexos.
Na obra “A tomada de consciência” ([1974], 1977), Piaget
nos conduz a observar e a compreender o mecanismo da tomada de
consciência. Concebida a partir de uma situação de não adaptação ou
de readaptação, ela se constitui da periferia para o centro da relão
entre sujeito e objeto, em outras palavras, inicia-se com os objetivos e
resultados de uma determinada ação, e posteriormente, de maneira
gradativa, alcança os fatores internos tais como a causalidade dos
objetos ou as coordenações de ações do sujeito. Num primeiro
momento a ação do sujeito e as características dos objetos
confundem-se, não havendo diferenciação entre um e outro.
Progressivamente, o sujeito vai tomando consciência da
40
independência relativa e recíproca entre ele e o objeto, um
movimento análogo de conhecimento que conduz aos mecanismos
centrais da ação do sujeito e das propriedades intrínsecas dos objetos.
A ão que é dominada no vel prático eleva-se à conceituação
transformando-se em pensamento e, posteriormente tudo o que o
sujeito aprendeu no nível da experiência é ressignificado em
conceitos: trata-se de uma reestruturação que aumenta
potencialmente a capacidade cognitiva do sujeito.
A compreensão do conceito de tomada de consciência está
para além do sujeito se dar conta de um saber fazer, trata-se de um
processo de conceituação, fruto de progressivas reconstruções, é uma
compreensão no nível do pensamento de algo que se faz, atingindo o
porquê e o como se faz, de sorte que a própria ão pode ser afetada
e ressignificada por esse compreender. Tais reconstruções não partem
do nada, são resultados dos esquemas anteriores, os quais, por
algumas vezes, precisam ser corrigidos e/ou adaptados a novas
situações, conforme nos aponta Piaget ([1974], 1977):
As ações do sujeito, ao contrário, são vistas por ele e assimiladas
mais ou menos adequadamente por sua consciência como se se
tratasse de ligações materiais quaisquer situadas nos objetos,
donde a necessidade de uma construção conceitual nova para
explicá-las: na realidade, trata-se, então, de uma reconstrução,
mas não trabalhosa quanto o seria se não correspondesse a nada
de conhecido do próprio sujeito, e apresentando os mesmos
riscos de omissões e de deformações que existiriam se a questão
consistisse em explicar a si mesmo um sistema exterior de
conexões físicas (p. 201-202).
41
A relação entre a ação e a consciência se explica por meio do
processo de tomada de consciência, que se potencializa por construir
estruturas mentais cada vez mais elaboradas e capazes de compreender
e conceitualizar aquilo que se faz em termos de ação, ou seja, na
prática. Não se trata de um processo simples, pelo contrário, é um
processo bastante complexo e não pode ser entendido tal como uma
solução mágica ou instantânea, que transformaria a ão em conceito.
Conforme sabido, é um processo gradual de constantes
reconstruções que implica “desmontar”, em pensamento, as ações que
se conseguiu fazer para então compreendê-las.
Dongo-Montoya (2006) aponta que a relação entre a ação e a
consciência é fundamental para compreendermos a teoria piagetiana,
relação explicitada por ele, quando trata da questão inerente a
linguagem e o pensamento. A construção do pensamento ocorre
mediante um processo que se inicia na inteligência sensório-motora
prolongando-se até a inteligência conceitual, dos esquemas de ação
aos esquemas conceituais, envolvendo continuidade e reconstruções.
Nessa direção, a linguagem propicia o processo de socialização do
pensamento em razão da narrativa, ensejando a partir daí a
coordenação e os ajustamentos de pontos de vista. Neste momento, a
criança começa a compreender o mundo para além de si mesma,
alcançando a conceptualização, dessa forma, a relação entre
pensamento e linguagem tornam-se recíprocas.
As relações ocupam papel essencial no processo de
desenvolvimento da criança. Em muitos de seus estudos, Piaget
apresenta de uma maneira taxativa a importância das relações,
exclusivamente as de cooperação, para a construção do conhecimento.
Nessa direção, Piaget (1973) retoma a questão das relações sociais,
42
por meio das quais justifica as modificações no pensamento do
sujeito:
Existem, efetivamente, dois tipos extremos de relações
interindividuais: a coação, que implica uma autoridade e uma
submissão, conduzindo assim à heteronomia, e a cooperação, que
implica igualdade de direito ou autonomia, assim como a
reciprocidade entre personalidades diferenciadas. É evidente que
entre estes tipos-limites toda uma série de outras relações devem
ser previstas. [...] A coação transforma então o indivíduo muito
menos profundamente que a cooperação, e se limita a se recobrir
com fina camada de noções comuns, não diferindo, em sua
estrutura, das noções egocêntricas (p. 168).
Piaget (1994) admite a existência de um “paralelismo entre o
desenvolvimento moral e a evolução intelectual”, assim como um
parentesco entre as normas morais e as normas lógicas, logo, “[...] a
lógica é uma moral do pensamento, como a moral, uma lógica da
ação” (p. 295) e tais normas não são constituídas de forma inata pelo
indivíduo, porém, por meio das relações que se estabelecem com o
mundo.
Aspectos do Desenvolvimento Moral e a Socialização
De antemão, é válido esclarecer que, para Piaget (1973/1994),
tanto o desenvolvimento intelectual quanto o desenvolvimento
moral, ocorrem de forma solidária e recíproca na criança.
Conforme apresentado anteriormente, para Piaget (1973) a
socialização equivale à capacidade do sujeito em cooperar de maneira
recíproca, isso refere-se à capacidade de coordenar uma ou mais
43
perspectivas diferentes por meio da reciprocidade. Os estudos do
autor mostram que um paralelismo entre o desenvolvimento moral
e o desenvolvimento intelectual, de sorte que nem as normas lógicas
e nem as normas morais são inatas no sujeito, elas são construídas por
meio das relações que o sujeito estabelece com o mundo.
De acordo com Piaget (1994, p. 23) “toda moral consiste
num sistema de regras e a essência de toda moralidade deve ser
procurada no respeito que o indivíduo adquire por estas regras”. As
formas de respeito que se estabelecem prioritariamente nas relações
conduzem a formas distintas de moral: heteronomia ou autonomia.
A primeira proveniente do respeito unilateral e das relações de coação:
a moral heterônoma, que implica o sentimento do dever e a submissão
ao poder das pessoas. A segunda nasce da cooperação e do respeito
mútuo, trata-se da autonomia.
As relações do sujeito com o mundo ocupam um lugar de
grande importância para Piaget e são necessárias tanto para o
desenvolvimento moral quanto ao intelectual. A cooperação torna-se
fator essencial para que a criança se desvencilhe gradativamente do
egocentrismo inicial, conseguindo estabelecer trocas e coordenar
pontos de vistas ajustando-se a eles. Isso será possível num primeiro
momento, dentro do contexto social e, posteriormente a essa vivência
prática será possível estabelecer uma consciência dessas relações.
Achamos importante dizer que a moral, na concepção de
Piaget (1994), apesar de estar estritamente ligada às regras, deve ser
compreendida com base no modo como o sujeito se relaciona com
essa regra, fruto da relação que mantém com a pessoa que a cria ou
que a transmite. Por conseguinte, para Piaget, a moral não é a própria
regra, a regra é social e o respeito que se estabelece entre os indivíduos
44
nessa relação social é que legitima tal regra, o que inclui a teoria
sobre a moral de Piaget em uma perspectiva que crê em uma essência
humana da moralidade, presente nas relações sociais:
[...] a sociedade é o conjunto das relações sociais. Ora, entre estas,
dois tipos extremos podem ser distinguidos: as relações de
coação, das quais o próprio é impor do exterior ao indivíduo um
sistema de regras de conteúdo obrigatório, e as relações de
cooperação, cuja essência é fazer nascer, no próprio interior dos
espíritos, a consciência de normas ideais, dominando todas as
regras. Oriundas dos elos de autoridade e de respeito unilateral,
as relações de coação caracterizam, portanto, a maioria dos
estados de fato de dada sociedade e, em particular, as relações
entre a criança e seu ambiente adulto. Definidas pela igualdade e
pelo respeito mútuo, as relações de cooperação constituem, pelo
contrário, um equilíbrio limite mais que um sistema estático.
Origem do dever e da heteronomia, a coação é, assim, irredutível
ao bem e à racionalidade autônoma, produtos da reciprocidade,
se bem que a própria evolução das relações de coação tenda a
aproximá-las da cooperação. (PIAGET, 1994, p. 294).
Os conceitos de heteronomia e autonomia, sob a ótica
piagetiana, devem ser compreendidos não apenas como lugares de
partida e de chegada, mas como processos, construções que englobam
uma relação entre a ação e a consciência, os quais não dizem respeito
ao sujeito somente, mas também ao contexto em que ele está inserido,
enquanto relações, ou interações, que ele estabelece. Podemos dizer
que a vida social é necessária para que o espírito possa tomar
consciência das relações sociais e possa construir as regras. Longe
disso, ou seja, fora das relações sociais, o sujeito permanece
egocêntrico, indiferenciado do mundo, preso em seu próprio ponto
45
de vista. Para estar consciente do seu próprio ponto de vista, é
necessário o confronto entre o eu e o outro. Somente quando se está
em contato com os juízos e as avaliações dos outros, sofrendo a pressão
das normas intelectuais e morais coletivas, é que se pode superar a
anomia, tanto no campo da moral quanto no campo intelectual.
Por serem as relações sociais tão importantes e necessárias para
o desenvolvimento moral, podemos dizer que do nascimento aos
primeiros anos de vida, a primeira dessas relações que o sujeito
vivencia é a relação de coação e de respeito unilateral, trata-se de uma
primeira forma de controle lógico e moral, nesse sentido é
significativa para a vida moral do sujeito. Entretanto, esse controle
não é suficiente para superar o egocentrismo infantil, pois muitas
vezes acaba por reforçá-lo.
A predominância do egocentrismo não permite ao sujeito
uma diferenciação necessária do outro e dos objetos, o que caracteriza
para o autor o estado de anomia moral (carência do sentido de
obrigatoriedade das regras sociais). “[…] seja porque é puramente
motora, seja (início do estágio egocêntrico) porque é suportada, como
que inconscientemente, a título de exemplo, interessante e não
realidade obrigatória” (PIAGET, 1994, p. 34).
Devido ao respeito unilateral, a criança crê fortemente na
onisciência do adulto e na verdade absoluta das regras que dele recebe,
vivenciando uma forma de realismo moral. Esta percepção é
importante para o desenvolvimento da moralidade na criança e
constitui a primeira consciência do dever e uma primeira forma de
controle normativo.
Podemos observar que, no período em que se emerge a
inteligência pré-operatória, nascem as primeiras manifestações de
46
respeito à autoridade. O respeito é um sentimento que mistura amor
e temor. O primeiro sentimento de respeito manifestado é unilateral,
ou seja, a criança não espera o mesmo respeito ou obediência da
pessoa respeitada. É deste sentimento que surge o sentimento de
obrigatoriedade, pode se dizer que o sentimento de respeito possibilita
o sentimento do dever.
Piaget (1994) aponta que para que se possa falar de fato de
uma moral efetiva, é preciso que a consciência tenda para uma
autonomia, em que as regras sejam apreciadas interiormente em favor
do bem moral, no entanto, isso é possível dentro do respeito
mútuo, das relações de cooperação e reciprocidade. A heteronomia
será superada ao passo que o sujeito alcançar a autonomia e para isso,
é necessário que ele conquiste a capacidade de descentração, que
acontece nos campos da moral e da inteligência.
Cabe dizer que essa superação não determina a exclusão da
moral heterônoma, e sim, consiste na construção de mais uma
possibilidade para o sujeito: pensar e operar de maneira autônoma.
Ainda é importante considerar que mesmo que as relações de coação
se oponham às relações de cooperação, as primeiras são condições
necessárias para que, mais adiante, sejam possíveis as segundas. Assim,
pode-se dizer que não é possível estabelecer respeito mútuo sem antes
ter estabelecido respeito unilateral, ou seja, o respeito pelo outro.
Assim como ocorre no desenvolvimento intelectual, a
autonomia moral é possível a partir da cooperação. Esta e o respeito
mútuo levam às normas imanentes, catalisam e direcionam a moral;
assim, diferentemente da obediência, pode-se pensar em um ideal
interno, em um bem moral que não é imposto, mas construído pelo
sujeito.
47
É importante compreender que as relações de coação
conduzem o sujeito ao respeito unilateral, do qual resulta em uma
moral heterônoma, ou seja, a moral do dever, da obrigação, no qual
a criança obedece mesmo sem entender a regra. Os estudos de Menin
(1996) corroboram, na medida em que nos ajudam a compreender a
heteronomia, que segundo a autora:
Coagido socialmente a obedecer, o pequeno imita o mais velho;
coagido psiquicamente pelo egocentrismo, o pequeno não sabe
que imita e age como se sempre tivesse sido assim [...] Isso explica
a prática imitativa-egocêntrica das regras e sua consciência
heterônoma: as crianças jogam como os mais velhos e o que vem
deles é sagrado, imutável, sempre existiu; mas, por necessidades
próprias, elas modificam as regras não percebendo o que estão
fazendo. O novo transforma-se em velho no momento em que
aparece [...]As crianças pequenas comportam-se como nos
governos gerontocráticos: o que vem dos mais velhos, da
tradição, é sagrado e deve conservar-se eternamente! Eis a moral
do dever – a heteronomia! (p. 52).
Portanto, a heteronomia moral coloca o sujeito em uma
condição de sujeição à ordem ou regra de quem se constitui como
autoridade para ela. Tratam-se de regras e ordens inquestionáveis e
que não devem ser analisadas em seus princípios. Pode-se dizer que o
sujeito heterônomo é acrítico e passivo. Segundo Piaget (1994), a
heteronomia não deve ser tomada como um estádio, mas como uma
grande etapa do desenvolvimento moral que deve ser superada com
vistas a um nível mais elevado de autonomia moral.
É interessante dizer que a heteronomia não é vista na
conduta infantil, podemos estender seus resultados também nos casos
48
da vida adulta. Embora se trate da primeira forma de ação e
manifestação da moralidade no sujeito, a heteronomia não está
limitada a uma determinada idade assim como nos conteúdos, no
entanto, encontra-se relacionada às interações e tomadas de
consciência do sujeito compreendendo a uma construção individual,
dentro de um contexto coletivo.
Podemos exemplificar, a partir de situações contemporâneas,
com situações do nosso cotidiano, no qual vivemos um cenário de
caos político, legitimado pelas fake news, onde adultos passaram e
reproduziam em seu discurso informações baseadas em notícias falsas
geradas em aplicativos de celular, defendendo tais posicionamentos e
ideias sem ao menos buscar informações sobre a veracidade dos fatos,
sem escutar diferentes opiniões e sem refletir, esta prática trata-se de
um exemplo de heteronomia moral. Podemos dizer que a
heteronomia moral e intelectual da população brasileira corroborou
para instaurar o caos político e social no Brasil por meio do golpe de
2016. Observamos que, nesse caso, a sua opção por uma regra é
exterior à sua própria consciência, está ligada à influência de pessoas
por trás de ambientes virtuais que, se impõem como superiores e
donos da verdade e são aceitas pelo sujeito passivamente, sem
questioná-las.
Em relação à saída da heteronomia para autonomia, para
Piaget (1994) seria possível pelas vias da cooperação e da
descentração. A autonomia é, por consequência, para Piaget, uma
forma de equilíbrio ideal para onde deve caminhar o desenvolvimento
moral. Descentrar-se, ou seja, deixar de considerar somente o próprio
eu como o centro ou o único ponto de vista possível, e cooperar, são
elementos necessários para que se possa pensar uma maneira de agir e
49
de pensar moralmente guiados por princípios internos, aplicáveis a
todos.
Assim podemos considerar que a autonomia moral é uma
construção, na qual tanto nas crianças quanto nos adultos,
aconteceram pelas vias das relações de cooperação e de reciprocidade
associadas a valores altruístas como a justiça e a solidariedade, essas
abrem espaço para que essa construção se efetive.
Segundo La Taille et. al. (1992), ainda, um componente
nos processos de desenvolvimento, tanto no campo da moralidade
como no campo da inteligência, trata-se da afetividade. Para ele, a
afetividade corresponde a uma energia que motiva as ações.
A afetividade é comumente interpretada como uma “energia”,
como algo que impulsiona as ações. Vale dizer que existe algum
interesse, algum móvel que motiva a ação. O desenvolvimento
da inteligência permite, sem dúvida, que a motivação possa ser
despertada por um número cada vez maior de objetos ou
situações. Todavia, ao longo desse desenvolvimento, o princípio
básico permanece o mesmo: a afetividade é a mola propulsora
das ações, e a razão está a seu serviço. (p. 65).
A teoria da Epistemologia Genética considera a afetividade
como um fator que também corrobora no processo de socialização,
sendo ela condição necessária na constituição da inteligência, mas não
suficiente. De acordo com Piaget (1994), os valores, frutos da
afetividade, representam a motivação da ação, trata-se de uma
motivação caracterizada por valores próprios, não como algo que
busca agradar a si mesmo, mas em relação ao outro. O autor ainda
contribui ao afirmar que, apesar de inteligência e afeto constituírem
categorias distintas, não se reduz uma à outra, são categorias
50
indissociáveis. Não sendo possível existir, portanto, conduta livre de
uma estrutura cognitiva ou conduta livre de uma energia motivadora.
Nesse sentido no ambiente escolar, ao favorecer as relações
democráticas, pautadas no respeito mútuo e na cooperação por meio
do diálogo, da ação e da reflexão, ela estará auxiliando a criança a
descentrar-se e superar o egocentrismo que a limita na vida social e na
própria inteligência. Assim, a escola deve libertar-se das práticas que
levam a passividade e a sujeição, propondo novas alternativas para a
construção do conhecimento, logo a formação integral das crianças.
Assim ela estará preparando as crianças para a vida, para além dos
muros da escola.
Considerações Finais
Nos esforçamos neste capítulo para apresentar o conceito de
socialização sob a luz da teoria da Epistemologia Genética, sendo esta
a que melhor explica como o sujeito do conhecimento se relaciona
com o mundo e aprende.
Esperamos que o aparato teórico aqui exposto contribua no
sentido de proporcionar possíveis reflexões aos leitores sobre a
compreensão da socialização das crianças numa perspectiva
emancipatória. Com vistas a superar as tendências de ensino que
propõem a sujeição e a passividade do aluno em seu processo de
construção do conhecimento pretendo, a partir disso, vislumbrar um
espaço onde as crianças possam exercitar os princípios da liberdade,
da democracia, da cooperação e do respeito mútuo. A compreensão
que propõe o estudo sobre o conceito de socialização objetiva
cooperar com o professor na tomada de consciência de sua prática de
ensino, bem como as metodologias que elege em seu trabalho com as
51
crianças. Nesse sentido, a compreensão do professor certamente
privilegia as crianças no percurso de construção de sua
aprendizagem, e no desenvolvimento de sua autonomia intelectual e
moral.
A Epistemologia Genética de Piaget refuta essa maneira de
compreender a socialização, pois questiona em suas bases as estruturas
de sujeição e passividade do sujeito do conhecimento evidenciando
um sujeito ativo na construção e (re)elaboração dos conhecimentos.
Neste aspecto, a gênese do conhecimento explica-se na relação
solidária entre o sujeito e objeto, partindo de níveis menos elaborados
de conhecimento para níveis mais complexos, sendo a ação do sujeito
necessária para o processo de construção de sua autonomia.
Destarte, os estudos piagetianos permitiram-nos afirmar que
o processo de socialização é entendido pela capacidade do sujeito em
cooperar, isso refere-se à capacidade do mesmo em coordenar pontos
de vista, um processo que envolve as relações externas do sujeito com
o outro/objeto de conhecimento e a construção de estruturas
cognitivas que possibilitam a capacidade do sujeito de descentrar-se,
romper o egocentrismo inicial e assim, cooperar intelectualmente de
maneira recíproca, o que lhe possibilita construir conhecimentos e
desenvolver sua autonomia em todos os campos de sua vida.
Entretanto isso será possível em contextos que
oportunizem um espaço onde exista efetivamente a livre expressão e
participação das crianças nas decisões do seu processo da
aprendizagem, tendo como condição essencial para construção do
conhecimento a liberdade de agir e pensar do sujeito, e como
pressuposto a necessidade do mesmo em tomar consciência da prática
e da realidade vivida (ação e reflexão) em um contexto no qual as
52
relações sejam pautadas nas premissas do respeito mútuo, da
democracia e da liberdade. Nisso, encontra-se a importância da
compreensão do professor sobre a epistemologia dos conceitos, os
quais auxiliam no planejamento do trabalho pedagógico junto às
crianças.
Ante a isso fortalecemos nosso posicionamento frente a ideia
equivocada de que a socialização das crianças, logo a construção do
conhecimento, mais especificamente no contexto escolar, se
somente pela introdução das crianças na vida social pois não se trata
simplesmente de um salto qualitativo das questões neurológicas para
questões sociológicas, é um processo complexo e que abarca
sobretudo a capacidade do sujeito de cooperar reciprocamente sobre
o mundo, construindo assim os conhecimentos.
Acreditamos que um dos grandes desafios para a compreensão
do conceito de socialização pelos educadores encontra-se na
possibilidade de uma tomada de consciência que promova uma
ruptura com os modelos menos progressistas de ensino, que estão
incorporados desde sua formação inicial, e muito presentes nos
contextos escolares brasileiros. Entendemos que, toda prática de
ensino, mesmo que inconsciente, reflete a concepção de
conhecimento do professor, bem como sua epistemologia. A forma
com que planeja suas aulas está diretamente relacionada a sua
compreensão de como os alunos aprendem, e isso pode direcionar o
caminho didático-pedagógico a ser trilhado. Vemos na formação
continuada uma possibilidade para que o professor possa tomar
consciência de sua ação profissional e, quando necessário, reconstruí-
la, mediante o processo de ação/reflexão.
53
Ressaltamos que, embora a socialização seja um conceito
muito frequente na área da Educação Básica, pouco se reflete sobre
ela nos contextos de formação de professores, o que se faz
imprescindível, uma vez que os projetos educacionais visam uma
formação voltada para a autonomia moral dos sujeitos.
Referências
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Epistemologia genética, diagnóstico e soluções. Petrópolis, RJ:
Vozes, 1996.
DONGO-MONTOYA, A. O. Pensamento e linguagem: percurso
piagetiano de investigação. Revista Psicologia em Estudo, Maringá,
v.11, p. 119-127, jan./abr. 2006.
LA TAILLE, Y, de. O erro na perspectiva piagetiana. In: AQUINO,
J.G. (org.) Erro e fracasso na escola: alternativas teóricas e práticas.
São Paulo: Summus, 1997.
LA TAILLE, Y. Moral e Ética: dimensões intelectuais e afetivas.
Porto Alegre: Artmed, 2006.
LIMA, Thiago Corado. O conceito de Socialização e a Educação
Física: um estudo piagetiano. (Dissertação de mestrado). 245p.
Programa de s-Graduação em Educação. Marília: Universidade
Estadual de São Paulo - UNESP, 2020.
MENIN, M. S. S. Desenvolvimento moral. In: MACEDO, L.
Cinco estudos de educação moral. São Paulo: Casa do Psicólogo,
1996. p. 37–104.
54
PIAGET, J. Seis estudos de Psicologia. Tradução Maria Alice
Magalhães D’Amorim e Paulo Sergio Lima Silva. 1o ed. Rio de
Janeiro: Forense, 1967.
PIAGET, J. Estudos Sociológicos. Tradução de Reginaldo Di Piero.
1o ed. Rio de Janeiro: Forense, 1973.
PIAGET, J. Para onde vai a educação? Rio de Janeiro: Livraria José
Olympo Editora/Unesco, 1973.
PIAGET, J. A formação do símbolo na criança: imitação, jogo e
sonho, imagem e representação. Tradução de Álvaro de Carvalho e
Christiano Monteiro Oiticica. 2o ed. Rio de Janeiro, Zahar, Brasília,
INL, 1975.
PIAGET, J. A tomada de consciência. Tradução Edson B. de
Souza. São Paulo: Edusp, 1974/1977.
PIAGET, J. O nascimento da inteligência na criança. Tradução
Alvaro Cabral. 4o ed. Zahar Editores: Rio de Janeiro, 1982.
PIAGET, J.; INHELDER, B. A psicologia da criança. Tradução de
Octavio Mendes Cajado. 6o ed. São Paulo, DIFEL, 1993.
PIAGET, J. O Juízo Moral na Criança. Tradução Elzon Lenardon.
São Paulo: Summus, 1994.
PIAGET, J. Seis Estudos de Psicologia. 24. Ed. Rio de Janeiro:
Forense Universitária, 1999, 136 p.
55
O Tema da Violência na Formação de Professores
Angel Sthefani RAMALHO
2
Cristiane Paiva ALVES
3
Introdução
A violência nas escolas entrou em destaque nas mídias no
último ano, mas não é um fenômeno contemporâneo sendo parte de
toda a história da humanidade. Os incidentes violentos ocorridos nas
escolas nos últimos anos, e mais recentemente, no ano de 2023,
afetaram a comunidade escolar e a sociedade. As manifestações de
violência se tornam cada vez mais complexas, e após a fase de choque,
são banalizadas, principalmente por sua presença excessiva na mídia e
nas redes sociais.
É notável a necessidade de reflexão, discussão e planejamento
de ações para o tratamento da questão da violência nas escolas. Alguns
autores têm se debruçado sobre essa temática e apontam que a
formação de professores no que tange o desenvolvimento de um
ambiente cooperativo poderia influenciar a prevenção da violência.
2
Mestranda em Educação pela Faculdade de Filosofia e Ciências (FFC), Universidade
Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” (UNESP), Campus de Marília, São Paulo, Brasil.
E-mail: a.ramalho@unesp.br
3
Docente da Faculdade de Filosofia e Ciências (FFC), Universidade Estadual Paulista “Júlio
de Mesquita Filho” (UNESP), Campus de Marília, São Paulo, Brasil. E-mail:
paiva.alves@unesp.br
https://doi.org/10.36311/2024.978-65-5954-473-8.p55-68
56
Para tanto, se faz necessária a criação e implementação de políticas
públicas que tenham como proposta o entendimento a respeito das
razões que levam ao cenário atual e de que forma o educador pode se
instrumentalizar para atuar nesse contexto, colaborando para o
desenvolvimento de habilidades cognitivas e afetivas nos estudantes
(GATTI; BARRETO; ANDRÉ, 2011; KNOENER, 2019;
MOLINA; RODRIGUES, 2020).
Projeto CONVIVA
Neste sentido, este capítulo apresenta uma breve análise sobre
os materiais disponíveis em livre acesso para professores a respeito das
ações que compõem o Projeto CONVIVA, da Secretaria Estadual da
Educação (SEDUC). Este Projeto se caracteriza por sua grande
abrangência de temas, portanto, na presente análise, traremos o
enfoque para os temas: resolução de conflitos e violência, a escolha se
justifica pela relevância das temáticas e sobretudo, pela crescente
necessidade busca de caminhos sistematizados para a implementação
de soluções efetivas. O programa apresenta uma linguagem acessível
para toda comunidade escolar, e acreditamos ser uma alternativa
viável para o momento, tendo em vista os alarmantes casos de
violência extrema registrados em escolas, recentemente.
Em outubro de 2019, o governo do Estado de São Paulo
instituiu o Projeto CONVIVA SP Programa de Melhoria da
Convivência e Proteção Escolar, que inclui em seus objetivos
colaborar com os processos de escolarização, construir a escola um
ambiente amistoso para aprendizagem, com intuito de favorecer os
índices de permanência, bem como de melhorar a articulação com
serviços de saúde mental e assistência social do estado (SÃO PAULO,
57
2019). Sabendo da importância do período escolar para a formação
social e pedagógica dos indivíduos, o projeto busca fornecer meios
para fomentar o pleno desenvolvimento do aluno a partir das
diretrizes da Lei de Diretrizes e Bases de 1996 (BRASIL, 1996).
No portal oficial do Programa, que se encontra no site da
Escola de Formação dos Profissionais da Educação EFAPE, é possível
ter acesso aos materiais de apoio na formação de professores, que
conta com nove pautas formativas, descritas no quadro 1, a seguir:
Quadro 1 – Pautas formativas do Programa CONVIVA
Clima Escolar
Suicídio e Projeto de Vida
Bullying
Substâncias Psicotrópicas
Conflito e Violência
Indisciplina e Incivilidade
A Banalização do Mal,
Contemporaneidade e Ensino Religioso
Formação Ética Virtual
Fonte: Elaborado pelas autoras
O Programa também oferece os Materiais de Apoio, como
complementação, sendo eles: Material de Apoio Complementar,
Material do Projeto Grêmio em Forma, Projetos Diálogos com
Teatro, conversando sobre Saúde Mental e Emocional na Escola,
Projetos Diálogos com Teatro- Cartilha e Projeto Construindo
Pontes. Estes contam com roteiros de formação, apresentações,
videoaulas, avaliações que devem servir como base para ações locais,
incluindo a capacitação de docentes e demais membros da
comunidade escolar, incluindo pais de alunos.
58
Devido à grande abrangência de assuntos que são de
competência do projeto, se fez necessário um recorte temático para
melhor leitura e interpretação dos materiais fornecidos para formação
docente. Com isso, nesse trabalho, foi analisado a pauta formativa
Conflito e Violência, por entender a relevância deste para o cotidiano
escolar, visto que as dinâmicas que ali se dão podem ser classificadas
como microesferas dos sistemas de poderes, pois além da estrutura
formal (equipe de gestão, cnicos educacionais, técnicos de
manutenção, docentes e alunos), as relações pessoais demonstram
isso, em especial nas maneiras de silenciar corpos e vontades assim
como explica Foucault (1989), de modo que indivíduos que não
correspondem as expectativas sociais ou pertençam a grupos
historicamente inferiorizados sofram mais com a violência direta ou
indiretamente, como por exemplo sendo as principais vítimas de
bullying ou recebendo menor atenção dos profissionais da educação
para suas demandas individuais.
A percepção sobre o papel da educação passou por mudanças
e hoje se entende mais a função social da escola. Os documentos
oficiais reforçam essa nova compreensão, por exemplo, a Declaração
dos Direitos Humanos inclui a educação como ferramenta de paz
quando visa pleno desenvolvimento da personalidade humana e do
fortalecimento do respeito pelos direitos do ser humano e pelas
liberdades fundamentais” (ONU, 1948, p. 6). É possível mencionar
também a Base Nacional Comum Curricular (BNCC), que seguindo
os princípios políticos e éticos da LDB direcionam a educação
brasileira para a formação humana integral e para a construção de uma
sociedade justa, democrática e inclusiva” (BRASIL, 2018, p. 7). Para
se adequar a essa perspectiva algumas abordagens passaram a fazer
59
parte da formação docente, rompendo com a antiga ideia do professor
como portador do conhecimento, que condicionava o aluno a mero
ouvinte e reprodutor do que se ouve. As novas metodologias tentam
aproximar professor e aluno, para que esses se reconheçam como
indivíduos com direitos, deveres e anseios (MAGALHÃES, 2017;
RAMALHO, 2021).
No dicionário Micheles online, as definições 4 e 6, descrevem
conflito como “encontro de coisas que se opõem ou divergem” e pela
perspectiva psicológica, seguindo a teoria behaviorista “estado
provocado pela coexistência de dois estímulos que desencadeiam
reações que se excluem mutuamente”. Pensando a escola como
ambiente plural, as expressões, necessidades e concepções de certo e
errado são distintas, com isso a presença de conflitos é inevitável. Esse
processo faz parte do aprendizado, e as maneiras com que as
diferenças serão trabalhadas depende do tato dos educadores, onde se
destaca a importância da atenção dos professores para como os
conflitos de ideias se desenvolvem, e como estes podem ser incluídos
em sua prática (PEREIRA, 2018).
Como propõem Ortega-Ruiz e Del Rey (2002), as resoluções
de conflitos na escola devem ser trabalhadas em duas frentes, a de ação
imediata e as de ações de prevenção. Pensando em formar cidadãos
autônomos e cientes de seus direitos e deveres, a formação docente
deve favorecer a capacidade de provocar as reflexões necessárias para
mudanças de comportamentos. Como destaca Freire (2015), a
formação de professores deve priorizar o olhar sensível do educador,
é esse olhar que irá trazer a visão crítica aos incômodos e inseguranças
de seus alunos, e fazer com que esse professor busque soluções. É
importante evidenciar também a escola como ambiente de construção
60
de conhecimento, colocando os professores como investigadores, para
que estes se apropriem de suas qualidades profissionais e desenvolvam
a curiosidade para o que lhes falta (PEREIRA, 2007).
violência é um conceito mais complexo para se definir.
Alguns autores defendem que é preciso avaliar aspectos socioculturais
e a historicidade de povos e regiões, como é caso de Abramovay
(2005), que conceitua violência de acordo com diferentes culturas.
a Organização Mundial da Saúde em 2002, definiu violência como
uso de força ou poder para gerar dor ou sofrimento, e pode ser
tipificada por quem pratica e pela natureza de ato, como por exemplo
violência física ou moral.
Dentro do contexto escolar essa definição pode ser ainda mais
complexa, ainda mais quando a pensamos como um ambiente de
formação e trocas culturais, visto a vasta diversidade que podemos nos
deparar na mesma instituição de ensino. Dessa forma, a seguir,
descreveremos um programa criado para a formação de professores
com a temática da violência.
Análise do Material Pauta Formativa Conflitos e Violência
Para este trabalho foi utilizada a pesquisa documental, tendo
como objeto de análise os materiais didáticos utilizados nas formações
realizadas pelo Projeto CONVIVA. Assim como afirma Gil (2008), é
uma pesquisa conveniente pois permite coletar dados com
informações mais precisas em qualidade e quantidade, além de ser
uma ferramenta de baixo custo de execução. Como fonte foi utilizado
o site da EFAPE, que possui um portal específico para o Projeto
CONVIVA, que além dos materiais de formação dispõe de portarias,
guias e orientações das demais ações do Projeto.
61
A pauta formativa estudada foi de Conflitos e Violência, que
tem seu conteúdo estruturado em: roteiro de formação, apresentação,
avaliação do encontro de formação, videoaula e um guia prático para
educadores, intitulado “Diálogos e Práticas Restaurativas nas
Escolas”. Esse material disponível trata-se de uma formação realizada
em 2018, ou seja, antes da implantação do Programa Conviva,
portanto a falta de contexto mais atualizado pode ser percebida,
porém isso não traz déficits importantes para o conteúdo, pois os
contextos escolares são complexos e repletos de trocas entre diferentes
indivíduos, e situações de divergências são comuns e até mesmo
necessárias. Para Jean Piaget (1932-1977) de acordo com suas
pesquisas, a interação entre o indivíduo e seu meio, em constante
trocas entre si, gera a construção de valores. Fatores com a família, os
amigos, o ambiente escolar, a personalidade, as informações, dentre
outros, contribuem no processo de construção de valores morais. E
para os construtivistas, os conflitos são importantes oportunidades
para evolução do desenvolvimento moral.
Destarte a importância do tema, adentramos o roteiro de
formação que está em formato Portable Document Format (PDF),
com dez páginas que sistematizam, com a utilização de um passo a
passo com orientações para cada um dos 27 slides da apresentação.
Esse documento é o que apresenta a maior falha quando pensamos
em material de formação, pois as orientações foram parcialmente
cobertas por cópias reduzidas dos slides. É possível compreender que
o objetivo era uma orientação mais precisa para realização de uma
replicabilidade prática, porém não foi bem executada.
A apresentação em slides também é apresentada em formato
PDF, com 27 páginas, organizados no quadro 2.
62
Quadro 2 – Apresentação encontro Projeto Mediação escolar e comunitária
Fonte: Elaborado pelas autoras
Como pontos positivos é possível mencionar a clareza dos
objetivos da formação e as diversas propostas de socialização entre os
participantes, pois pode-se entender que os docentes que participarão
deste trabalho poderão refletir e pensar suas práticas de acordo com
suas próprias demandas, dentro do ambiente educacional no qual
atuam. como um ponto desfavorável, nota-se que são dados
desatualizados, como o gráfico da página 9, que além das definições
Título do encontro
Objetivos do encontro
Sensibilização: vídeo Ciclo da violência & Educação
Atividade 1: Para refletir (considerações sobre o vídeo)
Socialização
Sessão de estudos: Leitura do texto O que as palavras conflito
violência significam para você?
Atividade 2- em grupoquestões sobre o texto
Socialização
Gráfico: tipos de ocorrência ROE 2016 e 2017
Atividade 3- em grupoquestões sobre o gráfico e preencher
quadro (ocorrências, desencadeadores e ações para redução)
Socialização
Sistematização
Definições fundamentadas de violência e conflito
Conflito: o que nos ensina?
Espaços de participação e diálogo
Comunicação assertiva
Frase
Bom retorno
Informações- contatos
Referências
63
de conflito e violência escolhidas serem mais genéricas, pensando em
um curso de formação docente, seria mais interessante que se
abordassem os conceitos com a utilização de autores da área, além da
escolha de significados e exemplos mais pertinentes à realidade
escolar.
Ao analisarmos o arquivo de avaliação, notamos o objetivo de
caracterização dos participantes do curso e obtenção de informações
sobre as percepções a respeito da aula, realizando a avaliação do
material, das expectativas dos cursistas e das reflexões geradas. Para
isso, são disponibilizadas 4 questões sucintas e bem objetivas, que
quando respondidas com seriedade podem sim orientar os passos
seguintes dos formadores.
a videoaula é apresentada em um formato mp4, com tempo
de 10 minutos e 34 segundos. O deo Projeto Mediação Escolar e
Comunitária, apresenta uma videoconferência realizada em 2018.
Inicia-se com a formadora Sandra Fondra do Sistema de Proteção
Escolar fazendo os cumprimentos e expressando a satisfação com a
avaliação dos profissionais que participaram do primeiro encontro,
são apresentadas uma síntese das avaliações e os temas sugeridos para
as próximas formações, dados esses fornecidos por 50% das diretorias
de ensino participantes. Como apoio, a formadora aconselha o uso do
link disponibilizado para cursistas, que permite o acesso a uma
biblioteca digital para os estudos individuais ou de pautas que ainda
não foram trabalhadas nos encontros. Depois de 6min e 50seg a vídeo
aula discorre sobre o slide 2 da apresentação, apresentado no quadro
2, explicando cada um dos objetivos doencontro de formação.
Dos materiais disponíveis esse é o que a apresenta menor valor
pedagógico pensando como professora da rede, pois trata-se de uma
64
avaliação das ações anteriores e lista os objetivos que seriam
trabalhados nos encontros posteriores. Embora possa ser motivador
ver que as avaliações feitas pelos antigos participantes do curso foram
ouvidas e validadas, porém como formação pouco agrega.
O guia prático para educadores, é o material mais completo
dentre os disponibilizados nessa pauta formativa. Elaborado pelo
Promotor de Justiça do Ministério Público do Estado de São Paulo
Doutor Antonio Carlos Ozório Nunes, dispõe de dez capítulos,
indicados no quadro 3, além de um anexo com material
complementar, que trabalham temas do convívio escolar e cultura de
paz.
Quadro 3 – Capítulos Guia Prático para Educadores
O poder do diálogo e das parceiras
Os pilares da educação para cidadania e construção de paz
Os conflitos e oportunidades de aprendizagem
Práticas restauradoras
Diálogo: poderosa ferramenta e base para todas as demais formas de resolução
pacífica de conflitos
Mediação
Círculos de construção de paz
Círculos restaurativos
Trabalho em parceira e em rede para uma escola cidadã
Adolescente e ato infracional
Fonte: Elaborado pelas autoras
Mesmo exigindo do docente uma maior autonomia, traz
temas relevantes que muitas vezes, pela grande demanda no cotidiano
escolar não são muito bem esclarecidos aos profissionais da educação,
como por exemplo o adolescente e o ato infracional. E o ponto
65
positivo desse material pode ser também o ponto de atenção que o
pensar a escola e a formação docente deve incluir o diálogo e trocas
de ideias, que estudar de maneira totalmente individual pode não
gerar os mesmos impactos que uma formação coletiva traria.
Considerações Finais
A partir deste breve estudo, pode-se concluir que as medidas
adotadas não se deram pelo real reconhecimento pelo o Estado da
necessidade de espaços de discussões para as demandas sociais, que
impactam diretamente a formação do estudante, visto a falta de
atualização dos materiais disponíveis, e a recente diminuição de ações
de formação, mas sim uma tentativa de justificar que medidas estão
sendo tomadas, ou seja, podem utilizar do discurso “a nossa parte
fazemos, mas não somos nós que estamos em sala de aula”.
O histórico de criação do Programa justifica as informações
fora do contexto e das necessidades escolares. O que gerou um
material desatualizado, com metodologia pouco interativa e
desestimulante. Nota-se a ausência de espaços de debate (mesmo que
virtuais) e a dificuldade em implementação efetiva de ações que
cuidem da questão da violência nas escolas. Apesar da iniciativa surgir
como uma alternativa para questões urgentes e graves, percebe-se que
maior empreendimento de esforços e principalmente a participação
de educadores desde a criação até a implementação é primordial.
Portanto, um programa criado de forma heterônoma perde sua
potência para o cumprimento da tarefa da formação de educadores
autônomos e de ambientes democráticos.
66
Referências
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69
O Papel da Psicologia Escolar no Enfrentamento
à Evasão de Alunos
Vilma Aparecida BIANCHI
4
Introdução
Mesmo tendo passado cinco séculos e suas várias
transformações históricas, a economia que antes era agrária-
comercial-exportadora deu um salto para se tornar uma economia
baseada na industrialização e tecnológica. E mesmo frente a tantas
mudanças, a estrutura educacional continua agindo como
transmissora de ideologias das elites atendendo de forma mais ou
menos satisfatória uma pequena parcela da sociedade. Para falar em
educação não podemos deixar de considerar sua História percorrida
até os dias de hoje, para que os erros cometidos não se repitam, mas
que sirvam como base para o aperfeiçoamento das novas propostas.
Segundo Massi e Giacóia (1998, p. 351), a “educação é um processo
essencialmente humano, pois a única que dela carece”.
A falta de políticas públicas assertivas, de conteúdo didáticos
contextualizados com a realidade dos alunos e interesse dos familiares,
compromisso e colaboração dos pais ou responsáveis, somados a
4
Doutoranda em Psicologia pela Faculdade de Ciências e Letras (FCL), Universidade
Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” (UNESP), Campus de Assis, São Paulo, Brasil.
E-mail: vilma.bianchi@unesp.br
https://doi.org/10.36311/2024.978-65-5954-473-8.p69-96
70
preocupação das instituições escolares em apenas entregar um
conteúdo para cumprir uma agenda, sem nenhuma preocupação com
o sentido ou a falta dele na vida de seus alunos, são problemas
corriqueiros que tem colaborado com os altos índices de faltas dos
alunos e a evasão escolar. Precisamos pensar sobre esse assunto e
utilizaremos dos pensamentos de Massi e Giacóia para justificar;
[...] o ser humano, precisamente em função de sua dignidade,
não é coisa, mas pessoa. Pessoa é sujeito moral, investido de um
valor absoluto, que se expressa não por um preço, mas pela
dignidade, o que transforma a pessoa em individuo insubstituível
na singularidade absoluta de seu valor próprio. Este valor é o que
impede que uma pessoa possa ser considerada ou tratada apenas
como meio ou instrumento segundo o qual se obtém ou
intenciona a um fim arbitrário. Quando isso ocorre, violenta-se
a dignidade da pessoa e se atenta contra a humanidade. (MASSI;
GIACÓIA, 1998, p. 358).
Refletir sobre a razão e os diversos motivos que leva uma
criança ou um jovem a estar fora da escola é buscar um caminho para
entender e consecutivamente propor soluções efetivas para diminuir
a evasão escolar.
A Psicologia tem um papel fundamental na comunidade
escolar, ajudando a escola em um trabalho multidisciplinar
ampliando seus olhares na defesa de questões sociais e políticas, para
o desenvolvimento de práticas contextualizadas e com foco nas
transformações sociais, e desenvolvimento integral do indivíduo
considerando sua realidade social, política e econômica.
Afinal, quando o aluno não se reconhece como parte desse
espaço, talvez, seja porque a instituição não acolheu a realidade desse
71
aluno ou dessa comunidade. A escola como instituição que possui
um sistema aberto e, portanto, responsável pela educação formal e
mediadora do indivíduo e da sociedade deve conhecer a realidade
principalmente da comunidade onde pertence e é sua tarefa articular
a vida escolar com a vida social de seus alunos.
A escola tem uma importância imensurável na vida das
crianças, ela vai além do ensino formal. A escola deixa marcas no
crescimento e no desenvolvimento de valores, de princípios
necessários ao longo de toda a vida. Uma escola acolhedora pode
deixar bons registros na vida das crianças, fortalecendo o processo de
aprendizagem e principalmente as relações.
A falta de motivação e a evasão escolar é um problema antigo
que a educação enfrenta e é papel da escola elaborar propostas para
aproximar e envolver a comunidade em que está inserida em suas
práticas pedagógicas para diminuir os conflitos e a evasão escolar.
Porém, muitas de suas práxis não trazem o retorno esperado, pois de
nada adianta trazer os alunos e seus familiares para dentro da escola
os envolvendo com ações que não leve em consideração a realidade
em que vivem, reproduzindo o que acontece dentro das salas de aula
com um ensino conteudista, como se fossem capazes de deixar sua
realidade social, econômica e política do lado de fora do portão, como
se os muros tivessem o poder de levá-los a uma outra realidade. Sem
nenhuma preocupação, quem são estes estudantes? Quais são suas
realidades sociais? Os seus direitos estão sendo respeitados? Como
funciona sua dinâmica familiar? Quais as expectativas que os
estudantes e seus familiares têm em relação à escola?
Qualquer proposta da escola sem considerar estas e outras
questões sociais se torna uma prática descontextualizada segregando
72
ainda mais a escola e a comunidade. E se a evasão escolar que era
uma questão preocupante, torna-se um tema emergencial devido a
Pandemia COVID-19, pois esta mudou toda forma de ensino, as
aulas presenciais tornaram-se on-line, agravando ainda mais a
realidade social e excludente em que se encontra a educação no Brasil.
A pandemia do COVID-19 escancarou as desigualdades
socioeconômicas, contribuindo para o abandono escolar. Quantas
crianças não tinham acesso aos estudos virtuais por não terem
computadores, celulares e mesmo a conexão da internet.
O presente trabalho pretendeu compreender como a
psicologia pode auxiliar no enfrentamento a evasão escolar,
repensando técnicas que ajude a desenvolver interesse e sentimento
de pertencimento aos alunos disponível, para tal se faz necessário os
seguintes objetivos específicos, como: discutir a importância de
encontrar sentido nas práticas de ensino foi apresentado como se a
relação escola e comunidade repensando práticas que à favoreça,
compreendendo também como a mesma influencia a evasão escolar.
Metodologia
A pesquisa foi realizada conforme processo formal e
sistemático que visa à produção, ao avanço do conhecimento e/ou à
obtenção de respostas para problemas, mediante emprego de método
científico. Foram respeitados os direitos dos autores das literaturas
utilizadas neste estudo, conforme determinado na Lei 9610 de 19 de
fevereiro de 1998 (BRASIL, 1998).
A metodologia utilizada para a realização deste trabalho foi
uma revisão de literatura, fundamentada em livros, artigos científicos
e sites confiáveis referentes ao tema abordado.
73
Fachin (2003), define a revio de literatura como aquela que
diz respeito ao conjunto de conhecimentos humanos reunidos nas
obras. Tem como finalidade fundamental conduzir o leitor a
determinado assunto e proporcionar a produção, coleção,
armazenamento, reprodução, utilização e comunicação das
informações coletadas para o desempenho da pesquisa.
Foram utilizados artigos científicos encontrados em bancos de
dados como: ScientificElectronic Library Online (SciELO), ERIC,
Educ@ e Periódicos Portal Capes. Sendo utilizados os seguintes
descritores: psicologia escolar, evasão escolar, comunidade escola,
alienação.
Foram selecionados os trabalhos científicos apropriados ao
tema, disponibilizados na língua portuguesa entre os anos de 2000 a
2022. Foram desconsiderados os artigos publicados anteriormente ao
ano de 2000, os que não estavam presentes em banco de dados
científicos, os que não condiziam com o tema objeto deste trabalho e
os que não estavam na língua portuguesa.
Foram encontrados 120 estudos no total de buscas em todas
as bases de dados citadas, sendo 35 da SciELO, 30 da ERIC, 25 da
Educ@ e 30 do Periódicos Portal Capes. Após a leitura de forma
cautelosa e crítica dos títulos e resumos, foram selecionados
inicialmente 68 estudos observando os critérios de inclusão e
exclusão. Destes, 28 foram excluídos, por não somarem a essa revisão
e, portanto, estarem enquadrados nos critérios de exclusão. Ao final
da seleção, foram inclusos 40 estudos que integram a presente revisão.
74
As Contribuições da Psicologia no Enfrentamento à Evasão Escolar
A Psicologia, ciência que estuda os processos mentais e o
comportamento humano, tem sua área de atuação e aplicação,
levando em conta a complexidade de seu objeto de estudo. Sua base
metodológica utiliza de instrumentos para investigar a memória, a
aprendizagem, a motivação, a percepção, a linguagem, a inteligência
e o comportamento social.
Tais práticas tinham suas origens no Movimento Higienista,
outro movimento que teve um marco no desenvolvimento da
Psicologia Escolar foi denominado Escola Nova que defendia a
democratização, permitindo um olhar para além das práticas
normativas e classificatórias, possibilitando uma nova atuação do
psicólogo escolar com um novo panorama sobre aprendizagem
considerando a realidade social do aluno. De acordo com Zanella
(2003) o professor e o aluno buscam o mesmo objetivo como
crescimento, aprendizagem e evolução.
Sendo assim, a psicologia pode favorecer a transformação no
ambiente escolar, Dugnani (2006) nos traz que a psicologia em uma
perspectiva crítica pode contribuir para tais mudanças. Segundo
Tanamachi e Meira (2003) a psicologia pode colaborar criando
espaços de diálogos que visam a reflexão sobre as possibilidades de
transformações fortalecendo a capacidade de reflexão de seus agentes,
expandindo todo seu potencial autônomo, criativo e transformador.
De acordo com Moreira e Guzzo (2014) as ações da psicologia na
escola devem considerar a realidade de toda comunidade escolar nas
dimensões políticas, pessoais e institucionais contribuindo para
melhoria das relações e da qualidade do ensino.
75
Martinez (2005), afirma que a inclusão escolar tem sido um
dos temas mais debatidos no cenário educacional atual e não
dúvida em relação à necessidade de se trabalhar em prol da Educação
Inclusiva, garantindo a igualdade e respeitando as diferenças. Dessa
forma, percebe-se que historicamente as relações entre Psicologia e a
Educação sempre tiveram um foco de atenção na condição de ajudar
o aluno com dificuldade e necessidade educativa, para que o mesmo
consiga aprender considerando-se suas peculiaridades.
A aproximação entre gestores e psicólogos escolares podem se
configurar como uma relação parceira e apoio mútuo, visto que
por um lado o psicólogo favorecedor de desenvolvimento e das
inter-relações humanas, pode colaborar para promoção de
espaços de diálogos e reflexões que favoreçam o rompimento do
instituído na escola, por meio do enfrentamento e superação dos
conflitos que podem contribuir para promoção da autonomia
dos seus autores; por outro lado, os gestores, como articuladores
das relações nos contextos educacionais podem favorecer e apoiar
a inserção do psicólogo em diversos espaços, tais como: formação
de professores, aproximação com grupos de alunos nos espaços
em sala de aula e aproximações com a família (DUGNANI,
2016, p. 42).
Ou seja, a junção do psicólogo escolar com os membros da
gestão pode contribuir de forma significante para fortalecimento das
relações na comunidade escolar, colaborando com ações para o
desenvolvimento integral dos sujeitos. Estimulando os docentes e os
alunos a expor seus pontos de vista, com total acolhimento, sem
julgamento ou autoritarismo favorecendo assim o desenvolvimento
de espaço para o diálogo entre toda comunidade escolar, ou seja,
gestores, professores, alunos e pais ou responsáveis. Para que todos se
76
sintam acolhidos e respeitados em suas opiniões mesmo que
divergentes. Essas e outras ações são importantes para que o aluno se
sinta pertencente ao espaço chamado escola e ao grupo chamado
alunos, criando razões para querer estar, participar e ser agente ativo
na sua educação, com isso, gera-se interesse em frequentar as aulas e
esta é uma arma poderosa no combate à alienação e evasão escolar.
A importância do significado para ação humana tem sido bem
percebida por grande parte dos dirigentes, que julgam a realidade
“suficiente objetiva” para que todos vejam da mesma maneira.
Todavia, os seres humanos, como cada vez mais esclarecem a
psicologia, o seres inteligentes, o que quer dizer que seres que
orientam suas ações por um objetivo que deriva da forma como
leem a realidade. A ótica assumida pelo “leitor” dependerá da sua
história de vida, de sua capacidade de perceber os fatores em jogo,
e tem como elemento básico organizador o seu interesse vital; em
outras palavras, o sujeito empenhar-seem concretizar as ações
que lhe pareçam contribuir para que tenha sua vida preservada e
continuada (SILVA, 2002, p. 40).
Como se pode ver na citação acima, o sujeito vai se empenhar
cada vez mais para concretizar ações que tenham sentido histórico-
social e que despertem interesse, porém, o que se são escolas
alimentando uma educação alienante e conteudista.
A função do psicólogo escolar não é a resolução de problemas,
nem a simples divulgação de teorias e conhecimentos
psicológicos, mas de acordo com suas limitações, auxiliar a escola
a eliminar os obstáculos que se colocam entre os sujeitos e o
conhecimento (MEIRA; ANTUNES, 2003, p. 128).
77
As habilidades desse profissional e seus conhecimentos acerca
da inclusão de alunos com necessidades especiais, do desenvolvimento
de programas de ensino e na orientação a pais, professores e outros
especialistas, se constituem como elementos relevantes para beneficiar
projetos educativos que favoreçam a educação para todos
(MARTÍNEZ, 2005).
Segundo Chauí (2014), a alienação social é o desconhe-
cimento das condições histórico-sociais em que se vive, resultado de
ação humana e de condições históricas anteriores e determinadas. Ou
seja, está relacionada com o estado mental, onde o sujeito se torna
passivo, vivendo em desarmonia com ele mesmo, incapaz de
compreender o que se passa no mundo renunciando ao seu direito
pensar e agir por si próprio, aceitando tudo como um novo normal.
Bandura (2008) em sua Teoria Social Cognitiva, localiza o
sujeito ativo no processo de aprendizagem. Segundo seu conceito de
autoeficácia o aluno tem potencial de agir, planejar e se empenhar na
busca de seus objetivos. Sendo assim é suma importância que o ensino
se torne mais significativo e estimulantes para que o aluno saia do
papel de passivo e receptor e se torne um agente ativo e
transformador. Desenvolvendo todo seu protagonismo, o aluno e o
professor se tornam atores no processo de ensino-aprendizagem, onde
não lugar para apenas um detentor de saberes, dando espaço a troca
de saberes onde ambas as partes se tornam agentes na construção de
conhecimento.
De acordo com Palonia e Dessem (2005) com uma relação
harmoniosa entre a família e a escola o aprendizado se torna mais
produtivo, pois o aluno recebe por parte de seus familiares confiança
e estímulo valorativo, portanto a família deve ser compreendida como
78
um sistema ligado ao aluno em todas as suas dimensões, considerando
seu contexto social e cultural favorecendo o seu apoio ao
desenvolvimento afetivo, social e cognitivo do aluno. Ter a família
como parceira da escola é uma ação necessária contra a evasão escolar
e outros problemas comuns e urgentes nas escolas como depredação
e violência.
Deve-se pensar ações que aproxime a comunidade e as
famílias para dentro da escolas, considerando sua realidade social,
para que não seja ações descontextualizadas e sem sentido para seus
membros, é importante que todo esse trabalho de empoderamento e
pertencimento também envolva os familiares, pensando juntos
soluções, elaborando projetos socioeducativos e explorando todo o
potencial da escola como espaço físico, docência e alunos e
considerando também as potencialidades que se encontra na
comunidade onde está inserida como ONGs, praças, Instituições
religiosas e se pensar projetos que articule estes espaços para uma troca
de conhecimento que traga benefícios tanto para escola, quanto para
comunidade.
Segundo Antunes (2008), a psicologia pode contribuir com a
educação e com a prática pedagógica, quando compreende os fatores
presentes no processo educativo a partir de mediações teóricas
“fortes”, com garantia de estabelecimento de relação entre teoria e
prática pedagógica no cotidiano escolar. Ela deve propiciar a
compreensão do educando a partir da perspectiva de classe e em suas
condições concretas de vida necessária, para construir uma prática
pedagógica inclusiva, que atenda às necessidades existentes.
A atuação do psicólogo na escola assume um papel
primordial, levando em conta as bases metodológicas e instrumentos
79
de investigação que ele possui e que aplicadas devem favorecer a
aprendizagem dos alunos, de forma significativa.
A Importância de Encontrar Sentido nas Práticas de Ensino
O mundo em que vivemos se transforma em uma velocidade
muito superior à do sistema de educação tradicional. Por essa razão,
o desafio de propor formas de aprendizado efetivas para as próximas
gerações aumenta mais e mais a cada dia. que não sabemos
exatamente o que o aman nos reserva, como preparar os jovens para
os desafios do desconhecido?
Na prática, o entendimento é de que modelos de educação
mais flexíveis têm mais condições de assimilar mudanças quando
comparados a formatos rígidos. Afinal, como verificamos ao longo da
história da humanidade, a capacidade de adaptação e de superação de
adversidades garantem a continuidade da nossa existência (SANTOS
et al., 2014).
Cercado por fragilidades, o ambiente educacional atualmente
passa por problemas que afligem a educação brasileira. A inexistência
de estrutura adequada que atenda as especificidades dos alunos, a falta
de comprometimento dos pais com a formação dos seus filhos, e
muitas vezes a ausência de perspectiva para o professor, ocasionam
nesse cenário desestimulante e pertinente na maior parte das escolas
públicas, tornando entraves para um ensino de qualidade (LISBOA;
LIMA; MENEZES, 2021).
Para reverter essa situação é fundamental que o professor exija
de si a capacidade de buscar novas práticas de ensino que se adequem
ao campo escolar e aos seus alunos. Nesse sentido, faz-se necessário o
planejamento de atividade que proporcione e incentive o aluno como
80
um sujeito ativo, e, quando aplicadas coerentemente, os objetivos são
atingidos e consequentemente os resultados são frutos de uma
aprendizagem construtiva e de qualidade (LISBOA; LIMA;
MENEZES, 2021).
Puntel (2007, p. 89) contribui acrescentando que “o ensino
vai ter sentido quando for construído, e isso vai acontecer
quando houver comprometimento por parte do educador que precisa
problematizar, questionar, provocar, confrontar”.
Dessa forma, cabe ao professor mediador do processo de
ensino e aprendizagem dinamizar suas aulas e apresentar ao seu aluno
uma nova maneira de aprender. Assim, a prática utilizada pelo
professor é uma tentativa de ultrapassar os obstáculos presentes no
ambiente educacional, que como salienta Santos et al. (2014, p. 3) “a
educação deve ser compreendida em uma perspectiva de construção
dos sujeitos por meio de uma prática docente que permita a troca de
saberes e o compartilhamento de informações objetivas e
contextualizadas”.
Segundo Lisboa, Lima e Menezes (2021), o emprego de novas
metodologias de ensino que auxiliem o aluno na interpretação e
compreensão dos conteúdos expostos, contribuem não para o
aprendizado, mas na relação professor e aluno, estreitando as
distâncias ao aproxima-los e desmistificando a ideia do professor
como detentor do saber ao compartilhar os conhecimentos.
[...] a relação professor/aluno em meio ao ensino/aprendizagem,
depende fundamentalmente, do ambiente estabelecido pelo
professor, da relação empática com seus alunos, de sua
capacidade de ouvir, refletir e discutir o nível de compreensão
81
dos alunos e da criação das pontes entre o seu conhecimento e o
deles (BRAIT et al., 2010, p. 6).
Assim, é possível compreender a sua eficácia no ambiente
educacional em ambos os sujeitos, refletido na sociedade ao tornar
cidadãos críticos e participativos das nuanças do seu entorno.
Neste sentido, percebe-se o quanto é importante o trabalho
do professor, que além de ministrar as aulas e dominar o conteúdo, o
mesmo deve despertar no seu aluno a criticidade por meio do ensino,
que quando acompanhado das práticas facilita a compreensão,
instigando a participar das decisões fora dos muros escolares,
preparando assim sujeitos ativos na construção de uma sociedade de
valores, crítica e de qualidade (LISBOA; LIMA; MENEZES, 2021).
Por estas razões a busca pela dinamização do ensino vêm
sendo apontada como um dos caminhos capazes de tornar o ensino
mais atrativo, interessante e de qualidade (LISBOA; LIMA;
MENEZES, 2021). Encorajando os professores a persistirem na
educação em meios aos devaneios da profissão, e fazendo acreditar em
seu trabalho como transformadores e construtores de sonhos,
percebemos o quanto podemos modificar a realidade no âmbito
escolar por meio de atividades que incentivem os discentes a tornar
agentes do conhecimento.
A busca por um modelo de ensino focado no ensino-
aprendizagem significativo transcende a abordagem tradicional,
baseada na transferência de informações do educador para o
educando de maneira unidirecional, e procura desenvolver um sujeito
crítico e questionador, reconstrutor da realidade.
Conforme Von Linsingen (2010, p. 114) “o ideal é articular
as diferentes abordagens de acordo com a situação de ensino”. O uso
82
de teorias de ensino diferentes enriquece o trabalho em sala de aula,
portanto, podemos somar, por exemplo, a abordagem construtivista
e a cognitiva objetivando qualificar o processo de aprendizagem.
Nessas perspectivas, as atividades experimentais constituem
relevante ferramenta que permite ao professor constatar e
problematizar o conhecimento prévio dos seus alunos, estimular a
pesquisa, a investigação e a busca da solução de problemas. A postura
experimental permite à exploração do novo e à incerteza de se alcançar
os resultados esperados da pesquisa, além da ideia de tornar o aluno o
sujeito da ação (RONQUI, 2009).
A experimentação possibilita ao estudante pensar sobre o
mundo de forma científica, ampliando seu aprendizado sobre a
natureza e estimulando habilidades, como a observação, a obtenção e
a organização de dados, bem como a reflexão e a discussão. Assim é
possível produzir conhecimento a partir de ações e não apenas por
meio de aulas expositivas, tornando o aluno o sujeito da
aprendizagem (VIVIANI; COSTA, 2010, p. 50-51).
Entender a ideia de ensino reflexivo implica procurar as suas
raízes no pensamento sobre a educação. Importa, então, caracterizar
o pensamento reflexivo de que fala John Dewey, destacar o termo
reflexão e os vários tipos de reflexão descritos por Donald Schön, bem
como conhecer outros contributos, como os de Zeichner ou Van
Manem. As investigações em torno da prática reflexiva têm vindo a
aumentar nos últimos anos contribuindo para a clarificação de
conceitos e proporcionando um modelo de fundamentação do
processo de ensino, contrapondo-se, assim, a uma visão tecnicista da
prática profissional (OLIVEIRA; SERRAZINA, 2002).
83
De acordo com Oliveira e Serrazina (2002), a capacidade para
refletir emerge quando o reconhecimento de um problema, de um
dilema e a aceitação da incerteza. O pensamento crítico ou reflexivo
tem subjacente uma avaliação contínua de crenças, de princípios e de
hipóteses face a um conjunto de dados e de possíveis interpretações
desses dados.
O processo reflexivo caracteriza-se por um vaivém
permanente entre acontecer e compreender na procura de significado
das experiências vividas. Há, através das práticas, um ganho na
compreensão e esta nova compreensão pode fazer surgir um insight
sobre o que significa ser professor (OLIVEIRA; SERRAZINA, 2002).
Deste modo, a artistry do professor, metáfora útil para expressar o que
os professores em cooperação são capazes de fazer, vai-se
desenvolvendo.
Ensinar constitui uma forma de reflexão na ão, isto é,
reflete-se sobre os acontecimentos e sobre as formas espontâneas de
pensar e de agir de alguém, surgidas no contexto da ação, que
orientam a ação posterior.
A Relação Entre Escola e Comunidade
Pelas exigências impostas à escola, a sociedade sempre
influenciou o seu funcionamento, sendo hoje verdade, talvez mais do
que nunca, que a escola também tem uma grande influência nessa
mesma sociedade, consubstanciando uma realidade cada vez mais
presente na criação e desenvolvimento de expectativas e aspirações,
pela criação e desenvolvimento de competências necessárias à
promoção da qualidade de vida das crianças e jovens e,
84
consequentemente, pela determinação dos ciclos de vida das
populações (SOUSA; SARMENTO, 2010).
Durante anos, a escola constituiu-se como um espaço fechado
e à margem da comunidade, uma vez que lhe competia apenas a
função de instrução formal, o que lhe permitia comportar-se como
uma sociedade dentro da sociedade geral. Em consequência deste
comportamento insular da escola, a sua relação com a comunidade
desenvolveu-se essencialmente num registro negativo: as famílias
eram chamadas à escola quando havia problemas com os filhos e “só
eram convidadas para atividades em que tinham um papel meramente
de espectador” (MARUJO: NETO; PERLOIRO, 2005, p. 149).
Sousa e Sarmento (2010) relatam que a escola não via de
forma positiva a vinda à escola por parte dos pais mais interessados,
entendendo essa atitude de intervenção como uma ameaça ao
exercício das suas funções. Por outro lado, a família tinha tendência
para percepcionar a escola de forma crítica e desinvestida, pedindo
apenas contas relativamente ao insucesso, que prontamente justificava
com erros de métodos ou de conteúdo.
Nem sempre os familiares dos alunos têm livre acesso as
unidades de ensino para participar de alguma forma no processo
educacional dos seus filhos. Eles não eram vistos com bons olhos pela
equipe pedagógica e a “sua presença ali se dava através de
convocação por parte da direção para participarem de alguns eventos
promovidos pela escola (SILVA; GOMES; SANTANA, 2016).
Em meados do culo XX foi notório o aumento de
importância atribuído à escolarização, levando essa sua crescente
importância política e social ao consequente aparecimento de novos
problemas e desafios à instituição escolar, decorrentes, nomeada-
85
mente, da sua massificação. Assim, apresenta-se como fundamental a
interação positiva da escola com a família, por forma a desenvolver-se
em uma relação colaborativa entre estas duas instituições
mutuamente responsáveis pelo prosseguimento adequado do processo
de escolarização e educação (SOUSA; SARMENTO, 2010).
A relação entre escola e comunidade educativa vem
assumindo uma centralidade crescente nas últimas décadas, quer
enquanto alvo de atenção dos debates sociais e políticos, quer como
objeto de pesquisa educativa. Esta situação tem origem em tendências
de evolução na organização do sistema educativo, as quais, por seu
turno, são indissociáveis de resultados da pesquisa educativa. Neste
sentido, a relação entre escola e comunidade configura,
simultaneamente, uma área de ação educacional e uma temática de
investigação educativa que hoje se revestem de significativa relevância
social e científica (ALVES; VARELA, 2012).
A universalização do ensino trouxe a diversidade para dentro
das salas de aula. Novos contingentes populacionais, pouco
habituados ao universo escolar, passam a fazer parte deste cotidiano.
A escola de hoje está aberta a todos, àqueles que vão cursar uma
faculdade e àqueles que vão desempenhar outras funções sociais que
não requerem tal grau de formação. A integração desses alunos e
alunas, muitos deles filhos e filhas de pais não-escolarizados e,
portanto, representantes de uma primeira geração que tem acesso ao
ensino escolar, aponta para a necessidade de uma educação capaz de
fortalecer os vínculos entre os alunos e alunas, suas famílias e a escola
(ARAÚJO; KLEIN, 2006).
De acordo com Piletti (2004, p.100), “da mesma forma que
a escola, para realizar eficazmente seu trabalho, precisa estar na
86
comunidade, esta não pode estar ausenta da escola”. Pois,
necessidade de estarem sempre em parceria buscando assim usufruir
o que a comunidade tem de melhor para beneficiar a instituição de
ensino tais como, prestação de serviços voluntários auxiliando a
equipe pedagógica com aulas de culinária, artesanato, informática,
contação de história ou até na manutenção do espaço físico do prédio
para que elas possam ver que é possível melhorar a qualidade do
ensino.
A escola não pode mais ser entendida como uma organização
social isolada, a qual se valida e justifica internamente. A escola deve
ser encarada como uma organização social que se insere numa
determinada comunidade, a qual tem de ser tida em conta na
enunciação dos seus objetivos e perante a qual tem de se
responsabilizar em termos de resultados (ALVES; VARELA, 2012).
Assim, uma perspectiva atomística da educação é substituída
por uma perspectiva sistêmica, considerando-se a escola como um
sistema aberto, que resulta de uma dissolução das fronteiras entre a
escola e a comunidade envolvente (BRANCO, 2007). A expressão
“envolver para desenvolver”, adotada por Marques (2003) no seu
estudo sobre parcerias educativas, é também ilustrativa desta
tendência evolutiva.
Com efeito, face aos múltiplos desafios do futuro, a educação
surge como um trunfo indispensável à humanidade, pelo seu papel
essencial no desenvolvimento contínuo das sociedades, constituindo
a educação escolar, uma necessidade e uma exigência à qual não é
possível nem desejável escapar (SOUSA; SARMENTO, 2010).
Sousa e Sarmento (2010) ainda relatam que, numa sociedade
multicultural, altamente competitiva, exigente e seletiva como a atual,
87
que evolui continuamente de forma dinâmica, e na qual se inscreve a
ação educativa, construída por influência de contextos vários, cabe à
escola a responsabilidade de se multiplicar em estratégias e ações,
reinventando-se permanentemente para ajudar os alunos a
desenvolverem competências essenciais com vista à sua promoção
pessoal, social e profissional.
Os autores ainda complementam dizendo que:
Assim, considerando como finalidades da educação escolar a
formação pessoal, a integração social e a estimulação, a escola
depara-se com a necessidade de romper com a chamada “escola
tradicional”, centrada em si mesma, e a premência de uma
verdadeira relação de parceria com a família, partindo da
premissa, irrefutável, de que esta constitui a primeira e
permanente responsável e promotora da formação global do seu
educando (SOUSA; SARMENTO, 2010, p. 142-143).
Sendo vários os estudos publicados (MARQUES, 2001;
VILLAS-BOAS, 2001; SILVA, 2003; CANÁRIO, 2009) que
evidenciam a existência de uma correlação forte e positiva entre os
resultados escolares, a assiduidade e o comportamento dos alunos e a
existência e qualidade do envolvimento das famílias, é hoje consensual
a necessidade vital de se estabelecer e desenvolver uma cooperação
estreita entre a escola e a família, sob pena de se não cumprirem os
objetivos esperados da função educativa.
A ação educativa é tarefa de toda a sociedade, de todas as
instâncias educativas por onde passa a criança. No entanto, tal como
igualmente registrado, ninguém nega a evidência de que à família cabe
a primeira e permanente responsabilidade de orientar e desenvolver
competências que permitam a construção de um projeto de vida
88
consentâneo com as suas potencialidades e aspirações
(BALLENATO, 2009).
Sousa e Sarmento (2010, p. 151) ainda ressaltam:
As características organizacionais e funcionais da escola são,
igualmente, apontadas pela literatura como uma barreira à
participação e envolvimento das famílias. À forma rígida e
centralizada de funcionamento, acresce a desadequação dos
espaços e dos horários de atendimento aos pais; a falta de um
espaço gerido por estes, onde se possam encontrar
informalmente e planificar a sua intervenção; a falta de formação
especializada dos professores, sobretudo dos directores de turma,
para se relacionarem com as famílias e as comunidades; o uso de
uma linguagem demasiado técnica e codificada; o pendor
altamente burocrático do seu funcionamento e o “fechamento”
à intervenção, opinião e crítica externa.
Araújo e Klein (2006) relatam que os quatro grandes eixos
temáticos propostos para uma educação voltada para a cidadania
enfatizam a importância da interação entre escola e comunidade,
trazendo aspectos da vida em sociedade para o currículo escolar.
Assim, o cerne desta proposta é tornar os recursos da cidade e,
prioritariamente, do entorno da escola, como espaços de
aprendizagem, promoção e garantia de direitos.
Torres (2005) afirma que a educação deve deixar de ser vista
como função apenas da comunidade escolar para que seja assumida
pela comunidade de aprendizagem, de forma que os diferentes
recursos e disciplinas locais possam ser utilizados no processo
educativo.
89
De acordo com Araújo e Klein (2006), deve-se estudar formas
de ampliação dos espaços educativos, rompendo os limites físicos dos
muros escolares, pode ser um bom caminho para uma educação em
valores éticos e democráticos, que visam a cidadania. Reforçar a
importância da articulação entre sujeito e cultura/ sociedade na
construção da cidadania e de relações mais justas e solidárias no seio
da comunidade onde cada um vive, pode indicar possibilidades para
o desenvolvimento de ações educativas que levem a uma
reorganização da escola na forma em que está estruturada, tanto do
ponto de vista físico quanto pedagógico.
De acordo com Silva, Gomes e Santana (2016), é necessário
que a comunidade e a escola se encarem responsavelmente como
parceiras de caminhada, que, ambas são responsáveis pelo que
produz, podendo reforçar ou contrariar a influência uma da outra.
É impossível colocar à parte escola, família e comunidade,
pois, se o indivíduo é aluno, filho e cidadão ao mesmo tempo, a tarefa
de ensinar não compete apenas à escola, porque o aluno aprende
também através da família, dos amigos, das pessoas que ele considera
significativas, dos meios de comunicação, do cotidiano (SILVA;
GOMES; SANTANA, 2016).
Sendo assim, é preciso que professores, família e sociedade
tenham claro que a escola precisa contar com o envolvimento de
todos.
90
Considerações Finais
O profissional de Psicologia escolar deve estar apto para
estruturar, implantar e transformar saberes. Sendo assim, é um agente
imprescindível para a construção e incorporações de valores no
âmbito acadêmico. A intervenção do psicólogo em instituições de
ensino deve ocorrer de maneira preventiva; desta forma, o profissional
precisa estar apto para intervir em situações suscetíveis ao
acarretamento de problemas maiores. O psicólogo escolar deve
prestar atendimento para alunos, pais, professores e demais
funcionários. Sua função é promover o bem-estar social.
Este profissional busca, ainda, interagir junto ao educando e
desenvolver ações educativas que promovam a saúde mental para
todos do espaço escolar. Dentre suas funções pontua-se: avaliar
problemas de aprendizagem, problemas de adaptação escolar e
integração da família, escola e sociedade. O psicólogo escolar
desenvolve também trabalhos com outros profissionais, podendo
intervir nos planejamentos e práticas educacionais.
A Psicologia Escolar tem apresentado em seus estudos ações
possíveis de serem implementadas no âmbito da relação família-
escola, porém para desenvolver atuações contextualizadas e que gerem
respostas às demandas educacionais, é imprescindível uma imersão
contínua no contexto, visando conhecer a comunidade escolar em que
se está atuando.
Dessa forma, sugere-se que o psicólogo desenvolva
instrumentos e procedimentos para o levantamento de informações
relevantes sobre os pais/responsáveis, seu ambiente social, concepções
e expectativas sobre o processo de escolarização dos filhos, a exemplo
de um questionário direcionado aos pais, que pode ser administrado
91
desde o período de matrícula, visando fornecer informações sobre a
história de escolarização das crianças e dos adolescentes, de suas
famílias e da comunidade onde se inserem, contribuindo para um
olhar mais ampliado e realista sobre a comunidade escolar e as
famílias.
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97
Clima Escolar na Educação Brasileira: Relações,
Desafios e Perspectivas da Gestão Educacional
nos Últimos Dez Anos
Thaís São João CASTELLINI
5
Introdução
O clima escolar tem se tornado um tema cada vez mais
relevante no contexto educacional brasileiro nas últimas cadas.
Compreender como as características e dinâmicas do ambiente escolar
influenciam o bem-estar dos estudantes, a convivência interpessoal e
o desempenho acadêmico tornaram-se um ponto crucial para a
melhoria da qualidade da educação. Nos últimos dez anos, uma série
de pesquisas científicas tem se dedicado a investigar esse campo no
Brasil, buscando evidências empíricas que contribuam para uma
abordagem mais eficaz do clima escolar.
O objetivo desta pesquisa foi analisar a relação entre a gestão
escolar, cultura organizacional e clima escolar no ambiente
educacional, buscando compreender como esses elementos se inter-
relacionam e influenciam o desempenho dos alunos e o bem-estar da
5
Mestre em Educação pela Faculdade de Filosofia e Ciências (FFC), Universidade Estadual
Paulista “Júlio de Mesquita Filho” (UNESP), Campus de Marília, o Paulo, Brasil. E-mail:
thais_castellini@hotmail.com
https://doi.org/10.36311/2024.978-65-5954-473-8.p97-118
98
comunidade escolar. Além disso, o estudo visou identificar a
importância da gestão democrática na promoção de um ambiente
propício à aprendizagem, bem como a relevância da liderança dos
gestores na construção de um clima escolar positivo.
Para desenvolver esta pesquisa, foi realizada uma revisão
bibliográfica abrangente, buscando referências relevantes sobre gestão
escolar, cultura organizacional e clima escolar em bancos de dados
científicos e acadêmicos, como Google Acadêmico, Oásisbr, Scielo e
Periódicos Capes. A busca foi limitada ao período de 2013 a 2022
para obter estudos recentes e relevantes sobre o tema.
A pesquisa também realizou uma análise detalhada de artigos
que abordam a gestão escolar como ponto de partida inicial, dentro
dos limites deste estudo. Essa análise do contexto serviu como base
para investigações futuras.
Por meio dessa abordagem metodológica, foi possível
compreender melhor a dinâmica da gestão escolar, sua relação com a
cultura organizacional e o impacto no clima escolar. A partir dos
dados coletados, foram identificadas as práticas efetivas para
promover um ambiente educacional saudável e harmonioso,
contribuindo para a formação integral dos estudantes e o
aprimoramento da qualidade do ensino.
A análise desses estudos permitirá obter uma compreensão
aprofundada das percepções, práticas e necessidades relacionadas ao
clima escolar no país. Além disso, o trabalho pretende contribuir para
o desenvolvimento de políticas educacionais mais fundamentadas e
estratégias pedagógicas mais eficazes, que visem a promoção de um
ambiente escolar positivo, acolhedor e estimulante para todos os
envolvidos no processo educativo. A partir da ntese e reflexão sobre
99
os avanços e desafios identificados nas pesquisas brasileiras sobre o
clima escolar, espera-se que este artigo possa fornecer um panorama
atualizado e relevante para futuras investigações e para aprimorar a
qualidade da educação no Brasil.
Desenvolvimento
No culo XXI, a educação tem passado por significativas
mudanças impulsionadas pelo avanço tecnológico e transformações
sociais. Para preparar os estudantes para os desafios contemporâneos,
pesquisas científicas m sido conduzidas com o intuito de
compreender e aprimorar os sistemas educacionais. Dentre as
descobertas, destaca-se a importância de uma abordagem centrada no
estudante, em que o foco é proporcionar uma aprendizagem ativa,
permitindo que os alunos explorem, questionem e construam seu
próprio conhecimento. Essa abordagem se baseia na premissa de que
os estudantes são protagonistas no processo de aprendizado, enquanto
os educadores desempenham o papel de orientadores.
Além do conhecimento acadêmico, é necessário que os
estudantes adquiram habilidades como pensamento crítico,
criatividade, colaboração, comunicação e resolução de problemas.
Essas habilidades são essenciais para adaptar-se às mudanças rápidas
da sociedade e da tecnologia, bem como para enfrentar os desafios
futuros. Além disso, tais competências são fundamentais para formar
cidadãos ativos e participativos na sociedade, reconhecendo que a
educação integral é indispensável para a formação humana.
A Base Nacional Comum Curricular (BNCC) (BRASIL,
2017) é um documento normativo de extrema importância no
contexto educacional brasileiro. Seu objetivo é definir os
100
conhecimentos, competências e habilidades essenciais para o
desenvolvimento pleno dos estudantes ao longo da educação básica
no país. Busca-se, por meio da BNCC, garantir uma educação
equitativa e de qualidade, que valorize e respeite a diversidade cultural
e regional.
A BNCC (BRASIL, 2017) desempenha um papel crucial na
formação integral dos estudantes, ao promover o desenvolvimento de
habilidades cognitivas, socioemocionais e culturais. Com isso, busca-
se preparar os alunos para os desafios do mundo contemporâneo,
capacitando-os a se tornarem cidadãos conscientes, críticos e
preparados para a vida em sociedade.
Nesse sentido, as referências afetivas assumem uma relevância
significativa no desenvolvimento moral dos estudantes dentro do
ambiente escolar. A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional
(LDB) (BRASIL, 1996) reconhece essa importância e estabelece os
valores éticos e morais como parte integrante do processo
educacional. Dessa forma, a educação não se limita apenas à
transmissão de conhecimentos técnicos, mas também busca fomentar
a formação de cidadãos éticos, responsáveis e comprometidos com o
bem comum.
Os Parâmetros Curriculares Nacionais, por sua vez, abordam
os temas transversais, incluindo a ética, e fornecem diretrizes
específicas para que essas questões sejam abordadas de maneira
consistente no currículo escolar. Assim, a ética permeia todas as
disciplinas e atividades, contribuindo para um ensino que vai além do
aspecto técnico e fortalece o desenvolvimento moral dos alunos.
A Constituição da República Federativa do Brasil de 1988
(BRASIL, 1988) também desempenha um papel relevante nesse
101
contexto. Ao estabelecer princípios e direitos fundamentais, a
Constituição enfatiza a educação de qualidade como um direito de
todos os cidadãos brasileiros.
Em síntese, a BNCC, a legislação educacional, os Parâmetros
Curriculares Nacionais e a Constituição Brasileira atuam em
conjunto para moldar uma educação que valorize tanto os aspectos
cognitivos como os socioemocionais dos estudantes. Por meio dessas
diretrizes, busca-se formar cidadãos preparados para enfrentar os
desafios do mundo contemporâneo, com valores éticos sólidos e
consciência dos direitos e deveres que regem a sociedade. Dessa
forma, a educação se torna um pilar necessário na construção de um
país mais justo, inclusivo e ético.
Essas diretrizes reconhecem a importância de uma educação
abrangente, que além da simples transmissão de conhecimentos
técnicos. Ao enfatizar a participação da família, da comunidade e a
promoção de valores éticos, buscam criar um ambiente educacional
propício ao desenvolvimento moral dos alunos, preparando-os para
se tornarem cidadãos conscientes, responsáveis e éticos em suas ações
e contribuições para a sociedade.
A escola desempenha um papel vital na formação integral do
ser humano, proporcionando um ambiente enriquecedor para o
desenvolvimento intelectual, emocional, social e físico dos estudantes.
Por meio da aprendizagem de conhecimentos e habilidades, bem
como da formação de valores, a escola tem o objetivo de preparar os
estudantes para se tornarem indivíduos conscientes, resilientes e
capazes de enfrentar os desafios da vida de forma positiva.
A escola é um ambiente privilegiado para que se possa
desenvolver padrões de relacionamento interpessoais, vivenciar e
102
refletir sobre valores, construir vínculos, aprender a cooperar,
partilhar e conviver com o outro. Ou seja, o se restringe à
função de transmitir o conhecimento formal, visto que também
funciona como local em que se gera o desejo de construir
conhecimento, a sedução por conhecer. Em outras palavras, não
é mais o lugar (por excelência) onde somente se adquire o
conhecimento, mas, sobretudo, onde se aprende a lidar com os
conhecimentos apreendidos e compartilhados. (MORO, 2020
p. 24).
Por intermédio dessa educação holística, os estudantes são
incentivados a contribuir de maneira significativa para a sociedade e
a se tornarem agentes de mudança em seu meio, promovendo uma
sociedade mais justa e inclusiva.
Dessa forma, fica evidente a importância de uma educação
sociomoral para formar indivíduos dignos, responsáveis, respeitosos,
justos e igualitários, sendo uma responsabilidade compartilhada por
toda a sociedade. A escola, por sua vez, desempenha um papel crucial
como um autêntico laboratório social, onde os estudantes passam
muitos anos, desde a infância até a fase adulta. Nesse contexto, a
escola exerce uma influência significativa na formação desses
indivíduos. Por meio de experiências de convivência em grupo, a
escola se apresenta como um ambiente altamente favorável para o
desenvolvimento dessas habilidades sociomorais fundamentais
(TOGNETTA; MENIN, 2017).
Assim sendo, a pesquisa sobre o impacto do clima escolar na
convivência respeitosa, ética e democrática dentro das instituições
educacionais assume um papel de extrema relevância na área da
educação. Compreender como o clima escolar influencia a interação
entre alunos, professores e demais membros da comunidade escolar é
103
necessário para promover um ambiente saudável e propício ao
desenvolvimento integral dos estudantes. Com o auxílio desses
estudos, poderemos implementar estratégias efetivas para fortalecer os
laços sociais, aprimorar o ambiente de aprendizagem e, consequente-
mente, enriquecer a experiência educacional dos estudantes,
preparando-os para se tornarem cidadãos éticos, respeitosos e
engajados em uma sociedade democrática. (MORO, 2020).
É crucial destacar que, apesar da diversidade de valores na
sociedade s-moderna, é possível identificar um conjunto básico de
valores éticos compartilhados, considerados essenciais para uma
convivência saudável e o desenvolvimento humano integral. A escola
é o lugar ideal para trabalhar esses valores, tornando essa pesquisa de
suma importância para a educação.
No entanto, ainda existem desafios e lacunas na compreensão
das dimensões do clima escolar e na identificação de estratégias
eficazes para promover um ambiente escolar saudável e propício à
aprendizagem. A ausência de um clima escolar positivo pode levar a
problemas como indisciplina, violência, bullying e baixo desempenho
acadêmico, comprometendo o bem-estar dos estudantes e a qualidade
do ensino.
O clima escolar engloba o conjunto de características e
componentes presentes em uma escola, influenciando o ambiente
social, emocional e acadêmico. Estes elementos incluem as relações
interpessoais entre alunos, professores e funcionários, as práticas de
ensino, o suporte emocional e acadêmico oferecido aos estudantes, a
cultura escolar e a segurança do ambiente. Um clima escolar positivo
é caracterizado por interações respeitosas, inclusão, apoio tuo,
104
motivação e um ambiente seguro, onde os alunos se sentem
valorizados, incentivados a aprender e a se desenvolver integralmente.
A convivência democrática nas instituições educativas é um
tema de grande importância na área da Educação. Refere-se a um
modelo de convivência baseado nos princípios da igualdade, respeito,
diálogo e participação ativa de todos os membros da comunidade
escolar. A convivência democrática envolve a construção de relações
saudáveis e harmoniosas, a resolução pacífica de conflitos, a
valorização da diversidade e a promoção de uma cultura de cidadania
e direitos humanos.
Essa pesquisa se trata de uma revisão sistemática de pesquisas
brasileiras sobre clima escolar realizadas nos últimos dez anos.
Primeiramente foi realizado um levantamento bibliográfico
abrangente utilizando os seguintes bancos de dados científicos e
acadêmicos: Google Acadêmico, Oásisbr, Scielo e Periódicos Capes
usando o termo “Clima escolar” filtrando a data para 2013 a 2022.
Foram encontrados 152 trabalhos, sendo eles 43 descritos como
dissertação de Mestrado, Tese de Doutorado e Trabalhos de
Conclusão de Curso e 109 artigos científicos em periódicos, revistas,
anais e capítulos de livros.
Após esse levantamento inicial, foi realizada uma seleção dos
trabalhos usando somente os 105 artigos científicos. A tabela a seguir
mostra a quantidade de artigos encontrados por ano.
105
Quadro 1 – Quantidade de artigos encontrados por ano
Ano Quantidade de artigos
2013 2
2014 4
2015 7
2016 13
2017 11
2018 14
2019 15
2020 9
2021 23
2022 11
Fonte: da própria autora
Desses 109 artigos selecionados, apenas 95 eram condizentes
com o tema pesquisado, sendo eles sobre clima escolar, clima
organizacional, clima de sala de aula, clima de escola e clima social.
Das pesquisas encontradas, os assuntos que mais apareceram
relacionados ao clima escolar foram: desempenho dos alunos, gestão
escolar, conflitos, violência, bullying, indisciplina, família e escola,
relações sociais, trabalho docente, deserção escolar, convivência
respeitosa, segurança nas escolas, fatores de risco e uso de drogas,
instrumentos de medida para avaliar o clima escolar, cultura da paz,
cultura da escola, saúde dos professores, diversidade sexual, revisões
de literatura sobre o clima escolar, regras e sanções e equipe escolar.
106
Dentre todos esses assuntos, os que mais apareceram foram
respectivamente, gestão escolar, conflitos, violência, bullying e
indisciplina, desempenho dos alunos, trabalho docente e
instrumentos de medida para avaliar o clima escolar. Dessa forma, foi
realizada uma análise detalhada dos artigos que abordam a gestão
escolar como ponto de partida inicial, dentro dos limites deste estudo.
Essa análise do contexto será satisfatória e servirá como base para
investigações futuras.
Primeiramente é preciso compreender o que é clima escolar,
gestão escolar, cultura organizacional e liderança para após descrever
sobre as pesquisas encontradas.
Segundo Moro (2020 p.31) o clima escolar é complexo e tem
muitas variações, podemos dizer em resumo que compreende a
junção das diferentes percepções dos alunos, gestores, funcionários,
pais e professores possuem sobre a instituição de ensino em um todo,
seja da sala de aula, as relações, as dimensões referentes as organizações
administrativas e educacional, a forma como o ambiente educativo é
cognitivamente apreendido, representado e significado para os
indivíduos que o compõem.
O clima escolar emerge de uma avaliação subjetiva
compartilhada pelos atores escolares, devido às vivências cotidianas na
instituição. Essa avaliação leva em consideração diversas dimensões da
instituição, como normas, objetivos, relações humanas e a
organização física, pedagógica e administrativa. Ele é influenciado por
várias dimensões da escola e pode impactar diretamente na dinâmica
educacional, revelando um ambiente positivo ou negativo. Essa
influência se reflete na qualidade de vida dos alunos, no processo de
107
ensino e aprendizagem, bem como nas relações estabelecidas entre
professores e estudantes na escola.
De acordo com Luck (2011) a gestão escolar, em uma
perspectiva abrangente, inclui o trabalho da direção, supervisão,
orientação educacional e secretaria da escola, todos participantes da
equipe gestora. A gestão democrática enfatiza, então, a participação
ativa de professores e da comunidade escolar para garantir qualidade
para todos os alunos. O diretor deve promover o entendimento do
papel de todos na educação e função social da escola, buscando
unidade e efetividade no trabalho conjunto. O trabalho do diretor
como gestor não deve ser fragmentado, e deve ocorrer em coliderança
com a equipe pedagógica, zelando pela escola como um todo, com
foco na aprendizagem e formação dos alunos em todas as ações e
momentos.
Silva et. al. (2021) descreve que cultura da escola abrange os
significados, modos de pensar, valores, comportamentos e formas de
funcionamento que revelam a identidade e as características das
pessoas que trabalham nela. Essa cultura organizacional é responsável
por sintetizar os sentidos atribuídos às coisas, estabelecendo um
padrão coletivo de pensamento, percepção e, consequentemente,
ação. Além disso, a ideia de que a cultura está relacionada à
funcionalidade, sendo vista como uma realidade estável, resultado de
um processo de adaptação.
Vicente (2013 apud TUNICE, 2018) identificou três tipos
de liderança, sendo elas: liderança predominantemente pedagógica,
liderança predominantemente organizacional e liderança predomi-
nantemente relacional. A liderança predominantemente pedagógica é
caracterizada por preocupações com a prática da sala de aula, como o
108
currículo, a aprendizagem dos alunos e os fatores pedagógicos que
influenciam o processo educativo. a liderança predominantemente
organizacional foca nas tarefas administrativas e no cuidado com a
infraestrutura e outros aspectos organizacionais. Por fim, a liderança
predominantemente relacional se destaca pela valorização do contato
e das relações com a comunidade escolar, envolvendo festas e
atendimento às famílias dos alunos. O autor conclui que os três tipos
de liderança são adaptados conforme a rede de ensino, e a relação
encontrada demonstra que, embora todos os três perfis sejam
importantes e não haja hierarquia entre eles, as escolas que
negligenciam o aspecto pedagógico ou ignoram a liderança
pedagógica apresentam resultados inferiores em proficiência em
leitura e desempenho dos alunos. Esses dados enfatizam a relevância
crucial da liderança escolar para o desempenho dos estudantes,
concluindo que a liderança pedagógica é necessária na gestão de uma
escola.
Para Agostini (2010), a eficiência de uma escola está
diretamente relacionada à competência dos seus gestores e
colaboradores, que devem se atualizar constantemente para fortalecer
os laços e aprimorar os serviços oferecidos. A gestão escolar é uma arte
que exige inovação por meio de estratégias e ações para resolver os
desafios da instituição. O gestor tem um papel importante ao apoiar
e motivar os colaboradores, incentivando-os a darem o melhor de si.
Um ambiente organizacional liderado por uma gestão bem-
estruturada tende a ser propício à criatividade e inovação. A direção
deve participar ativamente em todas as questões escolares,
descentralizando o poder e compartilhando responsabilidades com
109
toda a comunidade escolar, com foco no crescimento integral do
grupo, abrangendo aspectos profissionais, intelectuais e humanos.
Candian e Rezende (2013) realizaram uma pesquisa empírica
aplicando questionários contextuais e usando os testes de proficiência
dos sistemas estaduais de avaliação de três estados brasileiros (GO,
PE, RS) no ano de 2011 para estabelecer conexões entre clima escolar
e gestão escolar.
A pesquisa divide o clima escolar em quatro grandes grupos
de contexto no interior da escola, sendo eles: instrucional, inter-
relacional, normativo (regulatório) e imaginativo.
O contexto educacional é composto por várias dimensões que
impactam a experiência dos alunos na escola. O contexto instrucional
aborda percepções sobre orientação acadêmica, interesse dos
professores e adequação do ambiente para objetivos educacionais. O
contexto inter-relacional envolve a qualidade das relações
interpessoais e a preocupação com problemas dos alunos. O contexto
normativo trata da severidade das relações de autoridade e do
cumprimento de regras. Por fim, o contexto imaginativo diz respeito
à percepção da escola como incentivadora da criatividade ou ambiente
rígido e tradicional.
A dedicação na pesquisa foi do contexto normativo do clima
escolar com base nos questionários contextuais aplicados aos alunos
avaliados, visto que a criação e o respeito às normas são aspectos
essenciais para que a escola seja percebida como um ambiente
favorável à aprendizagem, atraindo tanto os alunos quanto os
professores e diretores. Essas regras são fundamentais para estabelecer
uma atmosfera desejável no ambiente escolar.
110
A pesquisa concluiu que as escolas com melhores condições
no contexto normativo do clima escolar obtêm um melhor
desempenho acadêmico. O cumprimento das normas, tanto em sala
de aula como fora dela, conforme percebido pelos alunos, é
fundamental para criar um ambiente escolar que favoreça o
desenvolvimento máximo da aprendizagem dos alunos.
Para garantir que os alunos possam aprender e desenvolver
suas capacidades na escola, é viável que toda a equipe gestora crie um
ambiente favorável à aprendizagem. Isso requer a existência de
normas de comportamento profissional e interpessoal, que
estabeleçam limites para as interações na escola e sejam efetivamente
cumpridas. O estabelecimento e a aplicação das normas devem ser
conduzidos de forma democrática pelo gestor escolar, envolvendo
todos os atores escolares e garantindo a transparência nas decisões.
Dessa forma, uma gestão escolar comprometida com o aspecto
relacional e pedagógico desempenha um papel basilar na criação e
manutenção de um clima escolar positivo.
Oliveira e Waldhelm (2016) realizaram uma pesquisa para
analisar a relação existente entre a liderança do diretor e o clima
escolar por meio da percepção dos professores tomando como
referencial teórico os estudos de eficácia escolar e desenvolveu uma
análise descritiva dos dados a criação dos Índices Médios de Liderança
e Colaboração Docente (IMLD e IMCE).
Esse estudo foi a ampliação de uma análise considerando as
escolas do Rio de Janeiro que atendem ao ano do Ensino
Fundamental e que participaram da Prova Brasil 2013, utilizando
uma análise multinível para capturar a percepção dos professores
sobre a liderança, o diretor e a colaboração docente (como
111
manifestação do clima escolar) e verificar como esta percepção,
traduzida em índices, se associa ao desempenho dos alunos nos testes
de matemática da Prova Brasil de 2013.
As autoras reconhecem que as avaliações em larga escala
podem ser consideradas bons instrumentos de monitoramento das
políticas educacionais, e que entre os fatores internos da instituição
escolar que podem ter um impacto positivo na aprendizagem dos
alunos encontra-se a gestão escolar. Por meio de um modelo
conceitual que aborda o processo de aprendizagem de forma
multidisciplinar, entende-se que a interação entre a gestão escolar e o
ensino é crucial para a melhoria do desempenho dos alunos dentro da
escola.
Sammons, 2008; Alves; Franco, 2008 apud Oliveira e
Waldhelm 2016, dizem que a gestão da escola pode influenciar
positivamente a aprendizagem dos alunos. Soares (2007 apud
Oliveira e Waldhelm 2016) menciona que a gestão escolar e ensino
são dois importantes processos que interagem a produção do
desempenho dos estudantes. E Ogawa e Bossert (1995 apud Oliveira
e Waldhelm 2016) descrevem que a liderança escolar afeta a
interpretação dos participantes da instituição e influenciam a maneira
como esses participantes se comportam dentro da cultura
organizacional.
Hees e Pimentel (2021) buscaram analisar estilos de liderança
e o papel do gestor escolar, enfocando uma possível conexão entre sua
atuação como líder, o clima organizacional e o comprometimento dos
demais colaboradores no ambiente escolar utilizando a revisão
bibliográfica numa abordagem descritiva e entrevistas a partir de um
112
questionário de análise de nível de comprometimento com docentes
convidados para participar do estudo.
Dessa maneira, considerando que o gestor tem a função de
monitorar praticamente todas as atividades de gestão, informações e
administração do setor, é importante que ele desenvolva um perfil
empreendedor, criativo e dinâmico. Essas características são essenciais
para que ele se torne um profissional competente e engajado,
comprometido com a excelência dos serviços prestados e o sucesso de
sua equipe gestora.
Silva et. al. (2021) em suas pesquisas realizaram um
levantamento bibliográfico com o intuito de analisar a relação da
gestão escolar entre cultura organizacional e liderança na condução
do trabalho escolar, para enriquecer a discussão foi realizada uma
breve pesquisa de campo em duas escolas com um convite aos gestores
para participarem respondendo um questionário com questões
objetivas sobre a gestão, cultura, clima, liderança e a relação entre eles.
Em conclusão, a pesquisa enfatiza a relação estreita entre a
gestão escolar, cultura escolar, clima organizacional e liderança. A
gestão democrática possibilita o engajamento da comunidade escolar
para cumprir a função social da escola e garantir educação de
qualidade. Um bom gestor age como um líder, favorecendo um clima
organizacional positivo e valorizando a cultura escolar. Manter o
equilíbrio entre esses elementos é crucial para um ambiente escolar
saudável e harmonioso, com foco na formação dos alunos. Os dados
coletados com os gestores mostram que eles compreendem essa
relação e trabalham para criar um ambiente escolar democrático e
participativo.
113
Assis e Martins (2022) em uma pesquisa mais recente,
descrevem que a sociedade vem sofrendo transformações e que a
escola deve acompanhar essas transformações também. Os autores
ressaltam a transformação do perfil das escolas, alunos e comunidade,
e questionam se todos os colaboradores, incluindo gestores escolares,
coordenadores pedagógicos e professores, estão preparados emocional
e profissionalmente para enfrentar essa nova realidade e seu impacto
na qualidade do ensino.
A pesquisa também destaca a evolução dos conceitos de
Gestão Escolar, que inicialmente eram confusos e se misturavam com
outros termos relacionados à administração e educação. No entanto,
a Gestão Escolar emergiu como uma nova tendência da educação,
com foco no estudo dos diretores escolares. Termos como liderança,
clima, socialização e cultura organizacional, antes vistos como
distantes do ambiente educacional, agora são essenciais para resolver
problemas de administração nas escolas. Com as mudanças na
estrutura das instituições educacionais, o perfil do gestor escolar
precisou se transformar, e a gestão participativa ganha foa. A
democratização da escola requer líderes educacionais competentes
para melhorar o ambiente escolar e, consequentemente, a qualidade
de ensino.
O texto enfatiza que fatores não diretamente relacionados ao
ensino, como o ambiente de trabalho e a cultura organizacional,
podem influenciar a eficiência da escola em alcançar suas metas e
objetivos. O papel do gestor escolar é destacado como estrutural para
administrar a escola em todos os seus aspectos e conciliar as diferentes
gerações presentes, garantindo a qualidade do processo de ensino e
promovendo a motivação e liderança dos profissionais da instituição.
114
A cultura organizacional pode interferir no clima escolar e,
consequentemente, na gestão escolar e na aprendizagem dos alunos,
o que torna imperioso para o novo gestor avaliar e gerenciar o clima
de trabalho visando a melhoria contínua da qualidade do ensino.
Considerações Finais
No culo XXI, a educação passa por transformações
significativas impulsionadas pelo avanço tecnológico e mudanças
sociais. A pesquisa científica tem sido impreterível nesse contexto,
pois permite compreender e aprimorar os sistemas educacionais, com
destaque para a abordagem centrada no estudante, em que os alunos
são protagonistas do processo de aprendizado.
Essa mudança na educação não se limita apenas ao
conhecimento acadêmico, mas também à importância do
desenvolvimento de habilidades socioemocionais nos estudantes. A
Base Nacional Comum Curricular (BNCC) assume um grande papel
ao definir competências e habilidades essenciais para o crescimento
pleno dos alunos, preparando-os para enfrentar os desafios do futuro.
As legislações educacionais, como a Lei de Diretrizes e Bases
da Educação Nacional (LDB) e os Parâmetros Curriculares
Nacionais, também reconhecem a importância da formação ética e
moral dos estudantes, destacando a convivência democrática e a
promoção de valores éticos nas escolas.
A pesquisa sobre o clima escolar e sua relação com a gestão,
cultura organizacional e liderança surge como um aspecto de
relevância na área da educação. Compreender como o clima escolar
influencia a interação entre alunos, professores e demais membros da
115
comunidade escolar é fundamental para promover um ambiente
saudável e propício ao desenvolvimento integral dos estudantes.
A gestão escolar desempenha um papel multifacetado
exercendo influência decisiva na trajetória dos estudantes desde a
infância até a fase adulta. Seu papel vai além da administração, pois
molda a cultura e o ambiente escolar. Uma gestão eficiente promove
um ambiente acolhedor e seguro, estimulando o engajamento dos
alunos. Além disso, promove uma educação inclusiva e ética,
preparando cidadãos conscientes e responsáveis para uma sociedade
mais justa.
As pesquisas disponíveis mostram a relevância da gestão
escolar na melhoria do desempenho dos alunos e a importância da
liderança pedagógica na criação e manutenção de um clima escolar
positivo. Além disso, a cultura organizacional da escola também
impacta o clima escolar, enfatizando a necessidade de gestores
comprometidos em promover um ambiente saudável e harmonioso.
Essa abordagem holística da educação é relevante para construir um
futuro mais promissor e sustentável para as próximas gerações.
No Brasil as pesquisas sobre clima escolar ainda são poucas,
mas se percebe uma crescente nesses últimos dez anos, visto que o
assunto vem ganhando reconhecimento nos estudos para criação de
políticas educacionais para promover um ambiente escolar mais
democrático e convivência respeitosa.
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116
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118
119
Uma Reflexão Sobre o Uso das Metodologias
Ativas no Ensino do PROEJA Integrado a
Educação Profissional
Cristina do Socorro Ribeiro da COSTA
6
Introdução
Atualmente, uma das questões mais discutidas é a
preocupação com a qualificação das pessoas, uma vez que é necessário
formar profissionais capacitados para acompanhar as mudanças
sociais, políticas e econômicas que ocorrem. A Educação preocupa-se
em direcionar suas práticas de ensino pautadas na formação de pessoas
independentes, capazes de mobilizar conhecimentos, valores,
habilidades e atitudes diante de situações de vida. Segundo Delors
(UNESCO, 1998), a educação estimula a resolução de problemas,
desafiando os alunos a trabalharem com os conhecimentos
adquiridos, integrando-os e a criando, tendo como base os quatro
pilares: aprender a conhecer; aprender a fazer; aprender a conviver e
aprender a ser.
6
Mestranda em Educação pela Faculdade de Filosofia e Ciências (FFC), Universidade
Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” (UNESP), Campus de Marília, São Paulo, Brasil.
E-mail: cristina.costa@unesp.br
https://doi.org/10.36311/2024.978-65-5954-473-8.p119-132
120
Os alunos de hoje estão acostumados a viver em um mundo
altamente tecnológico. Os millennials, alunos nascidos em ou após
1982, estão incluídos nesse grupo de alunos, que têm preferências de
aprendizado diferentes de seus antecessores. Os docentes muitas vezes
favorecem métodos de ensino que colidem com tais preferências.
As metodologias ativas de aprendizagem ganham importância
na intenção de aperfeiçoar o ensino, principalmente quando buscam
um modelo diferente do aprendizado tradicional, em que o
conhecimento deixa de ser apenas transmitido e passa a ser obtido de
maneira mais ativa pelo aluno, sendo um movimento que parte da
constatação de que esse maior protagonismo por parte do estudante
colabora para que ele aprenda mais pido e melhor.
A importância para um profissional compreender a
funcionalidade de suas atividades e obter uma visão sistêmica para
tomar uma decisão, implica na busca de uma formação que o ajude
tomar decisões e entender o impacto que essas decisões causarão.
Cabe ao profissional desenvolver conhecimento e habilidades para
decisões mais eficientes, tornando mais produtivo o trabalho, com
resultados mais duradouros e melhores. Diante do exposto o objetivo
deste artigo é analisar a utilização das metodologias ativas no ensino
do PROEJA integrado a educação profissional.
Educação de Jovens e Adultos
Segundo Oliveira (2007), a educação de jovens e adultos, no
Brasil, tem sido um tema polêmico e controvertido desde os primeiros
momentos em que começou a ser pensada em suas especificidades
com relação ao ensino regular.
121
A EJA (Educação de Jovens e Adultos), é uma política
educacional instituída pelo Governo Federal, voltada para a educação
de jovens e adultos que não completaram o ensino ou que não tiveram
acesso a uma educação formal na idade apropriada, tendo como
objetivo promover a inclusão social e o acesso dessas pessoas a uma
educação de qualidade. No entanto, outras finalidades também são
alcançadas, como a flexibilidade e a economia de tempo e dinheiro
dos estudantes, além da inclusão digital pelo uso da tecnologia na
educação (SOARES; PEDROSO, 2016).
A construção de uma proposta de trabalho que reconheça as
especificidades do público da EJA perpassa diversos aspectos como: a
diversidade de sujeitos educandos com características peculiares; a
preocupação com a existência de uma infraestrutura que acolha a
realidade desse público bem como a elaboração de propostas
curriculares que ao encontro das necessidades, das exigências e dos
interesses desses sujeitos (SOARES, 2011).
Arroyo (2007) relata que no cotidiano escolar muitos são os
desafios enfrentados pelos alunos da EJA na busca por um ensino com
qualidade, como exemplo, a diversidade cultural, a diferença de
idades entre os alunos, equacionando dificuldades de estabelecerem
boas relações, a superação do analfabetismo digital, o cansaço, a
formação profissional para atuarem na EJA, pouco tempo para
dedicação aos estudos, metodologias utilizadas, comumente
inadequadas que acabam por impedir ao aprendizado.
Os jovens, quando chegam nesta modalidade, em geral, estão
desmotivados, desencantados com a escola regular, com histórico de
repetência de um, dois, três anos ou mais. Muitos deles sentem-se
perdidos no contexto atual, principalmente em relação ao emprego e
122
à importância do estudo para a sua vida e inserção no mercado de
trabalho. Além das dificuldades de acesso e permanência na escola, os
jovens enfrentam a realidade de instituições blicas que se orientam
predominantemente para a oferta de conteúdos curriculares formais e
considerados pouco interessantes pelos jovens. Isso implica em dizer
que as escolas têm se apresentado como instituições pouco abertas
para a criação de espaços e situações que favoreçam experiências de
sociabilidade, solidariedade, debates públicos e atividades culturais e
formativas de natureza curricular ou extraescolar (BRUNEL, 2004).
Merazzi (2014) afirma ser possível realizar uma intervenção
na qual exista a necessidade de garantir a jovens e adultos, pouco ou
não escolarizados, a oferta de oportunidades educacionais que sejam
adequadas às suas expectativas e especificidades, mas que também é
importante que essas oportunidades venham acompanhadas de uma
política de discriminação positiva que programe e facilite este
processo para garantir a conclusão da formação escolar. Neste
contexto, não basta oferecer escola; é necessário criar as condições de
frequência, utilizando uma política de discriminação positiva, sob
risco de, mais uma vez, culpar os próprios alunos pelos seus fracassos.
Pinto (2000) explica que é necessário superar a ideia de que a
EJA se esgota na alfabetização, desligada da escolarização básica de
qualidade. É também necessário superar a descontinuidade das ações
institucionais e o surgimento de medidas isoladas e pontuais,
fragmentando e impedindo a compreensão da problemática. É
preciso desafiar o encaminhamento de possíveis resoluções que levem
à simplificação do fenômeno do analfabetismo e do processo de
alfabetização, reduzindo o problema a uma mera exposição de
números e indicadores descritivos. Visualizar a educação de jovens e
123
adultos levando em conta a especificidade e a diversidade cultural dos
sujeitos que a ela recorrem torna-se, pois, um caminho renovado e
transformador nessa área educacional.
A diversidade geracional do público da EJA (adolescentes,
jovens, adultos e idosos) incide nos diferentes acessos e níveis de
domínio das tecnologias digitais. O atual momento de pandemia
revela a necessária atuação do Estado e de políticas públicas planejadas
de acesso e inclusão às tecnologias digitais. Estas, porém, não
substituem a importância do espaço-tempo escolar e a mediação do
professor. No caso dos sujeitos da EJA, afora os desafios aqui
mencionados, os de outras natureza, a saber: os concernentes à
saúde de adultos e idosos, que impedem/dificultam a exposição por
longo tempo à frente da tela de um computador ou celular; o de
natureza pedagógica, que exige um maior acolhimento e interação por
parte do professor, face ao histórico dos estudantes marcado por
muitas interrupções e insucesso escolar; os de natureza econômico-
social, que não favorece haver espaço-tempo na residência, apropriado
para concentração e disciplina que o ensino remoto e a educação
online exigem (DA SILVA; MARTINS, 2012).
Educar jovens e adultos, em última instância, não se restringe
a tratar de conteúdos intelectuais, mas implica lidar com valores, com
formas de respeitar e reconhecer as diferenças e os iguais. E isso se faz
desde o lugar que passa a ocupar nas políticas públicas. De nada
adianta impor conteúdos, se não se sabe que eles são bens produzidos
por todos os homens, que eles têm direito e devem poder usufruí-los.
Nenhuma aprendizagem, portanto, pode-se fazer destituída do
sentido ético, humano e solidário que justifica a condão de seres
humanizados, providos de inteligência (PAIVA, 2007).
124
O PROEJA é a modalidade de EJA voltada à educação
profissional. Ou seja, além de receber a formação básica, o aluno
recebe também uma qualificação ou uma formação técnica.
Metodologias ativas para jovens e adultos
A idade é a característica frequentemente mencionada ao
descrever um aluno adulto. A maioria dos educadores presume que é
fácil distinguir um aluno adulto de um aluno mais jovem, basta
observar a diferença de anos. Mas a diferença vai além da idade e dos
anos. Pense nos muitos conceitos possíveis de um adulto, como a
definição de um dicionário ou as definições biológicas, fisiológicas,
legais, sociais, psicológicas, espirituais e morais. Esses conceitos
incluem definir um adulto como totalmente desenvolvido e maduro,
como alguém que pode se reproduzir, como alguém que é responsável
por suas próprias ações, como alguém que pode votar legalmente e
como alguém que exibe um comportamento que indica um sentido
de certo e errado.
O termo ensino e aprendizagem em que o conceito de
mediação em Vigotsky (2009) início a uma discussão que
considera o meio cultural e as relações entre os indivíduos como
percurso do desenvolvimento humano, no qual a reelaboração e
reestruturação dos signos são transmitidos ao indivíduo pelo grupo
cultural. Dessas formas as teorias de aprendizagem buscam
reconhecer a dinâmica envolvida nos atos de ensinar e aprender,
partindo do reconhecimento da evolução cognitiva do homem, e
tentam explicar a relação entre o conhecimento p-existente e o novo
conhecimento.
125
A aprendizagem não seria apenas inteligência e construção de
conhecimento, mas, basicamente, identificação pessoal e relação
através da interação entre as pessoas. A aprendizagem e o crescimento
genuínos são respostas autoiniciadas à vida, expressões da voz,
experiência, desejo, preferência e sentimento.
As abordagens teóricas sobre o desenvolvimento humano e os
processos de aprendizagem apresentam conhecimentos que podem
contribuir para a construção e reconstrução das relações entre os
indivíduos, podem modificar a realidade social e melhorar a qualidade
de vida do ser humano; e do ponto de vista educacional podem,
efetivamente, impactar na formação e atuação dos professores e
promover o desenvolvimento de práticas educativas mais eficazes.
O desenvolvimento e a aprendizagem tornaram-se campos de
estudos e pesquisas da Psicologia da Educação sob a égide de
diferenças filosóficas, epistemológicas, bases empiristas e seus
princípios entusiasmam na direção dos seus processos, pois cada
pesquisador abarca consigo uma concepção de mundo e de homem,
e estas consequentemente influenciam em seus estudos.
As metodologias ativas de aprendizagem vêm ganhando
espaço, pois se propõem a trazer o aluno para o centro do processo de
ensino e aprendizagem, por meio de experiências de situações reais,
abrangendo conhecimentos significativos. Esse processo desvincula o
aluno de uma metodologia que o robotiza, limitando-o apenas ao que
lhe é transmitido, quebrando o paradigma do ensino para o
verdadeiro aprendizado.
O modelo convencional de ensino não atende hoje todas essas
necessidades de mudança, uma vez que o aluno adulto possui outras
necessidades de aprendizagem e de construção do conhecimento,
126
diferente do aprender do aluno criança e adolescente. O marco
histórico da Andragogia como uma ferramenta didática ocorreu no
século XX, quando muitos autores notaram que a forma de orientar
e educar os adultos, deveria ser diferente da pedagogia para as crianças
e adolescentes. O adulto necessita que sua necessidade de
aprendizagem específica seja compreendida e atendida de maneira
prática.
De acordo com Knowles (1980), o objetivo da educação de
adultos deve ser a autorrealização; assim, o processo de aprendizagem
deve envolver todo o ser emocional, psicológico e intelectual. A
missão dos educadores de adultos é auxiliá-los a desenvolverem todo
o seu potencial e a andragogia é a metodologia de ensino utilizada
para atingir esse fim. Na visão de Knowles, o professor é um
facilitador que ajuda os adultos a se tornarem aprendizes
autodirigidos.
Rogers (1985) afirma que é pelo contato que se educa e que o
professor deve ser um educador-facilitador, uma pessoa realmente
presente para seus alunos. O educador não deve adotar um modelo
único de facilitar o aprendizado, precisa colocar os interesses dos
alunos em primeiro lugar; esse método consiste em o aluno seguir,
apreendendo a aprender e o professor, sendo um facilitador dessa
aprendizagem de forma singular e livre, com autenticidade, aceitação,
confiança tanto em si como no aluno e compreensão empática. Sugere
ainda a não padronização e a universalização dos comportamentos e
sim a singularização e o respeito às diferenças, a relação aluno e
professor deve transcender a sala de aula porque a educação sem
atuação é comparada ao adestramento, na prática educativa o aluno
127
precisa ser ator do seu processo de aprendizagem, refletindo,
questionando e fazendo escolhas.
Por aprendizagem significativa, queremos dizer que a
aprendizagem é mais do que um acúmulo de fatos. É a aprendizagem
que faz a diferença no comportamento do indivíduo, no curso de ação
que ele escolher no futuro, em suas atitudes e em sua personalidade.
É um aprendizado abrangente que não é apenas um acréscimo de
conhecimento, mas que se interpenetra em cada parte de sua
existência.
Hoke et al. (2005) descrevem que a aprendizagem ativa e
cooperativa é um método para ensinar as habilidades de pensamento
crítico necessárias para a transferência e uso do conhecimento
adquirido em sala de aula no ambiente clínico. No entanto, muitos
educadores de enfermagem continuam a usar abordagens
educacionais centradas no professor, ao mesmo tempo em que
identificam uma rie de barreiras para a preferência expressa pela
educação centrada no aluno. Usando estratégias holísticas e ativas de
aprendizado cooperativo (modelagem de papel do corpo docente,
aprendizado interativo e em grupo do aluno e testes em grupo) dentro
de uma aula didática, os autores encontraram diferenças na nota
clínica média (87,03) quando comparada à nota clínica média para
alunos que foram ensinados usando uma abordagem de palestra
(84,19).
Knowles et al. (2005) observaram que os aprendizes adultos
trazem experiências de vida e conhecimentos prévios para a sala de
aula; assim, o professor é mais um facilitador da aprendizagem do que
aquele que possui todo o conhecimento. Isso sugere que o professor
128
deve capacitar os alunos durante o processo de aprendizagem, e não
esperar que eles assumam um papel passivo.
As metodologias ativas de aprendizagem, além de romper com
o tradicionalismo com novas perspectivas de ensino e aprendizagem,
proporcionam uma gama de conteúdos que talvez não fossem
explorados no método tradicional, ou, se explorados, não teriam tanto
significado para o aluno. Nas metodologias ativas de aprendizagem,
quanto maior o envolvimento do aluno no conteúdo discutido, maior
sua capacidade de compreensão. Além disso, a correlação entre o
conhecimento abstrato e sua aplicação ao mundo real promove a
interação entre teoria e prática e, ao participar ativamente do processo
de aprendizagem, o aluno adquire maior capacidade de memorização,
pois o cérebro atua de forma mais dinâmica. Acrescenta-se que a
trajetória da aprendizagem ativa deve ser pautada por um objetivo
final a ser alcançado.
É de extrema importância o uso de metodologias, práticas
pedagógicas inovadoras e flexíveis que possam contribuir
positivamente no processo de ensino aprendizagem, na construção de
conhecimentos, constituindo possibilidades ilimitadas ao aluno,
assim como o acesso às tecnologias, obtenção de informações
consideráveis, através de professores preparados e valorizados que
ultrapassem as fronteiras da formação convencional.
São vários os motivos que levam os alunos a abandonar os
estudos dentro da faixa etária em cada modalidade, seja no Ensino
Fundamental ou Ensino Médio Regular de escola pública ou privada,
causando assim a evasão escolar, entre os motivos pode-se citar:
problemas familiares, busca por trabalho desde jovem, falta de
organização e frustação por não entender os ensinamentos do
129
professor, além de muitos outros fatores. Convém destacar que o
PROEJA é mais do que um direito, é o ponto de acesso para a atuação
da cidadania na sociedade contemporânea, que cada vez mais vai se
impondo nestes tempos de grandes mudanças e modernização nos
processos produtivos.
Considerações Finais
Os estudantes jovens e adultos historicamente têm lutado
para aprender uma grande quantidade de conteúdo em um curto
período. Confiar na memorização intensa de fatos intermináveis de
vários capítulos de livros didáticos é ineficaz, exaustivo e geralmente
não resulta em retenção de conhecimento. Os educadores enfrentam
o desafio de facilitar o aprendizado que promova o pensamento crítico
por meio do uso de estratégias que envolvam ativamente os alunos. É
imperativo criar um ambiente de aprendizagem onde os alunos
venham preparados para a aula e usem o material didático para
melhorar a compreensão e a aquisição de conhecimento. As
metodologias ativas têm se mostrado como recursos promissores para
um melhor ensino profissionalizante.
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132
133
A Importância das Competências Sociais na
Educação DO/NO Campo
Andreia do Nascimento LIMA
7
Henrique Tahan NOVAES
8
Introdução
A educação é um direito de todos e dever do Estado e da
família, devendo ser promovida e incentivada com a
colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da
pessoa, preparando para o exercício da cidadania e sua
qualificação para o trabalho (BRASIL, 1988, art. 205).
A educação do campo, resultado de um processo histórico
marcado por lutas, teve que conquistar seu espaço educacional diante
da exclusão e do esquecimento dos povos do campo, frente aos
avanços das cidades dominadas pela elite oligárquica. Conforme
Benincá (2013), os camponeses brasileiros historicamente foram
7
Mestranda em Educação pela Faculdade de Filosofia e Ciências (FFC), Universidade
Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” (UNESP), Campus de Marília, São Paulo, Brasil.
E-mail: an.lima@unesp.br
8
Docente da Faculdade de Filosofia e Ciências (FFC), Universidade Estadual Paulista “Júlio
de Mesquita Filho” (UNESP), Campus de Marília, São Paulo, Brasil. E-mail: henrique-
tahan.novaes@unesp.br
https://doi.org/10.36311/2024.978-65-5954-473-8.p133-148
134
privados do direito à educação básica, superior, continuada e de
qualidade, o que gerou desigualdades sociais imensuráveis. Nas
últimas duas cadas, os movimentos sociais desencadearam debates
e lutas que resultaram em projetos, programas e políticas de educação
do/no campo, associados a outras políticas necessárias para melhorar
as condições de trabalho e vida dos camponeses.
Caldart (2009) afirma que a Educação do Campo nasceu
como uma crítica à educação brasileira, em especial à situação
educacional do povo que trabalha e vive no/do campo. Enquanto
crítica da educação em uma realidade historicamente determinada,
ela luta por uma concepção de educação (e de campo). Assim, a
concepção de educação do campo veio para romper com a noção de
educação rural e com a ideia de que o campo é um lugar meramente
de produção de matérias-primas, onde a educação deve ser de
transferência de conhecimentos sem levar em consideração o
território onde esses sujeitos estão inseridos.
A educação do campo contrapõe-se a esse modelo de educação
rural, onde o ensino é pensado para a formação de mão de obra que
precisa atender ao capital agrário, buscando uma formação de sujeitos
protagonistas, com pilares ancorados na cultura e na tradição dos
saberes populares.
Para Santos e Neves (2012), a Educação do/no Campo se
firma na defesa de um país vinculado à construção de um projeto de
desenvolvimento, no qual a educação é uma das dimensões necessárias
para a transformação da sociedade. Sendo a escola um espaço de
análise crítica, esta deve levar a uma proposta de educação que
transforme a realidade dos sujeitos do campo em todas as suas
135
dimensões (sociais, ambientais, culturais, econômicas, éticas e
políticas).
A compreensão de educação do/no campo vai muito além de
um projeto ou uma política, mas de um fenômeno da realidade que é
vivida e sentida pelos sujeitos do campo e suas relações entre si e com
meio. Segundo Caldart (2012, p. 259), “a Educação do Campo
nomeia um fenômeno da realidade brasileira atual, protagonizado
pelos trabalhadores do campo e suas organizações, que visa incidir
sobre a política de educação”.
A escola do/no campo se designa aquela “situada em área
rural, conforme definida pela Fundação Instituto Brasileiro de
Geografia e Estatística (IBGE), ou aquela situada em área urbana,
desde que atenda predominantemente a populações do campo”
(BRASIL, 2010). Dessa forma, concebe-se a educação dos povos do
campo, também denominada de Educação do/no Campo, conforme
Scalabrin (2011, p. 18):
[...] na expressão do e no campo, em que no campo, indica a
necessidade da escola estar localizada no espaço geográfico,
político e social do campo, possibilitando a apropriação e
sistematização do conhecimento produzido no âmbito da
ciência; e, do campo, representa a educação construída/
produzida com as populações do campo, a partir de seus
interesses e necessidades, implicando na estruturação de um
currículo que priorize e valorize os valores expressos por essas
populações. A concepção de Educação do e no Campo pressupõe
o desenvolvimento de protagonismo e de participação efetiva e
crítica dos sujeitos, enquanto produtores de sua história, de lutas
sociais, com acúmulo de conhecimento sobre a vida e o meio em
que vivem e trabalham.
136
Portanto, é necessário entender a importância do lugar onde
ocorre a educação dos povos do campo. A educação deve acontecer
no local onde se vive, repleto das suas culturas, necessidades e
vivências humanas e sociais. Fazer a educação do/no campo onde a
população se afasta de seu próprio lugar dificulta a construção de sua
identidade. Portanto, a educação destinada ao meio rural precisa ser
compreendida como educação do/no campo para que os sujeitos
possam se enxergar como cidadãos e não como excluídos por não
viverem nas cidades.
Além disso, é preciso entender quem são os sujeitos da
educação do/no campo. Os povos do campo não são apenas os
agricultores familiares. As populações do campo incluem agricultores
familiares, extrativistas, ribeirinhos, assentados e acampados da
reforma agrária, trabalhadores assalariados rurais, quilombolas,
caiçaras, povos da floresta, caboclos e todos que produzem suas
condições materiais de existência a partir do meio rural.
Os sujeitos do campo têm como característica lutar pelo
direito à terra, à floresta, à água, à alimentação e à educação para
recriar suas pertenças, reconstruindo a sua identidade com a terra e
com sua comunidade, pois os sentimentos dos que vivem na e da
terra, com todo o ecossistema, não são os mesmos dos que vivem na
cidade (BRASIL, 2003).
Essa educação reivindicada pelos agricultores, essencialmente
os agricultores familiares, precisa ser diferenciada, relativa à sua
realidade e libertadora. O modo de viver e pensar dos povos do campo
difere-se em vários aspectos daqueles que vivem nas áreas urbanas,
sendo assim necessária uma educação voltada para seu cotidiano,
137
tornando-a significativa e capaz de fazer este sujeito transformar seu
ambiente (PUHL; PAULI; MORAES, 2020).
Macedo, Amorim e Silva (2020) enfatizam que é fundamental
que a educação valorize o campo como espaço de produção de
existência, possibilitando a aprendizagem significativa para a
formação dos sujeitos do campo, onde o professor possa organizar
suas práticas com base nesse conceito.
A educação do/no campo é um processo que deve considerar
as especificidades do meio rural e o contexto social em que os
estudantes estão inseridos. Assim, a formação de competências sociais
é fundamental para que os estudantes desenvolvam habilidades que
os ajudem a lidar com os desafios e as oportunidades que se
apresentam em suas comunidades.
As competências sociais são importantes porque ajudam os
estudantes a desenvolver habilidades de comunicação, colaboração,
liderança e resolução de problemas. Essas habilidades são essenciais
para que os estudantes possam se envolver em ações coletivas e
colaborativas, contribuindo para o desenvolvimento sustentável de
suas comunidades. Além disso, as competências sociais também
ajudam os estudantes a lidar com conflitos e a desenvolver relações
saudáveis e respeitosas com outras pessoas.
Nesse sentido, é importante que os planos educacionais e os
projetos pedagógicos das educação do/no campo contemplem o
desenvolvimento de competências sociais como parte essencial da
formação dos estudantes. É necessário que os educadores sejam
capacitados e estejam preparados para trabalhar com essas
competências, considerando as especificidades do contexto rural e a
realidade das comunidades em que os estudantes estão inseridos.
138
Por fim, é fundamental destacar a importância da participação
dos movimentos sociais e das organizações da sociedade civil na
construção dos planos educacionais e projetos pedagógicos das escolas
do/no campo. Esses grupos podem contribuir para a construção de
uma educação que esteja alinhada com as necessidades e expectativas
das comunidades rurais, contribuindo para a formação de estudantes
comprometidos com o desenvolvimento sustentável de suas regiões.
A educação do/no campo deve ser pautada na formação
integral dos estudantes, contemplando não apenas as competências
técnicas, mas também as competências sociais. Como afirma o
Ministério da Educação, “é preciso levar em consideração as
especificidades dos contextos rurais, promovendo uma educação
contextualizada, que contribua para o desenvolvimento das
competências e habilidades necessárias à vida no campo” (MEC,
2021).
Segundo a UNESCO, “as competências sociais são
fundamentais para que os indivíduos possam interagir de forma
efetiva com os outros e com o meio em que vivem, construindo
relações de confiança, respeito e cooperação” (UNESCO, 2016,
online). Nesse sentido, a educação do/no campo deve contemplar o
desenvolvimento de competências como a capacidade de
comunicação, de trabalho em equipe, de resolução de conflitos e de
liderança.
Além disso, é importante ressaltar que a construção de uma
educação pautada nas competências sociais deve ser fruto de um
processo coletivo, que envolva os diferentes atores da comunidade
escolar e os movimentos sociais do campo. Como aponta o texto do
Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária,
139
[...] a ampla participação dos movimentos sociais e organizações
da sociedade civil na construção dos Planos Estaduais e
Municipais é fundamental para que a identidade do campo na
sua complexa diversidade e o compromisso com um projeto de
desenvolvimento sustentável para o mesmo estejam
intrinsecamente articulados aos projetos pedagógicos dos
Estados e Municípios brasileiros (INCRA, 2016, online).
Em suma, a promoção das competências sociais na educação
do/no campo é essencial para o desenvolvimento integral dos
estudantes, bem como para a construção de uma sociedade mais justa
e solidária. Esse processo deve ser construído de forma coletiva e
contextualizada, levando em consideração as especificidades dos
contextos rurais e a participação ativa dos movimentos sociais e da
comunidade escolar.
Além disso, o desenvolvimento de competências sociais pode
contribuir para a construção de uma identidade coletiva do campo,
como destacado por Gomes (2011), ao afirmar que “o ensino no/do
campo precisa ser desenvolvido a partir de uma pedagogia que
valorize as identidades locais e regionais, que reconheça as
especificidades e as diversidades e que promova a construção de uma
identidade coletiva, o que implica em pensar em competências e
habilidades para a vida em comunidade”.
Dessa forma, é importante que as escolas do/no campo
incluam em suas propostas pedagógicas o desenvolvimento de
competências sociais, por meio de práticas educativas que envolvam a
participação ativa dos estudantes em projetos e atividades que visem
à promoção do diálogo, da cooperação, da solidariedade e da
resolução de conflitos de forma pacífica e democrática.
140
Assim, é possível afirmar que o desenvolvimento de
competências sociais é essencial na educação do/no campo, pois
contribui para a formação integral dos estudantes, para a construção
de uma identidade coletiva e para a promoção de práticas educativas
contextualizadas e significativas para a realidade dos estudantes.
Compencias Sociais Para Transformação dos Sujeitos da
Educação DO/NO Campo
O sistema educacional brasileiro, e mais precisamente a
educação do/no campo, enfrenta inúmeros problemas e desafios.
Entre eles, destaca-se a formação de todos os envolvidos no processo
educacional e a compreensão das competências sociais na valorização
dos sujeitos, que podem contribuir para o enfrentamento desses
desafios, respeitando as particularidades de cada contexto.
Para que ocorra um processo de ensino/aprendizagem
significativo, a educação deve contextualizar o viver do educando, de
modo que ele se perceba inserido dentro desse processo de ensino e
possa refletir e ser a mudança em seu local de vida. Morais e Barbosa
(2021), com base em Piaget (1998), afirmam que o centro do
processo de ensino/aprendizagem é a interação social, um dos
princípios da aprendizagem cooperativa. Ao propor dinâmicas de
trabalhos em grupos geradoras de conflitos sociocognitivos, que
conduzem à reestruturação da aprendizagem mediante a busca de
novas soluções e assimilação de perspectivas diferentes das próprias,
favorecem aos alunos o desenvolvimento de capacidades
comunicativas para a participação em discussões e debates.
Partindo dessa perspectiva, o uso da aprendizagem
cooperativa na educação do campo proporcionará aos sujeitos o
141
desenvolvimento de habilidades tais como o senso crítico, a aceitação
das opiniões dos colegas que divergem das suas e a construção de
consenso.
Segundo Morais e Barbosa (2021), a aprendizagem
cooperativa, que se orienta pela cooperação entre os sujeitos,
contempla a formação de grupos, a participação equitativa e a
igualdade de oportunidades. Para que a cooperação ocorra, é preciso
saber cooperar, ou seja, colocar em ação diferentes habilidades sociais.
Compreendendo que além da escolarização formal, a
educação deve se dirigir às experiências pessoais concretas para uma
formação crítica dos educandos, permitindo o acesso a
conhecimentos e instrumentos que os auxiliem na ampliação da
compreensão da realidade sociocultural no contexto do campo e da
luta pela terra. Isso possibilita pensar de forma autônoma a elaboração
e implementação de propostas e ações que contribuam para a
transformação da realidade dos povos do campo, com o uso do
método da aprendizagem cooperativa. Assim como Morais e Barbosa
(2021) afirmam, o sujeito acessa um nível de rendimento superior ao
individual, pois a produção coletiva é superior à soma da capacidade
individual.
A luta dos movimentos sociais do campo por uma educação
do/no campo parte da visão de construir um conhecimento libertador
embasado na participação, na organização e no fortalecimento dos
sujeitos. Os movimentos sociais do campo têm lutado por uma
educação que considere as especificidades do campo, suas culturas e
saberes, e que possa contribuir para a transformação da realidade
social, política e econômica na qual estão inseridos. Nessa perspectiva,
a educação do/no campo é entendida como um processo de
142
construção coletiva, que valoriza as experiências e saberes dos sujeitos
do campo, e que busca superar as desigualdades sociais, econômicas e
culturais existentes entre o campo e a cidade.
Assim, a participação, organização e fortalecimento dos
sujeitos são fundamentais para a construção de uma educação do/no
campo emancipatória e transformadora. A participação dos sujeitos
do campo na elaboração das políticas educacionais e no planejamento
pedagógico das escolas é um passo importante para que sejam
consideradas as suas demandas, necessidades e realidades. A
organização dos sujeitos do campo, por meio dos movimentos sociais,
é uma forma de fortalecer a luta por uma educação do campo e por
uma sociedade mais justa e igualitária. A partir desse fortalecimento,
é possível estabelecer diálogos com outras organizações e movimentos
sociais, bem como pressionar os governos por políticas públicas que
atendam às demandas do campo.
Além disso, a valorização dos saberes dos sujeitos do campo é
uma forma de reconhecimento da diversidade cultural e de combate
ao preconceito e à discriminação. A educação do campo deve
considerar os saberes locais, as práticas agrícolas e os modos de vida
das comunidades do campo, o que pode contribuir para uma relação
mais harmoniosa e sustentável entre seres humanos e natureza. A
valorização desses saberes pode contribuir também para a formação
de sujeitos mais críticos e reflexivos, capazes de pensar a realidade
social e de atuar de forma consciente e transformadora.
Portanto, a construção de uma educação do campo que
contemple as competências sociais é um desafio para a sociedade
como um todo, que deve se mobilizar para garantir o acesso à
educação de qualidade para todos, independentemente de onde
143
vivem. A educação do campo pode contribuir para a construção de
uma sociedade mais justa e igualitária, que valorize as diferenças
culturais e que respeite a diversidade de modos de vida.
As competências sociais têm se mostrado cada vez mais
importantes no contexto educacional, especialmente no campo.
Nesse sentido, é fundamental que os professores e demais
profissionais da educação atuem como mediadores e estimulem o
desenvolvimento dessas habilidades nos estudantes.
No campo, as relações sociais podem ser bastante diferentes
das urbanas, pois muitas vezes os estudantes vivem em comunidades
menores e mais próximas. Assim, é importante que os profissionais da
educação estejam atentos às peculiaridades desse contexto e trabalhem
de forma a desenvolver competências que permitam aos estudantes
conviverem de forma harmoniosa e cooperativa.
Aprender a reconhecer e expressar emoções, cuidar dos outros,
tomar boas decisões, comportar-se com responsabilidade e
desenvolver comportamentos assertivos e colaborativos são algumas
das habilidades que podem ser desenvolvidas por meio do
aprendizado socioemocional. Além disso, outras habilidades
socioemocionais como empatia, extroversão, autoconfiança,
autocontrole, comunicação intra e interpessoal, engajamento e
persistência e abertura para outras experiências são importantes para
a construção de relações saudáveis e positivas.
O desenvolvimento dessas habilidades pode ser estimulado
por meio de atividades que envolvam a cooperação e a interação entre
os estudantes. As técnicas de grupo, por exemplo, podem ser
utilizadas para favorecer o desenvolvimento das competências sociais,
144
desde que integradas a uma prática coerente do professor que seja
respeitosa, democrática e justa.
Além disso, é importante que os professores estejam atentos
às relações entre os estudantes, promovendo a convivência
harmoniosa e o respeito mútuo. O ambiente escolar pode ser um
espaço propício para o desenvolvimento dessas habilidades, desde que
os profissionais da educação estejam preparados para lidar com os
desafios que surgem no dia a dia.
Dessa forma, a importância das competências sociais na
educação do/no campo está diretamente relacionada à construção de
uma sociedade mais justa e equitativa. Através do desenvolvimento
dessas habilidades, os estudantes podem aprender a conviver de forma
harmoniosa e cooperativa, o que é fundamental para o seu
desenvolvimento pessoal e profissional, além de contribuir para a
construção de uma sociedade mais solidária e democrática.
As competências sociais, ao contrário das habilidades técnicas
e cognitivas, não são facilmente mensuráveis por testes padronizados.
Elas envolvem habilidades como empatia, respeito, solidariedade,
cooperação, liderança, comunicação e resolução de conflitos, entre
outras. Essas habilidades são cruciais para o desenvolvimento de
indivíduos capazes de compreender e atuar no mundo de forma ética
e responsável, criando soluções criativas e inovadoras para os desafios
que se apresentam.
Somado a isso, as competências sociais também são essenciais
para a construção de uma educação mais inclusiva e democrática, uma
vez que permitem que as diferenças sejam reconhecidas e valorizadas.
Através da promoção de uma educação que valorize a diversidade
cultural e a inclusão, é possível promover o desenvolvimento de uma
145
sociedade mais justa e equitativa, que respeita e valoriza a pluralidade
de experiências e vivências.
Assim, é importante que as escolas do campo desenvolvam
estratégias pedagógicas que promovam o desenvolvimento dessas
competências, levando em conta as especificidades e desafios do
contexto rural. É preciso considerar as demandas e as expectativas das
comunidades locais, além de estabelecer um diálogo constante com
os movimentos sociais do campo, de forma a garantir uma educação
que esteja alinhada aos anseios e necessidades desses sujeitos. Somente
dessa forma será possível construir uma educação do/no campo capaz
de promover o desenvolvimento humano e social em suas múltiplas
dimensões.
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metodológico e político. In: Seminário Regional de Educação do
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148
149
A Formão Continuada do Educador Como
Oportunidade de Construção de Ações Refletidas
Graziella Diniz Borges
9
Patrícia Unger Raphael Bataglia
10
Introdução
Ao iniciar esse capítulo, vamos conhecer a professora Cida,
que chega até nós apresentada por Pacheco (2018) e nos conta um
pouco da rotina diária de uma escola:
-Tia, por que não vai pra frente da fila? Por que não “fura fila”?
Meu querido, eu não “furo fila” contestou a Cida. A criança
insistiu: -Na nossa escola, as educadoras passam à nossa frente.
Você é educadora, pode passar. -Exatamente por ser educadora é
que eu não vou passar à frente da fila, meu querido Completou
a Cida. E por se quedou o breve diálogo, mas não o episódio...
Outra professora chegou ao refeitório, ultrapassou todo mundo
9
Doutora em Educação pela Faculdade de Filosofia e Ciências (FFC), Universidade Estadual
Paulista “Júlio de Mesquita Filho” (UNESP), Campus de Marília, São Paulo, Brasil. E-mail:
gdinizborges@yahoo.com.br
10
Professora Associada do Departamento de Educação e Desenvolvimento Humano e do
Programa de Pós-Graduação em Educação da Faculdade de Filosofia e Ciências (FFC),
Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” (UNESP), Campus de Marília,
São Paulo, Brasil. E-mail: patricia.bataglia@unesp.br
https://doi.org/10.36311/2024.978-65-5954-473-8.p149-176
150
e se serviu de alimento. A mesma criança, que falara com Cida,
ousou interpelar a tia que “furara a fila”. Foi repreendido por essa
e outras indignadas educadoras “furonas”. A Cida herdara uma
cultura diferente daquela que ali prevalecia. Havia trabalhado
numa escola onde palavras como respeito e cidadania não
serviam para enfeitar um PPP escrito, onde as regras eram
decididas em coletivo e por todos cumpridas, onde valores
escritos não eram negados na prática. Onde se educava no
exercício da cidadania. Na escola de “furar fila”, a Cida
surpreendia-se com o fato de haver banheiro de aluno (coletivo e
sem espelho) diferente de banheiro de professor (coletivo e com
espelho) e este separado do banheiro do diretor (privativo e com
espelho). Surpreendia-se que todo mundo “achasse normal” que
até no defecar e urinar houvesse hierarquia. Sabia que não se
prepara jovens para a cidadania, mas que se educa na cidadania,
em contextos onde haja igualdade na diversidade, onde prevaleça
o exemplo. Isso ela aprendera numa escola onde não se “furava
fila” (PACHECO, 2018, p. 24-25).
A professora Cida dessa história, encontrou em seu caminho
profissional quem partilhasse esperançosas práticas, ao mesmo tempo
também encontrou aqueles que lhe disseram, que tudo isso foi feito
outrora e que outras pessoas que pensavam como ela, se
arrependeram. Podemos identificar claramente que vícios e tabus se
revelam em pormenores, onde representações sedimentadas acabam
por esconder a origem de forças sociais de dominação. Não raro, o
fato de uma supervisora, como a de Cida, a chamar num canto e
ordenar que ela se atenha a dar suas aulinhas. “E que uma prudente
diretora a aconselhasse: Cida, tenha paciência. Aqui, manda quem
pode, obedece quem tem juízo” (PACHECO, 2018, p. 25).
151
Nesse ponto da história, esperamos ao menos uma pontinha
de indignação, não é mesmo? Se não ocorrer, é fato preocupante!
Pacheco (2018) não traz o desfecho da história, ficando a cargo de
cada um: a inquietação, a indignação, a coragem, ou talvez acreditem,
que mais cedo ou mais tarde estará a Cida, “furando fila” no
refeitório e adiante marcando uma consulta com um psiquiatra.
Sabendo que todas essas possibilidades são reais, entendemos
que na formação continuada reside espaços de construção de reflexão,
para que diante de situações parecidas com a de Cida, os professores
e gestores possam construir um desfecho digno do espaço educativo
que é a escola.
Através do processo de formação continuada é possível
renovar, modificar costumes, ões pedagógicas. Significa a abertura
de novos caminhos, a descoberta de estratégias diferentes daquelas
que habitualmente utilizamos” (PACHECO, 2019, p. 49).
Pensando na formação continuada do educador, vamos
abordar ideias a partir do significado da palavra “forma”, como
propõe Proença (2018). No dicionário Houaiss (2015), o termo
“forma” significa configuração física dos seres e das coisas, formato,
feitio, maneira, método, tipo, variedade. o termo “fôrma” significa
modelo oco ou vasado para produzir uma forma, vasilha para assar
bolos. Diferentemente, o verbo “formar”, possui o significado de dar
forma ou tomar forma, dar ou receber educação formal, criar-se,
constituir-se, originar-se, produzir-se, fazer-se, desenvolver-se aos
poucos, elaborar, dispor-se.
Formar-se é ir em busca da construção de sua própria
identidade profissional, enquanto membro de um grupo, instituição
152
educativa, é o fazer-se, criar-se, reinventar-se continuamente e estar
disposto a isso é algo muito valoroso.
Segundo Proença (2018) podemos pensar os dois conceitos
da seguinte maneira:
Figura 1 – Forma e fôrma - Dois conceitos diferentes
Fonte: Adaptado de Proença, 2018
Nesse sentido, a formação engloba transformação, ressigni-
ficação, reelaboração, reflexão sobre a própria ação, reinvenção
enquanto um movimento ininterrupto de busca de constituição de
uma identidade pessoal e profissional. A multiplicidade, bem como,
a complexidade de atores e fatores envolvidos na trama desse processo,
possibilitam estabelecer relações entre componentes singulares de
cada sujeito e a pluralidade que reside no grupo, ou seja, na
comunidade escolar. A formação docente dialoga com o individual e
com o conjunto, de forma que se misturam as partes e o todo,
proposto por Proença (2018).
Piaget (1974/1977) dizia que o principal objetivo da
educação era o de criar homens capazes de inovar, de fazer coisas
novas, não simplesmente de repetir aquilo que foi feito por outras
153
gerações, homens inventivos e descobridores estão adormecidos e
podem ser despertos ao estabelecer conexões, recriar e transformar.
A Tomada de Consciência e a Formação de um Educador
Na obra “A tomada de consciência” Piaget (1974/1977),
retoma o processo da apropriação que o sujeito faz dos mecanismos
internos das coordenações de suas ações, chamando de tomada de
consciência. Mais uma vez chama a atenção para o fato de que não
devemos reduzir o sujeito a questões genéticas, tão pouco a questões
sociais e culturais, pois ambos são constitutivos e importantes.
Sabendo que a matéria prima do trabalho docente é o
conhecimento, mais que fazer o aluno executar tarefas, é preciso
“conseguir que ele entenda por reflexão e tomada de consciência,
como fez isto ou aquilo” (BECKER, 2012, p. 83). Isto não é diferente
quando tratamos da formação de professores, seja ela inicial ou
continuada, pois o educador precisa compreender, tomar consciência
de suas ações, além de dominar pressupostos teóricos, deve refletir
sobre eles.
A partir da epistemologia genética piagetiana podemos
compreender como ocorre a aprendizagem humana, seja ela uma
aprendizagem escolar ou não. Registre-se que se trata da
aprendizagem humana, não estamos tratando apenas da
aprendizagem da criança, o que significa que podemos utilizar essa
mesma epistemologia para pensar sobre a formação continuada de
professores.
Para falar de aprendizagem vamos recorrer ao conceito
piagetiano de assimilação que “é a utilização do meio externo pelo
sujeito, tendo em vista alimentar os seus esquemas hereditários ou
154
adquiridos” (PIAGET, 1975, p. 326). Dito de outra forma, “assimilar
implica decifrar o objeto [...] após agir sobre o objeto busca apreender
sua ação, [...] volta-se para si, produzindo transformações em si
mesmo, e assim ad infinitum(BECKER, 2012, p. 38).
A assimilação e a acomodação são polos que estão em
interações constantes, buscando equilíbrio, que é um princípio da
inteligência, sendo responsável por organizar o mundo a nossa volta
(PIAGET, 1975).
Nesse sentido, Becker (2012) nos fala que o ser humano é o
único capaz de apropriar-se das ações que praticou e pensar sobre elas,
este seria o segredo da ilimitada capacidade humana de se desenvolver
e aprimorar-se, que para nós é um elemento de grande importância,
quando levamos essas ideias para a formação continuada. “Uma ão
humana sempre tem duas dimensões: de transformação do objeto
(assimilação) e de transformação do próprio sujeito (acomodação)
(BECKER, 2012, p. 39).
Ao agir sobre o meio, o sujeito retira dele qualidades de suas
próprias ações e das coordenações delas. O ser humano constitui-se
como sujeito pelos elementos que retira das coordenações de suas
ações. Sendo um apanhado daquilo proveniente de sua herança
genética, dos conteúdos que assimila em seu meio social e cultural.
Na medida em que se apropria de suas ões, de seus mecanismos
internos, constitui sua subjetividade, conforme Becker (2012).
Ao trabalhar o conceito de tomada de consciência Piaget
(1974/1977), nos mostra uma evolução da percepção que é observada
do ponto de vista das ações materiais às operações. Na prova “andar
de gatinhas”, é possível compreender que a tomada de consciência é
155
um processo que se inicia, mesmo antes que criança possa andar,
vejamos:
O processo adotado consiste, primeiramente, em se pedir ao
sujeito que ande de gatinhas por uns dez metros e, depois, que
explique verbalmente como o fez. Em seguida, é levado a fazer a
demonstração, num pequeno urso cujas patas são articuladas, dos
movimentos que imagina necessários a essa atividade (PIAGET,
1974/1977, p. 13).
Na prova, arremesso de um projétil por uma funda”, o
sujeito deve acertar, por arremesso de uma funda, uma bola de
madeira de 5cm de diâmetro, fixada na extremidade de um barbante,
num alvo, contendo uma distância e uma determinada posição. A
proposta aqui é verificar a tomada de consciência da pontaria e do
trajeto percorrido pela bola (PIAGET, 1974/1977).
Foram observados três níveis: inicialmente, a tomada de
consciência e a conceituação encontram-se deformadas, porque,
mesmo havendo êxito na realização da tarefa, no plano sensório-
motor, não uma coordenação no plano nocional, sendo necessário
que haja “uma coordenação inferencial ou operatória extraída da
coordenação das próprias ações por abstração refletidora” (PIAGET,
1974/1977, p. 35).
Nas conclusões, Piaget (1974/1977) pontua que uma
diferença importante entre coordenação motora e a coordenação
conceitual. De um lado, temos uma seleção inconsciente das
possibilidades com aproximações polarizadas no resultado favorável e,
de outro lado, ocorre uma generalização com compreensão
progressiva de todas as possibilidades inerentes ao dispositivo dado e,
156
em seguida, unicamente, aplicação à ão realizada que se trata de
interpretar, como salienta Piaget (1974/1977).
A coordenação inferencial ou conceituada é extraída da
coordenação sensoriomotriz das ações, ocorrendo através da abstração
refletidora, conforme Piaget (1974/1977). Segundo Becker (2014) as
características das coordenações das ações, que são transferidas de um
certo patamar a outro patamar por reflexionamentos, exigem uma
nova organização ou reflexão, no novo patamar, em função do que
existia anteriormente, pois elas foram retiradas da organização
anterior e levadas para um novo meio, estranho, diferente. Para Piaget
(1974/1977), trata-se de uma reflexão no sentido de reorganização
conceitual: a compreensão de suas condições e razões.
Na prova da consciência da seriação, em que os sujeitos foram
solicitados a estabelecer seriações no contexto das ações operatórias,
algumas conclusões foram retiradas dos resultados dessa prova: a) na
tomada de consciência ocorre a passagem da ão a sua representação;
b) nela está inclusa uma reconstituição que depende da conceituação,
ao passo que a consciência elementar estaria ligada a um dado
imediato, externo ou proprioceptivo; c) essa interpretação, ou seja,
conceituação que permite integrar a percepção, é que constitui a
tomada de consciência (PIAGET, 1974/1977).
Para Piaget, a aprendizagem ocorre no nível teórico, não
apenas no âmbito prático. Isto porque a prática não pode por si
mesma, alcançar mudanças, repetindo aquilo que deu certo.
Dificilmente, aponta caminhos novos. Opostamente, a teoria é capaz
de mudanças, pois ao apropriar-se da prática, indica novos rumos e
justifica a necessidade da mudança (Becker, 2012).
157
A boa teoria é capaz de tirar a prática de sua circularidade,
arrancá-la do aqui e agora e jogá-la em um universo de
possibilidades inatingíveis por ela mesma. A boa teoria
redimensiona a prática. A mesma prática que alimenta e viabiliza
a teoria é incapaz de transformar a si mesma (BECKER, 2012,
p. 85).
A teoria nos oferece possibilidades, amplia o olhar,
aumentando o trabalho reflexivo. É exatamente na força da interação
entre sujeito-objeto, que o conhecimento é construído. Nas
alternâncias de reflexionamentos, reflexões, novos reflexionamentos,
que se ampliam, se prolongam até que se tornem infinitos, como nos
fala Becker (2012). Neste momento é importante clarificar que na
relação sujeito-objeto, o objeto para nós, nesse trabalho é a formação
continuada, ou seja, os elementos teóricos trabalhados nos encontros
de formação e os processos reflexivos suscitados por eles.
O conceito de tomada de consciência é pertinente quando se
refere a formação continuada do educador, pois a partir dele,
podemos pensar a respeito da importância da conceituação da prática
no trabalho pedagógico. Uma vez que, “a tomada de consciência
possibilitará que ele compreenda o que fez e, assim, conceitue sua ação
tornando-a muito mais poderosa do que era inicialmente” (BECKER,
2012, p. 53).
Acreditamos juntamente com Becker (2012) e Piaget
(1974/1978) que de fato, um predomínio da ação e que esta ação
constitui um conhecimento autônomo, entretanto, ela somente
poderá ser melhorada, se conceituada. “A ação passa a ser corrigida e
pode ser significativamente melhorada em função da conceituação”
(BECKER, 2012, p. 53). Existem dois tipos de ações: as de
158
primeiro grau são aquelas ações automatizadas e práticas, que fazemos
costumeiramente, quase automatizadas, que levam ao êxito na
resolução dos problemas. Essas ações prescindem de tomadas de
consciência. as ações de segundo grau são aquelas que ao se
debruçarem sobre as ações de primeiro grau, retiram delas, por
reflexionamento, suas coordenações, pois seu objetivo é a
compreensão, segundo Becker (1999). Trazendo essa ideia para
prática pedagógica, vamos pensar naquela ação sem conceituação, ou
seja, faço desse jeito porque aprendi assim, utilizo essa estratégia
porque fiz assim uma vez e deu certo. De fato, não reflexão ou
conceituação aqui, pode haver êxito, entretanto, se indagarmos o
educador sobre o porquê dessa ação, provavelmente veremos que ele
ainda não pensou sobre isso.
Para que o educador proceda em ações de segundo grau
implica parar as ações de primeiro grau para, num segundo momento,
abstrair delas suas coordenações, por reflexionamento, e, portanto,
levá-las a outro patamar onde serão reorganizadas por reflexão. O
resultado desse reflexionamento e dessa reflexão serão combinados e
incidirão sobre as futuras ações de primeiro grau, modificando-as. E
assim sucessivamente, dependendo sempre da qualidade da interação.
A qualidade das interações é dada por um sujeito ativo num meio
desafiador (BECKER, 1999).
Trazendo as ações de primeiro e segundo graus para dialogar
com a formação em serviço, momento no qual o professor trará suas
ações de primeiro grau e terá a oportunidade de abstrair delas
reflexionamentos, que serão reorganizados por reflexão e trazidos a
outro patamar, modificando-as. Lembrando que a qualidade da
interação nesse processo de tomada de consciência, se um fator
159
consideravelmente importante. Pensemos numa formação onde os
professores e gestores podem atuar ativamente, onde as propostas de
estudos são demandadas pelos próprios sujeitos em formação, onde
de fato, existe o desejo de mudança, de inovação; são desafios que
lançam a comunidade educativa a pensar e refletir conjuntamente
sobre sua prática pedagógica e nos caminhos para construir aquilo que
desejam ver em sua escola, juntos.
Becker (1999) questiona sobre o que pode levar o sujeito a
não se satisfazer com ações de primeiro grau? Pensando na formação
continuada e em serviço, a partir das trocas estabelecidas nos
encontros de formação, acreditamos que as concepções podem ser
pelo menos colocadas em questão. Quando os educadores buscarem
formas de superar as contradições que conseguem identificar, serão
levados a pensar, construir conceitos e refletindo sobre tudo isso e em
conjunto, rumo a superação das contradições. Sendo assim, da mesma
forma que o organismo não suporta o desequilíbrio, a inteligência não
suporta a contradição (BECKER, 1999).
Nas conclusões sobre a tomada de consciência, Piaget
(l974/1977, p. 199) apresenta o seguinte diagrama:
Figura 2 – Diagrama da tomada de consciência
Fonte: Piaget (l974/1977, p. 199)
160
A tomada de consciência, parte da periferia (objetivos e
resultados), orientando-se para as regiões centrais da ão, com o
propósito de alcançar o mecanismo interno desta: deseja reconhecer
os meios empregados, os motivos de sua escolha ou de sua
modificação durante a experiência (PIAGET, 1974/1977).
Piaget explica a razão da utilização dos termos “periferia” e
“centro”. A periferia P da ação é também periferia do objeto, porque
o conhecimento vai na direção do centro da ação C e do centro do
objeto C’. Nas palavras de Piaget: “[...] por meio de um vaivém entre
o objeto e a ação, a tomada de consciência aproxima-se por etapas do
mecanismo interno do ato e estende-se, portanto, da periferia P ao
centro C” (Piaget, 1974/1977, p. 199).
Partir da periferia do objeto significa que o sujeito considera,
num primeiro momento, os resultados exteriores da ação (êxito
ou fracasso) e, posteriormente, analisa os meios que foram
empregados na conquista do resultado. Somente mais tarde, e
por fim, é que se preocupa com o que antes era inconsciente: os
mecanismos centrais (reciprocidade, transitividade, reversibili-
dade), os quais são edificados na própria ação do sujeito
(SALADINI, 2008, p. 50).
Na tomada de consciência Piaget não está mirando na ação de
primeiro grau, ou seja, num conhecimento prático apenas, sua
proposta é utilizar a ação de primeiro como apoio à ação de segundo
grau, a tomada de consciência. Vamos exemplificar e novamente
trazer para o âmbito da formação do professor. Se o educador pede
que o aprendente execute uma tarefa matemática, utilizando
determinados materiais, ditando os passos que ele deve seguir no
caminho da aprendizagem, ou ainda, quando na resolução de
161
conflitos entre alunos, o professor utilizar de estratégias de mediação,
diálogos, construção de regras e afins. Durante o percurso de sua ação
pedagógica, ele optou por formas de solucionar os problemas
relacionais, utilizou recursos pedagógicos para a realização da
atividade matemática. Se inquirido como agiu durante o conflito ou
como realizou com os alunos a tarefa matemática ele poderá descrever
suas ações, passo a passo. Diferentemente, se solicitarmos que
explique, pela fala, como fez, porque agiu daquela maneira, o
professor voltará seu olhar para sua prática pedagógica de modo
reflexivo. Ainda podemos trazer modos de fazer diferentes e traçar
paralelos entre eles, para que a conceituação seja construída.
Como vimos, a prática não tem alcance, por si mesma, não
consegue produzir mudanças. Ao contrário, a teoria pode
proporcionar mudanças na medida em que se apropria da prática,
indicando-lhe novos rumos (BECKER, 2012).
O Diálogo Entre a Práxis de Paulo Freire, a Formação do
Educador Reflexivo de Donald Schon e a Tomada de Consciência
de Jean Piaget
Como vimos anteriormente, a tomada de consciência
possibilita a compreensão sobre aquilo que se fez, e a partir dessa
compreensão ocorre o que chamamos de conceituação que é possível
a partir de progressivas tomadas de consciência, que tornarão a prática
mais eficaz e assertiva, pois será corrigida, significada, melhorada em
função da conceituação que foi realizada (BECKER, 2012).
O professor Paulo Freire na Pedagogia do Oprimido” propõe
o conceito de práxis e afirma que palavras sem ação, tornam-se
verbalismo. Ao passo que, ação sem reflexão, transforma-se em
162
ativismo, que é a ação pela ação. Assim, conceitua práxis como “ação
e reflexão dos homens sobre o mundo para transformá-lo” (FREIRE,
2005, p. 89). Nesse sentido, estamos pensando na transformação do
mundo pela via da práxis pedagógica do professor.
Portanto, “os homens são seres do que fazer é exatamente
porque seu fazer é ação e reflexão. É práxis. É transformação do
mundo. [...] O que fazer é teoria e prática. É reflexão e ação. [...] Nem
verbalismo, nem ativismo (FREIRE, 2005, p. 141-142). Pensar na
educação fora do verbalismo e do ativismo é o mesmo que ir ao
encontro das práxis que buscam a ressignificação pedagógica.
É preciso que fique claro que, por isso mesmo que estamos
defendendo a práxis, a teoria do fazer, não estamos propondo
nenhuma dicotomia de que resultasse que este fazer se dividisse
em uma etapa de reflexão e outra, distante de ão. Ação e
reflexão se dão simultaneamente (FREIRE, 2005, p. 146).
Práxis é energia e realização da vocação para o ser mais
humano (vocação ontológica), seu objetivo primeiro é a
transformação do mundo. Estamos falando de que existe uma relação
entre o que o educador pensa, o que ele diz e o que ele realiza em sua
prática pedagógica. Este ato deve ser dotado de coerência, de
aproximação entre aquilo que foi pensado, dito e realizado (FREIRE,
2005).
Freire aloca a práxis como condição e fundamento da ação, da
luta, no sentido de rompimento com a idealização, bem como de
revelação do teor alienante imposto pela relação opressor/
oprimido (CARVALHO; PIO, 2017, p. 433).
163
Da mesma forma, podemos pensar nessa proposta trazendo-a
para os processos educativos, onde ação e reflexão podem ocorrer
simultaneamente. Conforme Freire (2005) o pensar e o agir precisam
ser orientados pela reflexão. Nesse ponto, podemos dialogar com
Piaget (1974/1977) pois, a tomada de consciência possibilita a
compreensão sobre aquilo que se fez, a partir dessa compreensão
ocorre o que chamamos de conceituação que é possível a partir de
progressivas tomadas de consciência, capazes de tornar a prática mais
eficaz e assertiva, pois será corrigida, significada, melhorada em
função da conceituação que foi realizada (BECKER, 2012).
Juntamente com Nóvoa (1997), entendemos que a formação
deve estimular a construção de uma perspectiva crítico-reflexiva,
capaz de fornecer aos professores meios para a construção de um
pensamento autônomo. Esta formação requer um investimento
pessoal do educador, com vistas à construção de uma identidade, que
também é uma identidade profissional. A formação não pode ser
somente acúmulo de cursos, ela é “[...] um trabalho de reflexividade
crítica sobre as práticas e de (re)construção permanente de uma
identidade pessoal. Por isso é tão importante investir a pessoa e dar
um estatuto ao saber da experiência” (NÓVOA, 1997, p. 25).
Ao pensarmos na epistemologia da prática docente podemos
considerar inseparáveis teoria e prática no plano da subjetividade do
sujeito (professor), pois é evidente que um diálogo do
conhecimento pessoal com a ação. Esse conhecimento é formado na
experiência concreta do sujeito em particular, nutrido pela "cultura
objetiva" (as teorias da educação, no caso), que dão subsídios para que
o professor crie seus "esquemas" que mobiliza em suas situações
164
concretas, resultando em um acervo de experiência "teórico-prático"
em constante processo de re-elaboração, conforme Pimenta (2006).
Para ampliar nosso olhar e diálogo sobre reflexão e ação nas
práticas de formação continuada de professores, vamos trazer as ideias
que Donald Schon (1997) trabalha através do triplo movimento: a)
conhecimento na ação; b) reflexão na ação; c) reflexão sobre a ação e
sobre a reflexão na ação. Para este autor, conhecer dialoga com “a
qualidade dinâmica de conhecer-na-ação, a qual, quando
descrevemos, convertemos em conhecimento-na-ação” (SCHON,
2000, p. 32).
Schon (1997) entende a docência como uma atividade
reflexiva e propõe uma nova epistemologia da prática orientada por
permanentes processos reflexivos. A orientação prática ou reflexão, no
modelo de Schon, objetiva superar a relação linear e mecânica entre
uma teoria ou conhecimento técnico-científico entendido como
“superior” e uma prática em sala de aula a ele sujeita. Sendo assim,
“pensamos criticamente sobre o pensamento que nos levou a essa
situação difícil ou essa oportunidade e podemos, neste processo,
reestruturar as estratégias de ação, as compreensões dos fenômenos ou
as formas de conceber os problemas (Schon, 2000, p. 33).
Schon (2000) estuda essa habilidade reflexiva em
profundidade, entendendo-a como um processo de reflexão em ação
e coloca o conhecimento desse processo como sendo uma pré-
condição necessária para a compreensão da atividade efetiva do
professor mediante as vicissitudes pedagógicas que ocorrem no espaço
escolar. Esse processo reflexivo deve melhorar a resposta do ensino a
situações reais, sabendo que o profissional deve utilizar seus recursos
intelectuais a serviço da situação, para que, através de um processo de
165
análise, de busca por estratégias ou soluções, as reais necessidades da
sala de aula sejam atendidas de forma eficiente e assertiva.
Conforme Donald Schon (1997) vamos apresentar e
diferenciar três conceitos ou fases dentro do termo mais amplo do
pensamento prático, são eles:
a) Conhecimento em ação:
Schon (1997) propõe uma nova epistemologia da prática,
embasada nos conceitos de conhecimento na ação e reflexão na ação.
O conhecimento na ação é o componente que está diretamente
relacionado com o saber-fazer e que surge na ação. Dessa forma, a
reflexão acontece decorrente de situações inesperadas e apresentadas
pela ação, onde nem sempre o conhecimento na ação é suficiente
(CRUZ, 2011).
É o componente inteligente ou mental responsável pela
orientação de toda atividade eminentemente humana, ou seja, é o
saber-fazer. Trata-se de um conhecimento à nível pessoal que está
vinculado à percepção, a ação ou ainda no julgamento existente nas
ações espontâneas de cada sujeito. De outra forma, é um
conhecimento implícito, inerente as atividades práticas que
acompanham permanentemente a pessoa que atua.
No conhecimento na ação temos:
[...] saberes interiorizados, adquiridos através da experiência e da
atividade intelectual e mobilizados de forma inconsciente e
mecânica nas ações cotidianas do professor, em situações
concretas do trabalho profissional. São observações e reflexões do
docente em relação ao modo como ele se desloca em sua prática.
166
Uma descrição consciente dessas ações pode provocar mudanças,
conduzindo a novas buscas para soluções de problemas de ensino
e de aprendizagem. Assim, exercitando o pensamento crítico
sobre sua ação, o professor pode elaborar novas estratégias,
adaptando-se (ativamente) às novas situações (FEITOSA; DIAS,
2017, p. 17).
Neste conhecimento em ação, Schon (1997; 2000) diferencia
dois componentes: o conhecimento proposicional, de ordem teórica
que é adquirido pela via do estudo científico, e, por outro lado,
conhecimento em ação, oriundo da própria prática profissional, é algo
não dito, espontâneo, dinâmico. Sendo assim, quando o professor se
prepara para cumprir sua atividade docente, ele está fazendo uso de
seu aporte pessoal de conhecimentos teóricos, práticos, experimentais,
experienciais e outros, que estão em constante diálogo com elementos
inconscientes, preconceitos, memórias, experiências pessoais,
interpretações subjetivas e afins. Para Gómez (1997) o conhecimento
na ação é um componente inteligente capaz de orientar toda a
atividade humana, que por sua vez se manifesta no saber fazer. Saber
fazer e saber explicar o que se faz são habilidades distintas e
importantes.
A proposta de um professor como um profissional reflexivo
notadamente reconhece a expertise que existe nas práticas de bons
professores, o que Schon nomeou como “conhecimento-na-ação”. Da
perspectiva do professor, isso quer dizer que o processo de
compreensão e de melhoria de seu próprio ensino deve começar da
reflexão sobre sua própria experiência e prática, e que o tipo de saber
que resulta unicamente da experiência de outras pessoas é insuficiente
(ZEICHNER, 2008).
167
b) Reflexão na ão:
Para Schon (2000), podemos refletir sobre nossa ão quando
pensamos,
retrospectivamente sobre o que fizemos, de modo a descobrir
como nosso ato de conhecer-na-ação pode ter contribuído para
um resultado inesperado. Podemos proceder dessa forma após o
fato, em um ambiente de tranquilidade, ou podemos fazer uma
pausa no meio da ação, para fazer o que Hannah Arendt (1971)
chama de “parar e pensar”. Em ambos os casos, nossa reflexão
não tem qualquer conexão com a ação presente. Como
alternativa, podemos refletir no meio da ação, sem interrompê-
la. Em um presente-da-ação, um período de tempo variável com
o contexto, durante o qual ainda se pode interferir na situação
em desenvolvimento, nosso pensar serve para dar nova forma ao
que estamos fazendo, enquanto ainda o fazemos. Eu diria, em
caso como este, que refletimos-na-ação (SCHON, 2000. p. 32).
Para Perrenoud (2001), “tornar-se um professor profissional
é, acima de tudo, aprender a refletir sobre sua prática, não somente a
posteriori, mas no momento mesmo da ação” (PERRENOUD, 2001,
p. 223).
Trata-se do pensamento que o indivíduo realiza a respeito do
que ele faz enquanto age. Schon (1997) explica esse processo como
reflexão em ação ou como conversa reflexiva sobre a situação
problemática concreta. É marcado pelo imediatismo do momento e
pelas incontáveis variáveis existentes na situação que está sendo
experimentada.
168
Schon chama a este componente do pensamento prático,
reflexão-na-ação (deliberação prática, segundo Habermas). Ao
conhecimento de primeira ordem sobrepõe-se um conhecimento
de segunda ordem, isto é, um processo de diálogo com a situação
problemática e sobre uma interação particular que exige uma
intervenção concreta. O conhecimento de segunda ordenou
meta-conhecimento na ação encontra-se constrangido pelas
pressões espaciais e temporais e pelas solicitações psicológicas e
sociais do cenário em que se atua. É um processo de reflexão sem
o rigor, a sistematização e o distanciamento requeridos pela
análise racional, mas com a riqueza da captação viva e imediata
das múltiplas variáveis intervenientes e com a grandeza da
improvisação e criação. [...] Com todas as suas dificuldades e
limitações, a reflexão na ão é um processo de extraordinária
riqueza na formação do profissional prático. [...] Quando um
profissional se revela flexível e aberto ao cenário complexo de
interações da prática, a reflexão na ação é o melhor instrumento
de aprendizagem (GÓMEZ, 1997, p. 104).
O pensamento ativo é um permanente diálogo que implica na
construção de novas ideias e teorias sobre o ocorrido, na busca de
descrições adequadas a situação, procura a definição interativa entre
meios e fins e a construção e reavaliação dos próprios procedimentos
realizados (GÓMEZ, 1997). Perrenoud (2001), pontua que ser
professor profissional “é tomar essa distância que permite adaptar-se
a situações inéditas e, sobretudo, aprender a partir da experiência”
(PERRENOUD, 2001, p. 223).
169
c) A reflexão sobre a ação e sobre a reflexão na ação
A reflexão na ão e sobre a reflexão na ação, trata-se de uma
reflexão crítica, pois é uma análise que o sujeito realiza a posteriori
sobre as características e processos da sua própria ação. O sujeito
utiliza seus conhecimentos para descrever, analisar e avaliar os
vestígios deixados na memória por intervenções anteriores a essa. É
possível também nomear da seguinte forma: “reflexão sobre a
representação ou reconstrução a posteriori da ação (GÓMEZ, 1997,
p. 104).
A reflexão sobre a ação é um componente essencial de
aprendizagem permanente do profissional. A reflexão na ação supõe
um conhecimento de terceira ordem, pois analisa o conhecimento-
na-ação e a reflexão-na-ação em relação ao fato problemático e o seu
contexto. A título de exemplo, quando uma prática, pelo fator tempo,
se torna repetitiva, rotineira e o conhecimento em ação é cada vez
mais tácito, inconsciente, mecânico, o profissional repete sua ação de
forma automática, por isso, perde valiosas oportunidades de
aprendizagem pela reflexão na e sobre a ação. Pois, o seu
conhecimento prático vai se fossilizando e repetindo, tornando-se
incapaz de dialogar de forma criativa com a complexidade da situação.
Empobrece o pensamento prático e acomete erros que nem será capaz
de perceber (GÓMEZ, 1997).
A reflexão sobre a ação é uma reflexão que ocorre após a ação
profissional, através de um processo reflexivo sobre essa ação e sobre
os conhecimentos implícitos nela. É uma retomada, uma
reconstrução mental, em retrospectiva, a ação para analisá-la,
promovendo uma nova percepção dela. Essa proposta de um olhar
retrospectivo sobre a ação, possibilita que o docente perceba o que
170
ocorreu antes e durante a ação e como as respostas aos problemas
surgidos foram dadas. Por isso, Schon (1987) a denominou de
reflexão sobre a reflexão na ação. Pois, o docente constrói novas
formas de pensar, de compreender, de agir sobre seus problemas,
permitindo experienciar situações, cometer erros, tomar consciência
desses equívocos e utilizar outra forma, num novo momento. Nesse
sentido, a prática pedagógica em sala de aula é compreendida como
um espaço privilegiado de integração de saberes; de reflexão, de
experimentação, ambos são fundantes para a ação docente, porque a
partir delas, promove-se conquistas de autonomia e descobertas de
potencialidades de um saber docente, de si e como ser humano
(FEITOSA; DIAS, 2017).
Considerações Finais
A formação reflexiva configura-se como processo de
autoformação, decorrente das necessárias reflexões que lidam com as
singularidades, incertezas e conflitos do cotidiano da profissão
docente, de forma que o profissional nunca esteja plenamente
satisfeito com seu trabalho e com suas ações, ao contrário, que o
professor esteja sedento e motivado pela busca de aperfeiçoamento,
sempre (FEITOSA; DIAS, 2017).
Na tomada de consciência fica nítido que a prática não tem
alcance, por si mesma, não consegue produzir mudanças
(PIAGET,1974/1977). Ao contrário, a teoria pode proporcionar
mudanças na medida em que se apropria da prática, indicando-lhe
novos rumos (BECKER, 2012).
Segundo Pimenta (2006) a teoria pode ser compreendida
como possibilidade para a superação do praticismo, ou seja, uma via
171
crítica coletiva e ampliada para além dos contextos de aula e da
instituição escolar, considerando as esferas sociais mais amplas e
evidenciando o significado político da atividade docente.
A teoria de Paulo Freire, pautada no diálogo, na reflexão e na
ação transformadora da realidade, objetiva a construção coletiva da
consciência crítica ancorada numa práxis libertadora e revolucionária.
A pedagogia freireana se concretiza na relação teoria-prática,
inovando ao alocar o conceito de práxis, de tradição marxista, voltado
para a análise do modo de produção capitalista, relacionando-o à
educação e orientando-o à luta pela humanização, desalienação e
afirmação dos homens, contribuindo, dessa forma, para o processo de
emancipação humana, conforme Carvalho e Pio (2017).
Um professor reflexivo e pesquisador da prática, constrói
novas possibilidades e coloca-se na direção e sentido de uma atuação
docente na perspectiva emancipatória e de diminuição das
desigualdades sociais. Portanto, uma ação pedagógica reflexiva não
deve ser banalizada, se não, ela nada mais significa do que uma
tecnicização do trabalho dos professores e de sua formação.
Como apresentado na proposta de Donald Schon (2000) a
formação de professores parte do pressuposto de um profissional
reflexivo que aprende fazendo. Nesse sentido, o “professor reflexivo”
diz respeito ao profissional da educação que observa, analisa, reflete
sobre sua prática pedagógica e a avalia, com o objetivo de aperfeiçoar
continuamente sua atividade docente.
Tal conduta, pressupõe a autoformação na direção de uma
prática consciente da sua responsabilidade pedagógica e do exercício
político da profissão, ambos são elementos fundamentais para a
172
formação da cidadania, sobre o qual está assentada a contribuição
social da docência (SHIGUNOV NETO; FORTUNATO, 2017).
Nesse sentido, formar é organizar contextos de aprendizagens,
exigentes e estimulantes, ou seja, estamos falando de um ambiente
formativo que favorece o cultivo de atitudes saudáveis e o desabrochar
das capacidades de cada um com ao desenvolvimento das
competências necessárias para a vida em sociedade, isto é, nela
conviver e intervir juntamente com outros cidadãos (ALARCÃO,
2001).
Desejamos uma escola reflexiva, que funcione como um
organismo vivo, que pensa a si própria, que considere sua missão
social, sua organização, e que sua atividade se desenrole num processo
heurístico simultaneamente avaliativo e formativo.
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176
177
A Formão Ética do(a) Futuro(a) Educador(a):
Avaliação do Juízo Moral na Graduação em
Pedagogia
Matheus Estevão Ferreira da SILVA
11
Alessandra de MORAIS
12
Tânia Suely Antonelli Marcelino BRABO
13
Introdução
Neste capítulo, abordam-se resultados parciais de uma
pesquisa
14
, desenvolvida entre os anos de 2017 e 2018 (SILVA, 2018),
que teve como objetivo investigar a formação em gênero e
11
Doutorando em Educação pela Faculdade de Filosofia e Ciências (FFC), Universidade
Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” (UNESP), Campus de Marília, São Paulo, Brasil.
E-mail: matheus.estevao2@hotmail.com
12
Docente da Faculdade de Filosofia e Ciências (FFC), Universidade Estadual Paulista “Júlio
de Mesquita Filho” (UNESP), Campus de Marília, São Paulo, Brasil. E-mail:
alemorais.shimizu@gmail.com
13
Docente da Faculdade de Filosofia e Ciências (FFC), Universidade Estadual Paulista “Júlio
de Mesquita Filho” (UNESP), Campus de Marília, São Paulo, Brasil. E-mail:
tamb@terra.com.br
14
A pesquisa teve como título Educação em direitos humanos, gênero e sexualidades, e
desenvolvimento moral na formação docente: conhecimentos, concepções e condutas de
graduandos(as) em Pedagogia de uma universidade pública do estado de São Paulo, financiada
pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP) pelo processo de
n.º 2017/01381-9 e com vigência de 01/05/2017 a 31/12/2018, e realizada sob orientação
das Prof.ª Dr.ª Tânia Suely Antonelli Marcelino Brabo e Prof.ª Dr.ª Alessandra de Morais.
https://doi.org/10.36311/2024.978-65-5954-473-8.p177-202
178
sexualidades de graduandos(as) em Pedagogia e relacioná-la com sua
formação ética, do ponto de vista do desenvolvimento moral, nas
abordagens kohlberguiana e neo-kohlberguiana (KOHLBERG,
1992; REST et al., 1999).
Nessa pesquisa, abordamos os temas gênero e sexualidades
como um problema da Educação em Direitos Humanos (EDH)
(BRASIL, 2007; 2012; 2013), política pública educacional em
vigência no país desde 2006. Dentre os objetivos da EDH, constados
em seus documentos oficiais, está a superação de desigualdades sociais
afirmadas na história nacional, caracterizadas pela [...] intolerância
étnico-racial, religiosa, cultural, geracional, territorial, físico-
individual, de gênero, de orientação sexual, de nacionalidade, de opção
política, dentre outras (BRASIL, 2013, p. 21, grifos nossos).
Logo, essa proposta de educação é orientada de modo a
contemplar outras temáticas além da homônima direitos humanos,
tais como gênero e sexualidades. Com essa intersecção de temas dentro
da EDH, a educação passa, consequentemente, a atender demandas
de determinados sujeitos e grupos sociais historicamente excluídos da
condição de sujeitos de direitos, e, neste caso, daqueles grupos que
protagonizam as temáticas de gênero e sexualidades: mulheres e as
pessoas LGBTQIA+s (lésbicas, gays, bissexuais, transexuais, travestis,
transgêneros, queers, intersexuais, assexuais, etc.).
Contudo, tivemos como hipótese de que quando a EDH é
acompanhada pelos referidos dois temas, ela tem menos chance de ser
efetivada, visto que sua abordagem nas instituições de ensino depende
dos conhecimentos e das disposições que professoras(es) mantêm,
entre os(as) principais profissionais responsáveis por essa abordagem,
para com os temas e seus protagonistas.
179
Nosso interesse em investigar a formação do(a) professor(a)
erigiu da compreensão da posição privilegiada que esse(a) profissional
ocupa para a concretização da EDH nas instituições de ensino. Ou
seja, o(a) professor(a) é um dos principais atores que se colocam entre
o que prevê o campo normativo educacional então o
desenvolvimento da EDH orientada aos temas gênero e sexualidades
e a sua realização na escola. E isso adquire ainda mais relevância
quanto ao(à) profissional de Pedagogia, uma vez que a escola de
Educação Infantil e Ensino Fundamental I, níveis de ensino
encarregados à(ao) pedagoga(o), destaca-se por ser o primeiro “[...]
agente de socialização coletivo para com a diversidade fora do seio
familiar, em que a educação em direitos humanos tem início. Se desde
essa educação é prejudicada ou desvirtuada, os preceitos previstos
por essa educação, definitivamente, não se consolidarão” (SILVA;
BRABO; MORAIS, 2017, p. 1279). Todavia, sua concretização
depende tanto do conhecimento do(a) professor(a) sobre os temas
como de sua disposição para com os respectivos grupos que os
protagonizam.
Como exemplo, Castro (2016, p. 208, grifos nossos) traz o
seguinte relato sobre o posicionamento de professoras perante a
expressão da identidade de nero de um aluno de uma escola de
Educação Infantil:
Estava em uma escola de educação infantil e indo para a
sala dos professores me deparei com a seguinte cena: um
grupo de professoras fazendo comentários depreciativos em
relação a um aluno que elas diziam ser viadinho’. As
docentes [...] falavam, entre gargalhadas, que o menino
ficava igual a uma bichinha na fila de entrada e que quando
180
crescesse não escaparia de ser gay. Fiquei até com vergonha
de ouvir as palavras delas em relação ao aluno.
Se formos considerar que os(as) professores(as) vivenciarão
cotidianamente situações relacionadas a gênero e sexualidades na
escola, a ética na formação desses(as) profissionais torna-se ainda mais
necessária, visto que terão que julgar e intervir nessas situações.
Porém, temas como gênero e sexualidade culturalmente oscilam em
compreensão e sua abordagem na escola é permeada por polêmicas e
resistências, inclusive por parte dos(as) docentes. Logo, seus juízos e
ações nessas situações podem estar em consonância com a
responsabilidade social e legal de sua profissão, conforme o campo
normativo mencionado (BRASIL, 2007; 2012; 2013), ou partirem
de uma perspectiva normatizadora, meramente hedonista em relação
às suas crenças pessoais e com pouca capacidade reflexiva envolvida.
Foi em relação a essa dimensão ética do trabalho do(a) pedagogo(a)
com os temas de gênero e sexualidades na escola que a pesquisa que o
presente capítulo decorre se atentou.
Assim, nossa pesquisa buscou investigar a formação inicial em
Pedagogia no que tange aos conhecimentos teórico-conceituais que
estudantes de graduação teriam sobre os temasassumindo que suas
concepções sobre gênero e sexualidades incidiriam sobre sua futura
atuação profissional na escola e à sua disposição para com eles.
Porém, mais do que isso, ela também buscou investigar a capacidade
reflexiva que antecede a posição valorativa do(a) docente (se
favorabilidade ou contrariedade ao trabalho pedagógico que aborde
os temas), sendo que para tanto recorreu-se à investigação de sua
formação moral, seguindo as referidas abordagens kohlberguiana e
neo-kohlberguiana.
181
Os estudos baseados na teoria do psicólogo estadunidense
Lawrence Kohlberg (1927-1987) foram responsáveis, a partir da
década de 1970, pela consolidação do campo da Psicologia do
Desenvolvimento Moral. Esse autor forneceu um modelo de
desenvolvimento teórico-explicativo sobre como se o respeito às
regras ao longo da vida. Estudando a capacidade de emitir juízos
baseados na justificação de diferentes pontos de vista, Kohlberg
(1992) definiu seu modelo de desenvolvimento moral constituído por
três níveis e seis estágios, hierárquicos e ausentes de retrocesso, com dois
estágios correspondendo a cada nível: o nível pré-convencional,
caracterizado por raciocínios autocêntricos; o nível convencional, por
raciocínios sociocêntricos; e o nível pós-convencional, por raciocínios
baseados em princípios éticos universalizáveis.
Na diferenciação de ética e moral, Bataglia e Bortolanza
(2012, p. 127) esclarecem que “é possível considerarmos que,
havendo diferentes níveis de desenvolvimento moral, a ética se
relaciona a níveis mais evoluídos, uma vez que envolve a reflexão a
respeito das regras e não necessariamente o seu cumprimento”, e no
caso da teoria de Kohlberg, “os estágios pósconvencionais também
permitem que pensemos na ética como uma superação do nível das
regras para sua relativização em nome de princípios”. Assim, em
síntese, o desenvolvimento moral ocorreria em direção à capacidade
de emitir juízos e de manifestar comportamentos éticos
(pósconvencionais).
Nas referidas situações em que os(as) pedagogos(as) terão que
julgar e intervir, envolvendo gênero e sexualidades, nas quais se
depararão ao longo de sua atuação profissional, aqueles(as) que
dispõem de um raciocínio moral mais maduro, proveniente de
182
estágios mais altos de desenvolvimento moral, “serão incapazes de
sobrepor suas próprias ideologias em situações que intervirão na
individualidade do outro e estarão abertos e receptivos à saberes
díspares aos que fomentam, capazes de interpretar, considerar e
coordenar diferentes perspectivas”, enquanto aqueles(as) moralmente
tardios, “ficarão restritos a concepções unilaterais, individualistas,
grupocêntricas, baseando-se em suas próprias ideologias e interesses,
indiferentes se sejam normatizadoras ou não” (SILVA; BRABO;
MORAIS, 2017, p. 1275).
Dito de outro modo, profissionais com pouca capacidade
reflexiva, que utilizam de raciocínios pré-convencionais para basearem
sua prática, podem se mostrar contrários ao trabalho pedagógico que
aborde os temas e não os trabalhar simplesmente porque não
condizem com suas crenças pessoais. Ou também podem emitir juízos
e colocar em ação práticas que infringem os direitos humanos ou,
ainda, omitirem-se diante de situações de discriminação, gerando
efeitos negativos sobre a formação e a vida de quem educa. Da mesma
forma, podem ser favoráveis e os trabalharem por imposição externa,
partindo de um raciocínio convencional, buscando aprovação do
outro ou apenas cumprir o que está previsto legalmente pelo campo
normativo, sem reconhecer a real necessidade do desenvolvimento
desse trabalho, que é tanto a formação ética de seus(suas) alunos(as),
para o reconhecimento da dignidade daqueles que são discriminados
e da diversidade humana, quanto intelectual, para apreensão de
conhecimentos teórico-conceituais sobre os temas.
Dado o exposto, e compreendida qual foi a proposta de nossa
pesquisa, cabe ressaltar que utilizamos de diferentes instrumentos de
coleta de dados no cumprimento dos objetivos traçados: grupos
183
focais, cnica qualitativa de pesquisa; um questionário, instrumento
quantitativo, porém que foi elaborado de forma a compor perguntas
abertas e dilemas morais na proposta kohlberguiana; e o Defining
Issues Tes t 2 (DIT-2), instrumento quantitativo fechado e validado de
medida do juízo moral. Para este capítulo, diante da impossibilidade
de produzir uma discussão que abrangesse todos os resultados
alcançados com todos os instrumentos, decidimos abordar os
resultados obtidos com a aplicação do DIT-2, então aplicado para
avaliação do desenvolvimento do juízo moral dos(as) estudantes, logo,
para avaliação de sua formação ética.
Portanto, delimitada sua abrangência, neste capítulo temos
como objetivo analisar a formação ética, do ponto de vista do
desenvolvimento moral, de graduandos(as) em Pedagogia de uma
Universidade pública paulista.
Metodologia
Foram convidados(as) para participar da pesquisa 120
graduandos(as) matriculados(as) no primeiro ano (inicial) e 120
matriculados(as) no quarto ano (final) de um curso de Pedagogia de
uma Universidade pública paulista. Esse curso foi escolhido para
participação por critério de conveniência. Aceitaram compor a
amostra participante 165 sujeitos (N=165), 68,75% dos(as) 240
graduandos(as) estimados(as), cuja configuração amostral atribuiu à
investigação o desenho transversal.
O DIT-2, instrumento elaborado em 1998 por Rest e Narvaez
(1998), foi aplicado com os 165 sujeitos, cuja versão utilizada do
instrumento foi a validada e adaptada por Shimizu, Bataglia e Lepre
(2009) no Brasil.
184
O DIT-2 baseia-se na chamada abordagem neo-kohlberguiana
do desenvolvimento moral, que foi erigida por Rest et al. (1999) com
base em 25 anos de pesquisa com uma versão anterior do
instrumento, o DIT-1. Essa abordagem conserva a essência das
principais ideias da teoria de Kohlberg, mas apresenta algumas
diferenças elementares. Os autores (1999) traçam o desenvolvimento
moral a partir de esquemas de desenvolvimento ao invés de estágios: o
esquema de Interesse Pessoal, que corresponde aos estágios 2 e 3 de
Kohlberg, o de Manutenção das Normas, derivado do estágio 4 de
Kohlberg, e o s-Convencional, que engloba os estágios 5, dividido
nos subestágios 5A e 5B, e 6. Enquanto na abordagem kohlberguiana
o desenvolvimento moral ocorre abruptamente de um estágio para
outro, na abordagem neo-kohlberguiana ele se por meio de
mudanças graduais no uso e preferência por pensamentos morais mais
desenvolvidos. Assim, não se trata de enquadrar as pessoas em certo
estágio, mas de analisar o grau com que utilizam diferentes tipos de
raciocínios morais diante das situações com as quais se deparam.
O instrumento é constituído por cinco dilemas morais que
abordam problemas sociais. Para cada um desses dilemas, o(a)
respondente deve avaliar doze alternativas de respostas aos dilemas,
havendo uma escala de cinco graus de importância para a resolução,
e em seguida avaliar hierarquicamente as quatro alternativas que
considera mais importantes para a solução do dilema. Dessa forma, é
possível obter-se um escore, denominado Índice P, que representa a
percentagem de nível pós-convencional (estágios 5 e 6) utilizada para
a resolução dos dilemas apresentados. O DIT-2 permite, ainda,
visualizar os padrões de respostas que os sujeitos oferecem em cada
estágio (2, 3, 4, 5 e 6), assim como discernir, por meio do Índice N2,
185
o grau com que os itens concernentes ao esquema pós-convencional
são priorizados, à medida que tendem a rejeitar itens com
argumentações de esquemas inferiores, logo, mensura-se quanto
os(as) respondentes optam por utilizar um tipo de pensamento moral,
em detrimento de outro, na resolução dos dilemas apresentados.
Para caracterização dos sujeitos participantes, identificamos
variáveis da amostra que consideramos relevantes para a pesquisa.
Essas variáveis revelaram as seguintes informações: a amostra foi
constituída majoritariamente pelo público feminino (n=156; 94,5%);
a maior parte era de matriculados(as) no período noturno (n=105;
63,6%) e no primeiro ano do curso (n=92; 55,7%); a maioria relatou
a adesão a uma religião, vinculando-se ao Cristianismo (n=113;
85,6%), enquanto em menor número houve referência ao
Agnosticismo (n=7; 5,3%) e ao Ateísmo (n=11; 8,3%); e, por fim, a
maioria se autodeclarou branca (n=73; 54,9%) e parda (n=46;
34,6%). Ou seja, tratou-se de uma amostra composta, em sua
maioria, de mulheres brancas e de religião de base cristã.
Resultados e Discussão
Quanto ao processo de análise dos dados coletados com o
DIT-2, teve-se como base o seu manual (REST; NARVAEZ, 1998)
junto à literatura de base consultada. No tratamento estatístico dos
dados, utilizou-se a medida estatística média para comparação dos
escores obtidos entre grupos que foram discriminados segundo as
variáveis da amostra (ano de matrícula, período, religião e prática da
religião). A Tabela 1, disposta a seguir, apresenta tais resultados em
cada um dos índices do DIT-2: o Índice P, N2 score, Interesse Pessoal
e Manutenção das Normas. Também se aplicou o teste estatístico t de
186
Student, a fim de se verificar se as diferenças entre as médias eram
significantes, considerando-se p menor ou igual a 0,05. De modo
geral, foram encontradas diferenças consideráveis e que geram
preocupação sobre a formação oferecida pelo curso.
Tabela 1 – Resultados referentes aos índices do DIT-2 segundo as variáveis da
pesquisa e a medida estatística média
Variável
N. de
sujeitos
Pós-
Convencional
(Índice P)
Interesse
Pessoal
(estágios
2/3)
Manutenção
das Normas
(estágio 4)
N2
score
Ano de matrícula
Primeiro
ano
92
31,7174
29,6522
31,7609
30,3432
Quarto
ano
73
29,2603
33,5616
29,1781
27,6864
Período (primeiro ano)
Matutino
32
33,0000
26,5000
33,6875
32,1797
Noturno
60
31,0333
31,3333
30,7333
29,3637
Período (quarto ano)
Matutino
28
31,4286
32,7143
27,4286
29,3534
Noturno
45
27,9111
34,0889
30,2667
26,6491
Religião
Possui
religião
114
28,5789
32,7193
31,7544
27,7421
Não
possui
religião
18
39,3333
28,2222
25,3333
35,9233
Prática da religião
Praticante
86
27,4419
33,2791
32,2326
26,9231
Não
praticante
31
32,3871
30,7742
29,5484
30,6474
Fonte: Dados da pesquisa
187
No que concerne às diferenças entre as médias dos escores do
primeiro e quarto anos, no Índice P (s-Convencional), que
representa o quanto de esquema de nível s-convencional (estágios
5 e 6) foi utilizado para a resolução dos dilemas apresentados no
instrumento, o primeiro ano obteve em média um desempenho
melhor (M1=31,71)
15
em relação ao quarto ano (M2=29,26) que, ao
contrário do que se esperaria da passagem por uma formação de
graduação na Educação Superior, obteve desempenho inferior.
Porém, a diferença não foi estatisticamente significante no t de
Student.
Em coencia ao dado anterior, as turmas de primeiro ano
apresentaram uma média menor (M1=29,26) de adesão ao esquema
de Interesse Pessoal (estágios 2/3) que as turmas do quarto ano
(M2=33,56), o que mostrou significância estatística, com o valor de
p menor que 0,05 (t= -2,134; p<0,05). no esquema de Manutenção
das Normas (estágio 4), o primeiro ano apresentou uma média maior
(M1=31,76) que o quarto ano (M2=29,17), embora sem significância
estatística. No Índice N2, também em coerência aos dados anteriores,
ainda que sem significância, observou-se uma tendência dos(as)
graduando(as) do primeiro ano a apresentarem uma maior adesão ao
esquema s-Convencional e a rejeitarem mais os argumentos de
níveis inferiores do desenvolvimento moral (M1=30,34) do que os(as)
graduandos(as) do quarto ano (M2=27,68).
Em síntese, constatou-se que as diferenças entre as pontuações
dos(as) graduando(as) dos primeiro e quarto anos indicaram que a
15
Utilizaremos a abreviação M1 (com a letra M enquanto abreviação do termo Média”)
enquanto a abreviação M2 se referirá ao segundo grupo: ex. primeiro ano/quarto ano,
matutino/vespertino, possui religião/não possui religião, praticante/não praticante, todos,
respectivamente, grupos M1 e M2.
188
formação em Pedagogia, no curso investigado, não exerceu influência
positiva no nível de desenvolvimento moral de seu alunado e, de um
ponto de vista mais pessimista, que houve uma regressão no decorrer
do curso.
Na variável período, uma vez que o curso participante
dispunha de turmas no período matutino e período noturno,
confirmou-se haver disparidade entre as turmas e em ambos os anos,
inicial e final, do curso.
Em relação aos sujeitos participantes do primeiro ano (n=92),
no Índice P os sujeitos do período matutino demonstraram
desempenho superior (M1=33) que os sujeitos do período noturno
(M2=31,03), assim como no esquema de Manutenção das Normas
(estágio 4), com o período matutino aderindo mais (M1=33,68) do
que o período noturno (M2=30,73), embora sem haver significância.
no Interesse Pessoal, a turma do matutino teve adesão menor
(M1=26,50) do que as turmas do período noturno (M2=31,33),
havendo significância no t de Student (t= -2,2; p<0,05). Portanto, no
caso dos sujeitos do período matutino, a adesão aos esquemas de
níveis superiores aumenta ao mesmo tempo que adesão aos esquemas
de níveis inferiores diminui, enquanto com os sujeitos do período
noturno ocorre o contrário. E essa hipótese pode ser confirmada com
o Índice N2, em que o primeiro grupo apresentou escores mais altos
(M1=32,17) em relação ao segundo grupo (M2=29,36), embora sem
significância no t de Student.
Ainda segundo a mesma variável (período), mas com relação
aos sujeitos participantes do quarto ano (n=73), pelo Índice P os
sujeitos do quarto ano matriculados na turma da manhã tiveram
adesão maior (M1=31,42) ao esquema s-Convencional do que os
189
sujeitos das duas turmas da noite (M2=27,91), ao mesmo tempo que
no esquema de Interesse Pessoal (estágios 2/3) os sujeitos da turma da
manhã tiveram uma adesão menor (M1=32,71) que os sujeitos das
turmas da noite (M2=34,08). Com o Índice N2, os(as) participantes
do primeiro grupo tenderam a rejeitar os esquemas inferiores e a dar
preferência aos de níveis superiores. Dessa forma, considerando os
resultados discutidos até o momento, ressalta-se que além dos(as)
graduandos(as) do quarto ano terem um desempenho inferior que
os(as) do primeiro ano, os(as) matriculados(as) nas turmas da noite
demonstraram um desempenho inferior que aqueles(as) na turma da
manhã.
Ainda que as diferenças não foram estaticamente significantes
em nenhum dos Índices, a oposição e correspondência do Índice P e
do esquema de Interesse Pessoal, em que um escore aumenta
enquanto o outro diminui positivamente para o período matutino e
negativamente para o período noturno, assegura a fidedignidade na
assertiva de que os(as) graduandos(as) do matutino tiveram um
desempenho melhor.
Para verificar se implicações do vínculo religioso dos(as)
participantes no que se refere ao desenvolvimento do juízo moralse
eles(as) utilizam de esquemas pós-convencionais quando deparados
com dilemas morais ou sobrepõem seus interesses pessoais nas suas
decisões –, recorreu-se à variável de religiosidade.
No Índice P, os sujeitos que dispõem de adesão religiosa e,
mais especificamente, que possuem uma religião específica (n=114),
tiveram um desempenho menor (M1=28,57) que os sujeitos que não
possuem religião (M2=39,33), o restante (n=18) do total de
190
respondentes dessa questão de caracterização
16
. Ressalta-se, então, que
os sujeitos que não se vinculam a uma religião específica (ateístas, por
exemplo) tiveram um desempenho superior ao desempenho dos
sujeitos vinculados a religiões, chegando a atingir dois terços a mais
do escore dos sujeitos vinculados a uma delas.
Com relação ao Interesse Pessoal (estágios 2/3), os(as)
participantes que possuem religião tiveram um desempenho maior
(M1=32,71) que os sujeitos que não possuem religião (M2=28,22),
coerentemente com o dado anterior. Sobre isso, o Índice N2
confirmou que aqueles(as) que possuem religião tendem a rejeitar
mais os argumentos de níveis superiores e a aceitar mais os inferiores
(M1=27,74), enquanto aqueles(as) que não possuem religião
apresentam uma tendência inversa, por isso obtêm uma pontuação
maior nesse indicador (M2=35,92). Viu-se o mesmo no esquema de
Manutenção das Normas (estágio 4), em que sujeitos que possuem
religião demonstraram juízos mais legalistas (M1=31,75) do que
aqueles que não possuem religião (M2=25,32). No teste t de Student
houve significância em três dos quatro Índices/esquemas mensurados
pelo DIT-2: no Índice P (s-Convencional) (t= -3,55; p<0,01), no
esquema de Manutenção das Normas (t= 2,15; p<0,01) e no Índice
N score (t= -2,93; p<0,01).
Em vista disso, aprofundando-se na variável religião, utilizou-
se de uma outra decorrente dela, referente à frequência de prática da
religião.
16
Nas perguntas de caracterização dos sujeitos para extração das variáveis amostrais, nem
todos (N=165) preencheram a pergunta referente ao vínculo religioso, por isso considerou-
se, para essa análise, apenas escores do DIT-2 daqueles sujeitos respondentes (n=132)
divididos em duas categorias: possui religião (n=114) e não possui religião (n=18),
respectivamente.
191
Do total de sujeitos que possuem religião e que assinalaram
nas perguntas de caracterização do questionário a frequência com que
pratica sua religião (n=117)
17
, dividiu-os em dois grupos, praticante
(n=86) e não praticante (n=31). O primeiro grupo, de sujeitos
praticantes, teve um desempenho menor (M1=27,44) que o segundo
grupo (M2=32,38) na adesão ao esquema s-Convencional (Índice
P): quanto mais o sujeito pratica sua religião, demonstra maior
vinculação a ela, menor seu desempenho no uso de argumentos
superiores do desenvolvimento moral.
No esquema de Interesse Pessoal (estágios 2/3), os sujeitos
praticantes tiveram um desempenho maior (M1=33,27) que aqueles
não praticantes (M2=30,77). O mesmo ocorreu com o esquema de
Manutenção das Normas (estágio 4), em que o primeiro grupo obteve
um desempenho maior (M1=32,23) que o segundo (M2=29,54). A
partir disso, e em correspondência ao dado anterior, extrai-se o
resultado de que os sujeitos que praticam sua religião utilizam de um
maior uso do esquema de Interesse Pessoal e/ou de níveis inferiores
do desenvolvimento moral.
Também sobre isso, no Índice N2 os sujeitos praticantes
(M1=26,92) tiveram escores menores que os sujeitos não praticantes
(M2=30,64). Além disso, segundo t de Student, houve significância
no esquema s-Convencional (t= -2,04; p<0,05), ou seja, de que é
decerto inferir que os sujeitos praticantes aderem menos aos
argumentos de nível pós-convencional enquanto os sujeitos não
praticantes aderem mais veementemente a eles.
17
Além dos 114 sujeitos que possuem religião, três dos(as) participantes, que embora tenham
assinalado que não possuíam religião, optaram por assinalar que são praticantes de sua crença,
principalmente no caso dos que se vincularam ao Agnosticismo, que não é considerado uma
religião. A decisão dos(as) participantes foi respeitada.
192
Considerações Finais
A aplicação do DIT-2 teve como fundamento a investigação
da formação ética do(a) professor(a) em estado de formação inicial. A
partir de uma investigação empírica transversal, pôde-se analisar a
formação ética, do ponto de vista do desenvolvimento do juízo moral,
de graduandos(as) de um curso de Pedagogia e, assim, verificar sua
progressão ao longo do curso, bem como inferir sobre as possíveis
condições de trabalho que essa formação lhes possibilita em sua
futura atuação profissional na escola e na formação ética de seus
alunos e alunas. A análise dos dados coletados pelo DIT-2, no
entanto, relevou resultados, no mínimo, preocupantes.
A partir das variáveis ano de matrícula e período, os dados
sugeriram que o desempenho com relação ao desenvolvimento moral
mantém-se estagnado e, até mesmo, sugere certa regressão ao longo
do curso, havendo significância estatística atestada pelo t de Student.
E isso também acontece com as turmas do período matutino, que se
sobressaem em relação ao noturno, tanto no primeiro quanto no
quarto ano.
Mesmo que somente como um indicativo, trata-se de um
preocupante resultado, que infere que a formação oferecida pelo
curso não exerceu influência positiva no desenvolvimento moral de
seu alunado e, na verdade, que houve uma regressão no decorrer do
curso. Esse indicativo de retrocesso, contudo, dar-se-ia em termos de
diminuição da preferência por esquemas superiores, uma vez que o
DIT-2 não nivela os sujeitos em estágios duros de desenvolvimento
(REST; NARVAEZ, 1998) e nem, no âmbito da teoria de Kohlberg
(1992), a regressão em estágios ser possível. Encorajamos, em
investigações futuras, debruçarmo-nos sobre esse indicativo, aliando
193
técnicas qualitativas a instrumentos quantitativos, além de um
acompanhamento dos mesmos sujeitos ao logo do curso a partir de
uma investigação longitudinal e não transversal.
Assim, esse indicativo deve ser encarado como uma hipótese
erigida em nossa pesquisa, demandando mais pesquisas para verificar
se esse resultado condiz com outras realidades e ambientes
universitários de formação ou se são fruto de condicionantes próprios
da amostra e do ambiente anterior investigado.
No entanto, esse resultado endossa o que o referido quadro de
pesquisas, que também investigaram a formação ética na Educação
Superior nas abordagens kohlberguiana e neo-kohlberguiana
(MATTOS; SHIMIZU; BERVIQUE, 2008; SHIMIZU et al., 2010;
BATAGLIA; BORTOLANZA, 2012; LUCZKIEWICZ, 2015;
SANTOS; DINIZ, 2016; MORAIS et al., 2017), tem, em geral,
constatado: que os cursos de graduação “não estão proporcionando,
de forma adequada e muito menos suficiente, em termos de
conteúdo, estratégias e tipo de ambiente, o desenvolvimento moral e,
consequentemente, a formação ética de seus alunos” (LEPRE et al.,
2014, p. 132).
No caso de nossa amostra de graduandos(as) em Pedagogia,
ressalta-se que sem capacidade reflexiva suficiente, esses(es)
futuros(as) docentes não terão condições de partir de princípios éticos
no exercício de sua profissão. Docentes que aderem a esquemas
inferiores de desenvolvimento moral, se deparados com dilemas
envolvendo gênero e sexualidades ou outros temas, provavelmente
basear-se-ão no hedonismo às suas crenças pessoais ou meramente no
legalismo.
194
No que tange aos períodos, Morais et al. (2017) também
constataram diferenças no desenvolvimento moral de graduandos(as)
matriculados(as) nos períodos matutino e noturno de um curso de
Pedagogia de uma Universidade pública. As autoras ressaltam que, na
Universidade, participação menor de estudantes do período
noturno em atividades semicurriculares e extracurriculares ocorridas
ao longo do dia do que do período matutino, uma vez que que
trabalham e/ou residem em outra cidade, não havendo estratégias
institucionais que supram suas necessidades. Dessa forma, o usufruto
dessas atividades propiciaria uma formação mais sólida no período
matutino, compreendendo por sólida aquela formação em que a
consolidação de uma estrutura de desenvolvimento moral mais
elaborada (KOHLBERG, 1992), então decorrente das maiores
possibilidades de atividades de formação dispostas durante o período
diurno (MORAIS et al., 2017).
Outro resultado, igualmente preocupante, e que mostrou
significância estatística mais do que em outras variáveis, foi o vínculo
religioso dos(as) graduandos(as). Com a análise, percebeu-se que o
baixo desempenho dos(as) participantes no desenvolvimento moral
esteve fortemente relacionado com seu vínculo religioso e frequência
com que praticam sua religião, tornando possível inferir que, no caso
da amostra investigada, o vínculo e a formação religiosa podem
deslegitimar e coibir sua formação ética. Esse resultado, contudo, não
é isolado e endossa a literatura citada quando, em suas amostras,
investiga-se a relação entre desenvolvimento moral e religiosidade
(SHIMIZU et al., 2010; LEPRE et al., 2014; SANTOS; DINIZ,
2016).
195
Essa inferência da influência da religiosidade que se tira é
grave e corrobora com a análise de Rest et al. (1999), que indicam a
necessidade de se considerar a reciprocidade de influências entre o
desenvolvimento do juízo moral e a ideologia cultural. Para os autores
(1999), do mesmo modo que o juízo moral seleciona e interpreta a
ideologia cultural, esta, por sua vez, afeta seu progresso. Com base
nisso, sustentam que a Psicologia Cultural e a abordagens neo-
kohlberguianas devem se aliar, encetando, assim, diversos tipos de
estudos nesse sentido, tal como o grau de inflncia que a ideologia
cultural pode exercer sobre o juízo moral.
Segundo Duriez e Soenens (2006), vários(as) autores(as) que
procuram relacionar religiosidade e moralidade ressaltam que esses
não são aspectos independentes e têm chegado a resultados que
indicam que pessoas com afiliação religiosa demonstram preferências
pelo nível convencional do desenvolvimento moral e uma diminuição
na preferência pelo vel pós-convencional. Também ressaltam que
pessoas religiosas podem apresentar raciocínios morais limitados, por
não os basearem em princípios. Contudo, autores(as) (ERNSBER-
GER; MANASTER, 1981 apud DURIEZ; SOENENS, 2006;
SILVA; BRABO; MORAIS, 2017, p. 1276) ressaltam que o
raciocínio moral das pessoas religiosas depende de seu grau de
compromisso religioso e do estágio moral que é normativo em sua
comunidade religiosa, ou seja, “em uma comunidade em que os
ensinamentos incluem raciocínios por princípios, as pessoas
altamente religiosas tendem a apresentar uma preferência por esse tipo
de raciocínio. Ao passo que naquelas comunidades em que não a
inclusão desse tipo de ensinamento, essa preferência diminuirá”.
Logo, a superioridade teológica de argumentos morais convencionais
196
pode suplantar a superioridade lógica dos argumentos pós-
convencionais. Duriez e Soenens (2006) demonstram, no entanto,
que mais do que a inclusão e a exclusão da transcendência, ou mesmo
a afiliação religiosa, o que exerce influência no desenvolvimento moral
é a forma com que se processam os conteúdos religiosos, e salientam
que quem os fazem de modo literal e dogmático apresentam veis
morais inferiores em relação a quem emprega mecanismos simbólicos
de interpretação.
Tais resultados demonstram-se altamente consideráveis, atuais
e de extrema relevância ao contexto político e social contemporâneo,
tendo em vista a recente incursão de instituições e grupos religiosos
na conjuntura política, inclusive educacional, do país, em que temas
como nero e sexualidade têm sido suprimidos da redação de
documentos oficiais de Educação a partir dessa incuro. Esse fato se
refere à retirada dos termos gênero e orientação sexual da redação do
Plano Nacional de Educação (PNE) (BRASIL, 2014), entre 2014 e
2015, e, em tempo mais recente, à supressão dos termos gênero,
sexualidades e quaisquer outras questões que fomentem a cidadania
LGBT na redação da Base Nacional Comum Curricular (BNCC),
ambos episódios marcados por um polêmico debate e a forte presença
de grupos religiosos e setores ultraconservadores.
Segundo Furlani (2016), desse contexto emergiu a narrativa
intitulada “ideologia de nero”, muito presente durante o episódio
do PNE, que é sustentada em confusões teóricas e usos inadequados
dos estudos de gênero, elaborada por tais grupos para assustar e
desinformar a sociedade civil e de deslegitimar e ridicularizar os
estudos de gênero e pessoas que se beneficiam e se dedicam ao estudo
do tema.
197
Os resultados com o DIT-2 terem demonstrado que a
religiosidade, tanto o nculo como a prática religiosa, influencia de
modo negativo na formação ética dos(as) graduandos(as), atesta esse
fenômeno observado no âmbito das políticas blicas educacionais
ou pelo menos contribui para um diagnóstico nesse sentido –, que
questiona a qualidade da formação ética dos sujeitos envolvidos na
elaboração dessas políticas. No caso de professores(as) em estado de
formação inicial, esses(as) podem se sentir legitimados pela
conjuntura política e interromperem qualquer possibilidade de
desenvolvimento de sua capacidade reflexiva oferecida no curso e,
mais do que isso, de sua capacidade reflexiva especificamente sobre os
temas nero e sexualidades.
Como explanam Silva, Brabo e Morais (2017, p. 1268), o que
fomenta as mobilizações dos grupos que protagonizam essa incursão
nas políticas são fixações com os níveis p-convencional e
convencional, visto que pessoas que apresentam transcendência, e
principalmente afiliação religiosa, dispõem de maior preferência por
tais níveis de juízo moral, enquanto a possiblidade de se vincularem
ao nível pós-convencional diminui”. Ainda assim, os autores citados
(ERNSBERGER; MANASTER, 1981; DURIEZ; SOENENS,
2006) advertem que mesmo que essa relação cio-legal seja
encontrada predominantemente por parte de religiosos, isso se deve a
como processam os enunciados de suas creas e doutrinas e não
meramente pelo fato de disporem de transcendência ou afiliação
religiosa. Dessa forma, caso seus raciocínios se orientassem por
princípios, estariam cientes da possível normatização que sua
transcendência/religiosidade pode apresentar para com as pessoas que
não compartilham da mesma crença/doutrina, bem como cientes da
198
liberdade que essas pessoas detêm, então inseridas em uma sociedade
democrática e de direito.
Logo, elas não sobreporiam seus próprios interesses e a
contemplação de seus ideais religiosos a tais demandas sociais
democráticas, nem demonstrar-se-iam indiferentes à opressão que os
sujeitos que se beneficiariam pelas ações progressistas das políticas
públicas se submetem. Da mesma forma, docentes podem refletir esse
cenário da política e mostrarem-se incapazes de propiciar momentos
de reflexão ou agirem por princípios quando depararem com temas
que não concordam, problemática que decorre do conflito de suas
idiossincrasias com a afirmação em dispositivos legais da formação
ética comprometida com o respeito às diferenças e com a igualdade
de direitos.
Esses resultados, portanto, desvelam muitas reflexões e
demandam urgência para propostas de mudança na formação de
professores(as), considerando a dimensão ética da profissão.
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202
203
Brincadeira é Coisa Séria!
Possibilidade para se Trabalhar com a Formação
Ética do Educador
Cristiane Paiva ALVES
18
Bruna Assem SASSO DOS SANTOS
19
Fábio Luiz de Almeida BERTACINI
20
Para Início de Conversa
Tenho candor,
por bobagens.
Quando eu crescer eu vou ficar criança.
(Manoel de Barros)
O termo brincadeira nos remete a infância, a momentos de
descontração, alegria, de encontros, criatividade, leveza e muitas
18
Docente do Departamento de Fisioterapia e Terapia Ocupacional DEFITO e do
Programa de Pós-Graduação em Educação - PPGE pela Faculdade de Filosofia e Ciências
(FFC), Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” (UNESP), Campus de
Marília, São Paulo, Brasil. E-mail: paiva.alves@unesp.br
19
Doutora em Educação pela Faculdade de Filosofia e Ciências (FFC), Universidade
Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” (UNESP), Campus de Marília, São Paulo, Brasil.
E-mail:brunaasasso@gmail.com
20
Mestrando em Educação pela Faculdade de Filosofia e Ciências (FFC), Universidade
Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” (UNESP), Campus de Marília, São Paulo, Brasil.
E-mail: fabiobertacini@gmail.com
https://doi.org/10.36311/2024.978-65-5954-473-8.p203-228
204
outras características positivas e vibrantes. Características desejáveis
no ser humano? Mas para qualquer ser humano? Do nosso ponto de
vista, sim, mas do ponto de vista da maioria dos adultos, brincar é
coisa de criança e os adultos devem se ocupar é de coisa ria.
Entendemos que as regras do jogo dos adultos costumam ser assim,
mas, somos adultos brincantes e queremos oferecer aos leitores, um
outro ponto de vista, uma espécie de parada de mão para ver o mundo
de outro ângulo, olhando para o brincar na vida adulta e um pouco
mais de perto, para o educador brincante. Para isso buscaremos mais
parceiros que pensam como a gente. “Tem um alemão, notável,
Schiller que diz: O homem é inteiro quando brinca, e é somente
quando brinca que ele existe na completa acepção da palavra
homem.” (Ocupação Lydia Hortélio, 2019).
Esse é o foco que traremos ao nosso texto, a importância de
estar inteiro na vida, nas interações, nas ocupações. Não é preciso
adotar uma postura rígida e séria para se tornar o que La Taille (2009)
chama de peregrino, ou seja aquele que explora a experiência pelos
caminhos por onde passa, e ao contrário do turista que quer
usufruir dos locais de destino e ir embora, faz da sua jornada uma
construção coletiva, um mergulho na cultura do outro e em seu
território. Embora a maioria dos adultos não seja estrangeira no
território do brincar, costuma estar em um lugar bem distante do
mergulhar imersivo neste território. A proposta é que lancemos o
olhar do principiante para a experiência do brincar na fase adulta,
abrindo mão dos preconceitos que criamos com o tempo. Abrindo
espaço para a espontaneidade.
Na brincadeira espontânea, a criança é livre para exercer domínio
sobre seu próprio mundo, criando diferentes formas de
205
solucionar seus conflitos através da imaginação. O exercício da
imaginação habilita a criança a suportar mais facilmente as
frustrações que encontra na realidade, aprendendo a lidar
simbolicamente com algo que a ameaça. Quando brinca, a
criança se desafia a crescer e avançar para novas etapas.
(BERNARDI, 2016. p. 87).
A brincadeira traz uma força que nos conecta com o presente
e as diversas possibilidades de criação do que se possa imaginar:
pessoas, criaturas, realidades, etc. A criatividade e a imaginação são
essenciais para tal atividade. Para o Léxico de Pedagogia do Teatro
(Concílio, 2015, p.16), “a criatividade é frequentemente referenciada
como a capacidade de imaginação, de invenção e criação”. Brincar
pressupõe liberdade e seriedade, sim!
A atividade mais séria das crianças é brincar, mas isso deveria
servir para definir o que quer dizer sério, os adultos são sérios, a
seriedade é ficar focado, levar algo até suas últimas
consequências, que é o que as crianças fazem brincando. (TARJA
BRANCA, 2014).
Será que podemos identificar a brincadeira em nosso
cotidiano adulto? Adoramos piadas e se pensarmos um pouco,
podemos identificar que brincamos cotidianamente, usando essa que
é uma das brincadeiras mais comuns entre os adultos, a piada.
No entanto, a piada é uma elaboração posterior de uma atividade
muito mais extensa e primária do que a brincadeira. A piada é
uma espécie de brincadeira que sobreviveu ao lento recalque de
certas disposições que temos quando criança: 1. A atitude de
curiosidade diante do outro e do mundo; 2. A propensão a se
206
espantar e a admirar o mundo; 3. A inclinação a explorar usos e
sentidos não óbvios das coisas e dos outros; 4. A facilidade para
ligar-se aos outros e ensinar nossa forma de brincar. (DUNKER;
THEBAS, 2019, p. 236).
Segundo Jorge (2008), o recalque é um processo ativo que
provém da própria pessoa, a partir de suas histórias e concepções. Esse
processo tem relação com elementos que, de forma primitiva, ficaram
para trás, não esquecidos, mas, muito bem guardados pois não devem
ser lembrados considerando que podem ocasionar uma viva aversão.
Portanto, Jorge (2008, p.23), traz uma definição de recalque:
“operação pela qual o indivíduo procura repelir ou manter no
inconsciente representações ligadas a uma pulsão. Produz-se quando
a satisfação de uma pulsão em si mesma prazerosa provoca
desprazer”.
Mas o que isto tem a ver com o brincar? Tem tudo a ver.
Dunker e Thebas (2019) explicam que a brincadeira é muito mais
que uma atividade que nos proporciona momentos de diversão e
prazer, mas também uma forma de pensar e simbolizar. Saber jogar
ou brincar é muito relevante para se desenvolver na arte da escuta. E
a arte de escutar o outro começa, justamente, pela possibilidade de
escutar a si mesmo.
Para Dunker e Thebas (2019), brincar é uma das maneiras
pelas quais se transmite o saber construído no trajeto da escuta:
acolher, cuidar e encontrar o outro para, finalmente, compartilhar.
Afinal, quem inventou as brincadeiras de criança, as cantigas de roda,
as canções de ninar? Apenas o adulto que se esqueceu de forma
excessiva da infância, não se lembrará da seriedade que é o brincar.
207
Brincar é a atividade humana que mais nos conecta com a gente
mesmo e com os outros. Lembre-se de você brincando de
esconde-esconde, espremido atrás da pilastra, em conexão total
com tudo à sua volta. Na escuta de cada movimento de ar, de
cada micro ruído, com o seu corpo preparado para a corrida
heroica para tentar salvar o mundo. Lembre-se da maravilha que
era quando isso acontecia, e na desgraça quando você fracassava.
Brincar nos exercitava para o convívio. À medida que íamos
brincando, íamos também aprendendo a escutar os humores
coletivos e individuais dos grupos aos quais pertencíamos.
(DUNKER; THEBAS, 2019, p. 45).
Dunker e Thebas (2019, p.45) fazem uma analogia
interessante com uma frase conhecida de Descartes: “Brinco, logo
escuto”. A escuta é necessária no contexto da educação e o brincar é
um recurso potente para exercer e praticar a escuta. Para os autores,
escutar é reconhecer, e reconhecer é o instrumento fundamental de
transformação subjetiva e política. Quem não escuta verdadeiramente
o outro, impede que a empatia aconteça e passa a atuar como uma
espécie de polícia permanente contra a escuta.
Entretanto, sendo algo tão significativo neste cenário, o
quanto está claro para os atores do espaço educacional a relevância do
tema?
Educação: A que temos e a que queremos
Nosso sistema educacional não privilegia as interações
interpessoais. Ao contrário, organiza hierarquicamente e determina o
papel de cada um no ambiente escolar. A criança deve obedecer ao
adulto e absorver conteúdo. uma importante colocação acerca da
208
história do espaço escolar quando D'Auria, et al. (2021) colocam que
os discursos dos atores que convivem no ambiente da escola, ao se
cruzarem, acabaram por constituir e representar a história da escola
na atualidade. E o estudo da utilização deste espaço nos leva a reunir
essas representações onde ela se fabrica: na era industrial, que tinha
práticas como gestão de massa, obrigação de resultado e organização
centrada no resultado promovidas pelo modelo industrial onde
podemos perceber, inclusive, uma referência arquitetônica muito
significativa: longos corredores conduzindo a salas que se sucedem.
A escola que conhecemos hoje foi construída paralelamente ao
desenvolvimento desse modelo industrial idealizado no final do
século XIX e início do século XX. Esse modelo se impôs como
um paradigma eficaz para o progresso. Ele influenciou
largamente o campo da vida social, defendendo a produção em
série, despida de artifícios, para uma eficácia imediata (D’AURIA
et al., 2021, p.77).
Outrossim, Foucault (1985/1979) correlaciona a organização
escolar, historicamente, como uma garantia de controle por parte do
professor, que mantém a ordem e a disciplina. Ao possuir o poderio
(através de práticas de sujeição e exclusão) como elemento principal,
a instituição educacional se utiliza do controle social, principalmente
por meio de mecanismos, como a disciplina (FOUCAULT,
2014/1977). Dessa forma, as escolas se assemelham às prisões,
hospitais, exércitos e manicômios, exatamente pelo elo do poder
disciplinador (presente nos aspectos sociais, morais e éticos -por que
não?- de tais instituições), e expresso, até mesmo, em suas arquiteturas
(isto é, também no aspecto físico/estrutural), que existe neles e pre
209
neutralizar perigos, com o intuito de criar indivíduos dóceis e
eficientes.
Assim, ainda consoante a Foucault (2014/1977), os
professores, bem como os militares, psicólogos, psiquiatras e médicos,
fazem uso da disciplina como forma de controle e regulação das
habilidades. Disciplina essa que inibe, proíbe e repele a brincadeira,
quer seja para simples diversão, ou mesmo atrelada ao ensino-
aprendizado. Embora o castigo físico tenha se extinguido, sua
continuidade é verdadeira a partir de outra perspectiva, como a
psíquica, por exemplo. Vigilância, exercícios, manobras, notas, níveis
e lugares, classificações, exames, registros, toda uma forma de
submeter os corpos, de dominar as multiplicidades humanas e de
manipular as suas forças, sem espaço e/ou tempo para a ludicidade.
Por conta da construção do sistema educacional e de seus
princípios norteadores nos tempos hodiernos, nota-se que a educação
não cumpre seu papel como promotora da autonomia do aluno no
sentido intelectual e moral na maioria das escolas. Como traz
Mizukami (2007) ainda prevalecem as relações verticais, nas quais o
professor é a autoridade intelectual e moral, e o aluno é submisso. A
curiosidade, os gostos e as inseguranças dos alunos não importam. Os
professores sabem o que é melhor, o que deve ser repassado e como
deve ser feito.
Em uma tentativa de compreensão do cenário atual, podemos
levantar a hipótese de que talvez essa forma de relacionamento
(unidirecional) seja um valor de nossa cultura, ou seja, hierarquias de
saberes e cargos têm sido vistas historicamente como necessárias em
nosso país. Outra suposição é que os professores não sabem como se
comportar de maneira diferente de tal padrão. Ou ainda inferimos
210
que falta estímulo para refletir se o que estamos alcançando em nossa
educação é realmente o que queremos e se os métodos utilizados são
eficazes. As inquietações a respeito dessa forma de funcionamento
escolar, fizeram surgir o Movimento da Escola Nova, baseado nas
concepções de John Dewey (1859-1952) que refuta o empirismo
dominante e defende novos princípios de educação, e desde então,
autores vêm se debruçando sobre formas de mudar essa realidade.
Delors (2003), por exemplo, propõe que a educação do
Século 21 se apoie em 04 pilares: aprender a conhecer, aprender a
fazer, aprender a ser e aprender a conviver. Contudo, para que
possamos transitar entre eles, um aspecto relevante explanado por
Vigotski (1991) acerca da influência do ambiente sobre o sujeito que,
por sua vez, age sobre o ambiente e cria, através das mudanças
provocadas por ele, novas condições para sua existência. Barrera
(2016) em sua tese, fez uma busca dos pesquisadores da inovação
educacional e ao fazer uma análise dos conceitos propostos, cria a
seguinte definição: “Inovação na educação é um processo intencional
de mudança de uma prática educativa desenvolvida por um sujeito,
grupo ou sociedade, que incorpora um ou mais aspectos novos a esta
prática (p.24). Sendo parte fundamental desse processo de inovação
educacional a ão coletiva. Bem como traz Freire (1987), quando diz
que ninguém educa ninguém, assim como ninguém se educa a si
mesmo: as pessoas se educam em comunhão, mediadas pelo mundo.
De acordo com Piaget (1948/1975), se a educação pretende
assegurar o pleno desenvolvimento dos sujeitos (conscientes
intelectual e moralmente), e o fortalecimento dos direitos do homem
e das liberdades fundamentais, constitui um todo indissociável. Não
para formar pessoas autônomas no domínio moral se os
211
indivíduos, em contrapartida, forem submetidos a uma coação
intelectual de tal forma que tenham de se moldar a aprender por
determinação de outrem e por obrigação, ou seja, sem descobrirem
por si mesmos a verdade.
Ainda de acordo com o autor, será exatamente o que se deseja
quanto à formação dos sujeitos, que os métodos se distinguem: se o
que se quer é formar pessoas livres ou personalidades submissas ao
conformismo do enquadramento social a que pertencem, é preciso
distinguir os métodos que de fato irão favorecer a autonomia da
consciência daqueles que levarão à consequência contrária. Assim, ao
se pensar na escola, os métodos ativos, isto é, aqueles que presumem
atividades espontâneas e livres (nas quais as brincadeiras são cabíveis
e coerentes), seriam os únicos responsáveis por desenvolver o caráter
intelectual, presumindo indispensavelmente a ação de um meio
coletivo cooperativo, que, para Piaget (1948/1975) não é possível
estabelecer, de fato, uma autêntica atividade cognitiva, apoiada em
pesquisas e ações experimentais, sem o auxílio comum, não somente
entre professor e aluno, mas pelos alunos entre si, ou por meio de
técnicas que envolvem constrangimento moral e intelectual. (SASSO,
2022).
Nos moldes da escola tradicional, tanto a comunicação entre
os sujeitos bem como a colaboração entre eles, ficam totalmente fora
do trabalho desenvolvido, e por isso, não forma com êxito, quer seja
na criança, assim como no adulto, um raciocínio ativo e autônomo.
Dessa forma, se evidencia a necessidade da criação de novas
alternativas para a mudança na educação para a efetiva formação ética
de todos os atores escolares, a começar pela figura do próprio
educador.
212
Sasso (2022) disserta a respeito de como a escola deveria
presumir ser, ao se considerar práticas pedagógicas coerentes e que
dialoguem com pressupostos teóricos que garantem aos sujeitos
espaços em que os conhecimentos científicos são abordados através,
não de pura observação ou imposição verbal, mas, sobretudo, por
meio de pesquisa prática, participação efetiva, discussão e resolução
de problemas (quer seja no âmbito intelectual, moral e/ou ético).
Ressignificação da Educação
Neste sentido, em uma experiência pioneira, o Grupo de
Estudos e Pesquisas em Psicologia Moral e Educação Integral, o
GEPPEI, do qual somos integrantes, iniciou um processo de
Ressignificação da educação, em duas escolas do interior de São
Paulo. Segundo Paiva et al. (2020):
A ressignificação da educação se em um processo reflexivo,
crítico, dialógico e grupal no qual cada ator do ambiente escolar
é levado a entender-se como sujeito ativo e, dessa forma,
posicionar-se como potencial transformador de sua realidade
interna e externa, em interações com o contexto. Trata-se de um
processo aberto, inacabado e construído passo a passo, sempre
por um conjunto de pessoas guiadas por um mesmo propósito
(p. 156).
A tarefa da construção de um novo modelo educacional
prescinde, dentre outras necessidades, da mudança na formação dos
educadores, passando de uma lógica de transmissão de conhecimento,
para o exercício de reflexão sobre as práticas educacionais do ambiente
em que se insere, para que novos significados sejam atribuídos ao seu
213
cotidiano (PAIVA et al., 2020). Para estes autores, o professor passa
de professor-objeto da formação para o professor-sujeito de
autoformação que se insere em um grupo e em determinado
ambiente. Considera-se que o empoderar-se do papel fundamental na
mudança da educação, pode gerar o surgimento do sentido na
atividade profissional, assim como o desenvolvimento da autonomia
e da ética.
O processo de ressignificação da educação deve acontecer em
grupo, com grande espaço para o diálogo, para que se compreenda a
si e ao outro. Para Freire (1987, p. 54), o diálogo “deve ser entendido
como essência da educação, como prática da liberdade, como ato de
humildade do sujeito frente a outros sujeitos”. Ou seja:
Acreditamos, pois, ser a dinâmica de grupo, quando
corretamente conduzida, promotora de um processo de
transformação vivencial capaz de promover os aspectos afetivos
(amorização e delogicização). Afora isso, pretende-se, dessa
forma, fazer com que o processo educativo ganhe outra
dimensão, a começar pela não separação entre logicização
(normas), amorização (valores) e comunicação (significações)
(Paiva et al., p. 162)
Realizando os preceitos dialógicos e interacionistas, a
ressignificação da educação é composta por etapas, sendo elas:
Acolhimento e amorização; construção da utopia; assunção de
responsabilidade pelo processo e constituição de um núcleo de
ressignificação o coletivo de educadores. Para este capítulo
focaremos nas brincadeiras utilizadas no processo de ressignificação
da educação.
214
Educadores Brincantes
Considerando as ideias apresentadas, uma das ferramentas
que tem a potência de proporcionar a convergência desses conceitos
e operacionalizar uma proposta de educação que possa atribuir
significado ao processo de aprendizagem é o brincar. Wajskop (2012,
p. 35) explica que “a brincadeira é uma forma de comportamento
social, que se destaca da atividade do trabalho e do ritmo cotidiano
da vida, reconstruindo-os para compreendê-los segundo uma lógica
própria, circunscrita e organizada no tempo e no espaço.”
Ao adentrarmos os ambientes escolares, percebemos que os
educadores estavam muito acostumados com o modelo de
transmissão do conhecimento e que estavam muito pouco dispostos
a brincar para aprender sobre si e sobre os processos educacionais. A
sensação generalizada era a de desconforto e de perda de tempo. Foi
necessário que um grande esforço fosse empreendido para que os
educadores compreendessem o que Johan Huizinga discute em seu
livro intitulado “Homo Ludens - o jogo como elemento da cultura”,
quando diz que:
[...] o jogo é uma atividade ou ocupação voluntária, exercida
dentro de certos e determinados limites de espaço e tempo,
segundo regras livremente consentidas, mas absolutamente
obrigatórias, dotado de um fim em si mesmo, acompanhado de
um sentimento de tensão e de alegria e de uma consciência de
ser diferente da vida cotidiana’. (HUIZINGA, 2019, p. 35-36).
Era uma atividade muito diferente, a que se propunha, era
preciso que se fizesse uma escolha coletiva pela brincadeira/jogo, e os
educadores não são acostumados a fazerem escolhas que precisam de
215
liberdade, autonomia e espontaneidade. Os ambientes educacionais
costumam ser heterônomos, ou seja, onde regras pré-estabelecidas são
apenas cumpridas. Não espaço para a criatividade e esponta-
neidade, nem para o sentido. Era um movimento novo e arriscado.
Porém, muito importante. Era preciso coragem para ousar brincar e
aprender brincando. O documentário Tarja Branca traz alguns
depoimentos sobre a importância do brincar para adultos:
Acho que o brincar é um modo que a gente tem de organizar o
nosso mundo, criando um mundo paralelo ao mundo que a
gente vive mergulhado cotidianamente. (Antonio Nóbrega,
Tarja Branca, 2014)
E essa necessidade (do brincar) se estende no humano para além
da infância, você vai crescendo, e essa necessidade de entender o
que que você é, como você se relaciona com o outro, como você
existe dentro de um espaço, como você se apropria disso que está
ao seu alcance, isso acompanha a gente até a morte.
(ALMEIDA, R.; Tarja Branca, 2014)
A brincadeira trouxe a possibilidade de aguçar o olhar
sensível, o humor para as questões mais complicadas e a leveza
intrínseca à brincadeira. Mostrando a possibilidade de olhar
seriamente para questões importantes, e brincando. Segundo o que
diz Friedman:
O brincar traz de volta a alma da nossa criança: no ato de brincar,
o ser humano se mostra na sua essência, sem sabê-lo, de forma
inconsciente. No brincar, o ser humano imita, medita, sonha,
imagina. Seus desejos e seus medos transformam-se, naquele
segundo, em realidade. O brincar descortina um mundo possível
216
e imaginário para os brincantes. O brincar convida a ser eu
mesmo. (FRIEDMANN, 2005, p. 95 apud DRAGÃO, 2016,
p. 17).
Foi durante as brincadeiras do Processo de Ressignificação
que muitas questões profundas e complexas vieram à tona, assim
como muitas soluções e novas possibilidades para antigas questões. As
atividades lúdicas eram escolhidas para o fortalecimento de algumas
questões individuais e grupais, como a clarificação da personalidade
moral, a clarificação dos próprios valores e dos valores do grupo. Para
a realização das atividades em grupo, buscou-se a aplicação de jogos
cooperativos.
Os jogos cooperativos, conforme explica Orlick (1989 apud
Correia, 2015), são atividades relacionadas à aceitação, envolvimento
e diversão, baseadas na cooperação. Possuem como objetivo a
mudança de características como a exclusão, seletividade,
agressividade e exacerbação da competitividade, extremamente
presentes na sociedade e nos jogos tradicionais. “O objetivo
primordial dos jogos cooperativos é criar oportunidades para o
aprendizado cooperativo e a interação cooperativa prazerosa”
(ORLICK, 1989, p.123 apud CORREIA, 2015, p. 40).
Spolin (2010) realizou pesquisas entre 1960 e 1970 de teatro
improvisacional comprometida com o desenvolvimento de um
método de educação para o teatro a partir de práticas vivenciais de
jogos teatrais. Defende que qualquer jogo que seja digno de ser
jogado é altamente social e propõe intrinsecamente um problema a
ser solucionado. Objetivo com o qual cada indivíduo deve se
envolver, em comum acordo com o grupo sobre as regras do jogo e a
217
interação em direção ao objetivo, conjunto, para que o jogo possa
acontecer.
O jogo é uma forma natural de grupo que propicia o
envolvimento e a liberdade pessoal necessários para a experiência.
Os jogos desenvolvem as técnicas e habilidades pessoais
necessárias para o jogo em si, através do próprio ato de jogar. As
habilidades são desenvolvidas no próprio momento em que a
pessoa está jogando, divertindo-se ao máximo e recebendo toda
a estimulação que o jogo tem para oferecer - é este o exato
momento em que ela está verdadeiramente aberta para recebê-
las. (SPOLIN, 2010, p. 4).
Se trata de uma proposta de jogo onde não um vencedor e
a principal regra é a cooperação. Mas, será que os educadores sabem
brincar? E cooperar, eles sabem? O que nos importa é que podem
sempre aprender.
Possibilidade de Trabalho com a Formação Ética Por Meio da
Brincadeira “Escravos de
Traremos a experiência vivenciada no Processo de
Ressignificação. Chegamos à escola e estavam quase cinquenta
educadores. Fizemos uma atividade de aquecimento, na qual todos
circulavam pelo pátio ao som de músicas animadas e ao se
encontrarem (quando eram instruídos) diziam alegremente: “ahhh,
você aqui! Não acredito!”. Essa interação inicial foi dissolvendo o
aborrecimento, a indisponibilidade para o encontro e fomos
observando os sorrisos surgindo, as risadas, a leveza que a brincadeira
proporciona.
218
Naquele ambiente, eram comuns as dificuldades do trabalho
em grupo, assim como em muitos outros. Pois estar com o outro,
principalmente, na execução de tarefas comuns é mesmo desafiador.
Cada pessoa tem sua forma de ser, de se colocar e o respeito ao que é
diferente deve ser uma atividade constante nas interações
interpessoais.
Fizemos, então, a proposta de amassarmos folhas de papel
para criarmos uma bolinha. Em seguida, dividimos o grupo em dois
menores e passamos as seguintes coordenadas:
Sentem-se em roda, cada um com a sua bolinha;
E comecem a passar as bolinhas para a próxima pessoa da
seguinte forma:
Escravos de Jó, jogavam caxan - passando a bolinha sem
parar;
Tira - levanta a bolinha, sem passar;
Põe - deixa a bolinha no chão, à frente;
Deixa ficar - faz o gesto de espera com a mão espalmada e
balançando-a para cima e para baixo.
Guerreiros com guerreiros - passando a bolinha sem parar;
Fazem zig, zig, za - segurando a bolinha e a movimentando
em direção à próxima pessoa no “zig, zig” e passando a bolinha
no za (se repete duas vezes).
A segunda rodada se daria sem música, apenas com o
murmurar do ritmo da música e a terceira rodada se daria em silêncio,
apenas com os movimentos.
Antes de iniciarem, começamos a criar as regras a respeito do
que ocorreria em caso de erros. Nossa sugestão foi a de permitirmos
3 erros para as 3 rodadas. Os educadores acharam muito, queriam
219
menos chances de erros, o grupo concordou com dois erros para a
execução das três tarefas. Nota-se que houve uma rigidez na escolha
da regra, visto que não havíamos estabelecido qualquer limite,
anteriormente.
Em seguida, os grupos se organizaram para sentarem-se em
roda. Em um dos grupos, algumas pessoas relataram dificuldade em
se sentar no chão, os integrantes nos perguntaram se poderiam fazer
a atividade em uma mesa. Informamos que cumprindo a tarefa,
poderiam adaptá-la como desejassem.
Neste ponto, cabe uma reflexão sobre a dificuldade de
autonomia nas escolhas. Não é costume tomar decisões, os
educadores esperavam uma condução da equipe de forma
hierarquizada, mas, era exatamente essa a primeira questão que
pretendíamos ressignificar. Acreditamos que uma formação para a
autonomia precisa de relações horizontalizadas, da participação de
todos de forma equânime e que a brincadeira nos oferecia
elementos importantes sobre as dinâmicas inter-relacionais dos
educadores.
Os grupos começaram a treinar o jogo e observamos alguns
comportamentos parecidos entre eles. Uma das pessoas começou a
atuar como líder, daqueles dos modelos de infância, de autoridade,
falando alto e pedindo silêncio. O grupo consentiu e o líder começou
a organizar o jogo e começaram as tentativas.
Em uma das rodas, foi possível observar que um dos
participantes se auto declarou incapaz, e a partir desse momento, um
colega que estava ao seu lado passou a conduzir o jogo, dizendo em
alto e bom som o que o colega deveria fazer, quais movimentos
deveria executar e chegou a segurar no braço deste colega para fazê-lo
220
acertar. Em um dado momento, as bolinhas se amontoaram, era um
sinal de que algum erro teria sido cometido.
Nesse momento, todos apontaram o dedo para o colega que
se auto declarou incapaz. A questão é que observando de fora, não
havia sido culpa dele! Outras bolinhas se embolaram e a reação grupal
era a mesma: culpavam a mesma pessoa que não se defendia.
Chegaram a arremessar as bolinhas nessa pessoa. De “brincadeira”
puniram a pessoa que fez a tarefa não se completar.
Tivemos a apresentação dos dois grupos separados e depois
nos unimos para que fizessem a tarefa em um grande grupo e
entendessem que não havia competição entre eles, pois pela cultura,
eles estavam acreditando que havia uma competição. Após a
finalização, sentamos em roda, pois é dessa forma que todos se
encontram na mesma distância do centro e podemos enxergar e ouvir
uns aos outros.
Acontece que quando iniciamos a roda de reflexão sobre a
atividade, uma pessoa começou a falar na vez da outra e criamos o
bastão da fala, desta forma, cada um falaria quando estivesse com
o bastão em mãos. Esse fato os fez refletir sobre a dificuldade de escuta
ativa do colega e da importância de falar e ouvir para a construção de
um ambiente cooperativo e democrático. Ainda sobre esse tema,
resgatamos o papel dos líderes do grupo, questionamos se
combinaram quem seria o líder, ou se a pessoa se encarregou do papel
sem consultar os demais integrantes, mais de 25 pessoas. Os líderes se
identificaram e acharam natural a iniciativa, no entanto, outras
pessoas se disseram incomodadas, porém não se manifestaram no
momento. Discutimos sobre a importância dos combinados coletivos
221
para que todos se sentissem contemplados em suas necessidades nas
tarefas em grupo e para que houvesse mais fluidez.
Depois abordamos a questão da autodenominação de
incapacidade de um dos participantes. O colega que o ajudou
acreditava que estava fazendo um favor ao grupo e a ele quando emitia
as coordenadas, mas o colega que recebia a ajuda relatou sentir-se
incomodado e disse que a atitude do colega o atrapalhou muito.
Conversamos sobre a intenção do colega que ajudava e sobre como
nem sempre nossas atitudes tem o efeito desejado no outro,
principalmente quando não tomamos a perspectiva do outro a partir
do diálogo e dos combinados. Outra questão levantada sobre a
situação de ter um membro no grupo estigmatizado como incapaz,
foi a responsabilização injusta quanto aos erros cometidos.
O grupo admitiu que sempre atribuía a culpa dos erros, sem
se atentar aos fatos, a quem realmente estava errando e também a
questão de quem errou, não se pronunciar, deixando com que a
pessoa ficasse cada vez mais estigmatizada. Ampliamos a discussão
para a estigmatização de alunos com dificuldades, e o quanto era
difícil para essas crianças, se livrarem do rótulo, pois, depois de
estabelecida a dinâmica, se dificultavam as mudanças.
A brincadeira rendeu muitas risadas, interações e alegria ao
grupo, e reafirmou a veracidade da frase Brincar é coisa ria!
quando demonstrou o potencial de gerar reflexões tão profundas e
que refletiram na autorreflexão e na visão ampliada das dinâmicas
inter-relacionais operantes no grupo.
Considerações Finais
222
Ao se conjecturar trabalhar com a formação ética de
educadores, se que podemos planejar uma palestra, na qual falar-se-
à por horas, e horas, e horas a fio, até os ouvintes se cansarem,
retornarem para suas escolas/salas de aula, e não modificarem em nada
a sua prática ou postura diante das mais diversas circunstâncias?
Acreditamos que não. Como também ressaltamos que, para
se alcançar os objetivos almejados, especificamente quanto à formação
ética do educador, não é preciso atividades complexas, inéditas ou
distantes da realidade dos participantes. Justamente por não se tratar
do conteúdo em si, mas da forma de proceder com ele. O clima
desenvolvido nas formações, a postura dos agentes educadores frente
ao assunto (conhecimento), na missão de provocar desequilíbrios e
proporcionar tomadas de consciência necessárias ao progresso das
conceituações dos participantes, é que realmente importa.
É sobre olhar para o conteúdo a ser trabalhado, e não o tornar
disciplinador, engessado, ou tratado somente de forma transmissiva.
Entender que uma proposta formativa requer sim conhecimento e
domínio do assunto, porém exige tanto quanto paciência e respeito,
sem contar com a sorte ou com o espontaneísmo (no sentido de
esperar que os sujeitos cheguem às suas conclusões dependendo
apenas da questão do tempo, como se esse fosse necessário somente
para amadurecer ou possibilitar insights aos envolvidos, ou alcançadas
por simples associação ou transposição de informações fornecidas
pelo meio).
Para serem efetivas, as formações, quer seja em suas
modalidades iniciais ou continuadas, não podem despejar sobre os
educadores o múnus da aprendizagem dos integrantes. É
imprescindível a tomada de consciência por parte destes acerca do
223
tema abordado (a ética, a saber), num ambiente livre, acolhedor,
respeitador, responsável, e democrático - no qual todos m vez de
voz e de escuta.
É indubitável a necessidade da escola exercer o seu papel num
sentido muito mais de comunidade de trabalho, em que o trabalho
individual se alterna com o em grupo (ou coletivo), motivada pela
participação, cooperação e pelo respeito mútuo dos envolvidos, além
da ão da criticidade, que nada mais é do que a reciprocidade
intelectual e a cooperação racional e moral, as quais são o que
exatamente conduzirão os atores educacionais à objetividade e à
necessidade de demonstração (SASSO, 2022).
Igualmente, os educadores são e precisam desempenhar a
função de protagonistas dos seus trabalhos, criando e oferecendo
condições que potencializam a aprendizagem e o desenvolvimento
integral (não somente cognitivo, mas afetivo, social, físico e ético) de
si e de outrem. Desprendem-se da angústia pelo controle completo e
absoluto das expressões, suscitando o debate e a possibilidade de seus
aprendizes realizarem escolhas, falando, escrevendo, em silêncio
espontaneamente (aqui compreendido como livre de artificialismo,
natural enquanto sem elementos ensaiados, ou simplesmente como
verdadeiro, sem ser constrangido)E, quiçá, brincando! Tomara.
Destarte, o presente capítulo teve como finalidade demonstrar
o potencial dos jogos e das brincadeiras para a formação ética do
educador, visto que em um único momento de jogo cooperativo foi
possível empreender de forma leve e também séria, o olhar para
questões de fundamental importância para a construção de relações
mais saudáveis e cooperativas no ambiente escolar. Podemos perceber
que educadores também aprendem e que ainda por cima, aprendem
224
brincando! Demonstrando que a temática da ética pode ser abordada
em propostas de formações iniciais ou continuadas, de maneira
coerente, intencional e descontraída.
225
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228
229
Formação de Professores na Área da Saúde:
Competência Moral e Empatia
Fernanda Moerbeck Cardoso MAZZETTO
21
Patrícia Unger Raphael BATAGLIA
22
Cristiane Paiva ALVES
23
Juliana Gonçalves HERCULIAN
24
Introdução
O objetivo deste capítulo é fazer uma reflexão sobre a
importância da formação dos professores da área da saúde,
enfermeiros e médicos, a partir das modificações que ocorreram nas
21
Pós-Doutoranda em Educação pela Faculdade de Filosofia e Ciências (FFC), Universidade
Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” (UNESP), Campus de Marília, São Paulo, Brasil
e docente da FAMEMA (Faculdade de Medicina de Marília/SP). E-mail:
fernandamazzetto4@gmail.com
22
Professora Associada do Departamento de Educação e Desenvolvimento Humano e do
Programa de Pós-graduação em Educação pela Faculdade de Filosofia e Ciências (FFC),
Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” (UNESP), Campus de Marília,
São Paulo, Brasil. E-mail: patricia.bataglia@unesp.br
23
Docente pela Faculdade de Filosofia e Ciências (FFC), Universidade Estadual Paulista
“Júlio de Mesquita Filho” (UNESP), Campus de Marília, São Paulo, Brasil. E-mail:
paiva.alves@unesp.br
24
Doutoranda em Educação pela Faculdade de Filosofia e Ciências (FFC), Universidade
Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” (UNESP), Campus de Marília, São Paulo, Brasil
e docente da FEMA (Faculdade de Medicina de Assis/SP). E-mail:
julianaherculian@yahoo.com.br
https://doi.org/10.36311/2024.978-65-5954-473-8.p229-252
230
diretrizes curriculares e políticas públicas com enfoque na
competência moral e empatia.
Um momento reconhecido na política educacional brasileira
é a publicação das Diretrizes Curriculares Nacionais (DCN), as quais
flexibilizam as organizações curriculares, possibilitando a construção
de projetos político-pedagógicos (PPP) mais apropriados com o
pensamento do momento atual (BRASIL, 2001).
As mudanças que ocorreram no perfil demográfico e
epidemiológico da população brasileira, o desenvolvimento tecno-
científico, a evolução dos modelos tecno-assistenciais, a revisão do
processo de trabalho e os novos projetos pedagógicos tem
demonstrado a necessidade de adequações nos cursos de formação dos
profissionais de saúde (MARINS, 2011).
Neste contexto, tanto as diretrizes gerais do SUS quanto as
diretrizes curriculares dos cursos de graduação na área da saúde
apontam para uma organização de serviços de saúde e capacitação de
profissionais para atuarem de forma humanista, com postura ética,
reflexiva e competência técnica pertinente a atender aos principais
problemas de saúde da população (MARINS, 2011).
A Associação Brasileira de Educação dica (Abem) e a
Sociedade Brasileira de Medicina de Família e Comunidade
(SBMFC) vem empreendendo esforços conjuntos de produção
técnica e pedagógica para apoiar as escolas no processo de mudança,
com base nas DCN e centrando no ensino da Atenção Primária à
Saúde (APS) na graduação em Medicina de apoiar as escolas médicas,
de forma objetiva e prática, na elaboração de seus projetos
pedagógicos no contexto da APS (GUSSO et al., 2009).
231
Segundo os mesmos autores, considera-se que os núcleos do
saber e do agir médico se encontram no aprendizado da clínica e
semiológico. Por isso, destaca-se a obrigação de que o ensino na APS
esteja presente longitudinalmente ao longo do curso, de preferência
com inserções significativas (aprendizado real e a partir do trabalho),
mas que, sobretudo, deva fazer parte do núcleo do ensino da
semiologia e da prática clínica do futuro médico.
O documento DCN, deve estar em constante processo de
atualização e revisão, e visa sobretudo desencadear as discussões sobre
o tema. Trata-se de diretrizes construídas com a intenção de apoiar as
escolas médicas, de forma objetiva e prática, na elaboração de seus
projetos pedagógicos no contexto da APS.
Segundo BRASIL (2001), com o aumento das críticas ao
modelo de educação médica até então vivenciado no País, foram
criadas em 2001 as primeiras Diretrizes Curriculares Nacionais para
o Curso de Medicina, documento que deveria direcionar, a partir de
então, a composição curricular das escolas de medicina. Essas di-
retrizes propunham habilidades comuns a todos os cursos da área de
saúde e habilidades específicas para a graduação em Medicina,
traduzindo uma mudança no ensino em saúde. Apesar disso, as DCN
de 2001 não satisfaziam quanto às modificações ocorridas no SUS,
porque, ainda que preconizassem a interdisciplinaridade a uma visão
integral no cuidado da pessoa, percebia-se a formação de médicos
pouco habilidosos na prática clínica e pouco envolvidos com a visão
histórico-social e humanística dos seus pacientes ( COSTA et al.,
2014; SILVEIRA et al., 2015; GOMES et al., 2010).
Então, em 2014 foram publicadas as novas DCN para o curso
de Medicina. O atual documento, apresenta recomendações às quais
232
as instituições superiores devem se adaptar. Nele, aspectos
socioculturais, humanísticos e biológicos do ser são considerados de
forma interdisciplinar e multiprofissional ao longo dos anos de curso.
As diretivas propostas ressaltam a necessidade em formar médicos
generalistas ativos na abordagem ao paciente da atenção básica e da
urgência/emergência e que sejam decisivos na promoção, proteção e
redução dos riscos em saúde. E também, o documento prevê a
formação de um profissional com habilidades gerais, crítico, reflexivo
e ético, preparado para atuar em todos os níveis de atenção em saúde
e que seja capaz de praticar ações de promoção, prevenção e re-
abilitação em saúde, referindo o direito do paciente à cidadania e à
dignidade (BRASIL, 2014).
Tais Diretrizes visam a necessidade de outros processos
institucionais e políticos nas áreas de educação e saúde para a sua
efetivação. Pratica-se a necessidade de uma agenda junto aos
Ministérios da Saúde e da Educação, como também junto às IES, para
que sejam conversadas estratégias de ampliação e renovação do
quadro de docentes no Ensino Superior, assim como de qualificação
dos serviços e equipamentos de APS, apresentados em contratos claros
dos objetos de gestão e ensino, contribuindo para a melhora das
condições da graduação em Medicina no Brasil ( GUSSO et al.,
2009).
A humanização tem sido objeto de estudos e discussões como
uma das temáticas fundamentais na área da saúde, na formação do
trabalhador de saúde, como uma política integrante do Sistema Único
de Saúde (SUS) para realizar o cuidado integral, a promoção da saúde
e a valorização das dimensões subjetivas, além de serem incluídas no
processo saúde-doença-cuidado (CASATE ; CORREA, 2012).
233
A Política Nacional de Humanização (PNH), que surgiu em
2003 pelo Ministério da Saúde (MS), conceitua a humanização
relacionada ao direito à saúde distanciando-se do significado de
caridade e de filantropia. Contudo, estudos direcionados à
compreensão da humanização com base em professores, estudantes,
enfermeiros e técnicos de enfermagem evidenciaram que os sentidos
e imagens a ele atribuídos ainda abrangem atributos morais e
caritativos, afastando do caráter político, social e econômico que
envolve o cuidado à saúde, o que revela a necessidade de investigações
nas atividades de ensino-aprendizagem representativas de
humanização, com o propósito de se obter justificativas sobre os
motivos por que a sua extensão política não se mostra tão clara para
os estudantes de graduação em enfermagem (FREITAS, FERREIRA,
2013).
A Enfermagem tem como objeto de ciência e prática o
cuidado; contudo, o tema da humanização permeia os debates que
são apreciados na área, sobretudo na formação profissional. O campo
da formação deve propiciar discussão sobre as políticas e os conceitos
que afirmam com ênfase na responsabilidade social da enfermagem
(DE KONINC, 2013).
As diretrizes Curriculares Nacionais (DCN) direcionam o
ensino de Graduação em Enfermagem no Brasil, que definem os
princípios, os fundamentos, as condições, as competências e as
habilidades a serem desenvolvidas no decorrer da formação do
enfermeiro, tais como assistir de maneira integral e individualizada,
suprir às necessidades do indivíduo, da família e/ou da comunidade;
gerenciar o processo de trabalho de forma competente; e coordenar o
processo de cuidar (ROSA et al., 2015).
234
A implantação e o desenvolvimento do SUS, introduziu um
novo desafio à formação nas profissões da saúde no Brasil que é a
formação de profissionais, de forma coerente com seus pressupostos
ético-políticos e que respondam à complexidade dos problemas de
saúde, bem como forneçam uma atenção com qualidade e segurança
aos seus usuários. Essas necessidades de saúde têm requerido outra
organização do trabalho em saúde (COSTA, 2016).
Nesse mesmo contexto, é importante reconhecer que as
transformações no sistema educacional e de saúde precisam ocorrer
de maneira interdependente e articulada (FRENK et al., 2010). Em
meio a essas mudanças requisitadas, cabe destacar aquelas voltadas a
atingir um melhor entrosamento da equipe de saúde, destacando-se a
necessidade de promover a aproximação de futuros profissionais
desde a sua formação como uma estratégia para alcançar uma prática
interprofissional na equipe de saúde; melhor dizendo, uma prática de
atenção à saúde na qual profissionais de diferentes áreas prestam
serviços de modo colaborativo, orientados pela integralidade,
envolvendo usuários, familiares e comunidades (WHO, 2010).
Muitas mudanças sociais, éticas, econômicas e políticas vêm
sendo consideradas em âmbito mundial, e isso, de forma perspicaz,
tem atingido os sistemas de saúde. Criou-se, então, um enorme
desafio na condução destes, tanto para os envolvidos com o
planejamento e a atenção em saúde, como para os órgãos formadores
de recursos humanos para o setor da saúde (PIANCASTELLI, 2001).
O acesso à saúde de qualidade não é um direito real da maioria
dos brasileiros e este acesso não depende somente de uma mudança
das condições de vida, mas também de transformações no modelo de
atenção à saúde afim de se assumir uma concepção ampla da mesma,
235
cercada de preceitos éticos e morais que transformem a qualidade dos
serviços de saúde (FEUERWERKER, 2000).
A medida em que o mundo passa por mudanças no campo
educacional e do trabalho, influenciadas pelo contexto político,
econômico e social atuais, se fazem necessárias, adaptações e
atualizações na formação do profissional da saúde (FROTA, 2019).
a necessidade no Brasil, de se manter conversas com as
Diretrizes Curriculares Nacionais (DCN), na perspectiva de transpor
o paradigma centrado no modelo biomédico, padrão que modelou as
grades curriculares dos cursos da saúde por décadas (CARNEIRO;
PORTO, 2014). Para melhor planejamento da formação desse
profissional de saúde, as instituições de ensino superior, elaboram os
Projetos Pedagógicos dos Cursos (PPC) dos cursos de Medicina e
Enfermagem, que visam transpor matrizes curriculares direcionadas
em temas que priorizam aspectos biológicos e práticas medicalizantes,
mesmo que estas ainda se apresentem culturalmente como as mais
valorizadas pelos estudantes (LUCENA, PASKULIN, SOUZA,
GUTIÉRREZ, 2006.) É sabido que estudantes recém ingressos no
curso de graduação em enfermagem e medicina, preferem desenvolver
atividades relacionadas a procedimentos, conhecer a fisiopatologia e
tratamento das patologias ao invés de se voltarem às atividades
educativas que incentivem o contato com pessoas e a realização de
ações de escuta (LUCENA, PASKULIN, SOUZA, GUTIÉRREZ,
2006).
Neste contexto, percebemos a necessidade de propor
transformações que visem a alterar as representações da profissão de
enfermagem e medicina, sem desprezar o aspecto biológico da
formação. As instituições de ensino superior procuram oferecer à
236
sociedade a formação de um profissional com competências,
habilidades e atitudes éticas que respondam às demandas dos serviços
de saúde (WINTERS, PRADO, HEIDEMANN, 2016). O desafio é
encontrar o ponto de equilíbrio, propiciando a transformação destes
referenciais na prática profissional (LUCENA, PASKULIN,
SOUZA, GUTIÉRREZ, 2006).
Modelos que consideram a singularidade da pessoa e os afetos
das relações, exigem uma formação profissional apropriada. A Lei de
Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), define como alguns
dos objetivos da educação superior, estimular o desenvolvimento do
pensamento reflexivo e do entendimento do homem e do meio em
que vive, fato que demostra uma base social ampla, com interseções
entre saúde e educação visando à formação acadêmica voltada às
necessidades da sociedade (BRASIL, 1996).
Ademais, observamos a necessidade de conceber novas formas
de ensinar que transcendam as metodologias de ensino-aprendizagem
tradicionais, ainda amplamente utilizadas na formação do profissional
de saúde. Estas, a despeito de muito tempo, serem avaliadas por
estudiosos da educação como Paulo Freire, são compreendidas como
transferência de conhecimentos pelo docente ao discente, a
supervalorização da formação técnica e a dissociação entre o
conhecimento teórico recebido passivamente pelo discente e o
contexto social em que está inserido (FREIRE, 1987).
Além disso, para atualizar a forma de ensinar é necessário
reconsiderar a forma de atitude do profissional de saúde. A Política
Nacional de Humanização (PNH), criada em 2003 vem reconstruir
o cuidado a pessoa, apresentando o conceito de clínica ampliada, uma
ferramenta teórica e prática que busca contribuir para uma
237
abordagem clínica do adoecimento e do sofrimento, valorizando a
singularidade do sujeito e a complexidade do processo saúde/doença,
empregando recursos que permitam enriquecimento dos
diagnósticos, destacando entre eles, a percepção dos afetos surgidos
na relação entre profissional de saúde e a pessoa (TAKAKI;
SANT’ANA, 2004).
O modelo acompanhado até então, segundo o qual o
profissional era o dono do conhecimento e que se concentrava na
doença, no tratamento, fornecimento de medicações e solicitação de
exames, passa a ser ineficaz para responder as demandas complexas
das particularidades de cada paciente. Com o atual modelo a ser
seguido pela PNH, busca-se a valorização dos sujeitos e o
estabelecimento de vínculo entre estes (BRASIL, 2007). Alguns
estudos corroboram que profissionais empáticos, são mais capazes de
utilizar a comunicação verbal e não verbal para transmitir
entendimento ao cliente, enquanto aqueles com níveis mais baixos de
empatia possuem deficiência na interpretação dos sentimentos do
cliente, prejudicando a qualidade do cuidado prestado (LEONARD,
ZOMORODI, FOSTER, 2018).
Perante a inevitável necessidade de mudanças na formação do
profissional de saúde, na expectativa de contribuir para o alcance de
futuros profissionais críticos e comprometidos com a humanização da
assistência, destaca-se a empatia enquanto habilidade principal do
cuidar, constitui-se um componente fundamental do tratamento
dispensado por este profissional (MANSFIELD, 1973). Pensar em
humanização é pensar na valorização da pessoa, família e
comunidade, do trabalhador e gestor no processo de produção de
saúde. Valorizar os sujeitos é oportunizar uma maior autonomia, a
238
ampliação da sua capacidade de transformar a realidade em que
vivem, por meio da responsabilidade compartilhada, da formação de
vínculos solidários, da participação coletiva nos processos de gestão e
de produção de saúde (TAKAKI, SANT’ANA, 2004).
A humanização pode ser pensada como um princípio do
cuidado, que tem por fim organizar as ações dos profissionais da saúde
e construir valores humanos capacitados para readquirir a dignidade
das pessoas que estão sendo assistidas. Na perspectiva da ética, a
humanização compara à reflexão crítica que cada um de s,
profissionais da saúde, tem o dever de realizar, afrontando os
princípios institucionais com os próprios valores. A ética pode ser um
essencial dispositivo no que se refere à humanização, pois, por meio
de seus fundamentos, é possível entender o que se considera bom e
justo na sociedade, e o que representa o certo e o errado nas formas
de cuidar (AVILA et al., 2018)
Para praticar o cuidar de maneira humanizada, não basta
equipar-se de tecnologia durante a graduação, é preciso construir-se e
desconstruir-se constantemente. Nessa conjuntura, torna-se
necessário que o docente seja capaz de reforçar no estudante valores
morais que contribuam para reflexão, conscientização e
(des)construção do modo de ver/pensar do estudante no que se refere
ao respeito aos direitos humanos (RIOS, 2009). A recomendação do
Ministério da Saúde por meio da Política Nacional de Humanização
(PNH), também conhecida como HumanizaSUS, comprova que a
humanização não se refere a atitudes de benevolência ou bondade,
mas representa o respeito aos direitos das pessoas e o respeito aos
aspectos éticos (BRASIL, 2004).
239
Para esse fim, “devemos ter cuidado para não banalizar o que
a proposição de uma Política de Humanização traz ao campo da
saúde”, pois “as iniciativas se apresentam, em geral, de modo vago e
associadas a atitudes humanitárias, de caráter filantrópico, voluntárias
e reveladoras de bondade, um ‘favor’, portanto, e não um direito à
saúde”(BRASIL,2004). Compreende-se que humanizar é mais do que
ser bondoso, no entanto se necessita somar o respeito aos direitos
humanos, propostos na PNH, aos valores humanos e morais a fim de
que se realize um cuidado humanizado, pois “na vertente moral, a
humanização pode evocar valores humanitários, como respeito,
solidariedade, compaixão, empatia”(RIOS, 2009).
Em vista disso, torna-se fundamental que, desde a formação
acadêmica, o estudante seja estimulado a se fortalecer moralmente,
por meio de aulas teóricas, teórico-práticas e práticas em que o
estudante seja imerso frente à realidade profissional e, assim, possa
constatar que grande parte das decisões da prática de trabalho da
enfermagem tem implicações morais. O estudante necessita de
preparação para resolver conflitos de maneira ética, reconhecendo o
que é certo e o que é errado, para oferecer o mais alto nível de
beneficiamento ao paciente, unindo qualidade em assistência e
humanização, bem como tendo competência ética (SOLUM et al.,
2012; ROSSER, MOONEY, JASPER, 2015).
Não é bastante o conhecimento do que necessita ser feito
tecnicamente, se as posturas dos estudantes forem insensíveis. É
conveniente, pois, envolver-se com o cuidado, porque, ao cuidar, o
estudante (futuro profissional da saúde) imprime suas “marcas
pessoais nas suas ações, e essas expressam valores e sentimentos” que
o conduzem a prestar uma assistência humanizadora. É importante
240
que os estudantes se viabilizem a um senso de dever, com
responsabilidade e compromisso; a mergulhar em um processo de
(des)construção para alcançar o fazer ético. Com esse fim, é
fundamental confrontar valores morais e princípios éticos com a
finalidade de estabelecer sua maneira de ser responsável moralmente
(SILVA, CHERNICHARO, FERREIRA, 2011).
Alguns autores referem sobre às contribuições da educação
ética para a competência moral dos estudantes de enfermagem, e
evidenciam que a educação moral e ética deve estar fundamentada na
prática clínica do cenário real. Desta forma, a construção moral na
formação acadêmica pode surgir por meio da oportunidade de
articular os saberes técnicos às competências morais para que essas se
revertam em humanização do cuidado. Essa investigação pode ser
construída articulando-se teoria e prática por meio da discussão de
conjunturas das temáticas em sala de aula, procurando reproduzir
vivências para que o estudante possa colocar-se em situações de
tomadas de decisão (CANNAERTS, GASTMANS, CASTERLÉ,
2014).
Acredita-se que a construção moral possa ser desenvolvida a
partir de valores e comportamentos internalizados em diversos
contextos vivenciados e que o comprometimento moral pode ocorrer
a partir da internalização de valores e atitudes valorativas no processo
de formação dos estudantes de Enfermagem. Não o ambiente de
formação mas também as pessoas, o país, a região, a cidade, a religião,
o trabalho, a cultura, o modo de viver, de falar, o temperamento, o
modo de ser e de exercer a liberdade podem ser a base sobre a qual se
constrói a moralidade de um indivíduo ( SILVEIRA et al., 2014).
241
O objetivo da educação, desde a básica até a superior, é formar
pessoas que saibam, além de administrar sua própria vida, viver em
sociedade. Quer dizer, educação não se trata somente de produzir um
bem individual, a formação profissional, mas, também de formar
pessoas capazes de vislumbrar um bem coletivo. Assim, a educação
deve ser responsável por promover valores democráticos. Para tal fim,
faz-se necessária uma educação baseada em valores morais que leve ao
crescimento ético do sujeito (MACINTYRE, 2007; CASADO,
MARTÍNEZ, NEVES, 2018).
A educação moral nas universidades brasileiras é
constantemente associada ao ensino do código de ética, por meio da
mera inclusão de disciplinas deontológicas, favorecendo o
conhecimento das leis profissionais, porém, geralmente sem as
reflexões necessárias para a promoção da autonomia moral. Não
obstante, a dimensão ética do ensino superior não se restringe as
questões deontológicas (FINKER, RAMOS, 2017).
Nas universidades brasileiras ainda se nota a valorização do
saber técnico e científico, acertando a formação profissional conforme
a lógica do mercado de trabalho, o que provoca uma segregação das
discussões de ordem moral (FINKER, NEGREIROS, 2018). Assim,
a enfermagem, mesmo tendo como princípio da profissão o cuidado
do outro sob a perspectiva da integralidade, muitas vezes deixa suas
ações aquém das expectativas. Em vista disso, o Ministério da
Educação instituiu as Diretrizes Curriculares Nacionais (DCN)
definindo as competências e habilidades esperadas para os
profissionais de enfermagem, com a finalidade de propor mudanças
curriculares que aproximem o perfil do egresso aos princípios e
diretrizes do Sistema Único de Saúde (SUS). Uma das mudanças
242
concentra-se em formar um profissional humanista, crítico e
reflexivo, o que exige um investimento no ensino da dimensão ética
(BRASIL, 2001).
Fazendo uma reflexão do forte elo da Enfermagem com a
ética, devido às relações de cuidado inerentes à profissão, a formação
moral na graduação permeia os mais diversos cenários de
aprendizagem, de maneira planejada ou não. Cabe aos professores
conscientizarem-se da grandiosidade do caráter social de seu papel,
não pela formação de profissionais que façam bem as suas funções,
mas também pela formação de cidadãos que façam o bem (FINKER,
NEGREIROS, 2018). A educação moral supõe uma tarefa
construtiva tendo em vista que ela não se pela imposição de valores,
não advém apenas do processo de socialização ou do desenvolvimento
moral e tampouco reduz-se à aquisição de hábitos virtuosos. Acredita-
se que essas teorias, de forma isolada, são incompletas, que elas devem
ser pensadas de maneira complementar; portanto, consideramos
educação moral como um processo de construção da personalidade
moral. Segundo o autor, a construção da personalidade moral
depende da experiência que o meio é capaz de proporcionar, do uso
dos instrumentos da consciência moral e deve contar com um guia de
valores que auxilie no direcionamento moral da ação (PUIG, 1996).
Nesse panorama, a formação do enfermeiro não pode ser
pensada sem levar em consideração as concepções éticas, que
constituem a raiz do desenvolvimento da Enfermagem. Para tanto, a
graduação deve prezar pelo aprender a aprender por meio de uma
formação crítica e integradora, comprometida com o cuidado
humanizado, responsável e ético. Acredita-se que, ao investir na
construção moral de estudantes de Enfermagem, seja possível
243
estabelecer uma Enfermagem mais altruísta e mais humanizada, a
partir da assimilação de conhecimentos científicos e da internalização
de valores morais para fundamentar a prática profissional
(GOERGEN, 2007).
Nesse cenário, entende-se que a empatia assume papel
importante, que a própria origem da palavra do grego empatheia:
“em emoção”, “em sentimento em relação a outra pessoa, presume-
se vontade de compreender outrem (NUNES, 2019). Teoricamente,
a empatia pode ser entendida como uma ação associada entre
pensamento e comportamento. É o ato psicológico de se colocar no
lugar do outro, considerando os aspectos cognitivo, emocional e
motivacional.
A forma cognitiva se refere à capacidade de entender a
vivência e os sentimentos dos demais e à habilidade de compreender
o mundo a partir da perspectiva de outras pessoas; a forma emocional
envolve dar atenção especial, ou seja, mais afetiva, às experiências dos
outros; e a motivacional corresponde ao sentimento de cuidado com
o próximo em sociedade (MANSUR , 2020). Importar-se com o
outro, compreendê-lo e respeitá-lo é de fundamental importância
para o bom relacionamento interpessoal do futuro profissional de
saúde.
Um estudo com o objetivo de avaliar os níveis de empatia,
bem como os aspectos sociodemográficos e pessoais relacionados a
docentes e preceptores médicos de um curso de Medicina, apontou
que aspectos sociodemográficos e pessoais dos docentes e preceptores
médicos exercem influência direta em maiores ou menores níveis de
empatia. Tal evidência é relevante, que a formação de futuros
244
médicos mais empáticos depende da influência desses docentes e
preceptores médicos (NUNES, 2020).
Sabe-se que a atitude holística e empática que se vivencia em
ambiente familiar tem um papel importante no desenvolvimento da
socialização e empatia no núcleo familiar. Na situação da empatia
médica, sabe-se que o ambiente educacional não se restringe apenas
ao âmbito universitário, clínico ou hospitalar e que a empatia é
fundamental para que o ambiente de ensino-aprendizagem cumpra o
seu propósito (DELGADO-BOLTON et al., 2016). Entende-se que
os docentes e preceptores médicos são importantes influenciadores,
bem como referenciais, para seus alunos. Se sua prática pedagógica
for baseada na humanização e na empatia, poderá ocorrer um impacto
na formação de opinião e, consequentemente, na conduta dos
acadêmicos. A autoridade sobre o que se ensina é inquestionável
quando aquilo se torna visível. É clara a consequência de que a
empatia na relação médico-paciente também é docente-dependente.
A empatia pode ser instigada ou facilitada, o que não é possível sem o
exemplo do próprio docente (COSTA, AZEVEDO, 2010).
Enquadraria ao docente apresentar aos acadêmicos vivencias
que permitam ao autoconhecimento, ao poder de escuta, ao respeito
e à tolerância, de modo que eles sejam aptos a identificar suas próprias
fragilidades, seus medos e preconceitos. Como empecilhos ao ensino
e à prática da empatia pelo docente, podem-se mencionar a grande
variedade de professores/preceptores que os acadêmicos têm ao longo
do curso e o chamado “enrijecimento” dos acadêmicos de Medicina
durante o período de graduação (COSTA, AZEVEDO, 2010).
Como forma de responsabilidade social, a prática da empatia
constitui grande desafio ao estudante no cenário de pratica clínica
245
(KALUF et al., 2019). O futuro profissional, médico, enfermeiro,
terapeuta ocupacional, fonoaudiólogo, fisioterapeuta etc., tem a
empatia como habilidade a ser desenvolvida em seu processo de
aprendizagem. O estabelecimento de relações empáticas foi percebido
como uma necessidade no campo da saúde, pois todas as ões
realizadas para os pacientes, orientar, informar, confortar ou atender,
envolvem comunicação interpessoal (PONTES, LEITÃO, ISLANE,
2008).
A empatia como componente curricular na área da saúde tem
sido objeto recorrente de investigações científicas. Isso indica uma
conscientização acerca do importante papel dessa habilidade para o
profissional da área da saúde, em consonância com as DCN.
Caminha-se no sentido de formar um profissional mais humanizado,
crítico e reflexivo, que atenda aos princípios e diretrizes do SUS e que
favoreça a comunicação e a melhora na qualidade da assistência
prestada.
Ressalta-se a necessidade de utilização de metodologias ativas
que é uma estratégia de ensino, possibilitando a vivência da relação
entre profissional e paciente por meio de situações em que a
habilidade empática é fundamental. A partir de pesquisas sobre a
empatia na educação em saúde, busca-se contribuir para a reflexão
sobre essa importante temática que permeia a relação profissional-
paciente. É importante subsidiar práticas docentes e contribuir para
novas pesquisas, com foco na qualidade do cuidado por meio da
empatia e na compreensão de que educar em saúde não se restringe
ao repasse de informações por parte do docente, mas à vivência de
situações que valorizem a experiência dos aprendizes e possibilitem a
246
construção compartilhada e crítica de novos saberes (SILVA et al.,
2022).
Considerações Finais
Os valores morais que docentes e discentes consideram
fundamentais, bem como aqueles que eles creem que são
desenvolvidos durante a graduação, convergem para: a prudência, o
respeito, a responsabilidade e a empatia. E, felizmente, eles não
qualificam apenas o perfil de um bom enfermeiro ou um bom
médico, mas também se referem à descrição de uma pessoa boa.
Desta maneira, sustenta-se que uma potente estratégia
institucional para ensinar a cuidar é promover o cuidado dos próprios
estudantes, professores e funcionários. E para tal fim, é importante
criar espaços de convivência em que os valores morais estejam
presentes de forma habitual, rotineira e natural, sendo vividos no
cotidiano da escola.
O preparo dos alunos de medicina e enfermagem a partir de
conhecimentos que não se encaixam no modelo biomédico pode
produzir reações que vão da surpresa à hostilização. As reações podem
partir dos próprios estudantes por não entenderem o sentido destes
conhecimentos para sua atividade profissional. No propósito do
ambiente universitário voltado para a área da saúde, trabalhar com
este campo coloca o profissional numa situação desprestigiada frente
às demandas de valorização e progressão na carreira.
A resposta a esta exigência tem sido, de uma forma geral, a
tentativa, por parte dos professores e pesquisadores da área, de
demonstrarem o valor de seu trabalho a partir de indicadores como:
aumento de satisfação com a experiência, aumento da aderência a
247
tratamentos, comunicação mais efetiva, melhor manejo de sintomas,
redução do estresse associado a diagnósticos difíceis, custo-efetividade
e redução de custos.
O processo de formação de profissionais da saúde, por meio
dos estágios ou disciplinas extramuros, tem sido uma forma prática
de uma ação que sinaliza e privilegia a importância da empatia e da
competência moral no campo das relações de cuidado. Tal
importância pode ser percebida pela aproximação dos alunos com
a pessoa nos espaços de cuidado e também discussões de casos clínicos
e atividades educativas simuladas e até mesmo em sala de aula, em um
movimento de sensibilização mútua, capaz de ressignificar para
ambos o sentido de um cuidado ético, que possibilite maior
resolutividade e autonomização em saúde.
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253
O Uso de Metodologias Ativas Colabora na
Formação Ética do Futuro Médico?
Priscila Caroline MIGUEL
25
Juliana Gonçalves HERCULIAN
26
Introdução
Este capítulo, tem como objetivo discutir como as
metodologias ativas colaboram no desenvolvimento da ética
profissional do futuro médico. Para isso, foi necessário introduzirmos
os conceitos ética e moral e como estes podem ser construídos a partir
de percepções de estudiosos nestes assuntos.
La Taille (2009), anuncia logo no prefácio que, chama o
plano ético de busca da “vida boa” e o plano moral algo referente a
eleição de valores. Psicologicamente falando, os planos se relacionam
e as opções morais de uma pessoa dependem das respostas dadas por
ela no plano ético. Portanto, [...] “uma educação moral deve vir
acompanhada de uma formação ética” (p.8).
25
Doutoranda em Educação pela Faculdade de Filosofia e Ciências (FFC), Universidade
Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” (UNESP), Campus de Marília, São Paulo, Brasil.
E-mail: priscilacarolinemiguel@gmail.com
26
Doutoranda em Educação pela Faculdade de Filosofia e Ciências (FFC), Universidade
Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” (UNESP), Campus de Marília, São Paulo, Brasil.
Professora da FEMA Fundação Educacional do Município de Assis/SP no curso de
Medicina. E-mail: julianaherculian@yahoo.com.br
https://doi.org/10.36311/2024.978-65-5954-473-8.p253-284
254
Nem todo plano ético - o da vida boa - merece o nome de
ética e por ética tomamos a definição de Ricouer (1990, p.202): “uma
vida boa, para e com outrem, em instituições justas”.
Tratando do plano moral de deveres, La Taille (2009)
entende-os como ser justo, ser generoso e ser digno, por exemplo.
Para La Taille (2010), a moral deve ser compreendida no campo do
dever, no intento de responder à seguinte pergunta: “como devo
agir?” e a ética envolve a reflexão filosófica - “que vida quero viver?”.
O autor acrescenta ainda que embora, haja possíveis distinções entre
os dois termos, não podemos negar que ambos se relacionam
intimamente.
Ainda tratando de moral, Piaget (1932[1994]) relata que o
infante a desenvolve de acordo com as suas relações e estas podem ser:
unilateral, na qual a autoridade e a coação são predominantes e a outra
relação é a de respeito mútuo, momento em que cooperação e
interações entre pares. A partir deste último tipo de relação é possível
observar uma moral pautada na autonomia, na responsabilidade e na
formação de valores.
Assim, conforme dito anteriormente, a formação moral deve
vir acompanhada da formação ética e trazendo esta ao ensino
universitário, temos tradicionalmente a ênfase sobre teoria e técnica,
e observa-se que a formação ética do profissional é colocada, no
máximo, em uma disciplina articulada à deontologia da profissão,
conforme apontam pesquisas de Lepre et al. (2014) ao estudarem a
competência e o juízo moral de graduandos de Pedagogia de
universidades públicas e privadas do interior paulista. Além disso,
para os autores citados acima, uma formação que de fato seja ética
requer do profissional conhecimentos técnicos e políticos e,
255
evidentemente, com base na dimensão humana, que implica em
resgatar aspectos de sua formação moral.
Piaget (1996 [1930]), argumenta que é necessário educar
moralmente, seja em espaços formais e não formais. A centralidade de
tal educação reside na construção de personalidades autônomas aptas
à cooperação. Em relação aos procedimentos a serem adotados -
verbais ou métodos ativos, pelo primeiro o autor ressalta que: “do
mesmo modo que a escola em geral séculos pensa ser suficiente
falar à criança para instruí-la e formar seu pensamento, os moralistas
contam com o discurso para educar a consciência” (p.15). Podemos
inferir que as “lições de moral” pouco ou nada contribuem para a
educação moral, por serem advindas de relações de coação e respeito
unilateral.
Para Freire (2019), este tipo de educação é advinda da
“educação bancária” a qual o professor é o transmissor do
conhecimento/informação e o aluno é apenas um receptor destes
conceitos, o que favorece uma reprodução das atitudes do professor,
sem ao menos ter a possibilidade de refletir e criticar, prejudicando
desta forma o desenvolvimento da autonomia moral e ética.
Corroboramos com Lepre et al. (2014) quando afirmam que
trabalhar conteúdos ligados à ética e à moral apenas por meio do
método expositivo, pode não trazer benefícios ao desenvolvimento
moral dos indivíduos. Tal pensamento coaduna com a ideia de Piaget
(1996) que defende os métodos ativos como os mais efetivos, que
o sujeito participa de experiências morais por meio do ambiente
proporcionado pelas instituições educacionais. Enfim, a criança ou o
jovem deve conviver com os pares e com situações nas quais possam
experienciar a cooperação, a democracia, o respeito mútuo e assim,
256
construir paulatinamente sua moralidade, o que para Freire (2019) é
considerado como “educação libertadora”.
Segundo Dongo-Montoya (2022), Paulo Freire defende a
ética universal do ser humano, a qual compreende a necessidade do
respeito mútuo, da valorização, do poder se posicionar racionalmente
e afetivamente com o mundo, além de viver dignamente. A estas
condições atribui uma nominação do “Ser Mais”.
A partir das reflexões desses autores, seguimos construindo
um texto com um olhar voltado à necessidade do desenvolvimento da
moral e da ética no corpo discente. Entretanto, nos faz pensar, o
quanto e se os docentes estão preparados e têm consciência da
necessidade de tornar a educação mais libertadora, ou seja, livre de
coação, permitindo que o aluno seja ativo no seu processo de
apreender e o professor somente um transmissor, o que chamaremos
de transposição didática. E, que essa dialética e interação com o
meio/realidade seja o que promoverá o desenvolvimento de um
profissional crítico, reflexivo, autônomo e ético.
Sem mais, o presente texto divide-se em quatro seções: na
primeira, apresentamos o desenvolvimento da moralidade para os
teóricos Jean Piaget e Lawrence Kohlberg; na segunda, trataremos do
constructo da competência moral de Georg Lind a partir das
colaborações dos dois autores citados e logo depois, faremos uma
relação entre a formação ética do estudante de Medicina bem como
as mudanças de currículo para a implementação do uso de
Metodologias Ativas e por último e não menos importante, faremos
as considerações finais articulando os conceitos anteriormente
apresentados.
257
O Desenvolvimento da Moralidade para Piaget e Kohlberg
Piaget (1994 [1932]), em sua única obra destinada à
investigação da moralidade, O juízo moral na criança , obra seminal
no campo da Psicologia do Desenvolvimento Moral, propôs um
estudo sobre a possibilidade de construção da autonomia e retrata a
lei moral construída gradativamente, tendo como necessidade o
desenvolvimento da inteligência, ainda que esta não seja condição de
suficiência.
A referida obra está dividida em quatro partes: a primeira
parte trata do tema regras, estudando as respostas dos meninos num
jogo de bolinhas de gude, com regras bem estabelecidas e o
pique/amarelinha das meninas; a segunda parte trata do tema do
realismo moral e sua relação com a coação adulta; a terceira trata de
temas como justiça e cooperação e na quarta parte a discussão de
outras teses sobre a moralidade (MENIN; BATAGLIA, 2017). O
autor adverte logo no início que está se propondo investigar a
consciência moral no que diz respeito ao juízo e não aos
comportamentos ou sentimentos morais.
Assim sendo, a referida obra pode ser entendida como uma
tentativa de expor suas ideias sobre a moral a partir de uma verificação
empírica; diante de observações, entrevistas clínicas e até mesmo
jogando com as crianças. Piaget, notou que existem mudanças na
forma como elas pensam e praticam as regras do jogo. O epistemólogo
escolheu estudar como as crianças jogam pelo fato de os jogos serem
instituições sociais, ou seja, por comportarem um sistema complexo
de regras.
Piaget (1994 [1932], p. 23) afirma que: “toda moral consiste
num sistema de regras, e a essência de toda moralidade deve ser
258
procurada no respeito que o indivíduo adquire por essas regras”. Para
ele, as relações de coação, no caso das crianças, fortalecem o
egocentrismo que, entre outras coisas, é justamente a dificuldade de
se colocar no ponto de vista do outro e consequentemente, estabelecer
relações de reciprocidade.
Em relação ao desenvolvimento moral, na coação, somente
respeito unilateral, além de uma assimilação deformante das razões de
ser das diversas regras (realismo moral). Resumindo, da coação deriva
a heteronomia moral (LA TAILLE, 1992). O oposto da coação é a
cooperação, sendo que La Taille esclarece que:
As relações de cooperação (co-operação, como às vezes escreveu
Piaget para sublinhar a etimologia do termo) são simétricas;
portanto, regidas pela reciprocidade. São relações constituintes
que pedem, pois, mútuos acordos entre os participantes, uma vez
que as regras não são dadas de antemão. Somente com a
cooperação, o desenvolvimento intelectual e moral pode ocorrer,
pois ele exige que os sujeitos se descentrem para poder
compreender o ponto de vista alheio. No que tange à moral, da
cooperação derivam o respeito mútuo e a autonomia [...] (LA
TAILLE, 1992, p. 59, grifos do autor).
Pensando nos fatores que fortalecem na prática a heteronomia
e a consciência das regras e os que favorecem a autonomia, Piaget
postula que as relações sociais são “formadoras” dos sentimentos
morais. Temos de um lado, o egocentrismo da criança pequena e o
respeito unilateral nas suas relações com os mais velhos que resultam
em heteronomia ou em moral do dever. De outro, a descentração
oriunda das vivências de cooperação com a prática da reciprocidade
constroem a autonomia da prática e da consciência das regras. São
259
exatamente o respeito unilateral e egocentrismo num extremo, e
cooperação com reciprocidade, noutro extremo, que dão conta de
explicar a evolução dos juízos morais e das concepções de justiça entre
as crianças (MENIN, 2007).
Para Piaget, na história moral da criança não have apenas
dois momentos caracterizados pela ausência ou presença da moral,
mas sim momentos diferentes no modo como a criança assimila as
regras morais (LA TAILLE, 2006). Piaget fala em três tendências do
desenvolvimento moral (anomia, heteronomia e autonomia) e não
apenas em uma, pois se assim fosse teríamos apenas a interiorização
da moral vigente na sociedade em que nascemos.
É preciso falar então das características dos três momentos do
desenvolvimento do juízo moral. Piaget considera que os períodos são
definidos pela tendência dominante por meio do qual a criança pensa
moralmente, isto é, nenhuma criança é totalmente heterônoma ou
autônoma. A tendência heterônoma seria de forma geral, pensar a
legitimidade das regras morais tendo como referência a obediência de
uma autoridade e, no caso da tendência autônoma o sujeito, em certas
circunstâncias, demonstra a capacidade de levar em conta a
reciprocidade e construir regras baseadas em princípios
universalizáveis ao invés de simplesmente acatar a regra externa,
característica da heteronomia moral (LA TAILLE, 2006).
Para Piaget (1994 [1932]), como anunciamos logo acima, o
desenvolvimento moral pode adotar as seguintes formas: depois de
uma fase pré-moral ou anomia, é possível que o sujeito desenvolva
uma consciência heterônoma e depois disso, uma consciência
autônoma. Na anomia, como o próprio nome indica (a = não, nomia
= regras, ou seja, ausência de regras), a criança ainda não adentrou no
260
universo moral e desde o nascimento é inserida em um universo de
regras sociais e convencionais: hora de dormir, hora de comer, tempo
de televisão etc., e outras de cunho moral, tais como: não bater, não
xingar etc.
Tendo posto Piaget as suas compreensões sobre o
desenvolvimento moral e não trazendo mais reflexões sobre este
assunto, por sua preocupação maior ser epistemológica, ou seja, como
o sujeito constrói seu conhecimento, Lawrence Kohlberg tem
dominado os estudos neste assunto nas últimas décadas (BIAGGIO,
1997).
Lawrence Kohlberg (1927-1987), tinha o sonho de tornar-se
psicólogo clínico e não pesquisador. Contudo, as teorias de Jean
Piaget sobre o desenvolvimento moral de crianças e adolescentes o
levaram para esse caminho: em sua tese de doutorado, em 1958,
identificou estágios de desenvolvimento moral, baseado em
entrevistas com 72 meninos brancos de Chicago a respeito do
conhecido dilema de Heinz. No dilema em foco o personagem, com
sua mulher doente, diante da impossibilidade de comprar o remédio
que a salvaria, é colocado em situação de conflito quando se tendo
que decidir entre dois valores: o direito à propriedade (não roubar o
remédio do farmacêutico que o possui e deixar de salvar a vida de sua
mulher) ou o direito à vida humana (roubar o remédio e cometer uma
atitude considerada criminosa na sociedade em que vive, porém
salvando a sua mulher) (BIAGGIO, 2002; LEMOS DE SOUZA;
VASCONCELOS, 2009).
Segundo Bataglia (2014, p. 113) Lawrence Kohlberg
compartilha com Piaget a ideia de que a moralidade não é pura
assimilação de valores morais oriundos da cultura, mas sim que esta
261
depende de uma organização cognitiva que permita que sua visão de
mundo e de moral se construindo em veis mais e mais
complexos. Sendo assim, a moralidade não é coincidente com a
estrutura cognitiva, mas tem nela condição de necessidade, porém não
de suficiência.
Kohlberg, propõe então, que a estrutura moral também é
construída nas relações com o meio e a partir de suas pesquisas,
formulou a tese de que eram seis os estágios que descrevem o juízo
moral, da infância até a idade adulta. Durante mais de três cadas
(60, 70 e 80) empreendeu pesquisas sobre a moralidade do
adolescente e do adulto, em conjunto com diversos colaboradores,
que tinham como objetivo validar o caráter de universalidade e de
sequencialidade dos seis estágios evolutivos que resultou na
elaboração de três níveis de moralidade, agrupando dois estágios cada
um, totalizando então seis estágios que se sucedem de forma
evolutiva, sendo o último (estágio 6) mais complexo e mais adequado
se comparado ao primeiro, além de mais evoluído em relação aos
demais no que se refere ao princípio básico que é a justiça. Isso
significa que a justiça está presente no raciocínio moral de todos, mas
o significado e a amplitude que essa noção tem variam de acordo com
a complexidade alcançada pela estrutura, que por sua vez depende das
trocas estabelecidas com o meio (LEMOS DE SOUZA;
VASCONCELOS, 2009; BATAGLIA, 2014).
Biaggio (2002) relata também que a teoria de Kohlberg é a
única que caminha de forma sequencial, na qual os estágios mais altos,
são considerados pós-convencionais e que os indivíduos atingem a
maturidade moral quando compreendem que a justiça não é a mesma
coisa que a lei, entendendo que todo ser humano é capaz de ir além
262
dos valores culturais que foi socializado, ao invés de simplesmente
aceitá-los.
Bataglia, Morais e Lepre (2010) trazem que os estágios de
raciocínio moral propostos por Kohlberg, em 1992, não são
embasados nas emoções ou ações e sim na justiça e, que os conceitos
de heteronomia e autonomia não estavam completos para classificar
o raciocínio moral. A partir desta compreensão, Kohlberg, precisou
propor ts níveis para classificar o desenvolvimento do raciocínio
moral, que são: o pré-convencional, o convencional e o pós-
convencional.
No pré-convencional o indivíduo julga o certo e errado,
apoiado em seus interesses próprios, porém com medo da punição.
Este vel é composto por dois estágios, no primeiro, o indivíduo
respeita as normas sociais por medo do castigo. No segundo, o
indivíduo está na fase do individualismo e egocentrismo, buscando
então respeitar as regras que favoreçam os seus interesses. o segundo
nível, o convencional, também dividido em dois estágios, três e
quatro, o indivíduo busca cumprir com as normas na intenção de
atingir o esperado pelas autoridades, seguido da necessidade de
manter a ordem social, respectivamente (BATAGLIA; MORAIS;
LEPRE, 2010).
E, no último nível, o pós-convencional, compreendido pelos
estágios cinco e seis, o indivíduo age guiado por princípios morais
universais pautados na reciprocidade e igualdade e os pensamentos
são regidos pelos princípios morais e éticos e não mais por regras
sociais. No estágio cinco, o raciocínio moral considera o contrato
social e os direitos individuais e no sexto estágio, agem de acordo com
a condição ética. Além disso, após definir todos estes estágios, o autor
263
da teoria percebeu que era necessário subdividi-los em A e B,
entendendo que em A, está relacionado a uma orientação
heterônoma, baseada nas regras de autoridades e B, com uma
orientação autônoma, baseada nos princípios de justiça, igualdade,
reciprocidade, diante da moralidade. (BATAGLIA; MORAIS;
LEPRE, 2010).
A partir desta compreensão de Kohlberg sobre seu
instrumento de avaliação da moralidade, Georg Lind (1947-2021),
traz um olhar ampliado ao proposto por Kohlberg e complementa
o instrumento. Assim, seguiremos com a competência moral na
perspectiva de Georg Lind, a partir de um constructo proposto
originalmente por Kohlberg.
A Competência Moral: Algumas Considerações
O constructo de competência moral teve como definição
proposta por Kohlberg em 1964: “a capacidade de tomar decisões e
julgamentos que são morais (isto é, baseados em princípios internos)
e agir de acordo com tais julgamentos” (KOHLBERG, 1964, p.425,
tradução nossa). Entretanto, para Rego (2003), Kohlberg não
concebeu a fundamentação na ação moral, mas no raciocínio moral e
diversos fatores que estão relacionados a essa ação. Para Bataglia
(2022) com o constructo de competência moral, Kohlberg estava
relacionando juízo à ação, “de um modo que o constructo não se
refere unicamente ao campo da cognição e nem exclusivamente ao
campo do afeto” (p.50).
Desta forma, Georg Lind ao debruçar sobre a teoria de
Kohlberg, a contraria e traz a sua própria teoria baseada na discussão
de dilemas e testagem, criando assim o Moral Competence Test
264
(MCT) que incorpora aspectos cognitivos e afetivos não vistos nas
avaliações de Kohlberg. Bataglia (2010), complementa dizendo que
este instrumento identifica o nível da moralidade dos indivíduos
através de uma tarefa moral, que tem como base os princípios morais,
os quais são intrínsecos e inconscientes. Sendo assim, é necessária a
realização de testes experimentais para identificar e desenvolver a
competência moral. Desta forma, para que a competência moral seja
bem desenvolvida, o campo da educação deve estar alinhado com os
princípios desta necessidade, entendendo que a competência moral é
desenvolvida durante a prática de discussões e reflexões isentas de
coação (MATOS; ZUCCOLI, 2022).
A base dos trabalhos tanto de Piaget (1895-1980), Kohlberg
(1927-1987) e Georg Lind (1947-2021) é construtivista, isto é, a
competência moral está estritamente relacionada com a construção
que os sujeitos fazem a partir das trocas estabelecidas com o meio.
Bataglia (2022, p. 54) salienta que: “o conhecimento e a conação
(disposição para a ação) viriam da possibilidade de assimilação das
situações e não a partir das percepções de regras objetivas ou
subjetivas”, o que refuta qualquer interpretação fenomenologista em
relação ao constructo.
Nesta perspectiva, as teorias de Piaget e Kohlberg são as que
mais descrevem sobre este fato. Estas teorias, se incluem no grupo
das teorias cognitivas-evolutivas, as quais têm como base que o
desenvolvimento ocorre a partir de transformações das estruturas
cognitivas (BATAGLIA; MORAIS; LEPRE, 2010).
Fortalecendo a ideia da construção da moralidade, Dongo-
Montoya (2022), traz que Paulo Freire e Piaget entendem que “o
conhecimento e a moralidade não estão pré-formados nem no
265
indivíduo nem no meio” (p.131) sendo necessária uma interação
entre ambos para o seu desenvolvimento, não responsabilizando
somente o indivíduo na sua formação cognitiva e moral, mas também
outros indivíduos.
Retomando a ideia de que a moralidade é uma construção e
que a educação moral prescinde de uma formação ética, escolhemos
o recorte de estudar a formação do futuro médico, em especial.
A Formação Ética no Curso de Medicina e as Metodologias Ativas
Antes de abordarmos efetivamente a formação dica atual e
as metodologias ativas, faz-se necessário contextualizar historicamente
essa trajetória pedagógica na saúde e em especial na medicina.
Diante de um contexto histórico em que a educação em saúde
era voltada para um olhar fragmentado e curativista do indivíduo, sem
se preocupar com o meio e a sociedade, a formação ética ficou à
margem dos ensinos, fazendo com que os futuros médicos
apresentassem déficits neste conteúdo e dificuldade em lidar com
situações relacionadas ao meio e a sociedade, ou seja, com as questões
sociais. Diante deste cenário, na década de 40 começou-se a repensar
o tipo de ensino realizado a estas áreas (MORAES, 2016;
CARVALHO, SOARES, FERREIRA, 2023; GONZÁLEZ;
ALMEIDA, 2010).
Na década de 50, o Brasil incorpora um movimento norte-
americano, relacionado ao bem-estar social, aderindo à proposta da
reforma preventivista e da medicina integral, incluindo nas ações os
não-enfermos, englobando a saúde no processo saúde-doença,
surgindo assim, a Medicina Preventiva que proporcionou que o
266
trabalho comunitário pudesse ter ações mais práticas do que
científicas (GONZÁLEZ; ALMEIDA, 2010).
Apesar disso, Morita, Haddad e Araújo (2010), relatam que
as discussões e propostas de mudanças no ensino das graduações em
saúde brasileiras se tornaram mais evidentes na década de 80,
pautadas em diversas contribuições dos pensadores e pesquisadores da
época e no planejamento coletivo em andamento da Reforma
Sanitária Brasileira. Este momento revela o marco daConferência
Nacional de Saúde em 1986, da qual surgiu a proposta da Reforma
Sanitária que direciona para a universalidade do direito à saúde, sendo
oficializado com a Constituição Federal de 1988 e a criação do
Sistema Único de Saúde (SUS) em 1990 (FIOCRUZ, 2017).
Na perspectiva de Moreira e Dias (2015), os regimentos do
SUS foram um dos principais propulsores para as mudanças na
prática e na formação de profissionais da saúde. Porém, enquanto o
sistema de saúde estava sendo reformulado, buscando um olhar
ampliado e não mais fragmentado e curativista, os profissionais ainda
continuavam sendo formados neste modelo.
Albuquerque et al. (2007) trazem que a proposta de mudança
curricular precisava ser embasada no modelo de atenção à saúde, o
qual tem como essência o compromisso com a população. Portanto,
espera-se que o profissional de saúde busque em seu atendimento a
universalidade, a equidade e a integralidade do cuidado. Assim, o
objetivo do ensino em saúde, se torna formar profissionais que
entendam as necessidades individuais das pessoas, enxergando-as em
todas as suas dimensões, buscando promover a saúde e prevenir
doenças independente da complexidade tecnológica, garantindo
assim o equilíbrio entre a excelência técnica e a relevância social.
267
É, neste momento, em que a relação médico-paciente volta a
ser valorizada, que os valores morais, como respeito, responsabilidade,
paciência, humildade, prudência e confiança começam a serem vistos
como necessários na formação médica, conforme o resultado de
trabalho realizado com estudantes de medicina, por Marques,
Fonseca, Milioni e Corbiceiro (2020) que identificam através de
questionário que estes são os valores morais mais importantes de
serem trabalhados ao longo do curso de medicina. Entretanto,
também colocam que uma relação vertical e autoritária entre
alunos e professores. Fato que pode ser tomado como modelo e ser
reproduzido pelos futuros médicos com os seus pacientes e equipe,
dificultando assim a relação, situação que está intimamente ligada à
competência moral destes profissionais.
Entretanto, apesar da necessidade citada acima por Moreira e
Dias (2015), da mudança curricular e consequentemente da formação
profissional estar relacionada com às necessidades encontradas na
descrição do novo modelo de saúde brasileira, o SUS, não as
faculdades, mas também o próprio serviço, não conseguiram efetivar
verdadeiramente as alterações, principalmente às relacionadas ao
cuidado, pois o modelo centrado na doença ainda se encontrava
arraigado. Por isso, uma discussão que ocorre desde 1930, ganha
corpo somente em 1990 e chega às Diretrizes Curriculares Nacionais
(DCNs) em 2001, com o objetivo de alinhamento do programa
educacional das graduações da área da saúde com as propostas do SUS
e somente 13 anos depois, em 2014 ocorre o enquadramento das
Diretrizes Curriculares Nacionais do Curso de Graduação em
Medicina (BRASIL, 2014) com os princípios do SUS.
268
Stela e Puccini (2008) referem que as Diretrizes Curriculares
Nacionais (DCNs) para os cursos de graduação na área da saúde
constituem em uma:
[...] mudança paradigmática do processo de educação superior,
de um modelo flexneriano, biomédico e curativo para outro,
orientado pelo binômio saúde-doença em seus diferentes níveis
de atenção, com ações de promoção, prevenção, recuperação e
reabilitação da saúde, na perspectiva da integralidade da
assistência; de uma dimensão individual para uma dimensão
coletiva; de currículos rígidos, compostos por disciplinas cada vez
mais fragmentadas, com priorização de atividades teóricas, para
currículos flexíveis, modulares, dirigidos para a aquisição de um
perfil e respectivas competências profissionais, os quais exigem
modernas metodologias de aprendizagem, habilidades e atitudes,
além de múltiplos cenários de ensino (STELA; PUCCINI, 2008,
p.53).
Assim, diante da evidente inadequação do perfil do
profissional de saúde e com a promulgação das novas diretrizes
curriculares, a formação em saúde deixou de ficar à margem dos temas
discutidos pelo Ministério da Saúde, o que mobilizou a construção de
políticas públicas específicas para a formação que fossem ao encontro
com o novo modelo de ensino (MOREIRA e DIAS, 2015).
Com isso, o Art. das Diretrizes Curriculares Nacionais do
Curso de Graduação de Medicina (BRASIL, 2014) diz que:
O graduado em Medicina terá formação geral, humanista,
crítica, reflexiva e ética, com capacidade para atuar nos diferentes
níveis de atenção à saúde, com ações de promoção, prevenção,
recuperação e reabilitação da saúde, nos âmbitos individual e
coletivo, com responsabilidade social e compromisso com a
269
defesa da cidadania, da dignidade humana, da saúde integral do
ser humano e tendo como transversalidade em sua prática,
sempre, a determinação social do processo de saúde e doença
(BRASIL, 2014, p. 1).
Diante deste pressuposto citado acima, identifica-se que o
assunto ético-legal não pode ser dissociado do currículo da medicina,
pois o mesmo perpassa pela formação humanística e esta relevância
vai ao encontro quando é colocada a necessidade de um atendimento
médico de qualidade, no qual a técnica não se faz suficiente ou um
atendimento de qualidade por si . Para que o mesmo atinja a
excelência é necessário haver o saber científico, técnico e a
humanização no cuidado (CARVALHO, SOARES e FERREIRA,
2023).
O Art. das Diretrizes Curriculares Nacionais do Curso de
Graduação em Medicina de 2014 reforça que o futuro profissional
precisa articular o conhecimento, a habilidade e a atitude e além disso
ele precisará estar apto nas áreas de Atenção à Saúde, Gestão em Saúde
e Educação em Saúde.
Dentro do eixo da Atenção à Saúde:
[...] o graduando será formado para considerar sempre as
dimensões da diversidade biológica, subjetiva, étnico-racial, de
gênero, orientação sexual, socioeconômica, política, ambiental,
cultural, ética e demais aspectos que compõem o espectro da
diversidade humana que singularizam cada pessoa ou cada grupo
social, no sentido de concretizar o acesso universal e equidade
como direito à cidadania; integralidade e humanização do
cuidado por meio de prática médica contínua e integrada;
qualidade na atenção à saúde, pautando seu pensamento crítico;
segurança na realização de processos e procedimentos,
270
referenciados nos mais altos padrões da prática médica,
preservação da biodiversidade com sustentabilidade, ética
profissional, promoção da saúde, como estratégia de produção de
saúde, cuidado centrado na pessoa sob cuidado, promoção da
equidade no cuidado adequado e eficiente das pessoas com
deficiência (BRASIL, 2014, p.1)
No eixo da Gestão em Saúde, no Art. 6º, a Graduação em
Medicina visa:
[...] à formação do médico capaz de compreender os princípios,
diretrizes e políticas do sistema de saúde, e participar de ações de
gerenciamento e administração para promover o bem estar da
comunidade, por meio das seguintes dimensões: Gestão do
Cuidado, com o uso de saberes e dispositivos de todas as
densidades tecnológicas, valorização da vida, tomada de decisões,
comunicação, incluindo as novas tecnologias da informação e
comunicação, liderança exercitada na horizontalidade das
relações interpessoais, trabalho em equipe, construção
participativa do sistema de saúde, participação social e articulada
nos campos de ensino e aprendizagem das redes de atenção à
saúde (BRASIL, 2014, p. 2).
Quanto ao eixo da Educação em Saúde:
[...] o graduando deverá corresponsabilizar-se pela própria
formação inicial, continuada e em serviço, autonomia
intelectual, responsabilidade social, ao mesmo tempo em que se
compromete com a formação das futuras gerações de
profissionais de saúde, e o estímulo à mobilidade acadêmica e
profissional, objetivando um aprendizado autônomo e
responsável, no qual busca pelos seus conhecimentos diante das
possibilidades que lhe são apresentadas a partir da prática,
271
simulações ou discussão de casos em ambientes protegidos e
controlados, sendo direcionados por um facilitador que
proporcionará o desenvolvimento no processo de aprendizagem
buscando reflexões e um olhar ampliado para as relações com o
paciente, equipe e comunidade (BRASIL, 2014. p. 3).
Contribuindo com as propostas da DCN do Curso de
Graduação em Medicina de 2014, Berbel (2011) diz que a
implantação das metodologias ativas pode favorecer o
desenvolvimento da autonomia a partir do momento em que
propostas de problematização são ofertadas aos alunos e suas
impressões são valorizadas, favorecendo a discussão, reflexão e
desenvolvimento do raciocínio, sendo o professor o facilitador deste
trabalho.
Esta remodelagem na forma de ensinar, destaca a
Metodologia Ativa como aquela com maior possibilidade de inserir o
aluno e futuro egresso no contexto descrito pelas DCNs do Curso de
Graduação em Medicina, por possibilitar a vivência com a
realidade/prática mais precocemente, além de mostrar que esta
estratégia de ensino- aprendizagem possibilita o desenvolvimento do
olhar ampliado para o cuidado. (ITIKAWA et al., 2008; RUIZ,
FARENZENA, HAEFFNER, 2010; PEIXOTO, RIBEIRO,
AMARAL, 2011; ANDRADE, et al. 2011).
Esta evidência é enfatizada por Nunes et al. (2008) quando
revela que na metodologia ativa é possível desenvolver as habilidades
de comunicação e atitudes humanizadas diante dos pacientes, além de
desenvolver elementos psíquicos, afetivos e cognitivos, necessários
para tal.
272
Segundo Marques (2018), o método de ensino ativo gera uma
autonomia ao estudante e o leva a uma corresponsabilização não
pessoal, mas também no seu trabalho em grupo e com a comunidade.
Desta forma, o aluno começa a perceber os valores de uma boa relação
interpessoal, pois passa a depender também do outro para construir o
seu saber, seja no trabalho em grupo, com outros estudantes ou com
a comunidade que está atuando.
Assim, a autora coloca que as interfaces de autonomia, relação
com a comunidade e do pluralismo são importantes para a
concretização da construção de uma melhor educação em valores, a
partir das metodologias ativas. Pois, vivenciar contrastes
socioeconômicos e culturais, em especial fora da escola e em cenários
reais, mobilizam sensações e proporcionam diálogos e reflexões
concretizando questões de educação moral (MARQUES, 2018).
Para Enderle et al. (2018), o estudante capacitado através da
metodologia ativa tem a possibilidade de resgatar a sensibilidade,
desenvolver o pensamento crítico, tomadas de decisões, ações
humanizadas e éticas. Estas questões, somadas à socialização dos
saberes na prática colaboram também para o desenvolvimento da
competência moral ou do fortalecimento desta no aluno. Fato que vai
de encontro com o pensamento de Silva (2011), quando diz que a
moral é possível de ser construída se levar em conta o outro diante
de seus aspectos intrínsecos e extrínsecos, os quais devem ser
coordenados e não ignorados.
Corroborando a isto, Marques (2018) diz que a compreensão
da responsabilidade da profissão e da essência do cuidar do outro,
tornando a relação profissional-usuário respeitosa, empática, com
formação de vínculo e escuta qualificada através da comunicação, faz
273
com que o aluno desenvolva a competência moral. Afirma ainda, que
as metodologias ativas se utilizam de estratégias de aprendizado que
estimulam não as competências técnicas, mas também as
humanísticas e éticas, contribuindo assim com a formação moral do
indivíduo.
Diante deste panorama sobre a mudança curricular e as
possibilidades que as metodologias ativas geram nos discentes, em
especial no desenvolvimento de autonomia, ações críticas e reflexivas
em relação ao cuidar do outro e/ou comunidade, é pertinente
entender sobre o desenvolvimento moral e ético pois segundo Bataglia
(2022), para Piaget é no método ativo, que se realiza a construção de
valores quando a interação com o meio durante a formação, assim
favorecendo ao estudante a possibilidade de desenvolvimento da
autonomia moral e a ética e, consequentemente o desenvolvimento
da competência moral.
Para Dongo-Montoya (2022), a condição fundamental para
a formação ética e moral do discente é a liberdade de ação em relação
a qualquer escolha, o que o levará ao desenvolvimento de
responsabilidades. O mesmo autor complementa dizendo que tanto
para Freire como para Piaget, não é possível sair da ingenuidade para
a criticidade sem o envolvimento da ética e da moral na formação do
estudante.
Apesar de todos estes ganhos que a metodologia ativa traz para
os estudantes, Oliveira et al. (2008) mencionam que apesar de haver
um grande número de cursos médicos discutindo sobre as mudanças
curriculares, somente uma minoria tem implantado disciplinas e/ou
programas de iniciação científica, bem como promovido a
participação comunitária/popular. Este fato, pode ser entendido
274
quando Albino et.al (2004) relatam que dentro da classe médica
muita atenção para as capacitações técnicas/assistenciais deixando a
acadêmica à margem, o que colabora com o distanciamento dos
saberes sobre as alterações pedagógicas do curso. Além disso, Stella
et.al (2009) argumentam que uma dificuldade de aceitação dos
docentes em realizar as atividades propostas pelas diretrizes em
cenários da Medicina Social, Preventiva e Saúde Coletiva, o que leva
a uma mudança de paradigmas em relação aos cenários de
aprendizagem, que na sua grande maioria são intra-hospitalar.
Entretanto, as escolas que implantaram e que discutem sobre
a importância da inclusão de novas metodologias e disciplinas no
currículo médico mostraram a satisfação dos alunos na nova
experiência, sendo favoráveis à implantação permanente. Anjos et.al
(2010), relatam que a mudança curricular possibilita novos
aprendizados em lugares diferentes, proporcionando vivências em
espaços onde a clínica ampliada é mais viável, obtendo desta forma
novos olhares, interpretações e construção de conhecimentos.
Além disso, os mesmos autores, contribuem dizendo que a
inserção dos estudantes na atenção básica permite que os tornem mais
participativos e preparados e desta forma a academia cumpre com o
seu papel, seguindo as novas propostas curriculares. Afirmação, que
vai ao encontro com os autores Oliveira, et al.(2010); Itikawa, et al.
(2008) e Oliveira; Alves (2011), quando relatam de forma positiva a
inserção de novas disciplinas que utilizam como campo de estágio a
rede de saúde pública e/ou uma das ferramentas da metodologia ativa
como proposta de ensino aprendizagem como, por exemplo, o
Problem Based Learning (PBL) Ensino Baseado em Problemas e a
Metodologia Problematizadora.
275
Portanto, diante da realidade de uma sociedade intolerante,
onde as atitudes são tomadas a partir do efeito do poder monetário e
do prestígio individual, identificar se os alunos têm apresentado o
desenvolvimento da competência moral ao longo do curso de
medicina se faz necessário, pois as DCNs deste curso colocam que os
alunos precisam apresentar um trabalho colaborativo em equipes de
saúde, respeitando normas institucionais dos ambientes de trabalho e
agindo com compromisso ético-profissional, superando a
fragmentação do processo de trabalho em saúde; além de estar em
contato com a comunidade, família e indivíduo aplicando os preceitos
do SUS como a universalidade e a equidade.
Para isso, este estudante deverá ser estimulado desde o início
do curso a lidar com problemas reais, assumindo responsabilidades
crescentes como agente prestador de cuidados e atenção, compatíveis
com seu grau de autonomia, que se consolida, na graduação, com o
internato, utilizando da metodologia ativa como processo de ensino-
aprendizagem (BRASIL, 2014). Assim, lidar com discussões, reflexões
e princípios morais fará parte da realidade deste estudante e futuro
profissional, sendo então, importante buscar uma metodologia
pedagógica ativa que favoreça o desenvolvimento da competência
moral e ética para que este futuro profissional esteja preparado para
lidar com tais situações pertinentes à profissão.
Considerações Finais
Os educandos, merecem mais do que “aulas” de educação
moral, ou seja, vivenciar a moralidade em todos os aspectos, tempos
e espaços das instituições educacionais para que seja possível o pleno
exercício da democracia.
276
Silva (2022) aponta que em pesquisas brasileiras sobre a
competência moral em cursos de graduação, seja em Pedagogia,
Psicologia, Medicina, Enfermagem entre outros cursos, geralmente,
todas têm encontrado o seguinte resultado: os cursos de graduação
“não estão proporcionando, de forma adequada e muito menos
suficiente, em termos de conteúdo, estratégias e tipo de ambiente, o
desenvolvimento moral e, consequentemente, a formação ética de
seus alunos” (LEPRE et al., 2014, p. 132), o que indica ser um tema
problemático na Educação Superior em geral.
Outro ponto trazido por Carvalho, Soares e Ferreira (2023) e
que precisa ser melhor observado/estudado é sobre docentes que
ficam responsáveis por ministrar aulas sobre conteúdos ético-legais e
nem sempre estão qualificados para tal, o que consequentemente
compromete a formação do estudante de medicina nestes quesitos.
Assim como Piaget, também almejamos a formação de
sujeitos autônomos, moralmente falando, e para tanto, precisamos do
rompimento de ranços tradicionalistas na educação. Uma
universidade comprometida com essa formação pode e deve trabalhar
para a construção de um ambiente sociomoral com base no respeito
mútuo e na cooperação, o que é bem diferente de alguns modelos que
temos encontrado em nossas pesquisas. Corroboramos com Bataglia
(2022, p. 91) ao mencionar que: “[...] a escola tradicional valoriza o
acúmulo de conteúdos, o respeito unilateral, a competição e em uma
palavra, a heteronomia”.
Vimos que a competência moral é caracterizada pela coerência
com os próprios princípios em momentos conflituosos ou em
problemas morais difíceis, o que nos leva a pensar que esta não
277
combina com autoritarismo. Devemos educar para e na cidadania e
por que não, na/para a democracia.
Defendemos uma educação integral que realmente favoreça a
construção dessa competência e da personalidade moral. Tarefa essa
não nossa, mas de todos que atuam na Educação.
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285
A Importância das Metodologias Ativas na
Formação de Profissionais da Saúde da Atualidade
Cláudia Érika S. do Nascimento LIMA
27
Introdução
A educação tem passado por relevantes processos de
mudanças, pelos quais se estabeleceu uma nova dinâmica na relação
entre educador e educando (COLARES; OLIVEIRA, 2018). É com
base nessa afirmação das autoras, e acreditando no potencial que essas
mudanças representam no cotidiano escolar, especialmente as que
possuem relação direta com o processo de ensino-aprendizagem, que
como profissional da área da saúde e da educação, dou início a esse
texto, com a proposta inicial de promover uma reflexão sobre a
formação dos profissionais da saúde na atualidade.
Não é novidade que a formação profissional em saúde durante
muito tempo foi pautada no uso de metodologias tradicionais, tal
modelo vincula-se a um processo de ensino-aprendizagem limitado,
no qual o professor desenvolve um papel centralizado, sendo ele quem
detém e transmite o conhecimento para o aluno. Nesse cenário, o
discente se configura com o papel passivo de reproduzir o que foi
27
Mestranda em Educação pela Faculdade de Filosofia e Ciências (FFC), Universidade
Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” (UNESP), Campus de Marília, São Paulo, Brasil.
E-mail: claudia.erika@unesp.br
https://doi.org/10.36311/2024.978-65-5954-473-8.p285-302
286
repassado pelo docente, não se provocando a reflexividade e
desenvolvimento da autonomia do profissional em formação
(MITRE et al., 2008).
De modo geral, podemos afirmar que nas últimas décadas, as
instituições de ensino superior têm buscado se movimentar para o
desenvolvimento de uma educação mais autônoma, reflexiva e crítica,
onde é estimado que ocorra a migração do uso de métodos de ensino
tradicionais para implementação de métodos ativos no processo
ensino-aprendizagem dos alunos. Por outro lado, porém, pouco se
sabe como de fato fazer com que este mesmo processo seja executado
sob esta nova ótica.
Para Colares e Oliveira (2018), o ensino em saúde requer o
uso de metodologias inovadoras, pois possibilita que o estudante
consiga visualizar a sua ão nos diferentes espaços de atuação. Nessa
perspectiva, as metodologias ativas configuram um método no qual o
aluno tem condições de refletir sobre a sua realidade e assumir de fato
sua responsabilidade dentro do processo educacional.
Dessa forma, a discussão e a experiência com as metodologias
ativas de ensino possui estreita relação com concepções pedagógicas
que estimulam o aprendizado do discente, de maneira a configurar
uma estratégia importante para a formação de profissionais críticos,
reflexivos e transformadores de suas realidades, além de serem uma
possibilidade de potencializar as práticas dos profissionais de educação
em saúde junto aos usuários, famílias e comunidades que atuarão.
Baseado no exposto, e na importância que o tema em estudo
possui para os processos educativos, construiu-se a seguinte questão:
como as metodologias ativas podem ser utilizadas na formação dos
profissionais da área da saúde?
287
Por fim, o presente artigo tem como objetivo verificar como
as metodologias ativas são utilizadas na formação de profissionais da
área da saúde, através de uma revisão da literatura publicada nos
últimos cinco anos.
Metodologia
Esta é uma pesquisa do tipo bibliográfica e sua principal
vantagem é permitir ao investigador a cobertura de uma gama de
fenômenos muito mais ampla do que aquela que ele poderia pesquisar
diretamente. Neste tipo de pesquisa, utilizam-se materiais
previamente organizados com o objetivo de analisar o que foi
desenvolvido sobre um determinado tema (GIL, 2022).
Como fonte de informação para o levantamento
bibliográfico, utilizou-se o Google Acadêmico, sendo a busca feita a
partir dos seguintes descritores: “metodologias ativas” e “ensino em
saúde”. O levantamento bibliográfico foi realizado durante o mês de
julho de 2023. Na busca inicial, foram encontrados
aproximadamente 100 artigos publicados no período de 2018-2023,
a escolha desse período justifica-se pelo fato de se buscar conhecer
como tem sido trabalhado o tema em análise nos últimos cinco anos
nas instituições de ensino superior.
A partir desta amostra inicial, foi realizada a leitura do título
dos artigos, onde selecionou-se os que mais apresentavam relação com
o tema em estudo. Foram catalogados pela pesquisadora 26 artigos
científicos publicados no período de 2018 2023, com a finalidade
de organizar melhor o material encontrado.
Após essa etapa, foi realizada a leitura do resumo das 26
publicações, e nesse segundo momento, fiz a seleção delas buscando
288
utilizar as que tinham maior reconhecimento no meio acadêmico
(maior quantidade de citações e qualis da revista onde foi publicado).
Desta amostra, foram escolhidos 10 artigos científicos para serem
analisados no decorrer desta revisão de literatura.
Resultados e Discussão
A ntese dos resultados obtidos está descrita no quadro 01,
10 (dez) publicações foram analisadas integralmente e utilizadas
efetivamente para construção deste trabalho. Os artigos foram
organizados na sequência a seguir: ano de publicação, autor, título da
publicação, tipo de pesquisa e o objetivo de forma resumida.
Quadro 1 – Ano, título, tipo de pesquisa e objetivo
Ano Autor
Título da
publicação
Tipo de
pesquisa
Objetivo
1 2018
Colares, K.
T. P.;
Oliveira,
W.
Metodologias
ativas na
formação
profissional
em saúde:
uma revisão
Revisão de
literatura
Analisar a
produção
científica sobre o
uso de
metodologias
ativas na
formação
profissional em
saúde. Em caráter
secundário, busca
discorrer
brevemente sobre
a formação e
atuação do
docente da área
de saúde.
289
2 2018
Macedo, K.
D. S. et. al.
Metodologias
ativas de
aprendizagem:
caminhos
possíveis para
inovação no
ensino em
saúde.
Relato de
experiência
Relato de
experiência
realizado com a
participação de
docentes de uma
universidade
pública da região
noroeste do estado
do Rio Grande do
Sul-Brasil. Foram
realizadas oficinas
pedagógicas com
base no Arco de
Charles Maguerez.
3 2018
Barros, F.
F. et al.
Emprego de
metodologias
ativas na área
da saúde nos
últimos cinco
anos: revisão
integrativa.
Revisão
Integrativa
da literatura
Conhecer a
produção
científica
brasileira sobre
metodologias
ativas utilizadas
na área da saúde
nos últimos cinco
anos.
4 2020
Sousa, C.
E. G.
Metodologias
ativas de
ensino
aprendizagem
na área da
saúde: revisão
de literatura
Revisão
bibliográfica
Verificar as
evoluções no
processo de
ensino
aprendizagem,
evidenciar os
indispensáveis
conceitos,
ferramentas e
métodos das
intituladas
290
metodologias
ativas e salientar
sua aplicabilidade
na construção de
profissionais da
saúde,
pretendendo a
instrução de
educadores.
5 2021
Silva, Y. C;
Júnior,
E.O;
Tinoco-
Veras, C.
M.
A utilização de
metodologias
ativas na
formação de
profissionais
da saúde: uma
revisão
integrativa.
Revisão de
literatura
Realizar um
levantamento
bibliográfico
sobre as
principais
metodologias
ativas utilizadas
na formação de
profissionais da
área da saúde.
6 2021
Pereira, J.
C. et. al.
Metodologias
ativas e
aprendizagem
significativa:
processo
educativo no
ensino em
saúde.
Pesquisa de
Campo
Analisar uma
prática educativa,
segundo a teoria
da aprendizagem
significativa,
sobre
metodologias
ativas no ensino
em saúde,
realizada no
Programa de Pós-
graduação em
Ensino em
Saúde.
291
7 2021
Leitão, L.
M. B. P. et.
al.
Metodologias
ativas de
ensino em
saúde e
ambientes
reais de
prática: uma
revisão
Revisão de
literatura
Revisar a
literatura sobre as
metodologias de
ensino-
aprendizagem em
ambientes reais,
conhecendo seus
benefícios e
aplicações.
8 2021
Garcia, A.
et. al.
Utilização de
metodologias
ativas no
processo de
ensino-
aprendizagem
em saúde
Revisão de
literatura
Analisar as
literaturas
científicas sobre
as Metodologias
Ativas para a
construção do
ensino na saúde,
possibilitando
evidenciar a
relevância do
questionamento
sobre: “a
construção do
ensino em saúde”
frente ao seu
contexto de
ensino
aprendizagem
para a formação
dos futuros
profissionais da
área.
9 2022
Santos, J.
C. O. et. al.
Avaliação da
aprendizagem
nos cursos de
Revisão de
literatura
Reunir e
consolidar
informações que
292
formação em
saúde
pautados em
metodologias
ativas: revisão
integrativa.
potencializam a
tomada de
decisão frente à
promoção de
melhorias do
processo
avaliativo no
contexto de
formação em
saúde.
10 2023
Menegócio,
A. M. et.
al.
Transpondo
fronteiras em
metodologias
ativas: da
autonomia à
efetividade do
processo de
aprender a
aprender.
Revisão
sistemática
da literatura
Identificar como
o uso de
metodologias
ativas promove o
desenvolvimento
da autonomia do
graduando de
enfermagem no
processo de
aprender a
aprender.
Fonte: Dados da pesquisa
Com relação ao ano de publicação, destacou-se o ano de 2021
com 04 artigos publicados sobre o tema em estudo, em seguida têm-
se o ano de 2018 com 03 artigos. Notou-se que o ano de 2019 não
aparece na relação dos anos de publicação, podendo este dado estar
relacionado com a condição de pandemia da COVID-19 que nosso
país enfrentava, no qual as pesquisas sobre o tema, acabaram ficando
em segundo plano.
Sobre o tipo de estudo realizado, observou-se que dos 10
textos analisados, 08 tratam-se de revisões de literatura (integrativa ou
293
sistemática) e os outros 02 artigos são caracterizados, como relato de
experiência e pesquisa de campo, respectivamente. Este dado pode ser
utilizado para justificar a similaridade encontrada nos objetivos dos
artigos estudados, pois em sua maioria, as publicações objetivaram:
analisar, conhecer ou verificar como são utilizadas as metodologias
ativas no contexto de formação dos profissionais da área da saúde
inseridos em carreiras variadas, tais como: enfermagem, odontologia,
fisioterapia e medicina.
A literatura analisada coloca em evidência que os estudos
sobre o uso de metodologias ativas têm sido crescentes nos últimos
anos, devido essa estratégia ser considerada no meio acadêmico como
promissora para o desenvolvimento do processo de ensino-
aprendizagem. Com base neste dado, propomos uma reflexão sobre o
cenário em que ocorre o processo de ensino-aprendizagem,
especialmente dos profissionais da saúde, no qual os personagens
envolvidos (docentes e discentes) precisam estar dispostos a
estabelecer uma relação na qual a prioridade é a construção do
conhecimento, e consequentemente, a formação integral do aluno,
que no futuro será o profissional da área da saúde.
Com base no exposto acima, percebemos que cada um têm e
precisa cumprir o seu papel no processo de ensino-aprendizagem.
Para o discente é importante pontuar que sem maturidade, interesse
e disponibilidade de sua parte para construir o seu conhecimento,
nenhuma metodologia utilizada (por mais bem pensada, escolhida e
preparada pelo docente) trará bons efeitos. Esta perspectiva
apresentada, é reforçada com base nos resultados encontrados por
Menegócio et. al. (2023, p. 14), onde afirma-se que “o que define a
potencialidade no aprendizado se relaciona de forma direta com o
294
interesse do discente pelo conteúdo oferecido em sala de aula e pela
projeção referente a qual tipo de profissional almejam ser depois de
formados”.
Do outro lado, o docente da saúde, profissional
fundamental no desenvolvimento do processo de ensino-
aprendizagem, mas que comumente é encontrado na literatura como
“resistente” para implementar novas metodologias. Ancoro-me na
ideia de que mudar não é uma tarefa fácil, e por isso, deve ocorrer aos
poucos, para que cada um compreenda seu valor dentro do processo
que está inserido, desta forma, é esperada a ocorrência de dificuldades
por parte dos docentes da saúde. Então, como proceder para
minimizar os impactos dessas barreiras?
Acredita-se que para amenizar as dificuldades encontradas
pelos docentes, é necessário assimilar as razões pelas quais é preciso
realizar mudanças na sua prática pedagógica, e compreender a
importância do seu papel como mediador, haja vista, que esse é um
requisito fundamental para que a aprendizagem aconteça (SOUSA,
2020). É claro que a transformação pedagógica não deve ocorrer
como se fosse uma corrida para utilizar-se as metodologias ativas,
muito pelo contrário, este é um processo lento, que exige boa vontade,
engajamento e querer por parte dos professores e alunos para que flua
naturalmente e ambos se sintam satisfeitos com os resultados obtidos.
Vale ressaltar, que a maioria dos professores atualmente
lecionando no ensino superior, são frutos de uma formão
tradicional, baseada no ensino conteudista e tecnicista, portanto,
esperar que estes profissionais em sua prática sejam capazes de atuar
diferente é algo difícil de acontecer, porém, esta crítica nos
confirma a existência das barreiras para compreensão ou aplicação das
295
metodologias ativas de ensino-aprendizagem em decorrência da
deficiência ou ausência de formação pedagógica para professores
(BARROS, et. al., 2018; SOUSA, 2020).
Ademais, observou-se que alguns autores com obras
analisadas neste artigo (SOUSA, 2020; PEREIRA, et. al., 2021;
LEITÃO, et. al., 2021; MENEGÓCIO, et. al., 2023) propuseram
discussões sobre o uso de metodologias ativas de forma mista,
explorando as potencialidades do ensino tradicional e do ensino ativo
para os cursos da área da saúde, sendo esta apresentada como uma
estratégia com bons rendimentos.
Corroboramos com Menegócio et. al (2023), ao considerar
que alguns conteúdos específicos da saúde humana, ainda tem
necessidade de ser abordados no formato tradicional, colocando o
docente como facilitador primário do aprendizado de modo que o
conhecimento prévio seja ofertado ao discente, ao utilizar o ensino
misto (estratégias tradicionais e métodos ativos), aumento de
desempenho clínico dos profissionais da saúde proporcionando a
construção direta entre o conhecimento adquirido na teoria em
comparativo ao que se desenvolve na prática.
Sousa (2020) faz breve colocação nesse sentido em sua revisão
de literatura, podemos perceber no trecho abaixo:
Os todos ativos de ensino não impedem ou anulam a
metodologia convencional, ambas são capazes de serem
combinadas com sucesso no processo de adquirir conhecimentos
[...] seria pertinente executar esses métodos de forma mesclada
com a metodologia tradicional como maneira de adequação,
permitindo-se uma adesão mais ampla (SOUSA, 2020, p. 60).
296
Pereira et. al. (2021) nessa mesma linha de pensamento,
ressaltam que embora os métodos tradicionais e os métodos ativos
sejam opostos, eles não constituem uma dicotomia, sendo possível
que o ensino ocorra com os dois tipos de métodos, com variação
apenas no nível de significação, ora pois, um dos maiores problemas
do método tradicional é o fato dos conteúdos repassados não se
relacionarem de forma coerente e clara à estrutura cognitiva do
sujeito, e as metodologias ativas possibilitariam que isso ocorresse.
Dessa forma, é preciso sublinhar que o uso das metodologias
ativas precisa ser pensado de acordo com a particularidade dos alunos,
as características do curso, o perfil esperado para o egresso, o nível de
disponibilidade dos discentes para a construção da aprendizagem e a
habilidade do docente em conduzir uma metodologia que seja
adequada aos objetivos da disciplina que esteja lecionando. Somente
assim, é possível repensar o ato de ensinar uma profissão
acompanhando a atualidade e o modo de pensar da sociedade.
Acreditamos que o mais importante de tudo isso é fazer com que o
aluno perceba qual é o seu papel social, e tenha interesse em
argumentar, refletir, participar ativamente e visualizar as suas
responsabilidades como futuro profissional desde o início da sua
formação.
Os artigos analisados nos apresentam ainda diversas
metodologias ativas que podem ser utilizadas na formação dos
profissionais da saúde. Dentre elas, são citadas com maior frequência
no material estudado as metodologias: Aprendizagem Baseada em
Problemas PBL (Problem Based Learning); Aprendizagem Baseada
em Equipe TBL (Team Based Learning) e Metodologia da
Problematização.
297
Não é surpresa encontrar nos destaques essas metodologias,
que estas são as mais conhecidas no meio acadêmico, e apesar de
distintas, elas têm como base a resolução de problemas para o
desenvolvimento de habilidades na área da saúde. A Aprendizagem
baseada em Problemas PBL objetiva um ensino integrado dos
conteúdos, do ciclo de estudo e das diversas áreas envolvidas no
processo de formação, que possibilitam ao aluno que “aprenda a
aprender” e desperta a sua capacidade de tomada de decisão diante da
sua atuação profissional. Este método é bastante utilizado nos cursos
de Medicina, mas sua aplicabilidade não se restringe a ele.
Atualmente, vem sendo utilizada em cursos que possuem em seu
currículo participação com o ambiente hospitalar e atendimento de
pacientes (SILVA; JUNIOR; TINOCO-VERAS, 2021).
Sobre a Aprendizagem baseada em EquipeTBL, trata-se de
uma metodologia parecida com o método descrito acima, mas possui
suas particularidades, o TBL busca a resolução de problemas em
grupo, permitindo que o estudante tenha encontros prévios com o
docente facilitador, e aplique seus conhecimentos através da atividade
em grupo antes da aula propriamente dita. Tal ferramenta tem bons
resultados em cursos que tem como base as aulas expositivas que se
complementam com o método ativo (SILVA; JUNIOR; TINOCO-
VERAS, 2021).
A metodologia da problematização, que é um método
ancorado no debate e problematização da realidade, na qual se
trabalham situações problemas que requer dos alunos buscar uma
solução com base no conhecimento cientifico, de modo que possam
exercitar sua tomada de decisão e resolução de problemas. Nesta
metodologia, a situação problema é um disparador e o docente é
298
quem direciona os alunos para o desenvolvimento da sua capacidade
crítica e reflexiva (MACEDO et. al., 2018).
Com menor frequência, porém, não menos importantes,
foram apresentados: o Arco de Charles Maguerez; Uso de Roda de
Conversa; Mapa conceitual; Colcha de retalhos; Cordel; Portfólios;
Simulação realística; Sala de aula invertida; Uso de questões
norteadoras e o uso de tecnologias de informação e comunicação. E
por fim, métodos apresentados como específicos para formação da
área da saúde, que são: preceptor em um minuto; o momento em
cinco minutos e o método SNAPPS.
Grande parte desses métodos, são empregados de maneira
corriqueira em ambientes controlados, como salas de aula, auditórios,
unidades básicas de saúde, escolas, e por serem mais populares, são
mais simples de introduzir na rotina dos docentes e discentes, eles
também podem ser utilizados dentro das metodologias descritas
acima, como ferramenta para favorecer o processo de ensino-
aprendizagem (LEITÃO et. al., 2021).
É válido lembrar que o paciente é o que motiva a existência
dos profissionais da área da saúde, dessa forma, a formação do futuro
profissional da área da saúde é além do resultado do conteúdo
ministrado em sala de aula, reflexo da vivência do aluno e da formação
humanística que este recebe dentro da universidade.
Conclusão
A educação superior em saúde, nos últimos anos, tem passado
por transformações no que diz respeito as metodologias de ensino-
aprendizagem. Busca-se na atualidade, desenvolver no profissional da
saúde, habilidades necessárias para sua vivência profissional, tais
299
como: tomada de decisão, liderança, autonomia e criatividade na sua
forma de atuação. Para que isso ocorra, os métodos de ensino
tradicionais não seriam suficientes, devido suas limitações práticas,
que podem ser superadas com a utilização de metodologias ativas, nas
quais o aluno passa a ser o centro na construção do conhecimento,
com base em uma educação crítica e reflexiva.
A partir desta revisão de literatura, percebeu-se, que as
metodologias ativas cada vez mais têm ganhado espaço na formação
dos profissionais da área da saúde e também no meio cientifico, haja
vista que, hoje temos muitos estudos realizados sobre o tema. É claro
que, ainda muito a se avançar na discussão sobre o assunto, pois
apesar da preocupação com as mudanças nas práticas educativas, é
preciso quebrar alguns paradigmas educacionais, e esta configura uma
tarefa bastante difícil, e que exige ação coletiva, especialmente, dentro
das universidades.
A literatura indica que a formação acadêmica do profissional
da área da saúde exige o engajamento de dois personagens principais
para se alcançar bons resultados: docente e discente, trabalhando
juntos, cada um exercendo o seu papel e compreendendo o seu valor
dentro do processo educativo, para que o resultado seja ao longo dos
anos de formação o desenvolvimento de um profissional critico,
reflexivo, capaz de tomar decisões e solucionar problemas dentro do
seu ambiente de trabalho, ou seja, é preciso estar preparado para atuar
junto à comunidade, e é possível fazer isso, conhecendo na prática
as situações em que estão inseridos.
Os resultados deste artigo também direcionam para a
possibilidade de utilizar as metodologias ativas de forma mista, essa
seria uma alternativa que de acordo com os estudos, apresentaria
300
maior adesão por parte do público, deixando claro, que uma
metodologia não impede ou anula a outra, ambas possuem potencial
para ser usadas de forma combinada, desde que sejam compatíveis
com os objetivos da atividade a ser realizada.
Ao longo da análise realizada, foram levantadas as principais
metodologias ativas utilizadas em cursos da área da saúde e percebi
que foram abordadas com maior frequência a Aprendizagem Baseada
em Problemas PBL (Problem Based Learning); Aprendizagem
Baseada em EquipeTBL (Team Based Learning) e Metodologia da
Problematização. O que penso ser importante também pontuar, é
que apesar de a maioria dos estudos sobre essas metodologias ativas se
concentrarem na formação da área da saúde, elas podem ser utilizadas
em variados campos do conhecimento e em todas as etapas de ensino.
Por fim, concluímos com esta revisão da literatura que o uso
de metodologias ativas em cursos da área da saúde possuem um
potencial para alavancar a formação desses profissionais, uma vez que
o uso de novos métodos despertam aspectos positivos e
transformadores no relacionamento entre professores e alunos e
permitem o desenvolvimento e aprimoramento de habilidades para
construção de um olhar clínico que vai além do processo saúde-
doença do paciente, mas abrange a realidade do indivíduo que está
sendo assistido por esse profissional.
Referências
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cinco anos: uma revisão integrativa. Revista Espaço para Saúde, ed.
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301
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302
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na área da saúde: revisão de literatura. JNT Facit Business and
Technology journal, ed. 21; v.1, p. 51-62. Dez. 2020.
303
O Fazer Ético do Educador:
Desafios e Perspectivas na Formação e
Licenciatura em Psicologia
Thaísa Angélica Déo da Silva BERETA
28
Introdução
Nossas primeiras reflexões partem da definição do que é ética,
para que assim possamos compreender a importância de uma
formação ética, tanto na prática profissional do educador quanto na
Formação e Licenciatura em Psicologia.
Hoffman (1993) define ética como sendo uma disciplina
filosófica que reflete sobre a moral, e que pode ser entendida como
um conjunto de valores, de normas e de princípios que irão regular o
comportamento tanto humano quanto social, buscando assim, o bem
e a justiça.
para Aristóteles (2009) a ética não pode ser entendida como
uma simples teoria, mas como uma disciplina do caráter. Ou seja, não
são apenas regras abstratas, conceitos teóricos ou mesmo filosóficos,
mas o entendimento da importância de agirmos de acordo com
princípios éticos, valores morais em nossas práticas cotidianas.
28
Doutora com Estágio Pós-Doutoral em Educação pela Faculdade de Filosofia e Ciências
(FFC), Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” (UNESP), Campus de
Marília, São Paulo, Brasil. E-mail: thaisaangelica@yahoo.com.br.
https://doi.org/10.36311/2024.978-65-5954-473-8.p303-332
304
Destacamos, assim, que a ética perpassa sobre uma contínua
construção, em que o indivíduo vai se autodesenvolvendo e toma
decisões que sejam mais condizentes e mais coerentes com os valores
éticos e com o bem-estar não somente individual, mas também
coletivo.
Habermas (1987) compreende ética como a busca por aquilo
que é bom ou ainda, melhor para o ser humano. A ética aqui
compreendida como a busca pelo bem-estar do ser humano, papel
que compreendemos ser o central da educação e da função do
educador. A educação, configura-se como promotora da melhoria da
qualidade de vida dos sujeitos, para que estes possam interagir e atuar
na sociedade, em seus diversos contextos, mas sempre em defesa do
ser humano e de seu bem-estar.
Kant (1974), filósofo alemão, fundamenta a ética na busca
pelo dever e na razão prática, sendo que as ações morais deveriam ser
guiadas a partir de princípios racionais universais, independente-
mente de consequências ou de resultados, mas objetivando uma
autonomia moral do sujeito. Seus estudos apresentam a heteronomia
e a autonomia, duas tendências morais, que conduzem o sujeito e
determinam a relação que este estabelece com regras, normas e leis. A
autonomia seria a obediência irrestrita às regras, sem consciência do
seu significado, sendo que a regra vem do outro, não havendo a
construção ou elaboração pelo próprio indivíduo. autonomia é
entendida como o respeito às regras construídas pelo sujeito para si,
que estejam baseadas em princípios de igualdade e equidade. E assim,
agir moralmente, para Kant, está associado ao princípio da
universalidade, em que o bem é para a humanidade na totalidade e
não para determinadas culturas (Lepre, 2005).
305
Em diversos momentos de busca pelo termo ética, nos
deparamos com moral. Bataglia (2001) traz uma distinção entre estes
dois conceitos, sendo a moral um conjunto de regras, ou mesmo
conteúdos que o sujeito adota, se conforma e age a partir deles,
estando relacionados com “bem” e “mal”, de acordo com espaço e
tempo, nas situações do cotidiano. Para a autora, quando se fala em
ética, nos referimos a princípios, determinantes de juízo ou mesmo,
que dirigem as ações que implicam em tais juízos, discutindo, desta
forma, a coerência e incoerência dos princípios.
Para Cortina (1986) é necessária a distinção entre ética e
moral, pois a diferença está principalmente nos níveis de reflexão, em
que a moral está presente na vida cotidiana e oferece orientação
prática e direta para as ações humanas. ética, não objetiva a
orientação da conduta humana, mas consiste na reflexão sobre os
fundamentos racionais da moral (Cortina, 2001).
Tognetta e La Taille (2008) acreditam que estamos
empregando mais o termo ética do que moral, porque as referências a
este termo são consideradas mais sofisticadas e liberais, bem como,
quando falamos de ética, estamos nos referindo a busca por uma vida
boa, que deve ser vivida, enquanto moral implica em deveres (La
Taille, 2006).
A partir desta inicial apresentação do termo ética, entendemos
a urgência de construirmos reflexões sobre a ética na educação. A
formação de sujeitos conscientes, críticos e comprometidos com o
bem-estar de todos é uma das ações quando pensamos na relação da
ética com a educação.
Indo ao encontro desta discussão, Noddings (2003) amplia o
conceito de ética, nos trazendo a reflexão de que a ética do cuidado
306
de si próprio torna-se fundamental para a ética do cuidado para com
o outro, ressaltando a importância do olhar e do cuidado consigo
mesmo para exercermos a ética do cuidado para com o outro. No
contexto da educação, a autorreflexão do educador e o cuidado
consigo são fundamentais para o direcionamento das práticas
pedagógicas para com os estudantes. Caso contrário, a educação
assumiria uma perspectiva individualista e de transmissão de
conhecimentos, com a figura autoritária do docente no processo
ensino-aprendizagem, não permitindo a construção do saber pelo
estudante, inclusive de seu desenvolvimento enquanto sujeito
autônomo e atuante no contexto social.
Freire (1968) apresenta que a educação é um ato político e
ético, com a conscientização dos envolvidos e a superação da opressão,
fatores fundamentais para uma sociedade mais justa. Saviani (1991)
também aborda a ética no trabalho do educador e a prática
pedagógica comprometida com o desenvolvimento de uma sociedade
justa e igualitária. Desta forma, o educador é aquele que atua
mediando a relação do estudante com seu aprendizado, a fim de
estabelecer uma relação ética, autônoma e significativa. A verdadeira
educação visa descobrir e atualizar o melhor do sujeito, voltando-se
para o desenvolvimento das potencialidades dos estudantes (Gramsci,
2000). Assim, o espaço educacional não é aquele apenas de
escolarização, mas sobretudo, o de formação humana e ética do
sujeito, necessitando que se transforme para recepcionar essa função,
que também se faz o objetivo fundamental da educação (Rodrigues,
2001).
307
A Formação Ética do Educador
Discutir sobre a formação ética do educador é outro ponto
fundamental para o exercício responsável e consciente da profissão,
considerando a relevância que a educação tem sob a formação dos
sujeitos e a sociedade em sua totalidade.
Formar eticamente o educador, perpassa por tratarmos de
questões como a formação docente, o papel do professor na sociedade,
a ética na prática pedagógica e o compromisso assumido pela
educação, nos diversos níveis educacionais (infantil, fundamental,
médio, superior ou pós-graduação). Esta formação ética do educador,
fundamenta a atuação profissional e consequentemente, influencia a
formação moral dos estudantes, podendo ou não contribuir para a
estruturação de uma sociedade mais justa, igualitária e responsável.
Nelson Mandela (1918-2013), grande líder africano e
defensor de um sistema educacional mais equânime e digno, sempre
destacou que a educação deve ser a arma mais poderosa que pode ser
usada para a mudança do mundo (Timbane, 2022). A educação aqui
compreendida como base da estrutura do conhecimento, que
possibilita a orientação deste sujeito em seu papel na sociedade. Esta
relação entre educação e formação ética se configura como crucial
para o desenvolvimento de cidadãos e consequentemente,
profissionais, mais comprometidos com a transformação da
sociedade, com posicionamentos mais críticos sobre suas ações e o
impacto destas na formação dos estudantes.
Formar eticamente também está associada a atribuir
significado ao processo educativo, tornando este, relevante para a vida
dos estudantes, como destacado por Teixeira (1997), que educar é
embutir sentido aquilo que fazemos a cada momento. Bereta (2020)
308
em seus estudos sobre a formação na graduação em Psicologia defende
que esta formação no ensino superior precisa ser significativa,
trazendo condições dos próprios graduandos problematizarem as
situações e entenderem o outro como ser complexo, que necessita ser
compreendido integralmente e de forma contextualizada. Para tanto,
deve haver uma integração das dimensões ética, de competência moral
e política para a construção de uma visão crítica e comprometida com
o social.
Piaget (2012) nos apresenta que o objetivo verdadeiro da
educação é o de criar sujeitos que sejam capazes de construir novas
coisas e não apenas, de repetir o que outros fizeram. Neste sentido,
a formação ética do educador abrange a estimulação da criatividade,
da curiosidade e da autonomia dos estudantes, muito além da clássica
transmissão de conhecimentos, mas sim, de uma atuação pautada em
princípios éticos e críticos-reflexivos.
Para Freire (1996) o fazer docente se constitui enquanto
discência, não havendo distância um do outro. A formação ética do
educador está relacionada ao diálogo, à relação mútua de saberes e ao
respeito à autonomia do estudante.
Kohlberg (1984) ao enfatizar que a educação moral é parte da
educação total e o docente é o agente responsável por esta mudança,
reforça o papel do educador de ser agente de mudança moral, no
aprimoramento do pensamento ético de seus estudantes. Dewey
(2008) corrobora ao discorrer que a ética não é simplesmente o
entendimento do que é certo ou errado, mais principalmente, agir de
modo reflexivo e democrático no contexto social em que estamos
inseridos, priorizando o diálogo na construção de um ambiente mais
ético.
309
Entendemos, que a ética está intrinsecamente ligada ao
processo educativo, para tanto é primordial que o educador tenha
consciência e se comprometa com o desenvolvimento ético tanto de
si quanto de seus estudantes, aprimorando cotidianamente sua prática
pedagógica. Uma formação ética do educador é imprescindível para
haver o desenvolvimento integral dos estudantes sob sua
responsabilidade, pois uma educação ética, visa a construção de um
mundo mais empático e de respeito ao outro.
A função do educador também inclui auxiliar o estudante no
desenvolvimento moral que será fundamental para nortear suas ações
ao longo da vida, seja de forma pessoal e em sua atuação enquanto
profissional, resgatando o que de melhor em cada estudante.
Um educador que se compromete com sua própria formação
ética estará mais sensível aos princípios, aos valores, a integridade, ao
respeito e a busca pelo bem comum no cotidiano do exercício
profissional. Assim, a docência, nos discursos pedagógicos críticos,
objetiva a produção de sujeitos de consciência, do bem agir, de forma
crítica e emancipada (Garcia, 2009). Sendo a ética, fundamental para
guiar as ações do educador nas suas relações com os discentes, os
demais docentes e a comunidade educacional.
Sabemos que o professor acessa o aluno pela fala; ele é um
profissional da fala; é, porém, da mesma forma, um profissional
da escuta, da atenção às manifestações da singularidade de cada
um, que sua própria fala ajudou a suscitar. Então, precisamos
pensar em uma fala que esteja articulada a uma escuta
diferenciada daquilo a que se dispõe fazer um psicoterapeuta ou
psicanalista na clínica bipessoal. Ao reconhecer o investimento
que lhe é dirigido, o professor disponibiliza-se para um encontro
com o aluno, sem o qual a relação educativa apenas cumprirá a
310
função objetiva de transmissão de conteúdos pedagógicos, sem
cuidados, sem criatividade, sem escuta às demandas do aprendiz
(Soares, 2011, p. 80).
Nesta relação mútua promovida pelo espaço educacional, o
docente necessita despertar no estudante uma percepção sobre o seu
processo ensino-aprendizagem e mobilizar neste, ações autônomas
para as relações e intervenções que vão sendo solicitadas e decorrentes
deste processo. Para tanto, reforçamos que a função docente assume
uma importante responsabilidade sobre a formação de sujeitos mais
éticos e conscientes de seu papel social e nos contextos diversificados
de atuação profissional.
A Formação em Psicologia
Nossa reflexão neste momento, pauta-se especificamente
sobre a formação em Psicologia, um breve histórico da consolidação
da profissão no país e como esta vem acontecendo, a partir da
ampliação dos cursos de graduação pelo país.
Os primeiros cursos de graduação em Psicologia no Brasil são
da cada de 1950, antecedendo a regulamentação da profissão de
psicólogo, que aconteceu em 27 de agosto de 1962, pela Lei n
4.119, mas com imprecisões sobre as terminologias: Formação de
Psicólogo, Bacharelado e Licenciatura (Yamamoto, 2006). Isso não
significa que não presenciamos na história registros de formação em
Psicologia anteriores, como na década de 1930, com um curso regular
de formação em Psicologia, no Instituto de Psicologia do Rio de
Janeiro, a partir do Decreto n.º 21.173/32 (Centofanti, 1982).
311
A Psicologia foi se consolidando ao longo da história e tendo
um olhar voltado para o aprimoramento da formação de seus
profissionais. Rudá, Coutinho e Almeida-Filho (2015) discutem que,
a partir do avanço dos cursos de Psicologia no Brasil, houve a
necessidade da Lei n.º 4.024/61, posteriormente regulamentada pela
Resolução n.º 28/62, que objetivava a organização de um Currículo
Mínimo (CM), para a formação em Psicologia, em que haveria
necessidade de disciplinas para a graduação. O Parecer n.º 403/62 do
Conselho Federal de Psicologia (CFP) veio para dispor sobre o
currículo mínimo para a graduação em Psicologia, discorrendo sobre
as disciplinas necessárias para o Bacharelado, para a Licenciatura e
para a Formação de Psicólogos, inclusive trazendo a regulamentação
da duração de quatro anos para Bacharelado e Licenciatura e de cinco
anos para a Formação de Psicólogos, nesta com destaque para as
práticas de estágio supervisionado (Bereta, 2020, 2022; Costa et al.,
2012).
O CM somente foi substituído, no ano de 2004, pelas
Diretrizes Curriculares Nacionais - DCN’s, que apresentavam uma
nova dinâmica na formação do profissional da Psicologia (Rudá;
Coutinho; Almeida-Filho, 2015). Com as DCN’s de 2004 houve
uma habilitação única para a formação em Psicologia, após diversas
negociações sobre como deveria ser a formação em Psicologia no país,
sendo que em 2011, aconteceram mudanças nas DCN’s para uma
habilitação complementar de licenciatura, em que os Projetos
Pedagógicos dos cursos deveriam trazer especificações para a
Formação do Professor de Psicologia na atuação em Educação Básica.
Com a indiferença das instituições de ensino superior às novas
312
DCN’s, houve uma desvalorização das licenciaturas no Brasil (Rudá;
Almeida Filho, 2019).
A Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Psicologia
(ABEP, 2017) destaca que as DCN’s que foram instituídas em 2011,
e que estruturam normativas no projeto pedagógico complementar
para a formação de professores de Psicologia, partem de uma
manifestação coletiva, demandada por coordenadores de Cursos de
Psicologia, no sentido de apresentar demandas da formação de
professores de Psicologia, surgidas em 2004, após as DCN’s, que
destacam que o projeto pedagógico deve objetivar competências e
habilidades básicas previstas no núcleo comum do Curso de
Psicologia e nas DCN’s para a formação do professor da Educação
Básica, em nível superior.
Assim, as DCN’s de 2004 foram publicadas pela Resolução
CNE/CES n.º 8/2004 e republicadas com alterações em 2011, pela
Resolução CNE/CES n 5/2011, principalmente no artigo 13, que
versa sobre o projeto complementar da Licenciatura. Com o avanço
da ciência e da atuação que a profissão foi assumindo ao longo da
história a necessidade de se pensar sobre os parâmetros e princípios
da formação, com isso entidades representantes da classe profissional
(Conselho Federal de Psicologia, Associação Brasileira de Ensino em
Psicologia e Federação Nacional dos Psicólogos) se reuniram para
discutir novas DCN’s, reafirmando a importância da construção de
uma formação dos profissionais da Psicologia, que preze pela
qualificação, pelas necessidades da população e por conhecimentos
nesta área do saber científico (Brasil, 2018).
Para Bereta (2022) essas novas DCN’s, permitem a
estruturação de grades curriculares organizadas em eixos,
313
considerando a formação do psicólogo generalista e atuante na
sociedade, tanto nas intervenções de âmbito individual quanto
coletivo, defendendo principalmente, uma formação qualificada e
ética. tendo sido possível, depois destes anos desde a implantação
das DCN’s de 2004 e da republicação com alterações no projeto
complementar ofertado pela Licenciatura em 2011, avaliar a
efetividade e a necessidade de revisões para uma formação que esteja
próxima às necessidades da sociedade e da evolução dos
conhecimentos psicológicos (Brasil, 2018).
Realizando a leitura da minuta das novas DCN’s (CFP,
2018), destacamos alguns pontos centrais para a formação em
Psicologia: i) uma formação que deve ser científica, ética, política,
generalista, humanista, crítica, reflexiva, democrática e laica; ii)
presencial, generalista, multi e interdisciplinar; iii) com componentes
curriculares estruturados em eixos; iv) uma base comum para a
formação em Psicologia no país, mas pode se diferenciar em ênfases
curriculares; v) integração entre ensino, pesquisa e extensão; vi) com
carga horária total mínima de quatro mil horas, integralização
mínima em cinco anos; vii) metodologias de ensino e aprendizagem
diversificadas, com destaque para a construção do conhecimento de
forma ativa e colaborativa; viii) avaliação contínua do processo de
ensino-aprendizagem com diversidade de instrumentos; ix) estágios
supervisionados em dois níveis Estágios do Núcleo Comum e
Estágios Específicos; x) atividades complementares; xi) ter um
serviço-escola de Psicologia; xii) suporte, acolhimento e apoio
psicossocial e pedagógico aos graduandos; xiii) Trabalho de
Conclusão de Curso apresentado no formato de monografia, artigo
científico ou relatório de pesquisa; xiv) projetos de extensão
314
relacionados aos eixos estruturantes do curso; xv) projeto pedagógico
complementar e diferenciado para a Formação de Professores de
Psicologia.
A homologação das novas DCN's, em 11 de outubro de 2023,
por meio da Resolução CNE/CNS n.1/2023, permite uma ampliação
sobre o olhar da formação, que prioriza o humano, as relações, as
intervenções na sociedade, a criticidade, a reflexão, a ética, a
integração entre teoria, técnica e prática, o destaque para o tripé
ensino, pesquisa e extensão, a função do docente/formador enquanto
mediador do processo ensino-aprendizagem, do graduando como
ponto central deste processo e do egresso enquanto articulador do
conhecimento psicológico nos diferentes contextos interventivos.
Quando priorizamos a ética na formação de psicólogos,
entendemos que esta deve ser pautada em princípios que sejam
sólidos, que garantam uma atuação profissional responsável,
confidencial e, ao mesmo tempo, respeitosa. Neste sentido, o avanço
da ciência psicológica vem a partir de uma investigação cuidadosa,
por fundamentos empíricos e objetivos, que buscam a compreensão
do comportamento humano e dos processos mentais (Milgram,
1983).
Rogers (2012) nos apresenta que cada sujeito é único, é um
mundo em si, e que as teorias não podem abranger toda essa riqueza
e complexidade presente na existência humana. Para tanto, o
profissional psicólogo que precisamos formar é justamente aquele que
aprimora o desenvolvimento da empatia e da compreensão do outro,
entendendo que o encontro terapêutico é uma possibilidade de
acolhimento e compreensão mútua, em que o terapeuta não detém
315
todas as respostas, mas atua como um facilitador da ação de
autoconhecimento do sujeito (Yalom, 2010).
Desta forma, reforçamos o destacado por Soares (2011, p.
81), ao entender que:
O professor tenha também sua parcela de responsabilidade no
investimento relacional em uma formação universitária que pode
tanto limitar-se a ficar voltada para o mercado consumidor,
formando consumidores que serão consumidos por outros
consumidores, ou agir de modo a contribuir para habilitar seus
alunos para uma prática criativa e crítica, formando agentes de
transformação.
Em outro trabalho, Bereta (2020) também vai ao encontro
dessa reflexão ao considerar que a prática docente nos Cursos de
Graduação em Psicologia devem estar articuladas com uma
participação ativa e crítica, refletindo sobre mudanças, readequações
curriculares, estruturação de projetos, integração das DCN’s nos
projetos pedagógicos do curso, para que assim, possamos pensar em
uma formação que permita que o graduando seja um agente de
transformação social, saindo de um lugar passivo para mais ativo e
atuante no processo formativo e profissional.
A Licenciatura em Psicologia
Neste ponto de discussão gostaríamos de discorrer
especificamente sobre a Licenciatura em Psicologia e o quanto esta
não vem sendo prioridade quando falamos na Formação em
Psicologia. Para estas discussões apresentaremos mais detalhadamente
a Resolução n.º 5, de 15 de março de 2011, que instituiu as DCN's
316
para os cursos de Graduação em Psicologia, mais especificamente,
estabelecendo normas para o Projeto Pedagógico Complementar para
a Formação de Professores de Psicologia. No artigo 13 (Brasil, 2011,
p. 05) é apresentado que “a Formação de Professores de Psicologia
dar-se em um projeto pedagógico complementar e diferenciado,
elaborado em conformidade com a legislação que regulamenta a
formação de professores no País”.
Um projeto pedagógico complementar para a Formação de
Professores de Psicologia necessita contemplar os seguintes objetivos:
a) complementar a formação dos psicólogos, articulando os
saberes específicos da área com os conhecimentos didáticos e
metodológicos, para atuar na construção de políticas públicas de
educação, na educação básica, no nível médio, no curso Normal,
em cursos profissionalizantes e em cursos técnicos, na educação
continuada, assim como em contextos de educação informal
como abrigos, centros socioeducativos, instituições comunitárias
e outros; b) possibilitar a formação de professores de Psicologia
comprometidos com as transformações político-sociais,
adequando sua prática pedagógica às exigências de uma educação
inclusiva; c) formar professores de Psicologia comprometidos
com os valores da solidariedade e da cidadania, capazes de
refletir, expressar e construir, de modo crítico e criativo, novos
contextos de pensamentos e ação (Brasil, 2011, p. 05).
Tais objetivos vem ao encontro das considerações promovidas
ao longo deste capítulo, e neste ponto ao destacarmos sobre a
formação de psicólogos para atuação em Licenciatura, precisamos
compreender a importância de integrar conhecimentos didáticos e
metodológicos para a atuação em diferentes níveis e contextos
educacionais, mais ao mesmo tempo, priorizar uma formação de
317
professores articulados com as transformações políticas, sociais e
inclusivas, com valores de solidariedade, cidadania, que expressem e
construam atuações críticas e criativas para suas ações.
A Formação de Professores de Psicologia também deve
assegurar conhecimentos, habilidades e competências a partir de eixos
estruturantes:
a) Psicologia, Políticas Públicas e Educacionais, que prepara o
formando para compreender a complexidade da realidade
educacional do País e fortalece a elaboração de políticas públicas
que se articulem com as finalidades da educação inclusiva;
b) Psicologia e Instituições Educacionais, que prepara o
formando para a compreensão das dinâmicas e políticas
institucionais e para o desenvolvimento de ações coletivas que
envolvam os diferentes setores e protagonistas das instituições,
em articulação com as demais instâncias sociais, tendo como
perspectiva a elaboração de projetos político- pedagógicos
autônomos e emancipatórios;
c) Filosofia, Psicologia e Educação, que proporciona ao
formando o conhecimento das diferentes abordagens teóricas
que caracterizam o saber educacional e pedagógico e as práticas
profissionais, articulando-os com os pressupostos filosóficos e
conceitos psicológicos subjacentes;
d) Disciplinaridade e interdisciplinaridade, que possibilita ao
formando reconhecer o campo específico da Educação e percebê-
lo nas possibilidades de interação com a área da Psicologia, assim
como com outras áreas do saber, em uma perspectiva de
educação continuada (Brasil, 2011, p. 05-06).
Não diferentemente do bacharelado e da formação de
psicólogos, a formação de professores de Psicologia vai ao encontro
das políticas blicas, da interdisciplinaridade, da integração da
318
Psicologia com outros saberes, do conhecimento de diferentes
abordagens teóricas e de uma educação continuada, em que se é
possível discutir e refletir mais sobre as ações que vem sendo
desenvolvidas, priorizando a autonomia e o processo emancipatório.
Destacamos agora os conteúdos que devem ser oferecidos pela
Formação de Professores de Psicologia e complementados com
estágios que possibilitem a prática do ensino.
a) destaquem e promovam uma visão abrangente do papel social
do educador, assim como a reflexão sobre sua prática e a
necessidade de aperfeiçoamento contínuo do futuro professor; b)
articulem e utilizem conhecimentos, competências e habilidades
desenvolvidos no curso de Psicologia para a ampliação e o
amadurecimento do papel de professor; c) considerem as
características de aprendizagem e de desenvolvimento dos
alunos, o contexto socioeconômico e cultural em que atuarão na
organização didática de conteúdos, bem como na escolha das
estratégias e técnicas a serem empregadas em sua promoção; d)
promovam o conhecimento da organização escolar, gestão e
legislação de ensino referentes à educação no Brasil, assim como
a análise das questões educacionais relativas à dinâmica
institucional e à organização do trabalho docente; e) estimulem
a reflexão sobre a realidade escolar brasileira e as articulações
existentes com as políticas públicas educacionais e o contexto
socioeconômico mais amplo (Brasil, 2011, p. 06).
A prática profissional professor-aluno deve acontecer a partir
de: perspectiva de análise do trabalho educativo, entendimento desta
complexidade, planejamento das atividades, promoção da reflexão,
trabalho em equipe, enfrentamento de problemáticas decorrentes do
processo ensino-aprendizagem, reflexão sobre políticas educacionais,
319
projetos político-pedagógicos institucionais e ações político-
pedagógicas (Brasil, 2011).
Em relação à carga horária para a Formação de Professores de
Psicologia, esta deve ter minimamente oitocentas horas, acrescidas
à carga horária do curso de Psicologia, e distribuídas em: quinhentas
horas de conteúdos específicos da área da Educação e trezentas horas
de estágio curricular supervisionado. Essas atividades relacionadas à
Formação de Professores, serão complementares aos cursos de
Psicologia, sendo oferecidas aos graduandos, com a opção de optar ou
não, por sua realização. Assim, aqueles que optarem e cumprirem
satisfatoriamente as exigências contidas no projeto complementar,
terão em seus diplomas do Curso de Psicologia, apostilada a
Licenciatura (Brasil, 2011).
No entanto, sabemos o quanto a Licenciatura em Psicologia
vem enfrentando desafios. Muitos cursos de Graduação em Psicologia
optaram por não mais oferecer a Formação de Professores de
Psicologia, mantendo o Bacharelado e a Formação para Psicólogo.
Entendemos ser de grande importância à Formação de Professores de
Psicologia continuar sendo oferecida pelos cursos, como uma
formação complementar, optativa, em que o aluno poderá ter a
escolha de cursar. Sabemos o quanto isso poderia onerar a graduação
em Psicologia, mas defendemos que este pode ser um diferencial
dentre os novos cursos de Psicologia.
Quando pensamos na atuação destes profissionais psicólogos
que também optaram por uma Formação de Professor de Psicologia,
e quais as perspectivas de atuação no contexto que vivemos, devemos
considerar que as ações destes profissionais podem estar integradas às
políticas públicas, educação básica, nível médio, cursos
320
profissionalizantes, cursos técnicos, educação informal (abrigos,
centros socioeducativos e instituições comunitárias), como a própria
resolução destaca (Brasil, 2011).
Com a homologação das novas DCN’s, a Formação de
Professores de Psicologia será uma oferta optativa pelos cursos de
graduação em Psicologia, devendo constituir-se em um projeto
pedagógico complementar e diferenciado. Este projeto deve
promover as competências básicas para a prática reflexiva e crítica,
bem como pautar-se pelos marcos legais para o exercício do
magistério. Também se compreende, que dado o rápido
desenvolvimento do conhecimento e dos recursos tecnológicos
voltados ao processo ensino-aprendizagem, aos novos conceitos e
diferentes modos de operar, as DCN’s precisarão ser revistas e
atualizadas com mais frequência (Brasil, 2018).
Fazendo um contraponto com as DCNs de 2023, em seu
artigo 24, compreendemos que a formação de professores de
Psicologia deve estar articulada com competências em torno dos
seguintes eixos estruturantes:
I - Políticas públicas e educacionais que preparem o estudante para
compreender a complexidade da realidade educacional do país e
contribuir para a elaboração de políticas públicas que se articulem
com as finalidades da educação; II - Sistemas e Instituições
Educacionais que orientem o estudante para a compreensão das
diferentes dinâmicas institucionais e para ações coletivas,
objetivando a elaboração de projetos político-pedagógicos
democráticos, inclusivos e emancipatórios; III - Fundamentos
científicos da educação, que proporcionem ao estudante conhecer e
integrar conhecimentos de diferentes campos científicos (Filosofia,
História, Sociologia e outros) para lidar com as distintas abordagens
321
teóricas que caracterizam o campo educacional; IV -
Interdisciplinaridade e multidisciplinaridade que possibilitem ao
estudante reconhecer as especificidades e interfaces do campo da
Educação com diferentes áreas, em especial, com a Psicologia; V -
Práticas pedagógicas que preparem o estudante para atuar em face
dos distintos processos e em contextos educacionais diversos, com
diferentes recursos pedagógicos, fazendo bom uso de tecnologias da
informação e comunicação; VI - Língua Brasileira de Sinais,
conforme o Decreto nº 5.626, de 22 de dezembro de 2005, que
permita o efetivo desenvolvimento e aprendizagem do estudante
surdo e favoreça as relações sociais inclusivas; VII - História da África
e História Indígena, conforme disposto nas Leis nº 10.639, de 9 de
janeiro de 2003 e nº 11.645, de 10 de março de 2008, para
ampliação dos conhecimentos relativos à história e à cultura
brasileiras e ao enfrentamento do racismo e do preconceito; e VIII -
Transversalidade temática, que prepare o estudante para abordar
temas no currículo que envolvam conhecimentos, vivências e
reflexões sistematizadas, como Direitos Humanos, Educação
Ambiental, Educação das Relações Étnico-raciais, entre outras
(Brasil, 2023, p. 56).
As novas DCN’s priorizam a formação de professores de
Psicologia a partir da promoção de competências básicas para uma
prática pedagógica que seja reflexiva e crítica, bem como
comprometida com a ética da educação e ética escolar.
Os resultados de pesquisa desenvolvida por Machado,
Kohatsu e Pereira (2023) com egressos de oito instituições de Ensino
Superior dos estados do Rio Grande do Sul, Rio de Janeiro, Goiás e
São Paulo revelam que a motivação por cursar a Licenciatura ocorreu
pelo interesse/gosto pela educação, mesmo havendo o
desconhecimento dos egressos de possibilidades de inserção
profissional, ou ainda, que não atuem e/ou pretendam atuar como
322
docentes de Psicologia na Educação Básica. Corroborando com os
resultados, os autores entendem que a inclusão da Psicologia no
currículo do Ensino dio contribui para discussões sobre direitos
humanos, enfrentamento de políticas de dominação e opressão e para
um processo de ensino-aprendizagem com mais engajamento e senso
crítico, sendo defendida a continuidade e a qualidade da Formação
de Professores de Psicologia.
Neste sentido, entendemos que o olhar e os debates sobre a
Formação de Professores de Psicologia devem continuar acontecendo
e serem ampliados, considerando as perspectivas de atuação para além
dos desafios que vivenciamos com a retirada da Psicologia do Ensino
Médio. A falta de debates sobre a Formação de Professores de
Psicologia pode estar relacionada com a desvalorização da profissão
docente (Machado, 2016), prejudicando a concepção que
graduandos e docentes têm sobre esta modalidade de formação
(Amado, 2013).
Considerações Finais
Contudo, nosso objetivo enquanto docentes de cursos de
formação em Psicologia é o de ir ao encontro da fala de Soares (2009,
p. 40) de que “não pretendemos formar um aluno da graduação em
Psicologia repetidor de teorias e mero aplicador de técnicas,
totalmente dominado pela fala de seus mestres isso seria formatar,
e não formar um futuro profissional”.
Formar um profissional para um fazer ético, é muito mais
amplo do que possibilitar a ele conhecimentos teóricos sobre a área
de atuação. É entender que ao longo do processo formativo, devem
ser desenvolvidas práticas que permitam ao graduando a reflexão de
323
que a ética é uma instância crítica e as situações que serão vivenciadas
nas intervenções individuais, grupais e institucionais perpassam por
este entendimento, de que um Código de Ética Profissional coloca
parâmetros para a atuação, mas em nenhum momento, irá dispensar
a reflexão sobre as ações/atitudes.
No entanto, continuamos a vivenciar nos espaços
educacionais das faculdades/universidades um ensino tradicionalista,
que integra teoria e técnica, não permitindo ao estudante uma
construção de sua formação ética a partir da integração também da
práxis.
Práttein é o infinitivo do verbo grego para designar ação,
atividade, realização. É o ato de percorrer um caminho até o fim;
executar, cumprir, realizar alguma coisa por si mesmo. Desse
verbo deriva o substantivo práxis, que em Aristóteles trata-se de
uma ação na qual o agente, o ato e o resultado da ação são
inseparáveis, como partes que existem somente em conjunto
(Teles, 2005, p. 123).
Estudos de Bataglia e Bortolanza (2012) e Bereta (2018)
apresentam que embora seja esperado o desenvolvimento de
oportunidades de assunção de responsabilidade e reflexão dirigida ao
longo da graduação em Psicologia, comparativos entre os estudantes
de início e final dos cursos estudados, não tem apresentado diferenças
significativas, mantendo baixos índices, podendo ser justificado pelo
pouco envolvimento dos estudantes nas problematizações, em
discussões sobre a prática profissional e na integração entre o tripé:
teoria, técnica e práxis.
Caminhando neste sentido, concluímos que são muitos os
desafios para a formação e licenciatura em Psicologia, principalmente
324
por entendermos que este fazer ético integra o ambiente acadêmico
da universidade com valorização de oportunidades de assunção de
responsabilidade e reflexão dirigida, o docente como mediador do
processo ensino-aprendizagem, a interdisciplinaridade no ensino da
ética, o uso de metodologias mais ativas nas interações em sala de aula
e nas supervisões de práticas de estágio e uma formação integral dos
graduandos (Bereta, 2022).
E quais as perspectivas para a Formação e Licenciatura em
Psicologia no país? Entendemos que a resposta para tal
questionamento vai ao encontro do compromisso das instituições de
ensino superior com a qualidade dos serviços ofertados, não na busca
constante por novos cursos e vagas disponíveis nos vestibulares,
culminando em ensinos cada vez mais distantes e à distância.
O Conselho Federal de Psicologia defende que a Psicologia se
Faz com Presença. Esta presença está no compartilhamento dos
espaços educacionais e nas discussões que permeiam as nossas ações
enquanto profissionais psicólogos. Se fazer presente é buscar a
Psicologia nos diversos espaços nos quais o nosso trabalho pode ser
desenvolvido. A Psicologia tem muito a oferecer, enquanto ciência e
profissão e devemos objetivar uma formação sólida, generalista e ética,
que contemple o estudante como agente principal no processo
formativo, preparando-o para atuar profissionalmente, enquanto
psicólogo e/ou licenciado em Psicologia.
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333
A Formão Ética do(a) Futuro(a) Psicólogo(a):
Avaliação da Competência Moral na Graduação
em Psicologia
Matheus Estevão Ferreira da SILVA
29
Patrícia Unger Raphael Bataglia
30
Introdução
Este capítulo aborda resultados parciais de uma pesquisa de
Mestrado concluída, desenvolvida entre os anos de 2020 e 2022,
intitulada Competência moral, gênero e sexualidades, e religiosidade na
formação inicial pública paulista em Pedagogia e Psicologia
31
(SILVA,
2022). Essa pesquisa de Mestrado foi proposta como continuidade de
29
Doutorando em Educação pela Faculdade de Filosofia e Ciências (FFC), Universidade
Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” (UNESP), Campus de Marília, São Paulo, Brasil.
E-mail: matheus.estevao2@hotmail.com
30
Docente da Faculdade de Filosofia e Ciências (FFC), Universidade Estadual Paulista “Júlio
de Mesquita Filho” (UNESP), Campus de Marília, São Paulo, Brasil. E-mail:
patrícia.bataglia@unesp.br
31
Essa pesquisa contou com o financiamento do Conselho Nacional de Desenvolvimento
Científico e Tecnológico (CNPq), pelo processo de n.º 131735/2020-9, no período de
01/03/2020 a 31/10/2020, e com o financiamento da Fundação de Amparo à Pesquisa do
Estado de São Paulo (FAPESP), pelo processo de n.º 2020/05099-9, com previsão de
vigência de 01/11/2020 a 31/01/2022, sob orientação da Prof.ª Dr.ª Patrícia Unger Raphael
Bataglia e co-orientação da Prof.ª Dr.ª Tânia Suely Antonelli Marcelino Brabo.
https://doi.org/10.36311/2024.978-65-5954-473-8.p333-354
334
uma pesquisa anterior realizada pelo primeiro autor, entre os anos de
2017 e 2018, na modalidade de Iniciação Científica (IC) no contexto
da formação inicial universitária pública paulista em Pedagogia
32
(SILVA, 2018).
Nessa pesquisa anterior, teve-se como objetivo investigar a
formação em gênero e sexualidades de graduandos(as) em Pedagogia
e relacioná-la com sua formação ética, do ponto de vista do
desenvolvimento moral, nas abordagens kohlberguiana e neo-
kohlberguiana (KOHLBERG, 1992; REST et al., 1999). Em sua
metodologia, no que tange ao trabalho de campo, para avaliação da
formação ética dos(as) graduandos(as) em Pedagogia do curso que
ambientou a pesquisa, elegeu-se o Defining Issues Te st-2 (DIT-2),
instrumento quantitativo fechado e validado de medida do jzo
moral. Assim, os resultados obtidos com esse instrumento revelaram
não haver qualidade moral satisfatória proporcionada durante a
passagem dos(as) estudantes nesse curso, além de que isso apresentou
forte relação com a variável religiosidade.
Para aprofundar esses e outros resultados encontrados, de
modo a atestá-los em um diagnóstico mais preciso sobre o estado da
formação inicial em Pedagogia oferecida no contexto da Educação
Superior, vimos a necessidade de novas aplicações. Ou seja, a
necessidade de se investigar outras realidades e ambientes
32
Essa pesquisa anterior intitulou-se Educação em direitos humanos, gênero e sexualidades, e
desenvolvimento moral na formação docente: conhecimentos, concepções e condutas de
graduandos(as) em Pedagogia de uma universidade pública do estado de São Paulo, e foi
financiada pela FAPESP pelo processo de n.º 2017/01381-9 e com vigência de 01/05/2017
a 31/12/2018, sob orientação da Prof.ª Dr.ª Tânia Suely Antonelli Marcelino Brabo e co-
orientação da Prof.ª Dr.ª Alessandra de Morais. Resultados parciais desta pesquisa
encontram-se também divulgados na presente coletânea, no capítulo A formação ética do(a)
futuro(a) educador(a): avaliação do juízo moral na graduação em Pedagogia.
335
universitários de formação, tanto em Pedagogia como de outras
licenciaturas e cursos de graduação, para verificar se esses resultados
estão condizentes ou se são fruto de condicionantes próprios da
amostra e do ambiente anterior investigado.
Assim, desenvolvemos a referida pesquisa de Mestrado com o
objetivo de investigar a relação entre competência moral, gênero e
sexualidades, e religiosidade na formação inicial pública paulista em
Pedagogia e Psicologia. Desse modo, a amostra participante consistiu
em quatro cursos universitários, dois cursos de Pedagogia e dois cursos
de Psicologia, todos pertencentes a uma Universidade pública do
estado de o Paulo. Então, além de se debruçar novamente sobre a
formação inicial do(a) pedagogo(a), buscou-se também se debruçar
sobre a formação inicial do(a) psicólogo(a) comparando-a com o
contexto da Pedagogia. Desta vez, para a avaliação da formação ética
dos(as) graduandos(as), recorreu-se ao constructo competência moral,
e não de juízo moral (mensurado pelo DIT-2), a partir do
entendimento de que a atuação profissional depende da integração de
aspectos afetivos, cognitivos e conativos, o que é melhor avaliado a
partir desse constructo. Para isso, utilizou-se do Moral Competence Tes t
extended (MCT_xt), instrumento quantitativo fechado e validado que
mensura a competência moral.
O conceito de competência moral foi fundado pelo psicólogo
estadunidense Lawrence Kohlberg (1992) no que tange à obra desse
autor sobre o desenvolvimento moral. Porém, foi o psicólogo alemão
Georg Lind (2019) que, em estudos que desenvolveu ao longo de
quatro décadas, retomou, desenvolveu e operacionalizou esse conceito
de competência moral de Kohlberg (1992). Como esse autor expressa,
a “denição de Kohlberg para a competência moral era a capacidade
336
de tomar decisões e emitir juízos que são morais (isto é, baseados em
princípios internos) e agir de acordo com tais juízos’ (KOHLBERG,
1964, p. 425 apud LIND, 2019, p. 52, tradução nossa).
Assim, para Lind (2019, p. 52, tradução nossa), “Kohlberg e
Piaget costumavam usar o termo juízo para descrever o raciocínio
moral verbal”, de modo que isso (o raciocínio) se trataria de um
fenômeno interno, mas externamente observável por meio do juízo
que é emitido verbalmente, enquanto a competência moral é um
processo inconsciente do qual as pessoas podem não estar cientes e
não revelam em suas reflexões éticas”. Logo, tratar-se-ia de um
fenômeno que não pode ser coletado mediante os métodos usuais,
como o de Kohlberg (1992), para mensuração do juízo moral.
De forma resumida, esclarecemos em trabalho anterior o
conceito de competência moral:
[...] agir moralmente depende do desenvolvimento de uma
capacidade, a de refletir e aplicar consistentemente princípios em
situações difíceis, dilemáticas. Quando nos defrontamos a essas
situações que exigem de nós uma resposta e os cursos de ação
possíveis são conflitantes e mutuamente excludentes, somos
mobilizados afetivamente e, nesse momento, exibimos ou não a
capacidade de agir de acordo com princípios, apesar da comoção.
É essa capacidade [...] a competência moral (SILVA; BATAGLIA,
2020, p. 528).
Assim, ser competente moralmente significa ser coerente na
sua conduta ética cotidiana, o que se mostra muito interessante pensar
a questão da ética profissional. E, no caso dos(as) profissionais de
Psicologia, que são profissionais da área da Saúde que prestarão
atendimento nos mais diferentes setores da sociedade, enfrentarão
337
cotidianamente dilemas morais e temas éticos relacionados, que
demandam capacidade reflexiva suficiente para o desenvolvimento de
um trabalho devidamente fundamentado e baseado em princípios.
Assim, o desenvolvimento da competência moral é requerido no
sentido de serem capazes de desempenhar adequadamente essa
demanda de trabalho, de fazê-lo de acordo com a responsabilidade
legal e social de sua profissão.
o sendo possível abranger todos os resultados obtidos com
o MCT_xt nos quatro cursos participantes, muito menos dos
resultados encontrados com os demais instrumentos utilizados para
avaliar os outros aspectos de formação investigados pela pesquisa
33
,
decidimos por abordar os resultados referentes a um dos cursos de
Psicologia. Dessa forma, neste capítulo, temos como objetivo analisar
a formação ética, do ponto de vista do desenvolvimento moral,
dos(as) graduandos(as) em Psicologia de uma Universidade pública
paulista.
o obstante, cabe ressaltar que, na discussão da formação
ética do(a) educador(a), consideramos pertinente a abordagem da
formação do(a) psicólogo(a) além de essa abordagem ser importante
para testar nossa hipótese em outros contextos de formação, como
mencionado –, pois, no Brasil, a profissão também atende a
modalidade de Licenciatura: para a Formação de Professores de
Psicologia (RUDÁ; ALMEIDA FILHO, 2019; BERETA, 2018).
Embora desde o período da regulamentação da profissão no país haja
regulamentação para a Licenciatura em Psicologia, para além do
33
No caso, os constructos de concepções sobre gênero e sexualidades, em que se utilizou de
um questionário elaborado durante a pesquisa, e de adesão à religiosidade, em que se utilizou
da Post-Critical Belief Scale (PCBS).
338
Bacharelado, com a instituição das Diretrizes Curriculares Nacionais
para os cursos de graduação em Psicologia (2004; 2011) houve a
contemplação de especificidades para a Formação do Professor de
Psicologia na atuação em Educação Básica. Ainda assim, grande parte
dos cursos de Psicologia optam por não oferecer a Licenciatura,
desvelando a falta de importância que se atribui a esse campo em que
o(a) psicólogo(a) pode atuar. Logo, levanta-se a importância de se
investigar a sua formação ética diante dessa possibilidade de atuação
como educador(a).
Metodologia
Lind (2019) elaborou o Moral Competence Test (MCT) com
base proposta de Kohlberg (1992) sobre a competência moral. Em
sua composição original, o MCT é composto por dois dilemas morais,
um primeiro relacionado a uma situação trabalhista em que operários
roubam documentos para denunciar a empresa em que trabalham, o
dilema do operário (Workers’ Dilemma), e o segundo dilema
relacionado à eutanásia, o dilema do médico (Doctor’s Dilemma).
Depois de -los lido, o(a) respondente do instrumento é confrontado
com a decisão tomada pelo protagonista de cada dilema. Após, o(a)
respondente é questionado numa escala Likert de extensão 7 (de -3 a
+3) se concorda ou discorda com a atitude do protagonista do dilema.
Por fim, o(a) respondente deve avaliar algumas alternativas,
distribuídas em uma escala Likert de extensão 9 (de -4 a +4),
referentes a argumentos a favor e contra sua própria opinião. Esses
argumentos apresentam diferentes qualidades morais, que se baseiam
nos estágios kohlberguianos do desenvolvimento moral.
339
Para Lind (2019), o trabalho de apreciar e reconhecer a
qualidade de argumentos a favor e contra à própria opinião requer
uma capacidade que envolve a estrutura cognitiva e exige uma postura
não dogmática em relação a sua própria opinião, sendo essa
capacidade o que o MCT se propõe mensurar: a competência moral.
Com isso, é possível analisar o grau de coerência com que o(a)
respondente diferencia e integra princípios morais e os aplica nas suas
decisões perante problemas morais.
Na versão brasileira do instrumento, contudo, identificou-se
a ocorrência de um fenômeno que ficou conhecido como segmentação
moral, que se refere à diminuição da qualidade moral na resolução dos
dilemas que compõem o MCT quando esses apresentam conteúdo
específico relacionado a um tema que afeta o respondente (SILVA;
BATAGLIA, 2020). Assim, uma versão estendida do MCT foi
desenvolvida, chamada de Moral Competence Test extended
(MCT_xt), visando melhor compreensão do fenômeno da
segmentação. Nessa versão, manteve-se os dois dilemas originais e
acrescentou-se um dilema chamado “dilema do juiz” (Judge’s
Dilemma), cujo tema é a tortura de uma prisioneira em prol de
possivelmente salvar a vida de 200 pessoas ameaçadas por um grupo
terrorista. O MCT_xt foi validado e passou-se a sugerir aos(às)
pesquisadores(as) brasileiros(as) que usem essa versão estendida do
instrumento, com três dilemas.
O seu principal índice é chamado de C-Score, cuja variação é
de 0 a 100 pontos (amplitude = 100, mínima = 0, máxima = 100),
sendo considerado um escore baixo de 0 a 9, médio de 10 a 29, alto
de 30 a 49 e muito alto acima de 50. Mediante um cálculo semelhante
a uma análise multivariada, analisa-se “[...] a capacidade de um
340
participante de classificar argumentos a favor e contra uma certa
decisão moral em relação à qualidade moral dos argumentos, em vez
de em relação à concordância de sua opinião, em suma: sua
competência moral” (LIND, 2018, p. 1, tradução nossa).
A amostra participante consistiu em graduandos(as)
matriculados(as) em todos os anos do curso, que se selecionou por
meio da amostragem de etapas (GIL, 2008), visando identificar se
progresso da competência moral ao longo da formação no curso, de
ano a ano. Assim, identificou-se que amostra foi composta por
graduandos(as) matriculados(as) nos quatro anos do curso de
Psicologia que ambientou a pesquisa, respectivamente, 43
matriculados(as) no primeiro ano (22,1%), 49 matriculados(as) no
segundo ano (25,1%), 18 matriculados(as) no terceiro ano (9,2%),
36 matriculados(as) no quarto ano (18,5%) e 49 matriculados(as) no
quinto ano (25,1%) (ano de matrícula), totalizando 195 participantes
(N=105); 147 eram mulheres cisgênero (75,4%), 01 era mulher
transgênero, 42 homens cisgênero (21,5%) e 05 sujeitos não-binários
(2,6%) (gênero); 07 se autodeclaram amarelos (3,6%), 138 brancos
(71,1%), 33 pardos (17,0%) e 16 pretos (8,2%) (raça-etnia); e 187
sujeitos indicaram a graduação em Psicologia em andamento ser sua
primeira graduação (95,9%) e 08 indicaram possuir outra
graduação (4,1%) (nível de formação).
Resultados
Dos índices que compõem o MCT_xt, consideramos aquele
considerado o principal, justamente o que mensura a competência
moral: o C-Score. Esse índice, por sua vez, divide-se em quatro índices,
os quais representam cada um dos dilemas do instrumento: o C-score
341
do dilema dos operários (C_W), o C-score do dilema do médico
(C_D), o C-score do dilema do juiz (C_J) e o C-score de todos os
dilemas (C_TOT). Por meio de uma planilha gerada pelo software
SPSS© (STATISTICAL PACKAGE FOR THE SOCIAL
SCIENCES, 2017), calcularam-se as médias das pontuações em cada
um desses índices do MCT_xt e se procurou cruzá-las com as variáveis
anunciadas da amostra.
Além desse cálculo a partir da estatística descritiva, realizou-
se uma análise de variância de uma via (ANOVA-One Way) com o
objetivo de avaliar se havia diferenças estatisticamente significantes
nas pontuações de competência moral em variáveis que dividiam a
amostra em mais de dois grupos (por exemplo, a variável ano de
matrícula, dividindo-a entre estudantes desde o ano inicial ao ano
final do curso). A normalidade dos dados foi avaliada por meio dos
testes Kolmogorov-Smirnov e Shapiro-Wilk. O pressuposto de
homogeneidade de variância foi avaliado por meio do teste de Levene.
Quando o ANOVA demonstrou diferenças significantes, para se
saber entre qual(is) grupo(s) houve significância, a análise post-hoc foi
providenciada pela técnica de Tukey HSD (honestly significant
difference). No caso das variáveis que dividiram a amostra em apenas
dois grupos (por exemplo, a variável nível de formação, dividindo-a
entre estudantes em sua primeira graduação e estudantes com uma
graduação anterior), a avaliação foi realizada mediante o teste t de
Student, considerando-se p menor ou igual (< ou =) a 0,05
(PASQUALI, 2016). Assim, feitas essas considerações, prosseguimos
com a descrição das análises.
Não obstante, do total da amostra participante (N=195),
apenas parte respondeu ao MCT_xt: 151 graduandos(as) (n=151).
342
Por se tratar de um instrumento fechado, caso alguma questão do
MCT_xt estivesse em branco, isso invalidaria o instrumento, assim
como se estivesse com respostas faltantes, considerada missing.
A tabela disposta a seguir retrata as médias das pontuações
desses sujeitos no C-score de todos os dilemas (C_TOT) segundo as
variáveis da amostra.
Tabela 1 – Médias referentes ao índice C-Score de todos os dilemas (C_TOT)
do MCT_xt segundo as variáveis da amostra
Variável
N. de
sujeitos
C-Score Total
(C_TOT)
Desvio
padrão
Gênero
Feminino (cis)
109
14,88
10,92
Feminino (trans)
01
7,80
-
Masculino (cis)
36
14,13
9,43
Não-binário
05
14,48
9,89
Ano de matrícula
Primeiro ano
37
14,85
11,14
Segundo ano
41
16,26
10,46
Terceiro ano
15
12,86
11,03
Quarto ano
23
10,97
9,41
Quinto ano
35
15,70
10,06
Nível de formação
Ensino Superior
Incompleto
146
14,79
10,53
Ensino. Superior.
Completo
05
10,24
8,28
Fonte: Dados da pesquisa
A partir da Tabela 1, podemos observar que as médias dos(as)
participantes no índice C_TOT calculadas segundo a variável nero
mostraram diferenças mínimas entre os(as) participantes mulheres
343
cisgênero (n=109) e homens cisgênero (n=36). As médias referentes à
única mulher transgênero foi desprezada, assim como dos sujeitos
não-binários, por se tratarem de um número amostral ínfimo e, além
disso, em razão do MCT_xt ser recomendado para comparação de
médias entre grupos com mais de 05 sujeitos. Dessa forma, foi
realizado o teste t de Student para investigar em que medida as médias
eram diferentes, entre as mulheres e homens cisgêneros, no entanto,
não foi encontrada significância estatística. A pontuação nesse índice
variou baixa competência (de 0 a 9) a competência moral média (de
10 a 29), segundo Lind (2018), entre as médias das mulheres e dos
homens, com as mulheres pontuando um pouco mais.
Na variável ano de matrícula no curso de Psicologia, apesar de,
em geral, parecer ter havido uma progressão do primeiro ano (n=37)
ao quinto ano (n=35) apesar de no quarto ano (n=23) ter havido
uma pontuação muito baixa em relação aos demais segundo as
médias nesse índice (M1=14,85; M2=16,26; M3=12,86; M4=10,97;
M5=15,70)
34
, não foi encontrada significância estatística pelo
ANOVA. A pontuação média nesse índice variou dentro de média
competência moral.
Na variável nível de formação, as médias de quem tinha o curso
de Psicologia em andamento como sua primeira graduação foram
maiores do que quem tinha outra graduação, porém, não houve
significância estatística nas diferenças dessas médias pelo ANOVA. A
pontuação média nesse índice, com pouca diferença entre os grupos,
manteve-se como baixa competência moral.
34
Para referimento das médias do primeiro grupo utilizaremos da abreviação M1 (com “M”
abreviando “Média”) enquanto a abreviação M2 se referirá ao segundo grupo, assim como
em mais de dois grupos, como M3, M4 e etc.
344
Para saber o desempenho dos(as) graduandos(as) em cada
dilema do MCT_xt em separado, dispõe-se a tabela a seguir.
Tabela 2 – Médias referentes aos índices C-score do dilema dos operários
(C_W), o C-score do dilema do médico (C_D) e o C-score do dilema do juiz
(C_J) do MCT_xt segundo as variáveis da amostra
Variável
N. de
sujeitos
Dilema
do
operário
(C_W)
Desvio
padrão
Dilema
do
dico
(C_D)
Desvio
padrão
Dilema
do juiz
(C_J)
Desvio
padrão
Gênero
Feminino
(cis)
109
35,83
23,17
26,74
18,19
31,62
22,66
Feminino
(trans)
01
12,70
-
32,30
-
8,78
-
Masculino
(cis)
36
32,68
22,69
26,50
17,80
38,81
26,29
Não-
binário
05
38,62
31,87
18,80
19,94
25,10
14,91
Ano de matrícula
Primeiro
ano
37
31,11
22,57
24,64
20,06
38,94
26,17
Segundo
ano
41
39,23
23,16
28,48
17,92
30,71
22,03
Terceiro
ano
15
29,43
21,90
33,35
18,85
27,86
26,08
Quarto
ano
23
30,33
24,41
21,58
16,73
32,12
22,54
Quinto
ano
35
39,69
23,17
26,25
16,03
32,05
21,76
Nível de formação
En. Sup.
Incon.
146
35,29
23,32
26,48
17,76
33,00
23,09
En. Sup.
Comp.
05
27,20
20,67
25,80
27,37
32,07
37,25
Fonte: Dados da pesquisa
345
Com base na Tabela 2, podemos identificar que, na variável
gênero, enquanto as mulheres tiveram uma pontuação média maior
no dilema do operário (M1=35,83) e no dilema do médico
(M1=26,74) do que os homens (M2=32,68; M2=26,50), no dilema
do juiz os homens (M2=38,81) apresentaram maior pontuação do
que elas (M1=31,62). Todavia, não encontramos diferença
significativa pelo t de Student. Outrossim, tais pontuações tiveram a
variação de 26,50 e 38,81 que, segundo Lind (2018), enquadram-se
entre] competência moral média e alta competência moral (de 30 a
100).
Na variável ano de matrícula, aparentemente as médias do
quinto ano foram maiores que do primeiro ano, no Dilema do
Operário (M1=31,11; M5=39,69) e no Dilema do dico
(M1=24,64; M5=26,25), mas isso não se manteve no Dilema do Juiz
(M1=38,94; M5=32,05). Além disso, o segundo ano teve pontuação
média maior que o quarto ano no Dilema do Operário (M2=39,23;
M4=30,33) e no Dilema do dico (M2=28,48; M4=21,58, o que
também põe em cheque essa aparente progressão ao longo do curso.
Porém, não houve significância estatística entre as médias segundo a
ANOVA. As pontuações variaram entre competência moral média e
alta competência moral.
Na variável nível de formação, quem tinha o curso de
Psicologia como primeira graduação teve médias superiores no dilema
do operário (M1=35,29), no dilema do juiz (M1=33,00) e no dilema
do médico (M1=26,48) em relação a quem possuía uma graduação
anterior (M2=27,20; M2=32,07; M2=25,80, respectivamente).
Ainda que isso sugira que quem passou por um processo de
formação na Educação Superior apresenta uma capacidade reflexiva
346
reduzida em relação a quem está passando por sua primeira
experiência, a partir do t de Student, contudo, não houve resultados
estatisticamente significantes. no que se refere às pontuações nos
dilemas, elas variaram entre competência moral média e alta
competência moral).
Discussão e Considerações Finais
O objetivo deste capítulo foi analisar a competência moral na
formação em Psicologia de um dos cursos de graduação que
constituíram nossa amostra participante. Os resultados obtidos,
mediante a análise dos dados coletados com o MCT_xt, foram
entrecruzados com as variáveis curriculares dessa amostra,
especificamente de ano matrícula e de nível de formação. Contudo,
tais resultados foram desanimadores: indicou-se que a formação ética
não tem sido contemplada no processo formativo investigado, isto é,
a formação inicial em Psicologia ofertada no curso participante não
pareceu impactar de alguma forma a formação ética, no que tange à
competência moral.
Tanto as pesquisas sobre a formação moral, no aspecto da
competência moral, realizadas no contexto da formação inicial em
Psicologia (BATAGLIA, 2001; BERETA, 2018), como as pesquisas
com essa mesma preocupação, mas realizadas em outros cursos de
graduação, como na Pedagogia (SHIMIZU et al., 2010; LEPRE et
al., 2014; BATAGLIA et al., 2016; SILVA, 2018), na Enfermagem
(ENDERLE, 2017), na Medicina (SERODIO, 2013; CASTRO,
2019), na Administração (SOUZA, 2018), e etc., têm encontrado,
em geral, resultados similares. Como resumem Lepre et al. (2014, p.
132), esses resultados sugerem que os cursos de graduação “não estão
347
proporcionando, de forma adequada e muito menos suficiente, em
termos de conteúdo, estratégias e tipo de ambiente, o
desenvolvimento moral e, consequentemente, a formação ética de
seus alunos”.
Com base nesse quadro de pesquisas, do qual nossa presente
investigação passa a fazer parte, esta não parece se tratar de uma
problemática específica à formação inicial em Psicologia, ou à
formação inicial em Pedagogia como nossa pesquisa anterior
evidenciou (SILVA, 2018), mas na verdade que se estende a outros
contextos de formação e, assim, de que é uma problemática da
Educação Superior em geral.
Embora tenham havido diferenças entre as médias dos grupos
segundo as variáveis da pesquisa, não foi encontrada alguma diferença
significante estatisticamente atestada pelo t de Student ou pela
ANOVA. Isso nos preocupa principalmente em relação à variável ano
de matrícula. Ou seja, espera-se que, a partir das atividades
desenvolvidas nos cursos de graduação, nos âmbitos curricular,
semicurricular e extracurricular, desde as aulas em sala até os estágios
em campo supervisionados, participação em eventos científicos e
culturais, participação em projetos de extensão e de pesquisa,
desenvolvimento de pesquisa (Iniciação Científica) ou Trabalho de
Conclusão de Curso (TCC), e etc., pudesse se contemplar algum
impacto significativo na dimensão ética dos(as) estudantes que
submeteram a todas essas atividades realizadas ao longo dos cinco
anos do curso. Assim, à medida que progrediriam no curso e
desenvolviam tais atividades, sua formação ética seria afetada
positivamente, de modo a pontuarem mais alto no MCT_xt. Porém,
o que se encontrou foram dados que apontam para uma estagnação
348
nesse tipo de formação. diferenças, mas sem significância para se
apontar algum real impacto.
Autores como Clark e Yinger (1979, p. 267, tradução nossa)
apontam que a formação do(a) educador(a) também contempla a
ética, uma vez que é um(a) profissional “[...] reflexivo, racional que
toma decisões, emite juízos, tem crenças e gera rotinas próprias do seu
desenvolvimento profissional”. E isso também se aplica ao(à)
psicólogo(a), que também poderá atuar como um(a) educador(a), seja
mediante a formação em Licenciatura, seja apenas como Bacharel,
mas atuando no contexto da Psicologia Escolar e Educacional, em
instituições de ensino. Consideramos que um(a) profissional
autônomo, capaz de emitir juízos principados, e, não obstante, com
alta competência moral, capaz de agir de acordo com tais juízos,
considerar e avaliar a perspectiva do outro, certamente estará
contemplando a dimensão ética que sua profissão lhe exige(SILVA,
2022, p. 323).
Logo, chamamos atenção para o público da diversidade
humana que se faz presente no ambiente escolar, tal como da
diversidade sexual e de gênero, e que exigi que esse(a) profissional
esteja preparado para com ele e para com temas relacionados e
decorrentes, como a discriminação, a homofobia e transfobia, o
bullying, o cyberbullying, os demais tipos de violência e etc.
Se considerado que dentre os dilemas e temas enfrentados
pelos(as) pedagogos(as) na escola estão situações envolvendo
questões relacionadas a gênero e sexualidades, a ética na formação
desses(as) profissionais torna-se ainda mais necessária, visto que
terão que julgar e intervir nessas situações. Temas como gênero
e sexualidade culturalmente oscilam em compreensão e sua
abordagem na escola é permeada por polêmicas e resistências,
349
inclusive por parte de docentes. Logo, seus juízos e ações nessas
situações podem estar em consonância com a responsabilidade
social e legal de sua profissão [...] ou partirem de uma perspectiva
normatizadora, meramente hedonista em relação às suas crenças
pessoais e com pouca capacidade reflexiva envolvida (SILVA;
MORAIS; BRABO, 2023, p. 3).
Reforçamos que embora tenha sido em relação à dimensão
ética do trabalho do(a) pedagogo(a) com os temas de gênero e
sexualidades na escola que nossa pesquisa anterior de IC e de
Mestrado se atentaram, nessa investigação mais recente tivemos o
foco expandido para o(a) psicólogo(a) diante da necessidade de um
olhar especializado para outros contextos de formação. Enquanto a
Licenciatura em Psicologia vem sendo apagada dos cursos de
graduação, o reconhecimento do caráter educacional dessa profissão
nos mostra a urgência de se ir em direção oposta. De que o papel
do psicólogo(a) como educador(a) e sua possibilidade de atuação na
escola devem ser endossadas social e institucionalmente.
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354
355
Metodologias Ativas e o Ensino Tradicional:
Uma Reflexão na Formação na Licenciatura em
Matemática
Jerusa Ainoã Palheta de Souza CARDOSO
35
Introdução
A licenciatura em Matemática tem como objetivo principal
preparar profissionais para atuarem como professores de Matemática,
em diferentes níveis de ensino, desde a Educação Básica até o Ensino
Superior. Muitas vezes, essa formação é realizada por meio de um
ensino tradicional, dando ênfase aos conhecimentos técnicos e
conteudistas da disciplina para domínio de conteúdos puramente
matemáticos. No entanto, para a atuação destes profissionais, é
necessário muito mais que domínio de conteúdos puramente
matemáticos. Torna-se de suma importância as metodologias de
ensino, didática e práticas pedagógicas, que muitas vezes não foram
desenvolvidas durante a licenciatura.
Apesar de cada vez mais as universidades estarem discutindo
e diversificando a formação profissional, preparando os educandos
35
Mestranda em Educação pela Faculdade de Filosofia e Ciências (FFC), Universidade
Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” (UNESP), Campus de Marília (MINTER
UNESP/IFPA), São Paulo, Brasil e Licenciada em Matemática. E-mail:
jerusa.souza@unesp.br
https://doi.org/10.36311/2024.978-65-5954-473-8.p355-380
356
para que sua atuação em sala de aula se com práticas pedagógicas
e didáticas de ensino que contribuam para um processo de ensino e
aprendizagem significativo, com a formação mais crítica, reflexiva,
com alunos que possuam autonomia e sendo agentes participativos de
seu processo de construção do conhecimento, observamos que muitas
vezes essa prática não ocorre efetivamente na formação dos discentes
na licenciatura em Matemática, pois não utilizam a união entre
conteúdos matemáticos e prática pedagógica.
Dentro desta perspectiva, em contraposição ao ensino
tradicional na formação dos licenciandos em Matemática, uma
possibilidade é a utilização de metodologias ativas, como um recurso
didático na prática docente durante as aulas no nível superior. As
metodologias ativas enfatizam a participação ativa do aluno no
processo de ensino e de aprendizagem, referem-se a abordagens de
ensino em que o aluno é o protagonista do processo de aprendizagem,
estimulando sua participação ativa, o pensamento crítico, a resolução
de problemas e a construção do conhecimento de forma significativa.
diversas metodologias ativas que podem ser usadas nas
licenciaturas, possibilitando sua utilização na formação e na atuação
em sala de aula dos licenciados em Matemática.
Diante disso, neste artigo nos propusemos a refletir a respeito
da utilização de metodologias ativas em sala de aula e a importância
para a formação na licenciatura em Matemática e o estudo adotou a
seguinte questão norteadora: "Qual a importância das metodologias
ativas na formação em licenciatura em Matemática?”. Foi realizada
para essa reflexão uma pesquisa bibliográfica e a coleta de dados no
banco de Periódicos da Capes, selecionando artigos científicos que
357
tinham como objeto de estudo as metodologias ativas nas
licenciaturas em Matemática.
Assim o presente trabalho realiza uma reflexão sobre o ensino
tradicional nas licenciaturas em Matemática, apresentação de
metodologias ativas no ensino superior e resultados da pesquisa
bibliográfica com apresentação dos dados e discussão voltadas para a
utilização de metodologias ativas na formação em licenciatura em
matemática. Em seguida, nos remetemos a abordar os pontos
relevantes para nossa pesquisa, realizando uma reflexão a respeito da
utilização de metodologias ativas em sala de aula e a importância para
a formação na licenciatura em Matemática por meio dos dados
obtidos. Por fim, realizaremos as considerações finais.
Nessa perspectiva, a presente pesquisa apresenta uma
contribuição sobre as Metodologias ativas e o ensino tradicional na
formação na licenciatura em Matemática, apresentando por meio dos
dados, que apesar da importância das metodologias ativas na
formação destes profissionais e com resultados relevantes
apresentados nos trabalhos analisados, ainda possuem poucas
pesquisas com a temática, havendo necessidade de mais pesquisas
voltadas a área.
O Ensino Tradicional nas Licenciaturas em Matemática
Na licenciatura em Matemática, muitas vezes, a formação dos
profissionais que irão atuar como professores, acaba sendo voltada
para o conhecimento técnico e conteudista da disciplina, numa
dinâmica que tenta preparar o futuro professor para que ele possa
dominar os conteúdos matemáticos que serão ensinados aos seus
alunos, como álgebra linear, cálculo, geometria, estatística, análise real
358
e outros conteúdos, baseados em conceitos abstratos e teorias
complexas. No entanto, assim como importância na formação em
conteúdos puramente matemáticos, a Licenciatura em Matemática
também deve incluir atividades que estimulem a reflexão crítica, a
resolução de problemas e o pensamento criativo. Além disso, é
importante que os futuros professores aprendam a desenvolver
metodologias de ensino que possibilitem aos alunos compreenderem
os conceitos matemáticos de forma clara e acessível. Para Scriptori e
Santiago (2013):
Quando a licenciatura em Matemática se centra no ensino de
conteúdos formais, técnicas e fórmulas, seus estudantes
acreditam que para ser um bom professor basta ter apenas
conhecimento específico dessa área. As disciplinas ditas
pedagógicas, psicologia da educação, sociologia educacional,
didática e a metodologia de ensino costumam ter menor
importância,que aparecem como "auxiliares" no cotidiano da
sala de aula. Entretanto, quando o futuro professor termina seu
curso e começa a lecionar descobre que aqueles conhecimentos
específicos não o suficientes para que ele faça com que seus
alunos aprendam matemática com compreensão. Constata que
ensinar é uma tarefa para a qual não existe receita pronta.
Descobre, então, que além das técnicas e dos conteúdos previstos
no currículo escolar, é necessário conhecer os processos
cognitivos e as ideias do aluno, e que é preciso ensinar o aluno a
pensar e refletir para obter boas respostas e resolver problemas.
Para que a matemática não seja um "bicho de sete cabeças que
atormenta a maioria dos alunos e professores, busca-se sempre
por estratégias de ensino mais eficazes. (SCRIPTORI;
SANTIAGO, 2013, p. 223-224).
359
Essa formação que ênfase e maior importância nas
disciplinas de conteúdos teóricos em Matemática, remete o aluno ao
ensino tradicional em sua formação e consequentemente ele também
reproduzirá o mesmo modelo em sala de aula durante sua atuação
profissional, em que os conteúdos são ensinados para serem decorados
e transmitidos por meio de cálculos mecânicos. Berbel (1995)
constata que a Pedagogia da Transmissão no Ensino Superior
“caracteriza um ensino centrado no professor e seu saber ao invés da
aprendizagem do aluno (Berbel, 1995, p. 9).
Silva (2020) em sua pesquisa com discentes de licenciatura em
Matemática, apresentou como elementos que motivaram seu
trabalho, que em algumas atividades desenvolvida na Instituição de
ensino em que atuava (oficinas, minicursos e eventos em geral)
apareceram “falas com viés fortemente tradicional, por parte dos
alunos, inclusive, em muitos de seus trabalhos escritos”(SILVA, 2020.
p. 118). Segundo o autor, sua pesquisa revelou uma concepção
predominantemente tradicional nas respostas de um grupo de
discentes de licenciatura em Matemática, inclusive em seus discursos
nas respostas de perguntas.
Geralmente, durante a licenciatura em matemática as
disciplinas de conteúdos matemáticos são baseadas em aulas
expositivas nas quais o professor transmite os conteúdos matemáticos
aos alunos, utilizando principalmente a lousa e o giz e/ou pincel, com
aulas que costumam ser estruturadas de forma sequencial, seguindo o
conteúdo do livro-texto adotado pela disciplina, ministração por meio
de mesmos apontamentos utilizados anos e, quando utiliza
apresentação em slides, o material se repete por anos. Também
360
costumam incluir atividades complementares, como extensas listas de
exercícios para resolução de problemas.
Observa-se também que as disciplinas que abordam temas
como didática, metodologias de ensino, as tecnologias educacionais,
a educação inclusiva, psicologia da educação e práticas pedagógicas,
não lhes é dada a importância que essas disciplinas necessitam. E na
maioria das vezes são trabalhadas de forma dissociadas dos conteúdos
puramente matemáticos. Como consequência desse ensino
tradicional na Licenciatura em Matemática, podem haver limitações
aos discentes, como a falta de estímulo à criatividade e à reflexão
crítica por parte dos alunos. Além disso, a abordagem conteudista
pode não ser suficiente para preparar os futuros educadores para os
desafios da sala de aula em sua atuação profissional, que exige
habilidades, além do conhecimento técnico.
Quando o licenciado em Matemática se depara com a
realidade em sua atuação, observa que para se ensinar matemática em
sala de aula independente da rie escolar, exige que se remeta a
metodologias de ensino, didática e práticas pedagógicas que não
foram desenvolvidas durante a licenciatura. Assim, nesta situação o
educador tem duas possibilidades: o ensino tradicional ou ir em busca
de capacitação de práticas pedagógicas de ensino. Como uma
possibilidade para mudar esse cenário, podemos apresentar a inclusão
de metodologias ativas no ensino superior, especificamente voltadas a
licenciatura em Matemática.
Metodologias Ativas no Ensino Superior
Atualmente, se reflete, discute e se abordam diversas pesquisas
sobre a educação com formação crítica e reflexiva em todos os níveis
361
de ensino, com a necessidade de formação não apenas para que o
aluno aprenda conteúdos para provas, exercícios e exames, mas
formação para a vida, isto é, a contribuição da educação para
formação de cidadãos críticos, que possuam autonomia e que sejam
agentes participantes de seu processo de ensino e aprendizagem. Na
educação é necessário que haja um processo de construção de
conhecimentos, em que todos os envolvidos nesse processo,
participem de forma ativa. Para isso, podemos contar com diversas
estratégias, como por exemplo as diferentes metodologias que
possuam tais objetivos.
No ensino superior não é diferente, principalmente nas
licenciaturas, é importante que a formação do acadêmico seja para a
educação com autonomia e crítica, visando que se forme profissionais
que atuem em sala de aula com o mesmo objetivo. Uma proposta é a
utilização de metodologias ativas, como um recurso didático na
prática docente durante as aulas no vel superior. As Metodologias
Ativas - MA, referem-se a abordagens de ensino em que o aluno é
protagonista do seu processo de aprendizagem, estimulando sua
participação ativa, o pensamento crítico, a resolução de problemas e
a construção do conhecimento de forma significativa. Para Lima
(2017) as metodologias ativas na educação formal de modo geral:
[...] o consideradas tecnologias que proporcionam
engajamento dos educandos no processo educacional e que
favorecem o desenvolvimento de sua capacidade crítica e
reflexiva em relação ao que estão fazendo. Visam promover: (i)
pró-atividade, por meio do comprometimento dos educandos no
processo educacional; (ii) vinculação da aprendizagem aos
aspectos significativos da realidade; (iii) desenvolvimento do
raciocínio e de capacidades para intervenção na própria
362
realidade; (iv) colaboração e cooperação entre participantes.
(LIMA, 2017, p. 424).
Essas metodologias são inspiradas na ideia de que os alunos
aprendem melhor quando estão envolvidos em atividades práticas,
colaborativas e contextualizadas, se contrapondo ao ensino
tradicional, em que o professor tem um papel de detentor do
conhecimento e o papel central e transmite conhecimentos de forma
passiva ao aluno. Para os autores Paiva et al. (2016, p.145) as
metodologias ativas rompem com o modelo tradicional de ensino e
fundamentam-se em uma pedagogia problematizadora, onde o aluno
é estimulado a assumir uma postura ativa em seu processo de
aprender, buscando a autonomia do educando e a aprendizagem
significativa”.
Para Garbin et al. (2020, p. 5-6) “as metodologias ativas dão
ao estudante o papel de protagonista durante seu processo de
aprendizado e permitem seu envolvimento direto, participativo e
reflexivo, podendo experimentar com a supervisão do professor” e os
autores supracitados apresentam ainda que “estudos demonstram que
processos que priorizam o papel ativo dos estudantes permitem uma
aprendizagem mais significativa” (p. 6).
Dentro dessa possibilidade do aluno como protagonista
durante o processo de aprendizagem correlacionando teoria e
realidade, as metodologias ativas possuem como: “pressuposto a
contextualização, ou aproximação da teoria para a realidade do aluno.
É necessário nessa concepção que haja uma identificação,
possibilitando uma interação e intervenção do aluno como
protagonista do processo de aprendizagem”. (AZEVEDO;
PACHECO; SANTOS, 2019, p. 5-6).
363
Em relação às metodologias ativas no ensino superior, os
autores Borges e Alencar (2014, p.120) definem “metodologias ativas
como formas de desenvolver o processo do aprender que os
professores utilizam na busca de conduzir a formação crítica de
futuros profissionais nas mais diversas áreas”.
Dentre as metodologias ativas podemos citar: Aprendizagem
Baseada em Projetos (PBL); Aprendizagem baseada em equipes
(TBL/ABE); Aprendizagem Baseada em Problemas (PBL/ABP);
Aprendizagem Cooperativa; Sala de Aula Invertida; Aprendizagem
por Investigação; Estudo de Caso; Aprendizagem Por Pares ou Times
e a Aprendizagem Invertida; Grupos operatórios; Arco de Maguerez;
Círculo de Cultura; Aprendizagem Baseada em Ensino e Pesquisa
(ABEP) e outras.
Os autores Paiva et al. (2016, p. 145) esclarecem que outros
procedimentos podem contribuir para as metodologias ativas, tais
como:
[...] seminários; trabalho em pequenos grupos; relato crítico de
experiência; socialização; mesas-redondas; plenárias; exposições
dialogadas; debates temáticos; oficinas; leitura comentada;
apresentação de filmes; interpretações musicais; dramatizações;
dinâmicas lúdico-pedagógicas; portfólio; avaliação oral; entre
outros (PAIVA et al., 2016, p. 145).
Dentre os fatores importantes relacionados à utilização de
metodologias ativas, podemos destacar diversos fatores positivos aos
alunos. Os autores Borges e Alencar (2014) abordam o uso das
metodologias ativas como possibilidade de recurso didático:
364
É uma possibilidade de recurso didático para uma formação
crítica e reflexiva do estudante universitário, e se lança como uma
prática pedagógica inovadora, trazendo a participação coletiva
democrática como requisito fundamental para uma
aprendizagem significativa, que visa por meio da reflexão, e do
compartilhamento de conhecimento, uma formação do
indivíduo como um ser que se forma à medida que se relaciona
e se apropria da realidade humana. (BORGES; ALENCAR,
2014. p. 139)
Ainda para esses autores a metodologia ativa “pode favorecer
a autonomia do educando, despertando a curiosidade, estimulando
tomadas de decisões individuais e coletivas, advindas das atividades
essenciais da prática social e em contextos do estudante” (BORGES,
ALENCAR, 2014. p.120). Esses autores identificaram em suas
pesquisas como benefícios dos usos de metodologias ativas o
rompimento com o modelo tradicional, o desenvolvimento da
autonomia do aluno, do exercício do trabalho em equipe, da
integração teoria e prática, do desenvolvimento de uma visão crítica
da realidade e o do uso da avaliação formativa. Em relação aos
desafios, os autores apontam a formação do profissional educador, a
abordagem de todos os conhecimentos essenciais e da articulação com
os profissionais do campo. Relacionado a utilização dessas
metodologias no ensino superior Borges e Alencar (2014) apontam
que:
Somente através da utilização dessas metodologias ativas, aliados
a práticas cada vez mais reflexivas, críticas e grande
comprometimento, será possível viver uma pedagogia que
promova a autonomia, que liberte, que possibilite o diálogo e o
365
enfrentamento de resistências e de conflitos oriundos do ensino
superior. (BORGES; ALENCAR, 2014. p.139).
Considerando o objetivo deste presente trabalho,
apresentamos a seguir, os resultados de dados bibliográficos realizado
no banco de periódicos da Capes relacionados a metodologias ativas
na licenciatura em Matemática, para diante do que foi apresentado e
dos dados obtidos realizar uma reflexão sobre sua utilização e
importância na formação dos licenciados em matemática.
Pesquisa Bibliográfica e Discussões
Nesta seção apresentamos a pesquisa de artigos realizada no
Banco de Periódico da Capes e foram utilizados os seguintes critérios:
recorte temporal das pesquisas dos últimos 10 (dez) anos e presença
dos seguintes descritores na busca “metodologia(a) ativa (s) e
licenciatura em matemática”. A pesquisa foi realizada com a busca
do termo exato em qualquer parte do texto, para assim, conseguir o
recorte do objetivo deste trabalho. Foram encontrados 7 (sete) artigos
nos dados de busca e após a análise destes, foram selecionados 4
(quatro) artigos que continham como assunto as metodologias ativas
e possuíam abordagens em licenciatura em Matemática.
Como estratégia de apresentação das informações dos dados
obtidos nos artigos foram elaborados três quadros que apresentam a
sistematização dos dados dos artigos selecionados e a sistematização
das metodologias ativas abordadas, objetivos e resultados, realizando
a discussão sobre o material obtido na pesquisa bibliográfica
apresentada.
366
Quadro 1 – Sistematização dos dados dos artigos selecionados
Título Autores Dados do Artigo
Dados dos
sujeitos
pesquisados
1
Metodologias
ativas e a
construção de
portfólios digitais:
indicadores de
interação,
autonomia e novas
práticas na
formação de
professores.
Baumann
E. S.;
Fofonca E;
Carneiro,
T. K. G.
Educação
Análises,
Londrina, v.2,
n.2, p.303-320,
jul./dez. 2017.
Licenciatura em
Matemática do
Instituto Federal
de Educação,
Ciência e
Tecnologia da
Bahia
2
Atividades de
metodologias
ativas para
matemática com
elementos
didáticos da
BNCC
Ferreira, J.
S. P.
Revista Brasileira
de Pós-
Graduação, [S.
l.], v. 16, n. 35,
p. 1–22, 2020.
Licenciatura em
Matemática
3
Práticas
pedagógicas
inovadoras para a
formação de
professores
Garbin, M.
C.;
Oliveira, E.
T; Pirillo,
N.;
Azevedo,
A. S..
Revista Brasileira
de
Aprendizagem
Aberta e a
Distância, 2020,
Vol.19 (1)
Discentes do
segundo ano dos
cursos de
Licenciatura em
Matemática e
Pedagogia da
Universidade do
Estado de São
Paulo.
4
Concepções de
Licenciandos sobre
a Relação Ensino-
Aprendizagem e a
Existência de uma
Silva, Erick
dos Santos
Educação
Matemática em
Revista, Brasília,
v. 25, n. 66,
Onze alunos do
semestre do
curso de
licenciatura
367
Barreira
Tradicional a ser
transposta.
p.114-136,
jan./mar. 2020.
em Matemática.
Fonte: Elaborado pela autora
Em relação aos artigos selecionados, observamos no Quadro
1, que na busca no site do Banco de Periódico da Capes relacionados
à metodologia (s) ativa (s) nos cursos de licenciatura em matemática,
apresentou-se um quantitativo de 4 artigos, um número
significativamente pequeno quando observadas metodologias ativas
no nível superior em geral, como por exemplo ao se pesquisar no
mesmo banco de dados os termos "metodologia(s) ativa(s)” e “ensino
superior” no mesmo período (10 anos), observamos que foram
apresentados 354 resultados, apenas um comparativo, pois não
detalhamos a análise desses resultados por não ser o objetivo da
pesquisa. Dentre os artigos, mesmo com histórico de tempo de
pesquisa dos últimos 10 anos, mostram que as pesquisas são recentes,
sendo 1 (uma) do ano de 2017 e 3 (três) do ano de 2020.
Quadro 2 – Sistematização das Metodologias ativas e objetivo das pesquisas
Título
Metodologias
ativas abordada
Objetivo
1
Metodologias
ativas e a
construção de
portfólios digitais:
indicadores de
interação,
autonomia e novas
práticas na
Portfólio digital
como recurso
metodológico para
prática da
aprendizagem ativa.
Por meio de um estudo de
caso, propôs-se o
levantamento de indicadores
de interação entre os
discentes, prática docente e
recursos digitais para a
ampliação de uma discussão
didática, tal discussão
368
formação de
professores.
contextualiza-se através das
concepções teórico-
metodológicas de autonomia,
problematização e avaliação
em espaços virtuais de
aprendizagem.
2
Atividades de
metodologias
ativas para
matemática com
elementos
didáticos da
BNCC
Teoria Hipotética
de Aprendizagem
(THA) de Simon e
Aprendizagem
Baseada em
Problemas (PBL) e
a produção de
algoritmos para
resolver problemas
com o uso de
aplicativos.
Apresentar atividades
pedagógicas para o ensino de
matemática focadas nas
habilidades correlacionadas
com o uso de TDIC no
currículo de Matemática para
os Anos Finais do Ensino
Fundamental (AFEF) e
Ensino Médio (EM) previstas
na BNCC, o material
produzido e trabalhado em
sala de aula com os
acadêmicos de matemática,
elaborando planos de aulas,
em que o sugeridas a
utilização das metodologias
ativas.
3
Práticas
pedagógicas
inovadoras para a
formação de
professores
Aprendizagem
Baseada em
Problemas e por
Projetos (ABPP) e o
Design Thinking
(DT)
Analisar os projetos
integradores propostos pelos
alunos de Licenciatura sob
dois prismas: articulação dos
conteúdos curriculares para a
resolução de problema e
utilização dos princípios das
metodologias ativas no
cumprimento das etapas do
projeto.
369
4
Concepções de
Licenciandos
sobre a Relação
Ensino-
Aprendizagem e a
Existência de uma
Barreira
Tradicional a ser
transposta.
Não apresentou
metodologias ativas,
apenas abordou o
ensino tradicional,
em oposição à
perspectiva ativa.
O objetivo do trabalho foi
avaliar, por meio dos relatos
discentes de licenciatura em
matemática, as aproximações
com o paradigma das
metodologias tradicionais ou
ativas na concepção de ensino
dos estudantes.
Fonte: Elaborado pela autora
No quadro 2, constam informações da metodologia abordada
nos artigos obtidos e objetivo da pesquisa realizada pelos autores. Nos
artigos selecionados, os tipos de metodologias ativas abordados são o
Portfólio digital, Teoria Hipotética de Aprendizagem (THA) de
Simon, Aprendizagem Baseada em Problemas (PBL), Aprendizagem
Baseada em Problemas por Projetos (ABPP) e o Design Thinking
(DT) e um dos artigos não aborda metodologias ativas de tipo
específico.
Em relação aos títulos das pesquisas e objetivos, observamos
que em relação ao artigo 1 e 3, as metodologias ativas citadas no
trabalho foram desenvolvidas durante as aulas visando alcançar o que
se pretendia com a pesquisa. Em relação ao artigo 2, as metodologias
ativas são abordadas com os licenciandos em Matemática como parte
da elaboração de aulas com atividades de matemática com elementos
da BNCC, para ensino fundamental e para ensino dio, no entanto
observa-se que elas são produzidas e trabalhadas com os licenciados.
Por fim, o artigo 4 avalia por meio de relatos e questionários as
concepções dos licenciandos em Matemática, aproximações com o
paradigma das metodologias tradicionais ou ativas e o trabalho do
370
autor não aborda as metodologias ativas de forma direta e nem tem
como objetivo abordá-las.
Em relação aos objetivos das pesquisas podemos destacar nos
artigos 1, 2 e 3, que embora tenham utilizado diferentes tipos de
metodologias ativas nas pesquisas, os trabalhos visam a participação
ativa dos discentes, o processo de ensino e aprendizagem na formação
pautadas em práticas pedagógicas e não apenas em ensino tradicional,
além de apresentarem possibilidades de mudanças no processo de
formação dos licenciandos em Matemática. O artigo 4, possui um
objetivo de avaliação da percepção de paradigmas, e é possível
observar que a pesquisa possibilita um espaço de discussão das
concepções de ensino e de aprendizagem na formão na licenciatura,
ampliando a oportunidade de se discutir dentro da licenciatura esse
processo de formação e possíveis avanços em metodologias dentro da
formação, contribuindo para uma reflexão da importância de
participação mais ativa dos discentes.
Quadro 3 – Sistematização dos resultados das pesquisas
-
+*
Resultados
1
O estudo destacou que, diante de sujeitos multissemióticos e
multiletrados, torna-se necessário educar para a multiplicidade de
metodologias e crítica didática; logo, não como pensar os processos de
ensino e aprendizagem de forma unitária e depositária, sem a inclusão da
colaboração, problematização e autonomia dos estudantes. Contudo,
torna-se urgente a disseminação das metodologias ativas na prática da
formação dos futuros docentes, pois repensar o processo formativo
impulsiona-os a construir um cenário diferente, mais dinâmico e
problematizador para os seus futuros estudantes. O autor destaca que se
371
torna válido o processo de construção de um portfólio digital que
proporcionou aos estudantes um novo olhar sobre essa temática e, além
disso, sobre metodologias e didáticas inovadoras, dada a complexidade
que caracteriza a aprendizagem ativa.
2
Os resultados da pesquisa permitem inferir que os professores de
matemática, na sua maioria, não utilizam softwares educacionais como
facilitador da aprendizagem de conteúdos matemáticos, fato que poderia
ser repensado uma vez que foi constatado que os alunos apresentam
dificuldades de aprendizado nesta disciplina.
3
A análise do Projeto integrador com os discentes baseou-se na averiguação
da articulação dos conteúdos curriculares para a resolução de um
problema e a utilização dos princípios das metodologias ativas no
cumprimento das etapas do projeto. Foi possível notar que os projetos
avaliados geraram práticas pedagógicas que preconizam um perfil de
professor, que buscará não reproduzir as formas tradicionais de ensino,
levando em consideração diferentes metodologias e formas de ensinar e
aprender, contextualizadas no mundo contemporâneo, que inclui as
tecnologias e recursos disponíveis. Os projetos demonstram como
iniciativas diferenciadas, que articulam as disciplinas com atividades
práticas e ligadas às realidades de cada aluno, podem surtir efeitos na
aprendizagem dos temas fundamentais à formação dos professores.
4
A análise de conteúdo permitiu reconhecer uma perspectiva de viés
tradicional nos discursos proferidos pelos licenciandos, com algum
avanço em relação ao conhecimento de práticas mais alternativas,
denominadas ativas. O pesquisador aponta que apesar de reconhecê-las
como importantes no cenário atual, os cursistas ainda revelam dificuldade
com a aplicação prática dessas ideias. Ressalta que pode servir de alerta
para as formações locais implementadas atualmente, pois se existe
dificuldade na divulgação dessas metodologias alternativas, imagine a
barreira, ainda maior, associada à aplicação prática dessas ideias.
Fonte: Elaborado pela autora
372
Podemos observar no quadro acima que os resultados dos
artigos selecionados, anteriormente apresentados estão relacionados à
utilização do ensino tradicional nas licenciaturas em matemáticas e as
possibilidades de uso de metodologias ativas na formação dos
professores. Nos artigos 2 e 4, os autores apontam que apesar das
potencialidades do uso de metodologias ativas e práticas significativas,
os discentes não utilizam ou possuem dificuldades em utilizá-las em
sua formação acadêmica, e consequentemente na sua atuação.
Podemos observar ainda, as possibilidades de se utilizar
metodologias ativas na formação dos licenciandos em matemática e
consequentemente em sua atuação em sala de aula, pois, como
dissemos, a experiência de ter o contato com metodologias ativas traz
vantagens significativas em sua formação. Podemos destacar também
que em seus resultados os pesquisados apontam a importância de
repensar a formação desses profissionais, possibilitar o contato com
diferentes metodologias e as diferentes formas de ensinar e aprender,
bem como a possibilidade de impulsionar o uso de metodologias
ativas.
Também é possível observar uma crítica ao ensino tradicional,
bancário e passivo. Nos resultados alcançados constatou-se as
possibilidades e foi evidenciada suas vantagens de uso de
metodologias ativas em diferentes contextos, assim como, a
possibilidade de ruptura do ensino tradicional e bancário nas
licenciaturas em Matemática, bem como a integração entre a teoria e
prática e consequentemente profissionais mais capacitados para atuar
em sala de aula.
373
Discorrendo sobre os artigos apresentados, dentre a
possibilidade de metodologias ativas citadas e apresentadas nas
pesquisas, temos que o:
Portfólio digital como recurso metodológico para prática da
aprendizagem ativa não foi uma escolha aleatória, mas se deu por
possibilitar ao educando e ao professor mediador acompanhar o
amadurecimento acadêmico e profissional dos envolvidos, assim
como, propiciar uma análise e um processo de autocrítica das
suas práticas e escritos registrados desde as primeiras ações,
desenvolvendo deste modo a autonomia e autoria do aluno.
Portanto, para solidificar a compreensão deste estudo faz-se
necessário apresentar algumas concepções sobre o portfólio
digital como uma possibilidade para a aprendizagem ativa.
(BAUMANN; FOFONCA; CARNEIRO, 2017, p. 309).
No artigo que apresentou atividades, com a implantação das
Práticas Computacionais nos Fundamentos da Matemática (PCFM)
ou Tecnologias Digitais de Informação e Comunicação (TDIC), com
uso de metodologias ativas, vimos que a:
Teoria Hipotética de Aprendizagem (THA) de Simon ou
Aprendizagem Baseada em Problemas (PBL), esta é uma
metodologia ativa de ensino onde os alunos ganham
conhecimento e habilidades enquanto resolvem problemas. A
sigla vem do inglês Problem Based Learning (PBL). Foi adotada,
inicialmente, pela Universidade McMaster, no Canadá, e de
Maastricht, na Holanda, em 1969. Em resumo, PBL integra
saber e fazer. A metodologia prima pelo desenvolvimento de
habilidades críticas de pensamento e resolução de problemas nos
alunos. (FERREIRA, 2020, p. 21).
374
Os autores Garbin, Oliveira, Pirillo e Azevedo (2020)
apresentam que a Aprendizagem Baseada em Problemas e por
Projetos (ABPP) e o Design Thinking (DT), são utilizadas duas
perspectivas de metodologias centradas no aluno, que se
complementam e se combinam, segundo os autores:
[...] as metodologias ativas de aprendizagem estimulam o
aprendizado por meio da resolução de problemas práticos em
cenários reais, trazendo benefícios que remetem ao
desenvolvimento de características como pensamento crítico,
maior facilidade para a construção do conhecimento, motivação,
autonomia, autoconfiança, habilidades para resolução de
problemas, flexibilidade, comunicação, empatia, dentre outras.
(GARBIN; OLIVEIRA; PIRILLO, 2020, p. 6.)
Diante das possibilidades das pesquisas apresentadas,
podemos refletir na utilização de metodologias ativas e do ensino
tradicional de formação no curso de licenciatura em matemática.
Podemos destacar as vantagens da utilização dos portfólios digitais,
pois segundo os autores Baumann, Fofonca e Carneiro (2017, p.
318), essa metodologia ativa possibilita colocar os “os estudantes em
contato direto com ambientes virtuais, possibilitando que os mesmos
continuem a aprender mesmo não estando na sala de aula e o
professor continue a ensinar, ainda que não esteja ao lado do
estudante”. Ainda segundo esses autores: “torna-se um relato coletivo
e significativo da trajetória de aprendizagem, aos quais elementos de
integração são adicionados ao longo das resoluções dos problemas e
das tomadas de decisões dos educandos” (BAUMANN; FOFONCA;
CARNEIRO, 2017, p. 309).
375
Uma observação importante apresentada por Silva (2020)
sobre não se enganar em relação a uma aproximação com os contextos
ditos mais ativos por meio de tecnologias:
Em diversas oportunidades, podemos trocar o giz pela lousa
digital, o desenho no quadro pela animação no computador, mas
continuarmos na perspectiva expositiva, avaliando quase que
exclusivamente por meio de provas. A tecnologia, por si mesma,
não nos retira da perspectiva tradicional, reiteradamente
condenada. Os alunos parecem revelar deslumbre com a inserção
da tecnologia, não distinguindo claramente, em suas falas, essa
possibilidade de fazermos mais do mesmo utilizando apenas uma
roupagem tecnológica. (SILVA, 2020, p. 132).
Silva (2020) e Garbin et al (2020) nos remetem a alguns
questionamentos relacionados ao nível superior e de sua atuação com
metodologias ativas e não tradicionais, as quais compactuamos com
os autores: “como respeitar a ementa, avaliar e preparar devidamente
os estudantes, dentro dos objetivos delineados, a partir de uma
perspectiva mais ativa de ensino? E os estudantes, até que ponto eles
se reconhecem dentro desse viés mais alternativo?" (SILVA, 2020, p.
134) e ainda “como se a aprendizagem por meio dessas
metodologias e abordagens? Qual efeito ocorre de fato? As práticas
são influenciadas por essas vivências diferenciadas?” (Garbin et al,
2020. p. 23). Assim, “neste âmbito, urge pesquisar mais a fundo
como metodologias ativas e uso intencional de tecnologias muda não
apenas o ensino, mas também a aprendizagem” (Garbin et al, 2020.
p. 23).
Segundo Paiva et al. (2016), podemos ainda, refletir que a
formação não está limitada a habilidade de dar aulas, mas também à
376
efetivação de levar ao aprender. E isso não é possível por meio de um
ensino bancário e passivo, mas sim pela formação de sujeitos ativos,
críticos, reflexivos e com autonomia.
A questão do ensino não se limita à habilidade de dar aulas,
também envolve a efetivação de levar ao aprender. O vínculo
entre aprendizagem e ensino não é causal, ou seja, o ensino o
causa a aprendizagem nem desenvolve novas capacidades que
podem levar à aprendizagem. (PAIVA et al., 2016 p. 145).
Considerando todo o arcabouço teórico exposto acima,
partiremos agora para as considerações finais.
Considerações Finais
O ensino tradicional ainda é uma prática comum nas
licenciaturas em Matemática, no entanto observamos a necessidade
de transformação da formação dos licenciandos, considerando que a
universidade deve ser um espaço de aquisição de conhecimentos, não
apenas nas áreas técnicas, mas no contexto de formação de
profissionais capacitados para atuar em sala de aula e que vai
contribuir de fato com a formação de seus alunos. uma
necessidade destes desenvolverem além das competências técnicas, ou
seja, uma formação crítica e social.
Foram apresentados no trabalho dados sobre metodologias
ativas e o ensino tradicional na licenciatura em Matemática, obtidas
por meio do Banco de Dados de Periódicos Capes, nos quais
constatamos que possuem poucas pesquisas relacionadas à temática,
apesar de todas as vantagens apresentadas para a formação do
377
licenciando, o que nos remete a refletir sobre necessidade de outros
estudos visando observar as metodologias ativas.
Em relação aos dados apresentados, podemos inferir que a
formação do professor de Matemática, buscando desenvolver um
espaço de aprendizagem, deve capacitá-lo para atuar com o
pensamento crítico, de forma ativa e autônoma, e que compreenda
seu real papel dentro da sala de aula. Contudo, não como alcançar
isso com aulas baseadas no ensino tradicional - aulas expositivas,
professores detentores de conhecimentos, repassando cálculos
mecânicos e fórmulas decoradas, bem como com excessivas listas de
exercícios e conteúdos a serem decorados, apenas.
Podemos refletir sobre como almejar a transformação para
que esses profissionais utilizem metodologias e didáticas diferentes
nas aulas de Matemática na Educação Básica ao invés do ensino
tradicional, sem transformar a sua formação? Como repensar a
formação do docente durante a licenciatura em Matemática? Por que
não dar maior ênfase também em disciplinas que têm como objetivo
proporcionar uma formação mais ampla e completa para os futuros
professores, para que eles possam desenvolver um trabalho
pedagógico mais eficiente e inclusivo? Como se contrapor ao ensino
tradicional aos licenciandos? Como estimular as metodologias ativas?
Reconhecemos, finalmente, que é necessária uma análise mais ampla
e mais estudos dessa temática.
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378
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DOI: 10.21713/rbpg.v16i35.1706. Disponível em:
https://rbpg.capes.gov.br/rbpg/article/view/1706. Acesso em: 06
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379
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Disponível em:
https://seer.abed.net.br/RBAAD/article/view/388/334. Acesso em:
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LIMA, Valéria Vernaschi. Espiral construtivista: uma metodologia
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SANARE - Revista de Políticas Públicas, [S. l.], v. 15, n. 2, 2017.
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https://sanare.emnuvens.com.br/sanare/article/view/1049. Acesso
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SILVA, Erick dos Santos. Concepções de Licenciandos sobre a
Relação Ensino- Aprendizagem e a Existência de uma Barreira
Tradicional a ser transposta. Disponível em:
https://docplayer.com.br/192531815-Concepcoes-de-licenciandos-
sobre-a-relacao-ensino-aprendizagem-e-a-existencia-de-uma-
barreira-tradicional-a-ser-transposta.html. Acesso em 06 abr. 2023.
380
381
A Psicologia Moral na Formação Continuada de
Professores em um Mestrado Profissional
Rita Melissa LEPRE
36
Eduardo Silva BENETTI
37
Introdução
O Mestrado Profissional (MP) é uma modalidade de Pós-
Graduação stricto sensu que objetiva a capacitação profissional, em
diferentes áreas do conhecimento, por meio de técnicas, processos e
temáticas que atendam a demandas do mercado de trabalho
(CAPES). Neste sentido, é importante ressaltar que, embora o MP
venha ao encontro das demandas e lacunas do mercado de trabalho,
o mesmo não deixa de ser tão qualificado quanto o Mestrado
Acadêmico (MA), diferenciando-se tão somente pela sua
especificidade de uma aplicação mais direta da pesquisa, sendo que
ambos desempenham funções acadêmicas, teóricas e práticas
36
Docente Associada da Universidade Estadual Paulista (UNESP), Universidade Estadual
Paulista “Júlio de Mesquita Filho” (UNESP), Campus de Bauru e Assis, São Paulo, Brasil.
E-mail: melissa.lepre@unesp.br
37
Mestre em Docência para a Educação Básica pela Universidade Estadual Paulista “Júlio de
Mesquita Filho” (UNESP), Campus de Bauru, São Paulo, Brasil. E-mail:
luxgor00@gmail.com
https://doi.org/10.36311/2024.978-65-5954-473-8.p381-408
382
importantes, permitindo que o pesquisador avance para níveis mais
elevados, como o doutorado.
Uma característica importante do MP é que seus
pesquisadores necessitam aplicar a teoria embasada na prática,
visando a práxis. No caso do MP inserido na área de Ensino (área 46
CAPES), existe uma obrigatoriedade de se elaborar um Produto
Educacional que deve ser aplicado a um determinado grupo (de
acordo com o método e objetivos), comprovando ou não uma
hipótese voltada à Educação e, mais especificamente, ao ensino. Desta
forma, o futuro mestre te muito mais clareza da sua ão didática,
reforçando sua práxis pedagógica.
O presente artigo visa abordar um MP da Universidade
Estadual Paulista (UNESP), inserido na área de Ensino[...] focando
a articulação entre os conhecimentos escolares das diferentes
disciplinas ou áreas e os processos de ensino e aprendizagem desses
referidos conhecimentos” (UNESP, 2023, online)
38
. Nosso objetivo
central é identificar, descrever e apresentar os possíveis impactos de
pesquisas e seus produtos educacionais que se apoiam na Psicologia
da Moralidade como referencial teórico em sua aplicação no cotidiano
escolar.
Para realização do levantamento de dados, utilizamos a
metodologia da pesquisa bibliográfica com características de pesquisa
exploratória. Realizamos um recorte de tempo dos últimos dez anos
(2014-2023) em que foram selecionados apenas trabalhos do
repositório do referido MP. Para a seleção, usamos o descritor
moralidade, a partir de então, selecionamos por meio da leitura do
38
Tal citação encontra-se na descrição da página do programa:
https://www.fc.unesp.br/#!/posdocencia
383
resumo e da observação da fundamentação teórica um total de 13
dissertações e seus produtos.
Fundamentação Teórica
Temas relacionados ao desenvolvimento da autonomia dos
estudantes são recorrentes nos Projetos Políticos Pedagógicos (PPP)
das escolas que defendem a necessidade de objetivar tais temas na
organização do trabalho pedagógico. Mas, qual é a autonomia que a
escola pretende desenvolver? Quais as características desta autonomia
que a escola defende?
Neste sentido, a Psicologia Moral busca formas de auxiliar o
professor a “compreender os processos psicológicos por meio dos
quais um indivíduo passa a legitimar regras, princípios e valores
morais” (COUTO et al, 2021, p. 6). A Psicologia Moral não busca
exclusivamente o desenvolvimento do ponto de vista do sujeito, como
visão unilateral do desenvolvimento, nem tampouco uma visão
estritamente social, mas situa-se nas possibilidades interativas.
Para Borges e Souza (2020) as pesquisas no campo da
psicologia moral permitem que o sujeito tenha a percepção da
constituição de si mesmo e das contínuas elaborações nos planos ético
e moral e La Taille (2006) afirma que a moralidade é uma construção
e uma constante autorregulação que ocorre em contextos de interação
social. Piaget (1932/1994) afirma que para que haja de fato
autonomia moral, é necessário que se rompa com a heteronomia e
com o respeito unilateral regido pela obediência, tal superação
permite que haja novas formas de relações sociais, pautadas pela
cooperação e pelo respeito mútuo, assim como é promovida por tais
relações em um processo dialético e contínuo.
384
A autonomia é a superação dessa moral da obediência a algo
exterior ao sujeito, superação essa que se traduz tanto pela
necessidade da reciprocidade nas relações (respeito mútuo, e não
mais unilateral) quanto pela necessidade subjetiva de passar, para
legiti-los, os princípios e normas morais pelo crivo da
inteligência (LA TAILLE, 2006, p.16).
Piaget (1990, p.142) afirma que “a cooperação é condição do
verdadeiro pensamento [...] trata-se do indivíduo renunciar seus
próprios interesses em função da realidade comum e [...] colocar-se
do ponto de vista dos outros [...]”. Os estudos de psicologia moral
seguem a mesma lógica do autor ao considerar que “somente o bem
comum pode gerar coletividade, equidade e decisões que preservem a
maioria” (BORGES; SOUZA, 2020, p.472).
Outro aspecto relevante se na tomada de consciência do
sujeito a partir da descentração de si mesmo (PIAGET, 1977) e na
percepção de novos pontos de vista, resultando assim em atitudes
mais coerentes, refletidas e éticas. Todavia, para que haja êxito na
tarefa de educar moralmente para o desenvolvimento da autonomia
se faz necessário compreender que a criança não é um sujeito passivo,
que absorve como uma esponja os ensinamentos e valores morais
transmitidos pelo professor (BECKER, 2001). Nem tampouco a
transmissão oralizada de regras, valores e virtudes morais são
automatizados pelas crianças sem que elas realmente vivenciem
situações em que possam experienciar sua autonomia, desenvolvendo
condições de resolver problemas por meio do diálogo e de formas não
violentas. “Por essa razão, uma educação moral que objetiva
desenvolver a autonomia da criança não deve acreditar nos plenos
poderes de belos discursos, mas sim levar a criança a viver situações
385
onde sua autonomia será fatalmente exigida” (PIAGET, 1932/1994.
p.19).
Neste sentido, devemos levar em consideração a estrutura
didático-metodológica assumida pelo professor ao planejar suas aulas,
bem como pensar a forma que se a concepção de respeito entre
professor e aluno. Piaget (1932/1994, p.19) esclarece que “se uma
cultura for essencialmente coercitiva, valorizando as posturas
autoritárias e o respeito unilateral, dificilmente uma ação pedagógica,
por si , levará à autonomia dos alunos.”, deixando claro que se o
professor tiver uma postura de coagir seus alunos, levando a
comportamentos em que a obediência é obtida por punições,
doutrinando os corpos infantis, pouco ou nada se contribuirá para a
autonomia destas crianças.
Neste sentido, o professor deve se pautar em uma postura
mais reflexiva, com base na cooperação e no respeito mútuo, e, ainda
assim, se manter como uma autoridade sadia e dialógica na mediação
das atividades pedagógicas. O reconhecimento da autoridade sadia do
professor se dará por meio de um ambiente sociomoral cooperativo e
respeitoso, no qual o docente possa intervir de forma intencional e
planejada.
Para tanto, é necessário que o professor também se desenvolva
moralmente, rompendo com o tradicionalismo nas escolas, buscando
posturas mais assertivas para facilitar o desenvolvimento e construção
da sua própria moralidade e de seus alunos, o que muitas vezes é
complexo e requer uma reestruturação de si próprio, ou seja, exige a
autorregulação.
A autorregulação é a capacidade de dirigir por si mesmo a própria
conduta. Com ela, pretende-se escapar, pelo menos em parte, das
386
pressões sociais que configuram formas de conduta
preestabelecidas e alheias à vontade do sujeito. A autorregulação
pretende, pois, intensificar a relação consigo mesmo, até
converter cada indivíduo em sujeito de seus próprios atos, de
acordo com seus critérios morais. Assim entendida, a
autorregulação intervém na configuração de três ordens de
fenômenos: primeiro, a decisão da vontade que busca fazer com
que o juízo e a ação moral sejam coerentes; segundo a
autorregulação contribui também para a aquisição de hábitos
desejados; e, terceiro, contribui para conformar a maneira de ser
ou o caráter próprio de cada sujeito. (PUIG, 1988, p. 24-45).
Portanto, se o professor não se autorregula e não é
desenvolvido moralmente, mantendo posturas heterônomas,
consequentemente pautando suas ações em punições e coações para
obter atenção e obediência, a autonomia moral das crianças estará
fatalmente comprometida, uma vez que, não haverá espaços para
errar, refletir, conscientizar e por fim, tomar consciência de seus atos,
construindo assim novas percepções de como agir e se portar em
sociedade.
Portanto, é importante considerarmos que para um
desenvolvimento moral que venha ao encontro da autonomia e da
cooperação, o professor também venha a desenvolver-se, no sentido
de compreender que as crianças sob sua tutela não são seres passivos
e que para além de orientações verbais e/ou punições e castigos,
especialmente exercidas pelo respeito unilateral, são contraprodu-
centes. Ouvir a criança, deixa-la vivenciar situações em que ela tenha
que confrontar seus pontos de vista, levando em consideração outras
opiniões, permitir que haja reflexão é uma forma de favorecer o
desenvolvimento moral da criança. Piaget (1932/1994, p.22) afirma
387
que “a moral infantil esclarece, de certo modo a do adulto”, dessa
forma, para que não incorramos no erro de formarmos adultos não
desenvolvidos moralmente, é necessário que nossos esforços sejam
voltados para tal intento.
Assim, a Psicologia Moral se apresenta como um corpus
teórico e metodológico importante para a formação do professor-
pesquisador que tenha, entre seus objetivos pedagógicos, a
aprendizagem e o desenvolvimento integral dos estudantes.
Metodologia
Para atender aos objetivos propostos neste capítulo optamos
pela pesquisa bibliográfica, do tipo exploratória, visando levantar
quais pesquisas se apoiam na Psicologia Moral como referencial
teórico, bem como sugerir os possíveis impactos no cotidiano escolar.
Dessa forma, Severino (2007, p.122) afirma que
A pesquisa bibliográfica é aquela que se realiza a partir do registro
disponível, decorrente de pesquisas anteriores, em documentos
impressos, como livros, artigos, teses, etc. Utiliza-se de dados ou
de categorias teóricas trabalhados por outros pesquisadores e
devidamente registrados.
Ainda de acordo com Severino (2007), as pesquisas
exploratórias são definidas da seguinte forma “a pesquisa exploratória
busca apenas levantar informações sobre um determinado objeto,
delimitando assim o campo de trabalho, mapeando as condições de
manifestação desse objeto [...]” (SEVERINO, 2007, p. 123).
388
A pesquisa foi realizada por meio do repositório em um
programa de Mestrado Profissional da Unesp, na cidade de Bauru,
São Paulo, utilizando o descritor “moralidade” para buscar trabalhos
que utilizam a Psicologia Moral como aporte teórico e metodológico.
Selecionamos 13 trabalhos que atendem o pressuposto estabelecido
para esta pesquisa, sendo 1 em 2023, 1 em 2022, 3 em 2021, 3 em
2020, 4 em 2018 e 1 em 2016.
Resultados e Discussão
Após a seleção das pesquisas, organizamos um quadro
contendo o ano, autor, o nome da dissertação e de seu produto
educacional e alguns autores que balizam sua fundamentação teórica.
Quadro 1 – Relação de Dissertações, Produtos Educacionais e
Fundamentação Teórica
39
ANO AUTOR DISSERTAÇÃO
PRODUTO
EDUCACIONAL
FUNDAMENTAÇÃO
TEÓRICA
2023
BENETTI, E.S.
Jogos
cooperativos e a
percepção da
justiça
retributiva em
crianças na
educação
infantil
Jogos Morais
Piaget, J.; Puig;
J.M.; Araujo,
U.F.; Becker, F. ;
Buxarrais, M.R.;
La Taille, Y.;
Vinha. T.;
Tognetta, L.R.P.
2022
OLIVEIRA, J.
Os seriados de
streaming e a
construção da
Personalidades
fora de séries
Escaméz, J.;
López, R. G.;
Pérez, C. P. ;
39
Os autores que estão descritos na coluna Fundamentação teórica representam uma parcela
de autores da Psicologia Moral existente nos trabalhos.
389
personalidade
moral de
adolescentes
Llopis, A.; García,
X. M.; Puig, J.
M.; Kohlberg, L.;
Piaget, J.; Puig, J.
M.
2021
SAMPAIO,
C.F.S
Práticas
educativas
lúdicas e
reflexivas no
desenvolvimento
ético-moral em
contexto escolar
Jogos
interventivos no
desenvolvimento
ético-moral em
alunos da
Educação básica
Puig, J. M.;
Piaget, J.;
Tognetta, L. R. P. ;
Vásquez, A. S.
2021
OLIVEIRA, B.
A construção da
personalidade
moral por meio
de jogos de
regras em
estudantes dos
anos iniciais do
ensino
fundamental
Rir, Jogar e
Refletir...A
construção do
eu com o outro
Tur iel , E.;
Tognetta, L. R. P. ,
Assis, O. Z. M.;
Queiroz, S. S.;
Ronchi, J. P. ;
Tokumaru, R. S.;
Puig, J. M.;
Piaget, J.
2021
CAVALCANTE,
C.P.
Educação moral
e resolução de
problemas
matemáticos no
primeiro ano do
Ensino
Fundamental
Técnicas e
procedimentos
em Educação
Moral por meio
da resolução de
problemas
matemáticos
Piaget, J.;
DeVriés, R.,
Zan,B.;
Garcia,X.M, Puig,
J.M.; Lepre, R.
M.; Arruda;
A.C.J.Z.; Menin,
M. S. S.
2020
ALVES, H.
Moralidade e
Gênero na
concepção de
crianças da
Educação
Era uma vez: A
história que eu
criei
Piaget. J.; Arantes,
V.; Araujo, U.F.;
Silva; M. A.M.
La Taille, Y.
390
Infantil: Uma
proposta de
intervenção que
valoriza a
oralidade e a
criatividade
2020
LEITE, C. A. N.
A interação
entre crianças na
creche e o
desenvolvimento
do juízo moral:
Práticas
interventivas
Guia de práticas
interventivas
para o
desenvolvimento
moral das
crianças na
Creche.
Montoya, A.O.D.;
Lepre, R. M.; La
Taille, Y.;
Montenegro, T.;
Piaget, J.
2020
PERUZZO,
D.L.
Os memes como
recurso
pedagógico na
construção de
valores morais
no ensino médio
O meme como
instrumento
pedagógico no
ensino de
valores morais:
orientações para
estudantes e
professores
Bataglia, P. ; Lepre,
R., Morais, A. A.;
Ferreira, P. E.
Kohlberg, L.;
Piaget, J.
2018
FERREIRA, P.
E.
A honestidade
como valor
moral: uma
construção
possível e
Necessária na
escola
Pinóquio em:
Quero ser um
menino de
verdade!
Piaget, J.; Arantes,
V. A.; Araújo, U.
F. ; Biaggio, A.M.
B.; Kohlberg, L.
2018
MIRANDA, J.
G. J.
Educação moral
no ensino
médio:
possibilidades de
intervenção em
Educação moral
no ensino
médio: um dia
para professores
Kohlberg, L.;
Piaget, J.; Taille,
Y.; Puig, J. M.
391
uma escola de
ensino integral
2018
MIRANDA,
S. V.
O papel da
generosidade no
desenvolvimento
da moral numa
Escola Waldorf
É bom praticar a
generosidade:
um exemplo de
seu emprego no
processo criativo
do professor
Tognetta, L.R.P.,
Assis, O. Z. M.;
Tavares, M. R. et.
al.; Piaget, J.;
Lima, V. A. A.
2018
CAMPOS, I.C.
Os direitos
humanos como
mediadores para
o
desenvolvimento
moral de alunos
do ensino médio
Infográfico sobre
os Direitos
Humanos para
alunos da
Educação Básica
Kohlberg, L.;
Piaget, J.; Diaz-
Aguado, M.J,
Medrano, C.;
La Taille, Y.; Puig,
J.M.;
2016
MARTINS, D.
P.
A contação de
histórias como
recurso
facilitador
do
desenvolvimento
do juízo moral
de crianças da
educação
infantil
Avaliação
qualitativa do
juízo moral de
crianças
envolvendo a
generosidade, a
amizade e a
justiça
Kohlberg, L.; La
Taille, Y.; Macedo,
L.D.; Menin,
M.S.S.; Piaget, J.
Fonte: Elaborado pelos autores (2023)
Iniciando do trabalho de pesquisa mais recente, temos a
dissertação “Jogos cooperativos e a percepção da justiça retributiva em
crianças na educação infantil” e seu Produto Educacional “Jogos
Morais” (BENETTI,2023), cujo tema central está na elaboração de
uma Sequência Didática (SD) baseada em Jogos Cooperativos com o
intuito de desenvolver valores morais e a percepção da Justiça
392
Retributiva, bem como a resolução de problemas pelas formas mais
avançadas da reciprocidade. Como Produto Educacional foi
elaborado um e-book que contém toda a SD e vídeos explicativos da
execução das atividades. O autor conclui que uma SD baseada em
Jogos Cooperativos, bem como um ambiente escolar que rompa com
a moral do dever, possibilita avanços significativos na moral infantil.
Nota-se que o professor tem papel fundamental neste percurso, uma
vez que mesmo que utilizar atividades, brincadeiras e jogos
cooperativos, se não houver espaço de diálogo e interação, além de
um ambiente regido pelo respeito mútuo, pouco favorecerá o
desenvolvimento da moralidade na criança.
E o “grupo de iguais”, ou seja, a convivência de uma criança com
outras crianças é um dos melhores espaços para essa construção
da moralidade. Criança faz bem para criança! Isso não quer dizer
que adultos não são necessários, nem que a fase de heteronomia
seja dispensável". Quer dizer que precisamos viver, também
relações de igualdade com os outros para que saibamos construir
ou compreender regras construídas, mais do que somente
obedecer às regras impostas (MENIN, 1996, p. 53).
Portanto, os Jogos Cooperativos permitem que haja esse
grupo de iguais, incluindo o professor, que também estará envolvido
ativamente na proposta educacional intencional e planejada.
A pesquisa “Os seriados de streaming e a construção da
personalidade moral de adolescentes” e seu Produto Educacional
“Personalidades fora de ries” (OLIVEIRA, 2022), traz uma
abordagem educacional utilizando uma SD baseada em séries de
streaming e como resultado, foi apontada a disposição dos
participantes, uma vez que a utilização de elementos que fazem parte
393
do seu cotidiano aumenta o engajamento dos mesmos na construção
da moralidade.
Quanto aos professores, Oliveira (2022) afirma que:
Enfatizou-se que os educadores necessitam conhecer os
procedimentos da construção de personalidades morais para que
estejam aptos a desenvolvê-la em suas práticas docentes. Não será
suficiente ter os recursos didáticos, uma vez que o educador
possui um papel fundamental de atuar como o mediador para
que o exercício reflexivo se efetive e conduza os estudantes à
construção progressiva da autonomia moral. (OLIVEIRA, 2022,
p. 71).
A autora reafirma a necessidade do professor em promover
um ambiente em que a moralidade possa ser construída e isso se
através da sua mediação na sala de aula, intervindo na construção de
personalidades morais (PUIG, 1998).
A pesquisa “Práticas educativas lúdicas e reflexivas no
desenvolvimento ético-moral em contexto escolar e seu Produto
Educacional “Jogos interventivos no desenvolvimento ético-moral em
alunos da Educação básica” (SAMPAIO, 2021) aborda a questão do
jogo como instrumento capaz de promover a construção da
moralidade nos alunos e também ressalta a importância do professor
conhecer os percursos cognitivos das crianças de forma que sua
mediação permita com que elas avancem na construção da sua
moralidade, pautando pelo respeito mútuo e a cooperação. Para
DeVries (1998), o professor tem o papel de estimular a reflexão, bem
como promover situações reais em que a criança poderá por sua
moralidade à prova, permitindo que ela venha a autorregular-se na
medida em que vai refinando suas condutas morais.
394
Oliveira (2021) produziu a pesquisa intitulada “A construção
da personalidade moral por meio de jogos de regras em estudantes dos
anos iniciais do ensino fundamental” e também o Produto
Educacional “Rir, Jogar e Refletir...A construção do eu com o outro
trazendo uma proposta baseada em jogos voltada para o Ensino
Fundamental (EF) anos iniciais que tem como intuito, favorecer a
formação das personalidades morais destes alunos, para a autora, o
professor tem importante papel na construção da moralidade, uma
vez que permite com que os alunos possam refletir a partir de
situações problematizadoras.
A mediação docente no processo de construção da personalidade
moral aparece como fundamental, uma vez que é o professor o
responsável por conduzir a ação formativa amparada na vivência
do jogo de regras que promove a interação social entre as crianças
e as coloca em situações de conflito cognitivo. (OLIVEIRA,
2021, p. 151).
A pesquisa “Educação moral e resolução de problemas
matemáticos no primeiro ano do Ensino Fundamental” e seu Produto
Educacional “Técnicas e procedimentos em Educação Moral por
meio da resolução de problemas matemáticos” (CAVALCANTE,
2021) traz uma abordagem que trata a resolução de problemas
matemáticos que apresentem dilemas morais e mostrou-se como uma
estratégia válida para construção moral e como possibilidade de
atuação do professor para uma educação mais humanizada. A
pesquisa também alerta para a dificuldade dos professores da área da
Matemática em abordar, em suas práticas docentes, reflexões, dilemas
morais, o que poderia colaborar com a formação integral dos alunos
(CAVALCANTE, 2021).
395
A pesquisa de Alvez (2020), intitulada “Moralidade e Gênero
na concepção de crianças da Educação Infantil: Uma proposta de
intervenção que valoriza a oralidade e a criatividade” e seu Produto
Educacional “Era uma vez: A história que eu criei” parte da hipótese
de que as relações de gênero e a moralidade, trabalhadas em uma SD,
podem contribuir para o desenvolvimento do juízo moral e na
reflexão acerca das questões de gênero. A autora enfatiza que a partir
da intervenção, o respeito pela diversidade traz benefícios a todos, no
sentido de comunidade (ALVEZ, 2020), enfatiza também que para
além dos conhecimentos teóricos sobre moralidade, os professores
devem transformar a teoria em prática, indo ao encontro do que
Piaget (1932/1994) reflete, ao dizer que transmissão oral de valores
morais, sem o exemplo prático, pouco contribuem para o
desenvolvimento moral da criança.
A pesquisa “A interação entre crianças na creche e o
desenvolvimento do juízo moral: Práticas interventivas” e o Produto
Educacional “Guia de práticas interventivas para o desenvolvimento
moral das crianças na Creche” (LEITE, 2020) aponta para a
necessidade de formar professores a título de aprofundarem seus
conhecimentos teóricos acerca da moralidade infantil, uma vez que
muitas das práticas encontradas acabam reforçando o comportamento
heterônomo das crianças. Neste sentido, Puig (1988) afirma que a
“formação de pessoas autônomas e dialogadoras, dispostas a
comprometer-se na relação pessoal e na participação social com o uso
crítico da razão (PUIG, 1988, p. 22)”, complementando assim uma
das especificidades da ação docente, que é a formação integral dos
alunos.
396
Peruzzo (2020) traz a pesquisa “Os memes como recurso
pedagógico na construção de valores morais no ensino médio” e o
Produto Educacional “O meme como instrumento pedagógico no
ensino de valores morais: orientações para estudantes e professores”
que utiliza os memes como forma de comunicação a título de
compreender a concepção sobre a moral dos alunos e que permite aos
professores conhecerem a compreensão de seus alunos acerca da
moralidade. Outro ponto a ser ressaltado é que a pesquisa aponta que
a escola é um ambiente social e os vínculos formados pelos professores
e alunos favorecem a utilização do recurso como instrumento
pedagógico. DeVries (1998) afirma que o relacionamento entre
professor e aluno influencia diretamente na experiência e no
desenvolvimento da criança.
A pesquisa de Ferreira (2018) com o título de “A honestidade
como valor moral: uma construção possível e necessária na escola” e
seu Produto Educacional “Pinóquio em: Quero ser um menino de
verdade!” enfatiza a honestidade como um valor necessário a ser
trabalhado no contexto escolar e o professor como figura essencial
para promover situações problematizadoras que venham a
desenvolver em seus alunos a consciência moral, a discussão amplia a
necessidade de se trabalhar a moralidade em todas as disciplinas,
como forma de promover a formação integral dos alunos, neste
sentido, “a educação moral quer formar hábitos de convivência que
reforcem os valores como a justiça, a solidariedade, a cooperação ou
o cuidado com os demais (PUIG, 1988, p. 15).
A pesquisa “Educação moral no ensino médio: possibilidades
de intervenção em uma escola de ensino integral e seu Produto
Educacional “Educação moral no ensino médio: um dia para
397
professores” (MIRANDA, 2018) aborda uma perspectiva
kohlberguiana de construção de virtudes morais através de dilemas
morais, o que apontou uma elevação nos níveis morais encontrados.
Reflete também da necessidade de o professor teorizar seus
conhecimentos através da sua prática pedagógica, permitindo que sua
práxis venha ao encontro de uma proposta educacional que clarifique
os valores morais.
A pesquisa “O papel da generosidade no desenvolvimento da
moral numa Escola Waldorf” e o Produto Educacional “É bom
praticar a generosidade: um exemplo de seu emprego no processo
criativo do professor” teve como foco a participação de pais e alunos
de uma escola pautada na pedagogia Waldorf, demonstrando assim a
importância do desenvolvimento moral da criança. O autor enfatiza
que a generosidade é um valor moral compreendido nas atividades
elaboradas pelos professores e que é estimulada no ambiente escolar.
É importante ressaltar que as trocas que irão legitimar os valores
morais (TOGNETTA, 2023), portanto, o professor ter consciência
daquilo que se disporá a ensinar, bem como exemplificar e reforçar os
valores morais como a generosidade, reforçam a construção da
autonomia da criança.
A pesquisa “Os direitos humanos como mediadores para o
desenvolvimento moral de alunos do ensino médio” e o Produto
Educacional “Infográfico sobre os Direitos Humanos para alunos da
Educação Básica” (CAMPOS, 2018) traz as contribuições de
Kohlberg para as aulas de Educação em Direitos Humanos, na qual,
foi constatado que o material produzido potencializou o
desenvolvimento moral dos alunos, refletindo nas suas atitudes e
convivência ética.
398
Por fim, a pesquisa “A contação de histórias como recurso
facilitador do desenvolvimento do juízo moral de crianças da
educação infantil” e o Produto Educacional “Avaliação qualitativa do
juízo moral de crianças envolvendo a generosidade, a amizade e a
justiça” (MARTINS, 2016) traz as contribuições de uma intervenção
planejada intencionalmente para desenvolver a moralidade nas
crianças. A partir da aplicação dos instrumentos elaborados pela
autora, verificou-se o aumento da compreensão das crianças acerca de
dilemas morais, permitindo avanços em sua moralidade, bem como
melhoras na capacidade dialógica e na convivência coletiva. A
pesquisa ainda ressalta que os valores morais são construídos e
transmitidos através das trocas sociais, sendo o professor um destes
mediadores e que este, deve estar preocupado com o planejamento do
ambiente escolar, bem como a organização do mesmo de forma a
reforçar a construção da moralidade na criança.
No quadro 02 demonstramos os objetivos e a abordagem
metodológica de cada uma das pesquisas realizadas, com base na
Psicologia Moral.
Quadro 2 – Relação de Dissertações, objetivos e abordagens metodológicas
DISSERTÃO OBJETIVOS
ABORDAGEM
METODOLÓGICA
Jogos cooperativos e
a percepção da
justa retributiva
em crianças na
educação infantil
Utilizar os Jogos
Cooperativos como
forma de identificar os
elementos que
contribuem para o
desenvolvimento do
Juízo Moral, com foco na
Justiça Retributiva e na
Metodologia da Pesquisa-
Ação, coleta de dados
Método Clínico
Piagetiano, análise de
dados do tipo do Discurso
do Sujeito Coletivo.
399
construção dos valores
morais.
Os seriados de
streaming
e a
construção da
personalidade moral
de adolescentes
Mobilizar a construção
de personalidades morais
autônomas por meio do
diálogo e reflexão.
Abordagem quali-
quantitativa, amparada na
pesquisa descritiva com
levantamento de campo e
intervenção com os
respondentes do
questionário para
elaboração do produto
educacional.
Práticas educativas
lúdicas e re exivas
no desenvolvimento
ético-moral em
contexto escolar
Conhecer e analisar as
concepções de professores
do Ensino Fundamental
sobre a formação integral
no desenvolvimento
moral com o intuito de
propor ações pedagógicas
voltadas para este fim.
Entrevista
Semiestruturada e
Pesquisa de campo com
abordagem qualitativa.
A construção da
personalidade moral
por meio de jogos de
regras em estudantes
dos anos iniciais do
ensino fundamental
Promover a construção
de personalidades morais
aptas à autonomia.
Pesquisa exploratória de
abordagem qualitativa
com características de
pesquisa bibliográfica-
documental.
Educação moral e
resolução de
problemas
matemáticos no
primeiro ano do
Ensino
Fundamental
Investigar uma proposta
de educação moral por
meio da resolução de
problemas matemáticos
com crianças do primeiro
ano do Ensino
Fundamental.
Estudo de caso, com
abordagem qualitativa,
Pesquisa de campo e
Método Clínico
Piagetiano
Moralidade e
Gênero na
concepção de
Caracterizar o
desenvolvimento moral
Caráter qualitativo
interpretativo para análise
400
crianças da
Educação Infantil:
Uma proposta de
intervenção que
valoriza a oralidade e
a criatividade
de crianças de 5 anos, da
Educação Infantil,
diagnosticando suas
concepções sobre gênero
e moralidade, visando
promover uma reflexão
dentro de um processo de
Educação para a
emancipação.
das interações
comunicativas através de
perguntas
semiestruturadas e coleta
de dados através de Grupo
Focal
A interação entre
crianças na creche e
o desenvolvimento
do juízo moral:
Práticas
interventivas
Produzir material que
sirva de suporte e
orientação para os
educadores em suas
intervenções que
favoreçam a gênese da
moralidade em crianças
em suas interações com
seus pares.
Pesquisa qualitativa do
tipo estudo de caso
Os memes como
recurso pedagógico
na construção de
valores morais no
ensino médio
Conhecer e compreender
as possíveis contribuições
dos memes, uma forma
de linguagem e
comunicação muito
difundida atualmente na
internet, como forma de
auxiliar os estudantes a
compreenderem valores
morais
Pesquisa Participante com
característica qualitativa
A honestidade como
valor moral: uma
construção possível
e Necessária na
escola
Discutir princípios
morais e introduzir,
como vocabulário na sala
de aula, os termos
caráter, confiança, justiça
e honestidade,
Pesquisa-intervenção, com
abordagem qualitativa
num caráter social,
propondo inferências e
ações para a problemática
apresentada
401
demonstrando a
importância de sempre
dizer a verdade e as
consequências da
mentira.
Educação moral no
ensino médio:
possibilidades de
intervenção em uma
escola de ensino
integral
Analisar o
desenvolvimento moral
de adolescentes
estudantes do Ensino
Médio a partir de uma
intervenção baseada no
referencial teórico
conhecido como
Educação Moral,
inspirada na psicologia de
Piaget, Kohlberg, nos
trabalhos de Puig e
fundamentada na
filosofia de Sócrates e
Kant.
Pesquisa-Ação, coleta de
dadosDilema de Heinz
Forma A.
O papel da
generosidade no
desenvolvimento da
moral numa
Escola Waldorf
Procurar identificar e
analisar o papel da
generosidade como
componente do
desenvolvimento moral
nos anos iniciais do
ensino fundamental em
uma escola Waldorf
Pesquisa do tipo
etnográfica, qualitativa,
com elementos
quantitativos.
Os direitos humanos
como mediadores
para o
desenvolvimento
moral de alunos do
ensino médio
Investigar aulas de
Educação em Direitos
Humanos oferecidas a
um grupo de estudantes
de ensino médio com
intuito de promover o
Pesquisa- Intervenção com
análise qualitativa
402
desenvolvimento do
raciocínio moral.
A contação de
histórias como
recurso facilitador
do desenvolvimento
do juízo moral de
crianças da
educação infantil
Verificar se um programa
intencional e planejado
com contação de
histórias e reflexão
coletiva pode contribuir
para o desenvolvimento
do juízo moral de
crianças da p-escola
Pesquisa-Ação
Fonte: Elaborado pelos autores
Os objetivos de todas as pesquisas se voltam para questões
educacionais e de aplicação direta nas escolas, revelando a
preocupação com a práxis pedagógica. O público abordado vai da
creche ao ensino médio, perpassando toda a Educação Básica. As
abordagens metodológicas têm prevalência da pesquisa qualitativa, do
tipo participante ou ação. Nota-se, ainda, que todas as pesquisas
selecionadas abordam de certa forma a necessidade do professor como
mediador na construção da moralidade, além de reforçar o impacto
positivo no desenvolvimento moral quando as propostas pedagógicas
são planejadas de forma intencional.
Considerações Finais
Identificamos e descrevemos um total de 13 trabalhos
embasados na Psicologia Moral; através destas pesquisas, evidenciou-
se que, embora a criança seja a protagonista no processo de ensino e
aprendizagem, a mesma não se desenvolverá sem a mediação do
professor. Este por sua vez, tem papel fundamental na elaboração,
403
planejamento e organização das aulas e atividades pedagógicas e,
através da sua intencionalidade, poderá favorecer o desenvolvimento
integral da criança.
O presente capítulo ressalta que a Psicologia Moral pode
contribuir para a formação continuada de professores, em especial,
através dos trabalhos encontrados no repositório do MP da Unesp -
Bauru, uma vez que vão ao encontro das necessidades educacionais
dos docentes. Ressaltamos também que, as pesquisas selecionadas
apontam para a necessidade da formação continuada de professores,
a título de aprofundarem seus conhecimentos acerca da construção da
moralidade, ampliando assim, sua práxis pedagógica.
Piaget (1932/1994) enfatiza que a escola é um ambiente
favorável para as trocas mútuas e relações sociais e que pode favorecer
o desenvolvimento moral das crianças, contudo, sem que o professor
faça ativamente seu papel, apenas serão reforçados comportamentos
heterônomos e que não contribuem em nada com o desenvolvimento
moral dos alunos, nem tampouco com a formação integral dos
mesmos. Por fim, a formão continuada deve abranger a formação
moral não somente dos alunos, mas dos professores, para que estes,
em sua vez, possam ter clareza de como planejar suas aulas no sentido
de maior eficiência na mediação. Neste sentido, as pesquisas realizadas
por professores em programas de formação, em nível de pós-
graduação, se fazem imprescindíveis.
404
Referências
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Educação Infantil: uma intervenção que valoriza a oralidade e a
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405
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[recurso eletrônico] – 1.ed. – Curitiba-PR: Editora Bagai, 2021.
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Estadual Paulista. Faculdade de Ciências, Bauru, 2018.
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Dissertação (Mestrado) - Universidade Estadual Paulista. Faculdade
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MIRANDA, S.V. O papel da generosidade no desenvolvimento da
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406
OLIVEIRA, B. A construção da personalidade moral por meio de
jogos de regras em estudantes dos anos iniciais do ensino
fundamental. Dissertação (Mestrado)Universidade Estadual
Paulista. Faculdade de Ciências, Bauru, 2021
OLIVEIRA, J. Os seriados de streaming e a construção da
personalidade moral de adolescentes. Dissertação (Mestrado)
Universidade Estadual Paulista. Faculdade de Ciências, Bauru, 2022
PERUZZO, D.L. Os memes como recurso pedagógico na
construção de valores morais no Ensino Médio. 76 f. Dissertação
apresentada no Programa de Pós-Graduação em Docência para a
Educação BásicaUnesp, Faculdade de Ciências, Campus Bauru,
2020.
PIAGET, J. A tomada de consciência. - São Paulo: Melhoramentos:
Ed. da Universidade de São Paulo, 1977.
PIAGET, J. O juízo moral na criança. Tradução: Elzon Lenardon.
(public. orig. 1932). São Paulo: Summus, 1994.
PUIG, J. M. Ética e valores: métodos para um ensino transversal.
Tradução: Ana Venite Fuzatto. Revisão técnica: Ulisses Ferreira de
Araújo. São Paulo: Casa do Psicólogo, 1988.
PIAGET, J. Sobre a Pedagogia: textos inéditos. São Paulo, SP:
Casa do Psicólogo, 1998.
SAMPAIO, C.F.S. Práticas educativas lúdicas e reflexivas no
desenvolvimento ético- moral em contexto escolar. Dissertação
(Mestrado)Universidade Estadual Paulista. Faculdade de Ciências,
Bauru, 2021.
407
SEVERINO, Antônio Joaquim. Metodologia do trabalho
científico. 23. ed. rev. e atual. São Paulo: Cortez, 2007.
TOGNETTA, L. R. P. A construção da solidariedade e a educação
do sentimento na escola: uma proposta de trabalho com as virtudes
numa visão construtivista. Campinas, SP: Mercado das letras; São
Paulo: Fapesp, 2003. (Coleção Educação e Psicologia em Debate).
408
409
Sobre os Autores e Autoras
Alessandra de Morais é Psicóloga, com Mestrado e Doutorado em
Educação pelo Programa de Pós-Graduação em Educação (PPGE) da
Faculdade de Filosofia em Ciências (FFC), Universidade Estadual
Paulista (UNESP), Campus de Marília. É Master em Programas de
Intervención Psicológica en Contextos Educativos, pela Universidad
Complutense de Madrid (UCM) e Expert em Aprendizagem
Cooperativa, pela Universidad de Alca (UA), Espanha. É Professora
Assistente junto ao Departamento de Educação e Desenvolvimento
Humano (DEPEDH) e ao PPGE a FFC/UNESP de Marília.
Também é Assessora científica da FAPESP e Focalizadora de Danças
Circulares.
E-mail: alemorais.shimizu@gmail.com.
ORCID: https://orcid.org/0000-0001-5521-9307
Andreia do Nascimento Lima é Mestranda em Educação pela
FFC/UNESP/Marília, especialista em Gestão da Segurança de
Alimentos pelo Centro Universitário SENAC, graduada em
Administração Pública pela Universidade Federal do Pará e graduada
em Tecnologia de Alimentos pela Universidade do Estado do Pará.
Atualmente é Técnica em Alimentos e Laticínios do Instituto Federal
de Educação, Ciência e Tecnologia do Pará do Campus Rural de
Marabá (IFPA CRMB).
E-mail: an.lima@unesp.br.
ORCID: https://orcid.org/0000-0003-1008-8870.
410
Angel Sthefani Ramalho é Mestranda em Educação pela Faculdade
de Filosofia e Ciências (FFC), Universidade Estadual Paulista “Júlio
de Mesquita Filho” (UNESP), Campus de Marília, São Paulo, Brasil.
Licenciada em Física pelo Instituto Federal de Educação, Ciência e
Tecnologia de São Paulo, (IFSP), Campus Birigui, São Paulo, Brasil.
Licenciada em Pedagogia pelo Instituto Pedagógico de Minas Gerais,
IPEMIG, Belo Horizonte, Minas Gerais, Brasil. Preceptora no
Programa Residência Pedagógica CAPES subprojeto Física, IFSP
Campus Birigui, Birigui, São Paulo, Brasil.
E-mail: angel.sthefanni@gmail.com ou a.ramalho@unesp.br.
ORCID: https://orcid.org/0009-0004-2444-4033.
Bruna Assem Sasso dos Santos é Pedagoga, bolsista de Iniciação
Científica da FAPESP, com aprofundamento em Educação Infantil,
pela Faculdade de Filosofia e Ciências (FFC) da UNESP/Marília.
Mestra e Doutora em Educação, na linha de pesquisa: Psicologia da
Educação, processos educativos e desenvolvimento humano, do
Programa de Pós-Graduação da UNESP Univ. Estadual Paulista
“Júlio de Mesquita Filho”, Câmpus de Marília. Integrante do Grupo
de Estudos e Pesquisa em Epistemologia Genética e Educação
(GEPEGE) e do Grupo de Estudos e Pesquisas em Psicologia Moral
e Educação Integral (GEPPEI).
E-mail: brunaasasso@gmail.com ou bruna.sasso@unesp.br.
ORCID: https://orcid.org/0000-0002-0190-4365.
411
Cláudia Érika Siqueira do Nascimento Lima é mestranda em
Educação pela UNESP - Campus Marília, especialista em Docência
para Educação Profissional, Científica e Tecnológica pelo IFPA -
Campus Itaituba. Graduada em Enfermagem pela UEPA - Campus
Santarém. Membro do Grupo de Pesquisa Desenvolvimento
Sociomoral de Crianças e Adolescentes, desenvolvendo estudos na
área da educação e saúde da criança e do adolescente.
E-mail: claudia.erika@unesp.br.
ORCID: https://orcid.org/0000-0001-5998-8189.
Cristiane Paiva Alves é Terapeuta Ocupacional pela Faculdade de
Filosofia e Ciências - FFC, UNESP, Campus de Marília, tem
mestrado e doutorado em Educação Especial, pela Universidade
Federal de São Carlos UFSCar. É especialista em Neurologia e
Reabilitação dos Membros Superiores, pela UFSCar. Docente do
Departamento de Fisioterapia e Terapia Ocupacional DEFITO e
do Programa de Pós-Graduação em Educação - PPGE da Faculdade
de Filosofia e Ciências - FFC, UNESP/Marília. Instrutora de Yoga e
vice-líder do Grupo de Estudos e Pesquisas em Psicologia Moral e
Educação Integral (GEPPEI).
E-mail: paiva.alves@unesp.br.
ORCID: https://orcid.org/0000-0002-2450-4129.
Cristina do Socorro Ribeiro da Costa é Mestranda em Educação pela
UNESP/Marília. Licenciada em Letras pela Faculdade de Itaituba
(FAI), como bolsista do PROUNI. Foi professora da Rede Municipal
de Ensino de Itaituba/PA. Atualmente é Técnica Administrativa no
Instituto de Educação, Ciências e Tecnologia do Pará (IFPA).
412
Membro do Grupo de Estudos e Pesquisas em Organizações e
Democracia.
E-mail: cristina.costa@unesp.br.
ORCID: https://orcid.org/0000-0002-6160-7012.
Eduardo Silva Benetti é Mestre em Docência para Educação Básica,
Especialista em Neurociência e Educação, Jogos e Brincadeiras na
Educação e Psicologia da Educação e Aprendizagem, Professor
Recreacionista na rede municipal de Catanduva- SP. Membro do
Grupo de Estudos e Pesquisas em Desenvolvimento Moral e
Educação (GEPEDEME).
E-mail: luxgor00@gmail.com.
ORCID: https://orcid.org/0000-0003-1861-6340.
Fábio Luiz de Almeida Bertacini é Psicólogo pela Universidade de
Cuiabá - UNIC, mestrando do Programa de Pós-Graduação em
Educação PPGE pela Faculdade de Filosofia e Ciências - FFC,
UNESP, de Marília. Especialista em Gestão de Negócios pela
Universidade Gama Filho. Coordenador de Cursos do Senac-SP.
E-mail: fabiobertacini@gmail.com ou fabio.bertacini@unesp.br.
ORCID: https://orcid.org/0009-0003-5659-7205.
Fernanda Moerbeck Cardoso Mazzetto é Pós doutoranda em
Educação pela Universidade Estadual Paulista de “Júlio de Mesquita
Filho” Faculdade de Filosofia e Ciências, Marília, SP, Doutora em
Enfermagem e Docente da Faculdade de Medicina de Marília
(FAMEMA)/Marília/SP. E-mail: fernandamazzetto4@gmail.com.
ORCID: 0000-0001-9276-219X.
413
Graziella Diniz Borges é graduada em Pedagogia e Normal Superior,
pela Universidade de Uberaba (2004), também possui graduação em
Psicologia, pela PUC-Minas (2005), Pós-graduação lato sensu em
Psicopedagogia Clínico-Institucional (2011), Mestra em Educação,
pela Universidade Estadual Paulista "Júlio de Mesquita filho" -
Campus Marília (2017). Doutora pelo Programa de Pós-Graduação
em Educação da Unesp-Marília (2022). Atua na Educação Básica
como professora 23 anos nas redes públicas e privada. Professora
Universitária em diversos cursos de graduação e pós-graduação. É
membro do GEPPEI (Grupo de Estudos e Pesquisas em Psicologia
Moral e Educação Integral). Desenvolve oficinas com os temas
"Educação do Sentimento na Escola", "Assembleias Escolares",
"Formação Ética do Professor". Atualmente se dedica a pesquisar "A
Construção do Ambiente Sócio Moral na Escola Básica" e "Educação
em Valores".
Henrique Tahan Novaes é Professor da Faculdade de Filosofia e
Ciências da UNESP- Campus de Marília. Coordenador do Programa
de Pós-Graduação em Educação.
E-mail: henrique-tahan.novaes@unesp.br.
ORCID: http://orcid.org/0000-0001-5247-3684.
Jerusa Ainoã Palheta de Souza Cardoso é Mestranda em Educação
Minter FFC/UNESP/Marília e IFPA e Licenciada em Matemática
pela UFPA. Atualmente é Técnica Administrativa em Educação do
IFPA/Campus Rural de Marabá. E-mail: jerusa.souza@unesp.br.
ORCID: https://orcid.org/0000-0002-4245-2270.
414
Juliana Gonçalves Herculian é Doutoranda em Educação na
UNESP/Marília; Mestra em Enfermagem pela Escola de
Enfermagem da Universidade de São Paulo (EEUSP); Especialista em
MBA de Gestão em Saúde pela Universidade de São Paulo/SP; tem
Aperfeiçoamento de competências em docência clínica e preceptoria
pela Faculdade de Medicina de Botucatu/UNESP; com
Aprimoramento em Enfermagem Psiquiátrica e Saúde Mental pela
FUNDAP e Graduada como Enfermeira pela Faculdade de Medicina
de Marília (FAMEMA). Atualmente é Docente do Curso de
Medicina da Fundação Educacional do Município de Assis e participa
do Grupo de Estudos e Pesquisas em Psicologia Moral e Educação
IntegralGEPPEI da UNESP/Marília.
E-mail: julianaherculian@yahoo.com.br.
ORCID: https://orcid.org/0000-0002-9623-1473.
Matheus Estevão Ferreira da Silva é Pedagogo pela Faculdade de
Filosofia e Ciências (FFC), Universidade Estadual Paulista (UNESP),
Campus de Marília, Mestre e Doutorando em Educação pelo
Programa de s-Graduação em Educação (PPGE) da mesma
instituição e graduando em Psicologia pela Faculdade de Ciências e
Letras (FCL), U N E S P, Campus de Assis. Foi bolsista de Iniciação
Científica FAPESP em ambas as graduações, bolsista de Mestrado do
CNPq e da FAPESP e atualmente é bolsista de Doutorado da CAPES.
Atuou como 1.º Secretário do cleo de Direitos Humanos e
Cidadania de Marília (NUDHUC) nas gestões de 2016-2018 e de
2019-2021. E-mail: matheus.estevao2@hotmail.com.
ORCID: https://orcid.org/0000-0002-2059-6361
415
Patrícia Unger Raphael Bataglia é psicóloga, pela PUC/SP, Mestre e
Doutora em Psicologia Social pelo Instituto de Psicologia da USP. É
Professora Associada do Departamento de Educação e Desenvolvi-
mento Humano, da Faculdade de Filosofia e Ciências,
UNESP/Marília. Professora credenciada no programa de s-
graduação em Educação (UNESP/ Marília). É líder do Grupo de
Estudos e Pesquisas em Psicologia Moral e Educação Integral
(GEPPEI). Faculdade de Filosofia e Ciências (FFC), Universidade
Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” (UNESP), Campus de
Marília, São Paulo, Brasil. E-mail: patricia.bataglia@unesp.br.
ORCID: https://orcid.org/0000-0002-2575-3020.
Priscila Caroline Miguel é Doutoranda em Educação com Bolsa
CAPES/PROEX e Mestra em Educação pelo Programa de Pós-
Graduação em Educação (PPGE) da Faculdade de Filosofia e
Ciências (FFC/UNESP), Campus de Marília e graduada em
Psicologia pela UNIMAR Universidade de Marília. Também foi
Bolsista de Mestrado da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal
de Nível Superior (CAPES). Membro do Grupo de Estudos e
Pesquisas em Psicologia Moral e Educação Integral (GEPPEI) desde
2018. E-mail: priscilacarolinemiguel@gmail.com.
ORCID: https://orcid.org/0000-0003-1499-9196.
Rita Melissa Lepre é Doutora em Educação e Livre-Docente em
Psicologia da Educação. Docente Associada da Universidade Estadual
Paulista (UNESP). Líder do Grupo de Estudos e Pesquisas em
Desenvolvimento Moral e Educação (GEPEDEME). E-mail:
melissa.lepre@unesp.br.
ORCID: https://orcid.org/0000-0002-0096-3136.
416
Tânia Suely Antonelli Marcelino Brabo é Pedagoga pela Faculdade
de Filosofia e Ciências (FFC), Universidade Estadual Paulista “Júlio
de Mesquita Filho” (UNESP), Campus de Marília, Mestre em
Educação pela mesma instituição e Doutora em Sociologia pela
Universidade de São Paulo (USP). Possui um s-doutorado em
Educação (2007) pela Universidade do Minho (UMINHO),
Portugal, e dois s-Doutorados em Educação (2012 e 2018) pela
Universidade de Valência (UV), Espanha. Livre-docente pela U N E S P.
Atualmente é Professora Associada junto ao Departamento de
Supervisão e Administração Escolar (DASE) e ao PPGE a
FFC/UNESP de Marília. Líder do cleo de nero e Diversidade
Sexual na Educação (NUDISE). E-mail: tamb@terra.com.br.
ORCID: https://orcid.org/0000-0002-9833-0635
Thaís São João Castellini é Mestre em Educação pela
FFC/UNESP/Marília e graduada em Pedagogia pela FAIP -
Faculdade de Ensino Superior do Interior Paulista. Professora na
Rede particular de ensino de Pompéia-SP. Membro do Grupo de
Estudos e Pesquisas em Psicologia Moral e Educação Integral
GEPPEI. E-mail: thais_castellini@hotmail.com.
ORCID: https://orcid.org/0000-0003-3871-831X.
Thaísa Angélica Déo da Silva Bereta é Psicóloga, com Mestrado,
Doutorado e s-Doutorado em Educação pela Universidade
Estadual Paulista, Campus de Marília. Atualmente, é docente e
coordenadora do Curso de Psicologia do Centro Universitário de
Adamantina e docente no Curso de Psicologia da Faculdade da Alta
Paulista. Participa do Grupo de Estudos e Pesquisas em Psicologia
Moral e Educação Integral (GEPPEI). É Membra da Comissão de
417
Ética do Conselho Regional de Psicologia de São Paulo. E-mail:
thaisaangelica@yahoo.com.br. ORCID: https://orcid.org/0000-
0003-4980-5849.
Thiago Corado Lima é Doutorando em Educação pelo Programa de
Pós-Graduação em Educação da Faculdade de Filosofia e Ciências da
Universidade Estadual Paulista "Júlio de Mesquita Filho", campus de
Marília. Mestre em Educação (2020) também pelo PPGE-FFC-
UNESP/Marília. Graduado em Educação Física (2012) e Pedagogia
(2014). Integra o GEPEGE - Grupo de Estudos e Pesquisas em
Epistemologia Genética e Educação e também o GEPPEI Grupo
de Estudos e Pesquisas em Psicologia Moral e Educação Integral.
Atua, desde 2012, na Educação Básica como professor e gestor escolar
na rede pública de ensino. E-mail: corado.lima@unesp.br. ORCID:
https://orcid.org/0009-0006-4331-7202.
Vilma Aparecida Bianchi é Doutoranda em Psicologia, Mestre e
graduada em Psicologia pela Universidade Estadual Paulista lio de
Mesquita Filho, Campus de Assis/SP. Atualmente é coordenadora da
Associação Filantrópica Nosso Lar- Projeto S.E.R.- Serviço Especial
de Reabilitação, projeto que atende crianças e adolescentes com
deficiências. Professora substituta do Departamento de Clínica da
UNESP/Assis (2022). Vinculada aos grupos de Pesquisa
GEPEDEME (Grupo de Estudos e Pesquisas em Desenvolvimento
Moral e Educação) e GEPPEI (Grupo de Estudos e Pesquisas em
Psicologia Moral e Educação Integral), ambos da UNESP. Realiza
palestras, capacitações, aprimoramento e supervisão técnica, atuando
nos temas: criança, adolescente, deficiência, transtornos de
418
aprendizagem, transtorno do espectro autista, desenvolvimento,
educação e violência. E-mail: vilma.bianchi@unesp.br. ORCID:
https://orcid.org/0000-0003-2642-1930.
419
Nesse começo do século XXI,
muito tem se falado sobre ética ou
mais precisamente sobre a falta dela.
A repercussão desse tema evidencia,
sem dúvida, uma importante preocu-
pação a essa dimensão tão relevante
em se tratando da formação huma-
na e por outro lado, um “mal-estar”
existencial e moral da sociedade que
infelizmente, cada vez mais desnuda a
necessidade de mais estudos e pesqui-
sas na área. E a Educação, não pode
se furtar dessa discussão, justamente
porque a formação das novas gera-
ções depende do seu trabalho.
Se desejamos sujeitos autô-
nomos moralmente falando, preci-
samos pensar na formação ética dos
educadores das mais diversas áreas e
contextos. Precisamos reetir e agir
através de ações que possibilitem a
construção de uma cultura do “au-
torrespeito”, condição essencial para a
formação dos demais valores morais.
O leitor encontrará nesse livro
reexões sobre a formação ética do
educador inspiradas em nossa prática
prossional e também frutos de nossas
inquietações a respeito da sociedade
atual e o que falta nela quando pensa-
mos nessa temática.
Por m, consideramos que a
formação ética depende de dimensões
intelectuais e afetivas, ambas devem
ser trabalhadas pela educação, seja
ela dada no contexto familiar, seja
pelos professores. E a formação ética
dos educadores é ponto nodal para a
formação dos educandos. E é essa, a
contribuição dada, com a publicação
dessa obra.
Boa leitura!
Programa PROEX/CAPES:
Auxílio Nº 0039/2022
Processo Nº 23038.001838/2022-11
Acreditamos veementemente que a escola deve estar comprometida
com a formação ética e moral dos estudantes, já que deve priorizar a
defesa da dignidade humana e da justiça social. Além de priorizar o
desenvolvimento de competências intelectuais, a escola deve priorizar
valores éticos e morais, já que visamos a construção de uma sociedade
mais justa, harmônica e democrática.
Esta coletânea reúne 16 capítulos que versam sobre a formação ética do
educador nos mais diversos contextos, fruto de estudos e pesquisas de
alunos, egressos e professores vinculados ao Programa de Pós-Gradua-
ção em Educação da UNESP – Campus de Marília, a quem agradece-
mos o auxílio concedido para a publicação do livro.
Cuidar da formação do professor (seja ela inicial ou continuada) não se
restringe ao “ensino” tecnicista de métodos e procedimentos. Cuidar
desses aspectos são importantes, mas precisamos pensar nos fundamen-
tos teóricos que as sustentam, sem corrermos o risco de um “reducio-
nismo pedagógico”. Precisamos considerar a formação ética de nossos
estudantes, que pressupõe uma formação adequada dos educadores no
tocante a isso.
Sendo assim, vivemos o desao de reconhecer que a educação tradi-
cional está reforçando a heteronomia e deve ser superada por práticas
pedagógicas democráticas se desejamos, sujeitos moralmente autôno-
mos. E é essa, a nossa preocupação, quando nos propusemos a escrever
a presente obra, a qual tivemos o cuidado de torná-la acessível a todos
os interessados na temática.
A FORMAÇÃO ÉTICA DO EDUCADOR
EM CONTEXTOS DIVERSOS
Patrícia Unger Raphael Bataglia
Priscila Caroline Miguel
Matheus Estevão Ferreira da Silva
(Organizadores)
A FORMAÇÃO ÉTICA DO EDUCADOR EM CONTEXTOS DIVERSOS
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