Este livro destaca o tema da formação ética do professor e da professora
da Educação Básica e do Ensino Superior. Ele nos convida a reetir so-
bre o papel da escola enquanto instituição comprometida com a formação
moral e ética dos estudantes que prioriza a defesa da dignidade humana
e da justiça social. Entende-se que, além de competências intelectuais, o
processo de educação escolarizada deve, também, priorizar valores éticos
e morais que nos ajudem a construir uma sociedade mais justa, harmônica
e democrática
Thaísa Angélica Déo da Silva Bereta
Psicóloga, com Mestrado, Doutorado e
Pós-Doutorado em Educação pela Uni-
versidade Estadual Paulista (UNESP),
Campus de Marília. Atualmente, é do-
cente e coordenadora do Curso de Psi-
cologia do Centro Universitário de
Adamantina e docente no Curso de
Psicologia da Faculdade da Alta Pau-
lista. Membra da Comissão de Ética do
Conselho Regional de Psicologia de
São Paulo – Subsede de Assis. Partici-
pa do Grupo de Estudos e Pesquisas em
Psicologia Moral e Educação Integral
(GEPPEI). Desenvolve estudos sobre a
Formação em Psicologia, com ênfase em
aspectos éticos, competência moral, me-
todologias ativas e ambiente acadêmico.
Patrícia Unger Raphael Bataglia
Doutora e Mestra em Psicologia Social
pela Universidade de São Paulo. Possui
Livre Docência em Desenvolvimento
Moral na Criança pela UNESP. Atu-
almente é docente e pesquisadora do
Departamento de Psicologia da Edu-
cação e do Programa de Pós-Gradu-
ação Stricto Sensu em Educação da
Faculdade de Filosoa e Ciências da
UNESP (campus Marília). Membra da
Comissão de Ética do Conselho Regio-
nal de Psicologia de São Paulo e asses-
sora cientíca da FAPESP. Coordena o
GEPPEI (Grupo de Estudos e Pesquisas
em Psicologia Moral e Educação Inte-
gral).
Programa PROEX/CAPES:
Auxílio Nº 0039/2022
Processo Nº 23038.001838/2022-11
Thaísa Angélica Déo da Silva Bereta
Patricia Unger Raphael Bataglia
Organizadoras
Estudos sobre a Formação Ética
na Educação Básica e no
Ensino Superior
Estudos sobre a Formação Ética na Educação Básica e no Ensino Superior
ANA CLÁUDIA SALADINI
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ESTUDOS SOBRE A FORMAÇÃO ÉTICA
NA EDUCAÇÃO SICA E NO
ENSINO SUPERIOR
Thaísa Angélica Déo da Silva Bereta
Patricia Unger Raphael Bataglia
(Org.)
Thaísa Angélica Déo da Silva Bereta
Patricia Unger Raphael Bataglia
(Org.)
ESTUDOS SOBRE A FORMAÇÃO ÉTICA
NA EDUCAÇÃO SICA E NO
ENSINO SUPERIOR
Marília/Oficina Universitária
São Paulo/Cultura Acadêmica
2023
UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA
FACULDADE DE FILOSOFIA E CIÊNCIASFFC
UNESP - campus de Marília
Diretora
Dra. Claudia Regina Mosca Giroto
Vice-Diretora
Dra. Ana Cláudia Vieira Cardoso
Conselho Editorial
Mariângela Spotti Lopes Fujita (Presidente)
Célia Maria Giacheti
Cláudia Regina Mosca Giroto
Edvaldo Soares
Marcelo Fernandes de Oliveira
Marcos Antonio Alves
Neusa Maria Dal Ri
Renato Geraldi (Assessor Técnico)
Rosane Michelli de Castro
Conselho do Programa de Pós-Graduação em Educação -
UNESP/Marília
Henrique Tahan Novaes
Aila Narene Dahwache Criado Rocha
Alonso Bezerra de Carvalho
Ana Clara Bortoleto Nery
Claudia da Mota Daros Parente
Cyntia Graziella Guizelim Simões Girotto
Daniela Nogueira de Moraes Garcia
Pedro Angelo Pagni
Auxílio 0039/2022, Processo 23038.001838/2022-11, Programa PROEX/CAPES
Ilustração da capa: Imagem gratuita (https://pixabay.com/pt/illustrations/rede-comunica%c3%a7%c3%a3o-
conex%c3%a3o-grupo-6470010/)
Parecerista: Ana Claudia Saladini - professora Associada da Universidade Estadual de Londrina, departamento de
Estudos do Movimento Humano, no Centro de Educação Física e Esportes
Ficha catalográfica
Serviço de Biblioteca e Documentação - FFC
E82 Estudos sobre a formação ética na educação básica e no ensino superior / Thaísa
Angélica o da Silva Bereta, Patrícia Unger Raphael Bataglia (org.).Marília :
Oficina Universiria ; São Paulo : Cultura Acadêmica, 2023.
266 p. : il.
CAPES
Inclui bibliografia
ISBN 978-65-5954-397-7 (Digital)
ISBN 978-65-5954-398-4 (Impresso)
DOI: https://doi.org/10.36311/2023.978-65-5954-397-7
1. Ética Estudo e ensino. 2. Educação básica. 3. Ensino superior. 4. Professores
- Formação. I. Bereta, Thaísa Angélica Déo da Silva. II. Bataglia, Patrícia Unger
Raphael. III. Título.
CDD 370.114
_____________________________________________________________________________
Catalogação: André Sávio Craveiro BuenoCRB 8/8211
Copyright © 2023, Faculdade de Filosofia e Ciências
Editora afiliada:
Cultura Acadêmica é selo editorial da Editora UNESP
Oficina Universitária é selo editorial da UNESP - campus de Marília
“O ideal da educação não é aprender ao
máximo, maximizar os resultados, mas é antes
de tudo aprender a aprender; é aprender a se
desenvolver e aprender a continuar a se
desenvolver depois da escola”.
Jean Piaget
Sumário
Prefácio | Ana Cláudia Saladini........................................................9
1. A Formação Ética do Educador | Patricia Unger Raphael Bataglia
.....................................................................................................13
2. O Educador e a Formação para a Autonomia no Ensino Superior
| Thaísa Angélica Déo da Silva Bereta ..............................................25
3. O Impacto da Educação Ética no Ensino Superior: Considerações
sobre a Dimensão Sociopolítica do Ofício do Professor | Manuel João
Mungulume ..................................................................................47
4. Competência Moral e Empatia na Formação Ética dos
Profissionais de Saúde | Cristiane Paiva Alves e Tamires Alves Monteiro
.....................................................................................................75
5. A Formação Ética do Psicólogo na Visão dos Docentes | Fátima
Simone Silva Pereira Consoni e Rita Melissa Lepre .........................105
6. Disciplina de Ética e Moral: análise das matrizes curriculares do
curso de Pedagogia em três universidades públicas do Estado de São
Paulo | Beatriz Ribeiro Peixoto .....................................................127
7. As Metodologias Ativas no Ensino Superior e o papel do Professor:
Desafios e Possibilidades no Ensino Presencial | Priscila Caroline
Miguel ........................................................................................151
8. Contribuições das Metodologias Ativas na Pós-Graduação em
Educação: Relato de Vivência em uma Disciplina na Unesp de
Marília | Gisele de Assis Carvalho Cabral .......................................177
9. Formação de Professores e a Inclusão do Aluno Autista no Ensino
Fundamental I: uma Abordagem Ética | Davi Milan ....................207
10. Construção da Personalidade Ética na Interação entre
Adolescentes e Professores no Contexto do Ensino Médio | Rogério
Melo de Sena Costa ......................................................................227
Sobre os autores ..........................................................................261
9
Prefácio
Ana Cláudia Saladini
Este livro, organizado pelas professoras Patrícia U. R. Bataglia
e Thaísa A. D. da S. Bereta destaca o tema da formação ética do
professor e da professora da Educação Básica e do Ensino Superior.
Ele nos convida a refletir sobre o papel da escola enquanto instituição
comprometida com a formação moral e ética dos estudantes que
prioriza a defesa da dignidade humana e da justiça social. Entende-se
que, além de competências intelectuais, o processo de educação
escolarizada deve, também, priorizar valores éticos e morais que nos
ajudem a construir uma sociedade mais justa, harmônica e
democrática.
A temática da obra foi o alicerce da disciplina “A formação
ética do educador no Ensino Superior” que as professoras
ministraram em 2021 junto ao Programa de Pós-Graduação em
Educação da Faculdade de Filosofia e Ciências, da Universidade
Estadual Paulista (UNESP), Campus de Marília. Compartilho com
os leitores que essa mesma temática foi o ponto sorteado para a prova
didática de livre docência da professora Patrícia.
Este livro reúne a produção de momentos academicamente
ricos de um grupo de pessoas que se propôs a refletir a respeito da
complexidade do desenvolvimento humano e como a educação pode
contribuir nesse processo. Nesta temática, destacam a questão da
formação ética do educador. Foram dis cutidas questões como: o que
https://doi.org/10.36311/2023.978-65-5954-397-7.p9-12
10
é formação ética?; como deve se dar?; quais são os fundamentos desse
processo? Como a escola de Educação sica e do Ensino Superior
tratam dessas questões em seu cotidiano?
Cuidar da formação do professor (inicial e continuada) não se
resume a ensi-lo um conjunto de técnicas e procedimentos de
ensino. Estas são importantes, mas sem os fundamentos teóricos que
as sustentam, corremos o risco de cair em um “vazio pedagógico” de
atividades com finalidade em si própria, ou seja, a atividade por ela
mesma.
Algumas pesquisas sobre a constituição moral e ética do ser
humano nos apresentam possíveis desdobramentos para a ação
docente (TOGNETTA; VINHA, 2007; LA TAILLE, 2009;
TOGNETTA; MENIN, 2017; VINHA et al, 2017; BERETA,
2020; BATAGLIA et al, 2010; MORO, 2020). São pesquisas que
tomam como referência os conhecimentos da Psicologia Moral
alinhada à perspectiva construtivista para tratar do impacto da
intervenção docente que, de forma planejada e intencional, pretende
contribuir para o desenvolvimento integral dos estudantes.
Precisamos considerar a formação ética de nossos estudantes,
mas concomitantemente a dos nossos professores e professoras da
Educação Básica e do Ensino Superior. Assim, reconhecemos que é
necessário ao professor, em sua práxis, testemunhar o valor do
diálogo, da solidariedade, do respeito por si e pelo próximo e da
justiça, entre outros. Não basta uma disciplina cuidar desse processo.
Não basta que apenas um professor priorize o diálogo como
fundamento de sua relação com os estudantes e favoreça para que
estes também priorizem entre si. PUIG (2000) ao considerar as ões
11
a serem planejadas e implementadas, propôs a organização e inter-
relação de três dimensões: a pessoal, a curricular e a institucional.
O desafio é reconhecer que a educação tradicional forma para
a heteronomia e deve ser superada por práticas pedagógicas
democráticas se queremos, de fato, formar para a autonomia. Daí a
importância de, ao pensar em ações que contribuam para o
desenvolvimento dos estudantes e/ou dos professores, garantirmos a
participação da escola como um todo.
Historicamente, a nossa sociedade e a instituição escolar
apoiam-se em práticas tradicionais que priorizam a obediência à
autoridade e à hierarquia, fontes de origem do poder. Entretanto, para
refletirmos sobre a formação ética do professor, novos caminhos
precisam ser feitos. Olhares que valorizem a descoberta, a reflexão e a
criação devem ser incentivados e, mais que isso, planejados. Entre as
possíveis ações é preciso nos distanciarmos dos contravalores como a
violência, o autoritarismo, o individualismo, a submissão à autoridade
externa e a indiferença/omissão (VINHA et al, 2017).
É preciso lucidez e coragem para reafirmarmos o
compromisso de educar para a autonomia e para um mundo mais
humano. E esta obra apresenta possíveis caminhos que foram e estão
sendo percorridos a partir das inquietações e investigações que os
autores e autoras compartilharam conosco.
Ana Cláudia Saladini
Outubro de 2022.
12
BATAGLIA, P. U. R. et al. A teoria de Kohlberg sobre o
desenvolvimento do raciocínio moral e os instrumentos de
avaliação de juízo e competência moral em uso no Brasil.
Disponível em: https://www.scielo.br. Acesso em: 22 de maio de
2022. https://doi.org/10.1590/S1413-294X2010000100004
BERETA, T. A. D. da S. A Formação Ética do Psicólogo: ambiente
acadêmico e competência moral. Marília: Oficina Universitária,
2020.
LA TAILLE, Y de. Formação ética: do dio ao respeito de si. Porto
Alegre; Artmed, 2009.
MORO, A. A Avaliação do clima escolar no Brasil: construção,
testagem e validação de questionários avaliativos. Curitiba; Appris,
2020.
PUIG, J. M. A construção da personalidade moral. São Paulo;
Ática, 1998.
VINHA, T. P. et al. Da escola para a vida em sociedade: o valor da
convivência democrática. Americana; Adonis, 2017.
TOGNETTA, L. R. P. e VINHA, T. P. Quando a escola é
democrática: um olhar sobre a prática das regras e assembleias na
escola. Campinas; Mercado de Letras, 2007.
TOGNETTA, L. R. P e MENIN, M. S. de S (orgs). Valores
Sociomorais. Americana; Adonis, 2017.
13
1.
A Formação Ética do Educador
Patricia Unger Raphael Bataglia
O presente texto teve duas inspirações. Por um lado, a
disciplina que Thaisa e eu ministramos na pós-graduação em 2021
para um grupo de alunos realmente diferenciado. Tivemos na
disciplina oportunidade de discutir textos e ideias muito importantes
sobre a formação ética do educador. Por outro lado, esse foi o ponto
sorteado para minha prova didática realizada em 24 de maio de 2022.
Foi um momento muito especial na minha carreira que decidi
transformar em texto para este livro.
Discutiremos a seguir, o que é formação ética, como essa
formação deve se dar e qual o fundamento de técnicas que trabalham
nesse sentido. Antes, é importante esclarecer que temos como
pressuposto que para o educador formar indivíduos que sejam éticos
e cidadãos, deve ele próprio ter uma formação que o desenvolva do
ponto de vista crítico-reflexivo.
Sobre esse ponto queremos trazer duas pesquisas: uma
nacional e outra realizada fora do Brasil que corroboram para essa
hipótese
Lukjanenko (1995) realizou um estudo no qual foi verificada
influência do juízo moral do professor sobre as relações estabelecidas
em sala de aula. Segundo seu estudo, os professores com um alto nível
https://doi.org/10.36311/2023.978-65-5954-397-7.p13-24
14
de juízo moral proporcionavam ambientes mais cooperativos em
comparação com professores com baixo nível de juízo moral, que
estabeleciam mais relações de coação. O juízo moral foi avaliado
usando os critérios de avaliação propostos por Kohlberg (1984). Essa
primeira pesquisa aponta para a relação entre o desenvolvimento
moral do educador eu sua prática.
O outro estudo foi realizado por DeVries e Zan (1998)
observando inicialmente 3 classes de educação infantil conduzidas por
educadoras com perfis muito diferentes entre si. Uma delas, conduzia
a classe como um sargento em um campo de recrutas, dando ordens,
perfilando os estudantes, recompensando e punindo. Na segunda
classe, a professora se assemelhava a uma gerente que trabalhava com
a produção rápida, comparação entre os estudantes e novamente
prêmios e punições. Nessas classes, predominava uma regulação
externa, ou seja, as ordens eram cumpridas na presença da professora
e nunca quando se viam sozinhos. Finalmente, na terceira classe, a
professora agia como uma mentora, trazia atividades desafiantes,
incentivava os estudantes a usarem suas palavras, mais do que a força
bruta e tinha como base de relação o diálogo. Nessa classe,
predominava a regulação interna. Ou seja, as crianças não dependiam
da professora para resolver grande parte dos problemas e para
manterem-se dentro dos combinados. Esse estudo mostra além da
relação entre a postura do educador e sua prática, a possibilidade de
trabalho com crianças desde muito cedo rumo à construção de sua
autonomia.
A atuação de acordo com procedimentos que levem as
crianças à criticidade, reflexão e atividade no desenvolvimento
depende de um educador que veja nisso um valor. Argumentamos
15
aqui que esse educador deve ter tido uma formação tal que tenha
contemplado, além da teoria e técnica, um trabalho de valorização de
um ambiente sociomoral positivo. Um educador que tenha uma
formação ética.
Mais uma advertência é necessária: ao falarmos sobre essa
formação trataremos indiscriminadamente do educador e do
educando como um binômio inseparável. Com isso queremos dizer
que a formação ética do educador favorecerá a sua atuação na
formação ética de seus educandos.
Chamamos de formação ética, a educação que tem como
preocupação a autonomia moral dos educandos. Por autonomia
moral seguimos a definição de La Taille (2006) quando contrastando
com a heteronomia, aponta que a autonomia é uma forma de relação
possível em que os princípios sobrepujam as regras, a intenção da ação
é mais importante do que as consequências, do que a obediência e do
que as convenções.
Educar para a autonomia é, portanto, criar um ambiente que
possa provocar o sujeito para além da obediência à autoridade, o que
em nossa tradição educacional é muito difícil de ser superado, haja
vista a história de inúmeros projetos e programas de reformulação da
educação que embora tenham sido bem-sucedidos e alguns durem até
hoje, não são hegemônicos. Singer (2000) relata experiências
educacionais que propuseram repúblicas de crianças e não são relatos
de experiências recentes. snia-Poliana por exemplo, foi dirigida por
Leon Tolstoi entre 1857 e 1860, o Lar das Crianças fundado em 1912
funcionou até 1942, Summerhill, em funcionamento desde 1912,
16
além de outras 1535 experiências inovadoras cadastradas no site da
REEVO
1
. Constam nesse site 106 experiências brasileiras.
São todas elas muito diferentes entre si, mas todas carregam a
ideia de que esse formato de educação baseado na transmissão do
conhecimento e na obediência à autoridade estão exatamente na
contramão do que se espera de um trabalho libertador e construtor de
um sujeito ativo e autônomo. Lembramos que para Piaget se o sujeito
“é passivo intelectualmente, ele não se moralmente livre” (PIAGET,
1998, p. 70), correlacionando autonomia intelectual e moral.
Educar moralmente, educar para a autonomia é um trabalho
que começa na educação infantil, como escreveram DeVries e Zan
(1998), mas deve continuar durante toda a escolarização e durante a
formação profissional. Especificamente, o educador também precisa
de uma formação ética que contemple teoria, técnica e práxis.
Com isso queremos dizer que a teoria é importante e
indispensável, assim como o saber fazer técnico. Entretanto, a práxis
deve ser igualmente parte da formação.
Práttein é o infinitivo do verbo grego para designar ação,
atividade, realização. É o ato de percorrer um caminho até
o fim; executar, cumprir, realizar alguma coisa por si
mesmo. Desse verbo deriva o substantivo práxis, que em
Aristóteles trata-se de uma ão na qual o agente, o ato e
o resultado da ação são inseparáveis, como partes que
existem somente em conjunto. (TELLES, 2005, grifos
nossos)
1
REEVO - CIDADANIA 2.0. Reevo Mapeamento Coletivo de Educação Alternativa.
http://cidadania2.c/projectos/reevo
17
Muito interessante a imagem que o termo práxis sugere: uma
ação em que agente, ato e resultado da ação sejam inseparáveis.
Pensando na práxis educativa, isso significa, que o educador não “dá
aulas” como se fosse algo que ele entrega ao estudante e uma vez
entregue cumpriu sua parte no processo. Na educação implicação,
relação. O educador deve ser capaz de realizar com o estudante e
não para o estudante. Fazer para o outro implica em relação de
subalternidade e, portanto, de heteronomia. Na relação educativa, ao
mesmo tempo em que uma desigualdade no nível de
conhecimento, solidariedade na busca de caminhos para que
juntos, educador e educando, descubram a forma de construção do
conhecimento. Essa é a práxis que a escola (generalizando) não
descobriu como fazer.
Penso que podemos afirmar que a educação tradicional forma
para a heteronomia. Como seria diferente? A escola tem considerado
como valor a memorização, a repetição de conteúdos, mais do que o
desenvolvimento da reflexão, da invenção e da descoberta. A ideia de
que essas atividades são importantes para a construção de um sujeito
autônomo não são novidades, mas percebemos grande resistência à
mudança quando nos envolvemos em processos de ressignificação da
educação (BATAGLIA; ALVES, 2020).
As metodologias ativas têm sido sugeridas com esse intuito.
Uma metodologia ativa é uma concepção de educação crítico-
reflexiva que resulta em envolvimento por parte do educando na
busca pelo conhecimento. As técnicas desenvolvidas a partir dessa
concepção são variadas e sempre interessantes: Problem Based Learnig,
Team Based Learning, o Arco de Charles e Maguerez e a
Aprendizagem Baseada em Projetos, são alguns exemplos.
18
Como buscamos neste texto responder à questão do que seja
a formação ética, não consideramos suficiente trabalhar com as
técnicas, mas principalmente compreender os fundamentos que
fazem com que técnicas que valorizem a relação com o outro sejam
importantes para a formação ética.
Esse fundamento penso estar em uma das grandes
contribuições de Piaget para a compreensão da psicologia moral: o
papel da cooperação. Este conceito foi definido, redefinido e
reposicionado várias vezes na obra de Piaget como aponta Camargo e
Becker (2012). Montangero e Maurice-Naville (1998, apud
CAMARGO; BECKER, 2012) propõe uma forma de analisar a obra
de Piaget dividindo-a em quatro períodos: “O primeiro (anos 1920 e
começo dos anos 1930) apresenta uma preocupação do autor em
explicar o pensamento infantil: ele busca conhecer a lógica da criança
para, assim, diferenciá-la da do adulto (p. 529)”.
Nessa fase, que coincide aproximadamente com o que Delval
(2004) descreve como o período dos primeiros esboços de Piaget (até
1926) quando Piaget fazia observações e pequenas experiências com
crianças, e o período de constituição do método (até 1932) quando
iniciou a formulação do método e descreve facilidades e dificuldades
envolvidas na aplicação de pequenas provas ou histórias (como no
caso de O Juízo Moral na Criança de 1932).
A cooperação é explicada aqui, especialmente em “O Juízo
Moral na Criança” como um tipo de relação que sucede a relação
coercitiva. A relação coercitiva é típica de uma forma de respeito
unilateral, baseada em vínculos hierárquicos e em uma consciência
moral heterônoma, em que as regras são vistas como externas aos
sujeitos e devendo ser acatadas (ou burladas) porque são impostas pela
19
autoridade. A relação cooperativa é possível graças ao respeito mútuo
de pares. Nessa relação é possível a construção da consciência
autônoma.
O segundo período (meados dos anos 1930 a 1945), a
ênfase dos estudos está em mostrar que o pensamento
precede a linguagem. Para isso, Piaget (1966/1987), em
1936, investiga a ão dos bebês, para explicar como
acontece o processo de representação no pensamento dos
mesmos (CAMARGO; BECKER, 2012, p. 529).
Delval (2004) destaca que nesse momento, Piaget escreve a
trilogia do sensório-motor (O nascimento da inteligência na criança
(1936), A construção do real na Criança (1937) e a Formação do
Símbolo na Criança (1945). A ênfase nesse momento era demonstrar
a gênese da estrutura lógica a partir da ão que por sua vez é possível
a partir da construção dos esquemas motores. Durante todo o
sensório-motor e pré-operatório a organização do real, a separação
eu-outro e, o que é muito importante para a cooperação, a superação
do egocentrismo com a descentração cognitiva. As possibilidades
advindas dessa conquista para a moral são enormes. Ser capaz de se
colocar no lugar do outro é condição fundamental para operar com o
outrocooperar.
No terceiro período de sua obra (fim dos anos 1930 ao fim
dos anos 1950), Piaget e Inhelder (1955/1976) debruçam-
se sobre o conceito de operação e, com isso, a cooperão
é relacionada com coordenação de pontos de vista
(CAMARGO; BECKER, 2012, p. 529).
20
Nesse momento, Delval (2004) relaciona vários estudos sobre
lógica e matemática. O método clínico está em fase de formalização e
a ideia anteriormente anunciada de que a inteligência é condição
necessária, mas não suficiente para a moral vai se fortalecendo. Delval
também mostra que a partir de 1950 busca de ampliar os dados
estatísticos e poucas variações na estruturação de sua teoria.
No quarto período (anos 1970), o conceito de cooperação
está relacionado à explicação da abstração reflexionante,
principalmente quando Piaget trata sobre o processo de
reflexão. Poucas vezes é enfatizado o conceito de
cooperação, nomeando-o (CAMARGO; BECKER, 2012,
p. 529).
O conceito de abstração reflexionante esclarece a capacidade
de depreender as razões das coordenações particularmente se
considerarmos a metareflexão. Essa capacidade cognitiva possibilita a
coordenação de perspectivas e, portanto, a cooperação. Em síntese,
Piaget (1994) afirma que a reciprocidade é o que possibilita do ponto
de vista cognitivo a transformação da relação de coação e o respeito
unilateral em uma relação cooperativa de respeito mútuo. Para a
compreensão de como essa transformação se dá, Piaget retoma o
entendimento de Bovet quando diz que o respeito que a criança
pequena sente pelo adulto é composto por dois sentimentos: amor e
medo. Ele segue as regras porque respeita (teme e ama) quem as
impôs. Com a construção da operatoriedade do pensamento e das
relações sociais ampliadas surge uma outra possibilidade para o
indivíduo que é obrigar-se a cumprir uma regra não por um respeito
21
unilateral, medo ou amor, mas por uma necessidade interna que
obriga o sujeito a agir de acordo com a regra que foi estabelecida (uma
lógica da ação) pelo grupo com o qual ele vive em respeito mútuo.
Agora, não é mais amor ou medo o que obriga o indivíduo,
mas a liberdade. O indivíduo é livremente convencido de que o
respeito mútuo é bom e legítimo. Tal liberdade lhe vem de sua Razão,
e sua afetividade "adere" espontaneamente a seus ditames.
Identificamos nesse ponto a influência kantiana na construção de
Piaget também no campo da moral: a liberdade é a pedra angular do
sistema filosófico, seja ele especulativo ou moral.
A cooperação é possibilitada pelo intelectual, afetivo e social
e é facilitadora de construções mais e mais elaboradas em termos de
relações sociais éticas. Nesse sentido, Camargo e Becker (2012)
chamam atenção para como o conceito de cooperação em Piaget ora
fora ligado a um todo ora a um produto. Como produto é
resultado da atribuição de valor que as pessoas fazem às relações,
tornando-as assimétricas ou simétricas. Como método, é a forma de
produção de self-government, ou seja, a autorregulação é resultado de
uma forma de relação que é a cooperação.
Considerações Finais
Partimos da ideia de que o educador com um nível de
desenvolvimento moral superior é capaz de conduzir melhor seus
estudantes por uma educação para a autonomia. Definimos a
formação ética como a educação que visa a autonomia e que essa
formação, assim como o trabalho de educação moral praticado pelo
educador devem ser baseados não apenas na teoria e cnica, mas
22
numa práxis e que essa tem como fundamento a cooperação
anunciada por Piaget como método para se alcançar a autorregulação
ao mesmo tempo que o produto de relações de respeito mútuo. A
cooperação é o fundamento de uma educação para a formação ética
justamente porque promove a autonomia moral e intelectual.
Referências
BATAGLIA, PUR; ALVES, CP (ORGS.) Humanização e educação
integral: refletindo sobre rotas alternativas. Marília: Oficina
Universitária; São Paulo: Cultura Acadêmica, 2020.
CAMARGO, LS; BECKER, MLR. O Percurso do Conceito de
Cooperação na Epistemologia. In: Educ. Real., Porto Alegre, v. 37,
n. 2, p. 527-549, maio/ago. 2012.
CIDADANIA 2.0. ReevoMapeamento Coletivo de Educação
Alternativa. Disponível em: http://cidadania2.c/projectos/reevo.
Acesso em: 30 ago. 2022.
DELVAL, J. Introdução ao todo clínico. Porto Alegre: Artmed,
2004.
DEVRIES, R.; ZAN, B. A Ética na Educação Infantil: O ambiente
sócio moral na escola. Tradução de Fátima Murad. Porto Alegre:
Artes dicas, 1998.
KOHLBERG, Lawrence. Essays on moral development. San
Francisco: Harper&Row, 1984. (volume 1: The philosophy of
moral education: moral stages and the idea of justice).
23
LA TAILLE, Y. Moral e Ética: dimensões intelectuais e afetivas.
Porto Alegre: Artmed, 2006
LUKJANENKO, MFSP. Um estudo sobre a relação entre o
julgamento moral do professor e o ambiente escolar por ele
proporcionado [Dissertação]. São Paulo: Universidade Estadual de
Campinas, 1995.
PIAGET, J. O juízo moral na criança. São Paulo: Summus, 1994.
PIAGET, J. Para onde vai a educação? Jean Piaget Tradução de
Ivette Braga, 14 ed. Rio de Janeiro: José Olympio, 1998.
SINGER, H. República de crianças: sobre experiências escolares de
resistência. Campinas, SP: Mercado das letras, 2000.
TELLES, ELA. Práxis e poiesis: uma leitura arendtiana do agir
político. Cadernos de Ética e Filosofia Política. v. 6, n. 1, 2005, pp.
123-140.
24
25
2.
O Educador e a Formação para a Autonomia
no Ensino Superior
Thaísa Angélica
Déo da Silva Bereta
Com a pandemia da Covid-19, observamos um aumento das
discussões sobre o processo de aprendizado e as lacunas que podem
ter acontecido no ensino-aprendizagem de nossos estudantes.
Principalmente, quando se observa o oferecimento de aulas no
formato remoto/híbrido, ou mesmo, a partir do não oferecimento,
mas de distribuição de materiais para o autoestudo dos alunos.
Para Moreira e Schlemmer (2020), essa modalidade de ensino
(remoto ou aula remota) é percebida pelo distanciamento geográfico
de professores e estudantes. Em decorrência das restrições de
interação física, impostas pelos órgãos sanitários, como forma de frear
a contaminação pela Covid-19, essa modalidade foi adotada por
diferentes níveis de ensino e por diversas instituições educacionais no
mundo todo.
Nesse momento, a integração da tecnologia foi um grande
avanço para a educação, mas somente seu uso, não consolida uma
transformação da educação, no século XXI. Dada essa
problematização, é preciso avançarmos em campos fundamentais,
como a formação de habilidades e de competências, possibilitando
https://doi.org/10.36311/2023.978-65-5954-397-7.p25-46
26
aos estudantes tornarem-se protagonistas em seu processo de
aprendizagem (SUNDE; JÚLIO; NHAGUAGA, 2020).
Entretanto, os impactos sobre a educação são preocupantes,
pois reproduzem assimetrias existentes nas sociedades, diminuindo
os efeitos pandêmicos sobre os atores econômicos privilegiados e com
acesso ao ensino privado e às tecnologias em contraposição a atores
econômicos mais vulneráveis (SENHORAS, 2020).
Qual o real impacto disso no sistema educacional? A resposta
para essa pergunta ainda virá com as pesquisas que estão sendo
realizadas. Somente com a análise da realidade, poderemos
compreender o quanto o distanciamento do estudante dos espaços de
sala de aula, o distanciamento da relação professor-aluno, o
distanciamento entre os pares e, consequentemente, o distanciamento
dos livros, apostilas e recursos pedagógicos foram prejudiciais para a
formação dos estudantes em todos os níveis de ensino.
O olhar dessas pesquisas para o Ensino Superior precisa
ocorrer, uma vez que os graduandos poderiam não estar totalmente
preparados para assumirem a responsabilidade na construção de seu
aprendizado. É importante destacar que essa afirmação decorre do
cenário: não se trata de uma adaptação ao aprendizado remoto, mas,
sim, a uma mudança abrupta de um espaço interativo de sala de aula,
para um espaço remoto e de distanciamento.
Partindo desse princípio do desenvolvimento de pesquisas,
vislumbramos uma aproximação entre os estudos da academia e as
práticas educacionais. Se as propostas e as pesquisas acadêmicas
fossem mais amplamente aproveitadas, talvez pudéssemos presenciar
uma mudança mais eficaz e duradoura no sistema educacional. No
entanto, enquanto isso não se efetiva, precisamos repensar o papel da
27
educação, da escola e do professor no longo caminho da formação de
sujeitos mais críticos e reflexivos. Reproduzir modelos de educação
que estejam pautados em metodologias tradicionais de transmissão de
conhecimentos, hierarquizadas e de constante submissão do saber do
aluno não vem apresentando resultados significativos ao longo da
história educacional brasileira. Portanto, discutir e efetivar o uso de
metodologias mais ativas, centradas na relação professor-aluno como
protagonistas do conhecimento e de novas possibilidades de
ressignificação do processo de ensino-aprendizagem, são de
fundamental importância para a modificação da crise que a educação
vem enfrentando nos inúmeros centros educacionais espalhados em
nosso imenso país.
De acordo com Santos (2005), o atual contexto educacional
impõe, à prática, um número expressivo de demandas que desafiam
os educadores, fazendo-os revisar e renovar de modo permanente seu
entendimento sobre o sentido da educação que defendem e executam.
A sala de aula é um espaço privilegiado de muitas interações,
trocas e construções. É um espaço no qual a produção de novos
sentidos e significados (TUNES; TACCA; BARTHOLO JÚNIOR,
2005), no qual professor e estudante mergulham em um universo de
múltiplas interações. É um espaço de excelência para engendrar
valores fundamentais intrínsecos ao desenvolvimento pleno e ao
trabalho, mas é necessária a coerência entre os objetivos do ensino
superior e das instâncias pedagógicas, para que realmente se
concretize seus fundamentos (SANTOS, 2005).
Durante o período de ensino remoto, não foi possível a
garantia desse espaço privilegiado e poucas interações aconteceram,
assumindo muito mais uma educação tradicional do que de uso de
28
metodologias ativas. A comunicação ocorreu, predominantemente,
de forma bidirecional (do tipo um para muitos), com o docente como
protagonista da videoaula, realizando-a de forma mais expositiva
(MOREIRA; SCHLEMMER, 2020).
Contudo, esse não foi o único momento na história da
educação brasileira que presenciamos tal fato. Nem sempre esse
espaço foi entendido como de possibilidades, mas, muitas vezes, foi
compreendido como o de transmissão de conhecimentos da figura
autoritária do professor para o estudante, que pouco ou nada sabia a
respeito do que estava sendo trabalhado nas disciplinas.
Resgatando, o contraponto entre Escola Tradicional e Escola
Nova, a escola tradicional visava à transmissão do conhecimento, que
era visto como externo ao estudante e não estava relacionado a
inclinação do aluno em aprender, ou seja, impedia a ocorrência de
descobrimentos e expressões pessoais. O docente era o centro
gravitacional da escola tradicional, portador de conhecimentos. Ao
aluno, cumpria-lhe a tarefa de assimilação passiva e heterônoma,
associada à subordinação dos conhecimentos advindos dos docentes
e dos livros. Tais práticas levam a questionamentos sobre a
ineficiência da metodologia utilizada e a uma perniciosidade do
desenvolvimento de seus alunos (MESQUITA, 2010).
Por essa razão, o movimento da Escola Nova advém como um
movimento embasado na revisão e na crítica de sua antecessora, a
pedagogia tradicional. Na Escola Nova, o principal foco está na
importância do aluno. Uma de suas características mais marcantes é
a importância dada à atividade dos alunos, ao protagonismo deste em
seu processo de aprendizagem e estas, como espontâneas, guiadas a
partir de sues necessidades e interesses (MESQUITA, 2010).
29
Saviani (2008) destaca que a Escola Nova visa o sentimento,
o pensamento psicológico, os processos pedagógicos, o estudante, o
interesse, a espontaneidade, o não-diretivismo, a qualidade, uma
pedagogia de inspiração experimental com contribuições da Biologia
e da Psicologia, com destaque para o aprender a aprender.
Na Escola Nova, os docentes têm seus papéis e funções
modificados, pois não dirigem mais o processo pedagógico, passando
a atuar no acompanhamento, no auxílio e na assistência aos discentes,
trazendo conhecimentos que enriqueçam e que favoreçam a busca do
estudante para o que desejam saber (MESQUITA, 2010).
Com o escolanovismo, consolidaram-se mudanças no
desenvolvimento do docente ao vel das competências pedagógicas
que foram assumindo, adicionando-se a essas as competências
cognitivas e de conteúdo, consideradas, até então, o único
instrumento essencial para a atividade do docente (POCINHO;
GOUVEIA FRAGOEIRO, 2012).
em relação à formação de professores pela Escola Nova,
entende-se que esses não devem ser preparados para ensinar
conteúdos relacionados às disciplinas do currículo e intervenções nas
atividades, senão para assistir os alunos em seu próprio processo
educativo (MESQUITA, 2010). Nessa concepção de formação,
vislumbramos a possibilidade de que espaços sejam criados no sentido
de permitir ao estudante a construção de seu aprendizado, a partir
daquilo que elege como significativo.
Cesar e Duarte (2010) destacam que a educação não deve ser
pensada como algo dado e pronto, mas, sim, constantemente
repensada a partir das transformações do mundo. Foi a partir dessa
necessidade, imposta pela pandemia, que a educação e suas práticas
30
tiveram que se transformar para que ensino-aprendizagem
continuasse existindo. Entretanto, muito ainda precisa ser percorrido,
para que os princípios fundamentais do ensino superior
proporcionem uma formação para a autonomia.
O educador e suas múltiplas funções
Cada vez mais, o educador precisa resgatar o valor socialmente
útil e transformador de seu trabalho, buscando superar o valor de
troca material e simbólica que tem caracterizado o trabalho intelectual
produzido no meio acadêmico, para que possa criar o novo e ir contra
apenas ao modelo conteudista e transmissor deste (MAGALHÃES,
2013).
O termo docência se origina da palavra latina docere, que
significa ensinar, e sua ão se complementa, necessaria-
mente, com discere, que significa aprender. Assim,
docência, entendida como o exercício do magistério
voltado para a aprendizagem, é a atividade que caracteriza
o docente em geral (SOARES; CUNHA, 2010a, p. 23).
Devemos reforçar a ideia de que o docente existe, porque
existem os estudantes. Sua atividade está centrada no estudante e no
apoio na tarefa de o fazer pessoa, atuando como um facilitador da
aprendizagem deste. Ao conhecer o estudante, saber seu nome, sua
história e o que é significativo para ele, um grande avanço está
ocorrendo (TEIXEIRA, 1995).
Vieira e Vieira (2018) destacam que por excelência o docente
é um mediador, facilitador, intermediário e incentivador na relação
31
aluno-conhecimento, pois aproxima-os e serve como elo desta. Assim,
para uma boa relação pedagógica, necessariamente deve existir uma
boa relação de mediação entre aluno-docente-conhecimento, estando
este docente também na mediação de tensões e conflitos nos
ambientes de aprendizagem. Para tanto, “[...] o sucesso do docente
depende da cooperação ativa do aluno” (LABAREE, 2000, p. 228).
Ao ser um facilitador do processo de aprendizagem, o
educador pertence ao grupo, estabelecendo um clima positivo na
classe e propiciando a participação de todos. Ao priorizar a empatia e
o respeito pela individualidade, está propiciando um ambiente seguro
para o aprendizado, e que o estudante assuma um papel ativo neste
processo, em que ambos têm responsabilidade intrínseca. Dessa
forma, é muito provável que conjuntamente ao desenvolvimento
cognitivo ocorra o crescimento pessoal do estudante e com isso, a
aprendizagem seja significativa (SANTOS, 2005).
Muitas discussões precisam ainda ocorrer quando
entendemos que a sala de aula é um espaço compartilhado entre
professor-estudante. Quando pensamos nesse compartilhamento,
somos, também, capazes de entender que é uma corresponsabilidade
sob o processo de ensino-aprendizagem. Todos os membros são parte
fundamental para que haja a evolução do aprendizado e da associação
deste com a realidade que vivenciada. Assim, se firma a necessidade
do aprendizado significativo para os envolvidos, para que realmente
possam evoluir para além de transmissões de conteúdos em sala de
aula.
Santos (2005) discute a aprendizagem significante. Para o
autor, essa forma de aprendizagem acontece quando o conteúdo é
relevante para os interesses pessoais do estudante, mas nos alerta que
32
a função do docente deve estar preservada em decidir quais os
conteúdos que são relevantes ao aprendizado deste estudante, não
perdendo de vista os objetivos de sua disciplina.
Frente a esse panorama, precisamos compreender a
necessidade de uma mudança no modo como as aulas acontecem e
como são estruturadas pelo docente. Masetto (2001) apresenta que
quatro pontos centrais precisam ser planejados, a saber (i) qualidade
do ensino; (ii) conceito de sala de aula; (iii) objetivos do ensino-
aprendizagem; e (iv) atividades a serem desenvolvidas. Suscita a
urgência da mudança da prática atual para que se atinja a qualidade e
esta pode estar presente a partir do conhecimento do docente de cada
estudante e na criação de condições e oportunidades para que a
aprendizagem seja efetiva, por meio da prática (SANTOS, 2005).
O conceito de sala de aula também precisa ser ressignificado,
passando de um espaço de transmissão e controle autoritário do
docente para um espaço de compartilhamento, de trocas e
construções. Antes, ainda, dessa efetiva mudança no conceito de sala
de aula, o próprio docente precisa estar imbuído do significado desta
mudança para o processo educacional. Assim, poderá permitir que
novas construções e interações aconteçam neste espaço, pois também
os objetivos do ensino-aprendizagem foram repensados e redefinidos
para colocar o estudante como foco e ser ativo, Podemos defender o
uso das metodologias ativas, como estratégias de ensino-aprendiza-
gem que nos permitem o entendimento da importância do agente, ou
seja, do estudante, na dinâmica de construção do aprendizado.
Calheiros Pereira Sobral e colaboradores (2020) destacam que
as metodologias ativas e inovadoras devem ser cada vez mais
exploradas no ambiente universitário, com a finalidade de diversificar,
33
contextualizar e estabelecer um diálogo com a aprendizagem. É
justamente esse diálogo que precisa ser reforçado no ambiente
acadêmico: um diálogo capaz de permitir que o aprendizado seja
estabelecido com todos os envolvidos.
Para a utilização de metodologias ativas, a preparação inicia-
se muito antes do horário da aula. O docente constrói a dinâmica do
aprendizado com atividades que permitam ao estudante buscar seu
conhecimento, discutindo com seus pares e trazendo para o espaço da
discussão sua(s) experiência(s) anterior(es) sobre a situação-problema,
que contextualize diante da realidade as possibilidades de
resolutividade (CALHEIROS PEREIRA SOBRAL et al., 2020). Sob
essa perspectiva, identificamos uma crescente busca por essas
estratégias inovadoras de ensino-aprendizagem, principalmente em
cursos de graduação na área da saúde
À luz do que aponta Teixeira (1995), identificamos, além das
questões metodológicas supracitadas, que o docente assume
diversas funções no sistema educativo, sendo elas (i) o docente como
pessoa reforçando a concepção de que o professor deve ser ele
mesmo e não usar máscaras para possibilitar uma outra imagem de si
mesmo; (ii) o docente com os estudantes favorecendo uma
aprendizagem pela promoção do sujeito envolvido neste processo, ou
seja, ensinar a partir do conhecimento prévio de estudante; (iii) o
docente com os outros docentes entendendo a prática docente como
uma função de cooperação entre si, com o grupo de pares; (iv) o
docente e os pais pensando na função de complementaridade do
aprendizado iniciado no núcleo familiar e da inclusão da família
como parte do sistema educacional, embora haja um maior
distanciamento dos docentes e dos pais no Ensino Superior,
34
configurando mais a presença do estudante neste processo; (v) o
docente com outros trabalhadores da educação reforçando a
importância dos auxiliares no âmbito educacional; e (vi) o docente e
a comunidade valorização da extensão, transcendendo os espaços da
escola para intervir e transformar o meio.
A partir dessa apresentação das múltiplas funções do docente,
esperamos que ele seja capaz de reavaliar suas funções, entendendo a
importância de sua atuação na relação com todos os envolvidos no
sistema educacional. Sendo para tanto, esperado uma postura de
mediação nos processos educativos, a fim de permitir o
desenvolvimento dos envolvidos de forma autônoma, crítica e
reflexiva. Desta forma, visando a importância do docente neste
processo de formação, trataremos a seguir, mais especificamente do
Ensino Superior, do fazer docente e dos desafios que ocorrem na
docência no ensino superior.
A doncia universitária e seus desafios
Na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (BRASIL,
2020) fica resguardado que a educação é um dever tanto da família
quanto do Estado, e deve estar inspirada nos princípios de liberdade,
bem como nos ideais de solidariedade humana, tendo por finalidade
o pleno desenvolvimento do educando, o seu preparo para o exercício
da cidadania e a sua qualificação para o trabalho. a educação
superior é considerada como a etapa posterior à educação básica, e
visa a preparação para o exercício de uma profissão. De acordo com a
Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei n. 9.394/1996)
a Educação Superior tem por finalidade
35
I estimular a criação cultural e o desenvolvimento do
espírito científico e do pensamento reflexivo; II formar
diplomados nas diferentes áreas de conhecimento, aptos
para a inserção em setores profissionais e para a
participação no desenvolvimento da sociedade brasileira, e
colaborar na sua formação contínua; III incentivar o
trabalho de pesquisa e investigação científica, visando o
desenvolvimento da ciência e da tecnologia e da criação e
difusão da cultura, e, desse modo, desenvolver o
entendimento do homem e do meio em que vive; IV
promover a divulgação de conhecimentos culturais,
científicos e técnicos que constituem patrimônio da
humanidade e comunicar o saber através do ensino, de
publicações ou de outras formas de comunicação; V
suscitar o desejo permanente de aperfeiçoamento cultural
e profissional e possibilitar a correspondente concretização,
integrando os conhecimentos que vão sendo adquiridos
numa estrutura intelectual sistematizadora do conheci-
mento de cada geração; VI estimular o conhecimento dos
problemas do mundo presente, em particular os nacionais
e regionais, prestar serviços especializados à comunidade e
estabelecer com esta uma relação de reciprocidade; VII
promover a extensão, aberta à participação da população,
visando à difusão das conquistas e benefícios resultantes da
criação cultural
e da pesquisa científica e tecnológica
geradas na instituição; VIII atuar em favor da
universalização e do aprimoramento da educação sica,
mediante a formação e a capacitação de profissionais, a
realização de pesquisas pedagógicas e o desenvolvimento de
atividades de extensão que aproximem os dois níveis
escolares (BRASIL, 2020, p. 32-33).
36
Finalidades essas que, por sua vez, funcionam como objetivos
que direcionam a implantação e realização do ensino superior.
Mesmo sendo definidas tais finalidades, nem sempre, conseguimos
presenciá-las nas inúmeras Instituições de Ensino Superior
(doravante, IEA) do país.
Gatti (2018) destaca que as IES enfrentam desafios ao serem
formadoras de futuros profissionais, a saber: (i) na elaboração de
currículos que sejam integrados horizontal, vertical e transversal-
mente; (ii) na integração de práticas pedagógicas e teorias, mas ao
mesmo tempo, na diferenciação entre conhecimento disciplinar e
conhecimento para ensinar; (iii) no uso de abordagens
interdisciplinares, tecnologias, mídias integrando-as ao pedagógico;
trabalhar de forma cooperativa; dentre tantos outros desafios que vão
se constituindo no cotidiano das práticas educacionais.
Críticas frequentes à docência universitária, tanto em
instituições blicas como em privadas, ocorrem no sentido de serem
conteudista demais e desarticuladas da realidade, reforçando várias
tensões e conflitos entre docentes e as instituições. No entanto,
sabemos que a docência universitária não está resumida à aplicação de
técnicas e de recursos didáticos, mas na articulação do conhecimento
científico e didático com o conhecimento dos processos de
aprendizagem e esse conjunto às concepções (mais amplas e críticas)
de sociedade, homem e conhecimento em cada aula (MAGALHÃES,
2013). Colocamos, aqui, um grande desafio à docência universitária:
contribuir para o desenvolvimento do estudante, enfocando em uma
construção da capacidade crítico-reflexiva, articulando teoria, técnica
e prática.
37
Em sala de aula, o conhecimento trabalhado é social, a partir
de uma comunicação compartilhada entre docente, estudantes e o
material utilizado. Social pois, o conhecimento é apropriado em sua
materialidade quando se expressa de forma articulada e mediado por
uma visão de mundo socialmente existente e construída
(MAGALHÃES, 2013). Por meio da possibilidade de comunicação e
de interação, que a sala de aula propicia, ao estudante interiorizar o
conhecimento sob uma ótica mais crítica e reflexiva, de
posicionamentos divergentes e/ou aproximados, propiciados pelo
ambiente acadêmico.
É de fundamental importância que esse trabalho cooperativo
seja incentivado pelos departamentos, a fim de propiciar uma reflexão
coletiva sobre a didática e apoio mútuo entre os docentes, com o
objetivo da melhoria da qualidade no processo de ensino e
aprendizagem. Essa reflexão coletiva sobre as práticas, as atitudes e as
crenças individuais e coletivas e de abertura para mudança, contribui
para o desenvolvimento e uma postura de busca permanente de
crescimento tanto pessoal quanto profissional (SOARES; CUNHA,
2010a).
O desenvolvimento profissional dos docentes está
diretamente ligado ao desenvolvimento organizacional, pressupondo
uma gestão democrática e participativa, com reflexões críticas e
propositivas do grupo, pretendendo a garantia, aos estudantes, de
aprendizagens significativas e de crescimento pessoal (SOARES;
CUNHA, 2010a), além de possibilitar o desenvolvimento
profissional deles.
O docente vivenciará, ainda, desafios no sistema educacional
ao trabalhar na promoção de uma educação que seja contextualizada
38
e baseada em metodologias ativas de ensino-aprendizagem, ao
assumir um destaque estratégico e representar um fator crítico no
desenvolvimento de iniciativas educacionais orientadas por
competência (LARA et al., 2019).
Soares e Cunha (2010a) complementam que outros desafios
ocorrem para a docência no ensino superior: entender que o processo
formativo se desenvolve num contexto grupal e que existem pessoas
com histórias de vidas distintas. Assim, o contexto grupal não é
apenas o cenário no qual a aula acontece, mas sim, o princípio
educativo, que permite a formação de cidadãos e profissionais que
sejam reflexivos, críticos e solidários, a partir da vivência concreta da
sala de aula. Outro desafio, é o dos alunos compreenderem a
finalidade de estudar os conteúdos apresentados, de entender a lógica,
inclusive de negociar as formas propostas pelo docente para o
desenvolvimento dos conteúdos e da avaliação da aprendizagem.
Marcelo Garcia (1999) fala em tal fato, a passagem da
dependência para a autonomia e consequentemente, para a
aprendizagem autônoma. A complexidade da docência universitária
apresenta-se, também, na articulação entre teoria e prática,
possibilitando a formação de profissionais que sejam comprometidos
com uma transformação social, que sejam críticos, reflexivos e
autônomos. Inclusive na tarefa de compreender de forma crítica a
profissão, bem como o amplo contexto em que ela está inserida. Mais
um desafio está na mercantilização, ou seja, na configuração de uma
relação de prestador de serviços e clientes, que ocorre entre professor-
aluno e que ocasiona uma distorção pedagógica (SOARES; CUNHA,
2010a).
39
A docência do ensino superior é uma atividade complexa
do ponto de vista político, social, intelectual, psicológico e
pedagógico, cujos saberes e competências imprescindíveis
ao seu exercício, sumariamente apresentados neste estudo,
a configuram como um campo específico de intervenção
profissional. Dessa forma, como acontece com as demais
profissões, não podem ser adquiridos por imitação, e, sim,
mediante uma formação específica e consistente
(SOARES; CUNHA, 2010a, p. 30).
Assim, outro ponto surge como importante, o de repensar
sobre a formação docente diante das demandas emergentes da
educação. Isso, pois, a docência universitária configura-se como um
campo de conhecimento, que tem sua complexidade e especificidade
pouco reconhecidas. Dessa forma, o ensino não se constitui como
uma atividade que possui e exige saberes próprios, mas está integrado
à pesquisa. Essa competência de pesquisar é reconhecida como
principal atributo do docente universitário, por se compreender que
a pesquisa é fundamental para desenvolver nos estudantes:
questionamento, reflexão crítica e problematização, na perspectiva da
formação da autonomia (SOARES; CUNHA, 2010b).
Soares e Cunha (2010b) afirmam que para que essa relação
seja consistente, eficaz e caminhe na direção de uma formação de
profissionais investigativos, críticos e transformadores, entre a
integração do ensino e da pesquisa, pressupõe reflexões a respeito da
concepção de ensino na universidade, que é baseada na transmissão
disciplinar e fragmentada de conhecimento ora consolidados.
Contudo, as autoras reforçam o entendimento de que a aprendizagem
do estudante é uma construção do saber que lhe é próprio e
40
constituído na ligação como um elo indispensável para a
implementação do ensino com pesquisa na graduação.
Podemos acrescentar ao desenvolvimento desta docência na
universidade, a sua relação com a extensão, que são ações voltadas ao
desenvolvimento do protagonismo em diferentes grupos sociais,
colaborando efetivamente para a mudança social, ou seja, a produção
de conhecimento está vinculada à necessidade de formação de agentes
para a transformação social. Assim na Extensão, se assume a
necessidade acadêmica de uma postura no Ensino e na Pesquisa que
norteie o compromisso da universidade para com as políticas
públicas, contribuindo para tanto, com a implementação e o
reconhecimento da universidade, como espaço socialmente
referenciado (AUGUSTI; DALCIN, 2016).
O docente precisa pensar em prática pedagógicas,
objetivando, com isso, integrar o discente com a comunidade, sob sua
mediação; ao mesmo tempo em que desenvolve ações de ensino e de
pesquisa, são alguns dos desafios do fazer docente no ensino superior.
O Tripé Ensino, Pesquisa e Extensão cada vez mais assume destaque
nas discussões sobre os profissionais que queremos formar, pois a
formação profissional pressupõe o envolvimento nos diferentes
contextos e realidades individuais e coletivas.
Para tanto, formar um estudante para o exercício profissional
requer que o docente e a universidade propiciem ações nas dimensões
da Assunção de Responsabilidade (RT) e da Reflexão Dirigida (GR).
Na primeira, com o objetivo de o graduando assumir responsa-
bilidade frente ao processo de ensino-aprendizagem, possibilitadas
pelo uso de metodologias ativas na educação, que consequentemente
permitem mais autonomia para os estudantes.
41
Dessa forma, a RT, pode estar presente, no ambiente
educacional e para além dele, se configurando nas atividades
curriculares (que estão no currículo e são obrigatórias disciplinas e
estágios), semicurriculares (não obrigatórias, mas integradas à área de
conhecimento iniciação científica), extracurriculares (não
obrigatórias e não ligadas à área de conhecimento atividades
esportivas) e não curriculares (em espaços externos à instituição
educacional e não relacionadas à área de conhecimento participação
em organizações comunitárias), se constituindo enquanto espaços
interessantes para a formação pessoal e profissional dos estudantes,
bem como para o desenvolvimento de cidadãos mais autônomos.
Em contrapartida, na GR, quanto mais espaços forem
propiciados pela instituição educacional para discussão e conversas,
para integração de teoria e prática, mais supervisões relativas às
práticas, mais se possibilita ao professor-aluno, o desenvolvimento da
autonomia moral (SCHILLINGER-AGATI, 2006; BERETA,
2020).
À guisa de conclusão
As discussões apresentadas neste trabalho partem do
entendimento de que em todo o processo educacional, desde a
Educação Infantil até o Ensino Superior, incluindo a Pós-Graduação,
a relação entre professor-aluno, de construção de aprendizados, está
presente. Sabemos que cada um destes envolvidos tem um papel
frente a esta dinâmica, e que estes agentes se relacionam no processo
educacional.
42
Todavia, para uma formação de alta qualidade nesses níveis,
fazem-se necessários investimentos políticos e financeiros para
melhorar as atuais condições de formação inicial e continuada e de
trabalho dos professores (MAGALHÃES, 2013). Não podemos
deixar de enfatizar que o docente, é aquele que assume a função de
formação de outros profissionais, tornando as demais profissões
possíveis.
Assim, a função da universidade é a de propor ações que
integrem os três eixos: Ensino, Pesquisa e Extensão, para tanto,
emerge a necessidade de qualificação docente, de desenvolvimento de
ações nestas esferas, e de um currículo que busque formar
profissionais autônomos e comprometidos com as intervenções que
realizarão em suas práticas profissionais, em uma sociedade vulnerável
e carente de tantos recursos, como a realidade vivida pela população
brasileira.
Contudo, a escola e a universidade que objetivamos para
todos, enquanto instituição e mediadora, tem a obrigação, de atuar
no favorecimento do acesso e do sucesso de todos os estudantes, por
meio de processos de comunicação intercultural, bem como, de
inclusão na mesma (VIEIRA; VIEIRA, 2018).
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47
3.
O Impacto da Educação Ética no Ensino Superior:
Considerações sobre a Dimensão Sociopolítica
do Ofício do Professor
Manuel
João Mungulume
Introdução
O presente estudo pretende refletir sobre o impacto da ética
no ensino superior, sobretudo na atuação sociopolítica - docente.
Partindo do princípio de que a ética se trata de uma dimensão
fundamental para a compreensão humana e se constitui, sem dúvida,
numa exigência básica para a prática docente, este capítulo tem como
objetivo principal problematizar o papel da ética na formação
docente, discutindo os seus limites e desafios, bem como questionar
a tríade relação: docente, universidade e sociedade. Com isso, pretende-
se dimensionar o contributo e o alcance dessa tríade na esfera
acadêmica e sociocultural.
O trabalho far-sebaseado no seguinte questionamento: “a
formação docente é vista numa perspectiva que considere a conduta
ética”? Assim, espera-se contribuir com uma educação axiológica e
plural que vise alcançar os desafios reais que afetam o cotidiano, quer
na formação bem como na prática docente.
https://doi.org/10.36311/2023.978-65-5954-397-7.p47-74
48
Avaliar ou problematizar a tríade relação: docente,
universidade e sociedade, possibilita compreender o impacto da ética
na formação humana e estabelecer possíveis orientações para uma
educação efetivamente civilizada e democrática. Assim, tomar-se
como base de análise o ofício docente, para discutir a função social
das competências produzidas no ensino superior e como estes,
alcançam os desafios reais de uma formação ética e moral que sirva de
modelo para uma sociedade justa e democrática, pois como disse
Morin (2003), é preciso adaptar a universidade às necessidades
sociais.
As universidades contemporâneas, além de atender aos
desafios e necessidades do mercado e da economia, também tem por
missão integrar os valores éticos e morais que carrega consigo como
uma discussão urgente e necessária. Nesse sentido, a educação
axiológica emerge como modelo de ação, de procedimentos, no
sentido de formar seres humanos que vão além de competências
intelectuais, mas que alcancem valores éticos e morais que nos ajudem
a construir uma sociedade mais justa, harmônica e democrática.
Estamos cientes de que a assimilação de conhecimentos em si, por si
só, não permite a mobilização de ações éticas que ajude os seres
humanos a ser mais empáticos e democráticos; precisamos de saberes
éticos, democráticos que reconheçam a identidade e o ser - estar do
outro, assim, a educação axiológica na formação docente exerce um
papel imprescindível na luta e na contribuição para alcançar estes
objetivos.
Reconhecer a dimensão sociopolítica do ofício do professor
continua sendo um desafio nas ciências cognitivas, assim como tornar
a ética universitária como relevante na esfera social. Tal reconheci-
49
mento se efetiva numa construção dialógica como proposto por
Habermas. Os conhecimentos condicionados e discutidos no espaço
universitário, às vezes enfrentam desafios na sociedade, ou porque os
conhecimentos universitários estão acima da esfera micro social ou às
vezes por falta de um diálogo amplo que alcance os desafios reais e
práticos. Aqui entra a importância de haver a esfera pública para tratar
os nossos dissensos, o que Habermas denominou de teoria do agir
comunicativo como forma ou estratégias de alcançar o consenso
(Habermas, 2003). Diante de tudo isso, pretende-se neste estudo
discutir o papel social das universidades, e problematizar a dimensão
sociopolítica do professor universitário, e analisar a sua função social
enquanto agente da contribuição social. Com certeza, não são
perguntas fáceis, mas pretende-se traçar os desafios da educação em
valores e seus limites, enquanto fundamento da educação
democrática. A fundamentação metodológica a ser utilizada neste
trabalho será basicamente revisão bibliográfica, introduzindo as
noções básicas do conceito da ética, destacando a relevância de uma
educação axiológica na formação docente. E por fim, refletir sobre o
papel social da ética na formação docente. Assim, espera-se contribuir
com os fundamentos da educação em valores e traçar alguns desafios
dessa educação e os seus entrelaçamentos com as metodologias ativas.
Reflexões Sobre a Competência Moral na Formação Humana
A competência moral é uma categoria que inclui todos os
aspectos da constituição humana: bio-psico-social. Neste sentido,
Oliveira, afirma que o juízo moral, prepara as bases do conceito de
competência moral como a,
50
capacidade de realizar estes “valores morais” com base em
princípios morais internos e agir de acordo com tais juízos.
Uma conduta é considerada moral quando guiada por
princípios morais internos, maturidade moral demonstra-
se por uma competência racional desenvolvida. A
competência racional busca o significado do princípio no
contexto concreto. (OLIVEIRA, 2014, p. 34).
De acordo com Bataglia, et al, (2010), o pensamento
autônomo é regido por princípios morais e éticos e não por regras
sociais, que serão aceitas se estiverem fundamentadas em princípios
e valores gerais. Assim, o pensamento tem uma relação de
interdependência com as ações e a autonomia da vontade do sujeito,
o que segundo Kant se caracteriza por agir sem nenhuma regra externa
imposta, mas sim, ser capaz de “seguir uma regra livremente imposta
pela própria razão”. (KANT, 2004, p. 21-22). Tal pensamento
contribui para os estudos da competência moral, pois, incide numa
perspectiva em que o sujeito demonstre sua competência, uma vez
que impõe a ele limites ao seu próprio potencial. O grande foco de
Kohlberg (1981), era de discutir o raciocínio moral dos sujeitos, e a
sua preocupação não estava em discutir a prática moral dos
indivíduos, mas sua capacidade cognitiva de avaliar, argumentar e
refletir sobre aspectos morais. Assim, para este autor, o raciocínio
moral é uma competência cognitiva, necessária, mas não suficiente
para determinados tipos de motivação e conduta” (KOHLBERG,
1981, p. 6).
Nessa perspectiva, Rego (2003), ao interpretar o conceito de
raciocínio moral proposta por Kohlberg, afirma que, a prática moral
envolve outros elementos que não apenas a capacidade do indivíduo
51
de análise cognitiva da questão, excluindo aspectos como o controle
de impulsos e o caráter. Assim, estabelecendo como única hierarquia
valorativa no desenvolvimento moral, o grau de autonomia do
indivíduo expresso é por sua competência de raciocinar moralmente.
Estes, constitui na interpretação de Rego, os exames da questão
específica da capacidade cognitiva de pensar moralmente. (REGO,
2003, p. 102). Portanto, tais movimentos de raciocínio morais
estabelecem um valor para desenvolvimento inter-relacionados.
O desenvolvimento da Competência Moral e, também, da
competência democrática envolve um processo de maturação e de
construção, à medida que a criança aprende com as suas próprias
experiências e vivências sociais e culturais. Este progresso possibilita o
nível superior de vincular os seus objetos de aprendizagem e da prática
dialógica para a resolução dos conflitos. O desenvolvimento da
competência moral implica numa formação embasada em habilidades
éticas e morais que
Segundo Oliveira (2014),
Os métodos de intervenção pedagógica, baseados na
psicologia cognitivo- evolutiva para a promoção do
desenvolvimento moral - têm como foco principal, o
desenvolvimento do agente moral competente, uma vez
que, buscam desenvolver a competência moral, definida
por Kohlberg como a capacidade de realizar juízos morais
com base em princípios morais internos e atuar segundo
tais princípios. Além disso, na psicologia cognitivo-
evolutiva a preocupação, com a construção de um
instrumento de avaliação, com evidências objetivas do
52
impacto do processo educacional sobre a competência
moral. (OLIVEIRA, 2014, p. 16).
Na sua ética discursiva, Habermas pressupõe uma
competência comunicativa e o exercício da competência moral, na
medida em que são tematizadas questões morais. Para ele,
competência comunicativa é a expressão do pensamento lógico e
moral. O que se denomina pensamento socializado ou inteligência
comunicativa é a faculdade da razão que, com o desenvolvimento
cognitivo e afetivo, permite a comunicação de ideias e dos próprios
pensamentos, considerando os pontos de vista dos agentes, seu vel
de informação, seus interesses, sua condição de compreensão.
(HABERMAS, 1989, p. 143).
No ensino superior, tanto as propostas de Kohlberg (1981),
como a de Habermas (1989), ambos servem de modelo para a
construção de uma democracia deliberativa, e como a expressão dos
princípios de formação e de autonomia moral do sujeito, servindo-se
assim, como ferramenta de resolução dos conflitos na relação social
de sujeitos.
O papel da ética na universidade
O princípio da responsabilidade proposto por Hans Jonas
critica o antropocentrismo e coloca a natureza como sujeito das nossas
atenções. Ou seja, não é apenas o homem que merece as nossas
atenções nos debates éticos, mas também, toda a natureza smica,
pois segundo o autor, se o homem não cuidar da natureza o futuro da
humanidade estará comprometida. (JONAS, 2006). Tanto a
53
universidade como a sociedade devem refletir sobre os valores da
natureza. Assim, para Jonas,
Precisamos saber que o ser humano antes de tudo deve ser
equilibrado, isto é, elevar os conhecimentos construídos até
então, e renovar o saber da essência do homem e sua
posição no universo, que nos diga o que se pode admitir na
futura condição humana e o que que evitar a todo custo.
Criar bases para um saber de solidariedade humana,
especialmente à obrigação para com o futuro e integridade
das futuras gerações. (JONAS, 2013, p. 83).
Assim, o papel da universidade seria elevar a consciência de
pensar abrangente para um agir democrático sobre a natureza e criar
uma cultura de um agir sustentável e harmônico. É nesta ordem de
ideia que segundo Morin (2003), a universidade deve nos instigar de
modo a refletir sobre nosso destino físico e terrestre, pois, ela ainda
não tirou as consequências da situação marginal, periférica de nosso
planeta perdido e de nossa situação nesse planeta. No entanto, é no
cosmos que devemos situar nosso planeta e nosso destino, nossas
meditações, nossas ideias, nossas aspirações, nossos temores, nossas
vontades. (MORIN, 2003).
Portanto, a ética funda-se nos princípios do respeito, da
justiça e da solidariedade. Todos e cada um deles apontam para a
necessidade do reconhecimento do outro (sociedade), entretanto, se
observarmos bem, com muita frequência deixamos de fazê-lo.
Passamos pelas pessoas como se elas não existissem, deixamos de ouvir
o que elas nos dizem, vamos adiante com o nosso discurso sem
54
considerar a palavra, as ideias e os sentimentos dos outros. (RIOS,
2009, p. 17-18).
O grande desafio da formação universitária é de analisar a sua
própria formação e os valores éticos da sua contribuição social. A ética
universitária deve adaptar-se às necessidades da sociedade
contemporânea e realizar sua missão de criação e inovação de
conservação, transmissão e enriquecimento de um patrimônio
cultural, sem o que não passaríamos de máquinas de produção e de
consumo. Tudo isso, leva Morin (2003), a propor uma reforma de
pensamento moral que permitirão a todos e a cada um reconhecer a
identidade humana.
A reforma da Universidade não poderia contentar-se com
uma democratização do ensino universitário e com a
generalização do status de estudante. Falo de uma reforma
que leve em conta nossa aptidão para organizar o
conhecimento ou seja, pensar. A reforma de pensamento
exige a reforma da Universidade. (MORIN, 2003a, p. 83-
84).
Para Morin (2003), a universidade tem a missão de adequar
o ensino e a pesquisa às demandas econômicas, técnicas e
administrativas do seu tempo. A reforma, que Morin propõe,
incluiria uma reorganização geral para a instauração de faculdades,
departamentos ou institutos destinados às ciências que realizaram
uma união multidisciplinar em torno de um núcleo organizador
sistêmico com a finalidade de alcançar os problemas sociais.
Isso tudo, nos faz refletir da seguinte maneira: Podemos
imaginar uma Faculdade que ensine os estudantes a saber lidar com
55
os problemas globalizados? tais como, a preservação dos valores éticos
e humanos que garante a harmonia social? Seria está a universidade
do amanhã, da qual Morin propõe? Na ótica de Morin (2003), a
universidade deve se pautar por diversos pressupostos dos diferentes
saberes e para torná-los comunicantes. assim, de acordo com
Morin (2003), o conhecimento fluiria da racionalidade, à
cientificidade, à objetividade, à interpretação e à argumentação; Ele
elaboraria os dispositivos que iriam permitir as comunicações entre as
ciências antropossociais e as ciências da natureza. Portanto, a ética,
enquanto um princípio intrínseco de valores humanos deve garantir
prudência dessa mediação entre a pesquisa e a sociedade; e deve
também tornar-se um princípio global e necessária em conjunturas de
crise que estamos inseridos e vivenciando. Deste modo, ainda
segundo Morin (2003),
é preciso promover o princípio moral segundo o qual os
meios devem estar de acordo com as finalidades, mas a
concepção complexa da circularidade entre fins e meios nos
indicou que, em casos limites, meios "maus" tornam-se
indispensáveis para salvar do pior. (MORIN, 2003b, p.
143).
Assim, a missão de ensino não é transmitir o mero saber, mas
uma cultura que permita compreender nossa condição e nos ajude a
viver, e que favoreça, ao mesmo tempo, um modo de pensar aberto e
livre. (MORIN, 2003a, p. 11).
A função social da ética no ensino superior comporta a
emancipação da autonomia moral dos indivíduos, na medida em que
56
equipa o outro na maneira de ser, agir e estar. O finalismo ético no
ensino superior deve contribuir para um caráter mais original da
condição humana. A universidade como instituição a serviço da
sociedade deve criar uma linguagem que transmita um saber
democrático e que fortaleça a harmonia social, pois ela não serve
enquanto exibição de seus poderes, mas deve garantir fundamentos
éticos de harmonia social.
A universidade, enquanto instituição de formação social,
deve mergulhar profundamente no desafio da coletividade social,
entendendo os dilemas vivenciados em cada época, e assim, propiciar
um ambiente de discussão moral e ética abrangentes. Neste sentido,
a educação escolar deve contribuir para a consciência da condição
humana e o aprendizado da vida, reencontraria, assim, sua grande e
profunda missão. Conforme Morin (2003),
a universidade deve ser uma força de interrogação e de
reflexão dirigida não apenas aos conhecimentos e à
condição humana, mas também aos grandes problemas da
vida. Nesse sentido, o espaço acadêmico deve estimular,
em tudo, a aptidão crítica e autocrítica, insubstituíveis
fermentos da lucidez, e exortar à compreensão humana,
tarefa fundamental da cultura acadêmica. (MORIN,
2003).
Assim, a dimensão sociopolítica do ofício do educador deve
favorecer a aptidão natural da mente, emancipar a autonomia moral
e ética do aluno, de modo que este, consiga criar autoconhecimento.
O grande desafio do ofício de um educador é de estimulá-la ou
despertá-la, de encorajar, de instigar a aptidão interrogativa e orientá-
57
la para os problemas fundamentais de nossa própria condição e de
nossa época.
A importância da ética no ofício do educador:
fundamentos de uma educação em valores
A educação baseada em valores é fundamental quando se trata
de uma formação humana. Segundo Pacheco (2012), a questão dos
valores é absolutamente fundamental para o Homo Sapiens Sapiens,
pois, no fundo, somos Homo Moralis, Homo Ethicus ou mesmo
Homo Valens; qual seja, não é possível pensar se com rigor a
existência humana sem um conjunto de valores de referência. Ainda
segundo este autor, valor é um fim, algo para o qual a ação humana
pode e deve se dirigir, aquilo que “vale a pena”; valor é o que
sentido à atividade e, no limite, à vida. (Pacheco, 2012). Daí que
pretende- se neste texto contribuir e analisar o ofício do educador
baseada em valores que fundamentam uma educação concreta no
âmbito da vivência educativa. Nesta análise enfatizamos a
potencialidade da educação axiológica como uma proposta formativa
que ajude na reorganização curricular e como uma estratégia prática
para fomentar uma Educação para a cidadania ativa”. Como afirma
Pacheco,
Quem nunca viu uma criança furando a fila da merenda?
Quem nunca viu a família dessa criança jogando lixo na
rua e entupindo os bueiros? Até que ponto a escola pode
apenas promover uma inútil acumulação cognitiva e se
demitir da função de educar? (PACHECO, 2012, p. 29).
58
Tratando -se da educação como um ato civilizacional, a ética
é um elemento imprescindível na prática educativa. Assim, a
educação em valores torna -se numa ferramenta fundamental na e
para a construção de saberes éticos, morais e democráticos.
Destacando a origem da palavra ética ou ethos, que deriva do grego
ethos (caráter, modo de ser de uma
pessoa), representa um conjunto de
valores morais e princípios que norteiam a conduta humana na
sociedade. (CORTINA, 2005).
O conceito da ética e da moral coloca a universidade e a
formação docente como agentes de extrema responsabilidade dentro
e fora dela. Parafraseando o professor Pacheco (2012), o sistema
educacional atual, somente presta atenção no desenvolvimento do
cérebro e não o desenvolvimento moral. Porque, se a escola não é o
primeiro lugar para se educar o indivíduo, também não deverá ser o
primeiro lugar para deseducá-lo; mas um lugar e tempo de
aprendizagem de valores. D que,
a ideia da profissão docente não deve ser vista, no plano
do conhecimento, mas também no plano da ética. Não
respostas feitas para o conjunto de dilemas que os
professores são chamados a resolver numa escola marcada
pela diferença cultural e pelo conflito de valores. Por isso,
é tão importante assumir uma ética profissional que se
constrói no diálogo com os outros colegas. (NOVOA,
2009, p. 41).
Tudo isso demostra a importância de fomentar a educação em
valores na academia, e eticamente falando, tanto as escolas bem como
as universidades têm como grande desafio de formar uma nova
59
sociedade, ou virá aquilo que Pacheco denominou de um tsunami que
poderá arrasar tudo pela frente, pondo em perigo mortal a nossa
própria existência no planeta. (PACHECO, 2012). Portanto,
introduzir ou ensinar a educação em valores torna-se hoje uma grande
realização política e ao mesmo tempo se configura como grande
desafio na prática educativa. Como bem aponta Vásquez (2018),
existe uma relação intrínseca entre a moral do educador, a
do seu perfil como educador, isto é, não existe educador
sem moral como queira maquiavel e a moral sem política
ou vice-versa. Essa dissociação é impossível na atuação do
perfil do professor. A competência antecede a sua conduta
ética e moral quer dentro da sala de aula ou fora dela.
(VÁSQUEZ, 2018, p. 297).
Essa relação entre a ética e a política se realiza no cotidiano
dos indivíduos onde se desdobram suas virtudesjustiça, prudência,
amizade. Assim, o ofício do educador é uma participação direta ou
indireta nos assuntos da pólis a medida que ensina os valores e
princípios que visam ao alcance da comunidade. As virtudes morais
do indivíduo somente podem ser alcançadas com sua participação
comunitária. O ofício do educador é um ato de emancipação moral e
política dos indivíduos, e a sua conduta devem aspirar uma verdadeira
emancipação da formação e do crescimento humano a fim de, expor
um saber democrático e afetivo sobre a dignidade humana.
1
1
Tudo isso, de acordo com Vásquez (2018) visa encontrar uma necessária igualdade e da
justiça social, assim como com os da liberdade real, da democracia efetiva e da dignidade
humana; dando, pois, seu próprio conteúdo aos fins de uma política emancipatória. Uma
vez que a moral e a política são meios adequados para a realização humana. O que nas suas
60
Um educador além de ter o domínio dos conteúdos deve ter
um senso de sabedoria prática ou caráter virtuoso. Vivemos num
contexto em que os programas exigem muitos aspectos cognitivos
teóricos relacionados ou tidos como um meio de alcance exclusivo de
qualidade no campo educacional e as vezes não prestamos atenção em
aspectos éticos e morais, razão pela qual a ética não é considerada uma
disciplina básica na prática educativa, quer nas escolas ou mesmo
dentro das faculdades. A pergunta que fazemos é, por que a ética e
moral não são disciplinas basilares se a sociedade depende da ética
para ter uma convivência harmoniosa e civilizada?
A democratização da educação em valores consiste
basicamente numa reforma epistemológica que não se restringe
apenas numa formação que foca em transferir conhecimento, mas
também que difunde e emancipa educação ética, moral e cívica para
que os alunos sejam inseridos ativamente como cidadãos da polis que
adere uma competência teórica, mas também prática como queira
Cicero, não basta ter conhecimento, é preciso saber usá-lo”. É nessa
premissa que se baseia a educação em valores; formar sujeitos que
atuem ativamente na esfera cultural e social. Portanto, quando a
educação em valores é aceita, implementada e em certa medida surte
efeitos, é porque ela é apoiada por uma fração suficiente da opinião
pública, da classe política e do mundo da escola. Em suma, para uma
efetivação de uma educação em valores no contexto escolar, isso
próprias palavras, trata-se, portanto, da moral que o se encerra em si mesma; que não se
amuralha no santuário da consciência individual; que, pela mão da política, vai à praça
pública e que, socializando assim seus valores, impregna a ão coletiva, propriamente
política; uma ação que por ser tal não pode se reduzir a uma dimensão moral individual.
(Vásquez, 2018, p. 298).
61
dependerá da força do pensamento sistêmico e da vontade política
que faz com que a formação dos docentes não seja algo meramente
cognitiva, mas sim humana, isto é, uma formação voltada para a
formação humanística.
A dimensão sociopolítica de professor universitário
Muito se exige da intervenção política de um educar, além de
contribuir para uma formação ética e humana, também deve pautar
por conhecimentos e competências que ajudem o aluno a desenvolver
autonomia, criatividade e intervenção ativa na esfera social. Nesta
secção iremos propor e discutir duas dimensões, da moral e a da
competência. Portanto, a moral e a competência constituem duas
dimensões que fundamentam a identidade do professor. Segundo
Nóvoa (1992, p. 16),” tal identidade não é um dado adquirido, não
é uma propriedade, não é um produto, [...] é um lugar de desafios e
conflitos, é um espaço de construção de maneiras de ser e de estar na
profissão”. Por isso que para este autor, a identidade deve ser vista
como algo construído nos limites da existência social dos indivíduos.
Assim, o educador ganha sua identidade de reconhecimento na sua
atuação, e assim, não se espera somente um perfil dotado de
conhecimento, mas também de um agente moral que oriente um agir
cívico, uma vez que, a identidade tem, assim, um caráter de
complementaridade, vendo, sendo e agindo. Como afirma Rios
(2009),
Quando afirmamos que “somos professores universi-
tários”, procuramos corresponder a algo que se encontra
62
no imaginário das pessoas em nossa sociedade. Somos
professores num espaço diferenciado. É preciso pensar,
então, antes de mais nada, no contexto no qual
desenvolvemos nosso trabalho. (RIOS, 2009, p. 10).
Nesse contexto, a dimensão de competência está
restritamente relacionada com a questão moral, isto é, o ser social do
professor. Assim, o contexto universitário
2
trata-se de um espaço
institucional da educação de valores e princípios que, se articulam ou
pelo menos que deveriam se articular com o ensino de valores, e que
tenha como finalidade de formar profissionais democráticos, críticos
e criativos. A ética na docência universitária deve ser um caminho
capaz de construir uma sociedade sólida, democrática e solidária,
possibilitando uma formação de nova concepção de vida e de uma
sociedade, voltadas para o bem comum, ajudando uns aos outros para
e na realização pessoal dos indivíduos. A universidade como centro de
produção de conhecimentos, saberes e fazeres novos, deve estar na
busca de uma visão de totalidade, de racionalidade e da universa-
lidade. Em tudo isso, o espaço universitário se configura como uma
instituição que leva à descoberta de novos saberes. É nessa ordem de
ideia que os múltiplos significados da noção de competência que
definem atuação de um educar devem promover a capacidade de agir
eficazmente em um determinado tipo de situação, apoiada em
conhecimentos, mas sem limitar a autonomia moral do aluno, isto é,
a formação tem como finalidade de emancipar as potencialidades dos
2
Segundo Silva (1991), a universidade tem o significado etimológico profundo de “tornar
um”, ou seja, de expressar /articular a diversidade na unidade, que representa, em última
instância, sua missão histórica e razão de ser. (SILVA, 1991, p. 39).
63
indivíduos.
3
A experiência da formação ética humana deve mobilizar
as ões concretas de conhecimentos, isto é, construir uma hipótese e
verificá-la; Identificar, enunciar e resolver um problema que aflige o
cotidiano social, ou ainda todas as competências manifestadas por
essas ações. Ainda segundo Perronoud (1999), a dimensão
sociopolítica de competência de um educador consiste em
pôr em relação seu conhecimento do direito, da
jurisprudência, dos processos e de uma representação do
problema a resolver, fazendo uso de um raciocínio e de
uma intuição propriamente jurídicos. Da mesma maneira,
um bom médico consegue identificar e mobilizar
conhecimentos científicos pertinentes no momento certo,
em uma situação concreta que, evidentemente, o
costuma apresentar-se como "um problema proposto em
aula" para o qual bastaria encontrar a "página certa em um
grande livro" e aplicar a solução preconizada. Que o clínico
disponha de amplos conhecimentos (em física, em
biologia, em anatomia, em fisiologia, em patologia, em
farmacologia, em radiologia, em tecnologia, etc.) não é
3
Perronoud, explica a noção da competência com um exemplo prática na atuação de médicos
da seguinte forma: “As competências clínicas de um dico vão muito além de uma
memorização precisa e de uma lembrança oportuna de teorias pertinentes. Nos casos em que
a situação sair da rotina, o médico é exigido a fazer relacionamentos, interpretações,
interpolações, inferências, invenções, em suma, complexas operações mentais cuja
orquestração pode construir-se ao vivo, em função tanto de seu saber e de sua perícia
quanto de sua visão da situação. Uma competência nunca é a implementação "racional" pura
e simples de conhecimentos, de modelos de ação, de procedimentos. Formar em
competências não pode levar a dar as costas à assimilação de conhecimentos, pois a
apropriação de numerosos conhecimentos o permite, ipso facto, sua mobilização em
situações de ação”. (PERRONOUD, 1999, p. 5).
64
senão uma condição necessária de sua competência
(PERRENOUD, 1999, p. 5).
O reconhecimento da dimensão sociopolítica do ofício de um
educador continua sendo um desafio na esfera social, pois além de
assumir multiplicidade de tarefas na formação humana, também
assume de maneira holística o desenvolvimento pessoal e moral, a
educação para a cidadania e para os valores. Portanto, o dever moral
do ofício de um educador é a missão de assegurar a educação moral e
a instrução cívica dos valores aos alunos para atuarem de forma
democrática na sociedade.
Rios (2009), acrescenta que a dimensão política do educador
é marcada pelos valores da sociedade na qual se encontra o indivíduo
- uma hierarquia na valorização das profissões. Com relação ao
papel de professor, verifica-se que, ao lado do discurso que chama
atenção para o valor da profissão docente, uma atitude de
desconsideração, que se revela nas más condições de trabalho, nos
baixos salários e no pequeno investimento em sua formação inicial e
continuada. Assim, neste discurso, a ética tem um desdobramento
que se desencadeia na competência, na moral e no status da profissão.
Aqui, cabe pensar no significado da presença da ética na
formação e na docência universitária como as dimensões da
competência técnica, estética, política e ética. Assim, segundo Rios
(2008, p. 17), tornam-se mais claras as exigências para um trabalho
docente de boa qualidade: além do domínio de conhecimento de uma
determinada área e de estratégias para socializá-lo, um conhecimento
de si mesmo e dos alunos, da sociedade de que fazem parte, das
características dos processos de ensinar e aprender, da
65
responsabilidade e do compromisso necessário com a construção da
cidadania e do bem comum. A dimensão sociopolítica da atuação de
um educador numa esfera ética deve questionar a finalidade do
próprio trabalho formativo e educativo, a sua significação, o seu
sentido, recorrendo a pergunta clássica no diálogo platônico com
famoso aluno Menon, para que ensinar? Para que realizamos nosso
trabalho? Esta indicação nos leva a desenvolver valores necessários no
ofício da profissão, e assim, a Ética na docência universitária
desempenha o seu real valor enquanto uma prática individual e
coletiva.
Desafios da ética para uma educação inovadora:
fundamentos das metodologias ativas
A presença da ética quando se fala das metodologias ativas,
envolve uma avaliação ética pois conta com as tecnologias digitais ou
a internet. Aqui questionamos a forma do seu uso e da sua finalidade,
ou seja, a pesquisa que se realiza por meio das mitologias ativas está
levando a uma ampliação do conhecimento ou da qualidade do
conhecimento dos alunos. O espaço da ética na educação pode
acontecer em qualquer lugar e a qualquer hora, tendo como referência
professores reais ou virtuais. Aqui estamos pensando na sala de aula
invertida, que consiste em apresentar o conteúdo fora de ambiente
escolar. E isso pode se efetuar por meio da internet, como aponta
Novoa,
a tecnologia como a chave para a educação do futuro: “As
escolas, tal como as conhecemos deixarão de existir. No seu
66
lugar, haverá centros de aprendizagem que funcionarão
sete dias por semana, 24 horas por dia. Os estudantes terão
acesso aos seus professores, mas a distância. As salas de aula
passarão a estar dentro dos seus computadores”. Frases
deste tipo ouvem-se todos os dias. É um futuro que os
enormes avanços na produção de “ferramentas” interativas
de aprendizagem tornam cada vez mais possível.
(NOVOA, 2009, p. 75).
O uso dessa tecnologia digital deve se submeter aos crivos da
ética, daí que é de extrema importância formar para uma cidadania
ética e moral. A ética como uma dimensão humana que regula a
harmonia social que considera o princípio do conhecimento que está
ligado à transitoriedade, que segundo Piaget (1992), está ligado aos
estágios do desenvolvimento do ser humano; que são os quatros
períodos no processo evolutivo da espécie humana, que são
caracterizados por: sensório-motor, pré-operatório, operações
concretas e operações formais. Portanto, o desenvolvimento cognitivo
é condição necessária ao pleno exercício da evolução ou da cooperação
no processo do desenvolvimento ou da formação humana.
Segundo Moran (2018), as tecnologias digitais são um desafio
para a construção de conhecimento na escola, não somente pelo
conhecimento e apropriação das próprias ferramentas, mas também
pelo impacto no registro, pesquisa e nos diversos procedimentos de
estudo. A sua presença para fomentar a aprendizagem significativa é
inquestionável, como afirmam os autores Bacich e Moran (2018),
É importante, então, que as ações planejadas visando à
formação do aluno para o uso do digital promovam a
67
autonomia e a crítica e não atendam apenas os apelos
comerciais do mercado. Uma das vertentes de uso das
tecnologias digitais na escola em que foi realizada a
pesquisa são alguns dos cursos extracurriculares oferecidos
ao ensino fundamental. Esses cursos pretendem comple-
mentar o currículo com atividades que vão desde a prática
de esportes até as práticas culturais, como teatro, música e
leitura, passando também por propostas com maior
diálogo com o currículo, como as práticas de investigação
científica e os desafios matemáticos. um leque amplo
que se atualiza a cada semestre, em função dos interesses e
das potencialidades de cada faixa etária. (BACICH;
MORAN, 2018, p. 216).
Toda a inovação no processo de ensino-aprendizagem é
fundamental, pois viabiliza práticas sociais atuais, que precisam ser
tematizadas e experimentadas no contexto de educação escolar.
Hannah Arendt, nos seus manuscritos sobre a educação moderna,
afirmava que os modus operandi, socialmente, cria e concebe a
educação que se tornarão dominantes na sociedade do século XX.
Assim afirma a autora,
[...]Todos, dentro e fora das escolas, somos herdeiros destas
“teorias modernas da educação que vêm do centro da
Europa e que consistem numa salgalhada surpreendente de
coisas sensatas e de disparates, as quais contribuíram para
revolucionar de alto a baixo o sistema de ensino sob a
bandeira do progresso da educação” (ARENDT, 1972, p.
229).
68
Assim, nesse processo de inovação educacional para a
formação humana surgem várias dimensões éticas sociais e culturais
como métodos ou estratégias que buscam uma interação melhor neste
processo e desafio educacional. As metodologias ativas desempenham
um papel muito importante na prática educativa, promovendo a
consciência e o desenvolvimento humano, permitindo ao indivíduo
apropriar-se e colocar-se no interior da busca consciente da
informação.
Essa prática da formação do sujeito, aplica-se na aquisição de
novos conceitos, como um desdobramento da construção de novos
valores e da construção da própria identidade. Assim, Segundo
Moran (2018), todos estes processos, buscam transformar o ensino
em um processo mais dinâmico e próximo à realidade extraescolar.
Apesar dessas percepções, no início do desenvolvimento do currículo
com base nessa proposta,
o foco da compreensão dos professores sobre a organização
curricular privilegiava a formação acadêmica e conceitual
dos alunos. Com as ações de formação e as reflexões
realizadas no coletivo, a formação integral do aluno
(considerando, além da formação acadêmica, os aspectos
relacionais e o desenvolvimento de habilidades) passou a
ser objetivada e entendida como a meta dessa proposta,
demonstrando a transformação da atividade. (MORAN,
2018, p. 381).
Este constitui a compressão primordial das metodologias
ativas como prática ou complemento de aprendizagem significativa;
assim, se configura como a percepção do conhecimento para o aluno,
69
o que coopera para a transformação das concepções, tanto do
conhecimento bem, como das habilidades construídas a fim de uma
mudança de percepção e para uma formação integral e democrática.
Considerações Finais
Este trabalho abordou sobre as dimensões sociopolítica do
perfil de um educador numa perspectiva da ética axiológica, e com o
desdobramento sobre a reflexão da competência moral na formação
humana. Este tema procura enfatizar e destacar o papel da ética na
pratica da formação humana, ou seja, não pode existir uma formação
integral com a ausência das questões éticas. A valorização da
experiência ética e estética na universidade é desafio que precisa ser
colocado em discussão na esfera de formativa, que a ética não consta
como uma disciplina autônoma nos currículos acadêmicos, isso o que
nos leva a questionar a relevância das discussões éticas, políticas e
morais, na esfera acadêmica.
Será que existe uma resistência para abordar a ética e moral
como disciplina básica ou trata-se da falta de vontade política?
Contudo, pensa-se que a ética é uma disciplina fundamental que serve
para preparar os jovens no mercado de trabalho e no mundo (saber
ser, estar e fazer), observando os códigos da moral. A universidade,
por ser uma esfera de pequena sociedade e o professor é um agente
mobilizador de ideias sociais, daí que a categoria moral deve ajudar os
cidadãos a viverem seu destino de defender e promover valores da
autonomia e da consciência. Assim, tanto as universidades bem como
a pesquisa devem ser sempre abertas e plural e primado da verdade
sobre a utilidade cultural e social e tendo a ética como elemento que
70
deve acompanhar o processo formativo e de conhecimento; donde
essa vocação expressa pela mente interventiva e crítica.
Assim, o impacto da ética na formação universitária deve, ao
mesmo tempo, adaptar-se às necessidades da sociedade contempo-
rânea e realizar sua missão transecular de conservação, transmissão e
enriquecimento de um patrimônio cultural, sem o que não
passaríamos de máquinas de produção e consumo. Outro desafio não
menos importante é de situar as dificuldades de aprendizado no
centro do projeto educacional, isto é, dentro e fora dela. A
importância da educação ética e moral ou educação em valores é de
considerar os principais problemas que a escola enfrenta, e isso está
diretamente ligado aos desafios do ofício do educador, que deve
instruir os jovens no caminho real sobre a sua formação, singularidade
e identidade tanto do ponto de vista da ética, bem como sujeito que
atua na sociedade.
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competência moral na formação do enfermeiro. Rio de Janeiro,
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74
75
4.
Competência Moral e Empatia na Formão Ética
dos Profissionais de Saúde
Cristiane Paiva Alves
Tamires Alves Monteiro
Nas últimas cadas se observa uma grande preocupação com
o alinhamento da formação inicial do profissional de saúde aos
princípios do Sistema Único de Saúde e os valores democráticos
contidos em nossa Constituição Brasileira (BRASIL, 1988). Tal
preocupação tem impulsionado um aumento das discussões a respeito
das propostas curriculares e experiências em nível superior que deem
conta de pensar em uma formação capaz de preparar para os desafios
concernentes à atuação profissional.
De acordo com Casate e Corrêa (2012), os debates levantam
críticas a uma formação maiscnica que costuma ser fundamentada
em métodos tradicionais de ensino e com foco principal nas
patologias. Além de evidenciarem um ensino excessivamente
especializado, baseado em propostas curriculares estruturadas em um
conjunto de disciplinas que não apresentam articulação entre si e têm
pouca conexão teórico-prática, além de uma escassez de atividades
humanísticas que tenham a intenção de trabalhar a formação integral
dos graduandos.
https://doi.org/10.36311/2023.978-65-5954-397-7.p75-104
76
Devido a este cenário, uma mobilização, sobretudo no
âmbito acadêmico, para se pensar em estratégias de ensino e em novos
desenhos curriculares que tragam uma formação mais humanística e
integral no contexto da graduação em saúde. Em consonância com
esse ideal, temos a Política Nacional de Humanização - PNH
(BRASIL, 2004) que tem como principal objetivo melhorar a
assistência, levando em consideração a individualidade de cada
pessoa, dentro de um ambiente acolhedor e de cuidado qualificado.
A temática da humanização tem sido constantemente
abordada quando se fala em novos modelos curriculares para saúde.
Segundo Casate e Corrêa (2012), o conceito diz respeito aos aspectos
relacionados ao ser humano, sobretudo, quando se pensa no cuidado
e acolhimento dessas pessoas. Deste modo, essa assistência passa a
olhá-lo como um sujeito único, completo e complexo, buscando um
atendimento pautado nos valores éticos e morais, como o respeito e a
empatia. Levando em consideração sua história de vida, seus valores
socioculturais e os significados dados à sua experiência de
adoecimento e sofrimento, por meio do diálogo e da escuta ativa.
Apesar da PNH propor que tais conteúdos devam estar
presentes nos currículos dos cursos de graduação, pós-graduação e
extensão em saúde, Corsino e Sei (2019) apontam que a temática
ainda é pouco explorada nas disciplinas de graduação, sobretudo das
universidades paranaenses. Sobre isso, Casate e Corrêa (2012)
destacam que apenas inserir uma disciplina isolada que contenha
assuntos da humanização em saúde é insuficiente para dar conta do
aprendizado do cuidado humanizado. Benevides e Passos (2005) e
Mattos (2009) trazem que ao discutirmos sobre a humanização
observa-se que a centralidade do debate está na busca de formas de
77
transformação das práticas para a melhoria da qualidade do cuidado.
Ou seja, pensar em caminhos devemos seguir para humanizar. Os
caminhos até hoje percorridos não nos indicaram mudanças eficientes
que são necessárias à produção de saúde. Desta forma, é necessário
que se implementem, além de disciplinas de ciências humanas
aplicadas à saúde, espaços de reflexão das humanidades a partir de
referenciais teóricos que se debrucem sobre a construção de diversas
habilidades, como as socioafetivas e sociomorais (CASATE e
CORRÊA, 2012).
O desenvolvimento dessas habilidades auxiliará na construção
de uma conduta ética frente aos desafios profissionais e na
qualificação do cuidado dado aos pacientes. Todavia, é importante
sinalizar que não basta apenas aprender, do ponto de vista cognitivo,
sobre os valores morais. É preciso vivenciar situações que coloquem
os alunos numa postura reflexiva e que, de alguma maneira, isso os
mobilizem afetivamente.
Para La Taille (2006), não basta a pessoa saber sobre o que é
certo ou errado, é preciso que ela queira, enquanto força afetiva, agir
de forma ética. Deste modo, para compreendermos os
comportamentos morais das pessoas é necessário conhecer suas
perspectivas éticas, pois “somente sente-se obrigado a seguir
determinados deveres quem os concebe como expressão de valor do
próprio eu” (p. 51).
Buscando olhar para as questões éticas, surge na segunda
metade do século XX o ensino da bioética nos cursos de saúde, tendo
a intenção de orientar os alunos no enfrentamento de questões
éticas/bioéticas que surgirão na vida profissional. No Brasil, ela é
incorporada nas Diretrizes Curriculares de 2001 (BRASIL, 2001),
78
com a intenção de educar para o exercício ético profissional,
formando pessoas moralmente competentes, que são fundamentais
para as sociedades plurais e democráticas.
Compreendemos como sujeito moral competente aquele que
consegue julgar moralmente uma situação e tomar decisões a partir
dos seus princípios internos, o que Kohlberg (1964) nomeou como
competência moral. Todavia, essa competência não é dada ao nascer
e nem construída por meio da imitação de condutas que são
aprendidas durante a vida. Mas, fruto de um trabalho ativo e de
reelaboração do sujeito durante as trocas sociais experimentadas nas
situações cotidianas, sobretudo nos ambientes de socialização familiar
e educacional.
No meio acadêmico existe uma crítica à teoria cognitivista
que se relaciona a ausência de componentes afetivos quando se avalia
o julgamento moral. Um dos autores que tece esta crítica é Hoffman
(1990), que apesar de adotar a mesma perspectiva desenvolvimentista
de Kohlberg, propõe estágios de desenvolvimento afetivo, para além
dos estágios propostos pelo autor. O teórico justifica que as
construções morais se baseiam na cognição, porém, é a empatia como
aspecto afetivo que motiva a ação moral e o comportamento pró-
social.
Deste modo, acreditamos que para o desenvolvimento de uma
competência moral é primordial que esses estudantes vivenciem
situações acadêmicas em que o valor empatia esteja presente. E com a
intenção de fundamentar essa ideia, buscaremos apresentar nesse
capítulo alguns estudos como possibilidades para desenvolvê-las em
conjunto. Para prosseguirmos, apresentaremos a base teórica sobre a
79
competência moral e empatia e o que tem sido pesquisado sobre suas
relações e formas de desenvolvimento.
A construção da competência moral segundo os estudos
da psicologia moral
Antes de falarmos sobre o que é a competência moral,
precisamos nos debruçar sobre a construção da moralidade a partir
das ideais de Jean Piaget (1896 – 1980) e Lawrence Kolhberg (1927
- 1987).
Para Piaget (1994), a moralidade consiste num sistema de
regras e a essência está na obrigatoriedade de segui-las. Assim, o mais
importante não é saber se as pessoas são justas, generosas etc., mas
entender quais os fatores que as fazem agir dessa forma. Ao investigar
como se essa construção, Piaget (1994) descobriu que a evolução
da moralidade passa por duas morais, a primeira que ficou conhecida
como a moral da coação (heteronomia) e a segunda como a moral da
cooperação (autonomia).
Na heteronomia, a criança percebe que coisas certas e
erradas, mas são os adultos que as definem, isto é, as regras são ditadas
pelos mais velhos e elas precisam obedecer. Nesse tipo de moral a
presença do respeito unilateral, que se configura numa relação
desigual, do mais velho para o mais jovem. Conforme a criança se
desenvolve (intelectual e moralmente) e estabelece relações com
situações que beneficiem seu desenvolvimento, ela, aos poucos, vai
conquistando sua autonomia moral. Nesse tipo de moral, a
predominância do respeito mútuo e da cooperação. Segundo Piaget
(1994), a reciprocidade é a fonte da autonomia moral, sendo o
80
momento que o respeito mútuo é “bastante forte para que o indivíduo
experimente interiormente a necessidade de tratar os outros como
gostaria de ser tratado” (p. 155).
Os estudos piagetianos auxiliam a compreender não a
respeito dos dois tipos de morais que se encontram no sujeito, mas a
refletir sobre o papel do adulto nesse processo. De acordo com Piaget
(1994), é o adulto que vai inserir a criança no mundo da regra e
nortear essa relação, portanto, se houver o interesse que o sujeito
atinja a autonomia moral e intelectual, as relações precisam estar
pautadas no respeito mútuo e na cooperação. E para que o adulto
tenha condições de construir relações saudáveis e fundamentadas em
valores morais, eles precisam ter espaços e oportunidades para olhar
para seus próprios valores e para as relações que estabelecem consigo
e com o outro.
Os princípios e as ideias da teoria piagetiana foram
amplamente investigados e complementados ao longo dos anos e,
como consequência, deram origem a outros estudos que se
fundamentam na visão psicogenética. Um desses estudos é o do
psicólogo americano Lawrence Kohlberg. Para Kohlberg (1992),
assim como para Piaget (1994), o desenvolvimento da moralidade
está ligado, sobretudo, ao desenvolvimento cognitivo, afetivo e às
interações sociais estabelecidas ao longo da vida. Apesar de Kohlberg
ter se inspirado nos estudos de Piaget sobre a moralidade infantil, o
autor acreditava que os conceitos de heteronomia e autonomia,
propostos por Piaget, eram insuficientes para classificar e categorizar
todos os tipos de raciocínio moral que tinham aparecido entre os
sujeitos que ele estudava.
81
Buscando compreender esses diversos tipos de raciocínio
moral, o teórico realizou pesquisas longitudinais e interculturais, ao
longo de mais de vinte anos, em diferentes países (KOHLBERG,
1981, 1984). Fazendo uso de dilemas morais, o teórico observou
certas regularidades nas respostas que seus participantes davam, as
organizando em três grandes níveis: pré-convencional, convencional
e pós-convencional, subdivididos em dois estágios cada. Em suma, no
nível pré-convencional o pensamento moral é orientado por uma
visão centrada em si mesma, algumas vezes assumindo uma
reciprocidade simples e elementar, fazendo com que o sujeito aja em
função de evitar as punições ou receber recompensas pelos bons
comportamentos. no nível convencional, o sujeito passa a
considerar o outro, além do seu próprio ponto de vista, que,
geralmente, é alguém próximo e que representa uma referência afetiva
importante. Aqui a pessoa busca pela aprovação social dos grupos ou
de figuras de autoridade. Por fim, no último nível, pós-convencional,
esse raciocínio é orientado pelos princípios universais. Por meio desse
raciocínio, o sujeito tem a possibilidade de se enxergar como membro
de um grupo social e questionar as leis em decorrência dos valores e
princípios que elas trazem, as reconhecendo como justas ou injustas.
É importante frisar que tanto os níveis e estágios apresentados
por Kohlberg (1992) não são uma simples presença de conteúdos
morais diferentes, mas um raciocínio moral organizado e integrado a
uma estrutura generalizada de justiça. Além disso, essa evolução não
ocorre de forma mecânica, mas por meio de um processo que envolve
diferentes fatores, tais como a evolução da inteligência, da afetividade
e da experiência social. Segundo Kohlberg (1992) somente o
desenvolvimento cognitivo não possibilitaria a evolução do
82
desenvolvimento moral, pois é necessária a evolução da perspectiva
social e a troca de papéis para que o sujeito consiga se descentrar.
Tanto o juízo moral quanto a ão moral dependem de
componentes cognitivos e afetivos, que, apesar de serem distintos, são
inseparáveis no comportamento moral. Deste modo, a construção da
moralidade não ocorre apenas pela submissão as normas sociais, fruto
das transmissões sociais e da coação, como também não são somente
pelo exercício de reflexão racional sobre as regras, mas envolve uma
complexa dinâmica psicológica no processo de tomada de decisão
(PIAGET, 1994).
Foi pensando sobre esses aspectos que Kohlberg (1964)
utilizou o termo competência moral. Definindo como a capacidade
que um sujeito tem de “tomar decisões e fazer juízos morais, com base
em princípios morais internos, e agir de acordo com tais (p. 425).
Embora o teórico defendesse o duplo aspecto da moralidade, o
instrumento metodológico utilizado em suas pesquisas, o Moral
Judgment Interview, que buscava avaliar em qual dos níveis e estágios
de desenvolvimento moral estava o indivíduo, era insuficiente para
analisar os dois aspectos presentes.
Influenciado pelos estudos de Kohlberg, Georg Lind (1947 –
2021) buscou se aprofundar nos estudos da competência moral. De
acordo com o Lind (2007), a competência moral traz claramente
componentes intelectuais e afetivos, considerando que ela se
fundamenta em princípios internos (questões valorativas para o
sujeito, portanto, afetivas) e aspectos cognitivos, pois é necessária uma
estrutura cognitiva para pensar sobre os problemas morais, tomar
decisões e manifestá-las em seu comportamento.
83
A fim de avaliar a competência moral, Lind (2000)
desenvolveu o instrumento Moral Competence Test (MCT), além de
propor estratégias de educação moral por meio do método de
discussão de dilemas e a testagem dos seus resultados. Deste modo,
Lind (2000) convidava as pessoas não a refletirem sobre os dilemas
propostos, mas também a ter que lidar com contra-argumentos que,
apesar de trazerem ideias opostas à sua argumentação, continham
princípios morais.
No que diz respeito às diferenças entre os instrumentos de
Lind e Kohlberg, Bataglia (2010) comenta:
Lind argumenta que é fácil para alguém que tenha
habilidade para argumentação e conhecimento dos estágios
ou de filosofia, responder a um dilema em níveis superiores
de juízo moral, falsificando o seu próprio estágio de
desenvolvimento. A retórica o garante a competência na
ação. Sendo assim, Lind se preocupou antes do que avaliar
o vel de juízo moral do sujeito, um tipo de experimento
que permitisse ao sujeito mostrar sua competência em
aplicar sua estrutura em situações adversas, isto é, situações
com as quais ele não compartilhe a opinião ou ajuíze de
modo contrário (p. 84).
O autor ainda esclarece que todas as pessoas possuem valores
e princípios morais, mas para que esses valores se façam presentes na
conduta necessidade do desenvolvimento de uma série de
habilidades de ordem sociomoral, que são experimentadas e
exercitadas no processo de interação social, especialmente nos
processos educativos, sejam eles familiares, escolares ou outros. Deste
84
modo, é urgente olhar para os espaços de formações, analisando a
qualidade dessas trocas e a oportunidades que estão sendo
implementadas para o desenvolvimento dessas habilidades.
A empatia a partir dos estudos interacionistas
Sem relatos conclusos de datas de surgimento e oriunda do
grego empatheia, empatia é uma palavra que tem como definição
“estima pelos sentimentos da outra pessoa”. Sigmund Freud, em
1905, utilizou o substantivo Einfühlung para o discurso de “entender
o outro colocando-se no seu lugar” (IKEDA et al., 2019). Entretanto,
a introdução da empatia na psicologia foi feita pelo filósofo
psicanalista Theodor Lipps, apenas em 1926, quando abordou a
importância de explicar a necessidade de traduzir os sentimentos do
outro, discorrendo empatia como um componente emocional, sendo
resultado de uma reação do indivíduo ao presenciar uma situação
vivida pelo próximo (IKEDA et al., 2019).
Na última década, o conceito de empatia vem fomentando
grandes estudos acadêmicos na área da saúde com abrangência
nacional e internacional com muitos escopos, sendo o maior deles a
empatia como instrumento benéfico nos serviços de saúde (IKEDA,
et. al., 2019). Bem como a sua influência na humanização em saúde.
Ao longo dos anos de estudos, algumas aproximações ao tema
têm ocorrido em diversas áreas do conhecimento, como a filosofia, a
psicologia e a neurociências que tentam explicar os fenômenos com
base em suas epistemologias. Neste capítulo, nos interessa discutir a
visão desenvolvimentista sobre o tema. A empatia aparece em textos
de sua teoria, como um início de discussão que não foi aprofundada
85
ou sistematizada, sendo mais considerada como componente de um
processo empático, nas interações sociais, que envolve o role-taking, a
simpatia e o altruísmo. Neste processo, o role-taking, seria uma
habilidade necessária para intuir durante as interações quais seriam as
necessidades e os interesses da pessoa com a qual se interage,
compartilhando de seus sentimentos. a simpatia, seria uma
capacidade instintiva de colocar-se no lugar do outro que quando
desenvolvida, leva à possibilidade do exercício do altruísmo, que por
sua vez possibilita a cooperação e o respeito mútuo (PIAGET, 1994).
Segundo Camino (2009), Kohlberg trouxe muitas contribuições a
respeito do desenvolvimento moral e social, mas não se debruçou com
a mesma dedicação ao conceito de empatia.
Considera-se a empatia um conceito complexo e, por
conseguinte, de difícil definição. Dentro da perspectiva interacio-
nista, Martin L. Hoffman tenta dar conta desta complexidade e é
considerado um dos autores mais renomados da atualidade sobre
empatia. O autor define empatia como: “a capacidade de uma pessoa
para colocar-se no lugar do outro (role-taking), inferir seus
sentimentos e, a partir do conhecimento gerado por esse processo, dar
uma resposta afetiva mais adequada para a situação do outro do que
para sua própria situação” (HOFFMAN, 1989, p. 285).
A fim de explicar a evolução desse conceito, ele criou estágios
de desenvolvimento empático e os relacionou com os estágios do
desenvolvimento moral e cognitivo, propostos por Kohlberg e Piaget.
Sugerindo a relação entre o desenvolvimento da empatia e o
desenvolvimento das habilidades cognitivas de diferenciação de si e
do outro. Na Teoria de Hoffman (2000), a empatia seria a capacidade
de responder afetivamente a situação do outro, em detrimento de sua
86
própria situação, o que possibilitaria melhores interações nas relações
sociais, sendo o papel da empatia de grande importância para
comportamentos pró-social.
Para Hoffman (2000), os mecanismos de despertar da
empatia podem ocorrer a partir de sinais emitidos e recebidos nas
interações sociais, como por exemplo: o tom da voz, as expressões
faciais, a história de alguém em sofrimento, entre outros e evoluem
em sequência de quatro estágios: 1) o sujeito não é capaz de se
diferenciar do outro; 2) o sujeito adquire a consciência de que o outro
é fisicamente diferente de si; 3) o sujeito tem consciência de que o
outro possui sentimentos e estados internos independentes dos seus;
4) o sujeito obtém consciência de que as outras pessoas possuem
histórias e experiências peculiares e que os seus sentimentos
continuam a existir além do aqui e agora. Nomeando esses estágios
como: empatia global, empatia egocêntrica, empatia pelos
sentimentos dos outros e empatia pela condição de vida do outro.
Este autor considera a evolução dos estágios diretamente
relacionada ao avanço do role taking, estabelecendo uma relação entre
desenvolvimento moral e empatia, com a utilização da mesma
perspectiva de Piaget, Kohlberg e Lind.
Mas como será que esses autores foram incorporados nas
pesquisas da área da saúde? É sobre isso que falaremos a seguir.
87
O que as pesquisas sobre competência moral e empatia com
estudantes da área da saúde tem a nos dizer
Estudos sobre a competência moral
Os estudos que buscaram investigar a competência moral em
estudantes da área da saúde, sobretudo enfermeiros e dicos,
iniciaram com Georg Lind nos anos 2000. Lind (2000b), por meio
de estudo longitudinal, avaliou a competência moral de estudantes de
medicina de diferentes semestres. Em seus resultados verificou uma
diminuição acentuada da competência moral dos alunos que
cursavam o quinto semestre em relação aos que estavam no primeiro.
No Brasil, as pesquisas Oliveira (2008) com estudantes de
enfermagem, de Feitosa et. al. (2013) e Castro (2019) com estudantes
de medicina, também obtiveram resultados próximos aos
encontrados por Lind. Evidenciando que estudantes dos últimos anos
apresentam uma piora em relação à competência moral dos
estudantes que estavam ingressando no curso. Apesar da maioria
discentes do curso demonstrar ter altos ideias morais e serem bem-
intencionados, a preocupação com a educação moral “é colocada de
lado em face as demandas do aprendizado técnico altamente
sofisticado e de um meio extremamente competitivo” (FEITOSA et.
al., 2013, p. 12). Tal dado é preocupante e reforça a necessidade de
se repensar os currículos e a qualidade das experiências vivenciadas na
formação em saúde.
No que diz respeito às questões da avaliação dos métodos de
ensino e formação ética dos estudantes de medicina, o estudo de
Gontijo (2021) evidenciou que a atmosfera moral do ambiente em
88
que acontece as formações (especialmente os estágios e residências
médicas) e os métodos de ensino tecnicistas acabam dificultando o
desenvolvimento da competência moral. Para que haja a construção
de valores morais e éticos nos processos educativos é necessário ir além
da transmissão de informações. Deste modo, a competência moral
deve ser considerada estruturante no planejamento pedagógico da
formação médica. E para que isso seja possível, é necessário que os
docentes passem por uma capacitação adequada, evitando que a
“formação moral não fique restrita a um conteúdo periférico e não
essencial às matrizes curriculares ou, ainda pior, gere inconsistência
entre o discurso da relevância da ética e a prática docente divergente”
(p. 4). Tais conclusões também foram abordadas no estudo de
Oliveira (2014), destacando o quanto é urgente que o ensino da
bioética tenha caráter laico nos currículos, com ênfase nos temas
como direitos humanos, justiça e autonomia que são fundamentais
para as sociedades plurais desenvolverem um processo democrático.
Os resultados encontrados por Varela (2013) também
demonstram que o ambiente universitário, traz poucas oportunidades
de reflexões sobre as questões éticas, além da inexistência de uma
política institucional de condução dos problemas morais enfrentados
no cotidiano universitário dos estudantes. Para que a formação
humanística e crítica seja possível é necessário que as temáticas sobre
humanização e ética profissional estejam presentes nos currículos,
além de ser primordial que haja políticas institucionais que abarquem
essas questões. Segundo a autora, formar pessoas éticas, para o
exercício de uma convivência democrática, tem que ser um
compromisso assumido por todos. Deste modo, esse ideal deve estar
presente de modo transversal por todo o curso, por todo o campus.
89
Estudos sobre empatia
De acordo com Amore (2018), atualmente, as escolas de
medicina se viram impelidas a rever seus currículos, enfatizando
disciplinas e organizando intervenções para retomada do humanismo
na prática médica. Em sua pesquisa, destacou que o principal atributo
do humanismo é a empatia e que as escolas de medicina estão
desenvolvendo como principais ações alterações nos currículos dos
cursos, alterações curriculares, intercâmbios e programas de extensão,
mediante a inclusão de novas disciplinas, uso de atividades lúdicas e
atuação em contextos culturais distintos dos de origem dos
estudantes, mas, concluiu que a abrangência das medidas ainda é
pequena, considerando-se o universo dos cursos de medicina e o
resultados das intervenções no curso de empatia necessitam de uma
análise mais objetiva para a confiabilidade das ações. Neste sentido,
ao buscarmos intervenções para o desenvolvimento da empatia com
a estratégia de busca: empatia AND (estratégia OR estratégias) AND
educação superior, empathy AND (strategy OR strategies) AND
(education, higher OR higher education), nas bases de dado:
LILACS, SciELO, PePSIC, PubMed , BVS e BBO. Houve o retorno
de apenas 7 estudos que avaliavam as intervenções, sendo 3 nacionais
e 4 internacionais.
O primeiro estudo de duas décadas atrás, desenvolvido por
Henry-Tillman et al. (2002) contextualizou, inicialmente, a situação
em que a empatia foi apresentada em uma palestra, os estudantes de
medicina não apreciaram o tema ou tiveram oportunidades de
praticar técnicas empáticas. O Patient Navigator Project foi concebido
para promover a compreensão das experiências de um paciente e
90
encorajar a comunicação empática. Utilizou-se aprendizagem
experiencial em ambiente ambulatorial no primeiro ano de
treinamento. Cada aluno deveria acompanhar um paciente durante
uma visita a um oncologista cirúrgico e poderia observar o paciente
durante todo o tratamento, depois, os alunos se reuniram em
pequenos grupos para refletir sobre suas experiências. A maioria dos
alunos relatou uma experiência de aprendizagem positiva e que
aprenderam a ver os pacientes como pessoas, não como números ou
doenças. O estudo conclui-se que exigir atividades individualizadas
centradas no paciente no currículo pré-clínico é desafiador devido ao
grande número de alunos e à natureza imprevisível dos pacientes.
O estudo de Kestenberg (2010) trata de uma da avaliação da
eficácia de um Programa de Desenvolvimento da Empatia (PDE)
para graduandos de enfermagem. Foi utilizado o método
experimental, no qual 17 estudantes participaram de 16 encontros de
treinamento com três horas de duração cada, enquanto 16 estudantes
compuseram o grupo de controle. Os procedimentos utilizados
incluíram: relaxamento, exposição dialogada sobre empatia, vivência,
desempenho de papéis com vídeo feedback e prática das habilidades
aprendidas em ambiente natural. Os participantes dos dois grupos
foram avaliados antes da intervenção, e imediatamente após com
follow-up de 30-40 dias. Os componentes cognitivos e afetivos da
empatia foram avaliados através do Inventário da Empatia. Os
resultados da análise estatística evidenciaram que o PDE foi eficaz de
melhorar significativamente a compreensão e a verbalização empática
do grupo experimental quando comparado ao de controle. A
avaliação dentro do grupo experimental também revela mudança
significativa no desempenho empático verbal dos participantes nos
91
três momentos avaliativos. A análise qualitativa dos relatos dos
participantes evidenciou alguns benefícios do programa, dentre
outros, a redução da angústia pessoal diante do sofrimento do
paciente e a generalização das habilidades aprendidas para seus
contextos relacionais, o que favoreceu a qualidade de seus
relacionamentos em diferentes esferas sociais.
Medeiros et al. (2013), objetivou avaliar o desenvolvimento
de competências afetivas e empáticas dos estudantes do curso de
Medicina da Escola Superior de Ciências da Saúde (ESCS), por meio
da análise de 39 narrativas produzidas por estudantes da segunda e
terceira séries em 2010. A análise de conteúdo baseou-se na
epistemologia qualitativa, com base na qual foram estabelecidas três
categorias: ritual de iniciação do estudante: vivências e dificuldades;
vivências emocionais no decorrer da formação médica; benefícios
pedagógicos da medicina narrativa: os desafios do desenvolvimento
da empatia. A segunda série pareceu representar para os estudantes
uma fase de adaptação ao contexto hospitalar, vista a necessidade de
exteriorização dos próprios conflitos e de suas barreiras emocionais.
Na terceira série, observou-se melhor desenvolvimento tanto de
habilidades empáticas quanto de uma visão mais integral da condição
dos pacientes e seus dramas. Conclui-se que a medicina narrativa foi
uma abordagem efetiva para o aprendizado da empatia e da
competência afetiva nos estudantes de Medicina, além de
instrumento válido em nosso meio para avaliação de competências
empáticas e humanísticas. A progressiva adesão dos estudantes
legitima e consolida a medicina narrativa no espaço curricular,
revalorizando a formação médica em suas práticas intersubjetivas.
Entretanto, este estudo aponta a necessidade de novas investigações,
92
utilizando-se métodos mistos para melhor compreensão do impacto
dessa abordagem a longo prazo.
O estudo de Rodrigues et al. (2014), teve como objetivo
implementar e avaliar o efeito de um programa de desenvolvimento
da empatia em 14 graduandas de psicologia. No pré e pós-teste foram
utilizados o Inventário de Empatia - IE e a Escala Multidimensional
de Reatividade Interpessoal - EMRI. O Programa contou com cinco
encontros semanais, totalizando 18 horas de intervenção. Realizou-se
uma pesquisa de seguimento três meses após o término do programa,
por meio de entrevistas submetidas à análise de conteúdo. Os
resultados quantitativos indicaram melhorias nos fatores do IE:
Tomada de perspectiva, Sensibilidade afetiva, Flexibilidade
interpessoal e Altruísmo. A avaliação de seguimento revelou
benefícios para vida diária e relacional das participantes, maior
preparação no âmbito das práticas psicológicas e aprimoramento da
formação acadêmica.
O estudo de Claro e Mendes (2018) ocorreu em uma
disciplina de graduação em saúde e utilizou como metodologia a
abordagem narrativa com estudantes do terceiro ano do curso médico
da Universidade Federal Fluminense. A análise das narrativas revelou
diversos temas como admiração pelos pacientes por sua coragem e
generosidade; inibição inicial de abordá-los e receio de incomodá-los;
facilidade progressiva para a comunicação; dificuldades em lidar com
seu sofrimento e com a expressão de suas emoções; compreensão de
seus problemas, pontos de vista e experiências; e estabelecimento de
relações de amizade e cumplicidade com os pacientes. As Autoras
concluíram que a proposta pedagógica mostrou-se capaz de ampliar a
compreensão dos estudantes sobre o processo de adoecimento e a
93
experiência da hospitalização, aprofundar o nculo estudante-
paciente, facilitar o autoconhecimento, reflexão, desenvolvimento de
habilidades empáticas e de comunicação e da capacidade de
identificar e compreender e lidar com as emoções do outro e com suas
próprias emoções.
O estudo de YANG et al. (2020) implementou um programa
educacional estruturado de empatia desenvolvido a partir da técnica
Delphi, bem como avaliar seus efeitos na competência em empatia
entre estagiários de graduação em enfermagem. Este estudo foi quasi-
experimental, com comparação de dois grupos. Contando com a
participação de estudantes de graduação em enfermagem no quarto
ano (n=118) que foram recrutados de um hospital universitário
afiliado em Wuhan, parte central da China, entre janeiro de 2018 e
março de 2018. Uma amostra de conveniência de 118 estagiários de
enfermagem foi recrutada de um hospital universitário em Wuhan e
designada para o grupo de intervenção ou controle de acordo com sua
preferência. Os participantes do grupo de intervenção receberam um
programa educacional estruturado relacionado à empatia de 2
semanas e 12 horas (duas sessões por semana, 3h por sessão),
enquanto o grupo controle não recebeu nenhuma intervenção. A
Escala de Jefferson (JSE-HPs) foi usada para avaliar os níveis de
empatia dos alunos antes e após a intervenção. Um teste t de amostras
independentes revelou que os escores dos níveis de competência em
empatia no grupo de intervenção foram significativamente maiores
do que os do grupo controle após a intervenção. Três domínios do
nível de competência em empatia também foram significativamente
maiores no grupo intervenção após o treinamento de duas semanas
94
em relação ao grupo controle, a saber: tomada de perspectiva, cuidado
compassivo e ficar no lugar do paciente.
O estudo de Kötter (2021) caracterizado como longitudinal,
investigou o desenvolvimento da empatia durante a educação médica
e avaliou-se potenciais preditores de empatia em diferentes momentos
do curso de estudos médicos. A partir de 2011, as pesquisas iniciaram
com estudantes de medicina da Lübeck Medical School, Alemanha,
no início de seus estudos e após 2, 4 e 6 anos (t0-t3) usando
instrumentos padrão para empatia Escala Jefferson de Empatia,
versão para estudantes (JSE-S), ansiedade e depressão (Hospital
Anxiety and Depression Scale, HADS), estresse (Perceived Medical
School Stress scale) e padrões de comportamento e experiência
(Arbeitsbezogene Verhaltens- und Erlebensmuster [Padrões de
Comportamento e Experiência Relacionados ao Trabalho]). Com um
total de 43 alunos completaram todas as pesquisas. As amostras
transversais para os diferentes momentos da pesquisa compreenderam
entre n = 220 e 658 alunos. Observou-se um leve, mas
estatisticamente significativo, aumento dos escores de empatia de t0
para t3 (t(43) = −3,09, P < 0,01). Em todas as análises, a preferência
por uma especialidade voltada para as pessoas foi associada a uma
pontuação mais alta no JSE-S, além de ser do sexo feminino,
enquanto observamos uma associação negativa entre a depressão
HADS e os escores do JSE-S.
Catarucci et al. (2022) teve como objetivo investigar o efeito
de um programa de Redução de Estresse e Desenvolvimento da
Empatia na Medicina. O programa foi composto por oito encontros
de duas horas cada, envolvendo práticas de meditação, posturas de
ioga e atividades de grupo direcionadas ao aperfeiçoamento de
95
interações interpessoais. O grupo intervenção foi composto por 47
alunos e o grupo controle por 40 estudantes. Utilizou-se a Escala
Jefferson de Empatia, versão para estudantes (JSPE-S), para avaliar o
nível de empatia antes e depois da intervenção. Obteve-se aumento
significativo do vel de empatia no grupo que recebeu a intervenção
quando comparado ao grupo controle (p: 0,000). Conclui-se que a
participação no programa se mostrou eficaz no aumento da empatia
entre estudantes de graduação de um curso de Medicina.
Nota-se que as universidades que empreenderam esforços na
realização de intervenções para o desenvolvimento de empatia dos
estudantes da área da saúde, obtiveram resultados positivos, no
entanto, o número de estudos é muito pequeno.
Considerações Finais
Este capítulo buscou discorrer sobre a necessidade urgente de
ações relacionadas ao desenvolvimento da empatia e moralidade de
estudantes da área da saúde. Embora tenham sido encontrados
estudos que demonstrem caminhos favoráveis para o
desenvolvimento da empatia e da competência moral, não foram
encontrados estudos de intervenções para o desenvolvimento da
empatia e competência moral em conjunto. O que evidencia a
necessidade de aprofundamento neste tema. Deste modo,
acreditamos ser interessante avaliar se um programa de intervenção
em que o valor empatia esteja presente tem impacto no
desenvolvimento da competência moral dos estudantes da área de
saúde.
96
Quando falamos em desenvolvimento da moralidade e de um
comportamento p-social, sabemos que valores, sobretudo
sociomorais necessitam ser construídos nas interações do sujeito nos
diversos contextos de socialização. Essa construção não acontece de
forma mecânica e apenas pela transmissão social, pelo contrário, se
dão pelo processo de interação com as situações que esses valores
estejam presentes. Dessa forma, se tivermos a intenção de que esses
profissionais exerçam sua profissão de forma ética e cuidadosa, eles
precisam, desde sua formação inicial, estarem a inseridos em um
ambiente em que se valorize o cuidado consigo e com o outro e que
haja espaço para a troca de perspectivas sociais.
É possível que os cursos de formação desenvolvam a
capacidade reflexiva dos estudantes, a partir da possibilidade da
discussão de situações que façam parte da situação de trabalho. Mas
para que tragam resultados, essas reflexões precisam ocorrer com mais
frequência, inclusive com a modificação do currículo do curso para
um maior contato dos estudantes com o posicionamento reflexivo e
com a temática da ética associada a todas as disciplinas do currículo
(BATAGLIA e BORTOLANZA, 2012). Ou seja, é urgente que se
façam esforços efetivos e afetivos para o cumprimento da tarefa de
formar profissionais que atuem de forma ética e humanizada nos
contextos de cuidado em saúde.
97
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2022.
104
105
5.
A Formação Ética do Psicólogo na
Visão dos Docentes
Fátima Simone Silva Pereira Consoni
Rita Melissa Lepre
Este capítulo busca refletir sobre a ética na formação em
psicologia, compreendendo que a formação do psicólogo está
implicada com as relações humanas nos variados contextos da
sociedade. Concordamos com Bereta (2020), que uma formação que
não contemple a dimensão moral, afetiva e cognitiva, dificilmente,
“terá bases sólidas para contribuir com a formação de profissionais
comprometidos com o social e prontos a desempenharem um
trabalho reflexivo e ético frente às inúmeras demandas profissionais.”
(p.19)
O presente estudo buscou ampliar a compreensão a respeito
da ética na formação do psicólogo em uma Faculdade privada do
interior de São Paulo, a partir da visão de quatro docentes. Discutir
sobre a ética e a moral no curso de psicologia se faz necessário uma
vez que engloba questões relacionadas aos sujeitos, ao respeito como
base das relações humanas, à dignidade humana e à relação com o
outro. Ao nosso ver, o tema em questão é de relevância para a
formação em psicologia uma vez que visa auxiliar e repensar, se
https://doi.org/10.36311/2023.978-65-5954-397-7.p105-126
106
necessário, o processo de formação acadêmica colaborando com os
profissionais envolvidos na estruturação do curso e na formação dos
acadêmicos, habilitando-os para atuação nas mais variadas esferas da
psicologia, tendo a ética como processo e produto de suas ões.
A ética e a moral
Ética, de acordo com o Dicionário de Filosofia, diz respeito,
a ciência da conduta. Ramo da filosofia que tem por objetivo refletir
sobre a essência dos princípios, valores e problemas fundamentais da
moral, tais como a finalidade e o sentido da vida humana, a natureza
do bem e do mal, os fundamentos da obrigação e do dever, tendo
como base as normas consideradas universalmente válidas e que
norteiam o comportamento humano. A palavra ética vem do grego
“ethos” que significa modo de ser. A moral, por sua vez, tem sua
origem no latim, que vem de “mores”, significando costumes. A
moral é um conjunto de normas que regulam o comportamento do
homem em sociedade, compreendendo que estas são construídas a
partir da educação, do dia-a-dia e dos costumes, ou seja, na interação
com o meio.
Na filosofia, Aristóteles (384-322 a.C.) sugere a ética como
uma disciplina ligada à ação humana, prática, propondo que o
homem não nasce bom ou justo, contudo, desde o momento que
pratica tais atos, torna-se bom ou justo. A filosofia de Kant sobre a
moral se respalda na razão pura, desprovida de influência sensível, e
caminha no sentido oposto a qualquer ideal empírico. A ética
kantiana é a ética do dever, auto coerção da razão, que concilia dever
e liberdade. Segundo o autor, a capacidade do homem de agir
107
racionalmente embasamento para a prática moral, fundamentada
em uma lei que a priori é inerente à racionalidade universal humana
(KANT, 2007).
A palavra Ética, de acordo com Motta (1984 apud Luiz,
2018, p. 241), é definida como: “um conjunto de valores que
orientam o comportamento do homem em relação aos outros homens
na sociedade em que vive, garantindo, outrossim, o bem-estar social”,
sugerindo que a ética é a forma como o homem deve se comportar no
seu meio social.
Segundo Cremonese (2019), a ética na contemporaneidade,
seriam os princípios universais, que são aplicados a todos, baseando-
se no entendimento de que os indivíduos ou os seus interesses devem
receber igual respeito. Cremonese (2019), cita que para Outhwaite e
Botomore (1996, p. 278), “a ética refere-se à avaliação normativa das
ações e do caráter de indivíduos e grupos sociais”. A ética é a reflexão
sobre a melhor forma de viver e conviver, ou seja, são princípios
universais que regem a vida em sociedade.
A ética também é sempre relativa, porquanto muda com o
tempo (época), muda de acordo com a cultura e com
crenças de diferentes grupos sociais ou civilizações. O certo
e o errado diferem de cultura para cultura
(CREMONESE, 2019, p. 04).
A ética é, pois, o conjunto de princípios construídos baseados
em reflexões a respeito dos valores morais que permeiam nossas ações
e comportamentos com objetivo de melhorar nossa vivência e
convivência em sociedade e a relação com o meio-ambiente. Assim, a
108
ética é o conjunto de valores e princípios que nós usamos em nossas
condutas (CORTELA, 2013). Para La Taille e Tognetta (2008), a
palavra “ética” traduz as reflexões a respeito de situações, da ação e de
fatos.
De acordo com Luiz (2018), os princípios éticos
fundamentais para a vida em sociedade são os valores da justiça,
tolerância, solidariedade, responsabilidade, democracia, liberdade,
compaixão, respeito, dignidade, igualdade e prudência. Tais
princípios devem existir tanto num plano individual quanto coletivo
e, dessa forma, presentes no conjunto das instituições que fazem parte
da sociedade, como colocou Hegel (1770/1830), ao ressaltar que
procura pensar a ética, de maneira não somente na esfera individual
das ações proposta apresentada pelo filósofo Kant, e sim
considerando o contexto social.
Neste sentido, a partir de Hegel, tem-se início grandes
modificações a respeito das reflexões com relação à ética, que
começam a analisar a ética a partir dos aspectos sociológicos e não
somente com destaque na esfera filosófica uma vez que Hegel propõe
que o ponto de vista moral do sujeito, com sua ação e seu julgamento,
precisa ser considerado dentro do âmbito social para fazer sentido.
para Chauí “A vida ética é o acordo e a harmonia entre a vontade
individual subjetiva e a vontade objetiva cultural” (2003, p. 318).
Para Luiz (2018), a ética refere-se à investigação baseada na
reflexão acerca da moral, buscando pensar os fundamentos,
debatendo, questionando, observando as suas implicações e
consequências socioculturais e ambientais e contextualizando. Trata-
se de um assunto complexo e bem plural. Diz respeito a um assunto
que é fundamental a abordagem multidisciplinar, uma vez que inclui
109
fenômenos cio-históricos, culturais, ambientais e subjetivos.
Segundo o mesmo autor, os princípios éticos fazem sentido se não
existirem apenas nas práticas individuais, eles permeiam o conjunto
da sociedade, como nas famílias; nos meios de comunicação; nas
escolas; nas entidades de classes; nas instituições jurídicas; nas
empresas, entre outras. Ao definir ética como sendo “princípios que
orientam nossas ações considera relevante o agente ético, este termo
tem um significado importante, porque implica na existência de um
agente consciente, com posturas dialógicas e responsáveis por suas
ações e comportamentos.
Buxarrais (1997) e Martín (1998), que fazem parte do Grupo
de Investigação em Educação Moral (GREM), da Universidade de
Barcelona (Espanha) são nomes que se aprofundaram na questão
social (interação), fator importante para a construção da moralidade.
Segundo Buxarrais (1997), um projeto de educação em valores, tendo
a ética como base, deve levar em conta a realidade do país, as questões
políticas relacionadas à concepção de escola e a formação do corpo
docente, para que seja possível construir um currículo que
contemplem presentes: o conceito de educação, as características
socioculturais do grupo, as dimensões da personalidade moral, as
estratégias de trabalho e os âmbitos temáticos a serem trabalhados.
Nesse sentido, a formação na educação superior deveria considerar e
participar deste projeto. A formação em psicologia, de certo, não
deveria se furtar a isso.
110
A formação em Psicologia
De acordo como Jacó-Vilela (2010), a preocupação com a
formação em Psicologia tem sido marcada de forma constante ao
longo de sua história. Partindo da ênfase da ciência positivista que
direcionou seu início, ela tem passado por movimentos amplos e vem
disputando embates atuais bastante firmes em busca de uma posição
de luta por direitos sociais e políticos, especialmente, de saúde, de
educação, de viver as diferenças, entre outros. Não podemos correr o
risco de desvincular a formação das dimensões políticas, éticas e
sociais, pois estaríamos naturalizando-a e colocando-a a serviço de
práticas utilitaristas. Assim, os processos de formação, estão sempre
envolvidos com singularidades e experiências que vêm acompanhadas
da intensidade de forças que apresentam os diferentes contextos.
Segundo Rivero (2011), a prática crítica tem que estar sempre
presente seja nos objetivos dos cursos de Psicologia ou nas práticas
dos egressos, pois a competência profissional está em mantermos
sempre uma suspeita sobre aquilo que nos governa.
Além disso, questões éticas, políticas e epistemológicas, tais
como aquelas representadas pelos dilemas formação técnica
versus crítico-reflexiva, científica versus profissional,
generalista versus especialista, predominantemente clínica
versus pluralista, unidisciplinar versus multi/interdis-
ciplinar, histórica versus contemporânea, elitista versus
socialmente comprometida e voltada para indivíduos
versus voltada para a coletividade, têm sido debatidas
(Achcar, 1994; Bastos & Bock, 1997; Duran, 1994;
Ferreira Neto, 2004; Francisco & Bastos, 2005; Gomide,
111
1988; Gonçalves & Bock, 1996; Martinez, 2003; Patto,
2005; Pereira, 1996; Pfromm Netto, 2007; Witter &
Ferreira, 2005; Yukimitsu, 1999). Mais recentemente, o
impacto da avaliação nacional dos cursos de graduação
(Landeira-Fernandez & Primi, 2002; Primi, Landeira-
Fernandez & Ziviani, 2003) e da implementação das
chamadas novas diretrizes curriculares (Marinho-Araújo,
2007; Moura, 1999; Rocha Jr., 1999; Yamamoto, 2000)
tem sido enfatizado (LISBOA; BARBOSA, 2009, p. 724).
Após os anos 70, o Brasil inicia discussões sobre a grade
curricular e a formação em psicologia, no que diz respeito às questões
éticas, políticas e epistemológicas. A década de 80 trouxe novos
desafios aos psicólogos. A pequena, mas significativa, abertura do
mercado de trabalho no serviço público de saúde colocou aos
psicólogos e às suas entidades desafios muito grandes. Era preciso
“reinventar” uma Psicologia que permitisse contribuir e responder às
necessidades daquela população, com a qual não estávamos
habituados a trabalhar. Esse fato contribuiu para fortalecer nossas
entidades. A década de 80 foi, assim, fervilhante para os psicólogos.
Os Sindicatos se uniram e criaram a Federação Nacional dos
Psicólogos; os Conselhos também se fortaleceram, produzindo
material escrito sobre a profissão e organizando Congressos (BOCK,
1999).
Considerando as pesquisas realizadas sobre a formação em
Psicologia, a grade curricular deve proporcionar uma formação
abrangente com relação ao sujeito e aos fenômenos psíquicos que o
compreende, segundo as Diretrizes Curriculares (Parecer CNE/CES
0062/2004).
112
Cury e Neto (2014), destacam que os debates e documentos
referentes à formação em psicologia apresentam uma inquietação
com relação ao papel social do psicólogo na prática profissional,
enfatizando a importância dos estágios supervisionados nas diversas
áreas em sintonia com as demandas sociais. Defende uma formação
voltada para o compromisso com a realidade social e com a qualidade
de vida, com consciência política e crítica, caminhando na construção
de conhecimentos num contexto de ação-reflexão-ação.
Portanto, refletir e discutir sobre o currículo do curso de
Psicologia se faz necessário visando uma formação orientada para o
respeito e a promoção da liberdade, da igualdade, da democracia e da
integridade e dignidade do ser humano; promoção da saúde, bem-
estar e da qualidade de vida; responsabilidade social; desenvolvimento
da Psicologia no campo teórico e prático; acesso da população às
informações sobre a ciência psicológica; zelo pelo exercício digno da
profissão e criticidade quanto às relações de poder (CFP,2005).
Partindo de estudos realizados sobre a formação em
Psicologia, Bereta (2018), defende que a formação deve possibilitar o
desenvolvimento de sujeitos reflexivos e críticos que possam
contribuir para a transformação social, assim a autora discorre
também sobre a importância do professor de graduação colaborar
para a formação integral do acadêmico.
Ainda de acordo com Bereta (2018), as reflexões que abarcam
a ética e a moral, precisam estar presentes no planejamento do
Projeto Político Pedagógico da escola. Vale apontar que discussões
sobre as problemáticas devem fazer parte para que realmente haja uma
construção democrática e autônoma, imprescindível para a formação
moral.
113
Para Bock (1999), refletir e debater sobre o compromisso
social da Psicologia nos possibilita analisar o seu desenvolvimento,
como ciência e profissão, no contexto que vivemos, e indicarmos em
qual direção essa ciência tem caminhado: para a transformação das
condições de vida ou para sua manutenção? A autora discorre que está
se referindo ao compromisso, logo, a partir de uma perspectiva ética.
Assim, vale a intenção e a finalidade do trabalho.
Bock (2003), no livro Psicologia e o compromisso social -
defendia que a psicologia enquanto profissão ainda é frágil, a
despeito de mudanças obtidas. Para a autora, a psicologia se
estabeleceu na sociedade moderna como uma profissão tradicionalista
a qual está distante de debates com foco na transformação social. Para
que a Psicologia se fortaleça enquanto ciência crítica e transformadora
julgamos ser importante pensar na formação dos novos psicólogos e
psicólogas e entender como os docentes que trabalham nessa
formação concebem o tema da dimensão ética.
O que os docentes pensam sobre o tema em pauta?
Para o desenvolvimento deste capítulo aplicamos e analisamos
as respostas obtidas em um questionário, respondido por quatro
docentes que trabalham em um curso de formação em Psicologia, de
uma faculdade do interior paulista. Em decorrência do fato da
pesquisa envolver pessoas, bem como instituições, a pesquisa de
campo foi submetida e aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa,
conforme determinam as normas em vigor.
Os docentes responderam questões a respeito da compreensão
do estudo sobre a ética e a perspectiva moral trabalhadas no curso de
114
Psicologia, assim como se eles acreditam que os conteúdos da grade
curricular, contribuem para a formação do desenvolvimento moral e
ético dos acadêmicos e quais os aspectos e como devem ser trabalhas
as questões que envolvem a ética e moral no curso.
Quadro 1 – Informações sobre os docentes participantes da Pesquisa.
FORMAÇÃO/TITULAÇÃO
TEMPO DE DOCÊNCIA NO ENSINO
SUPERIOR
14 anos
10 anos
(Cursando Mestrado)
3 anos e meio
15 anos
Fonte: As autoras.
Para contribuir com a temática estudada buscamos conhecer
a compreensão que os docentes do curso construíram acerca da
formação ética em psicologia. As questões abaixo estão contempladas
no questionário respondido por parte dos docentes do curso de
Psicologia da Instituição.
A partir das respostas dos docentes percebemos que metade
dos participantes da pesquisa acredita que muitas disciplinas do curso
como Psicologia do Desenvolvimento, Ética profissional, Psicologia
Social e Educacional abordam questões éticas e morais. No entanto,
eles pensam e afirmam que tais questões podem ser trabalhadas mais
diretamente na prática cotidiana dos acadêmicos, além das conversas
em sala de aula sobre conceitos aprendidos e suas diferenciações.
Sugerem que o curso deve promover espaço para debate sobre o
desenvolvimento moral e a ética dos próprios acadêmicos, com
115
discussões de dilemas, assim como debates críticos nas supervisões de
estágios.
Uma das professoras entrevistadas coloca que o estudo da
moralidade está relacionado, sobretudo, às disciplinas que trabalham
com o tema do desenvolvimento humano, como Psicologia do
Desenvolvimento I e II, mas também nas disciplinas de Ética,
Psicologia Social, Educacional e Clínica. A participante afirma que
em toda a formação teórica e prática tais conteúdos acabam sendo
abordados, por meio de conflitos que são acolhidos e refletidos
durante o processo formativo, possibilitando o desenvolvimento
moral, profissional e pessoal dos estudantes. Uma outra entrevistada,
por sua vez, afirma que o conteúdo sobre o desenvolvimento moral e
ético na formação deveria ser trabalhando para além das disciplinas
teóricas, sendo discutido por meio de casos práticos, dilemas morais
e temas transversais.
Cabe destacar que dois dos quatro docentes que
participaram do questionário discorreram que o curso de Psicologia
não oferece reflexões de maneira aprofundada sobre o conteúdo
abordado nesse estudo e que a grade curricular precisa contemplar de
maneira mais efetiva o tema em pauta. “O desafio ético para uma nação
é o de universalizar os direitos reais, permitindo a todos a cidadania
plena, cotidiana e ativa, pois sua efetivação proporcionará o
desenvolvimento moral e ético da sociedade” (NERES; LIMA, 2011,
p.38).
Segundo Puig (1998), para educar moralmente em uma
sociedade diversificada e ampla, o trabalho deve envolver respeito à
autonomia de cada pessoa e a razão dialógica com intuito de
promover o distanciamento de reflexões e ações individualistas e
116
autoritárias. Este autor discorre, ainda, dentro das finalidades para um
currículo em educação moral, a respeito do sujeito desenvolver o
pensamento crítico, com a capacidade de compreensão crítica da
realidade social, assim como para perceber suas emoções e reconhecer
os valores morais que podem ser universalmente almejados.
A preocupação com a formação ética dos sujeitos aparece,
sobretudo, nas Diretrizes Nacionais para a Educação em
Direitos Humanos, que compõem as Diretrizes Curricula-
res Nacionais para a Educação Básica, de 2013. Segundo a
proposta, a Educação em Direitos Humanos tem a
finalidade de promover a educação para a mudança e a
transformação social, fundamentando-se nos seguintes
princípios: dignidade humana; igualdade de direitos;
reconhecimento e valorização das diferenças e das
diversidades; laicidade do estado; democracia na educação;
transversalidade; vivência e globalidade e sustentabilidade
socioambiental (LEPRE, 2019, p. 9).
O espaço acadêmico deve favorecer a formação ética e
desenvolver práticas pedagógicas que possibilitem aos discentes
perceberem criticamente a realidade sendo ativas no contato com a
comunidade. Cabe destacar que para formar cidadãos reflexivos é
preciso considerar a cultura, a sociedade e o sujeito como um todo.
Portanto, uma educação pautada na perspectiva moral e na ética é um
processo complexo que envolve questões culturais, emocionais, sociais
e políticas objetivando propiciar pessoas comprometidas com as
relações humanas.
117
Freire (2005), defende que tanto a educação como tudo que
a envolve, desde a formação ao currículo estão articulados ao ato
político, ou seja, a educação não é neutra. Portanto, a educação deve
possibilitar a formação de sujeitos reflexivos, críticos e participativos
na sociedade.
Trabalhar com o tema em questão, não significa transmitir
conteúdos, oferecer algo pronto e padronizado e sim, disponibilizar
espaço de criação, considerando os objetivos, planejamento e
atividades pensadas para o desenvolvimento de relações mais justas e
democráticas, partindo de interações baseadas no diálogo e no
respeito, a partir dos conflitos e situações sociais existentes no
cotidiano.
De acordo com Bataglia (2012), entende-se que o ambiente
acadêmico carece oferecer ao acadêmico possibilidades para que o
mesmo possa perceber que sua atuação profissional envolve estar
consciente e refletir sobre seus valores, com o intuito de que tenha o
ser humano como um fim em si mesmo.
Refletindo sobre os pontos defendidos pelos docentes
participantes, acreditamos que o campo educacional e social da
educação deva ser direcionado à construção de relações sociais mais
justas, por meio das quais, os sujeitos possam tornar-se cidadãos ativos
e participativos de maneira autônoma, assim como crítica. O
ambiente educacional, enquanto espaço social pode propiciar ações
que levem os sujeitos a refletirem e atuarem criticamente como
indivíduos no contexto ao qual estão inseridos.
Nesse contexto, chegar-se a um consenso sobre que
psicóloga(o) se quer formar para que atenda às principais
118
demandas de nossa população considerando-se a
identidade profissional nacional e as inúmeras e diversas
regionalidades deste país continente, exige o envolvimento
e a participação de todos os agentes envolvidos na formação
profissional (OLIVEIRA, et al, 2017, p. 15).
Vale relembrar que dois dos quatro docentes que
responderam ao questionário discorreram que o curso de Psicologia
não oferece reflexões de maneira aprofundada sobre o conteúdo
abordado nesse estudo e que a matriz curricular precisa contemplar
de maneira mais efetiva o tema em pauta.
O ambiente educacional, enquanto espaço social, deve
promover ações que permitam reflexão e atuação crítica por parte dos
acadêmicos, no desenvolvimento de relações sociais mais justas,
visando a construção de cidadãos ativos e participativos de maneira
autônoma. Vinha (2009), aponta que o docente deve trabalhar no
sentido de propiciar a participação dos estudantes em sala de aula,
oferecendo espaço para o protagonismo dos discentes e estimulando
a atuação ativa dos sujeitos envolvidos nos processos de construção de
vínculos satisfatórios.
Neste caminho, ainda podemos apontar que, muitas vezes,
temas referentes à ética e moral fazem parte, apenas, da disciplina
“Ética Profissional”, ficando o conteúdo demandado de maneira
generalizada e pouco aprofundada.
Em uma pesquisa realizada com acadêmicos de psicologia, foi
observado que:
Parece que os alunos não percebem como a formação
universitária pode contribuir para formar um psicólogo
119
reflexivo e autônomo, porque, em suas experiências na
graduação, não viveram situações de autorregulação, de
avaliação de processo, mas de regulação externa e de
avaliação de resultados. Não clareza na diferenciação
entre moral e ética, e muitos não responderam essa
questão, o que pode significar que não tenham tido esse
nível de reflexão (BATAGLIA; BORTOLANZA, 2012, p.
12).
Sobre o fomento do desenvolvimento moral dos estudantes
pelo curso, um dos docentes aponta que as disciplinas oferecidas
favorecem o desenvolvimento moral dos alunos e a credita que os
acadêmicos não aprendem apenas os conhecimentos técnicos, mas
também consciência a respeito de seus próprios valores no que se
refere ao seu exercício profissional.
Com base na investigação realizada, acreditamos ser possível
sugerir que o curso de psicologia abordado necessita de alterações em
seu currículo e concepção para que, efetivamente, a formação
oferecida possibilite ao profissional ampliar seu campo de atuação,
estando atento às questões éticas, sociais, culturais e políticas.
Entendemos, ainda, que aos poucos as Metodologias Ativas começam
a fazer parte, ainda que timidamente, do curso em questão,
objetivando possibilitar a qualidade na educação, segundo a
concepção dos participantes. O processo de construção da educação
foi influenciado por múltiplas tendências e métodos de ensino. Assim,
percebemos os desafios encontrados no ensino superior no que se
refere às Metodologias Ativas que promovem práticas pedagógica
eficazes, questionando e requalificando metodologias técnicas e
tradicionais, para efetivamente alcançar a formação de um sujeito
120
ativo como um ser ético-moral, histórico, crítico, reflexivo,
humanizado e transformador do espaço onde está inserido.
Para Zaluski e Oliveira (2018), a educação contemporânea
precisa envolver mudanças nos conteúdos e no modo de avaliar, ao
considerar as finalidades do ensino, de acordo com um modelo
centrado na formação integral do estudante. Neste sentido, o docente
deverá ser o promotor de uma prática educacional viva, agradável,
afetuosa, (com precisão científica e conhecimento técnico) e ética,
mas sempre voltada à transformação social. Neste sentido, pesquisas
que abordem os docentes dos cursos de formação superior e suas
concepções se fazem necessárias e se mantêm como cenário próspero
para novas investigações.
Considerações Finais
Refletir sobre a formação em psicologia envolve pensar em
intervenções e formas de construir conhecimento pautadas no diálogo
e relações democráticas para a possibilidade de construção de sujeitos
ativos e participativos na sociedade. Assim como Rechtman, Castelar
e Castro (2013), acreditamos que “a ética deve ser o eixo norteador
da atuação dos profissionais de psicologia (CARNEIRO et al., 2010).
Nesse sentido, a graduação em Psicologia é um momento privilegiado
de construção de sujeitos éticos.” (p.82)
Para tanto, é necessário que essa preocupação esteja presente
desde a concepção inicial do curso, perpassando todo o projeto
político pedagógico, e sendo compartilhada com todos os docentes
que fazem parte do curso. A formação ética não deve e não pode ficar
restrita à uma disciplina, mas precisa estar presente em todas as ações
121
formativas, teóricas e práticas, lembrando que em uma atuação profis-
sional crítica e transformadora, teoria e prática são indissociáveis.
Assim, conhecer as concepções docentes e suas práticas se faz
necessário para o entendimento de como o currículo é posto em ação
nos cursos de formação de psicólogos. A formação continuada desses
profissionais se coloca como uma questão importante e necessária,
uma vez que, para fomentar o desenvolvimento de uma personalidade
ética no outro, é necessário que o sujeito tenha construído a sua
própria autonomia e compreendido a importância de temas como o
respeito mútuo e os direitos humanos que devem ser defendidos,
tendo a dignidade humana como mote.
É fato que a formação ética dos sujeitos não se restringe ao
ambiente acadêmico e suas possibilidades, mas as interações
proporcionadas por e neste cus se colocam como potencialmente
importantes para o desenvolvimento de personalidades éticas, desde
que sejam pautadas na cooperação e no respeito mútuo.
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126
127
6.
Disciplina de Ética e Moral:
Análise das Matrizes Curriculares do
Curso de Pedagogia em Três Universidades
Públicas do Estado de São Paulo
Beatriz Ribeiro Peixoto
O capítulo tem como objetivo analisar a matriz curricular dos
três cursos de pedagogia, de universidades públicas renomadas
localizadas no estado de São Paulo, sendo estas: UFSCAR (campus
São Carlos), UNESP (campus Bauru) e USP (campus Ribeiro Preto).
Compreendendo se presença da disciplina de ética e moral para o
pedagogo e as contribuições desta disciplina na atuação profissional.
Comparar as matrizes, observando as congruências e diferenças, e se
alguma outra disciplina que sinalize a presença da ética e moral em
seu conteúdo ofertado.
Curso de Pedagogia no Brasil e a Ética
O curso de pedagogia surgiu no Brasil em um momento de
grandes mudanças políticas, na década de 30. O mercado de trabalho
começou a exigir uma maior preparação e estudo dos trabalhadores e
neste mesmo contexto os educadores começaram a pautar que a
https://doi.org/10.36311/2023.978-65-5954-397-7.p127-150
128
educação devia ser universalizada. Grupos de intelectuais, criaram
então o Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova.
[...]deixa de constituir um privilégio determinado pela
condição econômica e social do indivíduo, para assumir
um “caráter biológico”, com que ela se organiza para a
coletividade em geral, reconhecendo a todo o indivíduo o
direito a ser educado até onde o permitam as suas apties
naturais, independente de razões de ordem econômica e
social. A educação nova, alargando a sua finalidade para
além dos limites das classes, assume […] a sua verdadeira
função social, preparando-se para formar “a hierarquia
democrática” pela “hierarquia das capacidades”, recrutadas
em todos os grupos sociais, a que se abrem as mesmas
oportunidades de educação. (AZEVEDO, 1932).
A partir daí a ideia de Universidade se tornou mais palpável e
foi ganhando força. Os intelectuais tinham como reivindicação
“métodos de uma pedagogia que viabilizasse, no meio escolar, a
realização das máximas organizadoras exigidas pelo trabalho
industrial.” (SHIROMA; MORAES; EVANGELISTA, 2007, p. 19).
Deste modo, no de 1934, a Universidade de São Paulo foi criada.
Em 1939, foi criado o Decreto 190 de 4 de abril, utilizado
nos cursos de licenciaturas e no curso de pedagogia. Consistia em três
anos de estudo dos conteúdos cognitivos ou das disciplinas
específicas, o curso de bacharelado, e um ano de conteúdos didáticos,
o curso de didática.
No período da ditadura militar (início nos anos 1960), foi um
momento da história do Brasil marcada pelo tecnicismo e a
129
necessidade de se formar trabalhadores para o mercado. Entre eles os
profissionais da educação, atendendo ao momento de desenvolvi-
mento do país, visando incentivar a economia do país, sendo essa
etapa caracterizada segundo BRZEZINSKI, 1996, p. 58“[...] a etapa
do capitalismo brasileiro dedicada aos investimentos em educação
alicerçados no ideário tecnicista”, ou seja, os currículos também eram
afetados por estas interferências e ideais.
Apesar da criação do curso em meados do século XX, a
obrigatoriedade do ensino superior para o professor, surgiu na LDB
9394/96, segue o artigo 62:
Art. 62. A formação de docentes para atuar na educação
básica far-seem vel superior, em curso de licenciatura
plena, admitida, como formação mínima para o exercício
do magistério na educação infantil e nos cinco primeiros
anos do ensino fundamental, a oferecida em nível médio,
na modalidade normal. (Redação dada pela lei 13.415,
de 2017)
§ A União, o Distrito Federal, os Estados e os
Municípios, em regime de colaboração, deverão promover
a formação inicial, a continuada e a capacitação dos
profissionais de magistério. (Incluído pela Lei 12.056,
de 2009).
§ A formação continuada e a capacitação dos
profissionais de magistério poderão utilizar recursos e
tecnologias de educação a distância. (Incluído pela Lei
12.056, de 2009).
§ A formação inicial de profissionais de magistério dará
preferência ao ensino presencial, subsidiariamente fazendo
130
uso de recursos e tecnologias de educação a distância.
(Incluído pela Lei 12.056, de 2009).
§ A União, o Distrito Federal, os Estados e os
Municípios adotarão mecanismos facilitadores de acesso e
permanência em cursos de formação de docentes em nível
superior para atuar na educação básica pública. (Incluído
pela Lei 12.796, de 2013)
§ A União, o Distrito Federal, os Estados e os
Municípios incentivarão a formação de profissionais do
magistério para atuar na educação básica pública mediante
programa institucional de bolsa de iniciação à docência a
estudantes matriculados em cursos de licenciatura, de
graduação plena, nas instituições de educação superior.
(Incluído pela Lei 12.796, de 2013)
§ O Ministério da Educação poderá estabelecer nota
mínima em exame nacional aplicado aos concluintes do
ensino médio como pré-requisito para o ingresso em cursos
de graduação para formação de docentes, ouvido o
Conselho Nacional de Educação - CNE. (Incluído pela Lei
12.796, de 2013).
Retomando o Decreto-Lei 1.190 de 4 de abril de 1939, o
mesmo decretava que o curso de pedagogia fora criado com o objetivo
de Art.º 51c: “preenchimento dos cargos técnicos de educação do
Ministério da Educação A carga horária de aulas, era dividida na
seguinte forma:
Art. 19 O curso de pedagogia será de três anos e terá a
seguinte seriação de disciplinas: Primeira série 1.
Complementos de matemática. 2. História da filosofia. 3.
131
Sociologia. 4. Fundamentos biológicos da educação. 5.
Psicologia educacional.
Segunda série 1. Estatística educacional. 2. História da
educação. 3. Fundamentos sociológicos da educação. 4.
Psicologia educacional. 5. Administração escolar. Terceira
série 1. História da educação. 2. Psicologia educacional. 3.
Administração escolar. 4. Educação comparada. 5.
Filosofia da educação [...]
Art. 20 O curso de didática será de um ano e constituir-
sedas seguintes disciplinas: 1. Didática geral. 2. Didática
especial. 3. Psicologia educacional. 4. Administração
escolar. 5. Fundamentos biológicos da educação. 6.
Fundamentos sociológicos da educação.
Observa-se que a carga horaria descrita acima, contempla
várias vertentes da educação, mas nenhuma aparece a nomenclatura
“ÉTICA E/OU MORAL”. Não é possível afirmar, se algumas
matérias lidassem com algumas dessas questões em segundo plano ou
intrinsecamente. Mas de forma principal ou objetiva, não fica claro.
Além que na criação do curso, uma vasta quantidade de
disciplinas, incluindo parte de psicologia e biológicas. Mas em
nenhum momento fala-se sobre a parte de ética e moral em sala de
aula. Será que 80 anos depois de sua criação das matrizes curriculares
sofreram grandes modificações? O intuito deste capítulo é analisar as
matrizes curriculares, dos três cursos de pedagogia em universidades
públicas localizadas no estado de São Paulo.
Analisando se a parte da ética e a moral faz presente no
currículo do futuro professor recém-formado e as contribuições que
podem trazer no dia a dia do educador e educando em sala de aula.
132
Ética e Moral na Educação
Ética surgiu do grego ethosque pode ser traduzido como
modo de ser, ou grupo de princípios que norteiam o modo de agir do
homem em convivência em meio social, assegurando assim a
qualidade de vida social. Segundo Caetano e Silva (2009) Entende-se
dizer que a ética gira em torno de princípios e valores, orientando a
ação do estabelecimento de regras para o bem.
Segundo Laissone, ele descreve a ética como:
“A ética, partindo do seu étimo, pode ser entendida como
o abrigo que confere proteção e segurança aos indivíduos
(cidadãos), aqueles responsáveis pelos destinos da polis
(cidade). Ela é, por um lado o produto das leis erigidas
Página | 163 pelos costumes, e, por outro, das virtudes e
hábitos gerados pelo carácter dos indivíduos. Por isso a
ética não diz respeito aos costumes culturais ou sociais,
mas também se refere ao perfil, a maneira de ser e a forma
de vida adquirida ou conquistada pelo homem. A ética
imprime o carácter da pessoa: mostra-me como te
comportas e eu te direi o grau de tua ética (LAISSONE,
2017, p. 5).”
A ética se encontra no campo dos princípios morais e dos
valores que norteiam os homens no modo de agir, tomando de
referência outros indivíduos sociedades distintas. Desta forma sendo
uma construção histórico social, a ética permeia a consciência
humana à medida que “[ sustenta e dirige as ações do homem,
norteando a conduta individual e social […] e define o que é a
133
virtude, o bem ou o mal, o certo ou o errado, permitindo ou
proibindo, para cada cultura e sociedade.” (SOUZA, 1995, p. 187)
A moral segundo Bataglia (2014) que cita os estudos de
Lawrence Kohlberg, a mesma explica que ele dirigiu seus estudos
baseado na vertente piagetiana, no desenvolvimento do indivíduo em
relação com o meio. Bataglia (2014) segue dissertando que para
Kohlberg a estrutura da moral é construída nas interações com o
ambiente, no qual ocorre em estágios hierárquicos:
“Kohlberg define três níveis de desenvolvimento moral,
cada qual contendo dois estágios. Tais níveis e estágios
obedecem a uma sequência invariável, isto é, uma pessoa
persegue, passo a passo, cada nível e cada estágio de
desenvolvimento moral, em velocidades que, estas sim,
variam de cultura para cultura e de indivíduo para
indivíduo.” (BATAGLIA, p.25)
Segundo Bataglia (2014), Kohlberg explica que o
desenvolvimento da moral é construído por níveis: pré-convencional,
convencional e pós convencional. Sendo o primeiro ocorrendo até os
9 anos, no qual os mesmos compreendem o que é obediência e
punição /hedonismo instrumental relativista:
1-Obediência e punição: As justificativas para agir ou não
de determinado modo ou para diferenciar o certo do errado
são a obediência do fraco em relação ao forte e a punição
pelo forte aos desviantes.
134
2- Hedonismo instrumental relativista: A ação é dirigida
em termos de desejo de ma recompensa ou benefício.
(BATAGLIA, P.26,2014)
Neste ponto se observa que a criança, começa a
compreender e vivência o que é moral, e ele encontra-se na escola,
momento de desenvolvimento em todas as áreas, inclusive em seu
papel social e como se portar perante os outros. Deste modo fica
inimaginável, que o pedagogo não tenha uma base, para que saiba
lidar com estas temáticas com seus alunos. A autora Sève (1999)
explica que o trabalho da educação deve promover, desde bem
pequeno, o intercâmbio pluralista dos pontos de vista e dos
argumentos, uma formação para a democracia participativa:
desenvolver com os alunos, através de atividades mono e
multidisciplinares, a sensibilização para os problemas e
exigências, a apropriação de conhecimentos e ideias, a
experiência frequente do intercâmbio de pontos de vista e
de argumentos, sem o que não se pode chegar a uma
maneira rica culturalmente de ser formar uma opinião
pessoal (SÈVE, 1999, p. 147).
Bataglia (2014) continua a explicar sobre a técnica
desenvolvida por Kohlberg denominada “discussão de dilemas
morais” para lidar com jovens em formação. No qual os indivíduos
têm a oportunidade de experimentar conflitos morais cognitivos, que
além do senso comum para desenvolver juízos superiores
alcançados. Neste ponto, podemos voltar ao universo das
universidades e do curso de pedagogia.
135
Ainda que haja muitas mudanças no tipo de ensino ofertado,
o lado que foca apenas em matérias científicas, sem aprofundamento
humano e em diversas questões que nos rodeiam, como se estes
âmbitos não fossem interligados, como se um não dependesse do
outro. Infelizmente ainda no ensino superior, percebemos essa
constância do ensino tradicional, sem aprofundamento de
ensinamentos indispensáveis, como ética e moral.
Método
Trata-se de uma pesquisa bibliográfica e descritiva, que tem
por objetivo analisar, as matrizes curriculares dos três cursos de
pedagogia em universidades públicas no Estado de São Paulo. Como
a disciplina de ética e moral é introduzida e se não ocorre, o porquê
deste fenômeno ainda acontecer. Através da utilização de artigos,
livros e pesquisa em diversas plataformas disponíveis. A pesquisa
bibliográfica está enquadrada principalmente no meio acadêmico e
tem a finalidade de melhoramento e o progresso do conhecimento,
através de uma investigação científica de obras publicadas. Segundo
Fonseca (2002):
[...] a partir do levantamento de referências teóricas
analisadas, e publicadas por meios escritos e eletrônicos,
como livros, artigos científicos, páginas de web sites.
Qualquer trabalho científico inicia-se com uma pesquisa
bibliográfica, que permite ao pesquisador conhecer o que
se estudou sobre o assunto. Existem, porém, pesquisas
científicas que se baseiam unicamente na pesquisa
bibliográfica, procurando referências teóricas publicadas
136
com o objetivo de recolher informações ou conhecimentos
prévios sobre o problema a respeito do qual se procura a
resposta (FONSECA, 2002, p. 32).
Esse tipo de pesquisa, segundo Selltiz et al. (1965), busca
descrever um fenômeno ou situação em detalhe, especialmente o que
está ocorrendo, permitindo abranger, com exatidão, as características
de um indivíduo, uma situação, ou um grupo, bem como desvendar
a relação entre os eventos. Podendo atrelar o fenômeno da relação do
educador e educando, da importância do oferecimento de disciplinas
que abrangem um valor total do cidadão e como ele se comporta com
o mundo.
As plataformas utilizadas para a pesquisa bibliográfica: Scielo,
utilizando o descritor “ÉTICA E MORAL”, com 1002 resultados.
“ÉTICA E ENSINO com 452 resultados e “ÉTICA E ENSINO
SUPERIOR com 88 resultados. No portal Capes, utilizando descritor
“ÉTICA E ENSINO SUPERIOR” com 11.552 resultado e “ÉTICA
E PEDAGOGIA “com 11.218 resultados.
Resultados e Discussões
Utilizei a matriz curricular, dos três cursos de pedagogia em
universidades públicas com polos no Estado de São Paulo, sendo estas
UFSCAR (campus São Carlos), UNESP (campus Bauru) e USP
(campus Ribeiro Preto). Primeiramente analisei todas as três e separei
em tabelas individualizadas, o Ano, Semestre e a disciplina que
possuía “ÉTICA” e/ou “MORAL” na nomenclatura. Abaixo segue a
matriz curricular completa dos três cursos:
137
Quadro 1 - Matriz Curricular Unesp Bauru
Fonte: https://www.fc.unesp.br/Home/Cursos/Pedagogia/grade_atual.pdf
Acesso em: 22 nov. 2021.
138
Quadro 2 - Matriz Curricular USP
139
Continuação
140
Continuação
Fonte: www.uspdigital.usp.br/jupiterweb/listarGradeCurricular.
Acesso em: 22 nov. 2021.
141
Quadro 3 – Matriz Curricular- UFSCAR
142
Continuação
143
Continuação
Fonte: https://www.pedagogia.ufscar.br/arquivos/matriz-curricular-matutino-
2018.pdf. Acesso em: 22 nov. 2021.
144
Quadro 4 – Unesp - Bauru
Fonte: organização própria.
Analisando as três matrizes curriculares, observei que apenas
a Unesp polo Bauru, possui uma disciplina que deixa claro do que
se trata: “Ética e profissionalização docente”. No site do Polo Unesp
Bauru é possível ter acesso a descrição completa que descreve como
objetivo:
(Ao término da disciplina o aluno deverá ser capaz de:)
Promover uma reflexão filosófica sobre as relações entre
moral e ética; Demonstrar que a ética acontece num
espaço social, numa coletividade inseparável da divisão
social do trabalho; Evidenciar alguns parâmetros
filosóficos da Ética na Filosofia OcidentalRefletir sobre
a profissionalização docente e a ética da responsabilidade.
(UNESP, 2020, p. 1)
Nesta descrição de objetivos, é exposto, tudo que citamos
anteriormente. Do papel do professor como ator de mudança e
colaborador na propagação da ética e moral em espaços sociais de
coletividade. Freire (2018, p.18) explica que “O preparo científico do
professor, deve coincidir com sua retidão ética”, ou seja, é impossível
apenas reter um sem a presença do outro, porque o professor tem uma
importância e um peso muito grande no desenvolvimento do seu
discente. Em outro trecho Freire (2018, p;18) diz “Formação
145
cientifica, correção ética, respeito aos outros, coerência, capacidade de
viver e de aprender com o diferente”.
Isso mostra que, a visão do pedagogo como profissional não é
compreendida de forma global, sendo que todas as esferas de uma
profissão, são indispensáveis a um profissional de qualidade.
Ao acessar o Projeto Pedagógico do curso de Pedagogia da
Unesp (2006), é pontuado logo na segunda página o trecho a seguir:
Entendemos que à universidade blica cabe papel
essencial no enfrentamento das complexas demandas
postas para a formação dos profissionais da educação, uma
vez que, dada a crescente participação da iniciativa privada
no ensino superior e as diferentes modalidades formativas
recentemente criadas, as instituições públicas oficiais têm a
responsabilidade de atuar como modelo e referencial de
excelência nesse nível de escolarização. As universidades
públicas, por manterem a pesquisa, a inovação e a análise
crítica como bases do ensino, devem apresentar respostas
qualificadas para os desafios apresentados pelo contexto
brasileiro e, mais especificamente, paulista, para a
formação dos profissionais da educação. (UNESP, 2006,
p. 2)
Neste trecho, fica muito claro, da maneira que é vista a
Universidade Pública, sendo uma referência em aprestar profissionais
em todas as esferas, principalmente em um contexto neoliberal que
estamos inseridos:
146
A organização curricular aqui proposta pretende realizar
uma formação de alto nível qualitativo do pedagogo,
entendido aqui, como um profissional capaz de desem-
penhar a função básica da docência nos anos iniciais do
Ensino Fundamental e Educação Infantil, bem como um
profissional capaz de compreender e atuar em unidades
escolares, exercendo funções ou desenvolvendo atividades
próprias da coordenação de áreas, temas ou projetos; gestão
e planejamento de ações, projetos ou atividades e
realizando orientação de alunos com vistas ao seu
desenvolvimento e aproveitamento escolares. Entende-se
que esta formação profissional deva estar vinculada às
demandas próprias do ensino escolarizado com todas as
suas características e dificuldades. (UNESP, 2006, p. 9)
Ou seja, a universidade tem o papel de formar profissionais
integralmente, que possam e estejam preparados para trabalhar em
diversas áreas dentro do ambiente escolar.
Conclusão
Na resolução do Conselho Nacional da Educação nº1 de
2006, está presente as Diretrizes curriculares do curso de pedagogia
disponibilizadas pelo MEC, no qual as Universidades devem se pautar
na criação de seus currículos:
Art. As Diretrizes Curriculares para o curso de
Pedagogia aplicam-se à formação inicial para o exercício da
docência na Educação Infantil e nos anos iniciais do
Ensino Fundamental, nos cursos de Ensino Médio, na
147
modalidade Normal, e em cursos de Educação Profissional
na área de serviços e apoio escolar, bem como em outras
áreas nas quais sejam previstos conhecimentos peda-
gicos. § Compreende-se a docência como ão educativa
e processo pedagógico metódico e intencional, construído
em relações sociais, étnico-raciais e produtivas, as quais
influenciam conceitos, princípios e objetivos da Pedagogia,
desenvolvendo-se na articulação entre conhecimentos
científicos e culturais, valores éticos e estéticos inerentes a
processos de aprendizagem, de socialização e de construção
do conhecimento, no âmbito do diálogo entre diferentes
visões de mundo. (RESOLUÇÃO CNE/CP, P. 1, 2006)
Neste art 2º, observarmos que na formação do professor é
necessário, que haja uma articulação em conhecimento cientifico e
valores éticos e culturais, Gatti (1997) tem uma constatação muito
válida que a teoria e a prática se constituem uma unidade, sendo toda
teoria originária da prática social humana e que nesta estão velados os
pressupostos teóricos, logo, a teoria e a prática possuem uma conexão
circular, interdependentes, e ao percebermos este movimento e
colocá-lo na concepção da formação de professores, poderíamos ter
um processo mais integrador.
No ano de 2019, a resolução 2 de 20 de dezembro de 2019
apresenta Diretrizes Curriculares Nacionais para a Formação Inicial
de Professores para a Educação Básica e institui a Base Nacional
Comum para a Formação Inicial de Professores da Educação Básica
(BNC-Formação). No capítulo II, no qual intitula-se “Dos
fundamentos e da política da formação docente” em nenhum
momento utiliza-se o termo “ÉTICA E MORAL”, mas fica claro a
148
importância de uma aprendizagem global, noinciso, no art.
o seguinte excerto “I - a sólida formação básica, com conhecimento
dos fundamentos científicos e sociais de suas competências de
trabalho”. Ou seja, os valores sociais andam em consonância com o
científico, sendo fundamentos indispensáveis ao profissional docente.
É por isto que é primordial que todas as lacunas sejam
preenchidas no processo de formação do professor, porém
percebemos que muitas áreas, como disciplinas essenciais para uma
formação completa, no caso, ÉTICA E MORAL, são deixadas em
segundo plano.
Referências
AZEVEDO, F et al. Manifesto dos pioneiros da educação nova
(1932). Disponível em: Inep 80 anos - Manifesto dos Pioneiros da
Educação Nova - 1932. Acesso em 17 de outubro de 2021
BRASIL. Decreto-lei 1190/39. Dá organização à Faculdade de
Filosofia. Disponível em: Acesso em: 17 de outubro de 2021.
BRASIL. MEC. Resolução Conselho Nacional da Educação
Conselho Pleno, nº1 de 15 de maio de 2006. Disponível em:
http://portal.mec.gov.br/cne/arquivos/pdf/rcp01_06.pdf. Acesso em
23 de novembro de 2021
BRASIL. MEC. Resolução Conselho Nacional da Educação
Conselho Pleno, nº2 de 20 de maio de 2019. Disponível em http:
//portal.mec.gov.br/docman/dezembro-2019-pdf/135951-rcp002-
19/. Acesso em 13 de novembro de 2022.
149
BRASIL. Mec. LDB Leis de Diretrizes e Bases. Lei 9.394.
1996.
BATAGLIA, P. Esses adolescentes de hoje. cap.4, Editora Adones,
2014, p.23 - 30.
BRZEZINSKI, I. Pedagogia, pedagogos e formão de professores.
Campinas: Papirus, 1996.
CAETANO, A. SILVA, M. Ética profissional e Formação de
Professores. 2009.
FREIRE, P. Pedagogia do oprimido. 8. ed. Rio de Janeiro: Paz e
Terra, 1980.
FONSECA, J. J. S. Metodologia da pesquisa científica. Fortaleza:
UEC, 2002. Apostila
GATTI, B. Formação de professores e carreira: problemas e
movimentos de renovação. Campinas, SP: Editora Autores, 1997.
LAISSONE, Padre Elton João C.; AUGUSTO, Padre Jorge;
MATIMBIRI, Padre Luís Alberto; Manual de Ética Geral.
Universidade Católica de Moçambique, Beira, 2017, p. 5, 7
SÈVE, L. Entendimento em ética: atos de linguagem e linguagem
dos atos. In: CHANGEUX, J. (Org.). Uma ética para quantos? São
Paulo: EDUSC, 1999.
SOUZA, S. Um outro olhar: filosofia. São Paulo: FTD, 1995.
150
UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA. Projeto Pedagógico
do curso de Pedagogia. São Paulo, 2006. Disponível em
:>https://www.fclar.unesp.br/Home/Graduacao/PPP%20PEDAGO
GIA.pdf. Acesso em 23 de novembro de 2021.
151
7.
As Metodologias Ativas no Ensino Superior
e o Papel do Professor: Desafios e Possibilidades
no Ensino Presencial
Priscila Caroline Miguel
Introdução
Certa vez ouvi de um professor, experiente em sua área, a
seguinte frase: “O outro não é objeto de ensino, mas sim sujeito de
aprendizagem”; isso ecoou dentro de mim e me fez pensar: o que esse
mestre quis dizer? Que tipo de educandos queremos formar? Qual
metodologia de ensino deve ser adotada face ao sujeito que desejamos
formar?
Mediante algumas reflexões, cheguei à seguinte conclusão:
não para se trabalhar dentro da sala de aula do mesmo jeito, porque
os alunos não aprendem do mesmo modo, ao mesmo tempo e
também porque as inovações teóricas e avanços na práxis pedagógica
motivaram críticas a modelos centrados no professor e na sua
comunicação unilateral com o aluno.
Vários autores têm se debruçado sobre questionamentos dessa
natureza. Para Assunção (2021), a aula expositiva, ainda é uma
tradição no ensino superior que se mantém seja pela ideia de que é a
forma mais eficaz de transmitir conhecimentos complexos ou pela
https://doi.org/10.36311/2023.978-65-5954-397-7.p151-176
152
crença de que esse seria o método mais proveitoso para a memorização
pelos alunos.
Considerando que a geração de educandos de hoje nasceu nos
anos 1990 e foi educada em ambientes digitais; está acostumada a
obter informações de múltiplos emissores em um mesmo instante.
São os chamados nativos digitais e de comportamento multitarefa,
como bem observa Assunção (2021, p. 2): “[...] essa geração é capaz
de interligar vários pontos quando aborda um problema, de modo a
adotar um comportamento multitarefa [...]”. Se compararmos a
geração de hoje a de seus professores, veremos que os alunos dos
tempos atuais vivenciam desconforto quando expostos a uma única
fonte de informação, ainda mais se tratando de uma exposição
prolongada.
Fava (2016) na sua obra Educação para o século XXI: a era do
indivíduo digital, nos provoca em relação à educação atual, indicando
que urge repensar a forma de educação oferecida e de compartilhar
conhecimentos, pois vivemos em um novo tempo. Segundo o autor:
Nesse cenário não é suficiente considerar mutações
incrementais no processo de ensino e aprendizagem
tradicional. Faz-se mister uma ruptura. O velho modelo de
sala de aula notoriamente não atende às novas
necessidades. Trata-se de um modelo de aprendizagem
essencialmente passivo, ao passo que o mundo requer um
processamento, acionamento de informações mais célere,
ativo. O mundo de enfileirar estudantes com currículos
lineares, torcendo para que granjeiem algo ao longo do
verboso caminho. Não é inquestionável se esse foi o melhor
153
modelo 100 anos atrás; se era, indubitavelmente não é
mais. (FAVA, 2016, p.298).
O aluno dos tempos atuais requer para si ser sujeito de sua
aprendizagem (daí a máxima da fala que ouvi do professor, ainda que
de maneira informal e compartilhei logo no início do texto). É
objetivo do presente estudo discutir então o fato de que com as
metodologias ativas, uma mudança no papel do professor no
Ensino Superior, pois ele deixa de assumir o perfil de um professor
conteudista e tradicional para uma postura de mediador no processo
ensino-aprendizagem de seus estudantes. Sendo assim, qual é
realmente o papel desse educador e quais são os desafios e
possibilidades na sua atuação? São essas questões que nortearam o
texto.
Jean Piaget (1896-1980), epistemólogo suíço, em sua obra
“Psicologia e Pedagogia” de 1972, assume que é preciso uma escola
ativa, ou seja, de métodos ativos, na qual a educação baseada nessa
metodologia não leva a um individualismo anárquico, mas deve ser
uma combinação de trabalho individual e do trabalho por equipes,
visando a uma educação da autodisciplina e do esforço voluntário. O
autor considera que os métodos ativos são mais difíceis de serem
empregados se comparados aos métodos receptivos correntes por
exigirem, de um lado, do professor um trabalho bem mais
diferenciado e bem mais ativo, e por outro lado, os métodos ativos
são mais difíceis porque implicam também em uma formação
diferenciada. Vemos então que não é atual a discussão de que as
instituições escolares tradicionais não dão conta do perfil do
154
estudante que nelas frequentam. É fato que é preciso repensar as
metodologias, se quisermos atender a contento essas novas gerações.
[...] os professores desempenham um importante papel na
produção e estruturação do conhecimento pedagógico
porque refletem, de uma forma situada, na e sobre a
interação que se gera entre o conhecimento científico [...]
e a sua aquisição pelo aluno, refletem na e sobre a interação
entre a pessoa do professor e a pessoa do aluno, entre a
instituição escola e a sociedade em geral. Dessa forma, têm
um papel ativo na educação e não um papel meramente
técnico que se reduza à execução de normas e receitas ou à
aplicação de teorias exteriores à sua própria comunidade
profissional. (ALARCÃO, 2005, p.176).
As instituições escolares, inclusive no Ensino Superior,
mesmo em uma sociedade que é tida como sociedade da informação
e do conhecimento, ainda apresentam resquícios do modelo
tradicional de ensino: cadeiras enfileiradas, silêncio, predomínio do
uso da lousa e do giz, reprodução de conteúdos a serem memorizados
pelos estudantes, aulas expositivas, e a relação professor e aluno,
acontece de modo verticalizado, na qual o professor é quem detém o
conhecimento e o aluno o sujeito passivo, que os memoriza e os repete
na hora das avaliações. Corroboramos com Lázaro; Sato e Tezani
(2018, p.2) quando afirmam: “essa estrutura organizacional de ensino
acaba sendo incompatível com as demandas atuais”.
Moran (2009) aponta que poucas transformações
aconteceram na educação, isto é, o cenário ainda é o mesmo de anos
anteriores e quiçá de séculos passados, que tanto as escolas bem
155
como as universidades, empregam o uso de tecnologias, por exemplo,
de maneira tradicional, apenas com o objetivo de transmissão de
conteúdos ao invés de utilizá-las para a pesquisa e interação. Aqui faço
um adendo: a simples exibição de slides não se configura em uma
metodologia ativa, mas sim em um recurso tecnológico que facilita a
exposição por parte do educador.
Se o que desejamos é um maior envolvimento dos alunos nas
aulas, faz-se necessário repetir que a educação escolar precisa
modificar a sua forma de ensinar, utilizando-se de metodologias
ativas, como por exemplo, a aprendizagem baseada em problemas e
em projetos, a sala de aula invertida e o ensino híbrido. Enfim, é
preciso uma transposição didática.
Sendo assim, almejamos a formação de um cidadão
autônomo, reflexivo, ético e comprometido com o bem comum e
desta forma, o texto está organizado em três seções. Na primeira
seção, apresentamos os embasamentos teóricos que o fundamentaram
por se tratar de um levantamento bibliográfico, no que tange a novas
configurações de ensinar e aprender, na segunda temos a discussão de
desafios e possibilidades no uso de metodologias ativas no ensino
superior e na terceira e última seção a apresentação de algumas
reflexões no que se refere ao papel do professor que diante de
demandas atuais, precisa ressignificar a sua atuação.
Novas configurações de ensinar e aprender:
o uso de metodologias ativas
Para Moran (2018), desde que nascemos, estamos em
constante aprendizado: aprendemos a partir de situações concretas,
156
que paulatinamente conseguimos ampliar e generalizar (processo
indutivo), e aprendemos também a partir de ideias ou teorias que
testamos depois na realidade concreta, a partir de demonstrações e
generalizações (processo dedutivo), “[...] não apenas para nos
adaptarmos à realidade, mas, sobretudo, para transformar, para nela
intervir, recriando-a [...]” (FREIRE, 1996, p.28).
A rigor, o método dedutivo envolve formulações a partir do
que é geral e amplo para chegar ao particular e específico,
estabelecendo princípios e deduzindo novos axiomas. De outro lado,
o método indutivo parte dos sentidos e do particular para estabelecer
os axiomas, buscando progressivamente as formulações mais gerais.
De todo modo, em ambos a mediação pedagógica é elemento central
no encadeamento lógico a ser desenvolvido para a construção de
conhecimento. Efetivamente, aprender exige produção de sentidos e
negociação de significados. Este parece ser o grande dilema a ser
resolvido para a atuação docente significativa.
Aprendemos também quando alguém mais experiente nos
fala e quando fazemos descobertas a partir de um envolvimento mais
direto, através de questionamentos e experimentação (por meio de
perguntas, pesquisas, atividades, projetos). As metodologias
predominantes no ensino são as dedutivas, pois o professor transmite
primeiro a teoria e depois o aluno deve aplicá-la a situações mais
específicas (MORAN, 2018).
O que constatamos, cada vez mais, é que a aprendizagem
por meio da transmissão é importante, mas a aprendizagem
por questionamento e experimentação é mais relevante
para uma compreensão mais ampla e profunda. Nos
157
últimos anos, tem havido uma ênfase em combinar
metodologias ativas em contextos bridos, que unam as
vantagens das metodologias indutivas e das metodologias
dedutivas. Os modelos bridos procuram equilibrar a
experimentação com a dedução, invertendo a ordem
tradicional: experimentamos, entendemos a teoria e
voltamos para a realidade (indução-dedução, com apoio
docente) (MORAN, 2018, p.2).
Independente de qual seja a abordagem teórica do professor,
é fato que aprendemos o que nos interessa, o que está próximo do
estágio de desenvolvimento em que nos encontramos e o que é de
certa forma significativo e relevante. Daí cabe a nós questionarmos o
modelo escolar de transmissão e avaliação uniforme de informação,
considerando que não aprendemos da mesma forma, no mesmo
momento e os mesmos conteúdos.
A aprendizagem mais profunda requer espaços onde se possa
colocar em prática o que estamos aprendendo e ambientes ricos de
oportunidades. Para tanto, enfatizamos novamente a necessidade de
se repensar as práticas docentes, e mais do que isso, repensar as
formações iniciais e continuadas dos profissionais que atuam no
Ensino Superior.
Retomando como aporte teórico as contribuições de Piaget
(2014 [1954]), trazemos a ideia de que as relações entre a afetividade
e a inteligência, se referem ao fato de que elas são inseparáveis
(indissociáveis) e podemos dizer que a afetividade interfere nas
operações da inteligência, estimulando-as ou perturbando-as, causa
esta de acelerações ou retardos no desenvolvimento intelectual. É
incontestável que a afetividade atua como acelerador ou perturbador
158
das operações da inteligência e um exemplo disso é que um aluno
motivado em aula terá mais entusiasmo para estudar e
consequentemente, aprende com mais facilidade.
Piaget (2014 [1954]) entende a afetividade como os
sentimentos propriamente ditos e, em especial, as emoções; as diversas
tendências, incluindo as “tendências superiores” e, em particular, a
vontade. Faz-se necessário distinguir as funções cognitivas, que vão
da percepção e das funções sensório-motoras até a inteligência
abstrata com as operações formais das funções afetivas. Essa divisão é
apenas para fins didáticos, pois na conduta concreta do indivíduo,
elas são indissociáveis. Piaget (2014 [1954], p. 39) afirma que: “é
impossível encontrar condutas procedentes somente da afetividade
sem elementos cognitivos e vice-versa”.
De acordo com a teoria piagetiana, não mecanismo
cognitivo sem elementos afetivos, mesmo nas formas mais abstratas
da inteligência, podendo citar como exemplo um aluno que quando
resolve um problema de álgebra, no início um interesse intrínseco
ou extrínseco, uma necessidade e ao longo do trabalho, podem
intervir estados de prazer, de decepção, de ardor, sentimentos
de fadiga, de esforço, de desânimo etc.
É importante esclarecer que não existe também um estado
afetivo puro, sem elementos cognitivos, pois de acordo com Piaget
(2014 [1954]) os fatores cognitivos desempenham um papel
fundamental nos sentimentos primários e nos sentimentos complexos
mais evoluídos, onde são mesclados cada vez mais com os elementos
gerados pela inteligência. De forma sintetizada, podemos afirmar que
nunca se encontra estado afetivo sem elementos cognitivos, nem o
contrário. A afetividade desempenha então, o papel de uma fonte
159
energética, da qual dependeria o funcionamento da inteligência, mas
não suas estruturas; assim como o funcionamento de um automóvel,
que ao acionar o motor, não modifica a estrutura da máquina.
Conforme Piaget (2014 [1954]) se a afetividade pode ser
causa de condutas, se ela intervém sem cessar no funcionamento da
inteligência, se ela pode ser causa de acelerações ou atrasos no
desenvolvimento intelectual, “ela não gera estruturas cognitivas e não
modifica as estruturas no funcionamento das quais intervém (p.43).
Podemos perceber então o papel que a afetividade desempenha no
funcionamento da inteligência e agora abordaremos um pouco as
metodologias ativas.
Utilizaremos então no presente texto a seguinte definição de
metodologias ativas:
Metodologias ativas são estratégias de ensino centradas na
participação efetiva dos estudantes na construção do
processo de aprendizagem, de forma flexível, interligada e
híbrida. As metodologias ativas, num mundo conectado e
digital, expressam-se por meio de modelos de ensino
híbridos, com muitas possíveis combinações. A junção de
metodologias ativas com modelos flexíveis e híbridos traz
contribuições importantes para o desenho de soluções
atuais para os aprendizes de hoje (MORAN, 2018, p.4).
Fazendo um paralelo com o ensino tradicional, no qual o
professor domina a classe no ensejo de apresentar um conteúdo que
será “absorvido” pelo aluno que o observa e escuta, as metodologias
ativas possuem um modelo centrado no aluno, que é estimulado a
160
investigar e interagir com o conteúdo, deixando de lado sua postura
passiva.
Assunção (2021) salienta que as estratégias de aprendizagem
ativa são capazes de ampliar oportunidades de engajamento dos
alunos em seu próprio aprendizado, pois estimulam a autorreflexão
em colaboração com os colegas, o professor e outros atores no
ambiente de aprendizagem. O ato de estimular o aluno a pensar sobre
o conteúdo e sobre a atividade é um método para o desenvolvimento
de habilidades de resolução de problemas e experiências de
enfrentamento às dificuldades que surgem no decorrer do processo.
Para os estudiosos da área, as Tecnologias Digitais da
Informação e Comunicação (TDIC) são recursos que podem
contribuir para a introdução de práticas inovadoras na educação. A
Internet tão presente em nossas vidas atualmente, permite ao usuário
realizar cursos e pesquisas, acessar inúmeros materiais, conectar-se
com diferentes pessoas em qualquer lugar do mundo, assistir e
produzir conteúdos para plataformas virtuais, como o YouTube, por
exemplo. Embora, esse não seja o nosso objeto de estudo, vale lembrar
do quanto ela está sendo útil nesses períodos pandêmicos.
O vínculo entre os mundos, físico e virtual, aproxima as
instituições de ensino superior do cenário que estamos inseridos a
era digital, que não pode e não deve ser desconsiderada pela educação.
Para tanto, a estrutura educacional, que engloba currículo,
metodologia, ação pedagógica, tempo e espaço precisa de fato ser
revista e replanejada para que haja uma aprendizagem de êxito. A
educação precisa aproximar-se da realidade do aluno, através do uso
de metodologias contrárias às práticas conservadoras e retrógradas. Se
desejamos uma transformação educacional, é preciso abandonar as
161
velhas práticas e atender as exigências do novo modelo de sociedade.
Uma alternativa, seria o uso de metodologias ativas, que estamos nos
debruçando nesse texto.
Em estudo no qual enfatizam o desenvolvimento de
metodologias participativas e ativas enquanto perspectivas de
transformação de estratégias de ensino e aprendizagem, técnicas,
orientações teóricas e recursos pedagógicos com vistas à mudança nos
cenários educacionais, Bissoto e Caires (2019, p. 179) destacam que
O uso destas metodologias tem sido considerado eficaz por
inúmeros investigadores, especialmente porque contem-
plam as exigências de aprendizagens complexas, próprias
do cenário profissional e do conhecimento técnico mais
profundo, destacando-se por: a. se centrarem no desenvol-
vimento de competências básicas, como a responsabilidade
e a iniciativa de cada estudante (e do grupo) de promover
os seus processos de aprendizagem; b. propiciar as bases
teóricas para que se criem atividades de aprendizagem
generativas, em contextos de aprendizagem autênticos; c.
incentivarem alterações nos modos de se avaliar a
aprendizagem, o que tem repercussões não didáticas,
mas na própria natureza do conhecimento; e d. afirmar a
importância do compartilhamento sociocultural de
aprendizagem.
Se falamos tanto da necessidade de uma transposição didática,
devemos levar em conta que o histórico escolar do processo de
formação de professores é pautado no modelo de aula expositiva,
repetitiva e com a valorização dos conteúdos que são repassados e
162
cobrados por meio de exercícios mecânicos e provas. Quem nunca
decorou um conteúdo para a prova e depois de sair da sala, se
esqueceu completamente?
Transposição didática pressupõe que para serem ensinados os
conteúdos devem ser transformados nas suas formas de apresentação
aos estudantes, processo esse a envolver motivos, necessidades,
sentidos e significados de aprendizagem. A rigor, exige um processo
de construção de conhecimento pautado pela curiosidade, descoberta,
coordenação de ações e desenvolvimento da capacidade de
transferência do conhecimento adquirido para situações novas. Se as
tecnologias digitais de informação e comunicação contribuem para
essa mudança de atitudes ao ensinar e aprender, forçosamente se
impõe a modificação de concepções teóricas e práticas pedagógicas
ainda muito marcadas pela associação de modelos.
Segundo Tardif (2006, p. 261) “os alunos passam pelos cursos
de formação de professores sem modificar suas crenças anteriores
sobre o ensino. E, quando começam a trabalhar como professores, são
principalmente essas crenças que eles reativam para solucionar seus
problemas profissionais”. Os professores, portanto, repetem esse
modelo, inclusive nas instituições de ensino superior, nas quais na
maioria das vezes as turmas são numerosas e por esse e outros motivos,
evitam utilizar técnicas ou práticas diferenciadas, como as
metodologias ativas, por exemplo.
Lázaro; Sato e Tezani (2018) mencionam que o desenvolvi-
mento da tecnologia faz com que todos s, professores e alunos,
tenhamos acesso a numerosas informações, inclusive sobre nossa área
de atuação ou estudo, mas esses mesmos educadores que utilizam a
163
tecnologia para pesquisas e assuntos pessoais, não apresentam
habilidades para fazer uso dela com cunho pedagógico para suas aulas.
Diante desse cenário, temos ainda uma geração que utiliza a
tecnologia como entretenimento, porém não sabe utilizá-la na sala de
aula, o que perpetua ainda mais o modelo de relação vertical e
autoritária tendo o professor como o único que domina o conteúdo a
ser trabalhado. Para Lázaro; Sato e Tezani (2018), no processo de
ensino e aprendizagem a figura do professor e dos alunos, porém
não existe somente essa relação para que o ensino e a aprendizagem
aconteçam. Sendo assim, alunos podem aprender com seus pares ou
com seus professores dependendo de como o processo é entendido e
conduzido. O professor deve ser um mediador e a tecnologia pode
nesse meio entrar como um instrumento, um recurso que pode
auxiliar o aprendizado de diversas formas, entre diferentes pessoas
e/ou potencializar a aprendizagem.
Ainda mais com o cenário da pandemia de Covid-19, muitas
universidades têm investido em plataformas educacionais que
viabilizam essa relação do aprendizado com o uso da tecnologia
envolvendo as metodologias ativas como a sala de aula invertida, o
blended learning, entre outros modelos, porém muitos professores não
estão preparados para assumir uma nova postura e serem mediadores
utilizando esses recursos.
As metodologias ativas colocam o aluno como sujeito ou
protagonista de sua aprendizagem mudando a sua postura, isto é, ele
se torna ativo e participante saindo de um comportamento passivo,
além de aprender em parceria com o professor, com os pares ou
mesmo sozinho. E o professor? Será o orientador das atividades do
164
aluno, consultor, facilitador da aprendizagem, ou seja, alguém que
pode contribuir na dinamização desse processo.
É fato que esse processo pautado na corresponsabilidade pela
aprendizagem gera insegurança, pois pede do professor uma mudança
de postura e, mais do que isso, repensar o seu papel enquanto
educador. Além de ter que aprender a lidar com as tecnologias.
Não se trata de simplesmente substituir o quadro negro e
o giz por algumas transparências, por vezes, tecnicamente
mal elaboradas ou até maravilhosamente construídas num
power point, ou começar a usar um Datashow. As cnicas
precisam ser escolhidas de acordo com o que se pretenda
que os alunos aprendam. [...] Além do mais, as técnicas
precisarão estar coerentes com os novos papéis tanto do
aluno, como do professor: estratégias que fortaleçam o
papel de sujeito de aprendizagem do aluno e o papel do
mediador, incentivador e orientador nos diversos
ambientes de aprendizagem (MASETTO, 2012, p.143).
O professor, em sua aula, pode fazer uso de cnicas tidas
como convencionais, como por exemplo, estudos de casos, leituras
prévias, projetos e associá-las a metodologias ativas. Porém, é preciso
que ele saiba como conduzir essas propostas. Lázaro, Sato e Tezani
(2018) citam como exemplo, que no processo de sala de aula
invertida, é preciso que o educador saiba selecionar quais os melhores
materiais que os alunos deverão assistir, ler ou até mesmo elaborar no
momento da “pré-aula”.
É necessário ainda, como preconiza Masetto (2012, p. 150)
que “[...] a indicação de leitura deverá trazer consequências para as
165
atividades do próximo encontro para que ela seja interpretada como
importante para a aprendizagem do aluno”. As atividades propostas
devem fazer sentido e instigar a curiosidade dos alunos. Devem fazer
com que o educando também sinta vontade de buscar pelo
conhecimento.
Para que as metodologias ativas, associadas ao uso das TDIC,
sejam efetivas no Ensino Superior presencial é fundamental que o
professor tenha conhecimento dessas metodologias, quais são seus
usos e benefícios, das teorias que envolvem a Psicologia da
Aprendizagem, saibam utilizar as TDIC e acima de tudo sejam
criativos e tenham discernimento na intencionalidade pedagógica e
no planejamento das aulas. Além do estabelecimento de uma relação
afetiva com os discentes, pois como vimos mais acima, a afetividade
interfere no processo. Afinal, qual o aluno que não se esforça mais nas
aulas, quando gosta do professor?
A possibilidade de relacionar as TDIC às metodologias
ativas proporciona uma vivacidade as aulas do Ensino
Superior auxiliando no preparo de futuros profissionais
para o trabalho na sociedade da atualidade que é repleta de
conexões, redes e tecnologia. As atividades escolares
ganham um novo formato para a realização de atividades,
entrega de trabalhos e até mesmo a avalião (LÁZARO;
SATO; TEZANI, 2012, p.10).
Oliveira (2020) coloca que estamos vivendo uma mudança
importante na educação, principalmente no campo da didática: o
deslocamento do ensino para a aprendizagem e tal deslocamento
ocasionou impacto na prática docente, na postura do estudante, bem
166
como nas relações estabelecidas entre docente, estudante e
conhecimento. Para ela, com as metodologias ativas: “a ênfase das
propostas pedagógicas e dos currículos escolares é na aprendizagem, e
a centralidade do processo está no estudante” (p.10).
A pedagogia nova, em contraponto à pedagogia tradicional,
encontrou nas tecnologias da informação e comunicação uma aliada
para o fortalecimento das metodologias ativas. Temos a substituição
das práticas tradicionais por atividades prazerosas que despertam o
interesse do estudante. Para Dewey, “[...] o interesse o inspira
inteiramente, porque o nosso ‘eu’ se entrega, todo ele, a atividade” (1971,
p.69, grifos do autor). Destaque-se aqui, o papel do interesse e da
afetividade, bem descrita por Piaget em suas pesquisas.
Vale reiterar que as metodologias ativas descontroem o perfil
do professor conteudista, conservador e exigem novas atitudes e
conhecimentos, que o seu objetivo transpassa o de transmitir
conteúdos e passa a ser de formar alunos críticos, participativos no
processo de aprendizagem, criativos e éticos. Com isso, os alunos
tornam-se ativos nesse processo, desenvolvem sua autonomia e a
autoaprendizagem. Porém, nem tudo são flores: é preciso falar dos
desafios e possibilidades que permeiam essa transposição didática e
mudança de perfis.
Desafios e possibilidades no uso de metodologias ativas
Como anunciamos no tópico acima, vamos tratar
inicialmente dos desafios que o uso das metodologias ativas impõem
ao educador e aos alunos: além da mudança de postura, haja vista que
o professor não é mais o que detém o conhecimento e o aluno quem
167
o “absorve” de forma passiva; se, durante anos, o aluno acreditou nos
benefícios da aula expositiva, ou seja, centrada, no professor-
expositor, ele pode hesitar quanto a aderir às atividades apoiadas pelos
novos métodos, como aponta Assunção (2021) em sua pesquisa aqui
referenciada.
Outro desafio é que alguns alunos, principalmente os
trabalhadores, podem ressentir-se quanto ao emprego de tempo
necessário para interpretar as questões e mais do que isso, de ter eles
mesmos que buscarem as respostas; que no modelo tradicional, o
professor é a “fonte” de conhecimento e transmissor de conteúdos. A
elaboração de materiais didáticos por parte do professor também pode
ser outra dificuldade, pois exige treinamento com vistas a produzir
multimídia para incorporar textos, imagens, animações, vídeos e sons.
Assunção (2021) menciona em seu texto que a inovação no
processo educacional requer avanços na performance docente para
conseguir planejar e empregar técnicas, fazer a gestão do calendário,
produzir materiais e combinar procedimentos, elaborar devolutivas e
aperfeiçoar as suas habilidades de comunicação.
Em uma aula em que as metodologias ativas são utilizadas, as
aprendizagens ocorrem de várias formas e em diversos ambientes, por
meio de diferentes interações. Contudo, para que elas deem o
resultado esperado o professor precisa saber desenvolvê-las e levar em
conta os seguintes fatores: selecionar corretamente os materiais da
aula; planejar com antecedência e atenção todos os processos; saber
usar as TDIC e utilizar obviamente as que possui maior segurança;
usar conteúdos práticos, atuais e tecnologias que os alunos dominam
e promover diversas formas de agrupamentos e colaboração entre os
168
alunos para o predomínio do trabalho coletivo (ZARO, SATO;
TEZANI, 2018).
Oliveira (2020) aponta que a liberdade é fundamental para a
autonomia no processo de aprendizagem e quanto maior for o espaço
de liberdade, maior será a curiosidade do educando.
Sendo assim, é necessário que o professor antes de qualquer
tentativa de discussão de técnicas, de materiais ou de métodos, ele
desperte a curiosidade, a ânsia por “saber mais” em seus discentes. A
autora assim define:
As pedagogias ativas pressupõem uma mudança
metodológica, desde a própria estrutura física da escola até
os modos de ser, agir e se relacionar dos sujeitos envolvidos
no processo pedagógico. Mas o que muda no estudante, no
docente e na relação com o conhecimento a partir das
metodologias ativas? Muda a escola: o ambiente precisa ser
interessante, lúdico, agradável; precisa instigar a criação, a
colaboração, a interação, a conexão; a escola para além do
prédio. uma sede física, porém, no conceito de escola,
está algo maior, sua abrangência passa a ser virtual, todos
estão conectados a qualquer tempo e espaço. Os tentáculos
da escola se expandem, e entram em cena as tecnologias
que permitem o trabalho em rede, o acompanhamento por
parte do docente a distância, o controle na realização das
atividades pode se dar nas 24 horas do dia: dispositivos
móveis, software, aplicativos, redes sociais, etc.
(OLIVEIRA, 2020, p.13).
169
Essas mudanças nos modos de ser, agir e se relacionar, isto é,
a alteração dos papéis tanto do professor bem como do aluno, pois
agora o professor não é mais o detentor do saber, mas sim, um
pesquisador experiente que está para orientar o estudante em suas
descobertas e a postura do estudante frente ao conhecimento a ser
construído também muda, pois deve-se estabelecer conexões com o
cotidiano e utilizar esses saberes para resolver problemas de seu
entorno, mas como estamos vendo, o uso de metodologias impõe
alguns desafios aos dois lados.
Senge et al. (2005) defendem que a escola e a universidade
devem ser espaços para a experiência, como organismos vivos que
aprendem. Mas será que elas estão prontas para isso? Certamente não,
a maioria delas, eu diria. Para haver de fato uma metodologia ativa, é
primordial a preocupação que ultrapasse a transmissão de conteúdos
e que se ocupe com uma prática pedagógica ética, crítica, reflexiva e
transformadora, que ultrapasse o cnico (BERETA, 2020). A escola
pode e deve ser um espaço para a formação de seres pensantes e
atuantes na e para a realidade que os cercam.
Outros desafios que podemos encontrar no uso de
metodologias ativas são: muitas universidades particulares contratam
professores-horistas e sabemos que tal prática requer do profissional
várias horas de estudo, preparação de materiais/aulas etc.
Infelizmente, os professores trabalham em duas ou mais instituições,
não tendo tempo para implantar as metodologias ativas. também
a resistência desses professores em aderir às metodologias ativas, pois
como vimos, requer do profissional maior dedicação, tempo e
formação diferenciada.
170
Um desafio também importante de abordar é a dificuldade
dos professores e dos alunos em lidar com as tecnologias. As
instituições de ensino superior devem fornecer formações para isso, se
desejarem realmente o uso efetivo de pedagogias mais ativas.
Agora abordarei algumas possibilidades de uso de
metodologias ativas no Ensino Superior. Uma delas é a sala de aula
invertida ou
flipped classroom
, que de acordo com Lázaro, Sato e
Tezani (2018), concentra-se em abordar os conteúdos em dois
momentos: teoria e prática. Inicialmente os conteúdos planejados são
disponibilizados em formato de textos, vídeos, músicas, entre outras
atividades para serem feitas em casa, antes da aula. Já, na sala de aula,
o aluno se dedica a pesquisas em grupo para resolver problemas, tirar
dúvidas, debater e trocar ideias.
Segundo Moran (2015, p.22) a sala de aula invertida consiste
em “concentrar no ambiente virtual o que é informação básica e
deixar para a sala de aula as atividades mais criativas e
supervisionadas”. Essa metodologia é constituída de três momentos:
um momento pré-aula que o aluno terá contato com o conteúdo
disponibilizado pelo professor, a aula em si, onde serão resolvidas as
situações-problema ou estudos de casos que possuam relação com o
assunto, além de reflexões e um momento pós-aula com
questionamentos para que o aluno possa verificar se aprendeu.
Lázaro, Sato e Tezani (2018) salientam que um problema a
ser enfrentado pelo professor na metodologia de sala de aula invertida
é conseguir com que os alunos criem o hábito de acessar os materiais
disponibilizados para a pré-aula. Muitas vezes, os alunos não acessam
os materiais, cabendo ao professor retomar todo o material que seria
primordial para a compreensão dos trabalhos posteriores.
171
Outra metodologia é a aprendizagem baseada em projetos,
que diferente da forma tradicional, promove um vínculo entre aluno
e aprendizagem, a partir da ação-reflexão-ação. As atividades podem
e devem envolver várias áreas do conhecimento, os projetos
interdisciplinares, e são elaboradas a partir de um problema
significativo para os alunos obterem um produto final, que é
alcançado por meio de pesquisas em pequenos grupos (LÁZARO;
SATO; TEZANI, 2018).
Nesta organização de trabalho pedagógico, a relação com o
conhecimento se difere do modelo tradicional de ensino. A
educação e a aprendizagem consideram o aluno como
sujeito ativo da construção do conhecimento, havendo,
então, mudanças de olhares, os quais são direcionados para
outras instâncias: a educação passa a ser centrada na
aprendizagem, no desenvolvimento de habilidades e na
participação ativa do aluno. (LÁZARO; SATO; TEZANI,
2018, p.6).
Um exemplo de projeto com as tecnologias no Ensino
Superior, pode ser o de Prado (2005), que cita a produção de vídeos,
cuja proposta deve ser trabalhada em grupo para desenvolver as
seguintes atividades: pesquisa e seleção de informações, imagens,
sons, produção do roteiro e edição do vídeo. Neste exemplo, a
Internet é fundamental, servindo como fonte de pesquisa e de
comunicação.
A aprendizagem baseada em problemas ou Problem Based
Learning (PBL) começou a ser difundida nos anos 60, na área da
Saúde, pelo Ensino Superior. Tanto no Brasil bem como no exterior,
172
foi utilizada inicialmente em cursos de Medicina. Porém, aos poucos,
vem sendo usada na área da Educação e é uma estratégia em que os
alunos trabalham com o objetivo de resolver um problema, colocando
o educando como o agente principal responsável por seu aprendizado.
No PBL, o professor fica responsável em preparar problemas a serem
resolvidos pelos alunos de maneira colaborativa. Antes de apresentar
os conceitos teóricos, são lançados problemas reais para serem
solucionados, instigando o aluno a buscar novos conhecimentos
(LÁZARO; SATO; TEZANI, 2018).
Essa proposta auxilia na formação de um sujeito autônomo,
capaz de trabalhar coletiva e individualmente em busca de soluções
adequadas para o problema, construindo conhecimentos e
desenvolvendo habilidades. Por fim, são várias as possibilidades de
metodologias ativas que podem ser utilizadas no Ensino Superior,
porém destaco as mais utilizadas.
Considerações Finais
A parceria entre os recursos do mundo virtual e do mundo
presencial possibilitam inúmeras possibilidades de trabalho para o
ensino e a aprendizagem servindo não somente, para o acesso a
materiais, mas também como um vasto campo para discussões,
pesquisas e construção de conhecimentos. As próprias universidades
poderiam criar cursos de aperfeiçoamento específicos para auxiliar os
docentes no uso de metodologias ativas.
Por ser um assunto relativamente atual, ainda encontramos
dificuldades na busca de referências sobre esse assunto. No
levantamento bibliográfico realizado, observei que a aprendizagem
173
baseada em problemas é um campo limitado na área de educação,
pois foram poucos os trabalhos encontrados, haja vista que ainda é
uma metodologia muito utilizada e difundida na área médica.
Cabe ao docente refletir sobre sua prática, para que se consiga
formar profissionais reflexivos e talvez um dos desafios do ensino
superior esteja relacionado à formação do seu quadro docente e,
também à necessidade de se reinventar diariamente, com o objetivo
de atender às demandas de sala de aula, advindas de estudantes mais
preparados para a realização das atividades, que com o uso de
metodologias ativas, ele chega dominando o conteúdo por meio de
estudo prévio. Cabe aos docentes o papel de propor atividades que
materializem o conhecimento a partir de vivências associadas a
realidade do aluno.
Desse modo, é preciso o rompimento de processos
educacionais pautados na reprodução e na memorização para a
construção de novos conhecimentos. O estudante, quando
estimulado com criatividade e criticidade, construirá seus
conhecimentos sem medo de errar, pois quando o professor o
incentiva/encoraja, estará aprendendo e ressignificando seus saberes.
Sendo assim, as metodologias ativas desconstroem o perfil do
professor conservador, transmissor de conteúdos e exige novas
atitudes e conhecimentos, na qual os alunos tornam-se partícipes do
processo de aprendizagem, desenvolvem sua autonomia e a
autoaprendizagem.
174
Referências
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177
8.
Contribuões das Metodologias Ativas na Pós-
Graduação em Educação: Relato de Vivência
em uma Disciplina na Unesp de Marília
Gisele de Assis Carvalho Cabral
Ninguém educa ninguém, ninguém
educa a si mesmo, os homens se educam
entre si, mediatizados pelo mundo.
Freire (1987)
Introdução
Algumas pesquisas (KELLER-FRANCO, 2008; VALENTE,
2014; SILVA, BIEGING, BUSSARELO, 2017; LIMA, 2017;
BERETA, 2020; SOUZA, MEDEIROS, 2021) acerca das
metodologias utilizadas pelos e pelas docentes para o processo de
ensino e aprendizagem dos e das discentes em várias modalidades de
ensino do infantil ao superior vêm sinalizando, desde algum
tempo, a necessidade de implementação de práticas que ultrapassem
as fronteiras do modelo tradicional de ensino e promovam a inovação
das metodologias em sala de aula a fim de atender os objetivos
https://doi.org/10.36311/2023.978-65-5954-397-7.p177-206
178
exigidos pela sociedade contemporânea, a qual demanda, cada vez
mais, pessoas que saibam se apropriar e recriar o conhecimento,
relacionar conteúdos e informações e transformá-los em novos
conhecimentos, bem como atender as exigências postas pela área onde
atuam ou atuarão profissionalmente. Nesse sentido, uma
preocupação com a formação integral da pessoa, isto é, com o
desenvolvimento de competências. Para tal, a escola deve ser um
espaço para a formação do sujeito social, o qual deve ser consciente
de sua realidade e provido de meios para transformá-la (FREIRE,
2021).
A partir dessa perspectiva, não é possível formar uma pessoa
para atuar conscientemente na sociedade se for ensinada, desde
pequena, com base em conteúdos desvinculados da vida e sustentados
por metodologias tradicionais de ensino, calcadas em papeis bem
definidos de professor e estudante, em que apenas o primeiro possui
saberes e conhecimento e, por isso, deve transmitir ao segundo, este
um ser passivo que não constrói o próprio conhecimento, mas decora
os conteúdos e reproduz em momentos avaliativos. Nesse formato de
ensino, as aulas são fragmentadas do ponto de vista dos saberes
científicos e culturais das diversas áreas do conhecimento, ocorrem
exclusivamente no espaço escolar, sempre da mesma forma, e são
apoiadas na transmissão pelo professor ou pela professora e
memorização pelos/as estudantes (BERETA, 2020).
As singularidades dos/das discentes não são consideradas, os
saberes populares não são ponto de partida para a elaboração do
conhecimento sistematizado, assim, as relações humanas são nulas e,
por esta condição, a escola não se fundamenta no diálogo, essência da
vida, e passa a ser apenas um prédio frio e sem vida. Esse processo
179
resulta na formação de sujeitos não-pensantes, sem iniciativa e
autonomia, silenciados, governados por outros e totalmente
conformados porque inconscientes da sua realidade concreta.
Para Freire (2021, p. 65), “A escola como um espaço de
ensino-aprendizagem será então um centro de debates de ideias,
soluções, reflexões, onde a organização popular vai sistematizando sua
própria experiência [...] não é um espaço físico. É um clima de
trabalho, uma postura, um modo de ser”. Concordo com esta
afirmação, uma vez que concebo a escola como espaço vivo de diálogo
entre todos, democrático, plural. Se diálogo, abertura para a
escuta e as diferenças. Se “Ensinar exige respeito aos saberes dos
educandos” (FREIRE, 1996, p. 30), o professor ou a professora deve
se dispor a escutar o que os alunos e as alunas têm a dizer, conhecer
os saberes populares que eles e elas trazem à escola para servir de
preceito para pensarem e repensarem juntos a realidade de cada um e
uma e como modificarem-na. Freire propõe uma educação libertária,
humanizadora, sem a qual é impossível ter consciência de suas
próprias condições e desejo de mudá-las.
Ao encontro dessa ideia, menciono Bakhtin (2011, p. 348) ao
dizer que “A vida é dialógica por natureza. Viver significa participar
do diálogo: interrogar, ouvir, responder, concordar, etc. Nesse
diálogo o homem participa inteiro e com toda a vida: com os olhos,
os lábios, as mãos, a alma, o espírito, todo o corpo, os atos.” Na
concepção de ensino, na qual todos os sujeitos envolvidos são vistos
como pessoas com pensamentos, ideias, visões, ideologias, enfim,
seres expressivos e falantes (BAKHTIN, 2017), a base da educação é
o diálogo. As relações humanas são vivas e as trocas dialógicas
frequentes. As professoras e os professores não o vistos como
180
centralizadores e centralizadoras do ensino porque o diálogo
pressupõe trocas, assim, as pessoas se constituem e formam a sua
singularidade por meio das relações estabelecidas com todos os outros
e todas as outras na coletividade. Nessas relações sociais, o
encontro dos horizontes de cada um e cada uma, o que alarga o
pensamento e a consciência dos interlocutores e das interlocutoras.
Nesse processo -se a alteridade pela presença e importância de todas
as outras pessoas para a nossa própria constituição humana
(BAKHTIN, 2011).
A partir dessas considerações, para construir uma escola que
possa formar as pessoas integralmente com competências para gerir a
sua própria vida e participar dela como sujeito plenamente social,
penso que a utilização das metodologias ativas em sala de aula pode
ser ponto de partida ao contribuir ao/à discente que atribua sentidos
ao que está aprendendo por se assumir como sujeito protagonista do
seu processo de aprender, uma vez que:
[...] promover uma educação ativa é permitir o movimento
natural do desenvolvimento humano. É caminhar de mãos
dadas admitindo que espectador e protagonista troquem de
papéis e confundam a plateia, pois o espetáculo es na
emoção do resultado. Por isso, a educação deve ser
ampliada a partir do conceito de fazer junto, em rede,
consolidando saberes e oportunizando desenvolvimento
(SILVA, 2017, p. 6).
Rompe-se com o perfil de professor/a como centralizador/a
do conhecimento. Docente e discente, seres sociais e pensantes,
movimentam-se juntos entre muitos espaços de aprendizagem a todo
181
o momento e produzem conhecimento ou criam possibilidades para
essa construção. Ao compreenderem que cada ser é único e singular,
respeitam-se em suas especificidades porque, segundo Bakhtin
(2017a, p. 96), “Tudo o que pode ser feito por mim não poderá
nunca ser feito por ninguém mais, nunca”. O autor adensa que cada
um de nós ocupa “no existir singular um lugar único, irrepetível,
insubstituível e impenetrável da parte de um outro” (p. 96). Nessa
perspectiva, cada um e cada uma de nós ocupa um lugar social no
mundo fruto de todas as relações estabelecidas desde o nascimento
social com todas as outras pessoas partícipes da nossa vida e isso faz
com que cada um e cada uma seja único/a no existir e, por isso, tem
a obrigação e dever de agir responsavelmente nesse mesmo mundo.
Ao se furtar dessa participação, está se negando o direito de existir.
Como afirma Freire (1996, p. 59-60):
O professor que desrespeita a curiosidade do educando, o
seu gosto estético, a sua inquietude, a sua linguagem, mais
precisamente, a sua sintaxe e a sua prosódia; o professor
que ironiza o aluno, que o minimiza, que manda que ele
se ponha em seu lugar” ao mais tênue sinal de sua rebeldia
legítima, tanto quanto o professor que se exime do
cumprimento de seu dever de propor limites à liberdade do
aluno, que se furta ao dever de ensinar, de estar
respeitosamente presente à experiência formadora do
educando, transgride os princípios fundamentalmente
éticos de nossa existência.
O professor e a professora não podem ser negligentes nas suas
ações e indiferentes às suas experiências, assim como o aluno e a aluna
182
também não. E o fato de agirem responsavelmente em cada evento da
sala de aula sustenta o ato ético necessário no processo de ensinar e de
aprender. Para tal, o diálogo torna-se essencial porque somos todos
seres inacabados e precisamos das outras pessoas para nos
constituirmos. “O eu é inacabado, incompleto e necessita
indispensavelmente do outro para existir. O eu se constitui quando
vai ao encontro do outro em um processo de interação social”
(MARQUES, 2014, p. 33). No processo de alteridade, o eu nunca é
o mesmo e está em constante alteração por meio da interação com as
pessoas.
Exposto tudo isso, neste capítulo, procuro responder ao
seguinte questionamento: Quais as contribuições das metodologias
ativas utilizadas pelos e pelas docentes para o processo de ensino e
aprendizagem dos e das discentes na Pós-Graduação em Educação?
Para isso, assumo um percurso metodológico considerado relevante à
natureza qualitativa. Nas palavras de Bakhtin (2016, p.72)
“Independentemente de quais sejam os objetivos de uma pesquisa,
o texto pode ser o ponto de partida”. Por essa concepção, a
especificidade das ciências humanas é produzir texto, considerado
enunciado por esse autor, como fruto das trocas dialógicas
estabelecidas entre as pessoas, vistas como seres pensantes, produtoras
de pensamentos que são organizados pelos enunciados que se
relacionam entre si.
O pesquisador das ciências humanas percebe o sujeito, não
reificado, mas como sujeito expressivo e falante, uma pessoa que se
dirige a outra pessoa que também se expressa, em decorrência disso,
“o conhecimento que se tem dele pode ser dialógico(BAKHTIN,
2017, p. 66, grifo do autor). Ao assumir um posicionamento no
183
horizonte dialógico, compreendo o movimento concreto e real da
vida que ocorre a partir das e nas relações sociais. Dessa forma, como
ponto norteador, em um primeiro momento, busquei os estudos mais
recentes sobre a temática. Assim, deparei-me com alguns artigos e
obras disponíveis em periódicos eletrônicos sobre o assunto.
Ao localizar essas outras vozes que contribuíram com
pesquisas sobre a temática proposta, procurei conhecer e
compreender o que os estudos produzidos desvelaram em suas
caminhadas, na tentativa de fazer dialogar os enunciados de diferentes
autores e cotejá-los de modo que à medida que o pesquisador ou a
pesquisadora coteja textos com outros textos, constrói conceitos ou
reaproveita conceitos elaborados em outros estudos para aprofundar
a compreensão na investigação, no entanto, o conhecimento
construído não se esgota no próprio objeto de pesquisa, porque a
compreensão que se faz pelo pesquisador ou pela pesquisadora, nesse
caso, não pode ser generalizada, uma vez que é única e singular
(GERALDI, 2012).
Em um segundo momento, relatei sobre uma vivência minha
em uma das disciplinas da Pós-Graduação a fim de discutir sobre as
contribuições das metodologias ativas para o meu percurso na
condição de doutoranda do Programa de Pós-Graduação em
Educação (PPGE) da Universidade Estadual Paulista (UNESP),
campus de Marília.
Enfim, procurei fazer dialogarem os sujeitos autores e
autoras e todas as diferentes vozes contidas nos enunciados
materializados nas obras e nos artigos lidos na direção de
compreender em profundidade os sentidos que são inacabáveis.
184
Contribuições das pesquisas sobre
Metodologias Ativas no Ensino Superior
No relato de experiência intitulado Metodologias Colabora-
tivas na Pós-Graduação Stricto sensu em Educação, os autores Souza e
Medeiros (2021) discutem a utilização das metodologias
colaborativas vivenciada na disciplina obrigatória “Educação e
Cidadania” ministrada por dois docentes e realizada por trinta e cinco
mestrandos e mestrandas sendo vinte e três com formação em
Pedagogia de três linhas de pesquisa diferentes do Programa de Pós-
Graduação em Educação da Universidade do Estado do Rio Grande
do Norte (UERN) no segundo semestre do ano letivo de 2018.
Ao defenderem que “as posturas e os métodos de ensino
universitários devem ser revisados, para contribuir com uma
formação científica de pesquisadores imersos na sociedade do
conhecimento, comprometidos com o trabalho coletivo, cooperativo
e solidário” (SOUZA; MEDEIROS, 2021, p. 6), os autores propõem
o uso das metodologias colaborativas na Pós-Graduação, uma vez que
essas metodologias “se colocam como possibilidades de aumentar as
chances de os estudantes do ensino superior, da graduação à pós-
graduação, desenvolverem relações de autoconfiança e inovação na
construção e organização dos conhecimentos que fundamentam os
seus objetos de estudos” (SOUZA; MEDEIROS, 2021, p. 6).
Para esses autores, as contribuições mais relevantes do
trabalho docente com essas metodologias podem ser categorizadas em
quatro situações: a primeira diz respeito ao/à docente assumir o papel
de orientador/a e desafiador/a do processo de ensino e aprendizagem
e não o sujeito produtor exclusivo do conhecimento, desse modo,
185
atua como alguém que deve acompanhar os grupos e garantir a
participação colaborativa de todos e de todas, assim, o/a aluno/a
sendo instigado pelo/a docente protagoniza o seu próprio percurso de
construção do conhecimento, conquistando cada vez mais autonomia
para tomada de decisões. A segunda situação se refere às
aprendizagens comuns entre pessoas com graus de conhecimento
diferentes, o que favorece a convivência com a multiplicidade de
pensamentos. a terceira situação está relacionada à organização do
espaço-tempo que está para além da sala de aula física. Os ambientes
de aprendizagem se ampliaram e, atualmente, muitos deles se
configuram como virtuais. Enfim, a quarta situação, vinculada à
terceira, trata da ampliação das trocas de investigação por meio da
socialização do conhecimento.
A partir do relato de experiência com o trabalho proposto
mediante o uso das metodologias colaborativas, os autores concluíram
que essa vivência provocou nos participantes, tanto docentes como
discentes, muitas adaptações visando a promover um ensino
sustentado pela colaboração entre todos e todas, por conseguinte,
uma aprendizagem com mais sentido. Também, segundo eles,
contemplou as necessidades dos docentes de avaliação da turma, por
sinal bem numerosa, e propiciou a todos e a todas os atos de ouvir,
falar e posicionar-se, indispensáveis à construção da autonomia por
parte do/a estudante.
Na obra A formação Ética do Psicólogo: ambiente acadêmico e
competência moral, Bereta (2020) dedica o segundo capítulo “O Uso
de Metodologias Ativas e o Papel do Professor na Graduação” na
reflexão sobre o papel do/a professor/a na transformação educacional
no Ensino Superior. A princípio, faz um contraponto entre o Ensino
186
Tradicional com metodologias arcaicas e limitadoras e as
Metodologias Ativas. Estas, consideradas como ferramentas de ensino
e de aprendizagem e, por estarem alicerçadas no princípio da
autonomia, podem promover a necessária transformação educacional
cuja preocupação deve ser “uma prática pedagógica ética, crítica,
reflexiva e transformadora, que ultrapasse o cnico, e alcance a
formação do homem como ser histórico” (BERETA, 2020, p. 84).
Dentro dessa perspectiva, as metodologias ativas, quando bem
utilizadas, podem potencializar as capacidades dos/das estudantes e
favorecer a formação de pessoas mais reflexivas, críticas e atuantes em
seus diversos espaços colaborando para a transformação social.
Oliveira, Costa, Tortoreli e Santos (2020), ao realizarem uma
pesquisa de cunho bibliográfico sobre o uso de metodologias ativas
para o processo de ensino e aprendizagem no Ensino Superior no
artigo intitulado Metodologias Ativas e a Pedagogia: o Problem-Based
Learning na prática curricular, propõem a aplicação do PBL -
Problem-Based Learningem cursos de Graduação, especialmente os
direcionados à formação docente, por contemplar diferentes formas
de aprendizagem: a ativa, a integrada, a cumulativa e para a
compreensão, portanto, amplia as possibilidades de aproximações e
problematizações acerca do objeto estudado.
No artigo Metodologias Ativas na Pós-Graduação: relato de caso
na Disciplina Educação Ambiental para a sustentabilidade, Lima,
Pacheco e Ribeiro (2020) apresentam a reformulação da disciplina
“Educação Ambiental e Sustentabilidade” do Programa de Pós-
Graduação em Ciência e Tecnologia Ambiental (PPGCTA) da
Universidade de Pernambuco, Campus Petrolina, em decorrência do
contexto pandêmico provocado pela COVID-19 que impôs a
187
suspensão das atividades presenciais nas instituições de ensino. Nesse
cenário, a disciplina teve como base a utilização da aprendizagem
invertida e planejamento para ser ministrada na modalidade de ensino
remoto (online). Essa metodologia foi escolhida baseada em pesquisa
sobre o seu potencial em relação ao uso do tempo em aula, tendo em
vista o virtual, ao criar um ambiente de aprendizagem cujo/a aluno/a
é o centro, portanto, focado na participação e emancipação do/da
discente (LIMA, PACHECO, RIBEIRO, 2020). A seleção também
foi pautada nas instruções do “Guia para Utilização da Aprendizagem
Invertida no Ensino Superior”, produzido por Robert Talbert (2019).
Como conclusão, as contribuições relevantes do trabalho com
a aprendizagem invertida se referem ao envolvimento dos/das
discentes no processo de ensino e de aprendizagem ao assumirem o
papel de protagonistas, o que resultou em aprendizagem significativa,
às possibilidades do diálogo e das interações estabelecidas entre
docentes e discentes com foco na aprendizagem e a produção de jogos
e de recursos didáticos, frutos do trabalho docente e discente na
disciplina.
No artigo O uso das Metodologias Ativas na Educação, os
autores Pillon, Catapan e Souza (2019) trazem dados sobre o
crescimento da Educação a Distância (EaD) a partir do século XIX e,
por conseguinte, a necessidade da utilização de metodologias “que
possam suprir as necessidades dos estudantes das gerações digitais,
propiciando-lhes uma formação mobilizadora” (PILLON;
CATAPAN; SOUZA, 2019, p. 81). Por esse viés, sugerem o ensino
híbrido no qual “a educação ocorre de uma forma diferenciada, em
que a constante promoção de atividades com foco no
desenvolvimento das competências individuais primordiais para
188
tornar possível o sucesso na sociedade atual (PILLON; CATAPAN;
SOUZA, 2019, p. 81). Para tanto, apresentam as metodologias ativas:
Peer Instruction e Problem Based Learning (PBL) como práticas
inovadoras para atender as necessidades impostas pela sociedade
contemporânea, uma vez que o aprendizado, por meio das
metodologias ativas, efetua-se a partir de problemas e situações
concretas da vida real, assim, os alunos e as alunas anteciparão
algumas das vivências da vida profissional que terão futuramente.
O livro Metodologia Ativa na Educação é composto por sete
capítulos, cujos autores debatem ideias acerca do uso das
metodologias ativas nas diferentes modalidades de ensino. No terceiro
capítulo, cujo título é “Metodologias Ativas no Processo de Ensino
Aprendizagem: Proposta Metodológica para Disciplina Gestão de
Pessoas”, os autores Cunha, Cunha, Monte e Jesus (2017)
procuraram compreender como se deu a aprendizagem a partir das
metodologias ativas e a percepção de cento e quarenta discentes na
disciplina mencionada no segundo semestre do Curso Técnico em
Logística de uma universidade no município de Mossoró, Rio Grande
do Norte. Por meio de uma pesquisa descritiva e uma abordagem
qualitativa, a partir dos relatos de experiências vividas em sala de aula
com a utilização de metodologias ativas de ensino e de aprendizagem,
os autores tomaram conhecimento da percepção dos discentes sobre
as metodologias: simulações no ambiente de sala de aula, método de
problematização na sala de aula (ABP ou PBL), aprendizagem
colaborativa e exposições interativas.
Concluíram que o trabalho proposto com as metodologias
citadas propiciou uma maior participação dos/das discentes que
protagonizaram a construção de seus conhecimentos e, em razão
189
disso, sentiram-se mais valorizados/as. Além disso, os discentes e as
discentes puderam desenvolver habilidades e competências relaciona-
das ao raciocínio crítico e reflexivo, à tomada de decisão, ao trabalho
em equipe, o que promoveu melhoria na troca entre os/as
participantes. Por fim, na visão do alunado, esse processo facilitou o
aprendizado pela maior compreensão dos conteúdos ministrados,
devido à interação, autonomia e motivação.
No artigo Espiral construtivista: uma metodologia ativa de
ensino-aprendizagem, Lima (2017), após realizar um breve histórico a
respeito das origens, das características e da utilização das
metodologias ativas no Ensino Superior enfatizando a aprendizagem
baseada em problemas, a metodologia da problematização, o método
científico e o uso de narrativas, simulações ou atuações em cenários
reais de prática, discute as bases teórico-metodológicas da Espiral
Construtivista, a partir de suas especificidades: “identificando
problemas”, “formulando explicações”, “elaborando questões”,
“construindo novos significados”, “avaliando processo e produtos”, e
evidencia diferenças e semelhanças em relação às metodologias ativas
enfatizadas. Defende o uso da Espiral Construtivista no Ensino
Superior por ser uma metodologia problematizadora sustentada pelo
diálogo entre discente e docente em cujo processo este último assume
um papel de orientador e facilitador da aprendizagem sendo o foco
no desenvolvimento de capacidades críticas e reflexivas pelo primeiro.
Conforme Morán (2015, p. 16), em seu artigo Mudando a
educação com metodologias ativas, na sociedade do conhecimento na
qual todos nos encontramos, o avanço da Internet promoveu uma
ampliação da divulgação de cursos e materiais bem como o acesso a
eles, o que aumentou as possibilidades de aprendizagem, uma vez que
190
“podemos aprender em qualquer lugar, a qualquer hora e com muitas
pessoas diferentes”. O autor complementa que “O que a tecnologia
traz hoje é integração de todos os espaços e tempos. O ensinar e
aprender acontece numa interligação simbiótica, profunda, constante
entre o que chamamos mundo físico e mundo digital” (p. 16). A
educação formal não ocorre somente no espaço físico da sala de aula,
mas em variados ambientes diários sobretudo nos digitais de modo
que o “professor precisa seguir comunicando-se face a face com os
alunos, mas também digitalmente, com as tecnologias móveis,
equilibrando a interação com todos e com cada um” (p. 16). Segundo
o autor, a melhor maneira de aprender é harmonizar de forma
equilibrada e contextualizada diferentes estratégias atividades, jogos,
desafios, problemas em direção aos objetivos pretendidos sempre
próximos a situações reais e combinando atividades individuais e em
grupos, presencial e online. O espaço da sala de aula precisa ser
reconfigurado para o ensino híbrido.
Valente (2014) enfatiza, em seu artigo Blended learning e as
mudanças no ensino superior: a proposta da sala de aula invertida, que
as mudanças atuais exigem um novo papel do processo de ensino e
aprendizagem, outrora sustentado pelo modelo industrial cuja base
era a “concepção bancária’ da educação” (FREIRE, 2020), ao
requerer do/da aprendiz a assunção de um papel ativo para significar
e compreender as informações que lhe chegam com base em seu
acervo cultural a fim de poder construir novos conhecimentos e
aprender a utilizá-los em situações concretas. A aprendizagem ativa
pode ser promovida por meio de diferentes estratégias como a
aprendizagem baseada na pesquisa, o uso de jogos, a Aprendizagem
191
Baseada em Problemas (ABP) ou a Aprendizagem Baseada em
Problemas e por Projetos (ABPP).
O autor também expõe as dificuldades de implantar, no caso
da ABP e ABPP, estratégias em salas de aulas em razão do grande
número de alunos e alunas ou da adequação do problema conforme
o currículo previsto e o nível de conhecimento dos e das discentes.
No que concerne ao trabalho com projetos, comumente selecionados
de acordo com o interesse de cada aluno/a ou então de grupo de
alunos/as, a possibilidade de temas é diversa, o que torna complexo o
processo de orientação pelo/a professor/a. No entanto, o uso crescente
das tecnologias digitais de informação e comunicação (TDIC) na
escola tem contribuído para amenizar essas necessidades referentes à
implantação dessas metodologias. Desse modo, o autor constata que
a blended learning ou ensino híbrido, ou melhor, a “sala de aula
invertida” (flipped classroom) é uma das modalidades mais
implantadas tanto no Ensino Básico quanto no Ensino Superior a
partir dos anos 2000.
Discutiu também sobre as diferentes modalidades de blended
learning, especialmente a sala de aula invertida, uma abordagem
pedagógica na qual o conteúdo e as orientações são estudados pelo/a
discente de forma remota anteriormente à aula presencial. Nesta,
os/as estudantes realizam atividades práticas, tais como elaboração de
projetos, resolução de problemas, discussão em grupos etc. Com essa
perspectiva, o professor ou a professora explorará as necessidades dos
alunos e das alunas e aprofundará o assunto diferentemente de realizar
exposição dos conteúdos. Geralmente, as avaliações de aprendizagem
são em formato de testes, os quais servem para apontar ao professor
192
ou à professora quais conteúdos devem ser retomados na aula
presencial.
Após confirmar com exemplificações concretas de
implantação da sala de aula invertida, o autor concluiu que mais
pontos positivos que negativos em inverter a sala de aula. O/a discente
pode estudar o material de acordo com seu ritmo compreendendo-o
dentro das suas condições; ao ser motivado/a para a aula presencial
com a realização de tarefas prévias ou com a autoavaliação pode ter
uma percepção clara do que precisa ser aprimorado, o que pode ser
feito na aula presencial com a orientação do/a professor/a e dos/das
colegas aproveitando melhor esse momento coletivo; a autoavaliação
sinaliza ao/à professor/a as temáticas a serem retomadas a partir das
necessidades individuais; as ações em sala de aula são baseadas nas
trocas sociais, entre todos e todas.
No texto As metodologias ativas e a promoção da autonomia de
estudantes, Berbel (2011), apoiada na literatura, investigou o uso das
metodologias ativas em direção à promoção da autonomia dos alunos
e das alunas nas diversas modalidades de ensino. Para tal, discorreu
sobre algumas possibilidades de metodologias, tais como: estudo de
caso, método de projetos, a pesquisa científica, a aprendizagem
baseada em problemas (PBL) e a metodologia da problematização
com o arco de Maguerez, todas as quais colocam o/a discente perante
problemas e desafios que os levam a mobilizar o seu acervo intelectual
para compreendê-los e solucioná-los.
Assim, as Metodologias Ativas constituem maneiras de
construir o processo de aprender e de ensinar a partir de experiências
reais ou simuladas com vistas a solucionar com êxito desafios
provenientes das atividades concretas das práticas sociais em
193
diferentes situações. A pesquisadora também destaca que uma única
metodologia pode não alcançar todos os alunos e alunas na
construção de níveis complexos de pensamento e de engajamento em
suas ões simultaneamente. Existe a necessidade de o professor ou a
professora conhecer as diferentes metodologias e seus benefícios para
construir uma proposta que favoreça a criação de atividades para o
desenvolvimento das habilidades necessárias a todos e a todas
discentes levando-os/as à promoção da autonomia.
Após a explanação e descrição das pesquisas encontradas e
suas contribuições, concluo que todas elas, dentro de suas
particularidades ao enfatizar uma ou mais metodologias ativas,
constatam a importância dessas metodologias como ferramentas
capazes de transformar a realidade do processo educacional, em
decorrência de sua maior característica que é a mudança de papel
entre docente e discentes, os quais se tornam responsáveis ativos pelo
processo todo. A transformação educacional é uma das ações
primordiais para a transformação da realidade social. Devemos
“reconhecer que a educação, não sendo a chave, a alavanca da
transformação social, é, ainda assim, indispensável à transformação
social” (FREIRE, 2021, p. 39).
Relato de Vivência em uma disciplina da
Pós-Graduação na UNESP de Marília
Neste segundo momento, busco compartilhar uma vivência
acadêmica acerca do uso das metodologias ativas no âmbito de uma
das disciplinas da Pós-Graduação. Anteriormente, quero refazer
brevemente minha trajetória escolar até o momento em que me
194
encontro, na condição de doutoranda, com a intenção de refletir
sobre a presença ou não das metodologias ativas na minha
escolaridade e como contribuíram de alguma forma para minha
formação como professora e pesquisadora.
Não frequentei o Ensino Infantil e fui matriculada
diretamente no Ensino Fundamental Anos Iniciais a série
(atualmente ao ano), em uma das duas escolas públicas do
município de Herculândia, interior do Estado de São Paulo, no final
da década de 1980 e início de 1990, no qual as metodologias
vivenciadas eram fundamentadas na perspectiva tradicional com
predominância das carteiras enfileiradas e as aulas expositivas pelas
professoras. Não me recordo de nenhuma estratégia pedagógica
diferenciada. No Ensino Fundamental Anos Finais a série
(atualmenteaoano), os conteúdos eram todos escritos na lousa
pelo professor ou pela professora (ou por um aluno ou aluna em
forma de revezamento) e, na sequência, eram registradas as questões
sobre o conteúdo do texto. Não havia discussão, apenas memorização,
pois tínhamos que reproduzir nas avaliações o conteúdo tal como fora
registrado na lousa. O tempo era utilizado na maior parte para cópia
de textos selecionados pelos/as professores/as. Em vista disso, até os
quatorze anos de idade, minha escolaridade foi baseada em
metodologias tradicionais, alicerçadas na transmissão e reprodução de
informações e não na construção de conhecimento.
A partir dos quinze anos (1995), matriculada no Centro
Específico de Formação e Aperfeiçoamento do Magistério (CEFAM),
em Tupã, município vizinho, no período integral, foi o espaço em
que vivenciei metodologias diferenciadas como organização e
apresentação de seminários e teatros, gincanas, participações em
195
grupos, leituras e discussões sobre textos e obras. Após quatro anos,
recebi o diploma de professora dos Anos Iniciais do Ensino
Fundamental.
No Ensino Superior Graduação em Pedagogia e Pós-
Graduação em Educação os professores e as professoras
indicavam/indicam com antecedência os textos a serem lidos em casa
para discussão em sala de aula. Todavia, por trabalhar e estudar na
mesma época, raramente conseguia ir à aula com os textos
previamente lidos. Hoje tomo consciência do quanto isso se
transformou em lacunas na minha formação. na Pós-Graduação,
desde 2018, mesmo trabalhando, raramente vou à aula sem ter lido
os textos recomendados pelos/as docentes das disciplinas porque
tenho consciência da importância dessa leitura prévia e, por isso,
consigo me organizar melhor.
As aulas são basicamente dialogadas, apesar de ainda haver no
Ensino Superior professoras e professores que ainda fundamentam
suas práticas em apenas aulas expositivas. Na Pós-Graduação,
vivenciei aulas a partir de metodologias diferenciadas como
elaboração e apresentação de seminários, discussões em grupos,
participação de painel integrado, encontros dialógicos, e, como
avaliação das disciplinas, experimentei a produção de diferentes
materiais, tais como portfólio, artigos, capítulos de livros, resumos
expandidos.
Após esse preâmbulo para, enfim, chegar ao momento em que
me encontro hoje, intenciono relatar de agora em diante sobre a
disciplina onde vivenciei metodologias diferenciadas desde o primeiro
dia de aula, a qual se intitula “A Formação Ética do Educador no
Ensino Superior”, pertencente à linha de pesquisa Psicologia da
196
Educação: Processos Educativos e Desenvolvimento Humano e
ofertada para discentes do Programa de Pós-Graduação em Educação
(PPGE) da Universidade Estadual Paulista (UNESP), campus de
Marília.
A disciplina foi ministrada por uma docente em colaboração
com uma ex-orientanda, nos meses de setembro e outubro de 2021,
semanalmente com duração de três horas e meia por encontro virtual.
A turma era constituída por doze alunos/as, seis homens e seis
mulheres, mestrandos/as e doutorandos/as, de diferentes áreas de
formação como Pedagogia, Terapia Ocupacional, Fonoaudiologia,
Psicologia e outras. Foram realizadas seis aulas no tempo referido no
formato remoto (online), por ainda nos encontrarmos no contexto
pandêmico
1
. Esse cenário exigiu ainda mais das docentes assim
referir-me-ei às duas responsáveis pela disciplinaque pensassem em
metodologias que pudessem motivar e contribuir para a
aprendizagem dos pós-graduandos e das pós-graduandas. Farei uma
breve descrição como as aulas foram desenvolvidas e focarei apenas
nas duas últimas aulas.
As docentes criaram uma sala virtual na Plataforma Google
Classroom e enviaram convite a s, discentes, por e-mail. O conteúdo
programático foi todo organizado e apresentado por dia de aula
previsto antecipadamente. Por conseguinte, nós, alunos e alunas,
tivemos a oportunidade de baixar os arquivos e conhecer todo o
material com antecedência como preparação para as aulas, lendo os
textos, destacando apontamentos, construindo conceitos e
1
Por estarmos vivendo no contexto de pandemia de Covid-19, com a suspensão das aulas
presenciais desde março de 2020 em todas as instituições de ensino do país, continuamos em
distanciamento físico realizando aulas remotamente (online) no Ensino Superior.
197
antecipando questões norteadoras para as discussões nos encontros
virtuais com todos/as. Em resumo, o material foi todo compartilhado
na sala virtual e todos/as matriculados/as tiveram acesso previamente.
Os encontros aconteceram pelo Google Meet nos quais houve espaços
para discussão, a princípio em pequenos grupos de dois a três
estudantes, em que levantávamos as ideias principais dos textos
propostos, dúvidas e questionamentos. Na sequência, as discussões
eram realizadas no grupo maior.
Neste ponto quero tecer algumas considerações. Enfatizo o
acesso prévio ao material selecionado e disponibilizado pelas docentes
e a dinâmica dos encontros virtuais. Esses encontros seriam
presenciais caso não estivéssemos enfrentando uma pandemia.
Contudo, mesmo sem contato físico, tivemos a oportunidade de estar
em um grupo menor, dentro dos recursos do serviço de comunicação
adotado pelas docentes, para expressar as nossas ideias sobre os textos
lidos previamente, praticando a escuta dos outros e das outras e
tecendo a nossa contrapalavra a respeito. Esses momentos, que foram
muitos, necessitavam como base para as trocas dialógicas o respeito
pelas ideias dos parceiros e parceiras, mesmo não concordando;
noutras vezes, a reelaboração do próprio pensamento a partir de uma
visão diferente ou a confirmação da nossa ideia. No grupo maior com
todos/as, as professoras escutavam as nossas impressões
ressignificadas pelo encontro de consciências (BAKHTIN, 2011) e
partiam do que tínhamos a dizer sobre o assunto ampliando nossos
horizontes ao relacionar com os diferentes contextos sociais reais. Esse
movimento dialógico contribuiu para o alargamento da minha
consciência (MIOTELLO, 2014) ao acessar essa infinidade de vozes
(dos autores dos textos lidos, dos colegas em pequenos grupos e do
198
grupo maior). Essas características de estudo descritas e discutidas
assemelham-se à metodologia apresentada no item anterior a
respeito da sala de aula invertida.
Como uma das atividades solicitadas pelas professoras,
tivemos como incumbência uma apresentação de seminário para a
turma. As professoras solicitaram que pesquisássemos sobre
metodologias ativas utilizadas no Ensino Superior e selecionássemos
um texto para compartilhar com os/as colegas. Sugeriram textos na
Plataforma virtual, entretanto, deixaram-nos à vontade para cada
grupo trilhar seu caminho a partir da temática proposta. Para tal, em
trios organizados por nós mesmos, discutimos e tivemos que tomar
decisões sobre qual metodologia ativa pesquisar e como apresentar. A
ferramenta de comunicação mais acessível para essas discussões foi o
aplicativo WhatsApp. Como tínhamos outras tarefas acadêmicas para
cumprir, enviávamos mensagens escritas e áudios umas às outras
nosso trio foi composto por três mulheres quando possível, até
mesmo de madrugada, fazendo sugestões conforme nosso
conhecimento a respeito do conteúdo solicitado. Foi nesse momento
que me dei conta de que conhecia apenas uma das metodologias
ativas, porém, sem muito aprofundamento. Entramos em acordo, por
meio do diálogo possibilitado pelo aplicativo, e iniciamos a busca por
artigos referentes ao trabalho com Projetos.
Esse processo, a princípio, desarranjou-me porque havia,
obviamente, participado de apresentações para as/os colegas na
Graduação, mas não na s-Graduação, na qual estamos
acostumados e acostumadas a seguir sozinhos realizando um trabalho
isolado ou, no máximo, com auxílio do orientador ou da orientadora
em relação ao nosso objeto de pesquisa. Exigiu de nós um trabalho
199
em equipe e a Assunção de Responsabilidade que, segundo Bereta
(2020), é quando o discente e a discente assumem a responsabilidade
sobre os seus processos de ensino e aprendizagem, o que promove
maior autonomia.
Conforme Bakhtin (2017a, p. 101), “E tudo em mim cada
movimento, cada gesto, cada experiência vivida, cada pensamento,
cada sentimento deve ser um ato responsável; é somente sob esta
condição que eu realmente vivo, não me separo das raízes ontológicas
do existir real”. Não poderia me furtar ao meu existir nesse processo
em que estava sendo chamada. Ao escolher cursar a disciplina em
questão, assumi o dever e a responsabilidade de realizá-la ativamente
com todo o meu ser. Portanto, ao não ser indiferente, protagonizei a
minha própria trajetória de aprendizagem sobre a qual reflito neste
escrito.
Tivemos autonomia desde a escolha da metodologia a ser
estudada ao formato de apresentação às/aos colegas. Não foi fácil. O
trabalho em trios exigiu iniciativa, escuta, paciência, consenso,
abertura às diferenças, discussão e, também por isso, foi relevante e
significativo. Embora a temática tivesse sido proposta pelas
professoras, ocorreu de fato a aprendizagem, uma vez que o conteúdo
partiu do nosso interesse na condição de grupo e foi pesquisado
conforme nosso ritmo. Apresentamos no formato no qual estávamos
mais habituados/as em nossos percursos de estudo. Acredito que
tenha sido produtivo para os/as colegas também por nos colocarmos
como protagonistas do nosso processo de aprender quando pudemos
nos posicionar como professores/as diante da turma em uma postura
dialógica. Afinal, estamos nos formando para sermos futuramente
200
professores/as universitários/as, por conseguinte, orientadores/as de
outros processos de aprender.
As apresentações das metodologias ativas pesquisadas pelos
trios, totalmente online, ocorreram em dois dias penúltima e últimas
aulas diferentemente do previsto, porque houve uma variedade de
estratégias adotadas, tais como: exposição com apoio do visual a partir
de telas criadas no Powerpoint, discussão/debate, exibição de vídeos e
imagens, exemplificações, o que favoreceu o envolvimento de
todos/as. Para mim, foi um momento muito rico de muitas trocas.
Como complementação, um professor universitário foi convidado
por uma das docentes a relatar a sua vivência com as metodologias
ativas com exemplificações concretas da utilização de algumas
abordagens no Ensino Superior, como a PBL Project Based Learning
(Aprendizagem por meio de Projetos ou de Problemas); TBL Team-
based Learning (Aprendizagem por Times).
Outra ação proposta pelas docentes que merece destaque foi
pensar em uma proposta de artigo a ser produzido, como avaliação
final da disciplina, e trocar ideias entre os pares com o objetivo de
realizar contribuições. Em duplas, trocamos as propostas de artigo e
contribuímos com apontamentos, sugestões, considerações, a partir
do nosso conhecimento a respeito da temática pensada pelo/a outro/a.
Depois tivemos, no último encontro virtual, espaço para expressar
essas contribuições a todos/as de modo que, ao ouvir cada proposta e
cada contribuição vinda de todas as outras pessoas, pude ressignificar
o meu objeto de pesquisa. Foi nesse momento que confirmei a ideia
do presente capítulo, cujos pensamentos agora materializo em
enunciados escritos como um vivo exemplo de que é possível
201
implementar as metodologias ativas no Ensino Superior, mesmo no
formato remoto.
Considerações Finais
Na introdução, procurei enfatizar a necessidade da
implementação das metodologias ativas no processo de ensino e de
aprendizagem, desde o início da escolarização da criança, mesmo com
foco no Ensino Superior, trazendo a importância da dialogicidade na
nossa constituição como seres humanos. E, por essa característica
maior, somos seres com necessidades da fala e da escuta para nossa
formação integral. É pelo diálogo, nas diversas manifestações, que
temos acesso à cultura humana e a oportunidade de nos humanizar
cada vez mais como seres reflexivos, éticos, críticos, criativos,
autônomos e transformadores do mundo.
É na escola que temos um grande espaço de convívio social e,
por isso, deve ser um espaço vivo, dinâmico, interativo, para nos
formarmos em alteridade. As metodologias ativas podem favorecer o
desenvolvimento de grandes pessoas por estarem fundamentadas no
princípio da autonomia. Ao conhecer pesquisas sobre a temática,
constatei que a multiplicidade de possibilidades de
desenvolvimento das metodologias ativas no processo de ensino e
aprendizagem, tais como: Aprendizagem Baseada em EquipeTeam
Based Learning TBL, Instrução Pelos Pares Peer Instruction,
Aprendizagem Baseada em Projeto Project Based Learning, Estudo
de caso Case of Study e a Aprendizagem Baseada em Problemas
Problem-Based Learning PBL, Sala de aula invertida, Espiral
ConstrutivistaEC.
202
Diante de tantas possibilidades, penso que o/a professor/a
deve conhecer cada uma delas para compreender a existência de
diversos caminhos nos quais: a/o estudante pode ser o centro do
processo de ensino e de aprendizagem; a sua participação docente é
de orientação desse processo; os conteúdos precisam ser articulados à
realidade e a avaliação processual. O professor deve compreender que,
para além de formar profissionais para o mercado de trabalho, a
necessidade da formação de pessoas dinâmicas, ativas, solidárias e que
saibam cooperar no mundo profissional, o qual demanda cada vez
mais inovações.
Ao pesquisar sobre as metodologias ativas existentes, fui
relembrando as metodologias realizadas pelos meus professores e
minhas professoras desde o meu ingresso na escola aos seis para sete
anos (1987) e refletindo sobre a minha trajetória escolar. Apenas
vivenciei essas metodologias a partir do CEFAM, porém, somente
hoje, a partir da realização dessa disciplina sobre a qual relato, tomei
consciência de que, sendo professora de Escola Municipal de Ensino
Fundamental (EMEF) vinte e um anos, conhecia apenas a
metodologia ativa conhecida por trabalho com projetos.
Sendo assim, essa disciplina, da forma como foi estruturada e
efetivada, possibilitou pertinentemente o conhecimento das tantas
outras metodologias ativas existentes e suas múltiplas formas de
realização. Entretanto, mesmo sem conhecê-las, sempre procurei agir
com diversidade do ponto de vista metodológico em minhas aulas e
não reproduzir o vivenciado por mim na Educação Básica, justamente
porque poderia ter tido um caminho mais produtivo, autônomo e
bem mais feliz. Agora posso teorizar e nomear o que fazia na prática.
203
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Disponível em:
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t. Acesso em: 27 nov. 2021.
207
9.
Formação de Professores e a Inclusão do Aluno Autista
no Ensino Fundamental I: uma Abordagem Ética
Davi Milan
Introdução
Ao se tratar a respeito da inclusão do aluno autista, deve-se
atentar para a formação do professor que atua com esse público
específico, visto que em geral, um desprovimento na habilitação
desse profissional. Diante desta problemática, o presente capítulo,
discute sobre a função do professor tendo em vistas a inclusão escolar
de crianças com autismo na educação básica, na rede regular de
ensino, dando importância a abordagem ética.
O transtorno do espectro autista (TEA) é ocasionado por
distúrbios neurológicos e de desenvolvimento que afetam a
comunicação e a interação das pessoas e seus sintomas surgem nos
primeiros anos de vida. Dentre as características apresentadas pelas
pessoas com TEA, podemos citar a dificuldade no relacionamento
social, comportamentos restritos e repetitivos, padrões anormais de
movimento e disfunção sensorial, além da dificuldade de alimentação
(LEAL et al., 2015).
A pessoa com autismo apresenta vários comportamentos
atípicos ao longo de sua trajetória independente do grau desse
https://doi.org/10.36311/2023.978-65-5954-397-7.p207-226
208
transtorno: birra, choro, risadas inapropriadas, automutilação, falta
de contato visual, impulsividade, comunicação social inapropriada e
movimentos repetitivos (OLIVEIRA, et al., 2022).
A inclusão é fundamental para a construção de uma sociedade
democrática. O respeito às diferenças e a igualdade de oportunidades
requer movimentos de ruptura com a exclusão. A inclusão é a garantia
a todos do acesso contínuo ao espaço comum na vida em sociedade,
que deverá estar organizada e orientada, respeitando a diversidade
humana, as diferenças individuais, promovendo igualdade de
oportunidades de desenvolvimento para toda a vida (GLAT, 1995).
A função da inclusão, principalmente em âmbito escolar, é de
superar as situações de exclusão, reconhecendo os direitos da
diversidade e estimulando a participação social plena na sociedade.
Embora a inclusão seja uma prática recente e incipiente nas nossas
escolas, ela é suficiente para questionar qual a forma ética de iluminar
as nossas ações na direção de uma escola para todos (MANTOAN,
2003).
Essa modalidade de educação exige um processo de
transformação da escola, que passa pela formação de professores, pelo
envolvimento de toda a comunidade escolar e que pode contribuir
para suavizar a angústia daqueles que vivenciaram esse processo e
auxilia no entendimento das diferenças entre integração e inclusão,
em que o professor desempenha como principal atribuição, a
mediação no processo inclusivo, promovendo uma relação de contato
do aluno autista com as demais crianças da sala de aula regular, sendo
responsável ainda por incl-lo nas rotinas desenvolvidas na sala de
aula.
209
A Inclusão do Aluno Autista e o
Sistema Educacional Brasileiro
Na lei 13.146, de 6 de julho de 2015, assegura-se o direito
da pessoa com deficiência à igualdade, inclusão social e cidadania. Em
seu artigo 27, é reforçado o direito à educação de qualidade para esse
público ao longo de toda a sua vida. Ao analisarmos o seu parágrafo
único, observamos que este trata de um compromisso importante que
o Estado, família, comunidade escolar, empregar uma educação à
pessoa com deficiência e extirpando toda discriminação e violência.
Art. 28. Incumbe ao poder público assegurar, criar,
desenvolver, implementar, incentivar, acompanhar e
avaliar:
I - Sistema educacional inclusivo em todos os níveis e
modalidades, bem como o aprendizado ao longo de toda a
vida;
II - Aprimoramento dos sistemas educacionais, visando a
garantir condições de acesso, permanência, participação e
aprendizagem, por meio da oferta de serviços e de recursos
de acessibilidade que eliminem as barreiras e promovam a
inclusão plena. (BRASIL, 2015)
“A concretização das diretrizes inclusivas, entretanto, enfrenta
diversos empecilhos na sua implementação”. Nas escolas no Brasil
uma certa precariedade em receber os estudantes com as suas diversas
especificidades e necessidades pois além da falta de preparo dos
docentes, ainda a estrutura precária (LIMA, LAPLANE, 2016 p.
270).
210
A inclusão dos alunos autistas na rede regular de ensino vai
muito além de estruturar os horários e adaptações curriculares, porém
exige mudança de cultura, hábito e pensamentos de toda a
comunidade escolar gestores, professores e corpo técnico da escola e
da sociedade como um todo. “Precisa-se de mais informação por parte
de todos, menos discriminação e mais articulação entre os setores
(educacional, saúde, assistência social e sociedade como um todo”
(MINATEL; MATISUKURA, 2015, p. 437).
Seguindo essa linha de raciocínio (SILVA, 2020, p. 17),
menciona sobre a inclusão das crianças autistas na escola que é
importante para o avanço intelectual e social desses alunos, pois “o
transtorno ao qual estão submetidas tem várias limitações, dentre eles,
o de convivência e a escola é um local propício e dar a elas essa
oportunidade, nada mais é questão de dignidade e de direito”. Nessa
perspectiva, havendo uma escola amparada estruturalmente e com
profissionais capacitados, haverá um desenvolvimento significativo
por parte desses alunos. Porém se não houver uma sistematização
coerente dos conteúdos pedagógicos o ensino e aprendizado desses
alunos ficará prejudicado.
De acordo com os dizeres de (TEODORO, et al, 2016,
p.132) “a inclusão de fato é muito mais do que incluir o aluno autista,
na sala de aula regular, pensa-se em primeiramente a efetivação da
capacitação dos profissionais da educação que receberão estes alunos”.
É de grande importância que os professores da escola, gestores e
funcionários conheçam as especificidades de cada aluno que
frequentarão a escola.
Conhecimentos básicos sobre o autismo proporcionará à
comunidade escolar informações importantes para agirem com maior
211
tranquilidade nos eventos do dia a dia. “Pensar em estratégias de
atividades a serem trabalhadas em sala de aula demanda dos
educadores analisarem as propostas curriculares e adaptarem as
atividades a cada vivência das crianças autistas”. (CHAVES, et. al
2014, p. 5 - 7).
Os alunos autistas m direito a educação de qualidade, sendo
este o princípio ético e básico da equidade de condições. Nesse
ambiente educacional deve ser ofertado a eles, currículo adaptado,
com atividades que desenvolvam o cognitivo, social e emocional,
espaço arquitetônico adaptado, ofertando-lhes oportunidade de
crescimento intelectual e social.
No quadro abaixo uma relação sobre a sistematização do
ensino e aprendizagem do aluno autista que são de suma importância
para que ocorra de fato uma educação humanizadora, acolhedora e
democrática, onde o princípio da igualdade e da oportunidade
estejam ladeadas pela formação intelectual e social do indivíduo com
TEA.
Quadro 1Sistema educacional, inclusão e a sistematização do ensino e
aprendizado do aluno autista
Sistematização
Preleção
Referência
Oportunidades
Princípio da igualdade e da oportunidade de
condições a todos sem discriminação
BRASIL,
1988
Isonomia
Uma sociedade que seja justa e igualitária
nas suas organizações e execuções
BULOS,
2002
Educação
Básica
Todos têm direito a uma educação básica e
de qualidade
BRASIL,
1988
212
Inclusão
A escola é um ambiente de
formação intelectual e social.
TEDESCO, 2005;
UNESCO, 2004;
GOMES;
GONZALES, 2007
Adaptação da
escola
Precariedade nas adaptações
arquitetônicas das escolas, deve
haver uma reformulação para
que ocorra maior comodidade
aos alunos autistas.
KHOURY, 2014
Formação de
seus
profissionais
Formação amena de seus
profissionais para atendimento
das crianças com deficiências e
nesse caso específico, crianças
autistas.
BRASIL, 2012
Recursos na
escola
Existe uma ausência muito
considerável de recursos dos
alunos nas escolas, tanto no
conceito humano (pessoas para
trabalharem, como no conceito
material, material pedagógico).
ROCHA et al., 2003;
JURDI, et al., 2004;
JUR-DI,
AMIRALIAN, 2006
Estratégias
Ausência de estratégia para que a
escola acolha os alunos com
deficiência e os assista de forma
eficaz.
ROCHA et al., 2003;
JURDI, et al., 2004;
JUR-DI,
AMIRALIAN, 2006
Preconceito/
Discriminação
Alunos autistas são vistos como
crianças diferentes sem
capacidade de aprender, de se
relacionar e de ter um
envolvimento com os seus pares.
ROSA;
MATSUKURA;
SQUASSONI, 2019
MINATEL;
MATSUKURA, 2015
213
Assistência
Falta de relacionamento próximo
da escola e da família, falta de
diálogo, acolhimento das famílias
e clareza nas objeções.
FERNANDES;
SARDAGNA, 2019
Desistência
A desistência dos estudos e a
evasão escolar são requisitos
muito latentes no contexto da
educação inclusiva.
MONTOAN (2003)
Fonte: Organização do autor/2022.
Como registrado no quadro 1 são vários os fatores que
desestimulam os alunos com TEA de se matricularem e permane-
cerem nas escolas e muitos dos alunos que permanecem não se
desenvolvem cognitiva e socialmente. “A inclusão proporciona aos
alunos com necessidades especiais a inclusão social e a troca entre os
demais alunos da sala de aula, eliminando todo preconceito”.
(PRAÇA, 2008, p. 53).
“A forma que alguns profissionais da educação comparam um
aluno com espectro autista e outros ditos “normais”, prejudica muito
o desenvolvimento dos alunos e perpetuar a inclusão, pois cada
indivíduo têm as suas peculiaridades”. (PRAÇA, 2008, p. 62).
O aprendizado, para as crianças com TEA, desenvolve-se de
forma mais lenta, isso ocorre porque a manutenção do foco e da
atenção no aprendizado caracteriza-se como um grande desafio,
devido à dificuldade de manutenção da concentração por período de
tempo prolongado. Assim sendo, se faz necessária a repetição para a
assimilação (LEAR, 2004).
214
Autores como (ORRÚ, 2012; WHITMAN, 2015; CUNHA,
2017; SCHMIDT, 2018) esclarecem que a comunicação verbal é
essencial à prática pedagógica, entretanto, a ausência dela não
inviabiliza o processo de ensino e aprendizagem. Considera-se, pois,
outras formas de comunicação para o estabelecimento da interação,
como a comunicação alternativa, citada anteriormente. Neste
sentido, é importante um olhar diferenciado à heterogeneidade do
Autismo, para cada indivíduo, considerando aspectos ligados à
interação e à comunicação, pois encontramos estudantes não-verbais,
verbalizados, ecolálicos ou diferentes outras dificuldades de
comunicação.
Cunha (2017) pontua ainda que, em virtude da complexidade
das intervenções, a demora em observar resultados, devem considerar
o foco nos processos de aprendizagem e não nos resultados. Entende-
se então que um acolhimento e intervenção pontuais são
fundamentais para o avanço dos alunos autistas no ensino e
aprendizagem.
Figura 1Dimensões interdependentes e inerentes da educação inclusiva
Fonte: GIMENEZ, Tácio Bueno
1
1
https://observatoriodeeducacao.institutounibanco.org.br/
215
Conforme pode ser observado na figura 1, para que haja uma
educação inclusiva de fato e a aprendizagem aconteça, precisa haver
parcerias importantes que auxiliem o desenvolver processos
significativos na educação.
Com relação aos elementos constituintes no infográfico,
podemos destacar:
a) Gestão escolar: A função dos gestores da escola é incentivar a
comunidade escolar para que a inclusão na escola aconteça,
incentivando os alunos, professores para essa necessidade.
Também promovendo na própria instituição ou instituições
parceiras momentos de capacitação. É responsável por organizar
espaços e recursos para a inclusão, favorecendo uma consciência
de aprendizagem nos alunos.
b) Políticas Públicas: Políticas que envolvem o Executivo,
Legislativo e Judiciário em busca de uma realização plena da
inclusão nos espaços escolares e afins. De acordo com a Política
Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação
Inclusiva do Brasil, os órgãos públicos devem garantir a oferta de
escolarização para os estudantes com deficiência, transtornos
globais do desenvolvimento (TGD) e altas habilidades/
superdotação na escola comum.
Além disso, devem suprir a demanda de atendimento educacional
especializada (AEE) para esse público. Para tanto, é necessário
prover acessibilidade em todos os níveis (da arquitetônica à
comunicacional), assim como formação de educadores e
funcionários, possibilitando a aprendizagem de estratégias
216
didáticas e pedagógicas para lidar com tais educandos (BRASIL,
2006).
c) Parcerias: As parcerias são de suma importância para que
ocorra a inclusão dos alunos nos espaços da sociedade em geral.
São parceiros que vêm somar nas instituições com apoio aos
processos de educação inclusiva. Parcerias entre escola e institui-
ções especializadas trazem para os alunos uma maior possibilidade
de aprendizado, pois estarão trabalhando em conjunto para a
efetivação da inclusão.
d) Famílias: A proximidade das famílias na vida escolar de seus
filhos é um fato muito importante. A participação nos eventos,
nas APMs (Associação de Pais e Mestres) da escola, enfim
participando ativamente das elaborações dos documentos, bem
como das atividades desenvolvidas no dia a dia da escola, sejam
elas pedagógicas ou não.
e) Estratégias pedagógicas: São estratégias para que o aluno
possa se desenvolver de forma efetiva e eficaz no processo de
ensino e aprendizagem. Auxiliam o aluno a construir seu
conhecimento a respeito de um determinado tema. (GIMENEZ,
2015).
A efetiva inclusão do aluno autista na escola acontece quando
um currículo que seja adaptado às necessidades de cada discente,
com estratégias pedagógicas coerentes e com professores capacitados.
217
Formação do Professor e o Ensino e Aprendizagem
do Aluno Autista, um Olhar Ético
Nesse tópico será dissertado sobre a formação do professor
que é uma realidade urgente na perspectiva de em ensino e
aprendizagem do aluno autista. Neste ínterim deve-se pensar em
estratégias que atendam as demandas desses alunos e que estes de fato
sejam acompanhados em suas peculiaridades e o que o direito de
aprender não seja negligenciado.
Pensando em uma educação que seja acolhedora, em que o
professor esteja capacitado para as intervenções necessárias com os
alunos, a ética e a moral soam como um processo muito positivo no
cotidiano das escolas de educação básica.
No que concerne a formação do professor nos moldes da ética
e moral, Bereta (2010, p. 103) traz à luz a seguinte ideia: “Quando
preocupação com a pessoa que está ao nosso alcance, quando
empatia de sentimentos e integração, dessa forma princípios éticos
enraizados no sistema de relações”.
A autora menciona, com destreza, acerca da formação do
professor e a relação com o aluno, em que a partir da existência do
cuidado e da empatia nas relações, uma margem significativa de
acontecer o ensino e aprendizagem. Segundo Bereta (2020, p.89),
Moral e ética implicam reflexões, que necessitam começar
desde o planejamento do Projeto Político Pedagógico da
escola, e da presença nestas discussões de todos os
envolvidos no sistema educacional, para que realmente
haja uma construção democrática e autônoma, tão
essencial para a educação moral.
218
Nessa linha de pensamento de formação docente Nóvoa
(1992, p. 9-11) traz que a formação continuada do professor não deve
ocorrer apenas no sentido de reciclagem, contudo deve haver a sua
qualificação para atuar nas diversas esferas do contexto escolar, tais
como: direção, coordenação, organização. “É preciso reconhecer as
deficiências científicas e a pobreza conceptual dos programas actuais
de formação de professores”.
Segundo os dizerem de Gatti (2017, p.726), “no campo da
docência de se formar professores críticos para que possam
acompanhar a efervescência dos meios de comunicação, do mundo
globalizado”. A educação tem um papel fundamental nesse cenário de
aprendizagem e os professores estão inseridos nesse contexto para
promover um ensino e aprendizagem sólidos para que as crianças,
adolescentes e jovens vivam nesse ambiente de forma natural e
modifique-o em momentos oportunos.
Não i existir estratégica pedagógica eficiente no cotidiano
escolar para o aluno com TEA, se o professor não estiver preparado
pedagogicamente, se não conhecer os seus alunos em suas
peculiaridades, pois se torna difícil ocorrer a inclusão. (GROSSI,
et.al., 2020).
Professor preparado com intervenções corretas, agindo
eticamente diante ao aprendizado do aluno e a interação do sujeito
com o meio onde vive, são quesitos muito saudáveis para o
desenvolvimento e crescimento intelectual e social das crianças com
TEA. As crianças, através de sua relação com o meio em que vivem,
desenvolvem-se sobremaneira. Até mesmo em uma brincadeira de
roda, de carrinho ou boneca, estão tendo um aprendizado muito
importante, inclusive observando a expressão do outro e expressando
219
as suas emoções. “Independentemente do que podemos perceber do
mundo, elas possuem uma percepção de maneira estruturada, isto é,
como um padrão de estímulos” (LEONTIEV, 2010, p.86).
Para haver estímulos aos alunos com TEA e para que a
inclusão seja efetivada nas salas de aulas nas escolas é preciso algumas
estratégias, que são elencadas por (OLIVEIRA, et al., 2022).
Algumas estratégias utilizadas para manter o sujeito com
autismo em sala de aula são: privilegiar vínculos afetivos;
utilizar linguagem objetiva; privilegiar as habilidades
individuais; propor pequenas tarefas, mesmo que sejam
diversas; incentivar sempre; propor atividades que
estimulem o pensamento lógico; adaptar o currículo, as
metodologias e o processo avaliativo; evitar atividades
muito longas; utilizar jogos; explorar o cotidiano; utilizar
abordagens sensoriais (visual, auditivo, cinestésico); propor
atividades baseadas no interesse do aluno; utilizar o
concreto e o lúdico, mesmo nos anos finais da Educação
Básica.
Dentro dessa perspectiva, Santos (2016, p.18) “menciona que
a razão pedagógica não pode se resumir a razão neurológica e
biológica. Contudo a razão ética deve predominar dentro do contexto
escolar para que a dignidade humana seja emancipada”.
No quadro abaixo estratégias para manter a atenção do
aluno autista em sala de aula, levando em consideração a dignidade
humana e a democratização do ensino e aprendizagem, utilizando
atividades lúdicas, jogos, linguagem objetiva, abordagens sensoriais,
220
adaptação de currículos, provas e avaliações, privilegiar habilidades,
atividades que estimulem o pensamento lógico, dentre outras.
Quadro 2Estratégias para manter a atenção do aluno autista em sala de aula
Estratégias
Descrição
Linguagem
objetiva
Evitar conotações e utilizar uma linguagem
compreensível e direta.
Abordagens
sensoriais
É muito comum que uma de suas habilidades seja mais
apurada que as das outras crianças, portanto é de suma
importância que os profissionais que trabalhem com
estas crianças estejam atentos ao barulho excessivo,
cheiro, para que o estímulo não seja prejudicado.
Adaptação de
currículos, provas e
avaliações
Os alunos com TEA, estão inseridos nas salas regulares
juntamente com outros alunos, porém as suas atividades
devem ser adaptadas de acordo com as suas realidades e
possibilidades.
Privilegiar
habilidades
Necessário que os profissionais que estão em contato
com os alunos com TEA estejam atentos às habilidades
que os autistas desenvolvem rapidamente e aguça-las.
Atividades
propostas de
acordo com o
interesse do aluno
Interessante trabalhar com as crianças com TEA
atividades com estímulos visuais e que a sala de aula
esteja organizada, atividades lúdicas e sempre
respeitando o tempo das crianças e observando o seu
interesse e aptidão.
Jogos
Através dos jogos ministrados para as crianças com
espectro autista é desenvolvido nelas as possibilidades,
potencialidades e habilidades importantes para
proporcionar o ensino e aprendizagem.
Evitar atividades
longas
Evitar atividades longas, pois não prenderão a atenção
das crianças com TEA e dessa forma não aprenderão os
conteúdos ministrados e desistirão do aprendizado.
Atividades que
estimulem o
pensamento lógico
Lembrando que cada um tem o seu tempo, os jogos e
atividades lúdicas desenvolverão o pensamento lógico,
sempre pensando na conexão à vida social e afetiva do
aluno.
221
Explorar o
cotidiano
As atividades do dia a dia, são importantes serem exploradas
desde a mais tenra idade. A consciência de lavar as mãos após
o uso do banheiro, jogar o lixo no local adequado, são
exemplos de atividades cotidianas importantes.
Propor
pequenas
tarefas
Explorar nos alunos pequenas tarefas diárias, sempre
incentivando-os e mostrando que são capazes.
Privilegiar
vínculos
afetivos
Desenvolver o convívio saudável e afetivo da criança autista
com os seus demais colegas. Incentivando-os e todos os seus
atos mesmo que pequenos devem ser reconhecidos.
Fonte: Adaptado pelo autor da Revista Instituto Neuro Saber, 2017.
“A dignidade do ser humano torna-se possível quando os
direitos são de fato concretizados e que todos independentemente de
classe social, raça, etnia, deficiência, sejam respeitados e valorizados
dentro de suas potencialidades”. Porém, falar em direitos humanos
torna-se uma tarefa complexa, levando em consideração o sistema
econômico excludente em que fazemos parte. (STRELHOW, 2012,
p. 48).
Na condição de estudantes que fazem parte do sistema
educacional, deve-se pensar em dignidade quando se menciona:
currículo adaptado, atenção ás individualidades e atividades que
fazem parte do cotidiano dos estudantes e que vão oportunizar
crescimento: tanto social quanto cognitivo.
Considerações Finais
Sentir-se incluído no ambiente escolar vai muito além de ter
o direito de matrícula garantido por lei. É importante e necessário que
a prática pedagógica da escola disponibilize ações e conteúdos que
sejam facilitadores no aprendizado, de forma que estimule as
222
potencialidades e interesses da criança com autismo de maneira que
possa ampliar o seu aprendizado.
É necessário, pois, enfatizar as pessoas autistas pelo fato de que
tais sujeitos são dotados de diversas qualidades, sejam de
personalidade, sentimentos, emoções, preferência, habilidades e
subjetividades.
A interação social entre pais e professores é um
comportamento de extrema necessidade que resulta em grandes
benefícios para o processo de aprendizagem da criança com autismo,
de modo que esta unidade favorece o processo educativo da criança e
torna a aprendizagem eficaz e significativa, além de promover a
superação das dificuldades das crianças autistas.
Nestes termos, além de acolhedora e inclusiva, é necessário
que a escola seja constituída de um local de aprendizado, socialização
e principalmente de constituição de bom relacionamento para todos
os alunos, sem restrição.
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227
10.
Construção da Personalidade Ética na Interação
entre Adolescentes e Professores no
Contexto do Ensino Médio
Rogério Melo de
Sena Costa
A formação acadêmica de professores é um tema de relevada
importância que gera a necessidade de um estudo mais aprofundado.
A disciplina A Formação Ética do Educador no Ensino Superior,
ofertada pela Unesp de Marília na Pós-Graduação em Educação,
possibilitou aos participantes maior amplitude, aprofundamento e
ressignificação dos horizontes conceituais e viabilizou este estudo.
Dessa forma, o presente capítulo tem por objetivo verificar a
seguinte hipótese: a personalidade/formação do professor de Ensino
Médio influencia (serve como autoridade moral) na formação da
personalidade do adolescente, que passa por uma fase crítica em seu
desenvolvimento devido à transição para a vida adulta? Para tanto,
foram exploradas teoricamente e inter-relacionadas as noções sobre
moralidade, personalidade ética, adolescência, cultura da vaidade,
Ensino Médio brasileiro e interação dentro da perspectiva piagetiana.
Este capítulo foi estruturado nas seguintes seções: Moralidade
e (construção da) personalidade ética - fundamentação teórica na área
da Psicologia Moral sob a perspectiva piagetiana; Desenvolvimento dos
adolescentes em meio à cultura da vaidade - algumas características da
https://doi.org/10.36311/2023.978-65-5954-397-7.p227-260
228
adolescência atreladas ao atual contexto tecnológico; Contexto do
Ensino dio: entre o discurso e a efetivação da formação integral -
características da atual proposta de Ensino Médio brasileiro, com
atenção ao discurso de formação integral; O papel das interações sociais
no desenvolvimento dos adolescentes - importância das interações sociais
afetivas como forma de minimizar as vulnerabilidades na formação
dos adolescentes; O papel das interações sociais entre adolescentes e
professores no contexto do Ensino Médio - como propiciar um ambiente
de aprendizagem favorável à superação do modelo tradicional de
ensino e a importância da função/formação docente na constituição
de personalidades éticas.
Moralidade e (construção da) personalidade ética
Como seria a vida em sociedade sem nenhum tipo de regra,
princípio ou valor que regulasse os juízos e ações humanas? Os
estudos sobre a moralidade nos permitem compreender essa
característica essencialmente humana e passível de evolução ao longo
de nossa biografia. Ter conhecimento sobre teorias e conceitos a
respeito da moralidade humana nos impele a refletir e agir de maneira
a contemplar mais o outro, o coletivo, expandindo nossos propósitos
para além dos interesses próprios. A moralidade não é desenvolvida
isoladamente, pois com ela aspectos cognitivos, emocionais e
conativos tecem inter-relações de causa e conseqncia. Além disso,
uma marca da moralidade é sua construção de natureza social.
A preocupação com a moralidade e a ética remete à
Antiguidade Clássica, pois na Filosofia Ocidental, a reflexão sobre a
vida que se devia viver estava presente nas ideias de Sócrates, Platão
229
e Aristóteles. Apesar de sua proximidade conceitual, os termos moral
e ética não podem ser tratados como sinônimos, pois o primeiro
carrega um significado associado à dimensão social, enquanto o
segundo à dimensão individual. A moral
1
se refere ao sistema de regras
e conjunto de valores que regulamentam as relações entre os
indivíduos na vida em sociedade, com vistas à manutenção da boa
ordem social (LEPRE, 2015). A ética, por sua vez, refere-se à reflexão
do indivíduo sobre seu comportamento prático, à consciência dos
critérios que utiliza para resolver dilemas morais e à aplicação do senso
moral. Em outras palavras, a moral se associa aos deveres em prol da
justiça, dignidade e generosidade, enquanto a ética se refere à reflexão
sobre os valores e princípios universais que levam o indivíduo à “vida
boa”, que “é consequência de um sentido de felicidade que contemple
o si mesmo e o outro, objeto da moral, e completa-se em instituições
em que um conteúdo moral esteja presente: a justiça” (TOGNETTA;
LA TAILLE, 2008).
Jean Piaget (1932/1994), em seu livro “O julgamento moral
na criança”, estabeleceu as bases teóricas para a compreensão do
desenvolvimento moral da criança. Numa perspectiva epistemológica
construtivista, Piaget afirma que esse desenvolvimento se constitui na
interação entre indivíduo e meio, ou seja, não é algo somente inato,
nem somente externo. Esses estudos inspiraram Lawrence Kohlberg
(1992) a desenvolver uma teoria do desenvolvimento moral, a partir
da necessidade de detalhar mais as condições de heteronomia e
autonomia moral descritas por Piaget. Três níveis de desenvolvimento
1
Algumas vezes o termo “ética” é utilizado para substituir o termo “moral”, pois
este carrega um sentido pejorativo associado ao significado do termo moralismo”,
que remete a algo mais autoritário (TOGNETTA e LA TAILLE, 2008).
230
moral foram apresentados por Kohlberg (pré-convencional,
convencional e pós-convencional), sendo que cada um desses níveis
apresenta dois estágios, totalizando seis, que são: 1- obediência e
punição (dependente de regras externas); 2- orientação instrumental-
relativista (levar vantagem pessoal); 3- “bom menino, boa menina”
(adotar uma mesma convenção estabelecida pelo grupo); 4- lei e
ordem (conjunto de regras de uma instituição que é levada a cabo,
mesmo que não faça sentido); 5- contrato social (visar o bem da
maioria, decisão utilitarista); 6- princípio ético universal (de base
kantiana: a máxima que me faz agir deve ser universalizável)
(BATAGLIA; MORAIS e LEPRE, 2010). Assim, pode-se afirmar
que os estudos de Piaget e Kohlberg são fundamentados na noção
kantiana de moralidade, que se constitui a partir da aplicação de
princípios universalizáveis, cuja finalidade é o bem comum da
humanidade.
Chama a atenção o entendimento sobre moralidade como
derivada de uma tríade/integração de propriedades humanas,
cognição-afeto-volição, que remete à noção aristotélica sobre o tema
(LEPRE, 2015). Piaget (1999) se dispôs a estudar a inteligência-
lógico-matemática argumentando que ela é condição necessária, mas
não suficiente, para um bom comportamento moral; ele também
afirmou que afeto e cognição são aspectos inseparáveis. Ao se dedicar
aos níveis de moralidade dos juízos emitidos pelas pessoas, Kohlberg
contribuiu, assim como Piaget, para uma melhor compreensão entre
a moralidade e o intelecto humano. Georg Lind, ao estudar o conceito
de “competência moral” definido por Kohlberg, relativo ao exercício
na ação dos mesmos princípios nos quais o indivíduo se baseia para
231
emitir juízos (BATAGLIA; MORAIS; LEPRE, 2010), aproximou a
moralidade ao aspecto conativo.
Ainda, em relação às propriedades humanas, de maneira geral,
a personalidade
2
corresponde ao modo de ser de uma pessoa frente às
interações que constrói com o meio, com os outros e consigo mesma.
A construção da personalidade também abarca o aspecto ético, uma
vez que requer do indivíduo reflexão/juízo, sentimentos/emoção e
ação/aplicação de fundo moral. De acordo com Tognetta e La Taille
(2008), uma articulação entre a dimensão moral (“como devo
agir?”) e a dimensão ética (“que vida eu quero viver?”), do ponto de
vista psicológico. Ao discutirem sobre a correspondência entre os
julgamentos morais e as representações que os sujeitos têm de si
mesmos esses autores apresentaram resultados de uma correlação
entre ética (como o sujeito se ) e moral (como julga as situações
morais, demonstrando sensibilidade aos sentimentos dos personagens
envolvidos).
La Taille (2002 apud TOGNETTA; LA TAILLE, 2008,
p. 182), conceituando o “eu como conjunto de
representações de si, sendo elas necessariamente valores e
2
"Personalidade é a organização mais ou menos estável e duradoura do caráter, do
temperamento, do intelecto e do físico de uma pessoa: organização que determina
sua adaptação total ao ambiente. Caráter designa o sistema de comportamento
conativo (vontade) mais ou menos estável e duradouro da pessoa. Temperamento
designa seu sistema mais ou menos estável e duradouro de comportamento afetivo
(emoção); intelecto, seu sistema mais ou menos estável e duradouro de
comportamento cognitivo (inteligência); físico, seu sistema mais ou menos estável
e duradouro de configuração corpórea e de dotação neuro-endócrina." (EYSENCK,
1953, p. 2 apud ABBAGNANO, 2007, p. 758).
232
cada indivíduo naturalmente motivado em ver a si próprio
por intermédio de representações de valor positivo, fala em
“personalidade ética”: os valores morais ocupam o centro
de tais representações e, por conseguinte, levam a pessoa
dotada a agir coerentemente com a moral.
Assim, é pertinente considerar a dimensão afetiva da
moralidade, bem como a perspectiva teórica que pensa a relação entre
a moral e o “eu” (self), o que inevitavelmente remete à constituição da
personalidade ética.
Piaget (1932/1994) afirmou ainda que a construção da
autonomia moral depende da socialização, da interação entre os
indivíduos, de um ambiente cooperativo, participativo e de respeito
mútuo. Kohlberg aplicou essa compreensão quando gerenciou o
funcionamento de uma “comunidade justa”, composta por jovens
estudantes de Ensino Médio nos Estados Unidos (BIAGGIO, 2006).
Apesar dos esforços de alguns autores para distanciar a teoria dos
domínios sociais de Turiel (1984) das teorias de Piaget e Kohlberg,
tais teorias apresentam a mesma perspectiva epistemológica, o
interacionismo (LOURENÇO, 2014). De acordo com a teoria de
Elliot Turiel (1984), as pessoas interagem umas com as outras
definindo, interpretando e julgando as relações sociais; atuam,
portanto, ativamente na construção das categorias fundamentais do
conhecimento social, em interação com o meio. Constituem-se numa
relação recíproca, pois além de estarem sob influência do meio,
também o modificam, construindo suas organizações sociais e morais.
Sendo assim, independentemente das contribuições particulares dos
estudiosos sobre a moralidade, é notório o papel das interações sociais
233
para o desenvolvimento moral dos indivíduos em prol de uma
autonomia moral. Então, não cabe tratar a educação moral dos
adolescentes como algo desconectado das interações sociais que se
estabelecem em diversos contextos.
Pesquisas e outros trabalhos acadêmicos têm sido feitos com
a temática do desenvolvimento moral de adolescentes nas escolas.
Bataglia (2014), em consonância com as ideias de Kohlberg e Lind,
apresenta a discussão de dilemas morais como uma forma de
promover a educação moral dos adolescentes. Graziella Diniz Borges
(2017) avalia a adesão a valores morais (respeito, solidariedade, justiça
e convivência democrática) por alunos do ensino fundamental II e
médio identificando uma perspectiva social egocêntrica e indicando
que tais valores devem ser trabalhados nas escolas. Kadooka, Lepre e
Evangelista (2019) destacam que as novas tecnologias da informação
e comunicação (NTICs) alteraram o processo de desenvolvimento,
aprendizagem, interação e comunicação das crianças/adolescentes.
Um novo paradigma no qual estariam relativizadas as posições do
educador/autoridade e do educando, o que acaba por influenciar o
desenvolvimento social, afetivo, moral e cognitivo desses indivíduos.
Considerando alguns dos principais aspectos apresentados
sobre a moralidade (passível de evolução rumo à autonomia moral,
de natureza complexa e construída por meio de interações) e a
construção da personalidade ética (representação de si não
egocêntrica), cabe aqui defender propostas de educação moral.
Renunciar a estratégias que promovam o bem comum significa optar
por desumanizar a sociedade, pois o conhecimento sobre moralidade
nos impele a conscientizar os indivíduos e instrumentalizá-los para
resolver dilemas morais, tais quais os propostos por Kohlberg, mas em
234
situações reais cotidianas. Ou seja, é imperativo viabilizar a educação
moral das pessoas, porque, com base nessa educação, podem ser
minimizadas condições de vulnerabilidade humana, que geralmente
têm suas fontes estruturais em arranjos políticos e econômicos
arquitetados para o exercício assimétrico de poder de poucos sobre
muitos (MACKENZIE; ROGERS; DODDS, 2014).
Desenvolvimento dos adolescentes em meio à cultura da vaidade
Compreender o adolescente em sua integralidade e
diversidade, bem como as interações que estabelece é de fundamental
relevância quando se projeta uma sociedade formada por adultos bem
desenvolvidos, seja academicamente, seja moralmente. Acompanhar
as rápidas transformações do mundo contemporâneo, em termos de
tecnologia e sustentabilidade, e perceber como o adolescente participa
delas, como ele se sente, pensa e age, torna-se condição para propor
uma educação adequada. Entende-se, assim, que o cuidado do
adolescente é de interesse estratégico por parte daqueles que
genuinamente se dedicam ao bem comum, pois naquele reside uma
potência de caráter que se desdobrará ao longo de sua biografia e
marcará suas interações sociais.
A adolescência é caracterizada por ser um período em que o
adolescente sofre profundas transformações físicas e psicossociais,
uma vez que deixa a condição de criança e gradativamente se
aproxima da condição de adulto. Segundo Piaget (1999), por volta
dos 12 anos destacam-se o pensamento operatório formal, a
capacidade de raciocínio abstrato, reflexão propositiva, dedução e
elaboração de hipóteses. Ou seja, no que se refere ao desenvolvimento
235
cognitivo, a adolescência instrumentaliza o indivíduo a pensar a
realidade de outra maneira, a refletir sobre si mesmo e suas ações e,
assim, a superar seu egocentrismo juvenil (inteligência como condão
necessária para o desenvolvimento moral).
Além disso, Damon (2009) define a adolescência como uma
“baldeação” rumo a uma autoidentidade e defende a importância de
os adolescentes gastarem tempo pensando no futuro e procurando
oportunidades que correspondam a seus interesses. Em consonância,
Guhur, Alberto e Carniatto (2010), ao investigarem o significado do
exame vestibular para os adolescentes, explicam que isso ocorre
quando estes se veem muito indecisos quanto à sua própria
identidade. Esses autores também citam os “lutos” vivenciados pelo
adolescente no campo afetivo, cognitivo e social: 1- luto pelo corpo
infantil; 2- luto pela quebra de dependência familiar; e 3- perda da
fantasia da família ideal e busca por uma nova identidade em outro
contexto social (grupo), com marcas específicas (gestos, roupas,
linguagens) de igualização com os pares. Assim, importa ressaltar as
peculiaridades da adolescência como etapa do desenvolvimento
humano, marcada pela transitoriedade. A questão é o que surge a
partir desse “transitório”, para o próprio adolescente e para aqueles
com os quais interage.
É certo que a adolescência desemboca na vida adulta, com ou
sem a construção de um projeto de vida. A respeito desse tema,
Damon (2009) aborda a autoria de projetos vitais nobres por parte
dos adolescentes, um propósito para seus atos e que seja constituinte
de sua identidade. Não se trata de projetos de felicidade individual,
mas sim de caráter coletivo, caracterizados pela intenção de fazer a
diferença no mundo e contribuir para a sociedade. Atualmente o
236
grande problema é a sensação de vazio (insegurança, ansiedade) nos
adolescentes, sendo que deveriam definir seu rumo e agir para tal. Eles
vivem a tensão entre o que é gratificante (mundo do trabalho) e o que
é significativo (próprios sonhos e ideais), uma indecisão que tem
resultado em amadurecimento tardio. De acordo com o autor, a
consciência do adolescente atual de que te de fazer a transição para
a vida adulta pode causar ansiedade/depressão ou mesmo uma
paralisia. Nesse sentido, preocupa saber que, na maioria dos casos,
falta ao adolescente uma dedicação ria a uma atividade que venha
de um projeto vital sincero, que significado e direcionamento à
vida. Logo, diante de uma sensação de vazio ou indecisão, um forte
indício da vulnerabilidade dos adolescentes a fatores manipuladores
externos.
Também é relevante abordar a questão geracional que envolve
os adolescentes considerados nativos digitais. Kadooka e Lepre (2018)
esclarecem um fenômeno recente de incomunicabilidade entre os
nativos digitais e os adultos próximos que servem como
modelo/autoridade: no que se refere à internet, redes sociais e novas
tecnologias, o adulto perde sua hierarquia em relação à
criança/adolescente, e invertem-se, eno, os papéis (“o adulto não
sabe”, “a criança/o adolescente sabe”). Entretanto, no desenvolvi-
mento da moralidade, na noção piagetiana, a criança depende de uma
relação assimétrica com o adulto/autoridade, que é quem transmite a
regra (valor moral). A convivência de gerações distintas em suas
estruturas de pensamento, influenciadas qualitativa e quantitativa-
mente de formas diferentes pelas novas tecnologias digitais, está mais
para um não-encontro, ou mesmo um embate. Logo, os nativos
digitais interagem menos com pais e professores (estão mais
237
solitários), apresentam baixas resiliência e volição, são imediatistas e
individualistas, estão mais infelizes (nunca se satisfazem, tudo é chato)
e mais dependentes.
Nessa tendência de diminuição de interações humanas face a
face, Twenge (2020) aponta uma correlação entre o aumento dos
casos de depressão, automutilação e suicídio desde 2011 entre
adolescentes americanos e aumento do tempo gasto com tecnologia e
o ciberespaço. A propósito, essa autora cunhou o termo iGenpara
identificar a “geração smartphone”, uma geração de adolescentes cada
vez mais solitários, que vem amadurecendo mais lentamente que as
anteriores, e menos preparados para a vida adulta. Esse termoiGen
(“I generation”: “geração do eu”) remete ao sentido do “eu” do
adolescente não somente pelo viés da solidão ou isolamento das
relações humanas, com provável maior interação com a
máquina/tecnologia, mas também pelo viés do self (“eu”,
“próprio”), expresso pelo comportamento agora habitual de “tirar
uma selfie”, uma fotografia de si mesmo para publicação nas redes
sociais on-line.
É inegável a preocupação de boa parte dos adolescentes com
a sua imagem perante os olhos dos outros. O uso exacerbado da
imagem, a apologia às selfies, revela a necessidade de mostrar que
deseja uma suposta felicidade do outro, mas isso não significa que
haja o genuíno interesse de felicidade, inclusive consigo mesmo, pois
nas redes sociais on-line não faltam sorrisos “amarelos” de
pseudofelicidade em cenários inspirados no luxo (e muitas vezes
também na luxúria); é muito mais uma questão de exibicionismo, um
apelo ao consumismo, uma cultura da vaidade e do espetáculo (LA
TAILLE, 2009).
238
Num mundo cheio de câmeras e holofotes, no amálgama do
espaço real com o virtual, no limite tênue entre o que é privado e o
que é público, o adolescente é tolhido de ser simplesmente quem é,
ou define uma versão paralela de si mesmo, quando expõe seu “avatar
pseudofeliz”, que é a versão imagética pela qual é julgado no ambiente
virtual, onde faz a própria publicização. Tal superficialidade e
esvaziamento de si estão entranhados na vida dos adolescentes, que
tendem a jogar para segundo plano as figuras de autoridade (grandes
pensadores, artistas, pesquisadores etc.), tão importantes como
referência no momento de constituição de sua identidade. Através do
grande sucesso e visibilidade, as celebridades (youtubers, digital
influencers etc.) tomaram o lugar das autoridades e passaram a ser os
ídolos dos adolescentes. “Deve-se estar atento ao contexto no qual
evoluem as crianças e adolescentes, inclusive o fato de estarmos
educando em uma cultura da vaidade’” (LA TAILLE, 2009, p. 276).
Contexto do Ensino Médio:
entre o discurso e a efetivão da formação integral
A educação é direito de todos e dever do Estado. Uma vez que
a sociedade vivenciasse o Estado como coisa sua, a educação seria
priorizada e cuidada pelo reforço de seu caráter público (SAVIANI,
2010). O Ensino Médio compõe a educação básica dos cidadãos
brasileiros e é, antes de tudo, um direito dos mesmos. Contudo,
muito se discute a respeito da função do Ensino Médio, seu modelo
engessado (ainda essencialmente disciplinar, teórico, conteudista e
modelado pelas exigências do Exame Nacional do Ensino Médio e
demais vestibulares), sua configuração como espaço de uma cultura
239
de diversão, e como viabiliza, ou não, os projetos de vida dos
adolescentes. Diante desse cenário, para além de que seja meramente
reformulado quanto à sua organização e estrutura curricular, defende-
se que o Ensino Médio oportunize ao adolescente uma efetiva
formação integral.
Está sendo implementado o “Novo Ensino Médio”, um
programa nacional de reformulação dessa etapa da formação básica
previsto no Plano Nacional de Educação de 2014, com prazo de
adaptação das escolas até março de 2022 (BRASIL, 2018b), que se
mostra como uma oportunidade de efetivar uma educação de melhor
qualidade em prol dos jovens entre 15 e 18 anos. Segundo a
organização não governamental “Todos pela Educação” (2022), em
2021, a cada 100 jovens brasileiros de 19 anos, apenas 65%
concluíram o Ensino Médio; em 2019, dentre os estudantes da
série do Ensino Médio das redes públicas e privadas 37,1%
aprenderam língua portuguesa adequadamente e somente 10,3%
aprenderam matemática adequadamente. Esse cenário crítico traz
como consequências o a falta de preparo para as atividades cotidianas
da vida adulta e para o mundo do trabalho, sem contar que o ensino
superior é pouco acessado, pois fica restrito à uma pequena parcela da
população
3
. A baixa permanência dos jovens no Ensino Médio, assim
como a baixa motivação e a alta resistência a construções de sentido
do aprendizado como algo inserido em um projeto de vida a longo
prazo resultam no predomínio de uma cultura de diversão nos espaços
3
De acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (2019), em 2019,
a taxa de escolarização das pessoas de 18 a 24 anos, independentemente do curso
frequentado, foi de 32,4%, sendo que 21,4% desses jovens frequentavam cursos da
educação superior e 11% estavam atrasados.
240
escolares (OLIVEIRA; TOMAZETTI, 2012). Assim, fica evidente a
necessidade de um novo modelo educacional para o Ensino Médio
brasileiro, de tal forma que seja aderente à atual realidade dos
adolescentes e atenda/ressignifique seus interesses.
Regulamentações e documentos orientadores foram
construídos para a implementação do novo Ensino Médio. Quanto
aos referenciais para os currículos, podem ser citados a Base Nacional
Comum Curricular (BNCC) - Ensino Médio (BRASIL, 2018a) e os
referenciais para elaboração dos itinerários formativos (BRASIL,
2018c). Chama a atenção que tais documentos normativos defendem
para o Ensino Médio: uma formação geral básica com foco no
desenvolvimento de habilidades e competências, as quais estão
descritas na BNCC; o protagonismo juvenil, incentivado por meio
dos chamados itinerários formativos (parte flexível do currículo que é
escolhida pelo jovem de acordo com seus interesses); a possibilidade
de formação técnica e profissional; e a ampliação da carga horária, de
2400 horas para pelo menos 3000 horas, das quais 1800 horas estão
asseguradas para a formação geral básica (BRASIL, 2018b). Esses
documentos ainda abordam uma concepção de adolescente/jovem em
suas dimensões intelectual, física, afetiva, social, ética, moral e
simbólica, bem como valorizam a formação ética e orientada para a
tomada de decisões responsáveis, em prol da autonomia e cidadania.
Art. - O ensino médio em todas as suas modalidades de
ensino e as suas formas de organização e oferta [...] será
orientado pelos seguintes princípios específicos: I -
formação integral do estudante, expressa por valores,
aspectos físicos, cognitivos e socioemocionais; II - projeto
241
de vida como estratégia de reflexão sobre trajetória escolar
na construção das dimensões pessoal, cidadã e profissional
do estudante; [...] IV - respeito aos direitos humanos como
direito universal; [...] VIII - indissociabilidade entre
educação e prática social, considerando-se a historicidade
dos conhecimentos e dos protagonistas do processo
educativo [...] (BRASIL, 2018d, p. 2).
Apesar de haver pontos positivos no desenho desse novo
modelo, como o discurso de formação integral e protagonismo
juvenil, também pontos passíveis de questionamento, seja na
concepção ideológica, seja nas dificuldades para a concretização de
seu processo de implementação. posicionamento crítico em
relação a essa proposta de reformulação do Ensino Médio, apontando
que, na realidade, a flexibilização curricular tende a ser restritiva na
formação do jovem. Para exemplificar, a respeito dos itinerários
formativos na BNCC do Ensino Médio, Alice Casimiro Lopes (2019)
debate o enfoque dado à formação técnica e profissional (que seria
uma meta política fixada a priori, voltada à preparação para o mundo
do trabalho, na tentativa de controle dos projetos de vida dos
estudantes) e a relativização da importância dos conhecimentos
escolares na área de humanidades, como em filosofia e sociologia,
disciplinas que representam um espaço de pensamento crítico e
formação para a cidadania.
La Taille (2009) defende a presença da filosofia e ciências
humanas no currículo escolar para adolescentes no Ensino Médio,
por conta da maior maturidade intelectual, disposição para reflexão
sobre temas sociais, pensamento hipotético-dedutivo e,
principalmente, por oportunizar uma instância de educação moral.
242
Aliás, esse autor confirma a escola como instituição adequada para
ajudar os alunos a tomarem consciência das características do espaço
público: “como pode ela [a escola] delegar exclusivamente à família o
ensino de regras, princípios e valores que valem essencialmente para
as relações sociais típicas da própria escola?” (LA TAILLE, 2009, p.
232).
Ainda no contexto educacional, cabe abordar um ambiente
acadêmico favorável à aprendizagem, em que a formação e atuação
docente influenciem no processo de construção de personalidades
éticas, seja dos próprios professores, seja dos estudantes, superando o
mero aspecto cognitivo, independentemente do vel de ensino.
Morais et al. (2017) identificaram oportunidades de assunção de
responsabilidade e de reflexão dirigida em um curso superior de
Pedagogia, na percepção de alunos e professores. Tais oportunidades
se referem à possibilidade de aplicação do conhecimento em situações
reais e/ou experimentais que exigem do estudante envolvimento e
responsabilização, como a troca de perspectivas, a participação ativa e
a tomada de decisões de modo compromissado. Essas situações devem
ser, preferencialmente, acompanhadas por professores, autoridades
ou alunos mais experientes, a fim de proporcionar uma reflexão
dirigida e um aconselhamento competente sobre os problemas
relacionados ao processo de aprendizagem. Logo, as atividades em que
podem ocorrer a assunção de responsabilidade e a reflexão dirigida
correspondem a um ambiente acadêmico favorável à aprendizagem,
pois não se restringem às competências intelectuais e profissionais,
mas contribuem para a formação integral dos envolvidos, em suas
dimensões emocionais e sociomorais, por exemplo. Nesse sentido,
Morais et al. (2017) ressaltam a importância da articulação entre
243
teoria e prática na função docente, bem como sinalizam que a
formação do professor se de forma contínua e contempla a reflexão
sobre sua prática, para além do conteúdo e da cnica.
Em suma, o Ensino Médio se mostra como terreno de direito
de formação integral dos adolescentes brasileiros, porém, ainda se
apresenta na versão “areia movediça”, pois, apesar da dinâmica atual
em torno da implementação da BNCC, está mais constituído por
elementos ideológicos e políticos capazes de tragar uma educação para
o exercício da cidadania plena do que servindo como base firme para
construção de uma sociedade consciente e em prol do bem público.
Na contramão desse cenário predominantemente discursivo, destaca-
se a formação e atuação do profissional da área de Educação, como
facilitador de oportunidades de assunção de responsabilidade e
reflexão dirigida, que se alinham com a noção de protagonismo
juvenil preconizada na BNCC e com a construção de personalidades
éticas no contexto do Ensino Médio.
O papel das interações sociais no desenvolvimento
dos adolescentes
A adolescência é uma fase crítica do desenvolvimento
humano, que exige adaptações, pois se trata de uma transição para a
vida adulta. Tanto cognitivamente quanto moralmente o adolescente
passa por transformações que influenciam no desenho de seu futuro.
Mas, imersos em uma atual cultura da vaidade, os adolescentes estão
cada vez mais carentes de interações genuinamente humanas face a
face, algo que os distancia da autonomia moral. O egocentrismo tem
sido reforçado entre os nativos digitais, que mais se alimentam das
244
selfies, da publicização de si, do que de um plano de felicidade
coletiva. Sendo assim, como o projeto de vida do adolescente pode
ser enriquecido pelas interações sociais, tirando-o da solidão/vaidade,
da condição de vulnerável e heterônomo?
O pensamento do adolescente (formal) difere-se do
pensamento da criança (concreto). Além da estrutura de classes e das
relações, ele apresenta a lógica das proposições: elabora hipóteses,
planeja e executa experimentos, observa resultados e tira conclusões.
O adolescente constrói novas teorias e reflete sobre o seu pensamento.
O comportamento adolescente não depende apenas dessa estrutura
cognitiva amadurecida, nem somente do despertar da sexualidade,
mas também do meio social no qual está inserido. O esforço
empenhado para ingressar na vida adulta gera desequilíbrios, à
medida que a lógica do adolescente se confronta com diferentes
pontos de vista dos adultos, com sucessivos ciclos de aprendizagem e
adaptação (PIAGET; INHELDER, 1976).
Embora não tenha dedicado suas pesquisas à temática dos
afetos, Piaget chegou a dizer que as angústias desse
momento, a chamada crise da adolescência, são
determinadas pelo futuro, ao contrário do que pensava
Freud, para quem essa problemática era decorrente do
retorno de desejos reprimidos na infância [...]. Ao
visualizar o futuro, sem ter meios para realizá-lo, o jovem,
muitas vezes, revolta-se contra autoridades e situações
estabelecidas. (CUNHA, 2008, p. 75).
Na maioria dos casos, o adolescente se sente inseguro diante
da responsabilidade ou mesmo possibilidade de elaborar seu projeto
245
de vida. A autopercepção das aptidões a serem desenvolvidas
profissionalmente e a disponibilidade para interações sociais face a
face (entre pares ou com adultos/autoridades morais) ficam em
segundo plano, pois, ao ter o smartphone como uma quase extensão
do próprio corpo, os adolescentes priorizam os prazeres do
ciberespaço. Longe de serem inócuos, os ambientes virtuais,
principalmente as redes sociais on-line, estão impregnados de
inteligência artificial prontamente programada para atender aos
interesses do mercado de consumo, com seus mecanismos de captação
de dados e preferências pessoais, de indução de trajetórias e
conteúdos, enfim, de controle. A correlação entre o tempo gasto com
a tecnologia e o aumento do número de casos de depressão,
automutilação e suicídios entre adolescentes indica que eles estão mais
solitários e vulneráveis.
Segundo Piaget (1972/2008, p. 46), “o período de 15 a 20
anos marca o início da especialização profissional e consequentemente
também a construção de um programa de vida de acordo com as
aptidões do indivíduo”. Os lutos que marcam a passagem para a vida
adulta, as expectativas de amadurecimento e de assunção de
responsabilidade são vivenciados/sofridos pelos adolescentes. Muitas
vezes eles são pressionados pelos pais, pela escola ou por eles mesmos
a se posicionarem, a resolverem problemas e a tomarem decisões sobre
o próprio futuro. Porém, os adolescentes apresentam um apreço à
subjetividade, ao sentimento de insegurança e de autoafirmação, bem
como seus planos de vida estão mais voltados ao contexto privado, às
necessidades materiais e ao apego familiar (TARDELI; ARANTES,
2021). Isso torna a função docente desafiadora, pois a noção de
autorrealização dos adolescentes não se configura como um projeto
246
de felicidade coletiva (voltado ao bem comum), não é próprio de uma
personalidade ética.
Portanto, em termos de evolução moral da sociedade, é
relevante incentivar interações sociais nas quais a tecnologia não seja
protagonista/dominante, nem um fim em si mesma. Considerando a
tese piagetiana da indissociabilidade indivíduo-sociedade, compre-
ende-se que as interações sociais produzem características novas e
transformam o indivíduo em sua estrutura mental, podendo ser de
natureza coercitiva ou de opressão e de cooperação ou de
solidariedade (DONGO-MONTOYA, 2017). Defende-se, então, as
interações sociais de cooperação, que potencializam a construção de
personalidades éticas, inclusive no contexto educativo. De acordo
com Bereta (2020, p. 103):
A formação dos sujeitos no processo educacional somente
estará pautada nos princípios éticos quando realmente
houver uma preocupação com o outro, quando
identificarmos os nossos sentimentos e os do outro,
interligados neste complexo sistema de relações.
O papel das interações sociais entre adolescentes e
professores no contexto do Ensino Médio
O contexto do Ensino Médio brasileiro está sendo construído
com base num discurso de formação integral dos estudantes. Mas a
efetivação desse discurso depende de novas interações, que superem a
superficialidade do modelo de educação tradicional. Os adolescentes
precisam de um ambiente favorável para a constituição de suas
personalidades, personalidades éticas, preferencialmente. Os
247
professores do Ensino Médio, por sua vez, precisam de oportunidades
de formação nas quais sejam discutidos os conceitos do campo da
educação moral, tanto para que exerçam um papel de autoridade
perante os estudantes, quanto para que reflitam sobre sua própria
personalidade e evoluam eticamente. Em termos de desenvolvimento
moral, objetivando uma sociedade mais justa, defende-se a aplicação
de metodologias ativas nos processos de ensino, assim como a
ocorrência de interações afetivas entre os adolescentes e professores
para a potencialização das aprendizagens.
De acordo com a noção piagetiana de aprendizagem e de
desenvolvimento cognitivo, a ação precede a representação, algo que
também se expressa na vida em sociedade e no desenvolvimento
coletivo, pois as operações, a organização e reorganização da ação
humana (individual e coletiva) promovem conflitos e desequilíbrios,
até que sejam alcançados estados de equilíbrio relativamente estáveis
e tomada de consciência mais profunda (DONGO-MONTOYA,
2017). Entendendo esse caminho de desenvolvimento cognitivo,
desde a ação material do ser humano sobre os objetos até a
consciência, é plausível considerar o caminho inverso, de
desenvolvimento moral, desde o juízo moral até a ação moral. E,
intermediando esses polos da ão e do juízo/representação,
independentemente do caminho de desenvolvimento (cognitivo ou
moral), apresenta-se a afetividade. No plano moral (“como devo
agir?”), a afetividade pode ser entendida como a capacidade de
sensibilizar-se com o outro, algo que regula a conduta do indivíduo
em sociedade (afetividade interindividual), e não deixa de compor o
plano ético (“que vida eu quero viver?”), pois possibilita refletir sobre
si mesmo (afetividade intraindividual). “As ligações afetivas (amizade,
248
parentesco, exposição da intimidade, vergonha) são fatores
importantes na determinação da moralidade, bem como na
diferenciação do juízo moral expresso e da ação” (BERETA, 2020, p.
106).
[...] Desta forma, se as instituições educacionais não
reconhecerem a necessidade de considerar os sentimentos,
não haverá como controlar os comportamentos, pois é a
energia que alimenta a ação, e é por esta energia que será
construído o respeito por si. É com essa grande
contribuição da Psicologia Moral, que nos permite
concluir que somente no momento em que os estudantes
desejarem serem vistos como generosos, justos e solidários
é que temos a possibilidade de serem sensíveis aos
sentimentos dos demais (TOGNETTA, 2009 apud
BERETA, 2020, p. 110).
Em termos didáticos, a função docente que viabiliza a
aplicação de metodologias ativas no Ensino dio contribui para o
amadurecimento dos adolescentes, para a elaboração de seus projetos
vitais nobres e transição para a vida adulta, incluindo o ingresso no
ensino superior. Considerando que os documentos normativos
relativos ao Ensino dio defendem o desenvolvimento de
habilidades e competências, o protagonismo juvenil, cabe questionar:
a escola tradicional consegue promover a formação integral, a
almejada constituição de personalidades éticas? O viés conteudista do
Ensino Médio, o foco na transmissão de informações centrada na
figura do professor, impossibilita responder afirmativamente à
questão posta. Ainda muito apelo a operações formais, a
249
representações, a abstrações, sem suporte do aspecto afetivo, sem um
ambiente favorável à aprendizagem, e poucas oportunidades de
interação social durante as aulas (que exijam cooperação e
solidariedade, e suscitam assunção de responsabilidade), pouca
reflexão dirigida e pouco atendimento às aptidões e aos reais interesses
dos estudantes. A escola tem o papel de auxiliar na construção de
ferramentas cognitivas para a inserção ativa do indivíduo na
sociedade, para que ele possa compreender os processos sociais e
políticos em que está envolvido, contribuindo para o seu
aperfeiçoamento (CUNHA, 2008). Esforços para que esse papel seja
efetivamente realizado são coerentes com um projeto de sociedade
que se posiciona contra a solidão, passividade, vulnerabilidade e
opressão, ao contrário, a favor dos valores humanos mais elevados,
universalizáveis.
No entanto, a formação e a conclusão de estruturas
cognitivas implicam toda uma série de trocas e um
ambiente estimulante; a formação de operações sempre
requer um ambiente favorável para a ‘cooperação’, ou seja,
operações realizadas em comum (por exemplo, o papel da
discussão, crítica ou apoio mútuo, problemas levantados
como resultado de trocas de informações, curiosidade
aumentada devido à influência cultural de um grupo social,
etc.). (PIAGET, 1972/2008, p. 44).
Diante do exposto, evidencia-se que as interações sociais entre
professores e alunos do Ensino dio favorecem a construção de
personalidades éticas. Apesar do fenômeno recente de incomuni-
cabilidade entre os nativos digitais e os adultos próximos que servem
250
como referência (KADOOKA e LEPRE, 2018), os professores não
precisam nem devem desistir do papel de figura de autoridade
relevante no processo de constituição da identidade dos adolescentes.
Argumenta-se, assim, que a personalidade do professor influencia na
formação da personalidade do adolescente do Ensino Médio, por ter
um potencial educativo transformador. Cabe também ressaltar que
autoridade no ambiente escolar não significa que o professor deva ser
autoritário, por exemplo, mas que, por meio de sua conduta,
possibilite que o estudante perceba as razões pelas quais deve proceder
de uma maneira e não de outra (CUNHA, 2008).
Quando se fala em educação moral, a consideração dos
aspectos afetivos é tão importante quanto os cognitivos,
pois moralidade não pode ser ensinada como qualquer
outro conteúdo em que uma pessoa ensina e a outra
aprende de forma passiva. (BERETA, 2020, p. 113).
Contudo, é inevitável levantar alguns questionamentos diante
dessa argumentação a favor do professor como autoridade moral e das
interações afetivas. O professor tem formação para proporcionar isso
aos alunos? O professor tem conhecimento de como se forma uma
personalidade ética? O estudante, numa fase crítica do seu
desenvolvimento, na transição para a vida adulta, muitas vezes prestes
a migrar do Ensino Médio para o ensino superior, carece de uma
autoridade acadêmica e moral à altura desses desafios da adolescência.
Barrios; Marinho-Araújo e Branco (2011) afirmam a necessidade da
formação do professor quanto à promoção do desenvolvimento moral
de seus alunos, centrada no desenvolvimento de valores,
251
competências e recursos pessoais necessários à internalização ativa e à
coconstrução de uma cultura comprometida com a ética e com a
moral. Carvalho e Almeida (2011) verificaram que os professores têm
a concepção de que desenvolvimento moral é uma condição
decorrente de contínuo aprendizado; além disso, acentuaram a
importância da formação continuada dos professores, incluindo
análise da prática pedagógica, reflexões sobre aspectos importantes do
desenvolvimento humano e julgamento moral, especificamente na
adolescência, e implicações dos meios de mediação na promoção da
autonomia dos alunos. Logo, quanto ao ambiente favorável para a
formação de personalidades éticas, nota-se que os cursos
universitários de formação de professores ainda precisam avançar na
reformulação de suas propostas curriculares, algo que traça um
paralelismo com a necessidade apontada diante da BNCC e a
reformulação do Ensino Médio, em prol de uma formação integral.
Adere-se ainda à importância da formação docente continuada, tal
qual os apontamentos de Carvalho e Almeida (2011).
Considerações Finais
A partir das reflexões apresentadas ao longo deste capítulo,
destacam-se as seguintes considerações:
Os estudos sobre a moralidade humana são marcados por uma
complexidade que é própria da natureza humana, por
envolver a tríade cognição-afeto-conação, o que nos desafia a
construir academicamente um quadro teórico suficientemen-
te abrangente.
252
Nos estudos sobre moralidade humana é notório o papel das
interações sociais para uma evolução rumo à autonomia
moral.
É pertinente considerar a dimensão afetiva da moralidade e
sua interdependência com a dimensão ética (representação de
si não egocêntrica) na constituição da personalidade ética
(com projeto de vida e noção de felicidade que abarcam o
outro).
Intermediando os polos da ão e do juízo/representação,
independentemente do caminho de desenvolvimento
(cognitivo ou moral), apresenta-se a afetividade.
O conhecimento sobre moralidade nos impele a viabilizar a
educação moral dos indivíduos, conscientizá-los e instrumen-
talizá-los para resolver dilemas morais cotidianos, minimi-
zando condições de vulnerabilidade humana.
Os adolescentes passam por grandes transformações, mas seu
amadurecimento está cada vez mais atrasado e manipulável
(vulnerável, portanto), uma vez que incertezas e sofrimento
no momento de delinear um projeto de vida, num contexto
de diminuição das relações humanas face a face (principal-
mente com adultos/autoridades morais) e aumento de
interações virtuais ou com a máquina/tecnologia em meio à
cultura da vaidade.
A interação adolescente-máquina pode ser considerada um
amplificador do egocentrismo juvenil, em detrimento das
interações sociais/humanas que de fato forjam o desenvolvi-
mento moral, que se alinham com a constituição de uma
personalidade ética.
253
Vale o esforço da sociedade para garantir aos adolescentes
situações em que se desenvolvam para a autonomia e o
exercício de cidadania plena, de tal forma que o discurso
apresentado na BNCC não seja mera formalidade, nem um
meio político de perpetuar a enorme desigualdade social no
país.
As inter-relações entre cognição, afeto e conação/ação
inerentes à construção de personalidades éticas corroboram a
necessidade de haver interação afetiva entre adolescentes e
professores, passando do discurso à efetivação da formação
integral no contexto do Ensino Médio.
Nos níveis de ensino cujas aprendizagens por operações
formais (na noção piagetiana) são preponderantes (Ensino
Médio e ensino superior), espera-se que sejam implementadas
novas interações, que superem a superficialidade do modelo
de educação tradicional, mais coerentes com níveis morais
mais elevados.
Escolher exercer o papel de autoridade moral caracteriza uma
assunção de responsabilidade por parte do professor, num
quadro em que ele próprio se constitui como personalidade
ética, além da intencionalidade de contribuir para a formação
de outras personalidades éticas, ao optar por metodologias
ativas e estimular reflexões dirigidas, por exemplo, num
quadro amplo de interações sociais afetivas.
Conclui-se que a hipótese de pesquisa não deve ser refutada,
pois tais considerações dão sustentação teórica para afirmar que a
personalidade/formação do professor de Ensino Médio de fato
influencia (serve como autoridade moral) na formação da
254
personalidade do adolescente, que está em uma fase crítica em seu
desenvolvimento, pela transição para a vida adulta.
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Sobre os Autores
Beatriz Ribeiro Peixoto
Graduação: Pedagogia pelo Centro Universitário Sagrado Coração
UNISAGRADOBauru/SP (2017-2020). Mestranda em Educação
pela Unesp-Marilia, PPGE, Linha de Políticas Educacionais, Gestão
de Sistemas e Organizações, Trabalho e Movimentos Sociais (2021-
2023). Professora do Ensino fundamental rede pública de
Piratininga- SP (2021 – em andamento).
Cristiane Paiva Alves
Terapeuta Ocupacional, pela Faculdade de Filosofia e Ciências -
FFC, UNESP, de Marília, tem mestrado e doutorado em Educação
Especial, pela Universidade Federal de São Carlos UFSCar. É
especialista em Neurologia e Reabilitação dos Membros Superiores,
pela UFSCar. Docente da FFC, UNESP/Marília. Instrutora de Yoga
e vice-líder do Grupo de Estudos e Pesquisas em Psicologia Moral e
Educação Integral (GEPPEI).
Davi Milan
Professor mediador de polo da UNIVESP, professor da educação
básica da rede pública municipal, Especialista em Educação,
graduado em Pedagogia e Letras. Membro do Grupo: Produção
Acadêmica (PPA), Membro do Grupo de Pesquisa: Formação de
Educadores (GP FORME) da UNESP de Marília-SP, membro do
Grupo de Pesquisa: Trabalho, Saúde e deficiência da Unesp de
Marília -SP.
262
Fátima Simone Silva Pereira Consoni
Psicóloga e Pedagoga. Especialista em Terapia Cognitivo-comporta-
mental. Professora, mestranda em Psicologia pela Unesp/Assis e
participante do GEPEDEME - Grupo de Estudos e Pesquisas em
Desenvolvimento Moral e Educação.
Gisele de Assis Carvalho Cabral
Doutoranda em Educação pela Universidade Estadual Paulista "Júlio
de Mesquita Filho", campus de Marília (2021). Mestra em Educação
pela Universidade Estadual Paulista "Júlio de Mesquita Filho",
campus de Marília (2021). Graduada em Pedagogia pela Universi-
dade Estadual Paulista "Júlio de Mesquita Filho" (2010). Professora
de EMEF (Escola Municipal de Ensino Fundamental) em Marília
desde 2001. É integrante do Grupo de Pesquisa Processos de Leitura
e de Escrita: Apropriação e Objetivação PROLEAO (UNESP-
Marília) e do Centro de Estudos e Pesquisas em Leitura, Literatura e
Infância - CEPLLI (UNESP-Marília).
Manuel João Mungulume
Mestre e Doutorando em Educação pela Universidade Estadual
Paulista Júlio de Mesquita Filho FFC- UNESP Campus de
Marília/SP. Licenciado em ensino de Filosofia e com habilitações em
ensino de História pela Universidade Pedagógica de Moçambique,
Delegação da Cidade da Beira - Departamento de Ciências Filosóficas
e Humanas. Membro do Grupo de Estudos e Pesquisa em Educação,
Ética e Sociedade (GEPEES) da Unesp de Marília/SP. Trabalha nas
seguintes linhas de Pesquisas: Ética; Filosofia da Educação; Educação
Axiológica; Formação de Professores e Educação Ambiental.
263
Patricia Unger Raphael Bataglia
Doutora e Mestra em Psicologia Social pela Universidade de São
Paulo. Possui Livre Docência em Desenvolvimento Moral na Criança
pela UNESP. Atualmente é docente e pesquisadora do Departamento
de Psicologia da Educação e do Programa de s-Graduação Stricto
Sensu em Educação da Faculdade de Filosofia e Ciências da UNESP
(campus Marília). Membra da Comissão de Ética do Conselho
Regional de Psicologia de São Paulo e assessora científica da FAPESP.
Coordena o GEPPEI (Grupo de Estudos e Pesquisas em Psicologia
Moral e Educação Integral).
Priscila Caroline Miguel
Doutoranda em Educação com Bolsa Capes, pela Universidade
Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho - Campus de Marília.
Mestra em Educação (2021) pela mesma universidade. Graduada em
Psicologia pela Unimar - Universidade de Marília/SP. É vinculada ao
GEPPEI (Grupo de Estudos e Pesquisas em Psicologia Moral e
Educação Integral), cadastrado no CNPq.
Rita Melissa Lepre
Psicóloga, Especialista em Neuropsicologia, Mestre e Doutora em
Educação (UNESP/Marília) e Livre-Docente em Psicologia da
Educação (UNESP/Bauru). Professora Associada do Departamento
de Educação, da Faculdade de Ciências, UNESP/ Bauru. Credencia-
da nos Programas de Pós-Graduação em Psicologia (UNESP/Assis) e
em Docência para a Educação Básica (UNESP/Bauru). Líder do
GEPEDEME - Grupo de Estudos e Pesquisas em Desenvolvimento
Moral e Educação.
264
Rogério Melo de Sena Costa
Sempre gostou de escola e, para não sair dela, resolveu ser professor.
É licenciado e bacharel em Ciências Biológicas (UNESP - Botucatu),
mestre em Educação Científica e Tecnológica (UFSC) e doutorando
em Educação (UNESP - Marília). Lecionou Ciências da Natureza e
Matemática por mais de vinte anos, principalmente aos adolescentes.
Atualmente é Diretor Pedagógico do Ensino Médio, no Colégio
Chaminade. Participa do Grupo de Estudos e Pesquisas em Psicologia
Moral e Educação Integral (GEPPEI, UNESP - Marília). Tem
interesse por temas como educação integral, desenvolvimento moral
e influência das tecnologias digitais na formação dos jovens do Ensino
Médio.
Tamires Alves Monteiro
Doutora e mestre em Psicologia escolar e do desenvolvimento pelo
Instituto de Psicologia da USP. Graduada em Pedagogia, com
habilitação em educação infantil, pela UNESP/Marília. Cursando
estágio de s-doutorado no programa de Educação da
Unesp/Marilia.
Thaísa Angélica Déo da Silva Bereta
Psicóloga, com Mestrado, Doutorado e Pós-Doutorado em Educação
pela Universidade Estadual Paulista (UNESP), Campus de Marília.
Atualmente, é docente e coordenadora do Curso de Psicologia do
Centro Universitário de Adamantina e docente no Curso de
Psicologia da Faculdade da Alta Paulista. Membra da Comissão de
Ética do Conselho Regional de Psicologia de São Paulo Subsede de
Assis. Participa do Grupo de Estudos e Pesquisas em Psicologia Moral
265
e Educação Integral (GEPPEI). Desenvolve estudos sobre a Formação
em Psicologia, com ênfase em aspectos éticos, competência moral,
metodologias ativas e ambiente acadêmico.
266
SOBRE O LIVRO
Catalogação
André Sávio Craveiro Bueno CRB 8/8211
Normalização
Kamilla Gonçalves
Diagramação e Capa
Mariana da Rocha Corrêa Silva
Assessoria Técnica
Renato Geraldi
Oficina Universitária Laboratório Editorial
labeditorial.marilia@unesp.br
Formato
16x23cm
Tipologia
Adobe Garamond Pro
Este livro destaca o tema da formação ética do professor e da professora
da Educação Básica e do Ensino Superior. Ele nos convida a reetir so-
bre o papel da escola enquanto instituição comprometida com a formação
moral e ética dos estudantes que prioriza a defesa da dignidade humana
e da justiça social. Entende-se que, além de competências intelectuais, o
processo de educação escolarizada deve, também, priorizar valores éticos
e morais que nos ajudem a construir uma sociedade mais justa, harmônica
e democrática
Thaísa Angélica Déo da Silva Bereta
Psicóloga, com Mestrado, Doutorado e
Pós-Doutorado em Educação pela Uni-
versidade Estadual Paulista (UNESP),
Campus de Marília. Atualmente, é do-
cente e coordenadora do Curso de Psi-
cologia do Centro Universitário de
Adamantina e docente no Curso de
Psicologia da Faculdade da Alta Pau-
lista. Membra da Comissão de Ética do
Conselho Regional de Psicologia de
São Paulo Subsede de Assis. Partici-
pa do Grupo de Estudos e Pesquisas em
Psicologia Moral e Educação Integral
(GEPPEI). Desenvolve estudos sobre a
Formação em Psicologia, com ênfase em
aspectos éticos, competência moral, me-
todologias ativas e ambiente acadêmico.
Patrícia Unger Raphael Bataglia
Doutora e Mestra em Psicologia Social
pela Universidade de São Paulo. Possui
Livre Docência em Desenvolvimento
Moral na Criança pela UNESP. Atu-
almente é docente e pesquisadora do
Departamento de Psicologia da Edu-
cação e do Programa de Pós-Gradu-
ação Stricto Sensu em Educação da
Faculdade de Filosoa e Ciências da
UNESP (campus Marília). Membra da
Comissão de Ética do Conselho Regio-
nal de Psicologia de São Paulo e asses-
sora cientíca da FAPESP. Coordena o
GEPPEI (Grupo de Estudos e Pesquisas
em Psicologia Moral e Educação Inte-
gral).
Programa PROEX/CAPES:
Auxílio Nº 0039/2022
Processo Nº 23038.001838/2022-11
Thaísa Angélica Déo da Silva Bereta
Patricia Unger Raphael Bataglia
Organizadoras
Estudos sobre a Formação Ética
na Educação Básica e no
Ensino Superior
Estudos sobre a Formação Ética na Educação Básica e no Ensino Superior
ANA CLÁUDIA SALADINI
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