O livro “O BLOG NA EJA: Autobiograa e Ação Emancipadora” dis-
cute a ação pedagógica na educação de jovens e adultos no contexto de
sua consolidação como Direito Público Subjetivo, fundamentando-se
na Teoria Histórico Cultural, na Filosoa da Linguagem e na Pesquisa
Qualitativa. Tem como principais nortes de reexão o legado de Vy-
gotsky ao pensar o desenvolvimento dos sujeitos por meio da lingua-
gem, de Paulo Freire ao orientar os métodos de ação pedagógica no
âmbito da EJA e o estudo dos gêneros discursivos em Bakhtin, com foco
na produção de autobiograas.
Orienta-se por uma perspectiva de formação integral e de prática liber-
tadora para a emancipação dos sujeitos, na qual os indivíduos necessitam
ser motivados pelo sentido da aprendizagem em perspectiva omnilate-
ral, formando-se para múltiplas necessidades, desvelando a realidade na
qual se inserem, reconhecendo-se como sujeitos históricos e integrantes
culturais na sociedade.
Daí, a aprendizagem na EJA deve ser prazerosa e compreendida como
fazer humano cuja gênese se situa no contexto da articulação entre mo-
tivos e necessidades de aprender, na geração de ideias, articulação e ne-
gociação de signicados.
Discutindo a educação de jovens e adultos de natureza desenvolvimen-
tal, a obra é de interesse tanto para professores que ensinam na EJA
quanto para prossionais das redes de ensino envolvidos com orientação
técnico-pedagógica e formação inicial ou continuada de educadores.
O BLOG NA EJA
autobiograa e
ação emancipadora
contribuições atualizadas das teorias
educacionais. Assim, o docente da EJA
tem por dever a criação de um ambiente
positivo de estudo, situado no contexto
de um amplo processo de produção de
sentidos de aprendizagem e de negocia-
ção de signicados conceituais.
Por isso, neste livro busca-se dis-
cutir as contribuições do Blog escolar
para o enriquecimento das práticas edu-
cativas na EJA, tendo-se a clareza de que
ensinar e aprender extrapolam os limites
da sala de aula e que o recurso à tecno-
logia é fundamental para renovação das
formas de ensinar e aprender na socie-
dade contemporânea. Esse ambiente de
ensino e de aprendizagem, rico e de am-
plas nuances, visa à formação integral do
cidadão, voltando-se para o desenvolvi-
mento de capacidades adequadas ao en-
frentamento das transformações cientí-
cas e tecnológicas e seu impacto na vida
social, cultural e política.
Deseja-se, então, que a leitura
deste livro possa suscitar inconformismo
com práticas pedagógicas que devem ser
questionadas e sugerir outras com vistas
a instigar nos educandos da EJA o gosto
pela leitura e produção de textos como
atividades essenciais para o desvelar do
mundo
Programa PROEX/CAPES:
Auxílio 0798/2018
Processo 23038.000985/2018-89
Desenvolver práticas signicati-
vas no contexto da educação de jovens
e adultos impõe o reconhecimento da
cultura e da sociedade na qual os atores
sociais estão inseridos, conhecer o sig-
nicado das coisas e do mundo à luz da
cultura a qual pertencem bem como os
comportamentos e condutas que carac-
terizam os processos sociais, os quais in-
uenciam a educação como um todo e
delimitam o processo de construção de
uma sociedade livre e plural.
Desse modo, não se trata sim-
plesmente de substituir o conhecimento
vinculado ao “currículo oculto” pelo co-
nhecimento organizado cienticamente,
mas de articular saberes que permitam
pensar a realidade, ou seja, que o docen-
te seja epistemologicamente curioso, se
preocupando com a forma como o co-
nhecimento se constitui, estabelecendo
relações e tirando conclusões de modo
a incorporar cultura e conhecimentos
novos. O ponto de partida deve ser os
saberes parciais e populares; o ponto de
chegada deve ser os saberes sistematiza-
dos ou cientícos.
Educar jovens e adultos exige a
capacidade docente de pesquisar, mas
também exige criticidade, apego à éti-
ca e à estética. Impõe aceitar o desao
do risco, a aceitação do novo, do con-
traditório e a rejeição a qualquer forma
de discriminação. Mas exige conduzir os
educandos à verdade que pode ser pro-
vada a partir do reconhecimento da sua
história de vida e de sua identidade cul-
tural.
Os docentes identicados com
esses princípios buscam reformular
suas práticas pedagógicas, atualizan-
do-as permanentemente ante às no-
vas exigências culturais, tecnológicas e
O BLOG NA EJA autobiograa e ação emancipadora
Rodrigo Martins Bersi e José Carlos Miguel
Rodrigo Martins Bersi | José Carlos Miguel
O BLOG NA EJA:
Autobiografia e Ação Emancipadora
RODRIGO MARTINS BERSI
JOSÉ CARLOS MIGUEL
O BLOG NA EJA:
Autobiografia e Ação Emancipadora
RODRIGO MARTINS BERSI
JOSÉ CARLOS MIGUEL
Marília/Oficina Universitária
São Paulo/Cultura Acadêmica
2020
UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA
FACULDADE DE FILOSOFIA E CIÊNCIAS FFC
UNESP - campus de Marília
Diretora
Dra. Claudia Regina Mosca Giroto
Vice-Diretora
Dra. Ana Claudia Vieira Cardoso
Conselho Editorial
Mariângela Spotti Lopes Fujita (Presidente)
Adrián Oscar Dongo Montoya
Célia Maria Giacheti
Cláudia Regina Mosca Giroto
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Renato Geraldi (Assessor Técnico)
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Conselho do Programa de Pós-Graduação em Educação -
UNESP/Marília
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Rodrigo Pelloso Gelamo
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Cláudia Regina Mosca Giroto
Auxílio Nº 0798/2018, Processo Nº 23038.000985/2018-89, Programa PROEX/CAPES
Ficha catalográfica
Serviço de Biblioteca e Documentação - FFC
Bersi, Rodrigo Martins.
B535b O blog na EJA: autobiografia e ação emancipadora / Rodrigo Martins Bersi, José Carlos Miguel.
Marília : Oficina Universitária ; São Paulo : Cultura Acadêmica, 2020.
198 p. : il.
Inclui bibliografia
ISBN 978-65-5954-019-8 (Digital)
1. Educação de adultos. 2. Tecnologias de informação e comunicação. 3. Prática de ensino. 4.
Educação. I. Miguel, José Carlos. II. Título.
CDD 374
Copyright © 2020, Faculdade de Filosofia e Ciências
Editora afiliada:
Cultura Acadêmica é selo editorial da Editora UNESP
Oficina Universitária é selo editorial da UNESP - campus de Marília
Dedico este trabalho a minha família, a meus
pais Ana Maria e Maurício, que sempre me
apoiaram e socorreram nas mais diversas
empreitadas de minha vida e a meus irmãos que
são inspiração para mim.
AGRADECIMENTOS
_______ ____________ _______________ ____________ ____________ _______________ ____________ ____________ ____________ ______________ ____________ ___
Agradeço a todos que passaram a meu lado neste período de
incrível formação, a meu orientador pelo aprendizado, a meus
professores, aos amigos que conheci neste processo, aos das antigas e a
equipe do CEEJA pelo acolhimento amoroso e tão significativo.
O presente trabalho foi realizado com apoio da Coordenação de
Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior - Brasil (CAPES) - digo
de Financiamento 001.
A história de Bia tem algumas coisas pesadas, mas
também edificantes
(Bia, Encontro Dialogado, 2019)
LISTA DE SIGLAS
CEEJA
CENTRO ESTADUAL DE EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS
CNBB
CONFERÊNCIA NACIONAL DOS BISPOS DO BRASIL
EaD
EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA
EJA
EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS
LDBEN
LEI DE DIRETRIZES E BASES DA EDUCAÇÃO NACIONAL
MEB
MOVIMENTO EDUCÃO DE BASE
MOBRAL
MOVIMENTO BRASILEIRO DE ALFABETIZAÇÃO
ODS
OBJETIVOS DE DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL
ONG
ORGANIZAÇÃO NÃO GOVERNAMENTAL
ONU
ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS
PC
PROFESSOR COORDENADOR
CPC
CENTRO POPULAR DE CULTURA
PNE
PLANO NACIONAL DE EDUCAÇÃO
PNUD
PROGRAMA DAS NAÇÕES UNIDAS PARA O
DESENVOLVIMENTO
PPP
PROJETO POLÍTICO PEDAGÓGICO
RDH
RELATÓRIO DE DESENVOLVIMENTO HUMANO
TDIC
TECNOLOGIAS DIGITAIS DE INFORMAÇÃO E
COMUNICAÇÃO
UNE
UNIÃO NACIONAL DOS ESTUDANTES
SUMÁRIO
Introdução............................................................................................15
Fundamentação teórica: contexto histórico de legitimação da EJA e
CEEJA no Brasil...................................................................................21
Procedimentos metodológicos: fundamentação e organização da pesquisa
qualitativa.............................................................................................63
Apresentação e discussão de resultados: conteúdos das publicações dos
sujeitos.................................................................................................79
Considerações finais............................................................................151
Referências.........................................................................................157
Apêndice: Vozes dos sujeitos: íntegra dos textos publicados no blog
...........................................................................................................163
15
INTRODÃO
_______ ____________ ____________ _____________________ _______________ ____________ _____________________ _____________________ ____________________ ________
O desenvolvimento de práticas educativas significativas, de forma
geral, e na educação de jovens e adultos - EJA, em particular, exige o
compromisso efetivo com o acolhimento, a busca de envolvimento dos
sujeitos em atividades prazerosas, o respeito às diferenças e à cooperação,
com vistas à consolidação de valores e condutas voltados à superação da
tenncia histórica de fragmentação do conhecimento a ser socializado, o
que exige reorganização de procedimentos, espaços e tempos escolares.
Nesse modo de pensar, a proposição de totalidades nas quais não
se trabalha com conteúdos estanques, em componentes curriculares
hermeticamente fechados, impõe um olhar diferenciado às abordagens
didáticas com vistas à articulação entre as diferentes frentes de
conhecimento e a certeza de que a escola do giz e do apagador não atende
às demandas da educação de uma maneira geral e em especial a clientela
da EJA no ambiente escolar contemporâneo.
Assim, a pesquisa orientou-se pela busca de novos espaços de
direito e permanência na escola, fundamentando-se na perspectiva da
Teoria Histórico Cultural, da Filosofia da Linguagem e da Pesquisa
Qualitativa, tendo como principais nortes da reflexão o legado de
Vygotsky ao pensar o desenvolvimento dos sujeitos por meio da
linguagem e de Paulo Freire orientando os métodos de ação pedagógica
no âmbito da EJA e ao estudo dos gêneros discursivos em Bakhtin, com
foco na produção de autobiografias. Orientamo-nos por uma perspectiva
de formação integral de sujeito e da prática libertadora para a
emancipação dos sujeitos, em que os indivíduos necessitam ser motivados
no processo educativo pelo sentido da aprendizagem de maneira
16
omnilateral, formando as pessoas para as múltiplas necessidades,
interpretando a realidade e desvelando a situação social dos sujeitos neste
processo, reconhecendo-se como sujeitos históricos e integrantes culturais
na sociedade.
Na perspectiva da Teoria Histórico Cultural os sujeitos são
portadores de cultura e estão imersos em contextos históricos que dão
profundidade a suas experiências sociais; são sujeitos culturais,
constituídos e construtores de cultura, tendo seu desenvolvimento
fundamentado em relações sociais, no contato direto com outras pessoas
e mediados pela linguagem. A função do docente nesta perspectiva é
promover o diálogo e intensificar a comunicação verbal de maneira a
criar ambientes favoráveis ao desenvolvimento dos sujeitos.
O experimento didático-formativo de que trata a pesquisa foi
elaborado com metodologia análoga ao pesquisador-participante,
partindo de intensas trocas e envolvimento íntimo com o campo de
pesquisa, procurando por meio da proximidade, da troca e da
colaboração compreender as necessidades específicas na implementação
das TDIC na EJA. A partir desta dinâmica objetivou-se a implementação
do blog como um suporte de linguagem capaz de promover atividades de
letramento que incentivem práticas de leitura e escrita em ambientes
digitais.
Trata-se de discussão de natureza teórico-prática no campo da
EJA e das TDIC como um suporte de linguagem a ser utilizado na
educação, ocorrendo especificamente em um CEEJA; desta maneira,
reflete sobre a abordagem teórica e metodológica sobre estes recursos,
interpretando essas como suportes de linguagem digital, com caracterís-
ticas próprias e possibilidades ampliadas de desenvolvimento nas
atividades didáticas escolares, superando uma visão de uso das tecnologias
17
na educação com viés restrito a capacitação técnica para o trabalho e de
recurso de educação a distância.
As TDIC neste experimento formativo são suportes de
linguagem, servindo como recursos intelectuais de desenvolvimento e de
comunicação humana, assim representam possibilidades ampliadas e não
meros recursos técnicos, tendo o blog como uma biblioteca popular, ou
seja, um espaço de valorização das vozes dos sujeitos e letramento, ou
seja, de utilização situada da linguagem em contextos reais e
significativos.
Neste livro, o blog aparece como uma biblioteca popular na
perspectiva de Paulo Freire em ambiente digital, ou seja, um espaço
digital das TDIC, localizado na internet, que valoriza as vozes dos
sujeitos e suas vivências, incentivando a participação social e a
intervenção na realidade por parte dos sujeitos por meio da palavra
emancipadora, procedendo assim uma verdadeira inclusão digital pela
ótica da atuação nestes ambientes digitais, da valorização dos sujeitos
neste processo e pelo uso social da palavra, motivando assim práticas
significativas de leitura e escrita nestes ambientes.
A fundamentação teórica está organizada de maneira a pensar o
contexto histórico de legitimação da EJA no Brasil, em face aos projetos
educacionais e ao tratamento político das práticas educativas para esta
modalidade educacional, pensando a maneira de sua composição no
Brasil e as propostas políticas e pedagógicas de ação para a EJA. O
panorama histórico prepara nossa reflexão para explorar a proposta de
educação libertadora e seus métodos de ação ao focar no uso da
linguagem como emancipatória
18
Os procedimentos metodológicos estão estruturados como uma
pesquisa qualitativa, sendo um experimento formativo com abordagem
pesquisador-participante, envolvendo-se intimamente com o campo de
investigação e propondo práticas orientadas na dialética da ação-reflexão-
ação. Discutiu-se metodologias de utilização do blog na EJA e refletindo
a cada ação proposta, se desenvolveu uma pesquisa prática de
envolvimento e de reflexão direta com o campo de estudo e das múltiplas
vozes envolvidas neste processo, investigando com especial atenção o
processo e as produções dos sujeitos.
A coleta e reflexão das informações geradas nos procedimentos de
pesquisa investigaram os conteúdos das publicações dos alunos, os
enunciados desses sujeitos e os assuntos privilegiados, organizados em
categorias orientadoras da reflexão para facilitar a análise dos resultados.
As vozes dos sujeitos são de importância central na investigação, por este
motivo optou-se após a publicação e análise das postagens dos sujeitos,
promover encontros dialogados que buscaram evidenciar a percepção dos
envolvidos sobre a dinâmica de publicação e o processo de produção dos
conteúdos, investigando assim a ótica dos sujeitos sobre o experimento.
A partir de práticas significativas de leitura e escrita em ambiente
digital é possível promover uma verdadeira inclusão digital e a
participação na Web 2.0, com valorização das vozes dos sujeitos, tanto
nas produções autorais no blog, quanto nos movimentos de reflexão
sobre o experimento promovido. Assim, valorizam-se os conteúdos
publicados e a percepção dos sujeitos sobre este processo, criando uma
documentação mais próxima aos sujeitos e suas reais necessidades para
uma formação integral e a educação libertadora com vistas à
emancipação.
19
O texto que segue ficou organizado iniciando pela
fundamentação teórica, subdividida em três sessões que se
complementam. No primeiro capítulo, da fundamentação teórica, a
primeira parte é trabalhada a perspectiva histórica sobre as ações de
legitimação da EJA no âmbito do Estado brasileiro, investigando quais
perspectivas teóricas são contempladas historicamente enquanto políticas
de Estado, utilizando-se do recorte temporal do Brasil republicano. O
segundo tópico apresenta as principais perspectivas pedagógicas em
disputa para a EJA no Brasil contemporâneo, situando nossa investigação
neste campo. A terceira parte da fundamentação teórica embasa nossa
orientação teórica e fundamenta as ações tomadas no transcorrer da
investigação, justificando e referenciando a presente pesquisa.
Na sequência explicita-se a metodologia de pesquisa,
evidenciando as etapas da investigação, o local, os sujeitos e o método de
coleta de informações, utilizando-se de um experimento formativo para a
geração de informações. Após as explicações acerca do experimento,
materiais, organização e métodos, parte-se para o capítulo de
apresentação e discussão dos resultados. O capítulo em questão,
destinado aos resultados da pesquisa, foi organizado em três sessões,
sendo a primeira sobre a reflexão sobre as produções dos sujeitos, com os
textos publicados no blog, procedendo com uma análise sobre os
conteúdos e enunciados produzidos, organizando a exposição por autoria,
de maneira a valorizar a identidade dos sujeitos.
A segunda parte do capítulo dos resultados aborda os encontros
dialogados, utilizando deste espaço para conhecer melhor os sujeitos pela
interlocução de vozes no diálogo com os alunos sobre o experimento
formativo e a terceira parte elabora reflexões sobre a experiência de
implementação do experimento formativo no ambiente escolar, em
20
diálogo com os enunciados do encontro dialogado com a coordenação
pedagógica da instituição campo da pesquisa.
As considerações finais fazem um apanhado sobre a pesquisa
desenvolvida e os elementos pós-textuais elencam as referências que
embasaram nossa investigação e os textos dos sujeitos na íntegra,
organizados por data de publicação no blog.
21
FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA
Contexto histórico de legitimação da EJA e CEEJA no Brasil
_______ ____________ ____________ _____________________ _______________ ____________ ____________ _______________ ____________ ____________________ _____________________ _____________________ _______________ ____________ _____________________ _______________ ___________ ____________ ____________ _______________ ____________ _______________ ____________ ________
Iniciamos nossa reflexão com um panorama histórico sobre o
campo da EJA que permite ter a profundidade no tempo das propostas
pedagógicas e o contexto político deste campo de pesquisa, investigando
as principais ações e políticas no Brasil que legitimam as práticas
pedagógicas e investimentos na EJA enquanto modalidade de ensino no
âmbito do Estado, reconhecendo este como um espaço de embates
políticos e de projetos pedagógicos em disputa. A partir desta reflexão
histórica procedemos com a anunciação do projeto pedagógico que
optamos para orientar as ações da pesquisa e da apresentação dos
principais pontos da teoria que fundamentam nossa prática, sendo estes
principais fatores a ação pedagógica reflexiva, praxiológica e dialógica.
Busca-se, por meio do processo de ação-reflexão-ação aproximar-se as
propostas pedagógicas que dão verdadeiro sentido ao processo de
aprendizagem integral do ser humano.
A leitura histórica sobre o campo da EJA é importante para
compreender melhor e com profundidade esta realidade específica, das
práticas do passado que ajudam a localizar no presente as práticas
contemporâneas neste contexto. As maneiras de pensar e atuar na EJA
modificam-se no tempo de modo que abordamos por meio de um
panorama histórico as especificidades da realidade brasileira em face de
algumas propostas internacionais, reconhecendo sua construção histórica
e seu processo de legitimação no interior do Estado brasileiro.
Fazer a leitura histórica sobre a EJA permite uma reflexão crítica
para desvelar a realidade e o campo de investigação, reconhecendo as
22
tensões sociais nestes contextos, os cidadãos envolvidos nestes processos,
assim como os espaços de atuação dos sujeitos nos diferentes momentos
históricos, reconhecendo as discrepâncias e defasagens entre as distintas
realidades sociais e os momentos da história, reconhecendo o passado
para saber intervir de maneira consciente no presente e de forma
intencional modificar o futuro.
A EJA no contexto nacional está imersa entre duas grandes
concepções de ensino. Seu surgimento no Brasil, por iniciativa do
Estado, está marcado pela preocupação na capacitação dos sujeitos ao
trabalho e em se alinhar aos tempos modernos. Porém, seu
desenvolvimento aponta para a preocupação por uma reparação e em
justiça social, proporcionando a esses sujeitos o direito ao acesso a uma
educação que lhes foi negada no passado, possibilitando a educação ao
longo da vida. Historicamente, propõe-se no Brasil uma formação
voltada para a capacitação para o mercado de trabalho, em que os
educandos estejam habilitados para apertar botões e puxar as manivelas
das fábricas, assim como a necessidade que os membros de uma
sociedade estejam minimamente instruídos, podendo pertencer à
modernidade, período em que se depositavam muitas esperanças no
desenvolvimento nacional pelo crescimento econômico do país. Porém,
este desenvolvimento nacional apresentou-se na realidade como
contradição histórica.
Durante a primeira metade do século XX a república brasileira
passou por momentos intensos de modernização, tanto nas práticas
democráticas, admitindo-se o voto secreto das populações alfabetizadas e
o voto feminino; também se modernizou o cotidiano no país, com
implementos tecnológicos oriundos da indústria que se instalava. Foi
forte o movimento de urbanização, necessitando de maneira crescente de
23
trabalhadores capacitados e de eleitores alfabetizados, visto que em 1920
aproximadamente 72% da população com mais de cinco anos de idade
era analfabeta (HADDAD; PIERRO, 2000, p. 109).
A educação de adultos precisa ser analisada da perspectiva da
educação formal e não formal, onde a educação formal é aquela que
acontece nos espaços oficiais, com profissionais formados e métodos de
ação e a educação não formal é aquela que acontece em espaços fora do
Estado como a família e em outros espaços de socialização como igrejas e
ONGs. A educação de adultos destaca-se no início do século em seu
âmbito não formal, que acontecia principalmente nos sindicatos urbanos,
principalmente das fábricas, a fim de angariar e capacitar militantes.
Na primeira metade do século XX em paralelo com esses avanços
de modernização do país o movimento Escola Nova foi um dos primeiros
marcos para a educação enquanto um direito do cidadão para a atuação
democrática, admitindo-se a necessidade de escolarizar a população
brasileira diante dos ideais de modernização. Logo na Constituição
Federal de 1934, consta a preocupação pela gratuidade do ensino
primário extensivo aos adultos. Porém, no âmbito do Estado não foram
notadas políticas para educação de adultos até a criação em 1942 do
Fundo Nacional do Ensino Primário, que destinava parte dos
financiamentos do Estado para o ensino supletivo.
Foi instalado em 1947 o primeiro órgão com a finalidade de
organizar o ensino supletivo para a alfabetização de adultos chamado SEA
- Serviço de Educação de Adultos, buscando reorganizar os planos anuais
de ensino supletivo, criando materiais didáticos e mobilizando a
sociedade civil. Foram elaboradas campanhas de alfabetização de adultos
que fizeram os índices de analfabetismo da população maior de cinco
anos de idade cair de 72% para 46,7% em 1960 (HADDAD; PIERRO,
24
2000, p. 111). Neste momento os adultos não escolarizados eram vistos
como problema para o desenvolvimento urbano e da modernidade
nacional, sendo incapazes e devendo ser ensinados como crianças:
Nesse momento, o analfabetismo era concebido como causa e não
efeito da situação econômica, social e cultural do país. Essa concepção
legitimava a visão do adulto analfabeto como incapaz e marginal,
identificado psicológica e socialmente com a criança (RIBEIRO,
2001, p. 22).
Essa visão de educação de adultos ganhou nova dimensão a partir
da década de 1960 com o educador Paulo Freire e seu método de
alfabetização, que passava a encarar os sujeitos jovens e adultos como
portadores de cultura. Após a publicação da LDB (Lei de Diretrizes e
Bases) 4.024 de 1961, que ainda não contempla a educação de adultos
em seu texto, mas estabelece a educação como um direito de todos.
Apesar da educação de adultos não aparecer no texto da LDB, a década
de 1960 foi um momento importante de legitimação da educação de
adultos e das diretrizes para esta modalidade de ensino principalmente no
âmbito não formal.
Foram feitos vários encontros e ações para debater esta questão e
pressionar o governo federal para que legitimasse esta modalidade de
ensino, com destaque ao II Congresso Nacional de Educação de Adultos,
o MEB (Movimento Educação de Base), da CNBB (Conferência
Nacional dos Bispos do Brasil), a Campanha de Pé no Chão Também se
Aprende a Ler, os Centros Populares de Cultura (CPCs), da UNE e os
Movimentos de Cultura Popular, ações que em grande parte viabilizavam
a perspectiva do método de alfabetização de Paulo Freire, porém com o
regime militar Freire é exilado e em 1964 institui-se o Programa
25
Nacional de Alfabetização do Ministério da Educação e Cultura, que se
afastaria das propostas que começaram a ser trabalhadas na década de
1960.
Durante o período dos governos militares deu-se início ao
Movimento Brasileiro de Alfabetização (MOBRAL), criado em 1968 e
estabelecido o ensino supletivo em 1971, que se distanciou das propostas
pedagógicas dos movimentos populares com orientação da pedagogia
freireana e passou a assimilar as propostas conservadoras em sintonia com
o endurecimento do regime, propondo acabar com o analfabetismo no
Brasil, neste momento interpretado como “vergonha nacional
(HADDAD; PIERRO, 2000, p. 115). A LDB 5.692 de 1971 dedica um
capítulo inteiro para o ensino supletivo, tratando da educação de jovens e
adultos que não obtiveram o estudo em idade própria, focando nas
habilidades de ler, escrever e contar, assim como a formação profissional,
utilizando também de tecnologias como a televisão e o rádio.
A legitimação da EJA no Brasil apresenta preocupações voltadas
para a capacitação desta população para o trabalho urbano e fabril, que
exigiam mais especialidades de formação dos sujeitos e uma capacitação
técnica mais refinada para lidar com os equipamentos, assim como as
exigências modernas de instrução da população para construção de uma
Nação, com cidadãos mais instruídos, de eleitores habilitados a votar,
capazes de sobreviver na modernidade, objetivando a capacitação para o
mercado de trabalho e a instrução para a vida democrática. Por outro
lado, com a redemocratização do país, no contexto das políticas nacionais
e internacionais, surgiram amplas e numerosas propostas sobre o direito à
educação e à qualidade de vida, propõem uma série de direitos, além de
reconhecerem todos os sujeitos como iguais, políticas confirmadas pela
26
Constituição Federal de 1988, conhecida como constituição cidadã, que
reconhece todos iguais perante a lei e o direito à educação.
A normatização deste direito ocorre na LDBEN 9.394/96 que
admite a necessidade de métodos didático-pedagógicos de utilização das
TDIC no ambiente de escolarização de jovens e adultos. Assumimos a
necessidade do acompanhamento dos sujeitos, da linguagem, das práticas
de leitura e escrita, sua interação, assimilação de conteúdos, o progresso
escolar, criatividade, autonomia, interações e acolhimento na escola. A
reflexão sobre a realidade na EJA em face a hipermodernidade, com o
sentido da atividade mais profundo e teoricamente fundamentado,
identificamos especificidades da EJA na escolarização face a inclusão das
tecnologias no cotidiano desta modalidade escolar.
Estabelece-se que a oferta da EJA deva ser especializada às
necessidades dos estudantes, dispondo de condições favoráveis ao acesso e
permanência pelos sujeitos, articulando-se preferencialmente com a
educação profissional. A redação original traz a EJA como um direito
àqueles que não tiveram continuidade dos estudos em idade ppria,
sendo que a Lei 13.632/2018 dá nova redação e convalida o direito de
todos os cidadãos à aprendizagem e educação ao longo da vida, com base
em recomendações expressas da UNESCO, vigentes desde a Declaração
de Hamburgo e Agenda para o Futuro, em 1997, das quais o Brasil é
signatário.
Desse modo, registramos e analisamos formas e métodos
didático-pedagógicos de utilização das TDIC no ambiente de escolari-
zação de jovens e adultos, observando o desenvolvimento dos sujeitos, da
linguagem, das práticas de leitura e escrita, sua interação, assimilação de
conteúdos, o progresso escolar, criatividade, autonomia, interações e
acolhimento na escola. De maneira específica procuramos implementar
27
uma plataforma didático-pedagógica digital no cotidiano escolar como
meio de acolhimento aos sujeitos, para participar colaborativamente
utilizando as tecnologias, incentivando o diálogo e a interação entre os
sujeitos, criando um espaço para o uso da linguagem e de práticas de
leitura e escrita em ambiente digital pelos sujeitos, bem como criando
produções autorais e publicações regulares na plataforma de pesquisa.
Tratou-se de criar um ambiente positivo de aprendizagem no
qual a autobiografia e a elaboração de textos autorais permitiram a
produção de sentidos de aprendizagem e negociação de significados
conceituais, constituindo uma ação voltada à emancipação dos sujeitos.
Enfatizou-se o direito à educação e à aprendizagem ao longo da
vida, confirmando a preocupação da educação como um direito do
cidadão em qualquer idade. O Brasil, em sintonia com órgãos
internacionais como a ONU contempla a EJA nos textos normativos e
nos financiamentos, mesmo que de maneira ainda pouco especializada ou
sem esforços mais elaborados para esta modalidade de ensino.
Este campo histórico de disputas políticas em que vivem os
sujeitos da EJA está permeado por disparidades sociais e marcas de
exclusão social, segregação e silenciamento destas populações. Historica-
mente no Brasil os esforços na alfabetização e formação de adultos estão,
de certo modo, afastados do âmbito do Estado, ficando a cargo de ONGs
e outras instituições preocupadas com a educação popular. A EJA no
Brasil apresenta-se histórica e majoritariamente fora da esfera do Estado
desde suas primeiras legislações até seu reconhecimento enquanto um
direito inalienável do ser humano e garantido a todos os brasileiros ao
longo da vida.
28
Trata-se de ação educativa permeada por distâncias sociais, seja na
segregação econômica, na questão racial, geográfica, de linguagem ou
tecnologia. O papel do Estado ao assumir oficialmente esta tarefa
necessita em nossa perspectiva voltar-se para o problema da inclusão
destes indivíduos na vida social enquanto cidadãos atuantes e
aproximando estes da riqueza dos conteúdos culturais, tendo contato
com um amplo acervo cultural humano e tomando uso da linguagem de
maneira mais consciente e refinada, preocupados com a formação
integral, com a emancipação dos sujeitos e com o desenvolvimento da
linguagem em contextos concretos e sociais, para além da formão
profissional em uma perspectiva bancária de educação.
Sobre seus sujeitos, identificou-se um grande extrato da
população brasileira formada por indivíduos analfabetos ou analfabetos
funcionais, com 27% da totalidade nacional em 2016, composta por
pessoas com mais de 35 anos em média, sendo principalmente
vendedores ambulantes e donas de casa (LIMA, 2016, p. 16), porém
69% dos jovens entre 18 e 24 anos no Brasil não estão estudando em
2017 (BRASIL, 2017) e a totalidade de analfabetos funcionais no Brasil
subiu para 29% em 2018 (LIMA, 2018, p. 8), visto que a migração dos
sujeitos da educação regular para a EJA acontece nos anos finais do
Ensino Fundamental e no Ensino Médio (INEP, 2017, p. 17). As três
características mais marcantes entre os sujeitos da EJA são cor, sexo e
moradia, tendo o fator econômico como elemento que transpassa todas
as classes analíticas destes contextos. Portanto, a característica mais
marcante é a pobreza ou a vulnerabilidade social, seguido da cor da pele
negra e população rural. Nesta perspectiva podemos analisar essa
população como composta majoritariamente por pessoas em situação de
29
vulnerabilidade social, sendo pobres, negros, mulheres e moradores da
zona rural.
As disparidades sociais continuam, entre as mulheres, apesar de
possuírem maior grau de escolaridade em comparação aos homens, ainda
acabam tendo salário inferior ao dos homens, apesar deste quadro
apresentar melhorias nas diferenças entre as remunerações nos últimos
tempos. Entre os negros e população rural a situão se agrava, pois, o
Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) entre negros levou dez anos
para alcançar os números da população branca, que continuou
avançando. Em termos gerais, a disparidade entre brancos e negros e
entre homens e mulheres diminuiu, porém, o Brasil ainda figura em
décimo lugar em uma lista de 147 países mais desiguais do mundo
segundo o Relatório de Desenvolvimento Humano (RDH) elaborado
pela Organização das Nações Unidas (ONU) em 2017 e com base nos
dados do índice Gini, divulgados pelo Programa das Nações Unidas para
o Desenvolvimento (PNUD).
No Brasil, somente em 2010 o IDHM dos negros se aproximou ao
IDHM dos brancos observado para o ano 2000. Em outros termos, o
IDHM dos negros levou 10 anos para equiparar-se ao IDHM dos
brancos. Este seguiu avançando, e ainda era 12,6% superior ao dos
negros, em 2010. A renda das mulheres também apresenta dispari-
dades marcantes: era 28% inferior à dos homens, mesmo obtendo
níveis educacionais mais elevados. Entre o campo e a cidade, a
desigualdade nos indicadores de renda também ganha destaque. A
renda domiciliar per capita média da população urbana é quase três
vezes maior do que a da população rural (PROGRAMA DAS
NAÇÕES UNIDAS PARA O DESENVOLVIMENTO, 2017,
p.11).
30
No contexto internacional destacamos a Agenda 2030 da ONU e
os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), nos quais são
propostos 17 objetivos gerais para os países, como educação de qualidade,
erradicação da pobreza e redução das desigualdades, promovendo debates
com a proposta de Educação para Todos, já no contexto nacional
destacamos o Plano Nacional da Educação (PNE) com a Lei 13.005/14
que estabelece metas para a educação nacional, dentre eles a
universalização da educação básica no país e a meta 10, específica para a
EJA, que estabelece um mínimo de matrículas nesta modalidade
integrada à educação profissional.
A EJA apresenta-se em meio a uma realidade de exclusões e de
segregação social de seus sujeitos, que estão em situação de
vulnerabilidade social e ao tratar das TDIC essa desigualdade amplia-se
“o analfabetismo representa apenas uma forma extrema de exclusão,
dentre as múltiplas formas de apartheid social que se mostram atreladas, e
que não podemos tratar como se isoladas fossem” (CAMARGO;
MIGUEL; ZANATA, 2015, p. 262). A modernidade foi marcada pela
inclusão das máquinas e da vida urbana, onde os sujeitos jovens e adultos
não escolarizados foram instruídos a procurar capacitação para sobreviver
nesta realidade. No período contemporâneo vive-se a Hipermodernidade
(ROJO, 2015) ou a Sociedade da Informação (TAKAHASHI, 2000),
onde os indivíduos estão imersos em ambientes digitais e necessitam
utilizar das TDIC nas mais diversas atividades cotidianas.
A Sociedade da Informação é a sociedade contemporânea que es
fundamentalmente ancorada no fluxo de dados e na acelerada demanda
por informações, onde os sujeitos sobrevivem ao relacionar e ter que lidar
com múltiplas informações em tempo cada vez mais acelerado
(COUTINHO; LISBOA, 2011). Já a hipermodernidade avança nesta
31
análise da sociedade contemporânea e identifica aspectos novos, como a
digitalização e acesso às informações, mas reconhece este momento
histórico como um continuo da modernidade vivida nos séculos
anteriores, tratando-se de uma modernidade exagerada ou radicalizada,
por isso hipermodernidade, onde não existem rupturas com a
modernidade, mas a intensificação das características já apresentadas
como o desenvolvimento tecnológico, o controle e medição do tempo e a
vida em massas urbanas, possibilitando, por exemplo, comunicação em
tempo quase instantâneo em diferentes localidades geográficas (ROJO,
2015).
Diante deste contexto de radicalização da modernização na vida
cotidiana, podemos proceder à mesma crítica que se fazia à modernidade
quanto a sua imersão nos espaços, afirmando que existem locais aonde os
tempos modernos realmente chegaram e se faz presente e outras
localidades em que tais desenvolvimentos ainda são incipientes. O campo
da EJA, na hipermodernidade, é um contraponto importante de reflexão,
pois é um espo em que nem todos os avanços propostos na
hipermodernidade se fazem presentes, sendo possível encontrar
disparidades entre os contextos digitais e o campo da EJA, como o acesso
às informações e a equipamentos de alta tecnologia. Interpretamos nesta
perspectiva as TDIC como objetos culturais que dão acesso a um
universo cultural próprio, onde sujeitos que não têm acesso aos
computadores ou outros suportes de linguagem digital acabam
segregados deste universo da cultura digital e da hipermodernidade.
Incentivados por essa reflexão, cabe na EJA investigar as
tecnobiografias dos sujeitos, ou seja, seus históricos de proximidade e uso
dos computadores ou outros suportes de linguagem digital, assim o fator
da idade dos sujeitos não é fator determinante ao trabalhar o uso das
32
TDIC nas atividades pedagógicas, mas o fator de maior relevância
aparece na relação destes sujeitos com os recursos digitais ao longo de sua
vida “É por essa razão que, ao pesquisar o uso da linguagem online,
enfatizamos as vivências das pessoas e suas relações cotidianas com as
tecnologias, ou o que é referido como tecnobiografias” (BARTON; LEE,
2015, p. 41). Portanto, para além da faixa etária dos sujeitos, cabe ao
docente que trabalhar pedagogicamente as TDIC e investigar as
tecnobiografias dos sujeitos para identificar as necessidades específicas
para planejar seu trabalho docente.
Quanto à utilização das TDIC no âmbito das atividades
pedagógicas na EJA, encontramos uma imersão tímida e ainda voltada ao
ensino técnico, priorizando a formação profissionalizante antes da
formação humana, voltando todos os esforços para a capacitação técnica
ou profissionalizante ou na perspectiva de um instrumento tecnológico
útil para a Educação a Distância (EaD), onde o Decreto 9.057/17
confirma essa tendência e abre caminho permitindo a EJA totalmente a
distância, cabendo sua regulamentação aos estados, municípios e
distritos. Portanto, os investimentos em tecnologias no campo da EJA
são muito similares às propostas pedagógicas do momento de
modernização do país, preocupando-se com a capacitação técnica para o
mercado de trabalho e para a sobrevivência nesta sociedade que
denominamos já como hipermoderna.
As propostas pedagógicas hegemônicas que se preocupam
somente com a especialização técnica e com a capacitação para o mercado
de trabalho, visam preparar os sujeitos para sobreviver nesta sociedade
contemporânea, partindo dos eixos do ser social, de trabalho e cultura,
das necessidades humanas, da organização do Estado, das estruturas de
mediação com a linguagem e da intencionalidade do trabalho pedagógico
33
(PALUDO, 2015, p. 235). A partir desta perspectiva histórica é possível
que este projeto político hegemônico para a EJA acabe por promover a
manutenção das desigualdades entre os sujeitos da EJA e os da
hipermodernidade, afastando os jovens e adultos não escolarizados das
reais possibilidades de desenvolvimento e de atuação na
hipermodernidade, focando somente na capacitação para o mercado de
trabalho, representando, numa perspectiva histórica, um continuo das
políticas pedagógicas desenvolvidas no Brasil para a EJA, não servindo
neste caso para a efetiva emancipação dos sujeitos.
O CEEJA aparece como uma alternativa no âmbito do Estado
como a política pública mais aprimorada de iniciativa estadual para a
educação de jovens e adultos. As instituições de ensino deste modelo
apresentam características particulares, com presença flexível e
acompanhamento individualizado, além de contar com propostas
específicas para a educação de adultos, pensando a realidade concreta
desses sujeitos. Já o CEEJA em que ocorreu a pesquisa nos pareceu ainda
mais diferenciado, seja pelo acolhimento dos estudantes, seja pela coleção
de prêmios, como o Prêmio Construindo a Nação, vencedor em primeiro
lugar algumas vezes e finalista entre os primeiros outras tantas, tomando
este local como um locus propício ao desenvolvimento de propostas
pedagógicas de emancipação e de formação integral dos sujeitos, visto
que os CEEJAs, apesar de apresentarem organização especializada ao
atendimento dessas populações, possuem uma rotina muito individual de
formação visto que cada sujeito pode fazer seu horário e percurso
formativo, perdendo um pouco do contato social e do convívio escolar
cotidiano.
o CEEJA em questão funciona de maneira singular, pois a
organização didático-pedagógica é diferenciada pela organização em
34
projetos e com objetivo de formação integral dos sujeitos, além do
funcionamento específico, atendimento personalizado, individualizado e
presença flexível próprios de um CEEJA, atendendo ao segundo
segmento do Ensino Fundamental e Ensino Médio. O objetivo deste
sistema de organização escolar procura atender as necessidades dos alunos
trabalhadores, funcionando nos três turnos (manhã, tarde e noite) e
permitindo a presença flexível, em que o sujeito pode frequentar à
medida que conseguir, com plantões de dúvidas onde os sujeitos podem
procurar a escola sempre que necessário e cumprir as atividades didáticas
a seu próprio tempo, sendo esta a proposta mais especializada ao
atendimento da população jovem e adulta em escolarização no âmbito do
Estado.
Concepções didáticas, políticas e pedagógicas de ação em EJA
A escola ou o processo de escolarização formal é caracterizado
pela sistematização dos conteúdos da cultura humana com respaldo
científico, com uma metodologia específica, uma organização própria,
realizada por profissionais, sendo institucionalizada e com certificação,
acontecendo assim em espaços formais e com organização por parte do
Estado, que atesta sua legitimidade. Já o ensino não formal é praticado
por instituições diversas como igrejas, ONGs e associações de moradores,
que buscam promover a cultura e a inclusão social, fora do âmbito do
Estado. Os movimentos populares são os principais motivadores da
educação não formal para a promoção da educação e da cultura,
principalmente por seu enfoque nas relações sociais, no desvelamento da
realidade e no desenvolvimento de conscncia política, não sendo
legitimada dentro do âmbito do Estado. A educação informal, por outro
lado, é aquele processo de aprendizado cotidiano e dialético, que
35
chamamos aqui de vivências e experiências que acontecem na família e
em espaços de convívio social.
A atuação pedagógica exige clareza teórica sobre os objetivos da
aprendizagem, sobre quais conteúdos eleger e quais os métodos
apropriados eleger para trabalhar os assuntos escolares selecionados. Na
EJA esta clareza apresenta-se ainda mais cara ao educador, que lida com
uma realidade específica em um campo de embates políticos e de
necessidade de projetos pedagógicos diferenciados, com sujeitos muitas
vezes segregados na sociedade, em situação de vulnerabilidade social, em
que tiveram o direito a educação em idade adequada negado por diversos
motivos.
A conscientização do docente frente à perspectiva didática e
política de sua atuação é elemento importante na definição dos
conteúdos e métodos de ação por parte do profissional da educação, pois
este pode optar por uma educação distante dos problemas sociais
vivenciados por seus educandos, com um ensino conteudista e com viés
de massificação, chamada de educação bancária por Paulo Freire,
centrando a atenção em ensinar os conteúdos escolares de maneira
sistematizada, porém descontextualizada da realidade concreta dos
sujeitos “A prática educativa é tudo isso: afetividade, alegria, capacidade
científica, domínio técnico a serviço da mudança ou, lamentavelmente,
da permanência do hoje” (FREIRE, 1996, p. 53).
Por outro lado, o educador pode optar por uma formação
integral, omnilateral, que tem a preocupação de formar o cidadão para a
atuação social, em sintonia com as propostas da educação popular, não
preocupados somente com um aspecto da formação para o trabalho ou a
instrumentalização técnica, como na aprendizagem de um determinado
conteúdo escolar ou na capacitação profissional, mas sim numa formação
36
em múltiplas frentes, preocupada com diversas necessidades humanas,
aplicando estes saberes na realidade concreta, procurando situar o sujeito
no contexto real e evidenciar sua importância na sociedade, partindo de
um “resgate da identidade cultural do educando adulto e para a
compreensão das relações de poder manifestas nos processos de
produção, especialmente nas relações de trabalho produtivo, condições
essenciais para o exercício da cidadania” (GIROTTO, 2004, p.90).
O profissional da educação é quem decide os objetivos da ação
pedagógica, preocupado em qual o sentido do processo de aprendizagem
para este sujeito, que pode pensar uma formação humana, integral e
articulada à realidade concreta, especializada e que se afasta da visão de
indivíduo como mercadoria ou como mero trabalhador (FREITAS,
2005, p. 102). Para optar por um projeto de formação integral é
necessário clareza teórica e reflexão sobre quem são os sujeitos e qual a
concepção de sujeito que se utiliza no processo de desenvolvimento. O
panorama histórico da EJA no Brasil já traz indícios de quem são esses
sujeitos que estão entre os adultos não escolarizados, possibilitando
reconhecer suas condições históricas, os projetos de educação para essas
populações e refletir sobre as possíveis concepções pedagógicas e modos
de ação ao atuar nesta modalidade de ensino. As maneiras de o sujeito ler
e de ser leitor, modificando assim sua leitura de mundo, através da
oralidade, da escrita, do digital, das múltiplas linguagens, sabendo-se
como interlocutor na comunicação humana.
Em síntese a escola autônoma não é a escola abandonada à sua
própria sorte pelo Estado, mas aquela dentro de um Estado que se
propõe também a valorizar o município e a escola como núcleos
autônomos de participação numa política mais ampla (GADOTTI,
2015, p. 135).
37
A escolarização envolve organização e sistematização formal dos
conteúdos dentro do âmbito do Estado, de maneira os sujeitos podem ter
acesso a uma riqueza de conhecimentos produzidos e acumulados pelos
humanos ao longo da história. Cabe ao educador tomar decisões quanto
aos métodos e objetivos no trabalho pedagógico com estes conteúdos
culturais humanos. Procuramos assim pensar o indivíduo no contínuo da
história, a partir do acúmulo de experiências humanas que foram
sistematizados através do tempo e que formam a cultura, que de fato nos
tornam seres humanos, situando os educandos neste contínuo.
A escolarização é esta sistematização da cultura de maneira
formal, organizando conhecimentos em uma forma mais elaborada de
pensar. Cabe a escola também adequar os métodos e conteúdos para a
EJA, sabendo que seus sujeitos possuem especificidades e rotina, sendo
portadores de cultura e não meros receptáculos de informações ou
criaas crescidas “a adultos; a diferença está, fundamentalmente, na
natureza das experiências e práticas de leitura e escrita proporcionadas a estes,
e na necessária adequação do material escrito envolvido nessas experiências e
práticas” (SOARES, 2004, p. 16).
Os conhecimentos mais elaborados ou sistematizados, chamados
de científicos ou formais, são frutos de constantes reflexões e diálogos ao
longo da história, pela relação social entre indivíduos na ação
comunicativa e que possuem esses conhecimentos internalizados. A partir
desta perspectiva o profissional da educação não transfere conhecimentos,
mas compartilha saberes, debate ideias, pensa a realidade em diálogo com
os sujeitos no processo de aprendizagem, modificando-se mutuamente
durante o percurso formativo. A cultura humana possui um acervo
incrível de conhecimentos para os mais diversos objetivos; acreditamos,
portanto, na perspectiva de que a escola deve estar atenta às necessidades
38
e realidades específicas dos sujeitos da EJA, sabendo quais conteúdos
formais organizar nas atividades didáticas, de que maneira e com quais
objetivos, buscando não massificar as ações educativas, observando o
currículo e as necessidades dos educandos.
Ao reconhecer a importância dos conteúdos formais da
escolarização enquanto constitutivos de uma cultura mais elaborada e que
o sujeito precisa ter contato, valorizamos a heterogeneidade dos
conteúdos da aprendizagem, contemplando as múltiplas necessidades de
aprendizagem e enriquecendo o processo educacional com uma variedade
de assuntos a serem conhecidos e pensados pelos sujeitos de maneira
significativa em seu próprio processo de desenvolvimento. A cultura
primeira nesta perspectiva serve de base para articular múltiplos
conteúdos em uma variedade imensa de assuntos que precisam ser
claramente pensados e objetivados pelo profissional da educação “O
ponto de partida do trabalho pedagógico na EJA deve ser os saberes das
vivências das/os educandas/os e o ponto de chegada, o conhecimento,
por eles sistematizado” (GIROTTO, 2015, p. 267).
Por outro lado, existem outros projetos cujo objetivo é a
preparação focada somente para o mercado de trabalho, objetivando a
formação profissional, como, por exemplo, o material escolar que
orientou as ações pedagógicas no CEEJA durante o experimento da
pesquisa foi o EJA Mundo do Trabalho, sendo uma coleção de materiais
e vídeos que organizam os conteúdos escolares para este público,
propondo aproximar-se da realidade destes sujeitos, por meio do eixo
temático do trabalho, propondo assuntos que não infantilizem os adultos
e também sejam mais próximos de suas realidades, porém com foco
principal na preparação do sujeito para o trabalho, sem reflexões
aprofundadas sobre a realidade concreta, sem propor momentos de
39
fruição ou de apreciação cultural, apresentando os assuntos objetivados e
massificados, sem a preocupação explícita com a emancipação dos
sujeitos.
O material EJA Mundo do Trabalho foi descontinuado, não
sendo mais fornecido após o período da pesquisa, porém foi o principal
material orientador de conteúdos durante o período do estudo.
Fornecido pelo governo estadual, foi pensado para a transmissão de
conteúdos escolares sistematizados, com objetivo na instrumentalização
para o mundo do trabalho, apresentando uma cultura mais elaborada,
dos conhecimentos formais e científicos, porém sem se preocupar com a
cultura primeira dos indivíduos, com a profundidade ou com a
historicidade dos conteúdos, assim sem refletir sobre os sentidos da
aprendizagem para esses indivíduos e sem reconhecer a dialogicidade
necessária para a prática educativa.
Este material representa o projeto hegemônico no âmbito do
Estado para a EJA, mas a partir desta perspectiva escapa ao processo
educacional a emancipação, a formação integral e omnilateral do ser
humano, não refletindo sobre a profundidade histórica e sobre os
múltiplos objetivos da aprendizagem, que podem extrapolar as
necessidades de trabalho, em detrimento de uma perspectiva de formação
para a vida cotidiana, conscientização sobre a realidade concreta e
formação humana omnilateral.
O educador estabeleceu, a partir de sua convivência com o povo, as
bases de uma pedagogia onde tanto o educador como o educando,
homens igualmente livres e críticos, aprendem no trabalho comum de
uma tomada de consciência da situação que vivem. Uma pedagogia
que elimina pela raiz as relações autoritárias, onde não há “escola”
nem “professor”, mas círculos de cultura e um coordenador cuja
40
tarefa essencial é o diálogo [...]. O educador, cujo campo
fundamental de reflexão é a consciência do mundo, criou, não
obstante, uma pedagogia voltada para a prática histórica real
(FREIRE, 1967, p. 26).
Para uma aprendizagem significativa faz-se necessário pensar os
objetivos da atividade pedagógica e qual o sentido do processo educativo
para o sujeito de maneira que a relação teoria e prática se faz importante
ao passo que auxilia a pensar maneiras de atuação na realidade concreta
mediados pela linguagem na ação comunicativa. Refletir assim as
contradições sociais, as tensões históricas e a participação do sujeito na
realidade concreta, permite-nos refletir sobre o processo de construção do
sujeito histórico, sabendo se posicionar, tomando uma postura clara e
consciente frente aos desafios cotidianos.
Os conteúdos da aprendizagem são reveladores sobre esses
objetivos do processo educativo, pois podem favorecer uma reflexão
crítica sobre as tensões sociais e a construção histórica dos sujeitos e da
realidade social, mas podem também propor assuntos desconectados da
realidade concreta, de maneira massificante, apresentando somente um
acervo de assuntos formais e sistematizados, porém alheios aos sujeitos,
numa perspectiva acrítica, que não favoreça a conscientização deste
indivíduo enquanto sujeito atuante na sociedade e portador de cultura.
A relação de conteúdos escolhida pelo educador revela seus
objetivos e precisa buscar refletir sobre a realidade em seus pontos de
tensões, por meio de temas geradores, que procuram engajar os
educandos nos diálogos escolares e na reflexão sobre problemas
cotidianos, muitos propostos por eles mesmos, em um processo dialógico
de ensino, ouvindo e fazendo-se ouvir, valorizando assim suas vozes,
experiências e opiniões, sabendo-se importantes, sabendo que estes são
41
verdadeiramente portadores de saberes próprios e portadores de cultura, a
qual deve ser valorizada no processo de escolarização num processo de
educação libertadora onde a dialogicidade é a essência da prática
libertadora (FREIRE, 2015, p. 107).
O papel do profissional da educação é central nesta perspectiva,
pois apesar do processo de aprendizado estar focado no sujeito e em sua
atuação enquanto autor e ator de sua própria aprendizagem, o
profissional é de extrema importância como um facilitador, sendo aquele
que organiza os saberes escolares, trabalha metodologicamente com os
educandos e cria os ambientes favoráveis ao desenvolvimento dos
sujeitos, interpretando a educação como “aprendizagem ao longo da vida
como novo paradigma da educação do futuro, fundado em quatro
pilares: aprender a aprender, aprender a conviver, aprender a fazer e
aprender a ser” (GADOTTI, 2010, p. 15), a despeito de
questionamentos que podem ser feitos ao conceito de “aprender a
aprender” no âmbito da teoria histórico-cultural.
Em um plano ideal cabe ao profissional da educação bem
formado escolher quais conteúdos trabalhar, com quais objetivos e
métodos, tendo clareza sobre as maneiras de ensinar e as múltiplas formas
de aprender mediados pela linguagem, conhecendo seus alunos e em
dialogicidade com estes definir os objetivos da aprendizagem, porém no
plano real das práticas pedagógicas concretas o que se percebe é a relação
de conteúdos organizados em um currículo prévio alheio aos sujeitos.
Assim o investimento na formação do educador é necessário para uma
educação de melhor qualidade, reconhecendo a atuação docente como
elemento estimulador do desenvolvimento dos sujeitos, na definição da
qualidade da aprendizagem, relacionando os conteúdos e nos objetivos de
42
ensino, avançando para uma educação dialógica e não meramente
bancária conforme Freire (2015).
Nessa perspectiva o educador não é um mero transmissor de
saberes listados ou um organizador de conteúdos, mas um comunicador e
um estimulador do debate e de ideias, quem já conhece os assuntos e faz
papel de facilitador do desenvolvimento, procurando meios para que o
indivíduo possa se apropriar dos conteúdos, internalizando esses saberes
de maneira significativa ao passo de se ressignificar neste processo,
transformando mutuamente a si mesmo, ao docente e a realidade durante
o percurso formativo. A prática educativa formal nesta perspectiva vai
além da relação de conteúdos listados, sistematizados e formalmente
apresentados aos alunos, pois é praticada pelo profissional da educação,
com fundamentação teórica e métodos de ação específicos, com
legitimidade e respaldo estatal, em um processo dialético, exigindo ética e
rigor científico, clareza nos objetivos da aprendizagem, além de uma
estética agradável, que busque aproximar os assuntos formais aos temas
geradores dos educandos.
Assim toda educação é essencialmente política e dialética,
comunicativa e responsiva, em que os sujeitos devem ouvir e ser ouvidos
durante todo o processo, onde os objetivos da ação educativa deixam
claras as intenções políticas, seja ela libertadora ou bancária e alienante.
Busca-se, neste sentido, ter clareza dos objetivos pretendidos no processo
educativo, sem perder de vista sua eminência política, orientadora da
educação e das práticas adotadas pelos educadores.
Desta maneira, toda ação pedagógica possui sua orientação
política, seja ela velada ou explícita, não se admitindo uma educação que
se diga neutra ou não ideológica, pois toda ação comunicativa está em
defesa de algo, cabendo observar neste processo quais os objetivos das
43
atividades propostas no âmbito escolar. Um currículo flexível é necessário
para atuar na realidade da EJA, pois as práticas pedagógicas vão se
definindo à medida que os sujeitos demonstram, nos diálogos e
interlocuções com o educador, seus próprios temas geradores,
apresentando assim demandas próprias, atribuindo mais sentido ao
processo de aprendizagem, pensando a realidade e seu desvelamento.
O campo da EJA está permeado por esses embates para a
legitimação das práticas pedagógicas, assim novas abordagens fazem-se
necessárias para o efetivo aprendizado significativo, que vise uma
formação humanizada, especializada e preocupada com o desenvolvi-
mento destes sujeitos, utilizando-se das TDIC como elementos de
aproximação e valorização dos indivíduos e não como meros recursos de
capacitação, mas como suporte de desenvolvimento e de linguagem.
Orientados pela perspectiva de um trabalho pedagógico em um
plano de ação que oriente a tomada de consciência dos sujeitos sobre sua
realidade social concreta, buscando por meio da mediação com a
linguagem o desenvolvimento da capacidade de leitura e escrita, assim
como sua leitura de mundo e do desvelamento de suas condições
históricas de vida, busca-se o enriquecimento cultural dos sujeitos
mediante a um amplo e variado acervo a partir da riqueza produzida
pelos humanos ao decorrer da história, para articular os objetos de
aprendizagem com intuito de alcançar a reflexão crítica sobre a realidade
e os objetivos propostos no processo educativo. Sabendo da palavra
enquanto emancipadora do sujeito que é capaz de comunicar-se e
pronunciar a sua própria realidade, atuando conscientemente, mediado
pela linguagem, na sociedade.
Pensamos a educação como emancipadora por intermédio da
linguagem, sendo de formação integral, pela formação omnilateral,
44
refletindo sobre as mais diversas possibilidades humanas, com um amplo
acervo cultural oriundo de uma cultura elaborada, sem polir seu
desenvolvimento com objetivos enquadrados em necessidades
delimitadas somente para a capacitação para o trabalho, sem profundas
reflexões sobre a realidade e sobre o processo de aquisição e
desenvolvimento da linguagem.
Destacamos, portanto, os objetivos da educação libertadora,
pensando o indivíduo enquanto sujeito de ação social, entendendo este
como um ser histórico, portador de cultura, membro da sociedade,
socialmente localizado que é capaz de se emancipar pela palavra e
pronunciar sua própria realidade concreta e denunciamos, por outro
lado, o projeto de uma educação alienante, voltada para um indivíduo
objeto, passivo, raso e sem consciência de suas condições sociais e
históricas, sem se preocupar com a necessidade de refletir sobre a
realidade concreta.
A linguagem é emancipadora à medida que permite ao sujeito a
reflexão crítica para a transformação da sociedade e de sí mesmo,
encarnada e modificadora da realidade, em diálogo direto com outros
sujeitos no processo de aprendizagem, utilizada como pronúncia da
própria realidade e de intervenção social, para se expressar, atuar no
mundo e dar sentido ao processo educacional. Assim, não se trata de
reproduzir outras palavras, dita por outros, mas sim de dizer suas próprias
palavras, em seus contextos específicos, respondendo às necessidades
imediatas particulares e coletivas de comunicação e socialização dos
sujeitos, atendendo a anseios mais complexos de motivação pessoal,
enquanto emancipadora e transformadora dos sujeitos “em vez de ser
veículo das ideologias alienantes e/ou de uma cultura ociosa tornar-se-á
45
geradora, isto é, o instrumento de uma transformação global do homem
e da sociedade” (FREIRE, 1967, p. 3).
A palavra nunca pode ser um dado, doado pelo educador, mas
precisa ser tema de debate entre os participantes de um círculo de
cultura, ação comunicativa ou ação educativa, enquanto processo de
conhecimento e de aprendizagem, sendo a palavra estudada não
enquanto composição de fonemas ou de estruturas sintáticas, mas sim
enquanto elemento desvelador e problematizador da realidade, de
comunicação e expressão humana, mobilizando a atenção dos sujeitos
para o sentido da linguagem no processo de aprendizagem, focando a
atividade de estudo nos sentidos das palavras para os sujeitos e não em
seus meros significados generalizados ou em conteúdos listados, só desta
maneira é possível, portanto, trabalhar a linguagem enquanto elemento
de emancipação humana.
Preocupamo-nos em negociar sentidos com os sujeitos e produzir
significados em diálogo e parceria com os educandos, num processo
dialético de diálogo, onde a palavra alcança sentido em seu contexto
específico, de maneira individual e coletiva. A palavra não pode ser morta
ou mórbida, fria e definida em significados estanques, jamais restrita ao
aprendizado de técnicas e noções gramaticais abstratas, alheias ao sujeito,
mas precisa ser dialógica, viva e construída no âmbito do diálogo e das
relações sociais concretas, pelas vivências dos sujeitos, dizendo sobre suas
vivências, dores, alegrias, anseios, sobre seus saberes concretos em
contextos reais, dando voz a estes, que outrora foram silenciados e
segregados do direito à educação.
O educador de jovens e adultos jamais pode impor algo aos
estudantes, o diálogo deve ser a principal maneira de atuação docente e
metodologia de ensino, pois é por meio da dialética da conversa aberta,
46
realmente interessada na palavra do outro é que o processo comunicativo
e de aprendizagem pode se concretizar de maneira mais efetiva e
consciente, sendo possível reconhecer as necessidades dos sujeitos e
articular esses anseios aos conteúdos formais e culturais do contexto
escolar.
O processo educacional precisa servir como afirmação da
liberdade dos sujeitos e de valorização de suas vozes e vivências para seu
desenvolvimento, instrumento de confirmar a liberdade, de escolher
conscientemente e de ter clareza dos contextos concretos que permeiam
as vivências dos sujeitos. A leitura histórica e reconhecer-se enquanto
pertencente a este processo é essencial para a emancipação e afirmação da
liberdade, pois remete a reconhecer a significação real do termo liberdade
e suas implicações na história e cultura dos sujeitos, tomando a opressão
como realidade histórica e antagônica à liberdade, utilizando a educação
nos círculos de cultura como prática crítica e libertadora de emancipação
dos sujeitos, sabendo por meio da linguagem fazer sua própria leitura e
pronúncia de mundo sobre a realidade concreta.
A palavra geradora, neste contexto, serve como início da reflexão
para quebrar o silêncio de populações silenciadas na sociedade, pois
permite pensar a realidade a partir de uma expressão verdadeira e legítima
dos sujeitos que tiveram suas vozes silenciadas em seu passado, que foram
segregadas do direito à educação e à voz no âmbito social. Quebrar o
silêncio, permitir possibilitar que essas vozes sejam ouvidas e ouvir
verdadeiramente, com interesse e intencionalidade, permitindo modificar
e ser modificado pelas palavras dos indivíduos, oriundas de motivações
particulares de seus contextos reais no processo de aprendizagem.
Apostamos em uma educação libertadora e dialógica, que
reconhece o contexto social, a cultura e a história dos sujeitos, assim
47
como as mazelas vivenciadas e suas especificidades, sabendo também da
responsabilidade da escola enquanto instrumento ideológico do Estado,
de desenvolvimento e atentos sobre quais os objetivos da aprendizagem e
os métodos de ação para intervenção nestas realidades.
Valores e regras são transmitidos pelos professores, pelos livros
didáticos, pela organização institucional, pela forma de avaliação [...]
espaço de práticas sociais em que os alunos não apenas entrem em
contato com valores determinados, mas também aprendam a
estabelecer hierarquia entre eles, ampliam sua capacidade de
julgamento e a consciência de como realizam escolhas [...] capaz de
posicionar-se e atuar em situações de conflito. Educar para a
cidadania é a exincia atual (VAIDERDORN, 2000, p. 109).
Com o auxílio de Paulo Freire reconhecemos que existe uma
decisão política em que pode-se optar, por um lado, por uma educação
libertadora, que se pretende dar voz aos sujeitos da aprendizagem e
desvelar questões da realidade, como desigualdades sociais, direitos
políticos e comunicação responsiva, prospectiva, objetivo e foco de
nossos esforços, ou, por outro lado, pode-se desenvolver uma educação
massificante, bancária e não-responsiva, em que a voz dos sujeitos não é
importante, não se levam em conta suas necessidades e anseios perante a
sociedade, tratando os aprendizes como meros receptáculos de
informações, passivos e não importantes, que devem simplesmente ouvir
e obedecer, assimilando conteúdos formais de uma cultura erudita alheia
a ele.
Nossas ações propõem uma educação responsiva e prospectiva,
capaz de ultrapassar a rebeldia da rebelião irresponsável, para alcançar
uma integração responsável com a realidade e com os direitos dos
sujeitos, capaz de argumentar por meio da linguagem de maneira crítica e
48
consciente sobre os assuntos que lhes são caros e que consideram
importantes, possibilitando por intermédio da linguagem a emancipação
pela pronúncia de mundo. Preocupando-se com a formação de conceitos
científicos e o acesso a conteúdos culturais elaborados, mas também com
a constituição do cidadão, com direitos e responsabilidades perante a
sociedade, enquanto membro importante e constitutivo da realidade,
capaz de fazer escolhas e modificar a realidade de maneira consciente e
autônoma, entendendo como emancipação tal atuação consciente na
realidade mediados pela linguagem.
Cabe a educação libertadora criar as condições necessárias para a
expressão dos sujeitos nas atividades comunicativas, incentivando a
participação crítica e livre dos sujeitos no processo educativo, dando a
estes a visibilidade e relevância que lhes foi negada no passado. Pensamos
a educação como prática de liberdade, com condições econômicas, sociais
e políticas para efetivar a participação dos sujeitos na sociedade de
maneira efetiva e valorizada, para que suas vozes sejam realmente ouvidas
e respeitadas enquanto pessoas autônomas e membros valorosos e
verdadeiramente integrados a sociedade, buscando superar “uma visão
instrumental da EJA, subordinando-a às exigências do mercado de
trabalho em detrimento de uma concepção de educação como direito
humano” (DI PIERRO; HADDAD, 2015, p.205).
A relão entre teoria e prática é condição necessária para uma
educação responsiva e libertadora, que pretende não somente sistematizar
saberes, focando em questões formais, em conteúdos sistematizados e na
cultura erudita, mas utiliza dos saberes sistematizados para desvelar a
realidade, para enxergar as condições concretas da sociedade e saber
conscientemente atuar nestes contextos reais, atuando assim efetivamente
como emancipadora. Portanto, não se trata de uma educação formalizada
49
e sistematizada meramente como uma listagem de conteúdos, tampouco
se pretende uma prática pouco fundamentada, sem clareza nos objetivos
das ações pedagógicas. Optamos pela interação didática dialética entre os
sujeitos da aprendizagem, entre saberes formais e sistematizados com a
realidade concreta dos educandos, sabendo reconhecer por meio da
palavra dos educandos as questões que lhes são importantes e assim atuar
de maneira crítica e significativa sobre estes contextos reais. Para estes
objetivos a teoria precisa se articular à prática e em constante
reformulação dialética em um processo constante de ação-reflexão-ação.
A articulação teoria e prática no âmbito da pesquisa no cotidiano
escolar busca motivar os sujeitos a interagir no interior da escola, para
que produzam suas próprias narrativas, contando suas vivências, tendo a
experiência formativa da escrita de textos autobiográficos para publicação
na internet e participação na Web 2.0, exigindo o resgate da memória e a
inserção dessas práticas no cotidiano escolar concreto, utilizando-se dos
gêneros discursivos como elementos para viabilizar a emancipação pela
mediação com a linguagem. Buscamos nessas práticas valorizar as vozes
dos sujeitos, suas vivências e experiências nas práticas cotidianas na
escola, assim como suas produções autorais, a participação e a valorização
de suas vozes na Web 2.0 para a efetiva inclusão destes sujeitos nos
ambientes digitais e pronúncia de suas realidades.
Por meio das publicações de suas autobiografias ou outros
conteúdos autorais que estes sujeitos consideram de importância
compartilhar com a comunidade, procuramos a valorização destes
sujeitos, de suas vivências, experiências, opiniões, pesquisas, atividades
escolares, interações, dentre outros conteúdos produzidos nas atividades
escolares. Nos interessamos pelo ponto de vista dos sujeitos, em saber
suas trajetórias de vida e investigar o processo de desenvolvimento da
50
linguagem com o objetivo de pronúncia de mundo e efetiva
emancipação, a partir de sua identidade cultural.
A memória nesta perspectiva não pode ser encarada como algo
estático, como uma verdade inquestionável, pois trata-se de um processo
de lembrar e esquecer, de enganos, incertezas e instabilidades. Desta
maneira, não pode ser abordada enquanto informações confiáveis e
dogmáticas, mas sim como um texto instável e que revela a experiência
refletida e reflexiva dos sujeitos neste processo de contar e lembrar. São as
relevâncias emocionais sobre suas próprias histórias, o que se considera
relevante e o que se acredita ser importante expor na internet para a
comunidade, sendo esta atividade “outra mirada sobre o mundo escolar,
seus tempos e seus ritmos culturas e poderes e pretende ser uma
alternativa à documentação dominante e uma modalidade de produção
do saber pedagógico” (SOUZA, 2011, p. 330).
Destacamos, também, que o projeto de pesquisa desenvolvido se
alinha com os pressupostos do Programa UNESP de Educação de Jovens
e Adultos (PEJA), uma iniciativa institucional que propõe pensar a
relação teoria e prática especificamente no contexto da EJA. Com
objetivo de construção de referenciais teóricos e metodológicos que
valorizem a formação humana, o desenvolvimento dos sujeitos e seu
acolhimento no ambiente escolar, pensando também a formação
especializada para esta modalidade de ensino (MIGUEL, 2009).
A pesquisa se situa no contexto das diretrizes de atuação do PEJA
e com suas práticas e implementou a plataforma digital do blog,
utilizando as TDIC, para incentivar o desenvolvimento e o acolhimento
destes sujeitos no processo de escolarização e de desenvolvimento da
linguagem, superando visões utilitaristas e profissionalizantes da educação
e das tecnologias, para abordar esses elementos como instrumentos
51
importantes de mediação para o desenvolvimento integral do ser
humano, incentivando o acolhimento, a colaboração e a autonomia entre
os sujeitos no interior do contexto escolar e em face à comunidade
externa.
Neste esforço de utilizar uma variedade de conteúdos ou de temas
geradores para a aprendizagem, durante o processo de construção de
narrativas autobiográficas é possível notar tensões e dilemas da relação
história e memória, sendo estas produções nunca um resgate integral do
passado, mas sim uma reconstrução das experiências com base na
memória dos sujeitos que contam suas vivências. Interpretação de
crenças, valores e de mundo pelos sujeitos que narram suas
autobiografias, a compreensão destes indivíduos sobre os acontecimentos
e relatos de sua memória, assim como sobre contextos mais amplos e
também sobre os conteúdos escolares tornaram-se acessíveis às nossas
atividades de pesquisa.
O olhar de investigação está orientado a compreender o processo
de produção das publicações dos sujeitos da EJA na internet, com
narrativas que tratem de suas experiências e memórias, sabendo-se da
instabilidade da memória, não são investigadas verdades absolutas e
relatos concretos sobre a história destes sujeitos, mas sim as reflexões,
indicativos, categorias e relatos apresentados por estes indivíduos durante
o processo de produção textual em atividades no CEEJA, investigando o
que estes valorizam e quais suas relações emocionais com suas próprias
histórias, relacionando sempre com os conteúdos de aprendizagem, com
contextos mais amplos e com o desenvolvimento da prática de leitura e
escrita.
52
Desenvolvimento pela linguagem e letramento digital
O desenvolvimento humano acontece nas relações sociais
mediados pela linguagem, onde o ser humano na ação comunicativa
interage com outros sujeitos e conhece novos saberes por meio da
interação e no diálogo, numa comunicação responsiva, procedendo com
sua própria leitura sobre o mundo, sua história e realidade concreta. O
significado das palavras é, portanto, cultural e é construído pelo sujeito a
partir dos intercâmbios sociais que este interage, atribuindo sentido às
palavras a partir de intensa construção social. O desenvolvimento
acontece entre sujeitos em ação comunicativa mediados pela linguagem,
interpretando sujeito como:
[...] o ser humano como sujeito sociocultural interativo, criador de
cultura, inconcluso e consciente de sua inconclusão, inserido num
meio histórico e socialmente construído por ele em conjunto com
outros membros do grupo social [...] sujeito de reflexão e de ação, de
criação e de reconstrução, em constante processo de transformação na
busca por tornar-se humano (VARGAS; GOMES, 2013, p. 451).
Esta noção de sujeito corrobora nossa perspectiva integral de ser
humano e de formação omnilateral, pois o indivíduo tem múltiplas
necessidades para sua vida em sociedade, sendo função da escola
interpretar estes sujeitos de maneira integral e reconhecer sua
complexidade nos trabalhos pedagógicos. Desta maneira é importante
reconhecer o ser humano como sujeito sociocultural, portador de cultura
e importante na sociedade, capaz pela mediação com a linguagem de
intervir da realidade concreta, de modificar aos outros e a si mesmo neste
processo de desenvolvimento e de pronúncia de mundo pela palavra.
53
A cultura escrita possibilita que os sujeitos transformem e sejam
transformados pelo contato social direto mediados pela linguagem,
através da cultura escrita e da linguagem o indivíduo pode compartilhar
conhecimentos, comunicar-se e conhecer novos saberes, assim como
expressar-se e atuar diretamente no mundo material, sabendo desvelar e
transformar a realidade, partindo do abstrato para o concreto pensado a
partir de suas próprias necessidades e anseios, desenvolvendo nesta
prática o pensamento verbal. Os materiais e suportes da linguagem, como
a língua escrita ou digital, modificam a maneira como os sujeitos atuam e
percebem a realidade, assim como as relações sociais. Por estes motivos, a
formação o pode centrar-se em apenas e um aspecto da língua ou em
categorizações abstratas, alheias à realidade dos sujeitos ou com um
objetivo muito delimitado como a formação restrita ao trabalho, mas
necessita pensar a partir do abstrato a realidade concreta e o
desenvolvimento integral dos sujeitos, pensando a formação a partir das
múltiplas necessidades do sujeito integral.
A partir desta ótica de sujeitos complexos, históricos e culturais,
buscamos sujeitos capazes de participar de um círculo de cultura, fazer
parte, construir e ser constituído por uma coletividade humana que os
represente e onde estes se identifiquem, sabendo-se enquanto membro
importante na sociedade, reconhecendo sua constituição histórica e
social, busca-se valorizar além da listagem de conteúdos teóricos, também
os contextos concretos e culturais dos sujeitos, suas histórias de vida,
gostos, vivências, perspectivas, apreensões, medos, vontades e sonhos.
Um sujeito mais complexo do que um mero trabalhador e receptáculo de
assuntos formais, rigorosamente organizados.
Atribuímos especial importância aos sentidos da aprendizagem e a
gerar necessidades nos sujeitos, de se reconhecerem enquanto seres
54
humanos construtores e constituidores de cultura, conscientes enquanto
seres históricos e sociais, portadores de cultura, sujeitos históricos e
culturais, como membros da realidade social e constitutivos dela,
desenvolvendo-se no contato social e pela mediação com a linguagem
“população, embora alfabetizada, não dominava as habilidades de leitura
e de escrita necessárias para uma participação efetiva e competente nas
práticas sociais e profissionais” (VYGOTSKY, 2001, p. 28).
O desenvolvimento do intelecto humano está associado, além do
intercâmbio social mediado pela linguagem, também pelo sentido
emocional que o sujeito atribui aos objetos de conhecimento. Assim o
pensamento humano passa pela atribuição de sentido e construção de
significados pelos próprios sujeitos, relacionando pensamento e
linguagem a partir da comunicação verbal. A palavra é a condutora do
pensamento verbal, utilizada pelos sujeitos para construir o significado
das coisas e para a ação comunicativa que proporciona o
desenvolvimento. A ação comunicativa e o desenvolvimento mediado
pela linguagem acontecem numa relação dialógica entre pensamento e
linguagem, onde o ser humano parte do pensamento para atribuir
sentido às palavras e ao mesmo tempo utiliza a linguagem para a
comunicação verbal e no pensamento verbalizado (VYGOTSKY, 2001).
Esta perspectiva de sujeito e de desenvolvimento humano nos
permite encarar melhor a complexidade da formação humana e trabalhar
o processo educacional em uma perspectiva omnilateral e de formação
integral. Nossas preocupações centram-se nas necessidades individuais,
nos sentidos que estes indivíduos atribuem ao processo educativo e nos
objetivos da aprendizagem que estes se propõem enquanto sujeitos do
próprio desenvolvimento, buscando criar necessidades no uso da
linguagem. Ao alinhar-se a esta perspectiva, os conteúdos e objetivos da
55
aprendizagem não podem ser impostos pelo profissional da educação,
mas articulados em parceria e diálogo direto com o educando, enquanto
sujeito e agente de sua própria aprendizagem, investigando suas
necessidades, respeitando sua complexidade enquanto ser humano em
um processo de formação integral e estimulando necessidades para uso da
linguagem nos contextos concretos e reais.
Nos círculos culturais é essencial que os sujeitos se reconheçam
enquanto seres de cultura e atores sociais, sendo criadores, motivadores e
transformadores da realidade concreta, onde modificam e são
modificados num processo dialético de desenvolvimento, reconhecendo-
se enquanto agentes de cultura. O trabalho docente nesta perspectiva
orienta-se com o uso da autobiografia para a tomada de consciência pelo
educando de sua situação social concreta, sabendo-se como sujeito
historicamente situado, localizando-se neste espaço social de cultura, para
a tomada de consciência de sua condição social concreta, podendo fazer
sua própria pronúncia de mundo objetivando sua emancipação enquanto
sujeito social.
Entendemos como uma relação direta e dialética entre a
compreensão que o sujeito tem a respeito da sociedade e seu acervo sobre
sua própria história e cultura, reconhecendo-se e modificando-se nesta
relação com a leitura diagnóstica que faz sobre a realidade, sobre as
situações e contradições vividas no âmbito social, apoiando-se em seus
conhecimentos sobre o passado, em sua leitura sobre o presente,
possibilitando prognósticos para seu próprio futuro. Utilizar da
autobiografia para saber reconhecer-se enquanto cidadão histórico
portador de cultura, que pode intervir diretamente no presente para
modificar o futuro, implica munir este sujeito de elementos culturais e de
linguagem, não por uma perspectiva impositiva e unilateral, mas por
56
meio do diálogo e da formação integral, atribuindo responsabilidade,
poder, autoria e autonomia aos indivíduos para atuar e modificar a
coletividade social mediados pela palavra.
O tempo, apesar de parecer acelerado perante ao fluxo crescente
de informações, continua sendo dialético quando se trata de
aprendizagem, portanto, não é viável que o tempo das produções
escolares exceda o tempo da aprendizagem. Muitas atividades são
executadas de maneira agilizada em ambientes digitais e sua prática vai se
construindo de maneira aprimorada, com mais qualidade e de maneira
mais ágil. Por outro lado, a aprendizagem deve ser atenta e respeitar os
momentos de reflexão e aprimoramento dos saberes dos sujeitos,
sabendo-se dialética.
Aprender a ler ou tornar-se leitor de textos e da própria realidade
deve ser o objetivo primordial das ações pedagógicas emancipadoras,
visando estimular práticas de leitura e escrita que permitam que os
sujeitos, ao longo das atividades e no decorrer do tempo, reconheçam-se
como sujeitos autores e leitores, criando a necessidade e o costume da
leitura no decorrer deste processo “o conteúdo escolar deva conduzir ou
ao menos contribuir para a emancipação dos sujeitos, volte-se para o
desenvolvimento da consciência ctica, propicie emoção ao ler e
encaminhe o processo educativo pautado por relações dialógicas”
(ARIOSI; MIGUEL, 2016, p.8), assim as atividades pedagógicas
precisam estimular o fascínio pela leitura, levando os sujeitos a refletir
sobre a produção dos textos escritos e a aplicação prática destes nos
contextos reais, nesta ótica aprender a ler ou desenvolver a prática de
letramento em contextos digitais é importante não somente como “forma
de possibilidades ampliadas de comunicação, mas como tecnologia a
transformar o sujeito aprendiz em sua inserção direta num mundo
57
mediado por novas e sofisticadas tecnologias” (GIROTTO, 2013, p.
344).
Os computadores, a internet e todos os demais recursos digitais
que contemplam as TDIC são interpretados como suportes da
comunicação verbal ou da linguagem em ambientes digitais, sendo esta
uma nova maneira de comunicação humana, assim como a folha ou o
papiro. A inclusão de um novo suporte de linguagem implica em novas
práticas de comunicação verbal e de expressão humana. Entendemos o
letramento como a capacidade do sujeito em utilizar da linguagem, seja
oral, escrita ou digital, para compreender e atuar na realidade concreta
em contextos reais, comunicar, expressar e agir, desta maneira, o
indivíduo pode internalizar conhecimentos exteriores e ressignificar estes
saberes para atuar de maneira consciente e autônoma na sociedade por
meio do uso desta linguagem e de seus múltiplos suportes.
Compreendemos o trabalho docente com o letramento como:
[...] um trabalho docente com as linguagens no sentido de contribuir
com a construção de sujeitos capazes de transitar, compreendendo,
interpretando e respondendo, a partir de posicionamentos valorados,
(a)os discursos produzidos e circulantes nessa sociedade [...]
concepção de linguagem/língua voltada para o acontecimento
discursivo, configurado em enunciados inacabados, irrepetíveis, cujo
funcionamento não se dá pela estrutura, mas em rede (OLIVEIRA,
2014, p. 186).
As TDIC apresentam-se como suportes de linguagem e meio para
a aprendizagem e mobilização de sujeitos com as atividades de
letramento, também como espaço digital de alfabetização escrita e digital
que aproxima os sujeitos do ambiente escolar e não numa proposta de
educação à distância, no sentido de estar afastado ou de deslocamento
58
com a escola, mas trabalhamos as TDIC no contexto escolar no sentido
de proximidade com sujeito com a escola, com a linguagem e de
valorização dos sujeitos no processo de desenvolvimento.
O contato direto com os objetos culturais e de conhecimento, em
seus contextos reais de utilização, com aplicação prática e direta na
realidade concreta é a atividade central em nosso processo de ação
educativa e dos objetivos de pesquisa. Incentivamos, através do diálogo e
do contato direto com os objetos de estudo, a apropriação de objetos
culturais pelos sujeitos, trata-se de incentivar a apropriação pelo sujeito
de um conjunto de materiais simbólicos abstratos para a construção do
concreto pensado, para um inteligível objeto cultural, efetivamente
apropriado pelo sujeito, em toda sua complexidade de construção e
aplicação real de maneira significativa para o sujeito neste processo.
A comunicação deve ser dialética e é elemento central de nossas
ações e condição para o desenvolvimento pela linguagem, pois acontece
na troca entre os sujeitos no processo de comunicação verbal, em que as
palavras circulam entre as pessoas e as modificam mutuamente neste
processo de comunicar-se e expressar-se no mundo, dizendo e fazendo-se
entender. Ao mesmo tempo em que me comunico e expresso um
pensamento, sou modificado pelo que pensou e pelo que escuto, leio ou
escrevo e comunico. Desta maneira, trata-se de uma comunicação
responsiva e não unilateral, ocorre em que o diálogo, acontece em via de
mão dupla, com todos os participantes da ação comunicativa atuando e
modificando-se neste processo.
Essa comunicação dialética e responsiva não se trata de um
acontecimento passivo em que a pessoa simplesmente escuta ou aceita
passivamente uma informação ou expressão verbal imposta pelo parceiro
mais experiente, mas é o espaço de ouvir e fazer-se ouvir, refletindo sobre
59
novas informações e internalizando novos saberes, enriquecendo o acervo
cultural do sujeito. Trata-se de um processo de modificar e ser
modificado pela palavra, ao mesmo tempo em que acontece a
comunicação verbal no contexto concreto da vida humana e em situação
de comunicação. O momento da ação educativa é o espaço para dar voz
ao educando sujeito de seu desenvolvimento e ouvir com atenção o que
este tem a enriquecer neste processo.
A leitura da escrita em papel é mais linear e sequencial, enquanto o
texto na tela o hipertexto pode ser lido de forma multilinear,
acionando links, abrindo a leitura para múltiplas possibilidades [...]
presente não em páginas, mas em dimensões superpostas e que se
reconfiguram a cada nova leitura (GIROTTO, 2013, p. 344).
A escrita em ambiente digital apresenta peculiaridades inerentes a
este novo suporte e escrever na Web 2.0 é efetivamente estar incluído na
internet, colaborar ativamente na construção dos textos digitais e fazer
parte deste ambiente mediado pela linguagem digital. Os textos digitais
apresentam-se multimodais, repletos de hipertextos e múltiplas mídias,
textos escritos, áudios, imagens, imagens em movimento e links, assim a
leitura nestes suportes apresenta-se mais dinâmica, relacionando
múltiplas mídias e vozes “recursos semióticos disponíveis para construir
sentido e afirmar suas relações com os significados expressos. Em
particular, elas combinam imagens e outros recursos visuais com a
palavra escrita online” (BARTON; LEE, 2015, p. 33). A multimodali-
dade também implica na construção simultânea destes textos, ou seja, são
os usuários da Web 2.0 que em coletividade constroem os textos, por
meio de suas múltiplas vozes. Diferentes modos de ser leitor se constroem
na hipermodernidade e a comunicação verbal amplia-se e ganha novas
características com a multimodalidade dos textos digitais, pois implica
60
em novas práticas de comunicação verbal nestes novos contextos. Assim,
a comunicação continua sendo significativa, só que apresenta novos
aspectos e novas maneiras de ser construída, mais rápida e dinâmica,
contando com múltiplas vozes e de variadas mídias.
As investigações sobre a blogosfera, ou seja, sobre a cultura do uso
de blogs apresentou uma ampla utilização deste recurso em contextos
educacionais, inclusive com produções acadêmicas (BEZERRA, 2011, p.
26) e múltiplas práticas pedagógicas que envolvem a utilização do blog
como um acervo de conteúdo, como espaço de comunicação entre
docente e discente e como espaço de desenvolvimento de atividades de
classe como provas e trabalhos escolares, já outra propostas aproximam-se
mais com as nossas, com a perspectiva do multiletramento, investindo
em práticas de letramento nestes contextos digitais, promovendo assim
práticas de leitura e escrita em ambientes digitais e de maneira
colaborativa entre os sujeitos (BORTOLOZO, 2016, p. 49). O letra-
mento envolve o uso da linguagem em contextos concretos e nossa
abordagem vai neste encontro, propondo ainda o uso do blog enquanto
uma Biblioteca Popular em ambiente digital:
[...] biblioteca popular, com inclusão deginas escritas pelos
próprios educandos. [...] a acreditar nas massas populares. Já não
apenas fale a elas ou sobre elas, mas a ouça, para poder falar com elas
[...] como centro cultural e não como depósito silencioso de livros
(FREIRE, 1989. p. 20).
O blog neste contexto de hipermodernidade e de linguagem
digital aparece como uma alternativa pedagógica de inclusão das TDIC
nas atividades pedagógicas de maneira significativa e de letramento
digital, estimulando práticas de letramento nestes novos contextos aliadas
61
ao uso dos gêneros discursivos, em especial a autobiografia. Como
metodologia de ação em EJA, propomos na investigação utilizar o blog
como uma Biblioteca Popular na perspectiva de Paulo Freire, utilizando
deste espaço digital para dar voz aos sujeitos, para participar e atuar na
sociedade contemporânea objetivando sua emancipação.
As práticas de letramento que propomos com o uso do Blog no
contexto da EJA implica refletir sobre as desigualdades sociais,
interpretando este modo de ação pedagógica como uma maneira de
incluir por meio das práticas de letramento, com domínio da linguagem
digital, visando a participação social e a transformação da realidade
concreta, promovendo situações de aprendizagem que incluam estes
sujeitos nos ambientes digitais e que possam participar verdadeiramente
da Web 2.0 (BRAGA, 2015, p. 46) e desta maneira que possam
efetivamente fazer parte da hipermodernidade, tendo uma participação
cidadã através do blog enquanto uma biblioteca popular de valorização
de suas vozes, utilizando da autobiografia como estratégia para a
emancipação, estimulando a reflexão crítica sobre a realidade, a
pronúncia de mundo e o reconhecimento de sua própria história
enquanto ser social e cultural.
Apesar da ampla utilização de blogs em atividades pedagógicas e
inclusive em pesquisas acadêmicas na área da educação, não encontramos
propostas que associem as atividades de letramento nestes contextos
digitais com os instrumentos propostos na pesquisa e com a orientação
teórica da biblioteca popular, ampliando o ambiente digital do blog
como um espaço de valorização das vozes dos sujeitos e como método de
incentivar a leitura e a escrita na EJA, atribuindo aos sujeitos o status de
autores e conteúdos no blog e promovendo o letramento em contextos
significativos.
62
Utilizamos durante a pesquisa preferencialmente softwares livres
como uma alternativa de trabalhar com diversas mídias “tão facilmente
quanto trabalhamos hoje com a escrita, sem necessidade de materiais de
custo proibitivo, sem uma aprendizagem excessivamente complexa
(LÉVY, 1993, p. 103), TDIC construídas por uma coletividade na
internet e partimos da noção de hacker em uma perspectiva pedagógica:
Essa figura, o hacker, nas comunidades de Software Livre não é definida por
intenções escusas, mas, antes, pela característica proativa, curiosa, sedenta de
conhecimento, aquele que constrói o que falta, refaz os passos de outros pra aprender e
reinventar seus próprios, sem medo de errar, sem vergonha de pedir ajuda. O hacker é o
aprendiz ideal da educação libertária, pois ama aprender e adora compartilhar esse
prazer com os outros (MATTE, 2018, p. 349).
Assim como uma biblioteca popular, o blog apresenta-se como
um espaço de voz desses sujeitos da EJA, de compartilhamento de ideias
e experiências, local em que podem expressar-se e contar suas vivências e
histórias de vida, valorizando sua expressão enquanto cultura e
reforçando sua própria identidade. Interpretamos o blog enquanto uma
biblioteca popular, no sentido de ser um espaço de valorização dessas
vozes populares, nem sempre ouvidas ou valorizadas. Preocupamo-nos
em enxergar os educandos como sujeitos complexos e portadores de
riqueza cultural, enquanto membros importantes e constitutivos da
sociedade, como parte de um contexto mais amplo, que merecem além
do direito à educação, o direito de serem ouvidas e de se expressas nos
ambientes digitais, sendo estes espaços contextos reais contemporâneos,
participando ativamente da Web 2.0, colaborando com conteúdos e
produzindo novos conhecimentos em cooperação com outros sujeitos,
uma colaboração criativa que mira no desenvolvimento da linguagem por
meio das práticas de letramento.
63
PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
Fundamentão e organização da pesquisa qualitativa
_______ ____________ ____________ _______________ ____________ ____________ _____________________ _______________ ____________ ___________ ____________ _______________ _______________ ____________ ____________ ____________ _______________ ____________ ___________ _______________ ____________ _______________ ____________ ____________ _________
A pesquisa participativa foi de tipo qualitativa e utilizou a
abordagem pesquisador-participante (LÜDKE; ANDRÉ, 1986), sendo
que durante os procedimentos metodológicos para geração e coleta de
dados foi elaborado um experimento formativo de utilização do blog
diretamente no campo de investigação e em relação direta com os
sujeitos. A pesquisa ocorreu em uma realidade específica e singular, de
um CEEJA com características próprias, como prêmios nacionais e uma
organização diferenciada em projetos e rodas de conversas extracurricu-
lares (SOUZA, 2018, p. 10). Portanto, pode-se afirmar que a pesquisa se
desenvolveu em ambiente favorável a sua aplicação. Por outro lado, os
materiais e os métodos de utilização do blog na realidade escolar foram
organizados de maneira que possam ser generalizados e possivelmente
utilizados por outras instituições de ensino que assim o desejarem,
respeitando as especificidades de cada local e a dialogicidade entre os
sujeitos.
64
Tabela 1 - Etapas da Pesquisa
ETAPAS DA PESQUISA
ETAPA
DESCRIÇÃO DAS AÇÕES DE PESQUISA
Mar/2018 -
Fev/2019
Primeiros contatos, diálogos no local de pesquisa e
implementação do blog no CEEJA
Mar/2019 -
Mai/2019
Publicações, acompanhamento de alunos e coleta de
dados via posts no blog
Jun/2019 -
Nov/2019
Encontros dialogados com sujeitos para geração de
dados, acompanhamento de autores em publicações
no blog e atividades de formação
Dez/2019 -
Mar/2020
Reflexão sobre os resultados e dados obtidos e
publicação de material acadêmico e dissertação
Fonte: Do autor.
Os procedimentos metodológicos iniciam-se na implementação
de uma plataforma didático-pedagógica digital no cotidiano escolar do
CEEJA, utilizando das TDIC para promover práticas de leitura e escrita
em ambiente digital com foco no desenvolvimento dos sujeitos pela
linguagem. A implementação do blog objetiva efetivar a utilização dos
gêneros discursivos, em especial da autobiografia, com foco na
emancipação dos sujeitos, utilizam-se das TDIC como meio de
acolhimento aos sujeitos, incentivo a participação colaborativa, estímulo
ao diálogo e a interação entre os sujeitos, enquanto um espaço de
letramento, por meio de práticas de leitura e escrita que promovam a
emancipação pelo uso da linguagem, com criação de produções autorais
65
de valorização de suas vozes e publicações regulares na plataforma de
pesquisa dos materiais produzidos.
Buscamos refletir sobre a realidade dos indivíduos na EJA a partir
de seus próprios relatos de autobiografias produzidas e publicadas no
blog, utilizando da linguagem em contextos reais, pelo contato direto
com as TDIC e pela valorização de suas histórias. Procuramos, com o uso
dos gêneros discursivos, maneiras de atribuir sentido ao uso das TDIC
em contextos reais, com atividades de letramento, ou seja, no uso dessas
ferramentas digitais na realidade concreta para a resolução se seus
próprios anseios e como maneira de reforçar suas identidades e valorizar
suas experiências. Tratou-se da inclusão destes em ambientes digitais por
meio de atividades significativas, com foco no uso dos gêneros
discursivos, em especial da autobiografia, enquanto instrumento de
valorização de suas biografias e de suas vozes como forma de
emancipação dos sujeitos, mediados pela linguagem enquanto um direito
dos sujeitos, tomando os alunos como autores em sua pronúncia de
mundo.
[...] o encontro dialogado é aqui compreendido como um gênero do
discurso que configura uma possibilidade metodológica para a
geração de dados nas situações em que o pesquisador também se
constitui como sujeito protagonista da pesquisa. Nesse contexto de
geração de dados os enunciados dos protagonistas perdem sua relação
com os discursos [...] (TAMURA, 2018, p. 44).
Partindo desta reflexão a investigação contou com dois
instrumentos principais para a geração e coleta de dados, as publicações
no blog e os encontros dialogados. Ambos os instrumentos partem da
perspectiva da alteridade na ação comunicativa, a partir da relação direta
com os sujeitos e não de uma análise externa ao campo de pesquisa. O
66
encontro dialogado travou-se na alteridade entre os sujeitos da ação
comunicativa, investigando nos enunciados a percepção dos indivíduos
sobre o experimento formativo desenvolvido no contexto da pesquisa.
O blog foi pensado como instrumento no todo escolar,
articulando cotidiano e sociedade, gestão e práticas pedagógicas, forma e
conteúdo, objetivos da aprendizagem e métodos de ação, superando a
fronteira pátio e sala de aula, assim como incentivando a relação escola e
comunidade. Organizamos nossas ações e interações com os sujeitos com
o objetivo de promover interações no interior da escola e a relação com a
comunidade, estimulamos os sujeitos a atuar no cotidiano, utilizando as
TDIC enquanto linguagem para intervir no plano concreto, para pensar
e atuar na realidade social do sujeito e da comunidade ao redor.
Os materiais utilizados foram organizados para que a pesquisa
fosse exequível em tempo hábil. Para tanto optou-se pelo sistema
WordPress.com, o qual é um recurso proprietário, ou seja, pertence a
uma empresa privada, porém temos clareza, inclusive por conta da
perspectiva teórica que optamos, de que o cenário ideal contaria com o
uso do sistema WordPress.org, que é uma ferramenta opensource, ou
seja, é criada e mantida de maneira colaborativa pelos usuários na
internet, sendo um sistema aberto e de uso público e gratuito.
Outros sistemas opensource foram utilizados como materiais da
pesquisa como os Sistemas Operacionais, baseados em Linux Ubuntu e
Debian, a Suite de escritório LibreOffice e o programa de edição de
imagens GIMP. Outro sistema proprietário utilizado na pesquisa por
conta do tempo hábil foram as contas do Google Suite, visto que a
instituição escolar possui e-mails e contas coorporativas com este sistema,
o que facilitou a implementação dos recursos utilizados na pesquisa.
Cabe ressaltar que o uso de nenhuma das ferramentas gerou custos à
67
instituição e que os softwares proprietários preferencialmente devem ser
substituídos por softwares livres.
O experimento formativo foi organizado a partir da perspectiva
dialógica, partindo da alteridade entre os sujeitos e do diálogo, com
atividades de letramento, organizando nosso plano de ação em quatro
etapas: primeira da implementação, segunda da utilização, terceira das
conversas e quarta das publicações dos resultados da pesquisa. A primeira
etapa foi o momento de implementação do instrumento de pesquisa, que
contou com intensa participação do pesquisador no interior da
organização escolar, em relação direta com o campo, participando
ativamente no cotidiano do CEEJA, compreendendo as necessidades
junto a coordenação pedagógica da instituição e atuando com frequência
em parceria com a equipe. Desta maneira, foram elaboradas páginas para
utilização pela equipe escolar, formulários para coleta de informações,
planilhas de controles, sistemas para emissão de certificados, organizando
as Oficinas e Rodas de Conversas que acontecem no CEEJA e demais
necessidades do cotidiano escolar.
A relação entre esses contextos sociais mais amplos, suas origens
sócio-históricas do campo da EJA e dos perfis mais gerais destes sujeitos,
assim como a construção de subjetividades nas narrativas das produções
no contexto da pesquisa, permite o olhar para os sujeitos sobre suas
próprias vivências e a maneira como estes utilizam da memória e da
emoção para construir suas autobiografias, com especial atenção aos
enunciados produzidos por esses sujeitos e a maneira de anunciação,
entendendo este enunciado como uma unidade de significado da
linguagem humana com estrutura, estilo e conteúdo (BAKHTIN, 2016,
p. 12). Investigamos a maneira como estes indivíduos lembram-se de suas
experiências, o que valorizam e como acontece o processo de construção
68
dessas narrativas no âmbito das atividades de produção no blog escolar na
EJA viabilizando a pronúncia de suas próprias realidades e a efetiva
emancipação dos autores mediados pela linguagem.
A partir da perspectiva dialógica e praxiológica o envolvimento
com a instituição foi intenso, foram ouvidas as necessidades da gestão, da
coordenação pedagógica e dos professores, buscando assim viabilizar o
uso do sistema pelos profissionais da educação, assim como as adequações
técnicas para utilização da plataforma no contexto educacional. Desta
maneira buscou-se estruturar o blog para o uso pedagógico, criando
materiais de apoio, atalhos e links para as páginas, planilhas, formulários,
pastas e outros recursos disponíveis para a organização escolar e trabalho
didático. Foi efetiva a transformação no blog da escola, uma vez que a
instituição já utilizava do sistema base da pesquisa, o WordPress.com, em
um blog simples que existia desde Abril de 2016 e que estava com os
acessos em baixa, fator relevante, pois a boa parte das tentativas de
utilização de blogs em contextos escolares acabam por deixar de existir
antes de seu primeiro ano de utilização por baixa nos acessos e
dificuldade em manter a publicação de conteúdos.
Na segunda etapa da pesquisa, de utilização direta pelos sujeitos e
de criação de conteúdos para publicação pelos mesmos, é visível nas
estatísticas do blog a relação entre os procedimentos de implementação
da pesquisa e a criação de publicações e de conteúdos autorais pelos
sujeitos como impulsionadores dos acessos, elemento importante para a
manutenção do blog, visto que a quantidade de acessos motiva os
envolvidos na criação de conteúdos, perpetuando o uso do blog e fazendo
com que este não deixe de ser continuado. Durante a segunda etapa
foram elaboradas publicações autorais por professores e alunos, com
especial análise das postagens de alunos, visto que são os sujeitos de nossa
69
investigação, visando sua produção textual, o desenvolvimento da
linguagem e de práticas de leitura e escrita, tendo contato direto com as
TDIC em contextos reais e significativos.
Já na investigação com os professores e demais profissionais na
instituição de ensino, foram abordadas questões formativas, como as
relações destes sujeitos com as TDIC e com a metodologia de utilização
do blog proposta pela pesquisa. Neste momento de criação de
publicações para o blog, os sujeitos foram convidados a produzir
conteúdos, porém os assuntos a serem publicados não foram instruídos
de maneira restritiva, ditando o que os sujeitos precisavam escrever, mas
foram estimulados a produzir autobiografias, contando suas histórias de
vida e experiências para um grande público, tratava-se de uma orientação
e indicação de publicação, onde os sujeitos estavam livres para optar pelo
que publicar no blog, desde que estes conteúdos fossem significativos e
autorais.
Neste momento de produção das publicações os sujeitos
contaram com o apoio intensivo do pesquisador, que participou
diretamente de quase todas as publicações dos sujeitos, acompanhando
de perto e orientando o que fosse necessário nos procedimentos, tanto de
elaboração dos conteúdos, com a escrita das publicações, quando nos
momentos de submissão de seus trabalhos no painel de controle do blog
e efetiva publicação online para acesso irrestrito de um público amplo na
internet, envolvendo-se diretamente pelo diálogo com os sujeitos no
campo de pesquisa. Esta aproximação com os sujeitos durante os
momentos de elaboração dos conteúdos permitiu notar a necessidade de
formação para uso destes equipamentos, inúmeras vezes relatado pelos
sujeitos, tanto por professores quanto por alunos, principalmente pelos
alunos, que em muitos casos relatam não ter acesso a estes equipamentos
70
em outros contextos ou ainda admitem ter medo destes recursos, já os
professores questionam a falta de formação específica para o uso
pedagógico e adequado destes recursos, de maneira consciente e
autônoma por via oficial.
A criação das temáticas, a elaboração de contdos, das postagens
e publicação no blog envolveram momentos de relevância nuclear para a
investigação, pois são os momentos de desenvolvimento significativo da
linguagem, de intervenção didática e de criação de conteúdos autorais
pelos sujeitos, pesquisando neste processo as práticas pedagógicas que
incentivam o desenvolvimento de práticas de leitura e escrita de maneira
significativa pelos sujeitos, as carências e dificuldades neste processo as
temáticas privilegiadas e o uso dos gêneros discursivos como
instrumentos de emancipação pela linguagem. Tratou-se do momento
em que os sujeitos tomaram contato direto com os computadores e
puderam pensar de maneira autônoma quais conteúdos e relatos
desejaram compartilhar com o público do blog em suas autobiografias.
Preocupou-se nesta etapa em auxiliar os sujeitos no que fosse requerido e
principalmente em valorizar a autonomia destes na criação dos conteúdos
para a web, valorizando suas vozes como conteúdos significativos, que
eles atribuem sentido suficiente para ser devidamente compartilhado na
internet.
Respeitando a dialogicidade e alteridade próprios da linguagem os
sujeitos foram livres para tomar decisões sobre suas próprias publicações,
prestando atenção sobre quais foram as intervenções necessárias para
viabilizar a publicação dos conteúdos, quais as ajudas que estes requeriam
dos professores envolvidos e do pesquisador neste processo, quais os
gêneros textuais foram trabalhados e como ocorreu o processo de criação,
formatação e publicação dos conteúdos no blog. Assim, a investigação
71
partiu da dinâmica de elaboração dos conteúdos pelos sujeitos e da
adequação ou correção dessas produções para a publicação, evidenciando
as modificações na linguagem impulsionadas pelas atividades escolares e o
contato direto com as TDIC neste processo, com foco nos gêneros
discursivos, em especial à autobiografia, com vista a fuão social dos
textos e a emancipação dos sujeitos autores neste processo.
A terceira etapa foi o momento dos encontros dialogados, que foi
importante para coletar as percepções dos sujeitos sobre a experiência
com o blog, assim buscamos seus pontos de vista durante este processo,
investigando suas principais queixas e também quais avanços eles
enxergaram que a experiência proporcionou. Analisando tamm os
conteúdos produzidos e verificando a continuidade dos trabalhos, desta
vez sem o auxílio intenso e direto do pesquisador que era prestado nos
dois primeiros momentos de investigação, mas como uma assistência
com dificuldades que surgiam de maneira menos intensa. Com esta
dinâmica propomos evidenciar as dificuldades da utilização do blog de
maneira autônoma e as necessidades formativas inerentes a este processo.
A quarta etapa tratou de dedicar-se a sistematização dessas
informações, a reflexão e análise sobre as ações desenvolvidas e conteúdos
produzidos nos momentos anteriores, assim como a escrita da
dissertação, procurando evidenciar nossas preocupações teóricas e alinhar
a metodologia de utilização das TDIC na EJA com fins de
desenvolvimento da linguagem, de estimular a prática de leitura e de
escrita e de valorização de suas vozes e experiências.
Durante toda a pesquisa buscou-se uma relação praxiológica com
o campo de investigação, em uma relação dialética de ação-reflexão-ação
sobre as ações durante as atividades cotidianas no interior da escola, em
relação e contato direto com os sujeitos no campo, com as TDIC como
72
instrumentos de desenvolvimento da linguagem e a autobiografia como
principal gênero de emancipação nas ações desenvolvidas, tomando as
biografias e produções autorais dos sujeitos como núcleo de reflexão
enquanto resultados de pesquisa. Nosso empenho está no processo de
aquisição e desenvolvimento da linguagem como emancipadora,
utilizando das publicaçõe no blog e dos encontros dialogados como
fontes das vozes destes sujeitos.
A apresentação e a análise dos resultados foram organizadas em
três momentos: análise dos conteúdos das publicações postadas pelos
sujeitos no blog, os encontros dialogados com os alunos investigando
seus próprios enunciados sobre o processo e as percepções do pesquisador
e da equipe pedagógica sobre o experimento formativo. A relação do
pesquisador com o campo está articulado à viabilização da pesquisa e a
atender de maneira significativa as necessidades dos sujeitos diante do
cotidiano escolar e das atividades propostas, sabendo-se enquanto
dialógica, viabilizando reconhecer o dinamismo da linguagem nos
múltiplos enunciados e temáticas propostas pelos sujeitos nas diferentes
etapas dos procedimentos de pesquisa.
Os resultados da análise dos conteúdos publicados pelos sujeitos e
os assuntos abordados nos encontros dialogados retratam o perfil destes
sujeitos, os assuntos que eles elegeram e destacaram em suas próprias
publicações autorais, buscamos assim perceber quais conteúdos foram
privilegiados pelos sujeitos, elegendo por meio da memória o que devem
incluir em suas narrativas autobiográficas. A relação dialógica com os
conteúdos, com os sujeitos e com o campo de pesquisa apresenta-se
durante todo o processo de investigação, ajustando os procedimentos e
metodologias a partir das necessidades apresentadas no decorrer das
atividades, mobilizando novos saberes neste processo e reconhecendo a
73
riqueza das histórias de vida relatadas nas publicações e encontros
dialogados.
Com os encontros dialogados sobre o experimento formativo
buscamos a perspectiva dos sujeitos, buscando compreender por
múltiplos ângulos a implementação do blog na escola e as nuances deste
processo pela perspectiva dos sujeitos envolvidos, investigando pela
alteridade dos enunciados a perspectiva dos sujeitos sobre o processo de
utilização do blog, ou seja, qual o ponto de vista deles sobre o
experimento formativo desenvolvido durante os procedimentos de
pesquisa. A perspectiva dialógica da abordagem pesquisador participante
justifica o estreito envolvimento do pesquisador com os sujeitos e com o
campo, a fim de compreender de maneira praxiológica este processo,
investigando com profundidade a implementação do blog na escola, em
contato direto com os sujeitos nos diferentes momentos de sua utilização,
buscamos assim as fragilidades e avanços deste processo.
O experimento didático-formativo foi a estratégia utilizada para a
geração de dados para a pesquisa, com abordagem dialógica e em uma
relação praxiológica com o campo de investigação, utilizando-se da
pesquisa qualitativa a partir da abordagem pesquisador-participante, ou
seja, buscam-se a partir dos objetivos da pesquisa uma relação dialógica
direta entre o pesquisador e seu campo de investigação, modificando o
ambiente e deixando-se modificar neste processo, portanto, não se
propõe o afastamento com campo de pesquisa, mas sim uma relação
íntima e direta com este, buscando assim efetivar os objetivos da pesquisa
em sincronia com a perspectiva reflexiva durante a investigação
(ARAÚJO, 2018, p.45).
Os esforços iniciais foram centrados em viabilizar uma
perspectiva pedagógica do uso do blog, orientando nossas ações no
74
sentido de seu uso didático pelos professores e alunos, com a finalidade
de desenvolvimento da linguagem dos sujeitos por meio de práticas de
leitura e escrita em ambiente digital em contato direto com osneros
discursivos, com especial atenção à autobiografia como emancipação pela
valorização das histórias dos sujeitos. A partir da relão praxiológica e
dialógica da abordagem da pesquisa e pela aproximação com o campo de
investigação, foram apresentadas novas necessidades pela instituição, até
então não sistematizadas, como a organização de documentos e de
atividades de gestão escolar, as quais foram atendidas na mesma lógica de
ação-reflexão-ação das possibilidades pedagógicas, assim os recursos
foram implementados, utilizados e atualizados em todos os momentos,
partindo da reflexão sobre sua utilização integradas ao cotidiano escolar,
sempre com intenso diálogo com os envolvidos.
Alguns questionamentos didáticos orientaram nossas ações de
implementação e reflexão sobre a utilização do blog integrado ao
cotidiano escolar, principalmente pelo viés do desenvolvimento da
linguagem, pelo uso dos gêneros discursivos para a emancipação e da
criação de contextos favoráveis para a prática de leitura e escrita nestes
ambientes, sempre situando a incorporação destes recursos atrelada ao
cotidiano escolar. Buscou-se evidenciar junto com os sujeitos da pesquisa
uma utilização significativa do blog para atuar nos contextos digitais,
tomando consciência do significado que o blog pode assumir dentro do
cotidiano escolar para as atividades didáticas, assumindo este como um
objeto cultural e de participação social, como um suporte de linguagem,
capaz de incluir ou excluir indivíduos dos ambientes digitais.
Preocupamo-nos em utilizar o blog como uma ferramenta de inclusão
dos sujeitos nos contextos digitais e de real significado para as atividades
escolares, utilizando este como um instrumento motivador da
75
participação e gerador de necessidades, que viabilizem a efetiva
emancipação pela mediação com a linguagem nos contextos reais da EJA.
Nesta perspectiva investigam-se práticas significativas de inclusão
dos indivíduos da EJA nos contextos digitais com vistas à emancipação
dos sujeitos pela linguagem, assim criar ambientes favoráveis ao
desenvolvimento pela linguagem, de estímulo às práticas de leitura e
escrita nestes locais e de uso significativo dos gêneros discursivos,
procedendo com uma educação inclusiva e libertadora, que promova a
valorização destes sujeitos e a participação efetiva na sociedade e em
ambientes digitais, mediados pela linguagem em surporte digital. A
relação entre os sujeitos da EJA e as TDIC foi palco da pesquisa,
investigando como os indivíduos enxergam estes recursos e quais práticas
estimulam o desenvolvimento da linguagem e práticas de leitura e escrita
utilizando dos gêneros discursivos nestes suportes digitais. Procuramos
maneiras de participação significativa no blog que favoreçam o
desenvolvimento dos sujeitos e a inclusão destes em práticas de
emancipação nestes contextos, incentivando uma verdadeira inclusão
digital por meio da expressão e da utilização da linguagem por meio do
letramento em contextos reais e em suportes digitais.
O olhar foi orientado sobre as motivações e necessidades dos
sujeitos para a produção dos textos para publicação no blog, procurando
quais conteúdos são valorizados por esses indivíduos e quais os assuntos
mais recorrentes, sondando assim quais temáticas os sujeitos elegem em
seus enunciados e a maneira como estes produzem suas narrativas
autobiográficas. Procurou-se valorizar a produção autoral e a criatividade
dos sujeitos por meio da autobiografia, estimulando produções que
contassem suas histórias de vida e experiências em face ao contexto
escolar do CEEJA, observando os interlocutores e enunciados
76
produzidos. Foram estimuladas as interpretações dos sujeitos sobre suas
próprias vivências, valorizando o perfil e reforçando a identidade dos
sujeitos que aparecem nos enunciados, a maneira de se expressar e quais
memórias foram valorizadas neste processo, investigando como os
sujeitos constroem suas narrativas, qual o sentido alcançado para essas
pessoas, como essas autobiografias são construídas e de que maneira a
linguagem é mobilizada para alcançar o objetivo de se expressar por meio
da publicação no blog.
As produções dos alunos permitem reconhecer como a identidade
da população da EJA estão enunciadas nas narrativas dos sujeitos, ou seja,
como essas histórias individuais foram relatadas e como se envolvem com
contextos mais amplos da sociedade, reconhecendo essas pessoas como
portadores de cultura e imersos em um ambiente social e histórico.
Buscou-se utilizar o blog na perspectiva da biblioteca popular pensada
por Paulo Freire, valorizando as vozes dos sujeitos e utilizando do
ambiente do blog para a afirmação de suas identidades, onde podem
expressar-se e comunicar-se por meio de suas próprias produções, criando
materiais e conteúdos sobre suas biografias em ambiente digital.
Incentivaram-se práticas no uso das TDIC que favorecem o
desenvolvimento dos sujeitos mediados pela linguagem e pelo uso dos
gêneros discursivos, em especial da autobiografia, afirmando a identidade
dos indivíduos e reconhecendo estes como portadores de cultura, desta
forma o blog apresenta-se como um espaço para a instituição escolar
conhecer de maneira mais profunda, reconhecendo seus sujeitos e suas
maneiras de se expressar e na perspectiva dos indivíduos que publicam, a
oportunidade de comunicar suas vivências, expressando-se por meio da
linguagem, utilizando da comunicação verbal para atuar na sociedade nos
77
ambientes digitais, observando os interlocutores e a função social das
produções elaboradas.
A partir destas reflexões se logrou gerar material sobre a
identidade desses sujeitos, sobre como estes constroem seus enunciados e
se afirmam nos textos e qual o conteúdo dessas produções. Assim,
incentivamos que participem e que falem, investigando no processo suas
percepções e suas vozes, desta maneira, procura-se incentivar a produção
em ambiente digital, as práticas de leitura e escrita, o uso dos gêneros
discursivos e a valorização de suas vozes e identidades como via de
emancipação dos sujeitos.
78
79
APRESENTAÇÃO E DISCUSSÃO DE RESULTADOS
Conteúdos das publicações dos sujeitos
_______ ____________ ____________ _____________________ _______________ ____________ ____________ ____________ _______________ ___________ ____________ _______________ ____________ ______ _______________ ____________ ____________ _______________ ____________ ___________ ____________ _______________ ____________ ____________ _______________ ____________ __________
Foram publicadas 24 postagens por 20 alunos do CEEJA durante
o período da pesquisa, sujeitos que foram convidados a elaborar suas
publicações e concluíram a criação do material durante o período de
acompanhamento, tendo seus posts publicados. Três autores produziram
mais de um trabalho. Dois sujeitos publicaram três trabalhos no decorrer
da pesquisa e uma mulher elaborou duas publicações. Uma publicação
foi em dupla. Do total de trabalhos publicados no blog, 15 foram
submetidos no sistema por meio de usuário e senha próprios dos sujeitos,
assim os próprios usuários quem acessaram o painel de controle do blog e
enviaram suas publicações para revisão pela coordenação pedagógica de
maneira mais autônoma e imersa com as TDIC. Apesar da maioria dos
sujeitos terem percorrido o procedimento mais elaborado para a
publicação, que é o cadastro no sistema do blog e a submissão do
trabalho para revisão, de maneira geral todos apresentaram dificuldades
nos procedimentos envolvendo as TDIC e necessitaram de
acompanhamento pelo pesquisador ou por outro educador empenhado
com o desenvolvimento da pesquisa.
Organizamos nossa exposição dos resultados das publicações
elaboradas pelos sujeitos em sintonia com a proposta teórica e
metodológica de valorização dos sujeitos, de suas biografias, histórias de
vida e motivações pessoais, a partir da identificação destes indivíduos
enquanto autores dessa biblioteca popular digital que é o blog. A partir
desta perspectiva, os conteúdos foram analisados qualitativamente por
autoria, identificando os principais aspectos próprios de cada autor em
80
seus enunciados, como motivação, gênero discursivo, linguagem, estilo,
autonomia, afetividade e temáticas recorrentes. Esta maneira de refletir
sobre os conteúdos produzidos por autoria orienta nossa leitura no
sentido da valorização de suas identidades e organização da exposição dos
trabalhos, identificando as principais contribuições de cada sujeito autor
em nossa biblioteca popular, pensando a partir da perspectiva freiriana de
uma biblioteca com conteúdos elaborados pelos próprios sujeitos e de
valorização de suas produções (FREIRE, 1989).
O blog contou com uma diversidade de posts para além das
produzidas pelos sujeitos, com um contínuo de publicações anteriores e
posteriores ao período da pesquisa. Dos conteúdos publicados no blog,
muitos tratam de informativos sobre a escola ou outros assuntos
relacionados com a questão da educação, sejam notícias ou outros
informes, como Fale Conosco, divulgação de materiais de estudo, editais,
vestibulares, eventos culturais, projetos da escola e outras informações
úteis ao público do blog, divulgadas pela equipe do CEEJA.
Alguns professores empenharam-se em elaborar posts,
principalmente a docente interlocutora de LIBRAS, que ao menos
semanalmente publicava para um projeto de exibição de filmes e debates
na escola, com recorrentes vezes em que foram publicadas mais de uma
chamada na semana. Também com frequência semanal e até superior
ocorriam as Rodas de Conversas, ocasião em que se debatiam temas
contemporâneos, sendo que para cada evento deste era elaborado um
post de chamada e inscrições, que na maior parte das vezes os próprios
docentes elaboravam os conteúdos das publicações a partir de um
Release, cabendo ao PC copiar as imagens e dizeres no sistema do blog e
publicar com o login do projeto. Durante as atividades formativas com
professores e alunos foi possível elaborar postagens que foram publicadas
81
em Dezembro de 2019 e no início de 2020 já haviam numerosas
publicações pendentes de docentes que aguardavam revisão para ser
publicadas no blog e rascunhos em elaboração, almejando viabilizar
postagens pelos próprios professores.
Tabela 2 - Contagem de posts publicados no blog
POSTS PUBLICADOS NO BLOG
CONTAGEM DESCRIÇÃO
319 Publicados desde a criação do blog (Mai/2015 até Dez/2019)
262 Durante todo o período da pesquisa (Abr/2018 até Dez/2019)
75 Publicados na 1ª etapa da pesquisa (Mar/2018 até Jan/2019)
70 Publicados na 2ª etapa da pesquisa (Fev/2019 até Mai/2019)
102 Publicados na 3ª etapa da pesquisa (Jun/2019 até (Nov/2019)
16 Publicados na 4ª etapa da pesquisa (contagem até Dez/2019)
48 Publicados por professores com usuário próprio
24 Publicados por sujeitos
14 Publicados por sujeitos com usuário próprio
14 Autobiografias e Crônicas (por sujeitos)
3 Cartas (por sujeitos)
3 Poemas e Músicas (por sujeitos)
3 Cartazes (por sujeitos)
1 Tradução (por sujeito)
1 Reflexão (por sujeito)
Fonte: Do autor.
82
Os alunos que participaram do experimento foram estimulados a
produzir textos autobiográficos, assim mesmo se tratando de crônicas,
poesias, cartazes ou outros materiais, quase todos os posts publicados
fizeram referência à história de vida dos sujeitos, com narrativa própria
do autor, mesmo que em terceira pessoa ou de maneira anônima.
Portanto, houve um aproveitamento intensivo no uso da autobiografia
como elemento motivador das produções dos alunos, sendo que dos
textos produzidos e neros textuais presentes nas publicações 15
postagens são crônicas ou autobiografias que foram elaboradas desde o
início com o propósito de divulgar relatos de experiências e histórias de
vida, onde os sujeitos ao começar a pensar na temática da publicação já se
propuseram a relatar suas vivências e dar testemunhos de vida.
As publicações dos alunos autores e sujeitos da pesquisa são
narrativas autorais produzidas sobre sua próprias histórias, convidadas a
partir do contexto do experimento formativo. Os sujeitos participantes
foram indicados pelos docentes e coordenação pedagógica, desta maneira
todas as publicações puderam ser aproveitadas pelos sujeitos enquanto
uma avaliação para a disciplina em que os sujeitos estivessem
matriculados. Seis posts foram motivados a partir de atividades cotidianas
da escola, contando com a participação direta de docentes da instituição,
partindo de ações da pedagógicas da escola como a sala de aula e rodas de
conversas. Uma postagem de música autoral que foi criada pelo sujeito
anteriormente a pesquisa e dois cartazes, sendo um em dupla. Das três
cartas, duas foram endereçadas ao poder público e uma aos professores e
funcionários do CEEJA. Os posts foram organizados no quadro por data
de publicação, contendo o título e seu autor:
83
Tabela 3 - Relação de postagens e autores por data de publicação
POSTS PUBLICADOS POR SUJEITOS NO BLOG
DATA
TÍTULO
AUTOR
14/03/2019
Minha história de vida: da depressão ao sonho!
Edu
14/03/2019
Testemunho real: da água pro vinho!
And
18/03/2019
Carta ao prefeito: rua escura!
Ine
19/03/2019
Recomeço de uma Nova Vida
Igo
20/03/2019
Arrependimento não mata, mas ensina a viver!
Mar
26/03/2019
Denuncie a Violência Contra as Mulheres! Disque 180!
Ama/Lil
02/04/2019
Homofobia Não!
Dan
03/04/2019
Vamos acordar?
Fáb
11/04/2019
Crônica: Bia e suas histórias
Bia
18/04/2019
A luta continua!
Eny
23/04/2019
História de vida, força e superação!
Edi
26/04/2019
Acolhimento, Vida e Sonhos!
João
29/04/2019
O estudo faz falta em nossa vida?
Vid
03/05/2019
Poderes e Sonhos: uma autobiografia (Parte II)
Igo
23/05/2019
CEEJA: A Escola do Bem Viver!
João
08/06/2019
O mundo da sabedoria
Nio
11/06/2019
Alunos de CEEJA traduzem trecho inédito da obra de
Alexis Carrel, prêmio Nobel de Fisiologia e Medicina, de
1912
Usu
17/07/2019
Minha trajetória de vida
Ide
26/09/2019
Ginástica Laboral em um Sábado Criativo
João
09/10/2019
Aprendendo a Plantar Maracujá
Dem
84
24/10/2019
Aos mestres, com carinho! Por aluna Jan.
Jan
28/11/2019
Poema de aluna do CEEJA retrata tradição nordestina na
busca pela esperança!
Eny
29/11/2019
O Filho Pródigo que Volta aos Braços do Pai - Igo (Parte
III)
Igo
16/12/2019
Ex-aluna do CEEJA ingressa em Universidade Pública
que tem conceito máximo em indicador do MEC em
2019
Ros
Fonte: Do autor.
Entre os conteúdos mais recorrentes e norteadores da reflexão
estão: religiosidade, violência, criminalização, pobreza, trabalho, família,
saúde, motivação e estudos. A religiosidade é elemento que transpassa a
maioria dos textos publicados. A temática da violência também é
recorrente, com viés de denúncia social. A criminalização apresenta-se em
relatos sobre o afastamento da escola, com narrativas impactantes sobre o
envolvimento com atividades ilícitas e venda de drogas. A pobreza
aparece em muitos textos como um dos principais fatores para o
afastamento da escola, associado a temática do trabalho, no passado
elemento de afastamento da escola e atualmente como uma necessidade
no retorno à escola. A família aparece como um dos pilares de inspiração
dos sujeitos durante suas vivências e a saúde como catalizador de
problemas vivenciados em suas narrativas. A motivação e o estudo
mostram-se como relatos de experiência e de acolhimento na escola,
narrativas que almejam auxiliar outros sujeitos a partir de seus relatos a
superar situações vivenciadas nos textos, dando testemunhos de seu
esforço e exemplo de competência para encarar tais mazelas.
85
A população da EJA é composta em sua maioria por alunos-
trabalhadores (HADDAD; PIERRO, 2000) que têm a necessidade de
trabalhar durante os estudos ou ainda no período da infância ou
adolescência, relatando problemas e questões de saúde, perpassando por
problemas financeiros de maneira recorrente, dentre outros entraves em
seu processo de escolarização. Porém, os relatos de dificuldade, seja de
saúde, financeira ou outro aparecem não como impeditivo nos
enunciados dos sujeitos, mas como experiências drásticas, só que
motivadoras das narrativas e de superação pessoal, orgulhando-se por
superar tais mazelas e ter retornado à escola, almejando com os estudos
mais qualidade de vida.
A publicação da aluna Ide, egressa do CEEJA, é relevante nesta
reflexão, pois ela concluiu os estudos na instituão em que ocorreu a
pesquisa e no momento do experimento formativo encontrava-se
matriculada em um curso superior de universidade pública, relatando sua
experiência no blog na qualidade de ex-aluna e de exemplo motivador,
dando seu relato de vida como alguém que passou pelo CEEJA e no
momento da publicação encontrava-se matriculada no ensino superior
em universidade pública.
Perdi minha mãe muito cedo e fui criada por parentes,
consequentemente tive que começar a trabalhar com doze anos em
casa de família nos afazeres domésticos, para ajudar com as despesas
da casa da família que me acolheu [...] Naquela época podia s estudar
a noite, mas muitas vezes batia o cansaço e acabava dormindo na
aula, isso passo a se repetir diariamente até que finalmente desisti de
continuar os estudos [...] Me casei bem jovem, tive meus filhos e
minha vida se resumia em cuidar dos filhos e das tarefas domésticas.
[...] No decorrer dos anos passei por várias dificuldades, no entanto
me mantive firme e esperançosa em conseguir concluir minha tão
86
sonhada graduação e neste momento em fase de conclusão do curso
estou ansiosa, mas é uma ansiedade boa, aquela com gostinho de
vitória. Como uma criança ávida pela chegada do natal para receber
seu sonhado presente (Ide, Publicação no Blog, 2019)
1
.
Os desafios cotidianos nos enunciados de Ide durante o
desenvolvimento de sua postagem aparecem com um tom de testemunho
e exemplo motivador, expressando sua ansiedade face a superação das
situações vivenciadas no passado enquanto expectativa de conclusão do
Ensino Superior e de futuro, comparando-se a uma criança que está
prestes a receber um presente esperado há muito tempo, trazendo tais
elementos na conclusão de sua publicação.
Também na qualidade de aluna egressa do CEEJA e atualmente
universitária em universidade pública estadual, a aluna de curso superior
Ros é mais um exemplo de narrativa de vida com objetivo de motivar os
leitores a voltar a estudar e almejar um futuro com mais qualidade de
vida por meio da educação “Consegui concluir o Ensino Médio em
2017. Nesse mesmo ano, resolvi prestar o Enem e o vestiular [...] Tinha o
sonho de ser professora e por isso fiz vestibular para Pedagogia” (Ros,
Publicação no Blog, 2019). Diante do objetivo e sonho de terminar os
estudos e ingressar no ensino superior, a autora relata dificuldades
financeiras, familiares e de saúde no trajeto “[...] por motivos de
complicação na gestação precisei ficar de repouso e não pude mais ir para
a escola. Depois que me tornei mãe, dona de casa e esposa, a escola ficou
cada vez mais distante da minha realidade” (Ros, Publicação no Blog,
2019), retratando assim problemas cotidianos em seu percurso formativo
enquanto aluna egressa da EJA e futura pedagoga.
1
Todos os textos referentes à publicação no Blog serão transcritos como foram publicados, sem modificações.
87
Atrelados ao percurso formativo dos sujeitos da EJA, o trabalho
da aluna concluinte Jan que também faz um relato de superação e
apresenta evidências de afeto ao CEEJA em que estudou já em seu título
Aos mestres, com carinho! Por aluna Jan, sinal de amorosidade
perceptível também durante seu texto “[...] acolhida maravilhosa, desde a
secretaria, coordenação e professores. Tudo muito perfeito. Sempre me
ajudando nas minhas maiores dificuldades e olha que não foram poucas!”
(Jan, Publicação no Blog, 2019). Quanto as dificuldades no trajeto de
conclusão dos estudos, a autora destaca o problema de conciliar os
estudos com sua rotina cotidiana “[...] só que a minha disponibilidade foi
de um dia sim e outro não [...] Do mesmo modo foi o Ensino Médio,
que foi a mesma disponibilidade” (Jan, Publicação no Blog, 2019). O
post da autora demonstra outro problema para a população da EJA,
conseguir conciliar estudos com as atividades cotidianas, identificamos
nesta reflexão a importância da estrutura da presença flexível existente no
modelo de ensino de um CEEJA, pois permite que sujeitos como Jan
voltem á escola (MIGUEL, 2009).
As narrativas dos sujeitos tendem a ser impactantes, envolvendo
relações familiares e relatos de experiências de vida em ambientes sociais
desfavoráveis, com pobreza e trabalho durante a infância e adolescência,
associando a necessidade de trabalhar principalmente com a escassez
financeira, como no post do aluno Vid, que afirma “sou de uma família
simples e humilde. Somos um total de cinco irmãos [...] Como o único
filho homem, comecei a me dedicar mais em fazer bicos e trabalhar,
deixando de lado os estudos” (Vid, Publicação no Blog, 2019). A
necessidade de trabalhar e abandonar os estudos aparece como uma
imposição para este sujeito, que demonstra consciência e necessidade de
retornar aos estudos “Naquele momento talvez eu estava ajudando minha
88
família, mas não imaginava o quanto faria falta para mim no futuro. Por
isso larguei os estudos para trabalhar (Vid, Publicação no Blog, 2019)
atrelando assim a necessidades particulares dos sujeitos.
A temática da saúde aparece majoritariamente o como uma
questão de saúde pública nas narrativas, mas como um problema
particular que os sujeitos vivenciam, como na autobiografia de Edu e em
outras. O texto publicado pelo aluno Edu é o único que relata de
maneira aberta o problema da depressão, com o título Minha história de
vida: da depressão ao sonho!, o autor escreve “Acabei entrando em
depressão. Foi quando minha vida parou. Abandonei a escola” (Edu,
Publicação no Blog, 2019). Nos enunciados de Edu é possível perceber a
empatia do autor com os interlocutores, utilizando-se da publicação não
somente como uma ferramenta para expressar-se, mas também como
forma de alcançar pessoas que talvez estejam na situação que ele há pouco
se livrara, atrelando na interlocução com o leitor uma mensagem de
motivação “O que fica? Tu pode ter perdido um sonho, mas de um
sonho perdido vieram vários outros sonhos para serem realizados” (Edu,
Publicação no Blog, 2019).
Os relatos das publicações, principalmente as que apresentam
forte carga emotiva, possuem um caráter motivador e os enunciados
pretendem abertamente ajudar outros sujeitos que podem ter passado ou
estar atualmente nessas situações, deixando a vista a função social dos
textos como exemplo motivador, com objetivo emancipador do sujeito e
de interlocução com outros indivíduos, como na publicação do aluno
Fab, que afirma “Estou aqui para escreve este texto com o intuito de que
chegue aos jovens como eu” (Fab, Publicação no Blog, 2019). Assim, os
relatos vida vão ao encontro dos leitores no sentido de dar testemunho de
suas experiências:
89
[...] Vivi muitos anos dessa forma errada até acontecer a coisa que
mais marcou a minha vida. A perda da pessoa mais importante da
minha vida: meu Pai. Com 17 anos ele ficou muito doente e isso foi
se agravando. Foi preciso isso acontecer para que eu voltasse à
realidade. Fiquei muitos dias no hospital com ele. [...] Voltei aos
estudos para melhorar as minhas condições de vida e a da minha
família. [...] Espero que com esse humilde texto possa ajudar de
alguma forma pessoas que estão passando pelos mesmas dificuldades
que eu passei. Acreditar em Deus e em nós mesmos fará essa
diferença! (Fab, Publicação no Blog, 2019).
O texto de Fab evidencia esta proposta de emancipação pela
motivação a outros sujeitos a partir da interlocução com os leitores,
dando testemunho de sua experiência de vida, das fatalidades no percurso
e da superação dos problemas em uma perspectiva de vida melhor. A
religiosidade, aparente em muitos textos, também é evidente, utilzando-
se desta para impulsionar sua mensagem de motivação, atrelada a
elementos gráficos imperativos, como no caso o uso da exclamação no
final de seu enunciado.
Houve também o envolvimento direto dos docentes e equipe
escolar do CEEJA nas publicações no blog por meio do contato direto
com o pesquisador e com atividades que ocorreram durante o dia a dia na
instituição, tanto com trabalhos iniciados em sala de aula, como nas
oficinas e rodas de conversas promovidas pela escola. As atividades
desenvolvidas no cotidiano escolar na forma de atividades extraclasse
estão atreladas ao Projeto Político Pedagógico (PPP) do CEEJA, assim
tais formações puderam ser validadas na forma de avaliações em
disciplinas e nota no histórico escolar dos alunos, contando com maciça
participação destes. As publicações no blog, foram impulsionadas pelas
atividades em sala de aula e pelas formações extraclasse desenvolvidas,
90
possibilitando aos alunos utilizar os posts como validação de nota
curricular na disciplina em que encontravam-se matriculados.
A publicação da aluna Edi foi fruto da atividade da Roda de
Conversa de inglês e apresenta em seu post uma foto da professora com a
autora, assim como outra imagem do acidente que a aluna sofreu, o qual
é assunto da publicação e conclui afirmando “sei que através dessa minha
história outras pessoas podem acreditar que tudo tem jeito sim! [...] Em
breve pretendo fazer o Curso Técnico de Cuidados de Idosos e prosseguir
firme e forte” (Edi, Publicação no Blog, 2019). Nossa reflexão neste
sentido vai ao encontro do reconhecimento dos interlocutores e da
função social do texto, deixando clara a intenção de motivar outros
sujeitos, assim como da valorização de suas experiências em seus relatos,
onde na postagem a aluna se expôs inclusive pela divulgação de sua
própria imagem junto a professora e de foto do acidente em questão,
com o título História de vida, força e superação!, tornando a publicação
valorativa pela perspectiva da emancipação do sujeito e impactante em
sua interlocução com os leitores do blog ao preocupar-se também com os
outros.
A maior parte dos sujeitos que participaram das atividades da
pesquisa encontrava-se matriculada no Ensino Médio ou já em fase de
conclusão dos estudos, porém esta não foi uma exigência e nem
impeditivo para a participação no projeto e contamos com a participação
também de sujeitos matriculados no Ensino Fundamental e em fase de
alfabetização. O trabalho produzido pelo aluno Usu foi mais uma
publicação de atividades de sala de aula de inglês, com a tradução idita
de uma obra de Alexis Carrel, sendo a única publicação de sujeitos que
não tratou de ser um texto de criação autoral, mas foi relevante pelo fato
do texto traduzido ser inédito em português, de ter sido desenvolvido
91
dentro de sala de aula e de sua publicação não ter contato com a ajuda do
pesquisador em nenhuma das fases de sua elaboração, sendo
acompanhado diretamente pela professora responsável e publicada pela
coordenação pedagógica “Alunos do CEEJA iniciam tradução de obra
inédita no Brasil [...] Trecho traduzido por Usu, aluno de Língua Inglesa
do CEEJA” (Usu, Publicação no Blog, 2019). Esta dinâmica corrobora
com nossa proposta de descentralização das funções no Blog,
possibilitando que mais atores se envolvam com as publicações e utilizem
o sistema do Blog como instrumento pedagógico, possibilitando desta
maneira a participação de mais atores.
O sujeito participante Dem é aluno da Sala de Leitura com
acompanhamento por Deficiência Intelectual (DI) e também participou
da pesquisa a sua maneira. Motivado pela proximidade física com as
atividades desenvolvidas pelo projeto, pois encontrava-se constantemente
próximo aos sujeitos em processo de elaboração de suas postagens, e por
se mostrar uma pessoa muito animada em participar dos projetos na
escola, fez questão de colaborar com uma reflexão “O maracujá deve ser
plantado colocando a semente na terra e nunca deixar faltar água” (Dem,
Publicação no Blog, 2019), publicação motivada pela participação do
aluno nas atividades do projeto na horta da escola, incluindo ao final da
postagem um vídeo que havia feito anos antes da pesquisa como um
apelo de fã a um jogador de futebol, elemento este que motivou ainda
mais o sujeito a empenhar-se na elaboração de sua publicação de reflexão,
demonstrando que mesmo com dizeres textuais simples de somente um
período foi possível expressar-se de maneira significativa e afetiva.
Muitas publicações se destacam pela função social e pelo impacto
social pretendido pela postagem. Um post com poucos dizeres e de
linguagem simples foi elaborado pela aluna Ine, que desejava comunicar-
92
se com o poder público e quis utilizar o espaço do blog para esta
atividade, escrevendo uma pequena carta impessoal ao poder público
sobre o estado da iluminação pública de sua rua “Escrevo esta carta para
solicitar que o senhor providencie uma iluminação mais moderna e
eficiente da nossa rua [...] as árvores são muito grandes [...] deixando-a
escura e perigosa” (Ine, Publicação no Blog, 2019). Nota-se que mesmo
com dizeres simples, com pouco texto e uma escrita modesta, a aluna
pode atribuir sentido a produção de seu texto ao visualizar o motivo da
publicação pela função social de sua postagem, com um objetivo
delimitado e vendo sentido na atividade proposta. A autora também
aceitou acessar o sistema e com acompanhamento fazer a submissão do
texto diretamente no painel de controle do blog, aceitando ter contato
direto com computadores para publicar seu texto. Desta maneira, mesmo
com uma escrita modesta a autora efetivou sua emancipação e treinou sua
autonomia autoral, pois elaborou uma carta destinada ao poder público e
envolveu-se diretamente com as TDIC em uma atividade de letramento,
utilizando-se da linguagem e de suportes digitais para expressar-se em
contextos reais (ROJO, 2015).
Foram elaborados também cartazes no contexto do experimento
formativo. Três sujeitos concretizaram a publicação de duas imagens
editadas e criadas por eles, uma publicação individual com o título
Homofobia não! e outra publicação com o título “Denuncie a violência
contra as mulheres”, criada por duas alunas concluintes. As alunas Ama e
Lil são de cidades vizinhas ao local de estudo e na ocasião em que
participaram elaborando sua publicação fizeram em dupla a imagem
sobre denúncia de violência contra as mulheres, com o objetivo de
impactar os interlocutores na Web. Após a publicação da imagem
elaborada pelas alunas, porém sem ligação direta entre os fatores, iniciou-
93
se um projeto de roda de conversas entre mulheres sobre a temática, com
o objetivo de debater temas sobre questões sociais sensíveis para as
mulheres.
Figura 1 - Publicação “Denuncie violência contra as mulheres”
Fonte: Publicação Blog do CEEJA (2019)
O blog apresentou-se como um instrumento de expressão de
populações marginalizadas e um espaço de valorização de suas vozes,
94
utilizando da linguagem como instrumento de emancipação pelo direito
a palavra, onde os sujeitos puderam expor as mazelas vivenciadas e
preocupações do cotidiano, propensos a produzir trabalhos incisivos e
impactantes. Mensagens de motivação e de estímulo foram frequentes e
tendem a trazer enunciados diretos de denúncia destas situações,
aproveitando o espaço para a participação social e a expressão de suas
experiências, possibilitando enxergar sentido nos textos por meio de sua
função social de comunicação e emancipação.
Figura 2 - Publicação Homofobia não
Fonte: Publicação no Blog do CEEJA (2019).
O sujeito Dan foi incisivo na elaboração de seu cartaz, incluindo
na parte gráfica uma bandeira LGBT com marcas de sangue escorrendo,
acompanhada de um punho fechado também com as marcas LGBT, com
95
o título Homofobia não! destacado no topo da imagem, com uma fonte
metálica, acompanhada de dizeres de ordem “Protejam uns aos outros
[...] Enquanto houver forças e fôlego, resistiremos!” (Dan, Publicação no
Blog, 2019). Todos os sujeitos que se envolveram com a publicação de
imagens nunca haviam feito este tipo de edição, sendo a experiência com
o blog seu primeiro contato com este tipo de ferramenta, utilizando-se do
blog não somente como instrumento de expressão e de uso social da
linguagem, mas também se apropriando de um novo suporte de
comunicação por meio da edição digital de imagens.
A temática do machismo presente na sociedade brasileira aparece
mais claramente no post da aluna Bia, uma narrativa impactante sobre
suas próprias experiências. Relatos que enriquecem nossa reflexão sobre
as motivações dos sujeitos e sobre suas vivências até retornar à escola,
sobre suas relações com familiares e com os contextos mais amplos da
sociedade em que viveram e vivem. O blog apresentou-se como uma
ferramenta de expressão, onde os sujeitos podem desabafar sobre mazelas
vividas, como no caso de Bia, uma aluna do CEEJA que optou em não se
identificar e pelo fato de sua história ser impactante, decidiu escrever em
terceira pessoa, sendo o único texto produzido em terceira pessoa:
Bia se casou com apenas 13 anos. Seus pais sempre falavam que
mulher nasceu pra casar, ter filhos e cozinhar. Seu pai agredia sua
mãe verbalmente e fisicamente. Estudou de tanto sua madrina brigar
com ele. Estudou até os 12 anos. Fugiu de casa para casar pensando
em ser feliz e voltar a estudar. Mas a história se repetiu. O ex-marido
lhe batia e maltratava. [...] Sabe... Bia nunca imaginou que voltaria a
sorrir, que iria fazer planos e voltar a viver. [...] Hoje, ela pensa que
vai fazer uma faculdade e ver seus filhos assistindo ela receber o
diploma de pedagogia. Vê-la receber sua vitória é demais! Para Deus
nara é impossível. Na vida, temos também sempre um pouco de
ajuda de alguns anjos da guarda. Não podemos nos esquecer, é lógico,
96
que depende nós também querer aos poucos mudar nossa história.
Caro leitor, prometo voltar aqui para contar pra vocês o restante da
hsitória de Bia (Bia, Publicação no Blog, 2019).
A história de Bia gerou impacto inclusive nas redes sociais, sendo
a publicação que mais mobilizou conversa nos comentários entre os
leitores, onde outras mulheres se identificaram com a narrativa da autora
e se manifestaram em sinal de apoio, declarando que também tem
interesse em voltar a estudar, mas que ainda não encontraram a força que
a autora afirma em seu trabalho. A própria autora quem responde no
último comentário incentivando o retorno aos estudos:
Figura 3 - Print de Comentários na Internet
Fonte: Página do CEEJA no Facebook.com (2019)
97
A temática da motivação enquanto elemento de estímulo a outros
sujeitos, partindo do testemunho dos autores das publicações no blog, foi
aparente não somente nas produções dos sujeitos, mas nas reações dos
leitores e interlocutores dos textos, como no comentário acima, em que a
própria autora também participa do conjunto de comentários ao
convidar a mulher que motivou a conversa nos comentários para retornar
aos estudos. Desta maneira, além de produzir um material autoral a
autora do trabalho exerceu atividade de emancipação ao expressar-se pelo
direito a apropriação da palavra, utilizando-se da linguagem com uma
função social, alcançando seus interlocutores na internet e convidando-as
a retornar para a escola. Neste processo de interlocussão entre leitores e
autor foi possível o contato direto entre ambos, impulsionando a
alteridade de vozes pelos enunciados digitais (SOARES, 2004). Um
elemento motivador do texto, além da expressão de sua própria história,
foi de alcançar outros sujeitos e convidá-los para retornar à escola, tal
função social presente no texto, além de motivar que outra pessoa na web
se manifestasse sobre as situações enunciadas no texto, também permitiu
um diálogo online entre os interlocutores.
Os suportes digitais permitem uma comunicação mais dinâmica
em relação a outros suportes de linguagem (GIROTTO, 2004), desta
maneira a interligação do blog com as redes sociais foi importante na
divulgação dos conteúdos, possibilitando maior visibilidade das
publicações e melhor interação entre os leitores e autores na interlocução
com o blog, pois dificilmente comentários e curtidas aconteciam dentro
das páginas do blog, apesar dos recursos existirem, mas ocorriam
externamente, pelo compartilhamento automático nas redes sociais e
divulgação entre os usuários nestes espaços digitais. Ambientes estes em
que os sujeitos puderam compartilhar de maneira mais ágil suas
98
postagens, identificar parentes e serem identificados, quando consentido.
A relação entre autores e leitores aconteceu de forma mais dinâmica, em
um suporte de linguagem que torna possível a interação mais próxima
entre os interlocutores dos textos.
A temática da criminalização aparece em alguns posts com
vivências próximas ao comércio de entorpecentes e as consequências para
a vida dos sujeitos, tendo a escola como um estímulo e alternativa para
melhorar a qualidade de vida. A temática da criminalidade é recorrente, a
aluna Mar, que optou por não se identificar na publicação relatou que foi
encarcerada “que custou minha liberdade aos 18. Esse mundo de ilusões
acabou. Quando fui cair na real, acordar pra vida, eu estava atrás das
grades” (Mar, Publicação no Blog, 2019). Em seu texto, cujo título é
Arrependimento não mata, mas ensina a viver! a autora relata sua
preocupação com suas relações familiares e faz a afirmativa de um futuro
após estudar no CEEJA:
Hoje, estou fazendo o que eu posso para terminar meus estudos aqui
no CEEJA (antigo CEESMA) e já estou acabando para buscar um
emprego e recomeçar a minha vida honestamente. Nunca é tarde para
recomeçar do zero! E vou recomeçar quantas vezes for preciso! Já
passei por muitas coisas na minha vida. Mesmo sendo bem nova. Isso
só me deixa cada vez mais madura. Como diz o ditado: é errando que
se aprende! E como cada erro meu, eu estou sempre aprendendo. Se
eu tivesse escutado meus pais tudo seria mais fácil. Nossos pais sabem
o que é melhor para nós (Mar, Publicação no Blog, 2019).
Na publicação a aluna Mar optou por não se identificar, pois
trata-se de uma moça jovem, em que o acontecimento ainda é recente em
sua vida, causando constrangimento caso seja identificada, principal-
mente por residir na cidade em que o texto foi divulgado.
99
O sujeito And, ao ser convidado a publicar um contdo autoral,
propôs de divulgar a letra de uma música de Rap que havia escrito fora
do contexto escolar e anterior à pesquisa, desta maneira, o sujeito fez uma
breve apresentação de sua biografia e divulgou sua letra, digitando todo o
conteúdo de cabeça diretamente na plataforma da pesquisa, envolvendo-
se com a atividade de maneira significativa ao compartilhar uma
produção criativa de autoria própria e de fora do ambiente escolar
“Compartilhando com vocês, meus irmãos, um pouquinho da minha
transformação [...] Escrevo para que essas palavras possam inspirar a vida
de vocês também” (And, Publicação no Blog, 2019).
A produção do aluno And é significativa pois além de retratar seu
envolvimento com atividades ilicitas relacionadas ao tráfico de entorpe-
centes, também trata-se de uma obra criativa real, com envolvimento
emocional do sujeito com sua produção, pois trata-se de um poema que
apresenta musicalidade, com envolvimento afetivo e significativo do
sujeito com sua obra, relatando sua experiência nete contexto. O sujeito
apresenta sua biografia de forma artística, mesmo que com relatos
impactantes sobre seu convívio social. Neste sentido, o blog apresentou-
se como um espaço de expressão de realidades silenciadas, com
acontecimentos raramente encontrados nos espaços digitais ou escolares,
abrindo o diálogo com essas populações e oportunidade de refletir acerta
destes envolvimentos dos sujeitos.
And já traz a temática da superação sobre as mazelas sociais
vivenciadas por ele em seu título Testemunho real: da água para o vinho!,
relatando seu envolvimento com atividades ilíticas e com criminalidade
em seu passado “Soube entrar na confusão com peito aberto pra morrer;
Que nem passou pela minha cabeça o perigo que ia correr; Tava fortão,
me achava, nada me abalava” (And, Publicação no Blog, 2019). O sujeito
100
relata com valiosos detalhes o motivo de seu encarceramento “Os
parceiros tavam morrendo, então me armei por nada [...] Não queria ser
o próximo, então teria que matar” (And, Publicação no Blog, 2019), e ao
final de sua letra, já após o período de reclusão, o autor conclui sua letra
com destaque a superação e a sua recuperação:
Foi lá que Deus falou comigo e me deixou constrangido; Agora sei o
grande motivo que ainda estou vivo!; Minha família está mudada,
tenho lar renovado!; Mas Deus provou que ele conduz sempre o
desamparado!; Minha trajetória tem ainda muita coisa pra contar;
Hoje sou líder de célula, pode vim comprovar!; Creio que nunca é
tarde pra voltar aos braços de Deus; Reconstruir os caminhos como
reconstruí os meus; Me curou das loucuras minhas marcas estão nos
meus punhos (And, Publicação no Blog, 2019).
Para além do relato real de uma realidade de contravenções e
envolvimento com a criminalidade, a letra de Rap do aluno And retrata
bem uma realidade há muito silenciada, sendo significativa para o sujeito
enquanto autor de uma produção criativa com temática profunda e
relevância social. O tema da afetividade e envolvimento emocional ao se
reconhecer como autor da própria produção, utilizando-se da palavra
para a pronúncia de mundo (FREIRE, 1967) é um ponto importante de
reflexão sobre essa publicação, visto que o sujeito se expos e divulgou
uma produção criativa própria, assim como a temática da religiosidade
que é marcante e elemento transversal em muitos outros textos no blog,
inclusive ao apresentar a letra de rap “(Isso foi inspiração do amado
Espírito Santo). Vejam a minha música de Rap abaixo” (And, Publicação
no Blog, 2019).
Outro sujeito que publicou relatos próximos a temática da
criminalização foi o aluno Igo, que fez três postagens que se
101
complementam e escancaram as mazelas vivenciadas por ele em situação
de marginalização e de segregação. No contexto de suas publicações os
trabalhos foram acompanhados pelo pesquisador. O sujeito apresentou
grandes resistências no início quando foi convidado a elaborar seu
primeiro trabalho, mas motivou-se e produziu mais dois textos. Na
ocasião da primeira postagem, o aluno não aceitou nem ao menos digitar
ou encostar no computador para produzir seu trabalho, aceitando
publicar sua história, mas sem contato direto com o equipamento,
afirmando ainda seu interesse em expor seu nome e sua autoria.
Já no segundo texto, motivado pela produção do primeiro e por
incentivo de sua psicóloga da instituição de recuperação de adictos em
que participa, quem o orientou a produzir mais trabalhos para o blog, o
sujeito topou em digitar o trabalho e proceder com a submissão do texto,
mas sem uma inscrição própria na plataforma e sim supervisionado e
utilizando o usuário da coordenação pedagógica para esta atividade. O
avanço neste caso apresenta-se na aceitação em explorar o recurso do
computador, assumindo os riscos de utilizar um recurso até então
desconhecido. A terceira postagem foi publicada após o retorno do
sujeito que passou por um período de evasão, retornando ao CEEJA
meses após a etapa 2 de publicações, já no final do ano letivo.
As temáticas das publicações deste sujeito envolvem principal-
mente a criminalização e a religiosidade, sendo este um adicto de álcool
cruzado, ou seja, o vício em álcool e drogas. O título da primeira
publicação foi Recomeço de uma Nova Vida, o título do segundo texto
foi Poderes e Sonhos: uma autobiografia e o terceiro trabalho foi
intitulado O Filho Pródigo que Volta aos Braços do Pai. O primeiro
texto retrata o sujeito declarando sua dependência de álcool cruzado e sua
102
motivação recente em retornar aos estudos e de ingressar na igreja bola de
neve, fazendo questão inclusive de identificar-se na postagem:
Primeiramente é Deus. Ele sempre deve estar em primeiro lugar em
nossas vidas, depois Jesus Cristo e o Espírito Santo, que encontrei na
igreja Bola de Neve. Depois dessa ajuda divina vem os médicos,
psiquiatras, psicólogos, terapeutas e hoje, também meus professores.
[...] Considero que voltar a estudar foi muito importante em minha
vida, aprender e ganhar novos conhecimentos para sonhar com um
futuro diferente, no qual pretendo terminar os estudos, resgatar
minha família, conseguir um emprego que me de dignidade e buscar
coisas boas para minha vida. Sempre com Deus em primeiro lugar.
Gostaria também de agradecer o trabalho da igreja Bola de Neve, na
qual sou batizado com as águas do Espírito Santo, eles me ensinaram
o caminho de Deus, buscando uma vida diferente (Igo, Publicação no
Blog, 2019).
Após a produção deste primeiro texto o aluno levou consigo uma
cópia impressa da publicação que seria ainda divulgada na internet, cópia
que ele optou em mostrar para a psicóloga que o acompanhava, então a
profissional sugeriu que o aluno elaborasse mais uma publicação,
justificando a atividade pela possibilidade de se expressar por meio do
blog. Porém, esta segunda experiência de publicação foi bastante
conturbada e exigiu alterações no texto e conversas com o sujeito,
alterações requeridas pela direção do CEEJA pelo fato do sujeito em seu
texto atribuir uma recaída à autoridade municipal que cancelou uma
viagem escolar que estava agendada e que ele iria participar, confundindo
assim o gênero textual que deveria ser a produção de uma carta impessoal
para uma carta pessoal.
103
Em seu texto o autor atribui ao poder público a responsabilidade
por sua recaída, pois declara estar limpo de seu vício há mais de um ano e
ter ficado nervoso com o cancelamento da viagem, desta maneira como
consequência tomou uma lata de cerveja, suficiente para ter uma recaída,
desejando que a autoridade municipal fosse identificada. Após múltiplas
conversas explicando principalmente a questão do gênero textual que
poderia ser publicado o aluno aceitou as modificações em seu texto,
retirando as identificações de locais e nomes, aceitando elaborar mais um
texto, ao alegar ter compreendido a situação de que a escola não poderia
identificar pessoas não envolvidas com o projeto ou autoridades públicas
de maneira geral, aliando o trabalho produzido com uma carta impessoal.
Já havia completado a quinta série na EJA e faria uma viagem, por
meio da secretaria municipal da educação, junto aos colegas da escola,
completando o que seria a nossa última atividade escolar. Porém, o
poder público da época cancelou a viagem, assim não autorizou esta
última atividade da escola, cessando os recursos necessários para o
encontro final da turma. Como consequência de não alcançar meus
planos de viajar, fiquei desanimado e pensei que podia apenas tomar
uma cerveja [...]. Este primeiro gole foi o suficiente para eu ter uma
recaída cruzada. Tenho a dizer que as decisões de qualquer autoridade
pode influenciar a vida pessoal de todos nós (Igo, Publicação no Blog,
2019).
Após a publicação deste segundo texto o aluno retornou às
atividades escolares e inclusive iniciou a produção de seu terceiro texto,
desta vez aceitando digitar e submeter de maneira autônoma no sistema
de postagem, porém, com quase toda a produção escrita como um
rascunho em arquivo de texto digital, o aluno evadiu novamente,
retornando somente ao final do ano letivo com o intuito de concluir o
104
terceiro texto, complementando as ideias já trabalhadas nos textos
anteriores já publicados.
Em seu terceiro texto o aluno Igo elabora inclusive uma oração,
destacada na postagem, agradecendo o envolvimento das instituições que
o acompanhavam, incluindo o CEEJA, e faz projeções de futuro a partir
de seu desenvolvimento já perceptível “Hoje já posso ser doador de
medula óssea, estou na última disciplina do Ensino Fundamental,
avançando nos estudos e em breve serei doador de sangue” (Igo,
Publicação no Blog, 2019). A participação do aluno Igo elucida a
necessidade pelo direito ao uso da palavra de maneira emancipatória,
auxiliando sujeitos como Igo a se expressar e atuar na sociedade de
maneira significativa, reintegrando tais pessoas de maneira amorosa à
sociedade.
A partir desta experiência a instituição pediu que fosse elaborada
uma publicação com o título Orientações para publicação no blog do
CEEJA com o objetivo de apresentar sete pontos éticos de postagem,
chamados de Princípios e ética de publicação, onde são apresentados os
pontos: 1) Gêneros textuais para leitura por um grande público na
internet; 2) Conteúdos autorais; 3) Norma culta da língua portuguesa; 4)
Refletir sobre os interlocutores e a função social dos textos; 5) Nunca
citar ou atacar pessoas e instituições em especial as que não participem do
projeto; 6) Ser responsável pelas próprias publicações e conteúdos; 7)
Atuar em conjunto com a equipe pedagógica do CEEJA. Essas
orientações foram uma demanda apresentada pela coordenação pedagó-
gica diante das intensas modificações no texto do aluno Igo.
Este momento foi importante para refletir sobre a
responsabilidade da instituição que se propuser a abrir espaço de direito
ao uso da palavra para os alunos exporem suas vivências e a pronúncia de
105
mundo a partir do ponto de vista dos sujeitos que se expõe na
publicação. É necessário alinhar as produções autorais dos alunos de
maneira a não atacar pessoas e instituições, mas também respeitando o
espaço de direito ao uso da palavra pelos sujeitos, utilizando-se dos
gêneros textuais e ter a cautela para não modificar a identidade do texto,
onde o sujeito ainda precisa se enxergar como autor da publicação, para
que as modificações não excedam o limite da identidade e da
legitimidade do trabalho produzido pelo autor. Desta forma, é
importante cuidar para que o texto produzido pelo sujeito como
expressão emancipadora de seu direito a palavra continue tendo
significado e que este possa se enxergar como autor após a publicação,
focando assim na questão da autoria do texto e de legimitidade.
Ainda nesta relação entre contravenções e estudos, temos a
autobiografia do aluno Nio, desta vez de um sujeito mais velho, que
associa suas experiências de superação com a religiosidade e que neste
caso fez questão de se identificar e inclusive tirar uma foto para a
publicação, estando rodeado de livros:
Comecei a delinquir, roubar e usar drogas. [...] Ao passar da
maioridade eu fui preso, foi muito difícil, pois eu tinha vários
processos. Fiquei nove anos preso. Graças a Deus saí e conheci minha
esposa, que foi muito bom para mim. Tive dois filhos e então refleti e
vi que tinha que parar com as drogas e com o crime. E disse sim para
Jesus! (Nio, Publicação no Blog, 2019).
No desenvolvimento de sua postagem, o autor associa sua
superação da criminalidade a religiosidade e a escola, com uma nova
perspectiva de futuro a partir de um novo estilo de vida:
106
Hoje, graças a Deus, resolvi voltar para a escola. Encontrei o CEEJA,
uma escola muito boa e acolhedora. Com professores que são um
amor de pessoa, humildes, que tratam todos com muito carinho,
amizade e respeito. Sem acepção de pessoas. EU amei essa escola!
Hoje termino o Ensino Médio e me inscrevi em um novo curso:
técnico em contabilidade. A minha vida decolou com meu novo
estilo de vida e com Jesus. Estudar no CEEJA foi tudo de bom para
mim. (Nio, Publicação no Blog, 2019).
O título do texto é O mundo da sabedoria e faz a associação
direta entre estudos e a motivação de ajudar outros sujeitos a superar suas
mazelas, agradecendo a instituição de ensino e convidando os leitores a
retornar aos estudos:
Se você que acha que não consegue terminar seus estudos está aqui a
sua chance: Escola CEEJA, que está de pertoar abertas para todos os
jovens e adultos. Não perca esta chance! Esta escola me ajudou a ver e
entrar no mundo do estudo e da sabedoria. Jesus ama todos vocês
(Nio, Publicação no Blog, 2019, sic).
O sujeito faz uma chamada aberta a seus interlocutores no
sentido de dar seu testemunho e convidar seus leitores a superar situações
que impeçam o desenvolvimento destes e seu retorno à escola. A
heterogeneidade dos conteúdos e linguagens nas publicações é marcante,
com estilo de escrita e conteúdos próprios de cada autor, produzindo
trabalhos com abordagens bem distintas entre eles. Os textos do aluno
João apresentam os títulos Acolhimento, Vida e Sonho!, CEEJA: A
Escola do Bem Viver! e Ginástica Laboral em um Sábado Criativo, sendo
os dois primeiros publicados num intervalo de um mês, se
complementando e o terceiro elaborado na terceira etapa de
acompanhamento, já ao final do ano. O primeiro foi uma carta aberta
107
aos professores do CEEJA e não contou com o auxílio do pesquisador no
processo de publicação, sendo produzido dentro das atividades de sala de
aula na disciplina de português e publicado pela coordenação pedagógica,
já no segundo texto a escrita foi feita com acompanhamento do
pesquisador na sala de leitura e com acesso direto do sujeito ao painel de
controle do blog. O terceiro trabalho também não precisou de
acompanhamento próximo do pesquisador, sendo elaborado e submetido
pelo sujeito diretamente no sistema de postagem e publicada pela
coordenação pedagógica “Agradecimento pelas atividades realizadas no
CEEJA [...] Por: João - membro do Grêmio Estudantil do CEEJA”
(João, Publicação no Blog, 2019).
A experiência da publicação do aluno João, representante do
grêmio estudantil, demonstra um avanço importante no envolvimento
deste sujeito com atividades de letramento digital, pois na ocasião da
primeira postagem o aluno elaborou uma carta simples, com texto curto
e sem envolvimento direto com o sistema de postagem, porém já
utilizando do computador para digitar o texto previamente escrito em
papel e caneta. Já nas publicações seguintes este envolveu-se mais com a
proposta e além de escrever o texto no computador, fez a inscrição no
sistema de postagem, acessou o painel de controle e submeteu seu
próprio texto para publicação, além de ter produzido em sua segunda
publicação um texto mais elaborado, um pouco mais extenso e complexo,
em que na ocasião desta postagem foi editada pela coordenação
pedagógica uma foto do autor produzindo o trabalho com uma legenda
que foi pensada pelo aluno “A paciência acalma a alma” (João,
Publicação no Blog, 2019).
108
Mas, em meio à dor, às vezes a vida nos sorri novamente e, me sorriso
veio quando fiquei sabendo dessa escola. No CEEJA, fui bem
acolhido pelos professores e professoras, voltei a estudar, pois
conhecimentos abre novos caminhos, horizontes e me possibilitou o
direito de sonar novamente. [...] hoje, me permito acreditar em novos
caminhos e novos sonhos permeiam minha mente. Entrar em uma
faculdade e alcançar novos objetivos (Jo, Publicação no Blog,
2019).
Nas publicações deste sujeito a ênfase está na temática dos
estudos e da superação como motivadores da escrita, sendo a primeira
postagem uma carta aberta aos docentes, relatando a importância do
acolhimento escolar na situação em que este indivíduo se encontrava,
pois acabara de perder a esposa para uma doença e uma nova perspectiva
de continuar os estudos no ensino superior “Entrar em uma faculdade e
alcançar novos objetivos” (João, Publicação no Blog, 2019). Outra
temática impactante nas publicações deste aluno é a religiosidade muito
aparente “Agradeço a Deus, sempre, e a todos da escola que acolherem.
[...] um convívio abençoado! [...] Sim, agradeço a Deus por tudo! Por
poder estar realizando mais um sonho em minha vida! Amém!” (João,
Publicação no Blog, 2019).
A publicação da aluna Eny apresenta detalhes sobre sua biografia,
em quê o elemento inicial e motivador da publicação foi a atividade que
havia participado sobre o período ditatorial no Brasil e a mulher no
século XXI, partindo para uma postagem reveladora quanto ao seu
próprio convívio familiar neste período:
Durante a nossa roda de conversa sobre A muher no Século XXI [...].
Me lembro desta época, pois meu pai tinha muita esperança nessa
reforma agrária. Eu era pequena, mas já vivia este tempo. Nós éramos
109
uma família muito pobre e o meu pai ia nas reuniões da reforma
agrária para ver se conseguira um pedacinho de terra para construir
uma casa para nós morarmos (Eny, Publicação no Blog, 2019).
A autora publicou dois posts no blog, sendo o primeiro
autobiográfico e motivado pela atividade em que havia participado na
escola, com foco nas relações de trabalho e contexto da época e um
segundo trabalho que constitui um poema lido e apresentado pela
própria autora em um evento cultural que ocorreu na escola, sendo que a
divulgação do poema no blog ocorreu somente após a exposição da
autora no evento. As duas publicações de Eny retratam momentos
diferentes de sua vida, no primeiro, motivado pela Roda de Conversa,
abordou questões mais próximas à sua infância e seu convívio familiar
mediante ao contexto social da época e a necessidade de trabalhar “Os
meus irmãos não trabalhavam, porque estavam alistados no exército e as
firmas não empregavam quem estava alistado. Foi uma fase muito difícil”
(Eny, Publicação no Blog, 2019).
Já a segunda postagem, de cunho artístico e autobiográfico por se
tratar de um poema, faz mensão a imigração do nordeste para o sudeste
do país junto com a família. Com o título Nunca é Tarde o poema cita
uma autora marginal, moradora de comunidades periféricas, com
intensas referências a história de vida da aluna “Eu vim de Pernambuco;
Com três anos de idade; Meus pais estavam malucos; Para conhecer essa
cidade” (Eny, Publicação no Blog, 2019), contando sua trajetória de vida
ao sair de Parnambuco e até chegar na cidade de São Paulo, com uma
narrativa repleta de afetividade a partir de suas experiências de vida
“Acabei amando essa cidade [...] Me trouxeram felicidades” (Eny,
Publicação no Blog, 2019), concluindo seu poema com uma mensagem
incisiva de motivação a seus interlocutores “Mas antes que eu me
110
esqueça; Meu coração nordestino; Me fez parar no CEEJA” (Eny,
Publicação no Blog, 2019).
O desenvolvimento dos sujeitos pela linguagem (BAKHTIN,
2016), com estímulo a autonomia para a emancipação dos sujeitos foi
elemento motivador das ações durante o processo de publicação,
atrelados sempre com a amorosidade e envolvimento afetivo com as
atividades, exercendo seu direito a palavra como nos ensina Paulo Freire,
possibilitando que os próprios sujeitos selecionem suas temáticas
principais, a maneira de elaborar seus enunciados, as narrativas e a relação
com os suportes de linguagem, podendo produzir seus textos diretamente
nos suportes digitais ou ainda não envolver-se com computadores,
privilegiando de fato a produção autoral. Das publicações que não foram
produzidas para serem autobiografias, destacamos que somente uma não
apresentou relação direta com relatos de experiências e vivências dos
alunos que foi o texto traduzido no contexto das aulas de inglês.
A busca pelo sentido nas publicações dos sujeitos está diretamente
relacionada com a utilização da autobiografia e da emancipação destes,
que envolveu a mobilização de sua identidade e o reconhecimento
enquanto indivíduo histórico, cultural e autor de sua produção (FREIRE,
2015).
Nesse sentido, destaque-se, também, que para a maioria dos
educandos a EJA, de forma geral, é esperança de melhoria da condição de
estar no mundo; e a participação no blog, em particular, se constitui em
espaço de socialização, de diálogo horizontal, de fala entre iguais e
instância de aprendizagem pautada pela produção de sentidos e
negociação de significados.
111
Desta maneira pode-se visualizar a relação direta entre os assuntos
escolhidos pelos sujeitos para publicar e a importância ou o sentido destes
assuntos para suas vidas, como na carta ao poder público, com dizeres
textuais simples, mas que relata a preocupação do sujeito na conservação
da via pública de sua casa, desta maneira o texto alcança uma função
social. A especificidade dos conteúdos publicados pelos alunos modifica
conforme seus próprios interesses e preocupações, orientados neste
processo a criar trabalhos autorais e que tenham real significado para suas
vidas, estando livres para que propusessem os assuntos a serem criados,
reforçando a preocupação para que estes conteúdos façam sentido em
seus contextos reais, sendo algo que eles de maneira significativa queiram
divulgar para um público amplo na internet, exercendo a emancipação
pelo direito ao uso da linguagem.
Encontros dialogados com os sujeitos
O CEEJA está organizado com presença flexível, de maneira a
facilitar que alunos trabalhadores possam frequentar a escola e concluir os
estudos, além do fator de se adequar ao cotidiano de adultos que já
possuem uma rotina e precisam adequar a carga horária escolar com seus
afazeres diários. Diante desta questão, justificamos a baixa frequência dos
sujeitos nos encontros dialogados que mobilizamos para conversar com
os participantes sobre a experiência de terem publicado no blog da escola,
visto que das 19 publicações, sendo 17 autores ao todo, somente 6
sujeitos dispuseram de seu tempo e compareceram aos encontros
dialogados. Além dos diálogos com os sujeitos, foi elaborado mais um
encontro dialogado com o Professor Coordenador (PC), da coordenação
pedagógica do CEEJA, com o objetivo de enriquecer nossas reflexões
sobre o experimento do blog. As informações dialogadas nesta ocasião
112
constam no próximo capítulo, de reflexão, visto que esta seção foi
reservada aos enunciados dos sujeitos e suas leituras sobre o processo.
Os objetivos dos encontros dialogados com os sujeitos foi a partir
da interlocução de vozes na ação comunicativa com os autores que
publicaram no blog da escola, reconhecer em seus enunciados suas
histórias e percepções sobre o processo, para conhecer seus perfis,
compreender o processo de publicação a partir de seus pontos de vista,
dialogando entre seus próprios enunciados no ato comunicativo para
entender se esta dinâmica favoreceu o desenvolvimento da linguagem e
sua aplicação prática em atividades de letramento pelo uso dos gêneros
discursivos. O encontro dialogado deu-se na interlocução com os sujeitos
e na alteridade entre suas vozes com as hipóteses do pesquisador
(TAMURA, 2018), tendo como estrutura o convite prévio a todos os
sujeitos. Os encontros cororreram em três períodos e dois dias, na terça e
quarta-feira (dias 18/06 e 19/06/2019), em três horários, às 9h00, às
15h00 e às 19h30. Os participantes que aceitaram o convite puderam
escolher comparecer em qualquer um dos períodos indicados, sendo
necessário participar somente em um dos encontros. Foram previstos de
60min à 120min de conversa, podendo os participantes permanecer por
mais tempo ou se retirarem a qualquer momento, assim como acontece
na dinâmica do CEEJA. Foram ao todo quatro encontros com alunos
participantes presentes, o primeiro com três sujeitos, durando 55
minutos, o segundo encontro com dois sujeitos, durando 59 minutos, o
terceiro encontro com um sujeito durando 42 minutos e o último
encontro ocorreu ao dia 28/11, com um sujeito, por conta do retorno
deste após um período de evasão, durado 30 minutos.
A estrutura dos diálogos ficou relativamente aberta, deixando que
a conversa fluísse para novos contextos, partindo da alteridade entre os
113
sujeitos na ação comunicativa, ficando registrado pelo pesquisador os
conteúdos não estruturados previamente e que apareceram no decorrer
dos diálogos. O roteiro dos encontros foi semiestruturado e pensado com
uma sequência de assuntos prévios a serem conversados, podendo
enveredar para novos conteúdos no fluxo do diálogo, sendo estruturado
da seguinte maneira: 1. Informações pessoais sobre os sujeitos: procurar
abordar especificamente questões pessoais como idade, há quanto tempo
deixou de estudar e se está trabalhando; 2. Relação dos sujeitos com a
escola: motivos de seu afastamento da escola, suas relações com a escola
da época, investigando o que acreditam que faltou em contraste com a
escolarização atual, assim como seus motivos de voltar a estudar, sua
relação com a escola atual, com os conteúdos, com os profissionais e com
a dinâmica do CEEJA; 3. A experiência com o Blog: investigar a
percepção dos sujeitos sobre a experiência de produção e publicação de
conteúdos na internet, em especial ao processo de criação, investigando
os desconfortos e desafios gerados no transcorrer da atividade como
aceitar o desafio, elaborar um tema, produzir um trabalho, lapidar para
publicação, encarar as tecnologias e escrever para um grande público; 4.
Desenvolvimento da linguagem: buscar a opinião dos sujeitos sobre o
processo de aquisição da linguagem, em especial à língua escrita e digital.
Como a atividade desenvolvida favoreceu ou não a utilização da
linguagem pelos sujeitos em contextos concretos e digitais; 5.
Considerações finais: principais apontamentos, elogios e queixas dos
sujeitos sobre o processo.
A dinâmica proposta nos diálogos procurou evidenciar o ponto
de vista dos sujeitos e seus próprios enunciados sobre a experiência de ter
participado da pesquisa, investigando a relação desses sujeitos com as
atividades propostas e buscando compreender com maior profundidade
114
este processo de criação, produção e publicação de conteúdos no blog,
assim como a perceão dos sujeitos sobre a metodologia e sistemática
proposta. Desta maneira, trata-se de investigar o ponto de vista dos
sujeitos sobre a experiência, para am da ótica dos profissionais da
educação ou dos conteúdos produzidos, mas entender como ocorreu o
processo de criação no contexto proposto a partir da ótica dos sujeitos
participantes.
Os encontros foram gravados em áudio e transcritos em sua
totalidade, procedendo o encontro com o pesquisador como mediador
do debate, propondo questões e estimulando que os sujeitos falassem
sobre suas vivências e sobre a experiência de participar do experimento
formativo. Após a transcrição integral das falas dos sujeitos, foram
selecionados trechos mais relevantes para nossa investigação e organizados
por temáticas. A partir desta sistemática foi possível organizar as
temáticas mais recorrentes nas falas dos sujeitos, assim como as pensadas
nas publicações, investigando quais assuntos foram abordados e a
maneira de enunciação pelos sujeitos, com destaque aos assuntos:
história, trabalho, estudos, tecnologias, linguagem e motivação a partir
das falas dos participantes. Nossa reflexão parte das mesmas categorias
analisadas nas produções dos sujeitos, sendo autonomia, gêneros
discursivos, desenvolvimento pela linguagem e afetividade.
Quanto aos temas abordados pelos sujeitos em seus enunciados, a
temática história organiza as falas dos sujeitos sobre suas histórias
privadas, contando os motivos de ter se afastado da escola e outros
detalhes sobre suas vivências antes de ingressar no CEEJA. O trabalho
apareceu como elemento motivador na busca pela escola e necessidade
para a vida cotidiana, mas principalmente como fator de afastamento dos
sujeitos da escola enquanto uma necessidade imposta aos sujeitos. Os
115
estudos aparecem como motivadores, mas por outro lado, a motivação
aparece quando os sujeitos relatam sua relação com a escola e com as
dinâmicas escolares, o acolhimento e as possibilidades que aparecem com
a escolarização, sendo relatos associados ao envolvimento com a dinâmica
escolar atual. A temática das tecnologias explorou a relação destes sujeitos
com os equipamentos digitais e a linguagem evidenciou o
desenvolvimento e a emancipação dos sujeitos a partir do experimento
formativo.
Os sujeitos apresentaram-se motivados a contar sobre suas
histórias de vida, suas lembranças sobre o convívio escolar em sua época
de infância ou adolescência e sobre o contexto de seu afastamento da
escola no passado. Quanto ao afastamento da escola, o principal fator que
aparece nas falas é a questão financeira, onde os participantes relataram
que precisaram afastar-se por necessidade de trabalhar para auxiliar nas
despesas familiares “não teve condições de suprir nossas necessidades né,
aí eu decidi trabalhar, acabei saindo da escola e arrumando um emprego,
mesmo de menor” (Nio, Encontro Dialogado, 2019)
2
. Pode-se
evidenciar a relação dos textos com o contextos mais amplos, como a
conjuntura histórica da época, como no caso da aluna que faz menção
aos governos militares e o motivo de seus irmãos não conseguirem
trabalho “todos estavam desempregados por causa da fase do exército que
naquela época quem se alistava as firmas não empregava pra trabalhar”
(Any, Encontro Dialogado, 2019).
Um sujeito da pesquisa, que vivenciou o falecimento de seus pais
logo na infância, acabou precisando morar em casa de parentes e afirmou
que “nas casas que eu morava eu tinha que ajudar com o custeio sabe”
(Ide, Encontro Dialogado, 2019). A questão do machismo ou do
2
Todos os textos referentes ao Encontro Dialogado serão transcritos sem modificações.
116
contexto mais amplo da sociedade patriarcal e conservadora brasileira,
também aparecem nos diálogos, principalmente nos relatos das mulheres
“minha mãe dizia agora tem que trabalhar, mas tem que ter uma
profissão.. mulher não é tanta questão de profissão, mas homem sim”
(Any, Encontro Dialogado, 2019), outros relatos vão além e
apresentam questões mais sensíveis sobre o machismo no Brasil:
[...] eu me afastei eu tinha treze anos, é.. fatores, família.. meu pai
não deixava eu estudar [...] mulher.. mulher foi criada pra lavar,
passar, cozinhar e ter filhos [...] obedecer o homem, ter filhos,
trabalhar na roça [...] meu ex-marido tinha o mesmo pensamento do
meu pai e da minha mãe, mulher não foi feita para estudar, mulher
foi feita pra cuidar de casa, ter filho e apanhar (Bia, Encontro
Dialogado, 2019).
E ao ser questionada sobre sua relação com a escola da época, a
mesma mulher fez o relato:
[...] ótima, eu gostava era edificante, por que eu fugia de muita coisa
né, do trabalho, das surras, de muitas coisas mais. Era mais fácil estar
na escola, gostava de aprender, só que infelizmente, a oportunidade
foram poucas né, por que naquela época a mulher realmente não era
criada para estudar (Bia, Encontro Dialogado, 2019).
Já nos relatos dos homens as questões relativas ao machismo
instituído na sociedade brasileira não foram tão aparentes, revelando
outras questões, principalmente sobre as dificuldades financeiras de
colaboração nas despesas domésticas. A necessidade de trabalhar na
ocasião de seu afastamento da escola de maneira majoritária aparece com
o objetivo de auxiliar financeiramente a família, com ocupação de serviço
braçal entre os homens, que exigiam força física, e entre as mulheres de
117
empregada doméstica. Os sujeitos citam a faixa dos 12 aos 16 anos de
idade quando o seu afastamento da escola, junto com a necessidade de
começar a trabalhar, porém nenhum deu detalhes quanto as condições de
trabalho ou sobre o registro em carteira de trabalho dessas atividades.
Quando os sujeitos foram indagados sobre a relação deles com a
escola da época e sobre a dinâmica escolar do momento de seu
afastamento, todos relataram boa convivência escolar, sem relacionar em
momento algum os métodos escolares da época com defasagens de
aprendizado ou sobre seu próprio afastamento da escola, afirmando ainda
que a escola era boa e de ter boas lembranças sobre este momento de suas
vidas “quando eu estudei era muito duro, o hino nacional todos os dias
antes de entrar na sala de aula, a gente formava aquela filinha e cantava
com a mão no peito e com todo o respeito e cantava o hino nacional”
(Eny, Encontro Dialogado, 2019) e ao serem questionadas sobre a
importância dessas atividades no contexto escolar, ambas as mulheres que
participaram deste encontro dialogado específico tiveram as respostas
Sim!, Eu achava! e Com certeza! e completaram “Eu me sentia assim,
orgulhosa de estar na escola sabe, eu gostava muito, muito mesmo” (Eny,
Encontro Dialogado, 2019).
Por outro lado, uma das mulheres, a ex-aluna do CEEJA e que
está em fase de conclusão de sua graduação em Pedagogia pela UNESP
fez a seguinte crítica ao sistema escolar da época quando questionada
sobre a dinâmica escolar da época:
Eu acho que faltou pela questão assim, a gente não era ouvido, os
alunos, assim tipo, a gente não tinha voz né, o professor falava e a
gente obedecia, era assim que funcionava. A gente não podia falar
alguma coisa, tipo as coisas.. até mesmo falar da sua vida pessoal
também, algum problema. [...] eu sofria bullying na escola, eu era
118
chamada de magrela, de raquítica, de tudo mais.. aí eu ia falar pra
professora e não dava bola, ah é brincadeira, não liga, só que eu sofria
com isso.. eu sofria bullying, hoje eu sei o que é o famoso bullying,
mas na época não tinha, eu não era ouvida nessa questão.. acho que
falhou nesse sentido, de.. de não ouvi o que a gente tem pra falar
(Ide, Encontro Dialogado, 2019).
A outra mulher que participou do mesmo encontro dialogado
junto com a ex-aluna que fez o relato acima mencionado imediatamente
se pôs a discordar e a defender a escola de sua época afirmando “eu não.
Eu gostava da escola” (Eny, Encontro Dialogado, 2019), contando que
auxiliava a professora em atividades corriqueiras como apagar a lousa,
assim como outros sujeitos que apresentaram relatos similares de ajudar
os professores nessas atividades. Mesmo ao tratar dos castigos escolares
como a palmatória, os sujeitos não apresentaram críticas “naquela época
ajoelhava no milho, minha professora vivia dando reguada na gente e
ninguém morreu” (Bia, Encontro Dialogado, 2019), ou ainda ao
defender os métodos utilizados, afirmando “aprendíamos muito e era
assim ou sabia ou sabia, não tinha meio termo, ah vai passar que nem
hoje, por passar” (Bia, Encontro Dialogado, 2019), dando maior espaço
e importância na memória para boas lembranças, principalmente
envolvendo colegas e atividades extraclasse, como na relação com os
colegas ou com o ambiente da escola.
As críticas sobre sua escolarização apareceram mais claramente ao
debater sobre os contrastes com a escola atual, principalmente em relação
a experiência do CEEJA em que eles estudam, em que uns apenas
apontam algumas diferenças “passavam coisas na lousa e a gente copiava
e agora aqui no ceeja você pega a apostila e você estuda a apostila e depois
faz a prova” (Usu, Encontro Dialogado, 2019), outros afirmam “no
119
passado eu não lia e não achava incrível [...] hoje eu sou um cara
apaixonado por essa escola aqui [...] É diferente, é um acolhimento mais
amoroso, mais saudável” (João, Encontro Dialogado, 2019) e ainda
aparecendo críticas mais pontuais:
[...] as vezes se ia embora com dúvida, tinha coisa que não aprendia
por que era muita gente perguntando e as vezes não dava nem espaço
[...] Aqui não, aqui tem a apostila, tem o professor ali, qualquer
momento se preciso você chega nele, ele vem tira a dúvida, vc
aprende mais (Nio, Encontro Dialogado, 2019).
De maneira mais geral, a relação dos sujeitos com a escola de sua
época aparece mediada por boas lembranças relatadas pelos sujeitos,
surgindo críticas pontuais somente ao comparar a escola da época com o
CEEJA em que estudam “é essa escola que eu vivo hoje, é essa escola que
eu queria pro meu filho, pelo respeito, pela educação, pelo aprendizado,
pela força que falta na escola do meu filho” (Bia, Encontro Dialogado,
2019). Cabe relembrar que o CEEJA em questão se apresenta, além da
estrutura específica para a EJA, com presença flexível, possui uma
característica própria de acolhimento aos alunos e de formação integral,
possuindo diversos prêmios nacionais que legitimam seu diferencial.
Soma-se a este diferencial do CEEJA a caracterização dos sujeitos como
sujeitos mais maduros atualmente e de certa maneira pode-se interpretar
que estes indivíduos estão assumindo a responsabilidade por seu
afastamento no passado e de seu retorno atualmente:
[...] aqui os professores são respeitados, por quê são pessoas que
estudam aqui que já passaram por lá, entendeu? Que se arrependeram
e determinaram, encontraram aqui a oportunidade de terminar o que
eles deixaram de passar, o que eles não conseguiram terminar e aqui é
120
uma escola que acolheu todo mundo, que acolhe todo mundo de
braços aberto [...] atender de verdade mesmo, sem forçar, do livre
arbítrio da pessoa, você não tem horário pra chegar, você não tem
horário pra sair, entendeu? É da livre espontânea vontade da pessoa,
por isso que essa escola aqui, a diferença dela é que ela é muito
acolhedora (Nio, Encontro Dialogado, 2019).
Os sujeitos envolvidos com as atividades da pesquisa
apresentaram-se motivados com as atividades escolares e com o ambiente
de estudos proporcionado no cotidiano do CEEJA. Os motivos desses
sujeitos para retornar aos estudos inicia-se, numa primeira sondagem,
sobre a necessidade de aprimorar-se para o trabalho “eu voltei a estudar
pq eu encontrava muita dificuldade em achar um emprego” (Nio,
Encontro Dialogado, 2019), porém ao desenvolver do diálogo outras
necessidades aparecem “eu ia fazer uns concursos e pela escolaridade que
eu tinha não conseguia fazer concurso” (Nio, Encontro Dialogado,
2019), também “para me capacitar para isso. Eu encontrei muita porta
fechada no teatro” (Usu, Encontro Dialogado, 2019) e ainda “para mim
foi muito importante voltar a estudar, ter mais conhecimento e procurar
se conectar com esse mundo de hoje” (João, Encontro Dialogado, 2019,
sic).
Os motivos continuam e envolvem mais a vontade a a
necessidade de aprender novos saberes “O que me motivou foi a vontade
mesmo de retomar meus estudos. [...] A minha pretenção era de terminar
o Ensino Médio” (Ide, Encontro Dialogado, 2019), assim destacamos
que as necessidades pessoais sobressaem às exigências do mercado de
trabalho “O que me incentivou para voltar a estudar foi ficar falando..
agora to livre.. desocupada.. já formei todos os filhos, todos já casaram”
(Eny, Encontro Dialogado, 2019) e por uma questão de superação
121
pessoal, atribuindo necessidades e sentido próprios do indivíduos e não
por imposições externas:
[...] provar pra mim mesmo que eu não sou burra, provar pra mim
mesmo que eu posso me vestir de branco um dia, prova pra mim
mesma e quem sabe até pro mundo, que eu existo, que até então eu
era só mais um entre a multidão.. hoje eu vejo as pessoas me olhando
assim: poxa você está estudando? To! Nossa você é corajosa, não sou
não, sou medrosa, to tentando, é superação (Bia, Encontro
Dialogado, 2019).
A partir dessas informações refletimos que os motivos pessoais
dos sujeitos superam as exigências do mercado de trabalho, que podem
incentivar num primeiro momento, porém a permanência no processo de
escolarização em vida adulta depende muito das motivações pessoais
desses sujeitos e principalmente com o envolvimento com as atividades
desenvolvidas no cotidiano escolar e com o ambiente de aprendizagem
que a instituição apresenta, cabendo a instituição de ensino articular com
as necessidades dos sujeitos, como no caso de uma mulher que foi
motivada, inicialmente pela patroa, que a incentivou a matricular-se no
CEEJA e afirmou “o CEEJA abriu um leque tão grande na minha mente
que antes eu vivia um dia após o outro, hoje não, hoje eu penso algo
mais” (Bia, Encontro Dialogado, 2019), relatando inclusive a ocasião de
um diálogo pessoal com seus filhos “mãe que legal, depois que você foi
pra escola você está mais calma [...] não falta da escola não que se é
exemplo pra nós tá mãe” (Bia, Encontro Dialogado, 2019), desta
maneira os motivos e necessidades de estudo superam a qualificação
profissional para o trabalho e incorpora uma formação integral e
emancipadora.
122
Ao serem indagados sobre a proposta de participar do
experimento formativo e publicar no blog da escola, os sujeitos
apresentaram três pontos principais para nossa reflexão: a publicação de
suas histórias, a função social de suas publicações e o contato direto com
o suporte do computador. A preocupação que os sujeitos apresentaram
ao refletir sobre a publicação de suas vivências apresenta-se no fator de
divulgar na internet suas experiências pessoais “eu fiquei pensando no
que os outros ia pensar a respeito né, que as pessoas que fossem ver que
fossem ler, qual que seria as reação das pessoas né” (Nio, Encontro
Dialogado, 2019), onde o fator agravante é o de ser um amplo público
leitor “é os outros que vão ler as coisas da gente, então eu fico bem
preocupada com essa questão né.. nossa.. ainda mais que é muita gente”
(Ide, Encontro Dialogado, 2019).
A preocupação com a divulgação das informações aparece como
confirmação da identidade dos sujeitos, portanto, apesar do receio, esta
questão aparece como uma novidade a ser encarada e superada “O mais
difícil é você pensar do que você fazer, mas quando você começa a se
soltar aí a fila anda, funciona e é legal.” (João, Encontro Dialogado,
2019), por outro lado a preocupação com a divulgação das informações
não foi aparente em todas as falas “não tenho essa preocupação. Eu quero
que todo mundo leia, porque a minha história é uma história bonita,
uma história vivida, bonita” (Any, Encontro Dialogado, 2019).
Ao discutir a inserção de jovens e adultos como sujeitos de
conhecimento e aprendizagem Oliveira (2001) considera que essa
questão não envolve apenas uma especificidade relativa à faixa etária, mas
primordialmente uma questão de especificidade ou identidade cultural. A
autora identifica três formas de compreender as relações entre cultura e
funcionamento psicológico, sendo que a primeira envolve uma
123
postulação determinista, relacionando de forma automática os traços do
psiquismo com fatores culturais, ou seja, os sujeitos não pensariam de
forma apropriada ou não seriam capazes de aprender adequadamente em
função de sua pertinência a um grupo cultural específico. A segunda
posição, segundo a autora, se não nega de forma explícita as diferenças
entre os indivíduos e os grupos culturais, parece negar a relevância das
diferenças para a compreensão do funcionamento psicológico. As catarses
de João e Any apontam para a terceira abordagem indicada pela autora,
claramente associada à teoria histórico-cultural:
[...] poderia ser considerada a mais fecunda para a compreensão das
relações entre cultura e modalidades de pensamento. Postula o
psiquismo como sendo construído ao longo de sua própria história,
numa complexa interação entre quatro planos genéticos: a filogênese,
a sociogênese, a ontogênese e a microgênese (OLIVEIRA, 2001, p.
26).
Desse modo, se pela filogênese cada indivíduo nasce com as
características de sua espécie, na perspectiva da sociogênese se desenvolve,
trilhando o caminho da ontogênese, informado e alimentado pelos
artefatos simbólicos e concretos, pelas formas de significação oferecidas
pelo grupo cultural no qual estão inseridos, é pelo processo
microgenético que, interagindo com os outros três, se caracteriza a
emergência do psiquismo individual.
Trazemos à baila essa discussão porquanto as manifestações dos
sujeitos nos encontros dialogados e no próprio blog revelam diferenças
individuais e diferenças culturais que se fundem no fenômeno de geração
da heterogeneidade que se nota nos processos de sala de aula de EJA. E
124
apontam para a necessidade diversificação do trabalho pedagógico e de
materiais didáticos alternativos.
Muitas histórias foram impactantes e o blog apresentou-se como
um instrumento para reforçar a identidade e a emancipação dos sujeitos
pela mediação com a linguagem “pensei em por um nome fictício, mas
como era a minha história de vida eu senti vontade de colocar o meu
nome memo e me expor memo” (Nio, Encontro Dialogado, 2019), na
ocasião a imagem que acompanhou a publicação de Nio foi uma foto
dele segurando livros, o que indica a mudança de paradigma e
emancipação para um estilo de vida diferente. O blog apresentou-se
também como espaço para se expressar e desabafar sobre questões há
muito escondidas no passado “você querer contar uma história, que essa
história é sua [...] você relembrar nessa história os momentos que vo
passou, a qual estava escondida lá na caixinha de segredo” (Bia, Encontro
Dialogado, 2019). Sobre o processo de criação, um dos sujeitos relatou:
[...] assustador, medo, de nunca ter encarado assim, situações igual a
essas né [...] como o meu era uma história de vida, era a mesma coisa
de uma mulher quando ganhar o nenê, na época você passa na
[ruído] você passa pela dor, mas depois quando a criança nasce não
dá uma alegria? Entendeu. Então quando tá pronto o projeto se olha
dá uma alegria, mas na hora se fica meio assim, se quer tirar o pé, mas
depois de tudo concluído né, o passo [ruído] aí vem a alegria (João,
Encontro Dialogado, 2019).
A principal motivação apresentada pelos sujeitos figura no
crescimento pessoal e na possibilidade de ajudar outras pessoas em
situações similares, tratando-se não somente de sua própria emancipação,
mas também a preocupação pela emancipação de outras pessoas em
situações similares “pro bem, pra ajudar as pessoas e ajudar a eu também
125
é muito legal” (João, Encontro Dialogado, 2019), nota-se também na
afirmativa “muitas pessoas alí ta passando, que passaram ou tão passando
pela situação que eu passei né, que seja uma ajuda pra eles né, que seja
uma luz né, uma luz no fundo do túnel” (Nio, Encontro Dialogado,
2019).
Apesar da preocupação sobre a divulgação de suas experiências e
relatos de experiência para um grande público, a motivação de divulgar
suas experiências como testemunho para outras pessoas aparece como
justificativa do esforço de publicação, entendendo assim as publicações
como instrumento efetivo de emancipação não somente dos autores, mas
também para os leitores destes textos, reconhecendo a função social das
publicações no blog. Os principais receios apresentados ainda figuram
sobre a relação com o suporte de linguagem do computador e suas
diferenças “No computador a gente aperta as letras né e no caderno a
gente escreve” (Usu, Encontro Dialogado, 2019).
[...] computador, pra quem nunca mexeu ele é meio monstrinho, por
quê você escreve a ele escreve aaaaaaabc, assim por diante, você quer
por o vírgula, ele põe traço em baixo, é meio estranho, mas, eu perdi
o medo aqui escrevendo esse texto, por quê não tentar ir mais alto?
(Bia, Encontro Dialogado, 2019).
Desta maneira, a relação com um novo suporte de linguagem e
comunicação humana, o computador, aparece como elemento de
estranhamento dos sujeitos com a dinâmica proposta na pesquisa, mas
interpretamos esta relutância diante da segregação tecnogica sofrida
pelos sujeitos, onde dos seis sujeitos que participaram das conversas,
quatro afirmaram nunca ter mexido em um computador, uma afirmou
ser obrigada a utilizar este suporte da linguagem por conta das atividades
126
no curso superior e somente um alegou já ter familiaridade com as
funções básicas do computador. Porém, a partir da experiência com a
dinâmica da pesquisa, os sujeitos se envolveram mais com o computador
“a internet é um mundo aberto que você encontra tudo na internet e eu
achei muito bom né [...] foi isso pra mim, pra quem nunca tinha mexido
pra mim foi um começo” (Nio, Encontro Dialogado, 2019), outros
confirmando que após a experiência começaram a utilizar o computador
em seu cotidiano:
Eu uso o notebook, coisa que eu nunca mexia [...] Não,
quem mexia era meus filhos, eles viam, mãe vem jogar
com a gente no note. [...] Não, nem encostava, vai quebrar
isso aí, como eu vou consertar isso aí rapaz? Sua mãe tem
mão pesada, mão que puxou cabo de enxada, mão que
varre vassoura, pega balde de água [...] depois que eu fiz o
texto, foi o que? Quarta-feira da semana passada, eu
peguei o note, sentei na sala, tava digitando algumas
coisas, aí meu pequeno chegou e falou assim: ah, perdeu o
medo né mamãe. Eu falei: senta aqui, vamos jogar um
joguinho. [...] Essa experiência aqui no Blog também me
incentivou a chegar mais próximo do meu filho, até
mesmo fazer trabalho de escola no computador, me
ajudou bastante [...] Eu ajudo ele a fazer, muitas vezes, nós
dois no fuçometro, quer dizer, eu já não tenho tanto medo
(Bia, Encontro Dialogado, 2019).
A experiência de publicação do blog da escola apresentou-se
valiosa ao aproximar os sujeitos deste suporte de linguagem que é do
computador e a internet, ampliando as possibilidades no uso destes
recursos, para pesquisas, trabalhos escolares, laser, dentre outras inúmeras
possibilidades, possibilitou pela mediação com a linguagem e pelo uso
127
dos gêneros discursivos o exercício de emancipação, de reforçar a
identidade dos sujeitos, que relatam suas experiências e confirmam suas
histórias de vida, motivando novas práticas, proporcionando avanços
significativos, inclusive nos convívios familiares e cotidianos fora do
ambiente escolar, extrapolando assim os muros da escola e utilizando da
linguagem e dos computadores em contextos reais e no âmbito social e
familiar, evidenciando a função social das publicações e o objetivo de
emancipação a partir desta dinâmica.
O blog favoreceu, não somente a prática de escrita, por meio das
publicações autorais dos sujeitos que participaram da pesquisa, mas
também incentivou práticas de leitura em ambientes digitais, pois
diversos conteúdos foram divulgados na internet por meio deste
instrumento de linguagem, proporcionando a produção de conteúdos
autorais de boa qualidade e que podem ser acessados por quaisquer
pessoas conectadas à internet, com foco na emancipação do público da
EJA:
[...] aconselho a escola a fazer isso com outras pessoas né, pra fazer o
convite pra outras pessoas né [...] tudo isso aí, não pode parar, tem
que ter continuidade, porque sempre pessoas vão lá naquele no blog
procurar novas matérias entendeu, procurar algo pra ler, informações
boas, porque lá naquela escola alí eu acho só informação boa, tudo
que é declarado alí é autoajuda, ajudo eu, pode ajudar outras pessoas,
as vezes uma história de vida minha, dele, minha, dele, muitas pessoas
que leram alí, vai ajudar ela na dificuldade que ela tem, vai tirar ela da
dificuldade e vai ajudar ela a se estudar, procurar o estudo (Nio,
Encontro Dialogado, 2019).
Sobre o momento de elaboração dos conteúdos para publicação,
todos os sujeitos afirmaram que publicariam novamente, inclusive um
128
dos sujeitos disse que já estava elaborando uma próxima publicação, mas
que necessitavam das correções e do acompanhamento docente para
divulgar seus trabalhos. Ao serem questionados se elaborariam a
postagem diretamente no computador a maioria afirmou que prefere
criar o texto com papel e caneta e após as correções passar para o
computador digitando. Afirmando suas experiências sobre a publicação
“Eu gostei, achei gratificante mesmo.. mudou minha vida. Até meu
andar na rua é diferente [risos].. Alguém te conhece, Você não tá
sozinho” (João, Encontro Dialogado, 2019), em outras palavras “Saiu do
armário [...] Você mostra pras pessoas que você gosta de um desafio”
(Nio, Encontro Dialogado, 2019), assim os sujeitos afirmam gostar de
um desafio, ser aventureiros e de ajudar a outras pessoas com seus relatos
de experiência, possibilitando a efetiva emancipação pela mediação com a
linguagem.
O encontro dialogado ocorrido com o sujeito Igo, morador de
rua e que elaborou três textos para o blog, ocorreu meses após os
primeiros encontros, por motivo do aluno ter se evadido da escola por
problemas particulares, porém na oportunidade de seu retorno ao CEEJA
o mesmo apresentou-se motivado e determinado, afirmando sobre sua
produção no blog “Era pra ter escrito muito mais viu” (Igo, Encontro
Dialogado, 2019). O sujeito apresentou-se motivado a produzir mais
textos para o blog e muito questionador em todos os momentos de sua
participação, indagando inclusive quanto ao acompanhamento em suas
futuras atividades “Mas o certo não era ter um profissional que nem
você?” (Igo, Encontro Dialogado, 2019), o que evidencia, a partir do
enunciado do próprio autor, a necessidade de formação dos profissionais
da educação para poder acompanhar estes sujeitos durante a produção de
suas publicações para o blog.
129
O aluno Igo apresentou-se constrangido pelo fato de ter se
evadido da escola “Eu me sinto ainda um pouco ainda envergonhado,
por que eu vim várias vezes alcoolizado” (Igo, Encontro Dialogado,
2019), porém afirma estar concentrado e motivado a retomar os estudos
“agora foquei nos estudos e no meu tratamento [...] meu foco é meu
fortalecimento primeiramente, terminar meu ensino médio, recuperar
minha saúde física, mental, espiritual” (Igo, Encontro Dialogado, 2019),
confirmando este desejo de continuar os estudos e manter seu tratamento
nas instituições que o acolhiam o sujeito ainda fez menção a esta questão
em sua última publicação, explicando no diálogo seus motivos e
agradecendo o acompanhamento prestado pelas instituições, inclusive ao
CEEJA “Por isso eu fiz essa.. essa, eu acho que é uma homenagem né? É
um agradecimento, era o mínimo que eu podia fazer, nesse último texto
aí que é a terceira parte” (Igo, Encontro Dialogado, 2019).
Sobre sua autobiografia, escrita por ele no blog em três textos
complementares, o sujeito relata sua relação com bebidas e drogas,
relatando sua luta contra essa doença, tratada pelo próprio autor
enquanto uma doença, sendo assim uma questão de saúde pública,
atrelando ainda a superação ao vício com sua emancipação e com a
valorização de sua auto-estima “Por que eu estou limpo, eu consegui
novamente sair do álcool e da droga, eu consegui erguer a minha
autoestima, eu consegui aproximar a minha família” (Igo, Encontro
Dialogado, 2019), registrando assim um processo intenso e cotidiano de
luta contra o vício, com auxílio da escola e de outras instituições. Sobre
sua biografia, ao ser conversado sobre o uso da linguagem no contexto de
produção para o blog o aluno afirmou “Eu sempre escrevi [...] eu já
escrevi muita carta [...] eu tirava palavra sobre a bíblia, mas palavras
130
bonitas, então eu tenho esse hábito de escrever, desde a quarta série” (Igo,
Encontro Dialogado, 2019).
Utilizando-se da linguagem para se expressar, o sujeito afirmou
nunca ter contato com computadores antes da pesquisa e ao ser
perguntado sobre o processo de elaboração de seu segundo texto, que
gerou uma série de conturbações e ocasionou sua evasão, o aluno expôs:
Essa mágoa passou.. Essa mágoa, eu tava com muita mágoa.. inclusive
eu tive com o [autoridade citada no texto do autor], semana passada
[...] eu fiquei perto dele quase o tempo todo, mas, ele deu a mão pra
todo mundo [...] E eu senti que ele queria dar a mão pra mim e eu
senti também que eu queria também dar a mão pra ele, mas acabou
nenhum dos dois dando a mão, mas eu senti.. eu senti que ele ficou
sentido, e depois saindo daquilo eu fiquei sentido e eu falei, eu acho
que eu fui orgulhoso demais, e.. e isso doeu em mim, doeu pq é o
seguinte, não importa o que ele é, ele é um ser humano que nem eu,
de carne e osso ele tem coração, eu devia ter dado a mão pra ele (Igo,
Encontro Dialogado, 2019).
A partir desta experiência de publicação pelo aluno Igo e da
própria conclusão de superação desta situação de mágoa a qual o mesmo
se referiu em seu segundo texto, consideramos valiosa a ocasião, pois
permitiu que o autor refletisse sobre o ocorrido e superasse a mágoa
relatada, afirmando ainda ao final do encontro dialogado, quando
perguntado sobre o que faltou ser conversado, o aluno disse “Se estou
bem” (Igo, Encontro Dialogado, 2019) e logo na sequência, após ser
perguntado se estava bem, o aluno respondeu positivamente “Estou
muito bem! De saúde, eu acredito que sim, do espiritual e no físico. E
pretendo entrar em 2020 [...] entrar com os dois pés firme” (Igo,
Encontro Dialogado, 2019).
131
Sobre a experiência de pesquisa, o aluno afirma que têm o hábito
de leitura, principalmente de jornais e revistas, confirma que nunca havia
utilizado um computador antes desta ocasião e ainda complementa sobre
o processo “Senti que é uma emoção gostosa” (Igo, Encontro Dialogado,
2019), desta maneira, consideramos valorosa a geração de necessidade
enquanto uma atividade de ação comunicativa e de emancipação destes
sujeitos e também como uma maneira amorosa de valorizar as vozes
desses sujeitos nas atividades escolares cotidianas.
Reflexões, relatos e experiências sobre o experimento formativo
A partir da perspectiva praxiológica e dialógica da abordagem
pesquisador-participante utilizada na pesquisa, foi possível travar intensos
diálogos com os atores sociais no campo de investigação, dialogando com
membros da equipe de CEEJA durante o cotidiano escolar em um
processo de prática e de reflexão sobre as ações desenvolvidas. A partir
desta relação com o campo foi possível elaborar reflexões sobre a
implementação significativa e sobre a geração de necessidades para o uso
do blog pela comunidade escolar. Ocorreram atividades formativas com
alunos e professores neste processo e para enriquecer os dados de nossas
reflexões foi elaborado um encontro dialogado, similar ao utilizado com
os sujeitos, junto à coordenação pedagógica do CEEJA, com o objetivo
de verificar os enuciados e percepções sobre o experimento formativo na
perspectiva da equipe escolar.
O encontro dialogado com o PC - Professor Coordenador do
CEEJA foi elaborado da mesma maneira dos encontros com os sujeitos,
investigando na alteridade da ação comunicativa os enunciados que nos
permitam compreender o experimento formativo na instituição. O
roteiro do encontro dialogado foi estruturado da seguinte maneira: 1.
132
Informações pessoais e institucionais: evidenciar o envolvimento do
Coordenador Pedagógico com a instituição, as singularidades da
instituição de ensino (prêmios, organização, produções, projetos e outros
destaques) e seus sujeitos (perfil, dinâmica, dificuldades, produções); 2.
Experiência com o Blog: percepção do representante da instituição sobre
a experiência do uso do Blog, investigando os desconfortos e desafios
gerados no transcorrer das atividades e na implementação das ações de
pesquisa; 3. Desenvolvimento da linguagem: buscar o ponto de vista do
Coordenador Pedagógico sobre o processo de envolvimento dos sujeitos
com as atividades de escrita propostas pela pesquisa para aquisição e
desenvolvimento da linguagem, procurando singularidades neste
processo, avanços, desafios, dificuldades ou outras considerações; 4.
Considerações finais: apontamentos, elogios e queixas do Coordenador
Pedagógico sobre o processo. O encontro ocorreu ao dia 30 de
Novembro de 2019, na sala da coordenação pedagógica, com duração de
55 minutos, deixando a conversa fluir pela alteridade das vozes no
diálogo.
Nos contatos iniciais a escola apresentou-se bastante aberta ao
experimento e utilizava há três anos o sistema WordPres.com antes da
pesquisa e antes, por mais tempo, manteve um blog que foi
descontinuado. Essas experiências prévias da instituição com o formato
do blog facilitou a implementação da proposta e sua incorporação ao
cotidiano escolar, pois houve boa aceitação e interesse por parte das
equipes escolares. Por meio de intensos diálogos foi-se estruturando uma
relação dialógica entre as necessidades da equipe pedagógica e as
possibilidades de implementação do blog no cotidiano escolar. A partir
de demandas especificas de necessidades da escola, foram criadas páginas
como, por exemplo, a Sala dos Professores, página de interação entre
133
professores e coordenação pedagógica, servindo para organizar a
documentação escolar e Biblioteca, com um sistema para controle de
empréstimo de livros integrado ao blog.
Os docentes demonstraram boa aceitação para o trabalho com o
blog, porém apesar de boa vontade, muitos apresentavam resistências,
principalmente por conta do estranhamento com as interfaces e queixas
por falta de formação específica. Atribuiu-se este estranhamento a grande
quantidade de novas informações e recursos que os professores tiveram
contato e precisaram passar a utilizar em um curto período de tempo,
onde as demandas por utilização do blog partiam não somente das
iniciativas da pesquisa, mas tratavam-se da interação com a coordenação
pedagógica. Em conversas com os professores, alguns deles declararam
baixas ou muito baixas suas habilidades com computadores e com a
internet, revelando seus medos ou receios em utilizar estes recursos,
supostamente porque podem ser desconfigurados ou dar algum erro
durante o processo.
Acreditamos, portanto, que este medo, tanto por parte dos
professores, que necessitaram utilizar o sistema para comunicar-se com a
coordenação pedagógica, quanto por conta dos alunos, que foram
convidados a produzir conteúdos para o blog, é resultado da pouca
familiaridade que os sujeitos apresentam com os equipamentos digitais.
De fato, os indivíduos não utilizam computadores com frequência e
alguns ainda declaram que não possuem este aparelho em casa ou não
tem interesse no uso, confirmando suas tecnobiografias, ou seja, sua
relação com as tecnologias e com seu uso em atividades de letramento
(ROJO, 2015), como segregadas dos suportes digitais. Tais hipóteses
quanto ao uso e envolvimento com os sistemas digitais no contexto da
EJA confluem para a questão da visibilidade que o blog alcançou na
134
internet, gerando sentido para o trabalho docente enquanto instrumento
pedagógico, atrelando assim sentido com necessidade.
[...] reconhecimento não só da comunidade escolar, mas também dos
outros gestores [...] a dirigente de ensino precisou ligar para São
Paulo para resolver um caso do edital [...] de bate pronto eles já
falaram que conhecem bem a escola, que acompanham o blog, que
acompanham as produções dos alunos e dos professores. [...] até
colocaram pra dirigente a importância dessa escola aqui né no interior
paulista [....] (PC, Encontro Dialogado, 2019).
A necessidade da utilização e a visibilidade que o blog alcançou
incentivou os docentes a se aproximarem do blog ao final da pesquisa,
visto que a secretaria de estado da educação afirmou para a dirigente de
ensino e para a gestão escolar via chamada telefônica que acompanha as
atividades da escola por intermédio deste recurso digital. Desta maneira,
atrelou-se a necessidade da utilização com a atribuição de sentido no
trabalho desenvolvido, pois houve reconhecimento para além da
instância escolar da coordenação pedagógica ou da gestão, para a
comunidade de uma maneira geral e para os gestores a nível estadual.
Constata-se então que, embora não fosse pressuposto da pesquisa,
o blog pode e deve ser pensado como instrumento de apoio à gestão,
facilitando a comunicação entre os atores sociais envolvidos no trabalho
da escola, algo cujo o debate precisa ser aprofundado em contexto do
acentuado grau de desenvolvimento tecnológico e de influência dos
sistemas digitais nos processos sociais de produção.
Apesar do medo declarado na utilização destes recursos, a
curiosidade diante dos equipamentos e sistemas digitais é marcante entre
os sujeitos, que mesmo com receio procuram motivos para utilizar os
135
equipamentos e fazem muitas perguntas sobre as possibilidades e
funcionalidades dos aparelhos, demonstrando interesse a partir da
geração de necessidades e da atribuição de sentido à utilização do blog. O
medo é característica marcante, e nossa hipótese é que este é fruto da
pouca familiaridade causada pela segregação tecnológica presente nas
escolas e espaços por onde esses sujeitos circulam, não utilizando destes
suportes em sua vida prática e cotidiana e também pela não utilização
destes recursos com viés pedagógico numa perspectiva integral dos
sujeitos, mas sempre profissionalizante e de capacitação, assimilando estes
recursos como instrumentos técnicos de alta complexidade e de
finalidades profissionais específicas e alheias as necessidades cotidianas
escolares, sem a produção de sentido pelos usuários.
O blog acabou incorporando muitas funções no cotidiano
escolar, extrapolando a concepção pedagógica de sua utilização pensada
inicialmente e que motivou o experimento formativo, estando realmente
implementado e integrado ao cotidiano do CEEJA, com múltiplos
desdobramentos evidenciados no processo de utilização do sistema. Em
sua estrutura foram implementados recursos para a gestão e organização
escolar, instrumentos didáticos e pedagógicos e tornou-se uma via de
comunicação da instituição com a comunidade. A escola apresentou uma
série de demandas para resolução de problemas de organização do
cotidiano escolar, visto a carência da instituição por auxílio e incentivo
dos órgãos competentes.
A estrutura de internet da escola conta com aparelhos
relativamente antigos e outros novos, porém todos carecem de
manutenção, o que dificultou o trabalho, pois em inúmeras ocasiões o
sistema de internet não estava funcional ou os aparelhos que não
disponham de manutenção em dia. Se agrava a esta situação o fato de que
136
a banda de internet é fornecida com renda própria da escola, utilizando
serviço de terceiro, pois a internet fornecida pelo Estado à escola é
limitada e não supre o uso além do da secretaria, além do agravante da
escola não contar com um profissional capacitado para auxiliar a
utilização ou prestar a manutenção dos equipamentos. Essas questões
apresentam-se como um desafio para a instituição, que demanda
investimentos neste setor, além da questão estrutural evidente, também
formativo e de pessoal para exercer auxílio, acompanhar sua utilização e
prestar manutenção dos equipamentos de maneira pedagógica e
instrumental para o cotidiano escolar.
A qualidade dos equipamentos influencia diretamente o fluir das
atividades desenvolvidas com o auxílio desta tecnologia específica. Com a
estrutura tecnológica das instituições escolares acontece o mesmo,
portanto, as atividades são melhor desenvolvidas e aceitas pelas equipes
quando os recursos com os quais se trabalha atende de maneira
qualitativa as necessidades dos sujeitos envolvidos. Neste contexto, tem-
se clareza da impossibilidade de aplicação da pesquisa com a estrutura
que foi encontrada na instituição, desta maneira, toda a rede escolar de
internet e a manutenção dos equipamentos precisou ser prestada pelos
envolvidos na pesquisa para viabilizar a mesma, não contando assim com
o suporte direto dos órgãos responsáveis.
O uso de sistemas digitais integrados à internet é algo requerido
pelos órgãos superiores da administração escolar, que com frequência
exigem estatísticas e informações que devem ser manuseadas e
encaminhadas via sistema de informações ou e-mail. Porém, a formação
específica para lidar com estes recursos não se encontra no calendário
com a mesma frequência das necessidades do cotidiano escolar.
137
Os professores, a equipe pedagógica e a direção acabam por
atender a demandas para as quais nem sempre foram capacitados com
formação específica, gerando múltiplas dúvidas durante o processo de
gestão das informações, mesmo que se tratem de atividades e necessidades
recorrentes, desta maneira geram-se necessidades, porém não é oferecido
o acompanhamento didático necessário para sua apropriação. Por outro
lado, quando dialogado sobre as principais dificuldades enfrentadas pela
instituição, outros problemas sobressaem a estes, com principal menção
ao investimento em pessoal de forma a “ampliar o módulo de professores,
funcionários, equipe gestora, aí o aluno poderia inclusive ter mais
oportunidades de um atendimento um pouco mais personalizado” (PC,
Encontro Dialogado, 2019).
O tempo hábil para as formações e para a apropriação dos
instrumentos implementados pela pesquisa apresentaram-se como um
limitador ao desenvolvimento e ao envolvimento dos docentes, que
dispunham de poucas horas formativas fora do atendimento
individualizado aos alunos “formação dos usuários pra poder usá-lo como
uma ferramenta, e eu como disse, com muita demanda de trabalho, isso
acaba dificultando a formação dos próprios professores” (PC, Encontro
Dialogado, 2019). A partir das necessidades apresentadas pela escola em
contato direto com as equipes, foram incorporados planilhas,
documentos e formulários para gestão e organização escolar. Juntando
formulários e planilhas foi possível elaborar um sistema de upload de
arquivos, para a organização e arquivamento da documentação escolar,
com banco de questões, registro de avaliações, roteiros de estudos e
planos de ensino. Resolvendo, desta maneira, o problema documental do
fluxo constante de professores e o registro das atividades, utilizando o
blog como centro destes registros. O blog tornou-se uma interface de
138
acesso a pastas e documentos escolares, reunindo funções e respondendo
a necessidades da organização escolar em um mesmo ambiente digital.
Foi possível organizar no blog o acervo da biblioteca para
consulta pública, cadastro de livros e usuários, assim como o controle de
empréstimos de livros. Para organização da coordenação pedagógica o
blog também apresentou-se central, pois foram feitas planilhas de
acompanhamento pedagógico dos alunos, especialmente aos alunos com
deficiência auditiva ou intelectual e com dificuldade de aprendizagem,
também os que eram acompanhados por projetos parceiros como o
PEJA. O blog foi utilizado como meio para divulgar as atividades
escolares, como informações sobre o calendário escolar e divulgação de
atividades extracurriculares como as rodas de conversas e oficinas que
ocorriam semanalmente, emitindo inclusive os certificados para os
participantes. Entre as páginas mais acessadas no blog estão os conteúdos
de interesse dos alunos e de orientação pedagógica, como os materiais
para estudos, roteiros de estudo, apostilas digitais, vídeos do material
didático, e, é claro, o objetivo da pesquisa, as produções dos alunos,
revelando-se um instrumento pedagógico e de organização escolar para
comunicação interna e externa com a comunidade.
Apesar das resistências iniciais, a utilização do blog para resolver
problemas cotidianos da escola apresentou boa aceitação no decorrer do
processo de implementação e permitiu aproximar mais as tecnologias do
cotidiano escolar, demonstrando a possibilidade no uso destes recursos
para aproximar-se dos sujeitos, como elemento motivador imerso no dia
a dia da escola, porém tal aproximação só ocorreu após as atividades
formativas desenvolvidas no contexto da pesquisa. Os docentes
denunciavam a falta de formação específica para o trabalho com TDIC
no contexto escolar, relatando em conversas essas preocupações por não
139
saber cumprir determinada atividade demandada pela coordenação
pedagógica ou por outros órgãos, temendo problemas técnicos no uso
dos equipamentos. Os docentes em boa parte apresentam-se receptivos a
experiência, mas sempre apreensivos por não estarem seguros ao lidar
com estes recursos que durante sua tecnobiografia não o conheciam,
evidenciando a necessidade formativa para um trabalho pedagógico
significativo com TDIC.
Relatos de professores pelo contato direto com o campo de
pesquisa evidenciam que estes ficam pouco a vontade ao lidar com
equipamentos digitais, pois queixam-se da ausência de formação
específica para essas atividades, o que atrapalha e inviabiliza o manuseio e
utilização autônoma destes recursos como acompanhamento pedagógico.
Mesmo após incluir um novo sistema, procedendo com a manutenção
dos equipamentos e da estruturação da conexão com a internet, por meio
de iniciativa da pesquisa, não existem profissionais capacitados para
auxiliar na utilização e prestar manutenção destes recursos no ambiente
do CEEJA, que por consequência acaba por subutilizar os equipamentos,
que apesar de possuir os recursos, não os explora em sua totalidade e o
possuírem o acompanhamento necessário.
Os docentes foram acompanhados durante a pesquisa, por meio
de conversas entre as aulas, orientações em encontros de formação em
ATPC e ATPL e formações específicas no contexto da pesquisa por conta
do envolvimento do pesquisador-participante na relação com o campo de
investigação. Houve receio ao conhecer o sistema, onde muitos docentes
declararam-se preocupados com sua pouca afinidade com os sistemas
digitais de informação. A formação para o trabalho com TDIC preocupa
boa parte dos docentes, pois um novo recurso fora apresentado e
imediatamente os profissionais da educação passaram a requerer
140
acompanhamento para a utilização do sistema em seu trabalho cotidiano,
portanto as necessidades foram criadas, porém houve a necessidade de
acompanhamento pedagógico e formação específica para a utilização
destes recursos.
Foram mobilizados durante a utilização do sistema de pesquisa
uma série de saberes envolvendo as TDIC, conhecimentos práticos para
uso dessa linguagem na utilização direta no cotidiano escolar que
precisaram ser apropriados pelos docentes e responsáveis envolvidos no
experimento. Desde procedimentos mais simples como acessar uma
página de web até necessidades mais complexas como manejar arquivos,
editar documentos online e moderar páginas de internet. Os docentes
foram acompanhados durante o uso dos recursos no contexto da
pesquisa, onde as necessidades vinham para viabilizar o trabalho
pedagógico com alunos e possibilitar a organização dos documentos e
necessidades da gestão escolar.
Durante todo o processo da pesquisa o diálogo foi o principal
meio de ação e reflexão, por meio da relação praxiológica e diaógica com
o campo, viabilizando práticas significativas para a implementação do
blog no CEEJA, tendo os esforços de implementação voltados para
viabilizar o experimento formativo de desenvolvimento da linguagem e
incentivo de práticas de leitura e escrita pelos alunos em ambiente digital
como foco da pesquisa, utilizando das TDIC como meio ou suporte para
a comunicação social e expressão por meio da linguagem em ambiente
digital utilizando destes recursos como meio para a emancipação e
participação social dos sujeitos nestes espaços. Aprender uma nova
linguagem e um novo suporte de comunicação como instrumento de
emancipação implica sua aplicação prática no cotidiano real, a reflexão
crítica acerca da função social do texto e da ação comunicativa, lidando
141
com estes recursos na sua comunicação cotidiana e social por meio do
letramento.
Durante o processo de implementação do blog na escola, foram
feitos acompanhamentos durante algumas Atividades de Trabalho
Pedagógico Coletivo (ATPC), durante o Planejamento Escolar, também
com alguns professores foram atendidos em pequenos grupos em
Atividades de Trabalho Pedagico Livre (ATPL), assim como foram
desenvolvidas atividades formativas abertas para professores e alunos com
foco em instrumentalizar os sujeitos para interação com o sistema do
blog.
A formação para uso do blog ocorreu por meio de oficinas de
utilização das tecnologias e sistemas, ocorrendo formações durante o
cotidiano, prestando auxílio nas salas de aula, sala dos professores, sala da
coordenação pedagógica ou na sala de leitura e biblioteca da escola, com
intenso acompanhamento formativo. Além do acompanhamento intenso
durante o cotidiano escolar, foram oferecidas três formações em sábados
letivos no CEEJA que contaram com participação de quase todos os
docentes, sendo um momento bastante rico de aproximação dos
professores com o blog e ao final das três formações foram produzidas
publicações pelos participantes. As formações em sábado letivo focaram
nas atividades docentes com o blog, abordando temáticas dos softwares
livres, o gerenciamento de documentos online e a publicação de
conteúdos na web.
A dinâmica de ação-reflexão-ação foi constante durante toda a
experiência de pesquisa, como na resolução de problemas constantes que
circundam a necessidade de fornecer acesso à arquivos e pastas, gerando
certa demanda de pedidos via troca de e-mails entre professores e
coordenação pedagógica, porém esta interação acabou por demandar
142
tempo e vigilância constante durante os primeiros meses de
implementação. Durante o processo de aprimoramento, esta necessidade
de autorização foi modificada para o sistema de autorização em pastas,
movendo os arquivos entre as pastas, com a autorização para os grupos
das equipes, tornando obsoleta a necessidade de pedir acesso a
determinado arquivo. Portanto, as autorizações foram organizadas neste
sistema de pastas, facilitando a gestão e garantindo a segurança das
informações. Nova reformulação ocorreu ao utilizar o sistema de grupos
de e-mails, facilitando o cadastro de novos e-mails para as equipes
pedagógicas, tornando a utilização do sistema mais prática e ágil, assim
como mais segura, evidenciando.
Para a publicação no Blog foi necessário sistematizar o processo
para viabilizar os conteúdos para serem divulgados amplamente na
internet. Inicialmente, os sujeitos dispostos a participar elaboram seus
conteúdos autorais de maneira autônoma, em seguida o docente
responsável fez o acompanhamento diretamente no computador ou em
rascunho em folha, dependendo das preferências do sujeito autor do
conteúdo em produção. Por conta do tempo hábil do cronograma de
pesquisa o processo de correção ficou mais ágil com foco nas questões
estruturais e lógicas para viabilizar a ampla divulgação das produções
autorais na internet, mas pelo problema do tempo nem sempre contou
com o acompanhamento do aluno autor no momento da correção para
viabilizar a publicação. Após o processo de correção, o sujeito depara-se
com o último procedimento, publicar. Todas as ações envolvendo o
experimento formativo puderam ser feitas de maneira autônoma pelo
próprio indivíduo, podendo ser auxiliado pela equipe pedagógica a
qualquer etapa do desenvolvimento.
143
Durante as atividades de planejamento escolar para o ano letivo
de 2019, foi elaborada uma apresentação para ingressar no painel de
controle do blog da escola., apresentou-se o caminho para utilizar o
sistema, as janelas, os procedimentos e conteúdos necessários para
elaborar uma publicação, após esta breve demonstração das
funcionalidades do sistema os professores tentaram ter acesso ao sistema
de maneira simultânea, o que causou sobrecarga na rede de internet da
escola, que ficou lenta, neste momento múltiplas dúvidas surgiram e o
acompanhamento necessitou ser mais gradativo durante o período de
investigação. Houve maior envolvimento dos docentes no final do ano,
após as formações promovidas pela pesquisa e da ampla visibilidade que o
blog obteve na internet e mediante aos órgãos responsáveis.
Muitas questões técnicas apareceram durante os momentos
formativos, como em torno de qual conta de e-mail utilizar, gerando
receio em prosseguir com a atividade de maneira autônoma, com medo
de utilizar o sistema, por não ter habilidade com o computador,
observada a pouca familiaridade com estes equipamentos em suas
tecnobiografias. Porém, após o trabalho pedagógico de acompanhamento
individualizado e atividades de formação com viés didático, estes mesmos
professores mostram-se menos receosos com a necessidade de utilizar um
sistema novo e desenvolver as atividades requeridas pela coordenação
pedagógica utilizando-se destes recursos. Desta maneira, criou-se um
vínculo entre a gerão de necessidades pelo uso desta ferramenta
enquanto um instrumento interno da instituição, com a atribuição de
sentido pelo uso da plataforma como ferramenta didática e útil ao
cotidiano escolar, sendo reconhecida pelos docentes como uma poderosa
ferramenta pedagógica de comunicação e produção de conteúdos
mediados pela linguagem.
144
Os professores se empenharam com mais afinco em conseguir
utilizar os recursos de gestão pedagógica, necessitando preencher tabelas e
fazer upload de arquivos no blog, visto que estas se apresentavam como
atividades obrigatórias para a organização escolar, já as atividades do
experimento formativo, foco da pesquisa, que são as postagens de alunos
e a produção de conteúdos ficou em segundo plano pelos docentes, pois
não tratava-se de atividade obrigatória ou elementar, ou mesmo por se
tratar de um recurso pedagógico em implementação. O envolvimento
aprofundado com as atividades didáticas do experimento formativo
contou com a cooperação de alguns docentes, que em grande parte
encaminhavam os alunos, mas nem sempre podiam acompanhar os
alunos em todo o processo de produção e publicação dos conteúdos
principalmente pelo problema do tempo hábil para tais acompanha-
mentos, visto a organização pelo acompanhamento individualizado do
CEEJA.
Ficou evidenciado a partir do experimento formativo e dos
encontros dialogados a necessidade formativa para o trabalho com as
TDIC em contextos pedagógicos e tempo para desenvolver as atividades
necessárias para as produções. Já do ponto de vista da implementação do
blog enquanto uma ferramenta didática atrelada ao ambiente escolar,
destacou-se também a necessidade de envolver mais professores no
processo de manutenção e publicação de conteúdos no blog “no sentido
de poder descentralizar um pouco a formão e o uso do blog” (PC,
Encontro Dialogado, 2019). Desta maneira, atrelou-se tempo, formação
com autonomia na utilização e apropriação pelos sujeitos, visto que como
o blog apresentou-se como um instrumento pedagógico a ser utilizado
pela escola, este depende do envolvimento de profissionais da educação
com formação específica e descentralizada, de maneira que não
145
sobrecarregue poucos indivíduos envolvidos com a proposta, mas que
esteja atrelada aos projetos da instituição com vistas a “ter a formação,
mas ter outros atores aí colaborando na formação, isso é fundamental”
(PC, Encontro Dialogado, 2019).
Quanto aos alunos e professores do CEEJA em que ocorreu a
pesquisa, a grande maioria possui mais de 40 anos de idade, sendo assim
fazem parte de uma populão que obtiveram acesso aos computadores e
a internet por volta dos anos 1990 em diante ou ainda continuam
afastados destes recursos digitais posto que “tem esse ponto da faixa etária
que influencia [...] mas eu acho que não é só isso, isso é só um princípio,
a gente tem também o interesse [...] a necessidade vai ajudando também
a formar esse gosto” (PC, Encontro Dialogado, 2019).
Partimos da perspectiva da preocupação em conhecer a
tecnobiografia dos sujeitos (BARTON; LEE, 2015) e as necessidades de
utilização significativa dos recursos, mais do que uma classificação etária
dos sujeitos, visto que mesmo jovens, como o caso de alguns sujeitos da
presente pesquisa, com pouco conhecimento e acesso a estes recursos e
idosos ou pessoas mais velhas, com mais desenvoltura com computadores
e internet, visto que em sua tecnobiografia existe maior proximidade com
estes recursos.
[...] os professores precisaram se apropriar ainda mais, então.. criou-se
uma necessidade do uso [...] um respaldo de formação, então alguns
professores que não.. que acabam se afastando um pouco da gestão,
dessa formação, eles tem mais dificuldade ou tem um pouco menos
de envolvimento [...] essa questão da autonomia ela é bem
importante pra poder fluir bem a apropriação da ferramenta [...]
amorosidade, essa proximidade com os colegas, pra poder construir
junto um conhecimento [...] formação, acho que isso ajuda a tirar as
146
ansiedades e ajuda na compreensão do uso (PC, Encontro Dialogado,
2019).
A partir desta perspectiva de valorização da história dos sujeitos e
de trabalho com suas tecnobiografias, o trabalho pedagógico parte do
sentido e da geração de necessidades nos sujeitos. Reconhecemos a
importância da apropriação pelos sujeitos das TDIC para um trabalho
pedagógico significativo, incorporando à tecnobiografia dos sujeitos o
uso destes recursos enquanto atividades de letramento, utilizando-se dos
recursos digitais em contextos reais, valorizando o envolvimento do
sujeito e do grupo nas atividades, construindo um conhecimento,
tomando a questão etária como um desafio em termos da tecnobiografia,
ou seja, quanto a proximidade deste com os recursos e não como um
impedimento, mas como um tratamento diferenciado e adequado às suas
etapas de desenvolvimento, valorizando sempre a autonomia do sujeito
neste processo enquanto interlocutor da aprendizagem. Portanto, o
trabalho com TDIC e com o blog na EJA está intimamente ligado a
formação específica do docente com estes recursos no campo em questão,
valorizando a autonomia, a aprendizagem significativa e a interação entre
os sujeitos neste processo.
A especificidade da EJA no trabalho pedagógico vai ao encontro
de reconhecer quem são esses sujeitos e suas histórias de vida, por isso a
valorização da autobiografia como elemento nuclear de nossa investigação
como emancipadora, pelo uso da palavra na realidade concreta, enquanto
um direito humano dos sujeitos já que “a linguagem, a palavra na vida
dele é fundamental e aí a gente vê nas publicações que a vida realmente
está ali nas palavras dele [...] a emancipação vem mesmo pela palavra,
pelo direito a palavra” (PC, Encontro Dialogado, 2019). Entendendo o
blog enquanto uma Biblioteca Popular Digital, compreendemos que é
147
direito dos sujeitos exercer o uso da palavra nestes espaços, com sentido,
com estímulo à autonomia “o aluno tem o blog ali pra ele poder se
manifestar, colocar seus pensamentos, colocar o que ele quer dizer, o que
ele está sentindo” (PC, Encontro Dialogado, 2019).
As publicações no blog são conteúdos listados em ordem
cronológica inversa, de fácil circulação e compartilhamento na web,
contendo no sistema como instrumentos de arquivamento tipo, categoria
e tags, que visam facilitar o acesso para os usuários na web via redes
sociais ou por sites de busca, desta maneira são produções facilmente
divulgadas e acessadas pelos interlocutores na internet, divulgando as
histórias e relatos de forma facilitada. Já a criação de páginas centra-se na
necessidade de acessar conteúdos fixos e de garantir o controle das
informações ali trabalhadas, incluindo senha em algumas, sendo
utilizadas para circular informações permanentes como horários,
documentos e materiais de estudo. A criação de publicações é uma
atividade relativamente simples, porém exige a familiaridade com a
interface e com o manuseio do sistema, portanto o layout do painel de
controle do blog é relativamente amigável, mas sem dispensar uma
apresentação didática da interface para os sujeitos envolvidos com o
experimento e um trabalho significativo de utilização pedagógica do blog.
148
Figura 4 - Print do Gráfico de Acessos no Blog
Fonte: Painel de Controle WordPress do Blog do CEEJA (2019)
O aumento percentual nos acessos diários no blog foi claro após o
início da implementação do experimento formativo em Junho de 2018.
A utilização do blog antes das estruturações para a pesquisa apresentava-
se em baixa, contando com uma média de 39 acessos diários no primeiro
ano de seu uso em 2016 e uma queda para 18 acessos diários em 2017,
acusando assim uma baixa significativa na quantidade de publicões e a
baixa nos acessos ao blog da escola. Já em 2018 a média de acessos diários
em Janeiro foi de 16 acessos e de 25 acessos diários em Maio, em Junho,
quando iniciamos a implementação dos procedimentos de pesquisa,
foram registrados 55 acesso diários, saltando para 73 acessos em Julho e
para 299 acessos diários em Agosto, quando retornaram as aulas e foi
implementada a modificão de layout, transformando toda a aparência e
funcionalidades do blog já existente. Em 2018 a média de acessos diários
foi de 83 e em 2019 foi de 142, demonstrando a alta nos acessos após a
iniciativa de pesquisa. Em 2019, durante a fase de publicação de
conteúdos pelos sujeitos, a média de acessos diários ao blog foi de 104, já
nos anos anteriores foi de 83 em 2018, quando o icio dos
procedimentos de pesquisa e de 18 acessos em 2017 e 39 em 2016. A
149
quantidade de acessos apresentou crescimento gradativo conforme o blog
apresentava certa frequência nas publicações autorais dos alunos,
identificando o período de publicação pelos sujeitos o momento de
maior acesso ao blog.
A equipe pedagógica da escola e os alunos que se envolveram
apresentaram-se motivados com a possibilidade de divulgar conteúdos na
internet após as resistências iniciais oriundas do estranhamento com o
sistema e com o conjunto de recursos mobilizados na pesquisa, portanto,
notou-se a quebra de paradigma ao encarar as TDIC com o objetivo de
publicar conteúdos na internet, possibilitando articular gêneros
discursivos com foco na participação social pela função social dos textos
que viabilizam a emancipação pela mediação com a linguagem. O espaço
do blog apresentou-se como um instrumento para reforçar a identidade
dos sujeitos e fortalecer a emancipação destes mediados pela linguagem,
utilizando-se dos gêneros discursivos, que se expunham em suas
autobiografias e davam testemunho de suas experiências a outros sujeitos,
desta maneira produziam textos significativos e reflexivos, preocupados
com a função social de suas produções, pretendendo motivar outras
pessoas e dar testemunho de suas histórias, preocupados não somente
com sua emancipação individual pela palavra, mas na função social da
linguagem como emancipadora no coletivo. O blog se mostrou, além de
um instrumento de valorização das vozes dos sujeitos, demonstrou-se
também um ambiente para reforçar suas identidades e fortalecer sua
emancipação e cooperação.
150
151
CONSIDERAÇÕES FINAIS
_______ ____________ ____________ _____________________ _______________ ____________ ____________ _______________ ____________ ___________ _____________________ _______________ ________
O experimento formativo proporcionou a aproximação dos
sujeitos com os suportes da linguagem digital, a motivação para a
produção textual de maneira autoral, auxiliou a reforçar a identidade
desses sujeitos, também promoveu o desenvolvimento da linguagem,
utilizando da leitura e da escrita em contextos reais e refletindo sobre a
função social de suas publicações, utilizando-se dos gêneros discursivos e
da linguagem como um direito humano que efetiva a sua emancipação
pela participação social e valorização de suas histórias de vida.
Os sujeitos declararam-se mais criteriosos ao escrever e
preocupados com a qualidade de suas produções, reconhecendo-se
enquanto autores, tendo como interlocutores seus leitores na internet e
comunidade em geral. Apresentou-se promissor ao incorporar as
necessidades cotidianas pedagógicas e de gestão da instituição escolar,
visto que inicialmente foram planejados procedimentos que viabilizavam
sua implementação nas atividades didáticas da escola de uma maneira
geral, servindo como um novo instrumento ou suporte de
desenvolvimento e aplicação prática da linguagem, com atividades
significativas de leitura e escrita em contextos reais, assim como
promover o acolhimento aos sujeitos da EJA nos ambientes digitais e
fortalecer suas identidades como maneira de emancipação dos sujeitos.
A partir da relação praxiológica da pesquisa com o campo de
investigação e com seus atores sociais, foi possível ampliar as perspectivas
das ações de pesquisa, atendendo a outras necessidades da escola na área
da gestão e organização escolar, como a emissão automática de
152
certificados das atividades extraclasse que ocorrem na instituição, o
controle de acervo e empréstimo de livros facilitado, a relação do fluxo de
alunos por disciplina, o armazenamento de provas e outros documentos
pedagógicos, o arquivamento de pautas e atas de ATPC e o
compartilhamento de materiais de estudo entre professores e alunos,
possibilitando o acesso descentralizado e a segurança dos documentos.
Pensou-se nesta investigação as TDIC como um suporte da
linguagem digital, ou seja, assim como o papel e a caneta, os
computadores e a internet promovem uma revolução nas possibilidades
de desenvolvimento humano e nas práticas situadas mediadas pela
linguagem, ampliam-se as possibilidades de leitura e escrita nestes
suportes digitais, modificando a maneira como os sujeitos fazem essas
práticas, interpretando essas nuances na forma do letramento digital.
Portanto, não bastou conhecer as ferramentas ou ter competência técnica
para sua utilização, mas foi necessário situar estes recursos na realidade
concreta, com objetivos significativos para os sujeitos de forma a atribuir
sentido às atividades com TDIC e gerar necessidades de emancipação
pela mediação com a linguagem nestes ambientes.
Cabe ao sujeito apropriar-se destes suportes digitais de linguagem
para resolver suas próprias questões e necessidades, para a sua própria
emancipação, e é função da escola criar as possibilidades e os ambientes
favoráveis a este desenvolvimento. Portanto, o blog revelou-se como um
poderoso suporte de linguagem humana e de educação, que representa
múltiplas possibilidades, cabendo a instituição e aos profissionais definir
os objetivos no trabalho pedagógico com essas suportes, reconhecendo as
TDIC não como recurso tecnológico apenas, mas como possibilidades
ampliadas de linguagem humana, trabalhando pedagogicamente. No
processo de implementação do blog como suporte de desenvolvimento e
153
de letramento para a emancipação, foram propostas atividades
significativas de leitura e escrita em ambiente digital, assim como uma
biblioteca popular, ou seja, o blog assumiu o papel de valorização das
vozes dos sujeitos em atividades de leitura e escrita em contextos reais e
ambientes digitais com o suporte do blog. Neste processo foi proposto o
enriquecimento das práticas pedagógicas que envolvem as tecnologias no
CEEJA para superar a visão utilitarista destes recursos.
O blog apresentou-se como um suporte de possibilidades
ampliadas de linguagem, pelo exercício do direito a linguagem e pela
emancipação, útil também como instrumento em múltiplas necessidades
da instituição escolar, servindo como veículo de comunicação,
instrumento de práticas pedagógicas e organizador do cotidiano escolar,
valorizando práticas autônomas mediadas pela linguagem. Foi possível
neste processo organizar todas as informações pertinentes à organização
escolar de maneira segura e facilitada, onde existem documentos
públicos, para acesso amplo na internet e arquivos de acesso restrito,
podendo ser utilizado por equipes ou pessoas específicas, garantindo a
integridade dos dados e a segurança das informações, com acesso
facilitado pelas equipes escolares.
A proposta didática de utilização do blog no ambiente escolar
buscou incentivar a produção de publicações autorais pelos sujeitos e a
valorização de suas vozes, assim como uma biblioteca popular, onde são
os próprios sujeitos que produzem conteúdos, só que em ambiente
digital, incentivando assim a verdadeira inclusão digital, por meio da
participação efetiva na Web 2.0 por meio de atividades de letramento, ou
seja, colaboração e efetiva utilização prática da linguagem com suporte
digital em contextos reais e em atividades significativas, que possibilitem
154
a emancipação pela mediação com a linguagem e a utilização dos gêneros
textuais com um direito dos sujeitos, em especial da autobiografia.
Assim, as atividades pedagógicas funcionaram com uma fluência
maior do que a prevista, pois inicialmente esperavam-se poucos sujeitos
participantes das publicações, mas durante o período de produção de
conteúdos outros sujeitos se motivaram, sendo ao todo 21 alunos
participantes e 25 publicações destes sujeitos. Desta maneira, a
participação dos sujeitos foi intensa e em nossa perspectiva demonstra a
viabilidade de incorporar o blog como um recurso estratégico de leitura e
escrita em ambiente digital que estimula o exercício do direito pela
palavra, a pronúncia de mundo e a emancipação pelo uso da linguagem,
em especial da autobiografia.
A experiência do blog incentivou não somente a prática de leitura
e escrita em ambientes digitais, como também favoreceu o contato dos
sujeitos com este novo suporte da linguagem, criando necessidades para o
uso socialmente situado do computador e quebrando o tabu do medo
com estes equipamentos, principalmente por conta do estranhamento
causado pela falta de familiaridade e pelo custo oneroso, o que torna os
computadores um equipamento financeiramente caro, tanto para sua
aquisição quanto para a sua manutenção.
Partindo da perspectiva de educação libertadora o blog como
uma biblioteca popular digital incentivou a participação efetiva na Web
2.0 assim como promoveu atividades de letramento que viabilizaram a
verdadeira inclusão digital e emancipação dos sujeitos pela mediação com
a linguagem e uso dos gêneros textuais como um direito. Os sujeitos
tornam-se ativos na internet e produtores de conteúdos inéditos e
autorais, atentos a função social dos textos, a seus interlocutores e
reconhecendo-se como autores e produtores de cultura, participando
155
legitimamente nesses novos espaços digitais com práticas de leitura e
escrita significativas, a partir de em uma pedagogia libertadora.
A prática pedagógica com TDIC na EJA promoveu ões
educativas de formação integral, possibilitando que os sujeitos se
apropriem destes recursos e ressignifiquem seu uso em seus próprios
contextos, aplicando assim essa nova linguagem humana para múltiplas
possibilidades de desenvolvimento que não só a capacitação técnica, mas
sim para o desenvolvimento da linguagem, o exercício do direito a
palavra, com inclusão digital, viabilizando atividades de emancipação, de
participação social e de pronúncia da realidade. Diante dessas
possibilidades pedagógicas a formação docente aparece como elemento
central para o bom aproveitamento destes recursos, onde não bastam
equipamentos de elevado valor financeiro, mas primeiramente se faz
preciso a familiarização com estes suportes de linguagem ao propor um
trabalho pedagógico com TDIC na escola.
Desse modo, a familiaridade do docente com as possibilidades
dos suportes digitais melhora seu uso didático. Alinhados com a proposta
de autonomia e de utilização pela instituição, atrelados as concepções
teóricas, optou-se por instrumentos gratuitos ou opensource, desta
maneira todos os procedimentos tomados no decorrer da pesquisa não
geraram custos à instituição e podem ser replicados em distintas
realidades, exigindo equipamentos com a manutenção, conexão com a
internet e profissionais com formação para utilização didática
significativa destes recursos.
O envolvimento afetivo com as produções pelos autores foi
norteador e é marcante, com postagens que apresentam forte carga
emocional e envolvimento afetivo pelos sujeitos, pois tratam-se de suas
próprias histórias, com relatos de superação, de situações precárias de
156
vida ou de mazelas que ocorreram. Com a experiência do blog os sujeitos
encontraram um espaço de direito para se expressar e compartilhar suas
vivências, utilizando da mediação com a linguagem como para se
expressar e comunicar as experiências vividas.
O envolvimento afetivo das postagens vai além das chamadas
impactantes oriundas dos relatos de vida e são numerosas as declarações
de afeto à escola e ao processo de escolarização como meio de melhoria
de vida e de emancipação, utilizando-se da linguagem para dar
testemulho aos interlocutores dos textos no blog. Desta maneira, as
publicações dos alunos tenderam a apresentar forte carga emocional e
histórias impactantes, relatando a partir dos enunciados dos próprios
sujeitos, pelo resgate de suas memórias,autobiografias das populações da
EJA como pessoas segregadas e em situação de vulnerabilidade social,
expondo situações de vulnerabilidade nos textos publicados e que
permitem o resgate de suas vivencias de exclusão social enquanto sujeitos
imerso nessas situações, vivenciando preconceitos e violências, com
relatos de experiências impactantes.
Apesar do forte teor emocional nos textos, os autores
apresentavam-se sempre motivados, desejando servir de motivação para
outras pessoas que estão afastadas da escola e que passam por mazelas
similares, atribuindo assim uma função motivacional aos textos, tomando
os autores como exemplos de inspiração a seus interlocutores, praticando
a própria emancipação pela linguagem e utilizando desta para incentivar
outros sujeitos neste processo.
157
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em Revista, Belo Horizonte, , v. 27, n. 1, p. 327-332, aAbr.il, 2011.
Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/edur/v27n1/v27n1a14.pdf.
Acesso em: 01 Jan. 2019.
SOUZA, João Paulo Francisco de. A relação professor-aluno e a
produção textual no CEEJA de Marília-SP: uma abordagem dialógica.
2018. 110 p. Tese (Doutorado em Educação) - UNESP, Marília,.2018.
TAKAHASHI, Tadao (org.). Sociedade da Informação no Brasil: livro
verde. Brasília: Ministério da Ciência e Tecnologia, 2000.
162
TAMURA, Ana Lúcia Hermosilla. Concepções de professores
alfabetizadores sobre leitura: implicações na formação leitora de seus
alunos. 2018. 128 p. Dissertação (Mestrado em Educação) - UNESP,
Marília, 2018.
VAIDERDORN, José (org.). O direito a ter direitos. Coleção polêmicas
do nosso tempo. Araraquara: Autores Associados, 2000.
VARGAS, P. G.; GOMES, M. F. C. Aprendizagem e desenvolvimento
de jovens e adultos: novas práticas sociais, novos sentidos. Educação
Pesquisa, São Paulo, v. 39, n. 2, p. 449-463, abr./jun. 2013.
VYGOTSKY, L. S. Pensamento e linguagem. Edição eletrônica: Ed.
Ridendo Castigat Mores, 2001. Disponível em:
http://www.ebooksbrasil.org/adobeebook/vigo.pdf. Acesso em: 13 out.
2017.
163
ANDICE I
Vozes dos sujeitos: Íntegra dos textos publicados no blog
_______ ____________ ____________ _____________________ _______________ __________________ ____________ _______________ ___________ ____________ _______________ ____________ ____________ ____________ _______________ ____________ ____________ _______________ ___________ _______________ ____________ _____________________ _____________________ ____________________
14/03/2019 Minha história de vida: da depressão ao sonho! (Edu)
Tinha 13 anos. Como toda criança tinha meus sonhos. Mais eles
foram indo embora com o passar do tempos. Meu sonho era ser jogador
profissional. Eu tinha talento. Sei que tinha, mas o que eu não tinha era
oportunidade de fazer teste e sair de Marília. Vinha de uma família muito
pobre. Não tinha nem o que comer.
Acabei entrando em depressão. Foi quando minha vida parou.
Abandonei a escola. Não saía mais de casa. Passava o dia inteiro dentro
do meu mundo, que era as quatro paredes do meu quarto.
Em 2014, abandonei tudo. Não saía mais de casa nem para jogar
bola. Só ficava preso dentro ali do meu mundo chamado quarto.
Passei quase 4 anos nessa vida até que em meados de 2018 eu
voltei a sair mais e ter uma vida social. Reencontrei amigos antigos e fiz
novas amizades.
Hoje, duas dessas novas amizades são tudo para mim. Não vivo
sem elas! Em 2019, fiz vários planos de vida para mim: terminar estudos,
tirar carta, trabalhar. Não consegui! Mais uma vez eu estava caindo na
depressão por vários fatores.
164
Exatamente hoje, dia 13 de março de 2019, eu me vejo diferente!
Só hoje: fui atrás de serviço, voltei a estudar e fui na Micro Pro para
começar um curso.
O que fica?
Tu pode ter perdido um sonho, mas de um sonho perdido vieram
vários outros sonhos para serem realizados.
14/03/2019 Testemunho real: da água pro vinho! (And)
Aluno do CEEJA reescreve sua própria história, acreditando que
é possível aliar a fé e o estudo para a superação!
Sou de [...], interior de São Paulo. Casado. Tenho 5 filhos.
Compartilhando com vocês, meus irmãos, um pouquinho da minha
transformação depois que tomei a decisão de entregar a minha vida pra
Jesus.
Escrevo para que essas palavras possam inspirar a vida de vocês
também. Para isso, gostaria de ressaltar aos irmãos o texto escrito abaixo,
que se trata de uma letra de Rap. Ainda está em construção e precisa de
alguns retoques.
Para isso, gostaria de ressaltar aos irmãos o texto escrito abaixo,
que se trata de uma letra de Rap. Ainda está em construção e precisa de
alguns retoques.
(Isso foi uma inspiração do amado Espírito Santo). Vejam a
minha música de Rap abaixo:
165
Da Água pro Vinho
Já algum tempo que o Espírito Santo vem me tocando pra que eu faça,
divulgue...
Um pingo do meu passado pra relatar o testemunho e fazer prova de ti.
Glorifica e exalta Deus que não esqueceu de mim!
O meu nome nesse momento nem importa tanto agora.
O que importa é que eu estou firmão não joguei minha vida fora.
Comecei a palhaçada aos 14; no cigarro e na maconha viajei!
Manchei o meu jarro de barro!
Cigarro era legal jogava fumaça pra cima.
Eu pensava que fazendo isso eu ia conquistar as minas.
No fundo da construção meu primeiro baseado.
Hoje lá é uma igreja e Deus seja louvado!
Depois disso ai já era, me afundei pra caminhar.
Queria ser mais do que eu era e por isso aprofundar.
Nessas indas e vindas atravessando caminho.
19 anos de idade conheci o Marquinho.
Ele que me encaminhou as primeiras drogas pra eu vender.
Achava que por causa do dinheiro também ia vencer.
Soube entrar na confusão com peito aberto pra morrer...
Que nem passou pela minha cabeça o perigo que ia correr.
166
Tava fortão, me achava, nada me abalava.
Os parceiros tavam morrendo, então me armei por nada.
Não por medo, mas sim por preocupação do passado.
Não tive maldade com ninguém, vou deixar bem explicado.
Entre essas matanças só conseguia ver caixão.
Morre meu parceiro Marquinho com tiro no coração!
Aquilo me abalou tanto nem consegui acreditar.
Não queria ser o próximo, então teria que matar.
Por causa de um amor forte que eu sustento até hoje em dia...
Tirei a vida de um cara que estava querendo a minha!
Mas sei que não justifica tirar vida de alguém.
Tava cego pelo diabo, pois de luz estava sem!
Então o diabo se aproveitou e de mim se apossou.
Comecei a usar drogas que você nunca falou.
Nada fazia sentido, não encontrava mais paz!
Nada andava pra frente, ao contrario e só pra traz!
Mais eu passando por aí, tava legal, só visado.
Polícia me investigando por tudo que eu fiz de errado.
Então por isso fui preso e de verdade eu cai!
Foi lá dentro que tive muito tempo pra refletir!
Comecei raciocinar porque passo esse tormento.
167
Eu não queria estar ali, diabo esta preso ali dentro!
Então fui tirado de lá pra que eu pudesse começar.
Correr atrás do meu pero, comecei a conectar.
Vai vendo, começa agora minha trajetória pro céu!
Participei de um Face a Face chamado Peniel.
Foi lá que Deus falou comigo e me deixou constrangido.
Agora sei o grande motivo que ainda estou vivo!
Minha família está mudada, tenho lar renovado!
Mas Deus provou que ele conduz sempre o desamparado!
Minha trajetória tem ainda muita coisa pra contar.
Hoje sou líder de célula, pode vim comprovar!
Creio que nunca é tarde pra voltar aos braços de Deus.
Reconstruir os caminhos como reconstruí os meus.
Me curou das loucuras minhas marcas estão nos meus punhos
Meu nome é And, vulgo Mir (apelido), e esse foi meu
testemunho pra quem quiser ver que é possível se transformar!
168
18/03/2019 Carta ao prefeito: rua escura! (Ine)
Acompanhem a Carta ao Prefeito produzida pela aluna do
CEEJA, solicitando melhorias ao poder público.
Marília, 13 de março de 2019.
Senhor prefeito,
Escrevo esta carta para solicitar que o senhor providencie uma
iluminação mais moderna e eficiente da nossa rua, uma vez que, na frente
de casa, as árvores são muito grandes, cobrindo a luz da rua, deixado-a
escura e perigosa.
Senhor prefeito, já teve dias em que a polícia abordou algumas
pessoas na porta de casa e ficamos preocupadas com medo de tiroteio,
pois nossos meninos haviam acabado de chegar em casa.
Moro na Rua P, no bairro JV.
Agradeço sua atenção,
Cordialmente!
Ine (nome completo).
169
19/03/2019 Recomeço de uma Nova Vida (Igo)
Leia o texto autobiográfico escrito pelo aluno Igo (nome
completo), aluno do CEEJA.
Sou Igo (nome completo), tenho 39 anos, moro em [...] desde
minha infância. Mas uma vez, em agosto de 2015, me perdi e caí na
dependência do álcool cruzado. Até essa data (23/08/2015) estava
completamente destruído. Segunda a bíblia, eu estava nas mãos do
inimigo, que é o diabo, chamado por muitos de satanás. Esse inimigo
tinha tirado minha falia novamente, me deixando em estado de rua, às
vezes ficava dias sem tomar banho.
Para não encompridar esse diálogo, falava para os amigos que
“minha água não era mais água, era o álcool e minha comida era
'cruzado' com o álcool”, para quem não sabe, a droga.
Para quem não entende esse tipo de redação que é um pedacinho
de minha vida, a esse pequeno texto chamamos autobiografia, na qual
gostaria que entendessem que a dependência cruzada vem a ser o uso de
álcool e drogas.
Primeiramente é Deus. Ele sempre deve estar em primeiro lugar
em nossas vidas, depois Jesus Cristo e o Espírito Santo, que encontrei na
igreja Bola de Neve. Depois dessa ajuda divina vem os médicos,
psiquiatras, psicólogos, terapeutas e hoje, também meus professores.
Também tive a ajuda de grupos como Amor Exigente (AA) e Narcóticos
Anônimos (NA).
170
Assim, em 24 de agosto de 2015, Deus me resgatou, mais uma
vez. Entre os anos de 2015 e 2016 foram os melhores anos de minha
vida. Em 2017, tive outra recaída, que durou mais ou menos 7 meses.
Mas hoje, estou limpo há 3 meses, frequento a igreja, faço grupo
de terapia no Centro POP e voltei para a escola. Já concluí a disciplina de
Arte, no Ensino Fundamental e estou terminando a matéria de Língua
Portuguesa.
Considero que voltar a estudar foi muito importante em minha
vida, aprender e ganhar novos conhecimentos para sonhar com um
futuro diferente, no qual pretendo terminar os estudos, resgatar minha
família, conseguir um emprego que me de dignidade e buscar coisas boas
para minha vida. Sempre com Deus em primeiro lugar.
Gostaria também, de agradecer o trabalho da igreja Bola de Neve,
na qual sou batizado com as águas do Espírito Santo, eles me ensinaram
o caminho de Deus, buscando uma vida diferente.
E, para quem não sabe, o poder da oração em joelhos resgata
qualquer pessoa.
Amém!
Autoria: Igo - aluno do CEEJA.
Texto produzido durante as aulas de língua portuguesa, na escola.
Créditos da imagem: Sebastião Salgado.
171
20/03/2019 Arrependimento não mata, mas ensina a viver! (Mar)
Em 2011, meu pai me tirou de uma escola pública e me colocou
em uma escola particular. Eu tentei me adaptar com os novos alunos,
mas era bem difícil pois eu morava com minha e e meus irmãos em
uma comunidade e, chegando na nova escola, os alunos faziam diferença
de mim e eu o gostava disso.
Fazia de tudo pro meu pai me tirar daquela escola onde todos os
alunos não gostavam de mim por eu morar em uma comunidade. Fiz de
tudo pra ser expulsa daquela escola e quando passei para a oitava série eu
cheguei na escola e pedi uma carta de transferência. Voltei à minha
antiga escola e aos meus verdadeiros “amigos”. Mas foi aí que me
enganei, pois naquele mesmo ano eu comecei a perder o interesse pelos
estudos. A partir daí, meu pai - já decepcionado comigo - não quis mais
saber e deixou que vida me mostrasse o que realmente ela queria de mim.
Com 15 anos, já distante do meu pai, parei de estudar e só queria
sair com as amigas; pensava somente em curtir; Dois anos mais tarde, eu
comecei a mexer com contravenções, o que custou minha liberdade aos
18. Esse mundo de ilusões acabou. Quando fui cair na real, acordar pra
vida, eu estava atrás das grades e quem esteve do meu lado foi somente
minha mãe.
Eu caí na real que nunca precisei de nada daquilo uma vez eu
tinha de tudo e quem não deu valor foi eu. Todos ao meu redor, que
diziam ser meus amigos, todos esses se afastaram de mim. Nesse
momento da minha vida eu tive oito meses pra refletir sobre tudo que se
passou e, se, realmente era essa vida que eu queria pra mim. E a resposta
172
foi que jamais eu daria aquele sofrimento à minha mãe novamente e a
mim mesma!
Ainda atrás das grades, eu comecei a estudar novamente na
intenção de sair de lá e ser uma nova pessoa. Comecei a trabalhar
também já que não era sempre que minha mãe podia me visitar. Mas
meu tempo não permitiu que eu terminasse meus estudos e graças a
Deus, com oito meses, eu saí daquele inferno!
Hoje, estou fazendo o que eu posso para terminar meus estudos
aqui no CEEJA (antigo CEESMA) e já estou acabando para buscar um
emprego e recomeçar a minha vida honestamente. Nunca é tarde pra
recomeçar do zero! E vou recomeçar quantas vezes for preciso! Já passei
por muitas coisas na minha vida. Mesmo sendo bem nova. Isso só me
deixa cada vez mais madura. Como diz o ditado: é errando que se
aprende! E com cada erro meu, eu estou sempre aprendendo.
Se eu tivesse escutado meus pais tudo seria mais fácil. Nossos pais
sabem o que é melhor para nós. Hoje, eu e meu pai não nos falamos. Eu
espero que um dia ele entenda o meu lado assim como hoje eu entendi o
dele. Mas sei que um dia ele vai me perdoar, pois o arrependimento que
ele esperou que eu sentisse... eu estou vivendo.
Autoria: Aluna Carla (pseudônimo), estudante do CEEJA.
Texto produzido na Biblioteca do CEEJA por meio do Projeto
Ubu!
173
26/03/2019 Denuncie a Violência Contra as Mulheres! Disque 180!
(Ama/Lil)
Confira o trabalho feito por alunas do CEEJA sobre denúncia de
violência contra as mulheres!
A produção foi feita com o uso de software livre, utilizando a versão mais
atual do sistema operacional Linux Mint e o programa GIMP para
edição de imagens.
174
02/04/2019 Homofobia Não! (Dan)
Trabalho de edição de imagem realizado por aluno do CEEJA é destaque
nas atividades pedagógicas produzidas no primeiro trimestre de 2019! A
atividade traz à tona a reflexão e o combate contra quaisquer atos de
discriminação contra homossexual ou contra a homossexualidade.
Segundo o blog Geledes: A expressão homofobia e sua legítima
significação têm sido alvo de muitos debates entre os estudiosos do
assunto. Trata-se de um neologismo formado por dois radicais gregos
(homo=igual + phobia=medo). A sua origem tem como marco inicial o
ano de 1971, quando foi cunhado pelo psicólogo norte-americano
George Weinberg em seu livro “Society and the Healthy Homosexual”
11/04/2019 Crônica: Bia e suas histórias (Bia)
Por Morena Flor - aluna do CEEJA de Marília
Bia se casou com apenas 13 anos. Seus pais sempre falavam que mulher
nasceu pra casar, ter filhos e cozinhar. Seu pai agredia sua mãe
verbalmente e fisicamente. Estudou de tanto a sua madrinha brigar com
ele. Estudou até os 12 anos. Fugiu de casa para casar pensando em ser
feliz e voltar a estudar. Mas a história se repetiu. O ex-marido lhe batia e
maltratava. Dizia que lugar de mulher é na cozinha mesmo. E
trabalhando na roça para ter filhos saudáveis.
175
Sofreu muito. Era espancada quase todos os dias. Trabalhava feito escrava
na roça em casa. A vida se resumia em tristeza. Levou choque. Achou que
iria morrer. Foram 29 anos de sofrimentos, se sentindo a pior pessoa do
mundo. Sentia vontade de morrer. Não queria mais continuar. Um belo
dia engravidou.
estava com 18 anos, ai pensou: "agora vou ser feliz, vou ter uma
pessoinha para me fazer feliz!". Enganou-se! Foi mais uma pessoa para
sofrer do seu lado. Naquele tempo, as mulheres se casavam para ficar
casadas. Ela teve mais 3 filhos. Foi abusada após um dos seus partos,
ainda com pontos!
Mas Bia, mesmo se sentindo a última pessoa do mundo, amava seus
filhos mais que tudo. Quando já não tinha mais esperança, resolveu se
separar! Viveu um dia após o outro. Sem nenhuma expectativa ou sonhos
ela disse a si mesma: "vou terminar de criar meus filhos e esperar a morte
chegar, não tenho mais porque viver!" Mas Deus não desampara um filho
seu, mesmo que esse filho tenha pouca fé.
Para sustentar seus filhos foi pedir emprego numa clínica de odontologia.
Começou a trabalhar um dia por semana como faxineira. Os dias foram
correndo e passou a ir todos os dias. De faxineira passou a ser amiga da
dona. Foram vários anos assim. Para ser mais exato foram cinco anos!
Finalmente, ela saiu da periferia e sua amiga se tornou um anjo em sua
vida. Ajudou-a a ter sua casa própria e a incentivou a voltar a estudar.
Sabe... Bia nunca imaginou que voltaria a sorrir, que iria fazer planos e
voltar a viver. Seus filhos a olha com orgulho. Ouvir "você vai conseguir"
é maravilhoso. Nunca foi tarde demais para recomeçar, nem para sonhar.
Hoje, ela pensa que vai fazer uma faculdade e ver seus filhos assistindo ela
receber o diploma de pedagogia.
176
-la receber sua vitória é demais! Para Deus nada é impossível. Na vida,
temos também sempre um pouco de ajuda de alguns anjos da guarda.
Não podemos nos esquecer, é logico, que depende nós também querer
aos poucos mudar nossa história.
Caro leitor, prometo voltar aqui para contar pra vocês o restante da
historia de Bia.
18/04/2019 A luta continua! (Any)
Por Any (apelido) - relato de experiência vivida
Durante a nossa roda de conversa sobre A Mulher no Século XXI, que foi
muito importante, ficamos sabendo de vários assuntos, por exemplo,
sobre o feminismo, as desigualdades humanas, que existem até os dias de
hoje, e a necessidade de lutar, pela deficiência do sistema, o que nos levou
a tratarmos sobre as revoluções sociais que aconteceram ao longo da
história em todos os países.
No Brasil, no ano de 1964, o governo reunia o povo, oferecendo
passagens de graça para ir para ao Rio de Janeiro para participar de seus
comícios que realizavam, prometendo a reforma agrária e muitas outras
promessas de influência socialista da antiga União Soviética. Ouve
grande confusão na cabeça do povo mais humilde, que com grande
esperança sonhava por vida melhor, mas que só ficou na promessa.
Me lembro desta época, pois meu pai tinha muita esperança nessa
reforma agrária. Eu era pequena, mas já vivia este tempo. Nós éramos
uma família muito pobre e o meu pai ia nas reuniões da reforma agrária
177
para ver se conseguia um pedacinho de terra para construir uma casa para
nós morarmos, já que não tínhamos condições de comprar. Éramos em
onze irmãos e só meu pai quem trabalhava. Os meus irmãos não
trabalhavam, porque estavam alistados no exército e as firmas não
empregavam quem estava alistado. Foi uma fase muito difícil.
Nesse período, existiam dois projetos em disputa, o da reforma agrária e
os contrários. Depois de muitas promessas do governo, começaram as
greves nas fábricas, roubo a bancos e manifestações dos estudantes que
queriam a reforma agrária. A população contrária começou também a se
manifestar contra tudo isto. Houve a Marcha da Família com o slogan
"Deus para a Liberdade", propondo libertar o Brasil das ideias comunista
por parte do governo da época.
Foi então que as Forças Armadas tomaram o poder. Houve muitas
prisões, torturas e mortes. Nesta época, as mulheres sofreram muitos
preconceitos e medo de mandar seus filhos para a escola.
Mais tarde, na minha época, foi mais fácil. Eu trabalhava fora, casei, tive
meus filhos, mandava eles para a escola sem tanta preocupação e medo.
Ainda hoje, a nossa luta continua para que possamos ter nossos direitos
iguais, sem preconceito algum. A nossa luta continua!
23/04/2019 História de vida, força e superação! (Edi)
Por Edi (nome completo) - breve autobiografia
Em 24 de julho de 2013, às nove horas da manhã, estava parada com
minha moto embaixo do pontilhão do Cemitério das Orqdeas quando,
178
de repente, uma caminhonete S10 virou em cima de mim. No momento
do impacto fui arremessada para o outro lado da rua. Tive várias fraturas
expostas. Fui socorrida para o HC - Hospital das Clínicas - onde, logo,
fui para o Centro Cirúrgico e fiz uma cirurgia para colocar um fixador
interno. Fiquei internada por 15 dias. Só que, no Hospital São Francisco,
conheci um anjo que cuidou de mim - um enfermeiro que hoje é meu
esposo.
Passei por várias internações e sete cirurgias. O mais importante para
mim, com tudo que passei, foi poder acreditar que tudo é possível e que
quando usamos nossa fé podemos ver o impossível acontecer. Hoje em
dia, todas às vezes que tenho a oportunidade de contar este meu
testemunho, eu conto para as pessoas, pois sei que através dessa minha
historia outras pessoas podem acreditar que tudo tem jeito sim!
Hoje, cursando a 3ª série do Ensino Médio, no CEEJA, vejo que valeu à
pena não desistir dos estudos, embora as dificuldades me abatessem. Em
breve pretendo fazer o Curso Técnico de Cuidador de Idosos e prosseguir
firme e forte.
26/04/2019 Acolhimento, Vida e Sonhos! (João)
Carta Aberta aos Professores do CEEJA, por João (nome completo)
Marília, 16 de Abril de 2019
Com Deus, é vida que segue”. Tive um histórico de vida triste e feliz ao
mesmo tempo, sempre dividido entre o trabalho que mais gostava, que
era ser motorista profissional e minha família. Minhas duas paixões.
179
Em todas as minhas dificuldades minha aliada era minha esposa, que
sempre esteve ao meu lado, mas no início de 2012 ela veio a falecer. Foi
vítima de um câncer, que a manteve por um ano em grande sofrimento e,
em mim, trouxe uma revolta muito grande por se tratar de uma
companheira muito boa e também muito apaixonada.
Mas, em meio à dor, às vezes a vida nos sorri novamente e, me sorriso
veio quando fiquei sabendo dessa escola. No CEEJA, fui bem acolhido
pelos professores e professoras, voltei a estudar, pois conhecimentos abre
novos caminhos, horizontes e me possibilitou o direito de sonhar
novamente.
Hoje, com a saúde regularizada e terminando o ensino médio, vejo que a
escola me ajudou muito em minha vida e, hoje, me permito acreditar em
novos caminhos e novos sonhos permeiam minha mente. Entrar em uma
faculdade e alcançar novos objetivos. Pois sempre é tempo de aprender e
a voltar a viver, quando a vida nos sorri novamente.
O meu muito obrigado aos professores que me acolheram e me
incentivaram, porque a Paciência Acalma a Alma.
Grato, João (nome completo) - aluno do CEEJA.
29/04/2019 O estudo faz falta em nossa vida? (Vid)
Acompanhe o relato de experiência de aluno do CEEJA em que mostra a
relação entre estudo, trabalho e projeto de vida!
Por Vid
180
Moro em Marília, sou de uma família simples e humilde. Somos um
total de cinco irmãos, pai e mãe. Minha mãe, há muito tempo,
trabalhava de doméstica. Meu pai trabalhava na Sasazaki. Iniciei os
estudos no parque e depois normalmente na escola. Não era um dos
melhores alunos na sala de aula, mas seguia normalmente meus estudos,
até que as dificuldades da vida começaram a interferir na minha
formação. Minha mãe parou de trabalhar para se dedicar aos cuidados de
casa, filhos etc...
Meu pai trabalhou durante 16 anos na empresa, mas como ele não tinha
muito estudo, acabou perdendo espaço para tecnologia. Novas máquinas
chegando, cada vez mais substituindo a mão de obra e acabou sendo
dispensado do serviço. Com o acerto veio a realização da casa própria,
mas as contas não pararam de chegar. Como o único filho homem,
comecei a me dedicar mais em fazer bicos e trabalhar, deixando de lado
os estudos. Naquele momento talvez eu estava ajudando minha família,
mas não imaginava o quanto faria falta para mim no futuro. Por isso
larguei os estudos para trabalhar.
Em 2008 comecei a trabalhar na Yoki Alimentos, primeiro serviço com
registro. Logo nos primeiros meses, me destaquei e subi de cargo, mas
comecei a perceber que devido a falta do diploma de conclusão eu perdia
algumas oportunidades. Tinha experiência e competência, mas muitas
vezes isso não vale se não tivermos o papel na mão (diploma), então me
matriculei para poder terminar.
Conforme o passar do tempo vai ficando mais difícil, pois vamos
construindo família. No meu caso fazia muito hora-extra, pois trabalhava
com períodos de safra e tinha que dar conta. Isso veio me incomodando
muito e em muitas vezes me sinto até envergonhado por não ter
terminado os estudos. A empresa fechou e logo fui contratado em outra
181
companhia do mesmo seguimento e vi que a mesma história se repetia.
Nesse caso comecei como auxiliar de produção.
Subi ao cargo de líder e havia o interesse de me promover a coordenador,
mas esbarrei nos estudos novamente. Devido ao meu desempenho e
comprometimento consegui a promoção de coordenador, mas, é claro,
que eu não me sentia bem pois sei que os estudos é algo muito
importante e que está faltando em minha vida tanto profissional quanto
pessoal.
Participei de auditorias, onde ajudei a implantar procedimentos,
planilhas, formulários, programas, equipes de segurança do produto, mas
a falta dos estudos impedia que meu nome aparecesse como integrante de
algumas atividades, pois alguns órgãos exigiam que tivesse a formação.
Hoje, a empresa parou as atividades e estou me dedicando muito a
terminar os estudos, pois sei que somente minha experiência e vontade
não são suficientes. Por mais difícil que seja, é imprescindível se esforçar
para terminar os estudos. Incentivar os filhos, pois o estudo é a base de
tudo. Minha experiência no ramo da alimentação, graças a Deus, não
deixou que eu ficasse sem emprego, mas sabemos que nem sempre é
assim, pois uma pessoa sem estudo e sem nenhuma experiência com
certeza vai ter um pouco de dificuldade para entrar em algumas empresas.
Portanto, mesmo satisfeito com meu desempenho profissional, com as
conquistas que consegui ao longo da vida, sei que só vou me satisfazer
comigo mesmo quando tiver com meu diploma na mão e assim seguir
estudando e me aperfeiçoando profissionalmente e pessoalmente.
182
03/05/2019 Poderes e Sonhos: uma autobiografia (Parte II) (Igo)
Por Igo - estudante do CEEJA
Escrevo esta autobiografia sobre mais um pedacinho do que aconteceu na
minha vida nesses últimos anos. Do dia 24 de agosto de 2015 a 24 de
dezembro de 2016 eu estava completamente limpo do álcool cruzado. Já
havia completado a quinta série na EJA e faria uma viagem, por meio da
secretaria municipal da educação, junto aos colegas da escola,
completando o que seria a nossa última atividade escolar.
Porém, o poder público da época cancelou a viagem, assim não autorizou
esta última atividade da escola, cessando os recursos necessários para o
encontro final da turma. Como consequência de não alcançar meus
planos de viajar, fiquei desanimado e pensei que podia apenas tomar uma
cerveja em um posto de gasolina e, naquela manhã, de 24 de Dezembro
de 2016, lendo um jornal, tomei uma latinha.
Este primeiro gole foi o suficiente para eu ter uma recaída cruzada.
Tenho a dizer que as decisões de qualquer autoridade pode influenciar a
vida pessoal de todos nós. Aqueles que têm poderes em suas mãos,
podem abalar os sonhos de uma pessoa. Esta minha recaída foi muito
forte e me levou a perder a minha família novamente, assim como meu
trabalho, meu estudo e o amor de minha vida.
Gostaria de dizer, que é importante que as autoridades, independente dos
cargos que ocupam, precisam entender que mesmo não conhecendo uma
pessoa e não a conhecendo, podem acabar com os sonhos de uma pessoa.
Portanto, é preciso que se mantenham atentas em suas decisões e
lembrem-se sempre de cada um de nós.
183
Que Deus abençoe as autoridades em suas escolhas durante suas vidas
públicas, com conhecimento e sabedoria. Hoje, recuperando de muitas
dificuldades, vejo que meu sonho não acabou.
23/05/2019 CEEJA: A Escola do Bem Viver! (João)
Por João (nome completo) - aluno do grêmio estudantil do CEEJA
A Importância do Acolhimento aos Alunos Jovens e Adultos
Eu João (nome completo), quando soube que existia uma Escola, que
daria uma nova chance a voltar a estudar na terceira idade e acabar de
completar os sonhos de voltar a estudar e ter mais conhecimentos
atualizados no meu dia a dia.
Lógico tive um despertar muito abençoado na minha vida. Primeiro
respirei fundo. Fiquei muito contente. Conversei com Deus em oração.
Fui tendo um despertar e sendo motivado a procurar a escola. Moro na
Vila América Quatro. Tomei o ônibus e vim saber na escola. O que eu
tinha que fazer era providenciar a documentação.
Fui muito bem recebido pelo professor João Paulo. Me abraçou e me
acolheu com muito respeito e carinho. Me levou na secretaria. Todos me
trataram com muita amorosidade. Fiquei muito feliz pela linda recepção
que tive. Isso me motivou a correr. A buscar toda documentação e
retomar meus sonhos. Comecei pelo ensino fundamental.
Ali fui muito bem acolhido pela professora Maria (nome completo), da
disciplina de Ciências. Tenho imenso respeito e carinho por ela por me
184
acolher carinhosamente. Me motivou bastante e me disse que eu
conseguiria. Isso me cativou mais ainda. Hoje já estou no ensino médio!
Agradeço a Deus, sempre, e a todos da escola que acolhem. Todos os
alunos: jovens,adultos, idosos... me motivam a viver com felicidade!
Agradeço todos: portaria, limpeza, cozinha abençoada, professoras,
professores, seguranças, enfim... um convívio abençoado! Por Deus, pela
minha família, pela força e paciência comigo, pelos amigos e amigas que
sempre estão ao meu lado, e eu ao lado deles!
Sim, agradeço a Deus por tudo! Por poder estar realizando mais um
sonho em minha vida! Amém! "A paciência acalma a alma". Somos feliz.
Nesta escola CEEJA (nome da escola), somos todos abeoados. Amém.
Essa é a "Escola do Bem Viver".
08/06/2019 O mundo da sabedoria (Nio)
Por Nio (nome completo) - Aluno Concluinte do Ensino Médio
Aprendi a dizer não para o mundo
e depois depois dizer sim para Jesus!
Meu nome é Nio (nome completo), tenho 45 anos, moro em Marília, na
Vila Barros. Eu tive uma boa infância. Estudei no (nome da escola) até os
16 anos, mas depois disso eu comecei a ver o mundo com outros olhos.
Comecei a delinquir, roubar e usar drogas.
Resolvi trabalhar, mas por causa das drogas eu ficava pouco tempo nos
empregos. E foram vários os empregos que tive. Ao passar da maioridade
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eu fui preso, foi muito difícil, pois eu tinha vários processos. Fiquei nove
anos preso.
Graças a Deus saí e conheci minha esposa, que foi muito bom para mim.
Tive dois filhos e então refleti e vi que tinha que parar com as drogas e
com o crime. E disse sim para Jesus!
Hoje, graças a Deus, resolvi voltar para a escola. Encontrei o CEEJA,
uma escola muito boa e acolhedora. Com professores que são um amor
de pessoa, humildes, que tratam todos com muito carinho, amizade e
respeito. Sem acepção de pessoas. Eu amei essa escola!
Hoje termino o Ensino Médio e me inscrevi em um novo curso: técnico
em contabilidade. A minha vida decolou com meu novo estilo de vida e
com Jesus. Estudar no CEEJA foi tudo de bom para mim.
Se você que acha que não consegue terminar seus estudos está aqui a sua
chance: Escola CEEJA, que está de portas abertas para todos os jovens e
adultos. Não perca esta chance! Esta escola me ajudou a ver e entrar no
mundo do estudo e da sabedoria. Jesus ama todos vocês.
Agradeço a todos! À diretora, ao coordenador, aos estagiários, aos
professores e às professoras, por esta grande ajuda que me deram. Deixo
aqui o meu muito obrigado a todos.
Com muito carinho, Nio (nome completo).
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17/07/2019 Minha trajetória de vida (Ide)
Confira o texto da Aluna egressa do CEEJA e atualmente aluna do curso
de Pedagogia da UNESP.
Relato aqui parte da minha vida, da minha trajetória e como tive o
grande privilégio de estar aqui hoje, atualmente estou cursando o 4º ano
de Pedagogia na Unesp, após estudar no CEEJA e no CAUM
Cursinho Alternativo da UNESP.
Perdi minha mãe muito cedo e fui criada por parentes,
consequentemente tive que começar a trabalhar com doze anos em casa
de família nos afazeres domésticos, para ajudar com as despesas da casa da
família que me acolheu quando eu tinha apenas 6 anos de idade após a
morte da minha mãe.
Naquela época podia se estudar a noite, mas muitas vezes batia o cansaço
e acabava dormindo na aula, isso passou a se repetir diariamente até que
finalmente desisti de continuar os estudos, apesar de gostar tanto de
estudar.
Não culpo a família que me acolheu, eram pessoas muito simples, com
um poder aquisitivo muito baixo, tinham filhos pequenos e a situação
financeira deles era bem difícil.
Me casei bem jovem, tive meus filhos e minha vida se resumia em cuidar
dos filhos e das tarefas domésticas.
Os anos se passaram, meus filhos cresceram , apesar de eu ter estudado
bem pouco, sempre os incentivei para que estudassem e tivessem um vida
diferente da minha. Acabei me separando e retomando meus estudos.
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A minha vinda de Bauru para Marília me fez acreditar em mim
novamente, precisava trabalhar e consequentemente continuar meus
estudos.
Minha filha me falou e me orientou sobre o CEEJA, o que me deixou
bastante ansiosa, fui fazer minha matrícula e logo já comecei a estudar,
foram dias de descobertas e curiosidades a cada conteúdo que me era
apresentado, recomecei de onde havia parado, no 5º ano do Ensino
Fundamental, terminando o Ensino Fundamental logo na sequencia
comecei o Ensino Médio.
Não vou dizer que não houve dificuldades, houveram sim e foram
muitas, no entanto, continuei persistente no intuito de terminar meus
estudos. Fiz todas as disciplinas e concluí.
Na verdade fiquei um pouco triste, pois gostaria de poder continuar
estudando mais, contei isto para minha filha e ela me sugeriu o CAUM
cursinho alternativo da Unesp, no qual fui prazerosamente me
matricular, conclui seis meses de cursinho e, em seguida, no mesmo ano,
prestei o vestibular.
Fruto de muito amor, muito empenho e dedicação, passei no curso de
Pedagogia da Unesp e estou caminhando para o final, termino este ano.
Não poderia deixar de agradecer a todos os professores que prontamente
me ajudaram, por terem acreditado em mim e me ensinado com tanto
empenho!
Minha experiência ao ingressar na Unesp no ano de 2016 foi cheia de
surpresas, sendo a primeira delas é que eu era uma caloura, para mim era
tudo novidade, o campus, os prédios, os alunos, a biblioteca, as salas de
aula e o professores. Fiquei impressionada com tantos saberes que
transmitiam e o quanto são tão cultos.
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Conheci pessoas maravilhosas que me acolheram e me incentivaram, que
apesar da diferença de idade me aceitaram e inclusive me sinto meio que
mãe de alguns deles.
No decorrer dos anos passei por várias dificuldades, no entanto me
mantive firme e esperançosa em conseguir concluir minha tão sonhada
graduação e neste momento em fase de conclusão do curso estou ansiosa,
mas é uma ansiedade boa, aquela com gostinho de vitória. Como uma
criança ávida pela chegada do natal para receber seu sonhado presente.
26/09/2019 Ginástica Laboral em um Sábado Criativo (João)
Agradecimento pelas atividades realizadas no CEEJA
Agradecimento ao fisioterapeuta Dr.Luc; à professora Âng e à professora
Que.
Nós, convidados , alunos, professores do CEEJA e comunidade em geral,
agradecemos a presença do Fisioterapeuta Luc, na roda de conversa no
dia 17 de Agosto de 2019 onde contemplamos sua palestra , que passou
dicas valiosas sobre a Ginástica Laboral.
A proposta trouxe importantes reflexões que trazem benefícios tanto para
a saúde física, quanto para a mental, prevenindo o sedentarismo,
minimizando as tensões adquiridas ao longo do dia e prevenindo lesões
por movimentos específicos com foco no benefício mental e no alívio
do estresse.
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A ideia é que a ginástica laboral faça parte da vida de todos os cidadãos
tanto na sua vida profissional quanto na pessoal.
Por: Joãomembro do Grêmio Estudantil do CEEJA
09/10/2019 Aprendendo a Plantar Maracujá (Dem)
Confira abaixo a reflexão feita pelo aluno Dem do CEEJA na atividade
do Mutirão de Plantio de Maracujá no Projeto Horta Literária:
O maracujá deve ser plantado colocando a semente na terra e nunca
deixar faltar água.”
– Dem
Confira abaixo o vídeo do autor Demécio sobre seu amor pelo futebol e
pelo seu time, feito em 2013 e intitulado Dem Ceni: <https://youtu.be/>
24/10/2019 Aos mestres, com carinho! Por aluna Jan (nome completo).
(Jan)
Tive que interromper os meus estudos muito cedo, por motivo de
trabalho. Retornei aos meus 18 anos à escola, fiz o Ensino Fundamental e
agora depois de muitos anos vou precisar de um curso na área em que eu
trabalho, me faltou o Ensino Médio.
Voltei para a escola CEEJA e para a minha surpresa aquele Ensino
Fundamental que eu havia feito não tinha validade, então tive que
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recomeçar no Ensino Fundamental. Comecei no dia 02/05/2019, só que
a minha disponibilidade foi de um dia sim e outro não, ou seja, em uma
semana nos dias segunda, quarta e sexta-feira, e na outra terça e quinta-
feira apenas e assim foram meus dias até a conclusão.
Do mesmo modo foi o Ensino Médio, que foi a mesma disponibilidade,
nos mesmos dias da semana. Comecei em uma semana bem fria, mais ou
menos, antes das férias e assim segui até terminar meu Ensino Médio.
Entre Ensino Fundamental e Médio lá se foram muitas leituras, contas,
oficinas e aprendizados.
No início tive um pouco de receio sobre como seria voltar a escola depois
de muitos anos, mas para a minha surpresa tive uma acolhida
maravilhosa, desde a secretaria, coordenação e professores. Tudo muito
perfeito. Sempre me ajudando nas minhas maiores dificuldades e olha
que não foram poucas! Mas todos com muita sutileza me ajudaram
muito. Confesso que sou um pouco chata na questão de alimentação,
mas tudo teria que ser perfeito, inclusive a prova da merenda.
Obrigado CEEJA pela oportunidade, sei que vou sentir saudades, não sei
se foi pouco tempo, mas o suficiente para viver uma linda experiência!
28/11/2019 Poema de aluna do CEEJA retrata tradição nordestina na
busca pela esperança! (Eny)
Promover e incentivar a escrita de textos poéticos estimula a sensibilidade
ao mesmo tempo que coloca o aluno em sintonia com suas origens e
coloca as palavras como instrumento de liberdade e interação com a vida.
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Nunca é Tarde
Eu vim de Pernambuco
Com três anos de idade
Meus pais estavam malucos
Para conhecer essa cidade.
Era São Paulo muito falado
Acabei amando essa cidade
Apesar dos arranha céus e avenidas
Me trouxeram felicidades.
Comigo trouxe a inocência
Sede de aprender como criança
Ingênua e abalada
Mas com muita esperança.
Passado muito tempo,
casei e tive filhos
Foram todos para a escola
Para não virar perdidos.
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Depois de muita luta
Sou feliz no interior
Conquistei muitos amigos
Do pobre ao doutor.
Não tive de estudar
Mas antes que eu me esqueça
Meu coração nordestino
Me fez parar no CEEJA.
Eny (nome completo)
29/11/2019 O Filho Pródigo que Volta aos Braços do Pai - Igo (Parte
III) (Igo)
Leia o terceiro texto produzido pelo aluno do CEEJA Igo (nome
completo) sobre suas experiências e lutas de vida para cuidar de sua saúde
e estudos.
Estou aqui novamente e gostaria de agradecer ao Centro POP, a seus
funcionários que me atenderam, assim como a Casa Cidadã, antiga Casa
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de Passagem, que sempre me acolheram nos momentos difíceis e ao
CEEJA que me apoia em meus estudos.
Eu não aceitava o tratamento que me propuseram e me encontrava mais
uma vez destruído nas ruas da nossa linda cidade, perambulando que
nem folha seca que não dá frutos e nem água.
Eu não tinha dia e nem noite, nem um bom dia, nem uma boa tarte e
nem uma boa noite, por que estava completamente envolvido com o já
citado nos outros textos, o álcool cruzado.
Em novembro de 2018 o poder de Deus fez que eu fosse parar no
Hospital de Clínicas de minha cidade, lá então com os exames os
médicos descobriram que eu estava com pneumonia por causa da friagem
da rua, bebidas, drogas e cigarros. Então comecei a conversar com Deus:
Meu Deus, eu rogo pelo seu nome. Eu, filho de Deus, peço que o
Senhor Jesus Cristo me devolva o Espírito Santo, por que não quero ficar
sem a sua presença.
Meu Deus, o Senhor Jesus Cristo e o Espirito Santo, sou teu filho
também eu estou aqui e não quero essa vida para mim, de noites perdidas
de sono e ficar perambulando pelas ruas de qualquer cidade do Brasil ou
que seja fora do país.
Desejo de encontrar minha paz espiritual, mental e física com a ajuda e a
misericórdia celestial de Deus, Jesus Cristo e do Espírito Santo. Amém. “
Então, após orar e refletir, conversei com a Assistente Social do Hospital,
falei para ela sobre todos os fatos que estavam acontecendo comigo e ela
me disse: vou ligar para o Centro POP; mas eu respondi: eu não quero a
ajuda do Centro POP.
194
Pom, no mesmo milésimo de segundo Deus me deu um assopro de
arrepio, o Espirito Santo fez com que eu mudasse de opinião e no mesmo
instante dissesse para a assistente social, olhando fixo nos olhos dela, que
eu vi que naquela pessoa era Deus falando comigo. Diante disso, disse
para Deus que se é a sua vontade, eu vou aceitar esse tratamento da
dependência.
Como eu aceitei o tratamento, para mim esta foi a melhor clínica do
Brasil, pois estou há cinco meses limpo de tudo que me levou para lá.
Estou recuperando a minha saúde espiritual, mental e física, ao longo
dessa minha vida de trita anos, venho lutando contra essa doença.
Hoje já posso ser doador de medula óssea, estou na última disciplina do
Ensino Fundamental, avançando nos estudos e em breve serei doador de
sangue.
Agradeço a todos os envolvidos nesta minha fase de reerguida, a minha
escola, aos meus colegas, funcionários dos locais que me apoiaram, da
clínica, a todos os profissionais e a minha família que me apoia. Um forte
abraço e que Deus esteja com todos nós!
16/12/2019 Ex-aluna do CEEJA ingressa em Universidade Pública que tem
conceito máximo em indicador do MEC em 2019 (Ros)
Ros, ex-aluna do CEEJA, atualmente finaliza o segundo ano do curso de
Pedagogia da UNESP ---. Confira abaixo o relato sobre sua experncia
vivida no CEEJA ---.
Ros, à direita, em atividade do grupo de estudo do CEEJA.
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Meu nome é Ros e tenho 49 anos. E essa é a minha história: parei de
estudar com 18 anos, no 1º Ano do Ensino Médio (naquela época, a
gente chamava de 1º Colegial). Engravidei e, por motivos de complicação
na gestação, precisei ficar de repouso e não pude mais ir para a escola.
Depois que me tornei mãe, dona de casa e esposa, a escola ficou cada vez
mais distante da minha realidade. Após minha separação em 2012, tentei
voltar a estudar, mas infelizmente por motivos pessoais tive que
deixar de lado o sonho de retomar meus estudos.
Em 2017, após 30 anos longe da escola, resolvi voltar, devido à minha
demissão de emprego. Depois de ficar desempregada, eu me vi perdida,
preocupada por não ter ensino médio completo. Me desesperei! Meu
Deus, como vou conseguir um emprego, se ainda não concluí o ensino
médio? Foi então que coloquei uma determinação no meu coração: eu
iria terminar os estudos e não iria parar no caminho novamente.
Então passei a frequentar as aulas do CEEJA. Todos os dias, eu chegava
ao CEEJA de man e só ia embora à tarde. Eu só tinha um lema: foco,
força e fé! Tive muita ajuda dos professores nessa jornada de
conhecimento e superação. Consegui concluir o Ensino Médio em 2017.
Nesse mesmo ano, resolvi prestar o Enem e o vestibular da Unesp. Tinha
o sonho de ser professora e por isso fiz vestibular para Pedagogia.
Hoje, estou no 2º ano de pedagogia na Unesp e em 2020 começo o 3º
Ano do curso. Não posso me esquecer de pessoas que acreditaram em
mim e me ajudaram com as aulas no CEEJA para preparação do
vestibular: minhas queridas Yas (que fazia estágio no CEEJA segunda
da esquerda pra direita na foto acima), Gab, aluna da Unesp, que vinha
para o CEEJA voluntariamente ajudar os alunos, e também a querida
professora Ver, que sempre acreditou em mim…
196
Obrigada ao CEEJA e aos professores por tudo que me ajudaram a
conquistar, por me permitirem cursar uma universidade pública. Mas
principalmente sou muito grata a Deus! Sem Ele eu não conseguido…
Até aqui nos ajudou o Senhor! (1 Samuel 7:12)
Deus abençoe a todos! E não desistam de seus sonhos!
Pareceristas
_______ ____________ ____________ ____________ ____________ ____________ ____________ ____________ _______________ ____________
Este livro foi submetido ao Edital 01/2020 do Programa de Pós-
graduação em Educação da Faculdade de Filosofia e Ciências da UNESP, câmpus
de Marília e financiado pelo auxílio nº 0798/2018, Processo Nº
23038.000985/2018-89, Programa PROEX/CAPES. Contamos com o apoio
dos seguintes pareceristas que avaliaram as propostas recomendando a publicação.
Agradecemos a cada um pelo trabalho realizado:
Adriana Pastorello Buim Arena
Alessandra Arce Hai
Alexandre Filordi de Carvalho
Amanda Valiengo
Ana Crelia Dias
Ana Maria Esteves Bortolanza
Ana Maria Klein
Angélica Pall Oriani
Eliana Marques Zanata
Eliane Maria Vani Ortega
Fabiana de Cássia Rodrigues
Fernando Rodrigues de Oliveira
Francisco José Brabo Bezerra
Genivaldo de Souza Santos
Igor de Moraes Paim
Irineu Aliprando Tuim Viotto Filho
José Deribaldo Gomes dos Santos
Jussara Cristina Barboza Tortella
Lenir Maristela Silva
Livia Maria Turra Bassetto
Luciana Aparecida Nogueira da Cruz
Márcia Lopes Reis
Maria Rosa Rodrigues Martins de
Camargo
Marilene Proença Rebello de Souza
Mauro Castilho Gonçalves
Monica Abrantes Galindo
Nadja Hermann
Pedro Laudinor Goergen
Tânia Barbosa Martins
Tony Honorato
Comissão de Publicação de Livros do Edital 001/2020 do
Programa de Pós-Graduação em Educação
da Faculdade de Filosofia e Ciências da UNESP, campus de Marília
Graziela Zambão Abdian, Patricia Unger Raphael Bataglia,
Eduardo José Manzini e Rodrigo Pelloso Gelamo
SOBRE O LIVRO
Catalogação
André Sávio Craveiro Bueno CRB 8/8211
Normalização
Lívia Mendes Pereira
Personagem da capa
Thais Regina Pinto Soto
Vetorização do personagem da capa
Fabrício Henrique da Silva
Capa e diagramação
Mariana da Rocha Corrêa Silva
Assessoria Técnica
Renato Geraldi
Oficina Universitária Laboratório Editorial
labeditorial.marilia@unesp.br
Formato
16x23cm
Tipologia
Adobe Garamond Pro
Papel
Polén soft 80g/m2 (miolo)
Cartão Supremo 250g/m2 (capa)
Acabamento
Grampeado e colado
Tiragem
100
O livro “O BLOG NA EJA: Autobiograa e Ação Emancipadora” dis-
cute a ação pedagógica na educação de jovens e adultos no contexto de
sua consolidação como Direito Público Subjetivo, fundamentando-se
na Teoria Histórico Cultural, na Filosoa da Linguagem e na Pesquisa
Qualitativa. Tem como principais nortes de reexão o legado de Vy-
gotsky ao pensar o desenvolvimento dos sujeitos por meio da lingua-
gem, de Paulo Freire ao orientar os métodos de ação pedagógica no
âmbito da EJA e o estudo dos gêneros discursivos em Bakhtin, com foco
na produção de autobiograas.
Orienta-se por uma perspectiva de formação integral e de prática liber-
tadora para a emancipação dos sujeitos, na qual os indivíduos necessitam
ser motivados pelo sentido da aprendizagem em perspectiva omnilate-
ral, formando-se para múltiplas necessidades, desvelando a realidade na
qual se inserem, reconhecendo-se como sujeitos históricos e integrantes
culturais na sociedade.
Daí, a aprendizagem na EJA deve ser prazerosa e compreendida como
fazer humano cuja gênese se situa no contexto da articulação entre mo-
tivos e necessidades de aprender, na geração de ideias, articulação e ne-
gociação de signicados.
Discutindo a educação de jovens e adultos de natureza desenvolvimen-
tal, a obra é de interesse tanto para professores que ensinam na EJA
quanto para prossionais das redes de ensino envolvidos com orientação
técnico-pedagógica e formação inicial ou continuada de educadores.
O BLOG NA EJA
autobiograa e
ação emancipadora
contribuições atualizadas das teorias
educacionais. Assim, o docente da EJA
tem por dever a criação de um ambiente
positivo de estudo, situado no contexto
de um amplo processo de produção de
sentidos de aprendizagem e de negocia-
ção de signicados conceituais.
Por isso, neste livro busca-se dis-
cutir as contribuições do Blog escolar
para o enriquecimento das práticas edu-
cativas na EJA, tendo-se a clareza de que
ensinar e aprender extrapolam os limites
da sala de aula e que o recurso à tecno-
logia é fundamental para renovação das
formas de ensinar e aprender na socie-
dade contemporânea. Esse ambiente de
ensino e de aprendizagem, rico e de am-
plas nuances, visa à formação integral do
cidadão, voltando-se para o desenvolvi-
mento de capacidades adequadas ao en-
frentamento das transformações cientí-
cas e tecnológicas e seu impacto na vida
social, cultural e política.
Deseja-se, então, que a leitura
deste livro possa suscitar inconformismo
com práticas pedagógicas que devem ser
questionadas e sugerir outras com vistas
a instigar nos educandos da EJA o gosto
pela leitura e produção de textos como
atividades essenciais para o desvelar do
mundo
Programa PROEX/CAPES:
Auxílio Nº 0798/2018
Processo Nº 23038.000985/2018-89
Desenvolver práticas signicati-
vas no contexto da educação de jovens
e adultos impõe o reconhecimento da
cultura e da sociedade na qual os atores
sociais estão inseridos, conhecer o sig-
nicado das coisas e do mundo à luz da
cultura a qual pertencem bem como os
comportamentos e condutas que carac-
terizam os processos sociais, os quais in-
uenciam a educação como um todo e
delimitam o processo de construção de
uma sociedade livre e plural.
Desse modo, não se trata sim-
plesmente de substituir o conhecimento
vinculado ao “currículo oculto” pelo co-
nhecimento organizado cienticamente,
mas de articular saberes que permitam
pensar a realidade, ou seja, que o docen-
te seja epistemologicamente curioso, se
preocupando com a forma como o co-
nhecimento se constitui, estabelecendo
relações e tirando conclusões de modo
a incorporar cultura e conhecimentos
novos. O ponto de partida deve ser os
saberes parciais e populares; o ponto de
chegada deve ser os saberes sistematiza-
dos ou cientícos.
Educar jovens e adultos exige a
capacidade docente de pesquisar, mas
também exige criticidade, apego à éti-
ca e à estética. Impõe aceitar o desao
do risco, a aceitação do novo, do con-
traditório e a rejeição a qualquer forma
de discriminação. Mas exige conduzir os
educandos à verdade que pode ser pro-
vada a partir do reconhecimento da sua
história de vida e de sua identidade cul-
tural.
Os docentes identicados com
esses princípios buscam reformular
suas práticas pedagógicas, atualizan-
do-as permanentemente ante às no-
vas exigências culturais, tecnológicas e
O BLOG NA EJA autobiograa e ação emancipadora
Rodrigo Martins Bersi e José Carlos Miguel
Rodrigo Martins Bersi | José Carlos Miguel