Pensamento Latino-Americano e Educação: por uma ética situada |
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que é evidente. Nesse sentido, prestar atenção indicaria uma atitude de
estar presente ao presente, de tal forma que ele seja capaz de se apresentar
para que possamos ser transformados, atravessados ou contaminados por
ele, tornando a experiência possível. Estar atento contrapõe-se ao estado
de estar ausente, pois, estar ausente signica que não estamos ali/aqui,
que somos prisioneiros de um horizonte de expectativas, projeções,
perspectivas, visões, imagens, sonhos, que são nossos, ou seja, nossa
intencionalidade que nos constitui como sujeito em relação a um objeto/
objetivo (MASSCHELEIN, 2008, p. 42).
Assim sendo, tanto para Esquirol (2008) quanto para Masschelein
(2008), atenção resultaria de um exercício de suspensão do pensamento ou
dos julgamentos e que esta suspensão implica colocar em risco a constituição
do próprio sujeito. Tal perspectiva, aberta especialmente por Masschelein
(2008), constitui-se problemática na medida em que nos apresenta a
tarefa de pensar nas fronteiras do regime de verdade de corte moderno/
representacional
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, em que a noção de formação está associada à constituição
do sujeito uno, singular, portador de identidade, racional, autônomo e livre;
artíce de um mundo e de uma realidade constituída de objetos passíveis de
serem conhecidos e controlados pelo sujeito do conhecimento.
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A relação entre atenção e suspensão do julgamento – que colocaria
em risco a constituição do próprio sujeito do conhecimento – deve estar
associada, segundo Masschelein (2008), à vontade de movimentar-se e
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Em relação ao termo moderno queremos destacar o momento do cogito cartesiano, que comporta uma ruptura
substancial entre a res cogitans e a res extensa, isto é, a ruptura entre a ― coisa pensante (consciência) e a ― coisa
extensa (o corpo, com propriedades sensíveis, como espaço, largura, comprimentos, cor, entre outras) e inaugura
uma concepção dualista e irreconciliável da realidade, separando substancialmente, a realidade espiritual da
material, tendo em vista que a diferença existente entre as duas substâncias diz respeito à sua natureza. Esta
separação metafísica repercutiu não apenas na epistemologia, instaurando a relação dual e essencial entre sujeito-
objeto, entre o ser que pensa e o ser- pensado, porém se introduziu também em outras áreas, atingindo o cerne
mesmo das instituições do ocidente cristão, representado pelas cisões tradicionais de Estado – Igreja, público –
privado. De acordo com Leopoldo e Silva (2001), interpretando Descartes, a hegemonia do sujeito corresponde
ao que se convencionou denominar de primado da representação, compreendido como todo e qualquer conteúdo
presente na mente. De origem medieval, a palavra representação, de acordo com o Abbagnano (2003, p. 853)
pode indicar imagem ou ideia, ou ambas as coisas. Seu uso foi sugerido pelos escolásticos com o conceito
de conhecimento como “semelhança” do objeto. Posteriormente, Imannuel Kant estabelece uma noção geral,
considerando-o gênero de todos os atos ou manifestações cognitivas, independentemente de sua natureza de
quadro ou semelhança, sendo que desse modo passou a ser usado na losoa.
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Danelon (2004, 2005) arma que a educação, de modo geral, repousa sobre a premissa da existência de um
sujeito a ser formado/formatado e as disciplinas que compõem as ciências da educação, seja a psicologia da
educação, a sociologia da educação, as metodologias, entre outras, estão baseadas na idéia desse mesmo sujeito
a ser educado: sujeito uno, singular, sede da razão, liberdade, vontade e consciência.