Pensamento Latino-Americano
e Educação:
por uma ética situada
Pensamento Latino-Americano e
Educação:
por uma ética situada
Marília/Ocina Universitária
São Paulo/Cultura Acadêmica
2020
A B  C
C R B
G  S S
(O)
UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA
FACULDADE DE FILOSOFIA E CIÊNCIAS - FFC
UNESP - campus de Marília
Diretor
Prof. Dr. Marcelo Tavella Navega
Vice-Diretor
Dr. Pedro Geraldo Aparecido Novelli
Conselho Editorial
Mariângela Spotti Lopes Fujita (Presidente)
Adrián Oscar Dongo Montoya
Andrey Ivanov
Célia Maria Giacheti
Cláudia Regina Mosca Giroto
Marcelo Fernandes de Oliveira
Neusa Maria Dal Ri
Renato Geraldi (Assessor Técnico)
Rosane Michelli de Castro
Ficha catalográca
Serviço de Biblioteca e Documentação - FFC
Editora aliada:
Cultura Acadêmica é selo editorial da Editora UNESP
Ocina Universitária é selo editorial da UNESP - campus de Marília
Copyright © 2020, Faculdade de Filosoa e Ciências
P418 Pensamento latino-americano e educação : por uma ética situada / Alonso Bezerra de
Carvalho, Cláudio Roberto Brocanelli, Genivaldo de Souza Santos (organizadores). –
Marília : Ocina Universitária ; São Paulo : Cultura Acadêmica, 2020.
182 p. : il.
Textos em português e textos em espanhol
Inclui bibliograa
ISBN 978-65-86546-23-1 (Impresso)
ISBN 978-65-86546-25-5 (Digital)
1. Educação – Filosoa – América Latina. 2. Ética. 3. Pós-colonialismo – América
Latina. I. Carvalho, Alonso Bezerra de. II. Brocanelli, Cláudio Roberto. III. Santos,
Genivaldo de Souza.
CDD 370.1098
DOI
https://doi.org/10.36311/2020.978-65-86546-25-5
S
Prefácio
Sinésio Ferraz Bueno ............................................................................ 7
Apresentação
Alonso Bezerra de Carvalho; Cláudio Roberto Brocanelli
Genivaldo de Souza Santos ................................................................... 15
Pensamento decolonizante, prática intercultural e
emancipação: novas perspectivas para a Filosoa da
Educação no contexto latino-americano
Antônio Joaquim Severino .................................................................... 19
El paisaje educativo en la américa negada
José Alejandro Tasat ............................................................................. 33
Por uma losoa da educação latinoamericana: reexões
a partir da noção de estar em Rodolfo Kusch
Alonso Bezerra de Carvalho .................................................................. 53
La evaluación como estrategia formativa y transformadora
del aprendizaje del estudiante
Daniel Ríos Muñoz e David Herrera Araya ........................................... 67
Soltar o lastro: a categoria estar de Rodolfo Kusch e a
dimensão ética da atenção
Genivaldo de Souza Santos ................................................................... 79
Paulo Freire e Rodolfo Kusch: aproximações para pensar
Filosoa e Educação na América Latina
Cláudio Roberto Brocanelli .................................................................. 97
Tempo escolar e sua dinâmica de construção: tramas,
tensões e negociações
Rita de Cassia Gallego .......................................................................... 107
Oferta da educação básica em comunidade quilombola:
desaos da educação escolar no Tocantins
Ana Lúcia Pereira ................................................................................ 135
A inuência dos padrões colonizadores sobre as
diculdades de aprendizagem: a infância medicalizada
Fabiola Colombani .............................................................................. 155
El enfoque ético, axiológico y humanista, instrumento
insoslayable de la labor educativa: la experiencia cubana
Nancy Lucía Chacón Arteaga ............................................................... 167
Sobre os autores ........................................................................... 179
| 7
P
Sinésio Ferraz Bueno
UNESP - Marília
O objetivo manifesto no presente trabalho acadêmico, de
apresentar reexões dedicadas ao pensamento latino-americano e à
educação, estabelecendo como o condutor uma “ética situada”, requer
primeiramente alguns esclarecimentos de natureza losóca. No campo da
losoa, o termo “ética” implica conceber a circunscrição do comportamento
humano a ideais universalistas, de maneira a pressupor a existência de uma
essência ou substância humana que independe do momento histórico
ou do contexto cultural e social. É esse, por exemplo, o fundamento do
imperativo categórico kantiano, em seu objetivo básico de ancorar a norma
de conduta na substância racional do homem. Sob esse ponto de vista, não
se poderia pura e simplesmente “situar” a ética a determinada cultura ou
época histórica, pois isso implicaria restringir a validade do conceito a um
determinado contexto particular e histórico. Falar de uma “ética situada
e restrita a um conjunto especíco de valores e comportamentos morais,
culturais e religiosos, somente adquire signicado losóco quando se
| Alonso Bezerra de Carvalho, Cláudio Roberto Brocanelli e Genivaldo de Souza Santos (Org.)
8 |
considera a opção teórica e política demarcada pelo pós-colonialismo
latino-americano, e sobretudo pelo giro decolonial constituído nos anos
1990 por intelectuais latino-americanos. A compreensão do contexto
acadêmico especíco que originou tal movimento de ruptura com as
formas canônicas de concepção da ética requer uma breve apresentação do
movimento pós-estruturalista dos anos 1950.
O pós-estruturalismo francês constituiu-se como um movimento
intelectual de ruptura radical com as pretensões universalistas contidas na
concepção iluminista da humanidade como sujeito de uma experiência
histórica direcionada ao progresso linear e à autorealização moral e
intelectual. As diversas concepções de existência de um sujeito racional,
em termos cartesianos, kantianos, hegelianos ou marxistas, deram lugar
a entendimentos descentrados e múltiplos acerca da categoria losóca
do sujeito. O pós-estruturalismo, ou a pós-modernidade que se originou
sobretudo das produções intelectuais de Gilles Deleuze e Michel Foucault,
inauguraram concepções irredutíveis, incomensuráveis e plurais de sujeito,
relacionadas a gêneros, etnias e epistemes especícos, radicalmente
antagônicas ao padrão de racionalidade universalista que caracterizou o
Iluminismo e a Modernidade. A contestação do eurocentrismo, mediante
uma desconstrução dos essencialismos que historicamente deram
legitimidade ao projeto colonial baseado no patriarcado e na escravidão,
originou correntes de pensamento pós-colonial que repercutiram as
implicações da losoa da diferença para uma valorização de referências
culturais latino-americanas, a partir dos anos 1950.
É possível armar, portanto, que do pós-estruturalismo francês
emergiram tendências antieurocêntricas intensamente repercutidas
nos ambientes acadêmicos latino-americanos, manifestando-se como
movimentos desconstrutivistas pós-coloniais. Entretanto, a consideração
atenta de tais tendências de descolonização desvela uma sutileza losóca
e semântica que demandou nova inexão no sentido do aprofundamento
da fratura com a modernidade ocidental. É forçoso reconhecer que essa
contestação não foi suciente para efetuar uma ruptura suciente com as
matrizes eurocêntricas, pois, em sua origem, o próprio pós-estruturalismo,
sendo de origem francesa, é, indiscutivelmente eurocêntrico. Por mais
que esse movimento intelectual tenha demandado importantes estudos
direcionados para a descolonialidade, suas origens europeias se revelaram
Pensamento Latino-Americano e Educação: por uma ética situada |
| 9
insucientes para uma superação efetiva do estatuto de subalternidade
dos intelectuais pós-coloniais. Em texto muito esclarecedor acerca da
emergência do termo “decolonialidade”, Luciana Ballestrin destaca a questão
central que desde os anos 1980 passou a ser formulada entre intelectuais
pós-coloniais insatisfeitos com a origem europeia da descolonização: “o
subalterno permanece silenciado e aparece como constituição de mais
um ‘outro’, uma classicação essencialista que acaba por não incorporar
a noção de diérance ou hibridismo” (2013, p. 93). Referindo-se à crítica
originalmente formulada por Gayatri Spivak, arma Ballestrin: “Para
a autora (Spivak), não só o subalterno não pode falar como também o
intelectual pós-colonial não pode fazer isso por ele” (2013, p. 93).
Fica claro, então, que a própria ruptura pós-estruturalista ou
pós-moderna originalmente francesa, uma vez incorporada como crítica
à colonialidade, ensejou necessariamente nova ruptura que fosse capaz
de estabelecer parâmetros autenticamente voltados a uma crítica de
matriz latino-americana à colonialidade do poder. Com esse objetivo, em
2005, Nelson Maldonado-Torres propôs o termo “giro decolonial” para
expressar a decolonialidade como movimento de resistência intelectual
e política, originado de grupos explorados e oprimidos, e direcionado a
uma radicalização crítica ao eurocentrismo. Sucedendo à modernidade
iluminista e aos estudos pós-coloniais de inspiração pós-moderna, a
decolonialidade surgiu como um terceiro elemento que se adiciona
ao cenário da contestação do domínio colonial: “a supressão da letra ‘s
marcaria a distinção entre o projeto decolonial do Grupo Modernidade/
Colonialidade e a ideia histórica da descolonização” (BALLESTRIN,
2013, p. 108). Dentre as mais importantes contribuições proporcionadas
pelos estudos decoloniais, e incorporadas nos textos da presente coletânea,
que permitem uma compreensão acerca da “ética situada” a que alude o
título, estão o resgate das narrativas originais valorizadoras da América
Latina como continente fundacional, e o fornecimento de “novos
horizontes utópicos e radicais para o pensamento da libertação humana
(BALLESTRIN, 2013, p. 110).
A emergência da decolonialidade como campo de estudos
dedicado ao resgate das raízes culturais latino-americanas, em princípio,
poderia congurar apenas um “conito edipiano” no campo acadêmico,
voltado para a contestação da paternidade europeia no campo das
| Alonso Bezerra de Carvalho, Cláudio Roberto Brocanelli e Genivaldo de Souza Santos (Org.)
10 |
matrizes eurocêntricas do pensamento de resistência anticolonial. Mas
uma consideração adequada da dialética do senhor e do escravo na
fenomenologia do Espírito de Hegel, permite compreender o movimento
decolonial como momento fundamental e altamente relevante do processo
histórico-dialético de desenvolvimento da consciência de si. Para que
possamos compreender a decolonialidade como momento essencial do
trajeto histórico de realização da autoconsciência do Espírito, é relevante
uma breve apresentação dos elementos básicos da dialética entre senhorio
e servidão, tal como apresentada por Hegel. Embora este seja um convite
para reetir sobre a resistência cultural latino-americana à luz de referências
conceituais do colonizador, é lícito pressupor que a losoa de Hegel
contenha potenciais que estejam além de sua própria circunscrição histórica
e social, e que, portanto, sejam capazes de proporcionar uma compreensão
sucientemente ampla do trajeto do Espírito.
Para o lósofo alemão, a dialética do senhor e do escravo constitui-
se como experiência de luta pelo reconhecimento. No interior da obra
Fenomenologia do Espírito, ela representa o momento em que a consciência
infeliz, ou consciência de si (que representa o percurso paradigmático do
homem na história, em sua relação com os objetos, com outros homens,
e consigo mesmo) reconhece que seu desejo não se satisfaz na posse dos
objetos materiais. O homem persegue a posse incessante de diversos objetos
no mundo, sejam eles bens materiais ou simbólicos, porém essa busca está
inevitavelmente condenada à frustração, pois embora se confunda com a
posse material, o desejo persegue um sentido muito mais amplo: “o desejo
se refere aos objetos do mundo; (…) enm, a uma outra consciência de si,
é o próprio desejo que se procura no outro, o desejo do reconhecimento
do homem pelo homem” (HYPPOLITE, 1999, p. 175). Para Hegel, o
caráter trágico da existência humana se esgota na busca incessante de coisas
que são insucientes para aplacar a necessidade de reconhecimento de si
mesmo mediante uma outra consciência. Em outras palavras, a simples
posse de objetos materiais de nada vale se eles não forem reconhecidos
pelo Outro: “por isso, na Fenomenologia, o encontro das consciências de
si se manifesta como sua luta para se fazerem reconhecer” (HYPPOLITE,
1999, p. 179). O encontro entre duas consciências de si representa, no
sistema hegeliano, o momento fundador da cultura, da sociedade e da
política, pois a batalha pelo reconhecimento se desdobra em uma luta de
Pensamento Latino-Americano e Educação: por uma ética situada |
| 11
vida ou morte, em que uma das partes, o escravo, deverá se submeter à
outra, reconhecendo-o como senhor.
Essa relação é paradigmática não apenas no que se refere ao
simples encontro entre dois homens quaisquer, como também no âmbito
das relações entre civilizações. Mas embora ela pareça estabelecer uma
simples dissonância entre uma parte dominadora e outra dominada,
sua natureza é dialética, e envolve um sentido muito mais amplo acerca
da mediação recíproca entre ambas. Pois embora o senhor, como parte
vitoriosa no embate de vida e morte, pareça ser superior e autossuciente,
se o reconhecimento é o verdadeiro objetivo do desejo que animou o
conito entre ambos, deve-se admitir que o senhor é reconhecido não por
um homem em iguais condições, mas por uma simples coisa, um escravo:
o senhor só é senhor porque reconhecido pelo escravo, é autônomo pela
mediação de uma outra consciência de si, a do escravo” (1999, p. 188). O
escravo, por outro lado, representa o polo autêntico da ação sobre o mundo,
pois é mediante seu trabalho que o mundo das coisas brutas se torna um
mundo humanizado. Por esse motivo, a atividade laboriosa sobre o mundo
conduz o escravo a uma condição independente e autônoma que exige
reconhecimento: “o escravo forma-se a si mesmo não somente ao formar
as coisas, mas também imprime no ser essa forma que é a da consciência
de si, e assim o que encontra em sua obra é ele mesmo” (HYPPOLITE,
1999, p. 191).
Na dialética hegeliana, o polo da autonomia e da liberdade
concentra-se na gura do escravo, que em seu percurso inicial de
submissão, e posterior realização do próprio processo formativo da
civilização mediante o trabalho, produz as condições para o progresso da
autonomia e da liberdade. Desde que aqueles interessados em conhecer o
tema da decolonialidade não vejam em Hegel um simples representante
suspeito e ultrapassado de uma losoa colonial, mas sim um pensador
que soube compreender em profundidade o trajeto do Espírito na história
como processo de autorealização da emancipação humana, é possível
pensar o tema do reconhecimento da consciência de si como núcleo do
atual desenvolvimento histórico em que o pensamento latino-americano
expõe rupturas profundas em diversos níveis do processo civilizatório. A
contestação da modernidade colonial no âmbito do giro decolonial explicita
dois aspectos de grande relevância que a fazem representar uma etapa
| Alonso Bezerra de Carvalho, Cláudio Roberto Brocanelli e Genivaldo de Souza Santos (Org.)
12 |
fundamental da luta histórica pelo reconhecimento. Em primeiro lugar,
a própria decolonialidade se justica como explicitação de que a crítica
da colonialidade no âmbito epistêmico e político não pode se contentar
com as matrizes teóricas europeias, mesmo que originadas da losoa
da diferença francesa. Para além do pós-estruturalismo dos anos 1950, é
preciso expor a “América profunda” como signo de insubordinação e de
explicitação da diferença. Em segundo lugar, o conjunto crítico dirigido
contra a colonialidade não se limita aos aspectos materiais da dominação,
expondo um espectro amplo de eixos hierarquizantes que historicamente
formaram as bases de subjugação da América Latina às metrópoles
europeias. A luta pelo reconhecimento travada pelo pensamento decolonial
expõe uma estrutura complexa de níveis interrelacionados que se situam
muito além das lutas pela independência no século XIX e mesmo dos
movimentos socialistas historicamente mais recentes. A matriz colonial do
poder, segundo Walter Mignolo, que é uma das vozes mais importantes
do Grupo Modernidade/Colonialidade, compõe cinco eixos a partir dos
quais devem ser compreendidos e superados os aspectos obscuros da
modernidade ocidental: economia, autoridade, relação com a natureza,
genêro/sexualidade, e subjetividade/conhecimento (BALLESTRIN, 2013,
p. 100). Essa totalidade de núcleos que estruturaram o domínio colonial
compõe o conjunto de níveis que constituem a luta pelo reconhecimento
em sua versão decolonial.
Sob termos condizentes com o sistema losóco de Hegel,
o conceito losóco de ética deve ser pensado como algo idêntico e
não idêntico a si mesmo, isto é, como um horizonte losóco que visa
disciplinar a conduta de acordo com uma substância humana universal,
mas também como um processo que busca realizar tal substância no interior
dos conitos históricos entre homens singulares e civilizações. Como parte
inseparável da realização do Espírito na história, o campo ético somente
pode se estabelecer concretamente por meio de processos educativos
formadores do espírito, que não existem como noções essencialistas dadas
e absolutas, pois sua realização é histórica e inseparável da dialética entre
senhor e escravo. É nesse sentido que uma “ética situada” se compõe dos
momentos de enfrentamento da herança colonial no âmbito dos cinco eixos
que estruturaram o domínio sobre a América Latina. Na perspectiva de
Hegel, quando o escravo atinge a consciência de si como ser independente
e produtor da civilização, o imperativo do reconhecimento emerge como
Pensamento Latino-Americano e Educação: por uma ética situada |
| 13
utopia grandiosa que exige realização histórica. Porém, como assinala Lima
Vaz, “um longo caminho se estende entre a exigência de reconhecimento
universal que habita o logos e a sua aparição no plano social e político com a
proclamação da ilegitimidade jurídica e da aberração moral da escravidão
(1981, p. 24). Sob o foco da dialética entre senhor e escravo, a presente
coletânea sobre pensamento latino-americano, educação e ética situada,
está justamente inserida nesse longo caminho.
RefeRências
BALLESTRIN, L. América Latina e o giro decolonial. Revista Brasileira de Ciência
Política, Brasília, n. 11, p. 89-117, maio-ago. 2013.
HYPPOLITE, J. Gênese e estrutura da Fenomenologia do Espírito de Hegel. São Paulo:
Discurso Editorial, 1999.
LIMA VAZ, H. C. Senhor e escravo: uma parábola da losoa ocidental. Síntese:
Revista de Filosoa, Belo Horizonte, FAJE, v. 8, n. 21, 1981.
| 15
A
Os textos que compõem este livro são parte das conferências,
mesas redondas e de textos que contribuíram nos debates que foram
realizados por ocasião do I Congresso Internacional de Pesquisa e Práticas
em Educação – CONIPPE – que ocorreu em novembro de 2018, na
Faculdade de Ciências e Letras da Unesp, Campus de Assis. O evento teve
o propósito de promover debates a partir dos mais variados enfoques, com
objetivo de compreender e reetir acerca dos elementos constitutivos do
ethos, isto é, da maneira de ser, de estar, de pensar, de agir e de educar,
que foram e que estão sendo produzidos na América Latina. Nós, latino-
americanos, conhecemos e facilmente acessamos losoas, pensamentos e
ideias pedagógicas de uma cultura que poderíamos chamar de “universal”,
elaboradas, principalmente, no continente europeu e pouco conhecemos
sobre nossas losoas “nativas”, pensamentos próprios e ideias outras
que, se retomadas, expostas e debatidas, podem contribuir para novas
concepções, posturas e práticas que atendam aos anseios acalentados por
professores, pesquisadores e aqueles envolvidos no campo da educação.
As provocações e reexões que ocorreram no evento promoveram
um pensamento próximo ao que nos oferece, entre outros pensadores
latino-americanos e caribenhos, o lósofo e antropólogo argentino Rodolfo
Kusch, com o intento de enxergar um losofar e um pensar situado e
culturalmente enraizado no solo aqui pisado. Para Kusch, sem o solo não
há enraizamento e sem o enraizamento não há sentido e nem cultura.
| Alonso Bezerra de Carvalho, Cláudio Roberto Brocanelli e Genivaldo de Souza Santos (Org.)
16 |
Assim, no campo educacional em geral, nas reexões acadêmicas e em
qualquer ambiente que queira um pensamento reexivo, deve ser buscado,
primeiramente, o que há de próprio para, depois, caso necessário, também
pensar com o legado estrangeiro. Com isso, ao se promover reexões e
debates nesta linha visamos pensar uma ética situada como uma postura
do povo local latino-americano, que culturalmente foi educado com ideias
e pensamentos estrangeiros, em lugar de pensar o seu estar (do estar aqui).
Nesse sentido, acreditamos que reetir e articular a ética com
a educação pode nos dar a visibilidade e a compreensão necessárias para
o entendimento da realidade que nos circunda, ou seja, da situação
histórica da América Latina, repercutindo de alguma maneira nos desaos
e problemas que se enfrenta no interior da sala de aula.
Pensar em uma ética situada na educação é levar em consideração
o contexto, a história e as especicidades do ambiente que vivemos e de
como interagimos com ele e com as pessoas. Identicar-se e reproduzir
modelos, normas, ideias e práticas formados em tempo e espaço alheios
podem gerar, estar gerando ou ter gerado situações que dicultam uma
compreensão e um reconhecimento de nossas maneiras de ser. Poderíamos
dizer que a América Latina ou o povo latino-americano foi, losóca e
culturalmente, destituído de sua alteridade. Essa negação do Outro se
manifesta por meio de uma prática em que saberes, losoas, pensamentos,
pedagogias não são reconhecidas como válidas.
Pensar a educação e a ética a partir de um lugar situado, mas que
é inuenciado por outras ideias e concepções, implica e solicita um esforço
na busca de se pensar a partir de uma outra perspectiva, que contemple
outras vozes, outros protagonismos, outros “centros” de produção de
pensamento e ideias. Esse movimento não signica, em nenhum momento,
desconsiderar as produções clássicas que, secularmente, discutem
questões sobre a vida, o espírito, a natureza e o ser. Signica questionar
a visão ontológica da totalidade e, com isso, armar as particularidades,
reconhecendo a alteridade, no caso, homens e mulheres latino-americanos,
isto é, a própria América Latina, com seus problemas e desaos. Trata-se de
falar de lugares latinoamericanos e de suas realidades, movimento que não
é fácil, à medida que se contrapõe ao pensamento dominante dentro e fora
da América Latina, no qual a preocupação recai sobre o “ser”, a “essência
e a “totalidade”.
Pensamento Latino-Americano e Educação: por uma ética situada |
| 17
Muitos dos problemas e desaos que encontramos na escola
podem ser melhor redimensionados a partir de uma visão “de dentro”, isto
é, de um olhar atento aos componentes históricos que nos compõe como
povo latinoamericano e, assim, transformar o processo de formação de
professores, as nossas práticas pedagógicas, as nossas políticas educacionais,
dentre outros aspectos que possamos considerar.
Por m, a publicação deste livro para o público brasileiro e
latinoamericano pretende ser também um espaço de resistência, de
combate e de luta, para que a educação seja a protagonista, de fato e de
direito, na transformação das pessoas e que as pessoas possam transformar
o mundo e a sociedade.
Alonso Bezerra de Carvalho
Cláudio Roberto Brocanelli
Genivaldo de Souza Santos
| 19
P ,
  
:  
  F  E 
 -
Antonio Joaquim Severino
Uninove/Feusp
O ensaio desenvolve uma reexão sobre as exigências
epistemológicas e éticas para a abordagem da problemática educacional
na América Latina, frente à tomada de consciência da necessidade de
decolonização do pensamento dos povos colonizados. Busca explicitar
as consequências e os desaos postos pelo epistemicídio embutido no
processo de colonização bem como as exigências para sua superação.
Defende então três grandes perspectivas para o exercício da Filosoa
da Educação nessa circunstância. A primeira perspectiva diz respeito à
sua condição de etnoconhecimento; a segunda concerne à exigência da
interculturalidade em sua prática; e a terceira impõe a demanda de um
| Alonso Bezerra de Carvalho, Cláudio Roberto Brocanelli e Genivaldo de Souza Santos (Org.)
20 |
compromisso emancipatório. Por perspectiva etnolosóca, entende-
se a prática do conhecimento a partir das raízes culturais da própria
comunidade em sua real condição histórico-social. Para tanto, impõe-se
uma postura de questionamento e superação do silenciamento imposto
ao pensamento nativo pela intervenção colonizadora que produziu o
sufocamento das formas de expressão das culturas locais pré-existentes à
chegada dos europeus e impediu que a comunidade latino-americana, que
se formou ao longo dos últimos 500 anos, constituísse uma identidade
própria e trilhasse caminho diferente daquele traçado pela matriz cultural
do colonizador. Por perspectiva intercultural, entende-se a postura de que,
uma vez reconhecidas a pluralidade e a diversidade existentes em nosso
contexto, se proceda à busca e ao investimento estratégicos com vistas
a uma efetiva interação e convivialidade entre essas múltiplas culturas,
numa relação mais horizontal de reconhecimento e respeito mútuos, sem
hierarquização e hegemonia entre elas. Isso só poderá ocorrer se a losoa
praticada se compromissar com um processo pedagógico e político de
emancipação dos homens historicamente situados, engajando-se numa
tarefa educacional e política consistente, compartilhando o projeto de
assumir a complexidade da condição humana, propondo a se praticar
como sustentadora de uma modalidade de etnoconhecimento e como
uma abordagem intercultural do conhecimento. A concepção teórica
e as experiências práticas da etnolosoa suscitam uma intervenção
epistêmica e pedagógica muito mais abrangente do que o próprio campo
do conhecimento cientíco, demandando e envolvendo toda uma postura
losóca. Põe em ação uma reexão losóca que recorta as esferas do
epistemológico, do antropológico, do sociológico, do político, do ético,
em suma, de toda a esfera cultural. Incluindo uma postura losóca crítica
à hegemonia da racionalidade ocidental e uma armação da necessidade
de se implementar práticas de racionalidades silenciadas pela dominação
epistemológica da losoa do Ocidente europeu e norte-americano, a
tarefa da Filosoa da Educação não pode ser outra se não a de contribuir
para preparar as novas gerações, às quais cabe construir uma civilização
mais adequada à condição humana de imanência objetiva no mundo,
aberta à transcendência subjetiva no existir histórico-social.
Pensamento Latino-Americano e Educação: por uma ética situada |
| 21
Rumo a uma viRada epistemológica
Depois de 500 anos de vivência cultural sob o impacto do processo
colonizador, vem ganhando corpo, no contexto latino-americano, uma
nova perspectiva epistemológica, decorrente da tomada de consciência de
que nossa forma de pensar, de exercer o conhecimento, tem sido um tanto
alheio à nossa condição existencial histórica especíca.
A produção do pensamento, em nosso efetivo contexto
cultural, ocorre gerada, conduzida e formatada, reproduzindo modelo
para cá transplantado particularmente da Europa, da metrópole cultural
colonizadora. Esse modelo importado, articulado ao processo geral
da colonização, tornou-se hegemônico, sufocando eventuais formas
alternativas de pensamento.
Trata-se, então, de uma tomada de consciência de que, imanente
ao processo de colonização econômica, política e cultural, o colonizador
praticou igualmente uma repressão e até mesmo um genocídio epistêmico,
impondo um modo alheio de pensar, que não levou em conta, em sua
constituição, as especicidades existenciais da sociedade em formação. E
dada a profundidade dessa impregnação, mesmo depois das independências
política e até mesmo econômica, a dependência epistêmica, fundamento
de toda expressão cultural possível, continuou presente e hegemônica.
Conscientiza-se, então, de que todo pensar precisa ser
intrinsecamente etno-pensamento, etno-conhecimento, ou seja, tem que
ter suas raízes no seio da comunidade concreta em que é praticado, raízes
estas que precisam ser explicitadas. Toma-se, então, consciência de que,
embora todos os seres humanos disponham de uma capacidade de exercício
de sua subjetividade, o que é uma dimensão universal, esse exercício da
subjetividade se congura sob modalidades logosféricas especícas em
cada sociedade histórica.
No que concerne à sociedade e à cultura latino-americana, isso
vem levantando a necessidade da revisão de seu posicionamento em
relação à cultura e à epistemologia constituídas e formatadas na Europa,
ou melhor dizendo, no espaço ocidental euro-norte-americano. Trata-se
então do questionamento de um suposto universalismo, que se revela
como infundado e falso. Embora haja elementos epistêmicos que podem
ser considerados universais – tais como a ciência e a técnica – não se pode
| Alonso Bezerra de Carvalho, Cláudio Roberto Brocanelli e Genivaldo de Souza Santos (Org.)
22 |
armar o mesmo da cultura em geral e, particularmente dos pressupostos
epistêmicos do todo o conhecimento.
a Reação latino-ameRicana
Vem ocorrendo, então, um amplo movimento losóco e cultural
que põe em questão o paradigma epistemológico euro-norte-americano
que acabou se impondo e se tornando hegemônico em todo o território
geo-cultural da América Latina. Na realidade, essa tomada de consciência e
sua explicitação mediante o questionamento do eurocentrismo, já vinham
emergindo desde a segunda metade do século XX, em países colonizados
da Ásia e da África e mesmo na própria Europa, onde alguns pensadores
se tornaram sensíveis a essa situação de alienação e de dependência em que
viviam os povos colonizados. Só à guisa de uma referenciação bem geral, cito
alguns autores que se tornaram inspiradores do atual movimento. Assim,
criticando a colonização inglesa na India, Ranajit Guha, cria o Grupo de
Estudos Subalternos, que se estende à África do Sul, o palestino Edward Said
discute as relações entre Oriente e Ocidente, Frantz Fanon, martinicano,
que aborda com radicalidade o colonialismo, assim como Aimé Cesaire
e Albert Memi. Boaventura Souza Santos é outro precursor e inspirador
do movimento, particularmente ao denunciar o genocídio epistêmico que
acompanha o genocídio físico ao longo do processo colonizador, situação
que levou ao sufocamento das expressões de conhecimento próprias e
originais das culturas das regiões conquistadas e colonizadas.
Na América Latina, sob essa inspiração, a busca da identidade
e da originalidade de um pensamento próprio e autônomo, começa
a se manifestar mediante trabalhos de pensadores isolados, tais como
Leopoldo Zea, Salazar Bondy, Enrique Dussel, Arturo Roig, Paulo Freire.
Num primeiro momento, se aglutinaram em torno do Grupo Estudos
subalternos Latino-americanos, diretamente inspirado no Grupo indiano
e agora consolidado no Grupo Colonialidade/Modernidade, que agrega
nomes como Anibal Quijano, Walter Mignolo, Fernando Coronil, Nelson
Maldonado-Torres, Edgardo Langer, Santiago Castro-Gomez, Ramón
Grosfoguel. Conta com a contribuição de Caherine Walsh e Immanuel
Walerstein, norte-americanos, de Joseph Eastermann, austríaco e o
próprio Boaventura Santos. (BALLESTRIN, 2013; CASTRO-GÓMEZ;
Pensamento Latino-Americano e Educação: por uma ética situada |
| 23
GROSFOGUEL, 2007; DUSSEL; MENDIETA; BOHÓRQUEZ, 2008;
SEVERINO; MARCONDES, 2019; WALSH, 2012).
RepeRcussão no contexto bRasileiRo
Reportando-se aos fundamentos gerais do conhecimento,
essa nova perspectiva de pensar vem se colocando na teoria e na prática
dos vários campos do conhecimento e das correspondentes atividades
humanas. Também no Brasil, já se identicam algumas iniciativas
teóricas, promovendo um investimento que vai na direção do reforço da
empreitada de decolonização do pensamento latino-americano. Trata-
se, então, da participação desses autores brasileiros junto ao processo de
reexão sobre a realidade nacional, implementando a prática sob essa nova
abordagem epistemológica, o que vem ocorrendo em diferentes campos
do conhecimento. Podem ser citados, então, como se inspirando nesse
movimento de decolonização, autores como Fernanda Bragato, no campo
do Direito, Luciana Balestrini, no campo sócio-político, Gilberto Ferreira,
no campo da Educação, José Eustáquio Romão e Manuel Tavares, no
campo da Filosoa.
implicações paRa a filosofia da educação
Daí a tarefa que se impõe à Filosoa da Educação de rever sua
dimensão epistemológica. É que a Educação, até mais que os outros
campos, é profundamente enraizada no modo de ser especíco de cada
sociedade e é a partir dessa condição que ela precisa ser pensada, já que dela
se espera justamente a maneira pela qual as pessoas vão se portar, teórica e
praticamente, frente à realidade histórica concreta.
Obviamente no caso desse reequacionamento do olhar losóco-
educacional, haverá sempre aproximações reais entre o que se pensa em
outros contextos sociais e o que se pode pensar aqui. Isso porque muitas
condições históricas concretas se repetem, têm muitas semelhanças nas
diversas sociedades do planeta, sob os mais variados aspectos. Mas para
que haja um efetivo diálogo, com enriquecimento das partes dialogantes, é
preciso que cada parte conheça bem seu próprio contexto e tenha segurança
quanto a seu posicionamento.
| Alonso Bezerra de Carvalho, Cláudio Roberto Brocanelli e Genivaldo de Souza Santos (Org.)
24 |
Aqui entra, então, a decorrente postura das premissas acima
colocadas. As relações entre as culturas não será mais a imposição
monocultural nem a justaposição multicultural de logosferas diferentes,
mas necessariamente uma relação de interculturalidade, entendida esta
como um processo de intercâmbio e de interação entre culturas diferentes,
em que todas as partes interagentes possam se enriquecer, o que supõe
conhecimento e reconhecimento mútuos.
Assim, quando abordamos a obra de um pensador estrangeiro,
por exemplo, de Rousseau ou Deleuze, não pode estar em pauta a busca de
um modelo explicativo autônomo e automaticamente válido por si mesmo,
mas, sobretudo, o conhecimento de uma experiência de pensamento que
possa interagir com nossas experiências que também vivenciamos em nosso
contexto especíco, a ser sempre levado em conta.
Concluindo, sintetizo minha compreensão da tarefa no âmbito de
um pensamento decolonizante que se impõe para o exercício da Filosoa
da Educação nessa circunstância: cabe-lhe assumir, então, três grandes
perspectivas. A primeira perspectiva diz respeito à sua condição de etno-
conhecimento, a segunda concerne à exigência da interculturalidade em sua
prática e a terceira impõe a demanda de um compromisso emancipatório.
a) a filosofia da educação numa peRspectiva etno-filosófica
Por perspectiva etno-losóca, entende-se a prática do
conhecimento a partir das raízes culturais da própria comunidade em
sua real condição histórico-social. Para tanto, impõe-se uma postura de
questionamento e superação do silenciamento imposto ao pensamento
nativo pela intervenção colonizadora que produziu o sufocamento das
formas de expressão das culturas locais pré-existentes à chegada dos
europeus e impediu que a comunidade latino-americana, que se formou
ao longo dos últimos 500 anos, constituísse uma identidade própria
e trilhasse caminho diferente daquele traçado pela matriz cultural do
colonizador. (CANDAU, 2010; CASTRO GÓMEZ; GROSFO-GUEL,
2007; D´AMBROSIO, 2000; FORNET-BETANCOURT, 2004; SILVA
2006; WALSH, 2012).
Pensamento Latino-Americano e Educação: por uma ética situada |
| 25
o multicultuRalismo como Reconhecimento da diveRsidade das
cultuRas:
Esta é a grande contribuição do multiculturalismo ao armar a
existência de múltiplas culturas, merecedoras todas de reconhecimento.
Com isso questionando radicalmente a legitimidade de qualquer uma das
culturas se impor como mais valiosa sobre as demais. E isso no concernente
a todos os aspectos da vida cultural, como é o caso das duas dimensões
existenciais que nos interessam neste momento, a educação e da losoa.
Esta consciência e esse pressuposto de que desconhecer a cultura
nativa dos sujeitos, particularmente dos sujeitos educandos, é destruir a
identidade dos mesmos. Impõe-se reconhecer e valorizar as expressões
culturais particulares de todos os agrupamentos humanos, não só por
uma razão epistemológica evitando, assim, todas as formas de etnocídio
epistêmico, mas também por razões éticas e políticas, pois sem a garantia
de sua identidade, as pessoas humanas não podem ser autônomas, livres e
emancipadas.
Mas, o multiculturalismo perde toda sua legitimidade se ele se
reduzir a pura armação da presença das diferentes culturas, transformadas
em novos Narcisos coletivos. É preciso assegurar a intercomunicação
entre elas. O multiculturalismo precisa se expressar concretamente como
interculturalismo
Tem toda procedência a conclusão de D´Ambrosio, ao armar que
O multiculturalismo está se tornando a característica mais
marcante da educação atual. Com a grande mobilidade de pessoas e
famílias, as relações interculturais serão muito intensas. O encontro
intercultural gera conitos que só poderão ser resolvidos a partir
de uma ética que resulta do indivíduo conhecer a sua cultura e
respeitar a cultura do outro. O respeito virá do conhecimento. De
outra maneira, o comportamento revelará arrogância, superioridade
e prepotência, o que resulta, inevitavelmente, em confronto e
violência. (2000, p. 151-152).
É só dessa maneira que a educação se legitima. Lutar hoje
contra a discriminação, contra a opressão, contra o preconceito e contra a
exclusão implica pleitear uma educação que se comprometa em investir os
| Alonso Bezerra de Carvalho, Cláudio Roberto Brocanelli e Genivaldo de Souza Santos (Org.)
26 |
resultados do conhecimento na construção da cidadania, signicando isso
a formação de um sujeito autônomo, fonte de seu próprio agir, e situado
numa sociedade democraticamente estruturada, que não seja apenas um
lugar de heteronomia.
Vemos, então, que a origem da opressão, da perseguição, da
discriminação, dos preconceitos e de todos os estigmas que se abatem
sobre homens e mulheres está no fato da transformação da diferença em
desigualdade. A diferença histórica entre as pessoas, demonstração da
diversidade, transforma-se em desigualdade valorativa, o que é tomado
como justicativa pelos mais fortes, pelos mais poderosos, para o exercício
concreto do poder, realizado como dominação.
Sempre em pauta a diculdade do reconhecimento da alteridade,
como singularidade do outro, e o respeito decorrente da igualdade a ser
reconhecida. Somos todos iguais embora diferentes. Esta incapacidade
de superar o etnocentrismo, que fecha o observador e o dominador na
identidade de seu próprio modo cultural de ser, se fez presente nos mitos,
nas religiões, na losoa e na própria ciência, por mais contradições políticas
e morais que seus “conhecimentos” pudessem provocar. No caso da ciência
moderna, os reducionismos biologistas levaram à pretensa fundamentação
das diferenças em termos de leis da própria vida, desconhecendo a dimensão
sócio-cultural que as produziram.
b) a exigência de uma pRática inteRcultuRal de pensamento
Por perspectiva intercultural, entende-se a postura de que,
uma vez reconhecidas a pluralidade e a diversidade existentes em nosso
contexto, se proceda à busca e ao investimento estratégicos com vistas
a uma efetiva interação e convivialidade entre essas múltiplas culturas,
numa relação mais horizontal de reconhecimento e respeito mútuos, sem
hierarquização e hegemonia entre elas (CANDAU; RUSSO, 2010; SILVA,
2006; WALSH, 2012).
Na complexa tessitura da sociedade multicultural da América
Latina, a via que se vislumbra é aquela de uma práxis intercultural, ou
seja, do compromisso da teoria e da prática com um pensar e um agir que
reconheçam a consistência, a autonomia e a validade de todas as expressões
culturais com presença efetiva na realidade histórica, admitindo-se que
Pensamento Latino-Americano e Educação: por uma ética situada |
| 27
podem entrar em relação entre si, num processo de profícuo intercâmbio,
sem impor, umas às outras, qualquer ideia, prática ou norma heterônomas
que não sejam decorrência de decisão negociada entre iguais.
Esse diálogo horizontal, essa possível negociação, pressupõe, para
os indivíduos e grupos, conhecimento e respeito mútuos, como reforça
D’Ambrósio, ao falar da educação:
O encontro intercultural gera conitos que só poderão ser resolvidos
a partir de uma ética que resulta do indivíduo conhecer a sua cultura
e respeitar a cultura do outro. O respeito virá do conhecimento. De
outra maneira, o comportamento revelará arrogância, superioridade
e prepotência, o que resulta, inevitavelmente, em confronto e
violência. (2000, p. 151-152).
É verdade histórica que as relações das culturas entre si nem
sempre se dão de modo harmonioso, até em função da tendência das
culturas mais fortes se imporem sobre as mais frágeis, a se congurar
como cultura hegemônica, como se fosse uma cultura superior, digna a
ser respeitada como cultura universal, e, portanto, única. De seu lado,
muitas vezes, as culturas oprimidas, para armarem sua identidade
e autonomia, acabam se fechando sobre si mesmas, assumindo uma
perspectiva monoculturalista, questionando a possibilidade do diálogo
sem dominação com as outras culturas. Também a losoa corre este
risco quando se quer praticar como etnolosoa.
No caso mais especíco do pensar losóco, a postura
intercultural pressupõe a admissão de que o conhecimento humano
se enraíza em contextos histórico-sociais bem concretos das diferentes
culturas, não procedendo condoreiramente de um logos universal que
dispensasse qualquer vinculação às culturas singulares. Leio, nessa
direção, as armações incisivas de Raul Fornet Betancourt quando, ao
tratar da prática da losoa na América Latina, fala em “superar o uso
colonizado da razão, que continua cúmplice da herança colonial” (2004,
p. 13), que mantém “a vigência normativa do cânone estabelecido pela
tradição acadêmica centro-europeia na metodologia losóca” (2004,
p. 24), quando se desconhece o que é pensado, falado e escrito nas
línguas nativas.
| Alonso Bezerra de Carvalho, Cláudio Roberto Brocanelli e Genivaldo de Souza Santos (Org.)
28 |
Por isso mesmo, a Filosoa da Educação não pode se isolar na
sua ilha geográca ou cultural. É preciso que ela se situe numa perspectiva
intercultural, distinta tanto da perspectiva monocultural como daquela
puramente policultural. Trata-se então de praticar um universalismo
crítico, segundo o qual cada cultura é vista e avaliada em sua qualidade
especíca e em função da contribuição que pode dar para a construção de
uma cultura universal. Cada cultura particular consolida sua identidade na
medida mesma em que pode contribuir para o aprimoramento da cultura
universal a ser construída historicamente, pois esta não é ainda dada,
portanto, na medida em que participa da implementação de um projeto
antropológico de construção do humano, esta sim uma tarefa universal,
pois se trata do delineamento de caminhos de condução do destino de toda
a humanidade (CARVALHO, 1992; LIMA VAZ, 1988; MOUNIER,
2004; SEVERINO, 2001).
Assim, a Filosoa da Educação, ao se conceber e se praticar como
etnolosoa, não se confunde com uma postura etnocentrista, em torno da
cultura particular da qual parte e sobre a qual se sustenta. Por isso, o losofar
compromissado com a emancipação e com a construção da autonomia de
todos os sujeitos precisa se instaurar numa dupla perspectiva. Ele se quer
como uma etnolosoa, na medida em que sua narrativa tem raízes em seu
próprio solo geográco e cultural, mas, ao mesmo tempo e sob o mesmo
impulso, ela se expressa sob uma outra perspectiva mais complexa, a da
interculturalidade. Não se trata mais de se diluir numa suposta losoa
universal que, na realidade ocidental, não passou da imposição forçada
de um losofar eurocentrado, nem se isolar num pensar autossuciente e
incomunicável, que não estabelece pontes com outros pensamentos. Trata-
se de um discurso dialogante, que supõe a alteridade e com ela estabelece
comunicação. O diálogo losóco se constitui no seio da matriz de um
diálogo intercultural
A decolonização é condição sine qua non para uma autêntica
interculturalidade. Por isso, o investimento educativo pressupõe um
posicionamento crítico frente ao eurocentrismo, em todas as esferas da
existência: do poder, do saber e do ser. Por isso, a educação precisa envolver
estratégias políticas, éticas e epistêmicas, engajando-se numa luta sem
trégua contra todas as formas de ação colonizadoras, assumidas sob um
pensamento hegemônico ocidentalocêntrico monocultural, de pretensão
Pensamento Latino-Americano e Educação: por uma ética situada |
| 29
universalista. Trata-se então de questionar e descartar as propostas de ação
intercultural de cunho funcionalizante, ou seja, aquela interculturalidade
funcional para o sistema hegemônico vigente, o capitalismo neoliberal,
no caso da América Latina. São propostas de diálogo, de convivência,
marcadas pela tolerância e pelo esforço em evitar conitos. Tais processos
são compatíveis com a lógica do atual modelo neoliberal do capitalismo,
ocultando as contradições que tecem a realidade social, diluindo as
diferenças efetivamente presentes na diversidade. Mas não passam de
estratégias para se manter a colonialidade de nossa existência histórica.
c) a necessáRia peRspectiva emancipatóRia
Isso só poderá ocorrer se a losoa praticada se compromissar
com um processo pedagógico e político de emancipação dos homens
historicamente situados, engajando-se numa tarefa educacional e política
consistente, compartilhando o projeto de assumir a complexidade da
condição humana, propondo a se praticar como sustentadora de uma
modalidade de etno-conhecimento e como uma abordagem intercultural
do conhecimento. A concepção teórica e as experiências práticas da
etno-losoa suscitam uma intervenção epistêmica e pedagógica muito
mais abrangente do que o próprio campo do conhecimento cientíco,
demandando e envolvendo toda uma postura losóca. Põe em ação
uma reexão losóca, que recorta as esferas do epistemológico, do
antropológico, do sociológico, do político, do ético, em suma, de toda a
esfera cultural. Incluindo uma postura losóca critica à hegemonia da
racionalidade ocidental e uma armação da necessidade de se implementar
práticas de racionalidades silenciadas pela dominação epistemológica da
losoa do Ocidente europeu e norte-americano, a tarefa da Filosoa da
Educação não pode ser outra se não a de contribuir para preparar as novas
gerações, às quais cabe construir uma civilização mais adequada à condição
humana de imanência objetiva no mundo, aberta à transcendência subjetiva
no existir histórico-social.
É só dessa maneira que a educação se legitima. Lutar hoje
contra a discriminação, contra a opressão, contra o preconceito e contra a
exclusão implica pleitear uma educação que se comprometa em investir os
resultados do conhecimento na construção da cidadania, signicando isso
| Alonso Bezerra de Carvalho, Cláudio Roberto Brocanelli e Genivaldo de Souza Santos (Org.)
30 |
a formação de um sujeito autônomo, fonte de seu próprio agir, e situado
numa sociedade democraticamente estruturada, que não seja apenas um
lugar de heteronomia.
É íntima a aproximação que os teóricos modernos zeram entre
democracia e o caráter público da atuação do Estado (por isso mesmo,
deveria ser preferencialmente uma res publica), mediante a qual poderia
assegurar a todos os integrantes da sociedade o acesso e o usufruto
dos bens humanos, garantindo a todos, com o máximo de equidade,
o compartilhamento do bem comum. No entanto, essa expectativa
tende a frustrar-se continuamente, tal a fragilidade do direito em nossa
sociedade. A experiência histórica da sociedade brasileira foi e continua
sendo marcada pela realidade brutal da violência, do autoritarismo, da
dominação, da injustiça, da discriminação, da exclusão, enm, da falta do
direito. É assim que o nosso não tem sido um Estado de direito, ele sempre
foi, sob as mais variadas formas, um Estado de fato, onde as decisões são
tomadas e implementadas sob o império da força e da dominação. Não é
um agenciador dos interesses coletivos e muito menos dos interesses dos
segmentos mais fracos da população que constitui sua sociedade civil. Na
verdade, as relações de poder no interior da sociedade brasileira continuam
moldadas nas relações de tipo escravocrático que a fundaram, aquelas
relações do tipo “casa grande e senzala”, metáfora que é, na verdade,
descrição cientíca.
conclusão
A destinação de uma Filosoa da Educação criticamente concebida
e praticada não pode ser outra se não a de contribuir para preparar as novas
gerações às quais cabe construir uma civilização mais feliz. O que ela só
poderá fazer se se compromissar com um processo pedagógico e político
de emancipação dos homens historicamente situados. É o que se vislumbra
pela utopia de uma nova realidade social, de um outro mundo em que
indivíduos, sociedades e natureza se relacionem de modo a garantir um
bem viver, que vêm propondo os pensadores da decolonização.
Daí o compromisso da Filosoa de se engajar numa tarefa
educacional e política consistente, compartilhando o projeto de assumir
a complexidade da condição humana, propondo a se praticar como
Pensamento Latino-Americano e Educação: por uma ética situada |
| 31
sustentadora de uma modalidade de etnoconhecimento e como uma
abordagem intercultural do saber, do poder e do existir. Compromisso de
se praticar também como Filosoa da Educação.
A concepção teórica e as experiências práticas da etnolosoa
suscitam uma intervenção epistêmica e pedagógica muito mais abrangente
do que o próprio campo do conhecimento cientíco, demandando e
envolvendo toda uma postura losóca e educacional. Põe em ação
uma reexão losóca, que recorta as esferas do epistemológico, do
antropológico, do sociológico, do político, do ético, em suma, de toda a
esfera cultural.
Não há como não reconhecer, implícita nessa postura losóca,
uma crítica à hegemonia da racionalidade ocidental e a armação da
necessidade de se implementar práticas de racionalidades silenciadas pela
dominação epistemológica da losoa do Ocidente europeu.
Trata-se de reconhecer e armar a existência de múltiplas culturas
que se manifestam como expressões de logosferas particulares, próprias de
cada uma delas. Daí a necessária crítica à pretensão de universalismo da
epistemologia fundada na logosfera da tradição ocidental, pleiteando-se
para a losoa latino-americana uma perspectiva epistemológica fundada
em sua experiência, vivenciada e elaborada pela sua própria logosfera.
RefeRências
BALLESTRIN, Luciana. América Latina e o giro decolonial. Rev. Bras. Ciênc. Polit.,
Brasília, n. 11, p. 89-117, maio/ago. 2013.
CANDAU, Vera M.; RUSSO, Kelly. Interculturalidade e Educação na américa latina:
uma construção plural, original e complexa. Rev. Diálogo Educ., Curitiba, v. 10, n. 29,
p. 151-169, jan./abr. 2010.
CARVALHO, Adalberto D. de. A Educação como projecto antropológico. Porto:
Afrontamento, 1992.
CASTRO-GÓMEZ, Santiago; GROSFOGUEL, Ramón. (org.). El giro decolonial:
reexiones para una deversidad epistémica más allá del capitalismo global. Bogotá: Siglo del
Hombre, 2007.
D´AMBROSIO, U. Etnomatemática: uma proposta pedagógica para a civilização em
mudança. In: CONGRESSO BRASILEIRO DE ETNOMATEMÁTICA, 1., São
Paulo. Anais [...].o Paulo: Feusp, 2000. p. 143-152.
| Alonso Bezerra de Carvalho, Cláudio Roberto Brocanelli e Genivaldo de Souza Santos (Org.)
32 |
DUSSEL, Enrique; MENDIETA, Eduardo; BOHÓRQUEZ, Carmen (ed.). El
pensamiento losóco latinoamerciano del Caribe y “latino” (1300-2000): historia,
corrientes, temas y lósofos. Mexico/Maracaibo: Siglo XXI, 2008.
FORNET-BETANCOURT, R. Interculturalidade: críticas, diálogos e perspectivas.
Tradução de Angela Tereza Sperb. São Leopoldo: Nova Harmonia, 2004.
LIMA VAZ, Henrique C. de. Escritos de Filosoa II. São Paulo: Loyola, 1988.
MOUNIER, Emmanuel. O Personalismo. São Paulo: Centauro, 2004.
SEVERINO, Antonio J. Educação, sujeito e história. São Paulo: Olho d´Água, 2001.
SEVERINO, Antonio J.; MARCONDES, Ofélia M. (org.). Filosoa da Educação na
América Latina: aproximações, diálogos e perspectivas. São Paulo: Cartago, 2019.
SILVA, Gilberto F. da. Cultura(s), currículo, diversidade: por uma proposição
intercultural. Contrapontos, Itajaí-Univalli, v. 6, n. 1, p. 137-148, jan./abr. 2006.
WALSH, Catherine. Interculturalidad y (de) colonialidad: perspectivas críticas y
políticas. Visão Global, Joaçaba, v. 15, n. 1-2, p. 61-74, jan./dez. 2012.
| 33
E    
 
José Alejandro Tasat
UNTREF/Argentina
“Evidentemente, el discurso losóco tiene un solo sujeto,
y éste será un sujeto cultural. Mejor dicho,
la losofía es el discurso de una cultura que encuentra su sujeto.”
(KUSCH, 2007).
apRoximaciones a pensaR
Pensar es olvidar diferencia, es generalizar, abstraer”, arma
Jorge Luis Borges, en “Funes el memorioso
1
. Si seguimos la lógica de su
armación, pensar es recordar semejanza. Se propone pensar los aportes de
los pensadores americanos al ideario ilusorio de la modernidad desde un
 BORGES.Jorge Luis. Ficciones. Buenos Aires: Emecé, 1944.
| Alonso Bezerra de Carvalho, Cláudio Roberto Brocanelli e Genivaldo de Souza Santos (Org.)
34 |
abordaje geocultural, aportando desde las acciones, las cosas y los sujetos
culturales; relacionando la identidad, el territorio, el símbolo y la comunidad.
Se trata de pensar en y desde América en tanto el pensamiento
desarraigado de nuestra tierra y des-gravitado de nuestro horizonte cultural
fundamentó la implementación de políticas hegemónicas, económicas-
sociales y culturales, que tomaron como referencia una noción de cultura y
de sujeto cultural formulada en otros contextos, y, por tanto, desconectada
de los problemas, particularidades y tensiones propias del territorio y los
mundos que constituyen la América Profunda.
Esto ha sido posible en el acaecer de aquello que Quijano (2014)
denomina “colonialidad del saber”, práctica impulsada por la ciencia
moderna y su imperio epistemológico, es decir, su auto-referencia como
única forma de acceso al conocimiento riguroso y, por tanto, la postulación
de sus resultados como los únicos válidos. A partir de los aportes de
Quijano, Catherine Walsh señala: “La producción cientíca se considera,
así, detentora de una verdad que abre las puertas para la comprensión real
de los fenómenos sociales, por medio de procedimientos universalizables,
abstractos y sistemáticos. Esta pretensión universal de la ciencia moderna
esconde algo importante: su localización. Esto quiere decir que la ‘historia
del conocimiento está marcada geo-históricamente, geo-políticamente y
geo-culturalmente; tiene valor, color y lugar ‘de origen” (WALSH, 2004).
¿existe filosofía o pensamiento en nuestRa améRica?
Salasar Bondy publica su libro “¿Existe una losofía de nuestra
América?”, en 1968. Carlos Ossandón, en su libro “¿Qué se entiende por
losofía americana?”, propone pensar cuando se referencia a la losofía
americana, se está aludiendo a tres cosas diferentes: a la losofía “en
América, a la losofía “acerca” de América y a una losofía “de” América
(SANTOS HERCEG, 2010).
José Santos Herceg (2010) en “Conicto de Representación:
América Latina como lugar para la losofía” propone preguntarse qué se
entiende por América Latina y cómo se la concibe para poder pensar el
modo en que esta inuye sobre el pensamiento y su losóca. América
Latina es un lugar que es y puede ser muchos lugares, se trata de las
diversas representaciones que da lugar. Un espacio es muchos lugares y de
Pensamento Latino-Americano e Educação: por uma ética situada |
| 35
allí las múltiples formas de representarla y de nombrarla (Latinoamérica,
Indoamericana, América Morena, Iberoamérica, etc.).
Arturo Roig menciona en su libro “La Idea Latinoamericana
de América”, que desde el comienzo en América Latina conviven dos
representaciones contradictorias, una como defensa frente a la amenaza de
invasión y también adquiere un sentido de dominio en el contexto de la
ideología del panlatinoamericanismo. Dos lugares antagónicos conviven:
el de la amenaza de dominio y el de la reacción y defensa. Nuevo Mundo
y Nuestra América (ACOSTA, 2012).
Decir América en tanto nuevo mundo es decir con ello un territorio
que fue soñado, inventado, invadido. Decir América en tanto Nuestra América
supone nombrar una tierra ignorada, un sueño de unidad como resistencia,
autonomía independencia. La losofía de Nuestra América es diferente y
antagónica a la del Nuevo Mundo marcada por una reexión dominadora y
colonizada. La losofía de Nuestra América aparece en el lugar de la amenaza
y el dolor, y el de resistencia y emancipación (ACOSTA, 2012).
No tiene sentido seguir hablando de descubrimiento a menos
que sea por razones históricas y tampoco hablar de encuentro entre dos
culturas porque un encuentro, como dice Enrique Dussel
2
, supone un cara
a cara de personas que van a una hacia la otra en términos de igualdad y
respeto. Lo que caracteriza ese encuentro es un encuentro de desigualdad,
conquista y violencia. El europeo se sitúa como superior, y se propone
civilizar” a los barbaros (DUSSEL, 2007).
O´Gorman propuso la idea de que América no fue descubierta
sino inventada. América provee el tiempo y el espacio para el mito y la
utopía, los hace tangibles. Reedita y actualiza las viejas leyendas, la Edad
de Oro, el Paraíso Terrenal, La fuente de la Juventud, el Dorado. Colón
declara haber anclado en el Paraíso Terrenal. Estos mitos serán un motor
fundamental para la conquista posterior a la llegada de Colón. El nuevo
mundo es el lugar de la resurrección del mito clásico, es el espacio de la
nueva utopía, una tierra sin historia para el europeo donde todo puede
hacerse. Este espacio No-Europa en el sentido de Europa perfecta sin vicios
ni corrupción (SANTOS-HERCEG, 2010).
Pensamiento americano UNTREF. Pensar en Movimiento. Disponible: http://untref.edu.ar/
pensarenmovimiento/capitulo6.html. Acceso en: 23 abr. 2020. DUSSEL/ González - Trayectorias y mundos
culturales. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=LBAjZHyDmuI. Acceso en: 23 abr. 2020.
| Alonso Bezerra de Carvalho, Cláudio Roberto Brocanelli e Genivaldo de Souza Santos (Org.)
36 |
América entra a la historia universal (la europea) en forma
equivocada, disfrazada. De hecho, ingresa tan equivocada que toma el
nombre de un “descubridor” que ni siquiera es tal: Américo Vespucio. El
conquistador nomina, abandona los nombres de los pueblos ancestrales,
Nueva Granada, Nueva España, Nueva Toledo. Se re-descubre y re-bautiza
todo. El nombre es otorgar la esencia, la denición, es dar existencia. Se
nombra para apropiarse, para ubicar, para controlar. Nombrar América, lo
americano es un proceso de ejercicio de poder.
Filosofar en el Nuevo Mundo es hacerlo en una tierra cuyo
nacimiento está marcado por la invasión, por la imposición, por la
violencia. La losofía del nuevo mundo es una reexión que se sobrepone,
se adueña del espacio. La losofía europea se trasplanta a América, se la
exporta imponiéndola como “La Filosofía”, como losofía colonizadora,
teocéntrica y eurocéntrica. El caso paradigmático es el de la losofía de la
conquista. Es una reexión sometida, dominada, colonizada, acorralada
por el pensamiento europeo, que es una mera copia o imitación, losofar
en el Nuevo Mundo se reduce a repetir, una losofía plagiaria que instaura
un aparato hegemónico en nombre de la normalización losóco.
3
“nuestRa améRica
“Nuestra América”, publicado en 1891 por José Martí, condensa
un programa revolucionario e independentista. Yamandú Acosta (2012)
propone analizarlo como un ensayo transmoderno y portador de un
programa transmoderno con el consecuente potencial revolucionario capaz
de trascender los límites de la modernidad. Plantea esto porque desde su
perspectiva Martí no fundamenta la incorporación a la modernidad a través
de un sometimiento a la ley como condición de posibilidad de la autonomía,
sino una superación de la modernidad en una perspectiva que implica un
discernimiento de la ley desde el ejercicio de la autonomía radical.
Dussel (2007) interpela la superación de modernidad no
como postmodernidad que ataca la razón desde el irracionalismo de la
inconmensurabilidad, sino como transmodernidad que ataca como
SALAS, R. Pensar américa en diálogo. In: CONGRESO INTERNACIONAL INTERDISCIPLINARIO
DE PENSAMIENTO CRITICO, 1, Santiago de Chile, oct. 2014. Disponible: https://www.youtube.com/
watch?v=kEbDrte1wSA. Acceso en: 23 abr. 2020.
Pensamento Latino-Americano e Educação: por uma ética situada |
| 37
irracional a la violencia de la Modernidad. Y para ello es necesario negar
la negación del Mito de la Modernidad. La cara negada de la modernidad
debe juzgarse como inocente y juzgar a la modernidad como culpable de
la violencia sacricadora, conquistadora, esencial. Negar la inocencia de la
modernidad permite descubrir la otra cara oculta, la del mundo periférico,
el indio sacricado, la mujer oprimida, la cultura popular alienada.
El imperialismo, con la lógica de la expansión y profundización de
la modernización capitalista, construye una lógica constructiva destructiva
que alcanza su mayor grado de visibilidad con la globalización capitalista. En
José Martí nuestro autotransformación a través de la superación de nuestra
condición individualista es condición fundamental para nuestra realización
como sociedad y cultura. Esta autotrasformación es condición para tomar
conocimiento de “Los gigantes que llevan siete leguas en sus botas” o sea de las
amenazas que se ciernen sobre nosotros y nuestro mundo (ACOSTA, 2012).
Ante el capitalismo y el imperialismo se impone una celosa vigilia
como mejor posibilidad de neutralizar las amenazas. Las armas del juicio
vencen a las otras y la trinchera de ideas valen más que las trincheras de
piedras. Las armas del juicio reeren a la capacidad de juzgar, de discernir,
que vencen a las otras que aportan la razón de la fuera, la fuerza de la razón
termina imponiéndose.
Potenciar las armas del juicio y las trincheras de ideas no quiere decir
plegarse a los procesos de constitución de la “sociedad del conocimiento” que
parece revalidar el mito del progreso de la modernidad capitalista. Martí
propone constituirse como una sociedad del pensamiento que permita una
distancia crítica de imperialismo y de la modernidad capitalista.
José Martí establece que hay formas de subjetividad alienadas
(aquellas que se niegan americanas) y también hay instituciones y formas
de gobierno alienadas y alienantes con el espíritu de nuestra América. Son
instituciones que provienen de otras realidades y que se aplican de manera
imitativa a realidades disimiles y fracasan dando lugar a experiencias de
desgobierno. Y estos fracasos son depositados su culpa en las condiciones
históricas sociales y no en las instituciones. Se trata de la constitución de
un “pueblo” que es en denitiva el nosotros, no el pueblo de la modernidad
de las constituciones republicanas, sino un pueblo transmoderno como en
las constituciones plurinacionales del siglo XXI.
| Alonso Bezerra de Carvalho, Cláudio Roberto Brocanelli e Genivaldo de Souza Santos (Org.)
38 |
civilización o baRbaRie
En “Nuestra América”, José Martí enuncia: no hay batalla entre la
civilización y la barbarie sino entre la falsa erudición y la naturaleza.
Se trata del mito del progreso de la modernidad en que la
civilización y la barbarie no describen realidades distintas, sino oponen lo
superior con sentido de futuro que debe ser, con lo inferior y negativo con
sentido de pasado, que debe dejar de ser.
Civilización se entiende como falsa erudición, mientras que
barbarie es traducida como naturaleza, civilización o falso lugar de superior
como lugar inadecuado, y barbarie o naturaleza como el lugar epistemológico
desde donde se ha hecho posible el discernimiento de la falsa erudición.
No se enseña la historia inca, pero si la griega. El conocimiento tiene un
valor práctico, conocer es resolver, el sujeto de conocimiento es un sujeto
de la acción, ante los problemas se activa, ya no es una falsa erudición.
La colonia está presente en la actualidad de la república, como
factor determinante en la identidad republicana de los países de nuestra
América. Constituir una república no es un documento fundacional
como es la constitución, en la república sobreviven elementos, hábitos
y estructuras coloniales. Constituir la república supone una permanente
confrontación con la colonia y las lógicas coloniales. No hay choque de
civilización como tampoco hubo choque civilización o barbarie, hay una
lucha defensiva de la humanidad ante el cada vez más agresivo y ofensivo
ataque de la civilización capitalista.
Pensar en América es hacerlo “desde” y “sobre” ella. Si se piensa
desde ella, pero no “en América”, es un pensamiento americano en tanto el
sujeto que lo produce. Si se piensa sobre ella, pero no desde ella estamos en
un pensamiento americano por su objeto pero que se puede ejercer desde
circunstancias culturales distintas y distantes. No obstante, el pensamiento
americano pareciera tener una nota distintiva de autenticidad por lo que ese
sujeto del pensar expresa una cultura autentica. Pensar en América es hacerlo
desde” y “sobre” ella. Si se piensa desde ella, pero no “en América”, es un
pensamiento americano en tanto el sujeto que lo produce. Si se piensa sobre
ella, pero no desde ella estamos en un pensamiento americano por su objeto
pero que se puede ejercer desde circunstancias culturales distintas y distantes.
Pensamento Latino-Americano e Educação: por uma ética situada |
| 39
No obstante, el pensamiento americano pareciera tener una nota distintiva de
autenticidad por lo que ese sujeto del pensar expresa una cultura autentica.
Si la consigna pensar en América excluye a Estados Unidos y
oculta a Canadá, es una orientación latinoamericanista donde EEUU se
establece como otro. En cambio, si no se lo excluye, estaríamos en presencia
de un pensamiento panamericanista en tensión con el latinoamericanismo
que se instituye como un nacionalismo de la gran nación latinoamericana.
Cuando se habla de las Américas, se está en esta liación panamericanista.
Pensar en América debe ser apreciado como pensar Nuestra
América es decir sobre nuestros modos históricos de objetivación, que
implican procesos, estructuras, instituciones y por lo tanto es un pensar
sobre el nosotros dado y el nosotros utópico que lo acompaña como
condición de posibilidad.
Este pensar tiene el carácter de la reexión que no excluye el
análisis, sino que lo subsume. Frente a la perspectiva del análisis que supone
la relación sujeto-objeto (matriz dualista de la lógica de la modernidad), la
perspectiva de la reexión supone la relación sujeto-sujeto donde el sujeto
de análisis no se siente por fuera y por encima del objeto que considera,
sino que se siente y se sabe involucrado en la problemática.
Pensar en América implica pensar relaciones intersubjetivas y
también las instituciones que median esas relaciones. Es un pensar a través
del cual el nosotros se auto constituye. La perspectiva de universalismo
concreto del nuestramericanismo incluirá a todos los nosotros cuya
armación no excluya la posibilidad de armación de otros nosotros,
de manera que esos muchos nosotros sean posibles. Al interior de cada
nosotros se tratará de transformar las relaciones deshumanizantes en otras
humanizantes que impliquen la posibilidad de vivir con dignidad. Nuestra
América entre las profundizaciones de la modernidad y las emergencias de
la trans-modernidad.
apoRtes de pensadoRes ameRicanos
Kusch (2007) plantea en la oposición ser-estar, la dicotomía
fundacional y más original de su pensamiento. Esta distinción, tomada
| Alonso Bezerra de Carvalho, Cláudio Roberto Brocanelli e Genivaldo de Souza Santos (Org.)
40 |
inicialmente de Canal Feijóo
4
, pero profundizada radicalmente, indica el
rasgo decisivo que separa y tipica a América en oposición a la manera de ser
occidental. Hay cientos de referencias para explicar el ser y el estar en la obra
de Kusch, la más clara es aquella de Indios, porteños y dioses, llamada “La espera
en la chichería” en la cual Kusch opone la espera del indio, con su chicha y
su embriaguez a la vida del porteño de sectores medios que se pierde en la
impaciencia. En efecto, mientras en Buenos Aires ocupamos todos los espacios
y nos movemos vertiginosamente en una carrea por ser alguien, el indio, dice
Kusch, meramente está. Y arma Kusch (2007): “Nos sentimos satisfechos de
las cosas logradas en los últimos años: algún título, alguna propiedad, algunos
libros más, algún traje nuevo o algún cargo. Nos gusta pensar en esas cosas.
Decimos que al n y al cabo hemos puesto nuestro esfuerzo para ser alguien.
Hacemos otro esfuerzo y pensamos mal de la gente que se deja estar. Pensamos
incluso que el indio es una mala persona porque se deja estar, porque nada hace
por mejorar su situación. Y también aquí en Buenos Aires hay mucha gente
que hace lo mismo. Todo ese pueblo del tango, el del fútbol…todos ellos se
dejan estar y, entonces, cómo van a progresar. Y pensamos “yo en cambio hago
mis cosas, estudio, trabajo, lucho” […] Gritamos para nuestros adentros “yo
soy alguien y esa gente se deja estar
La fagocitación es como lo dice en América Profunda (2007),
“hay una fagocitación de ser por el estar en América”. Un ejemplo lo pone
en su libro “Geocultura del hombre americano en el cual da cuenta de un
complejo ritual que se lleva adelante frente a la llegada de un camión a
una comunidad campesina. Allí se le arranca el corazón a un cordero y
se queman sus huesos. Se lo viste al camión, se lo llena de dioses – dice
Kusch – y se lo incorpora a la cultura y a la comunidad. Es decir, en donde
un escéptico dice, “ves camión, técnica, dominación”, Kusch propone un
proceso de apropiación, resignicación o fagocitación. Pero esto no opera
solo en el campo de lo indígena, ahí lejos, en alguna comunidad perdida
de Bolivia o de Perú. El estar está denitivamente instalado en nosotros
mismos, en las pequeñas y grandes ciudades.
Bernardo Canal Feijóo fue abogado y escritor argentino; el documento titulado “Connes de occidente” publicado
en 1954. forma parte de la Colección Personal de Rodolfo Kusch y se encuentra en su antigua casa de Maimará,
Jujuy, Argentina. Rodolfo Kusch publica su libro fundacional América profunda en 1962. Adjunto el link del
índice donde uno de los capítulos que inicia en la página 113 se titula Ser, estar. Disponible: http://170.210.60.80/
pergamo/wsvpic/wsvpic.html?pic=/pgmedia/kusch/imagenes/001937_I1.jpg. Acceso en: 23 abr. 2020
Pensamento Latino-Americano e Educação: por uma ética situada |
| 41
Kusch (2007) presenta dos temporalidades (la de la cosecha
y la del progreso) y dos concepciones de mundo articuladas bajo la
perspectiva occidental y la americana. El ideario de progreso que habita en
la cotidianeidad de la ciudad se opone a la espera sagrada de las entrañas
americanas. Esta oposición le permite a Kusch, en primer lugar, dejar en
evidencia la convivencia de dos concepciones de mundo presentes en un
mismo territorio, que denitivamente se imbrican y se habitan. Hablar
de dos mundos aquí hace alusión no a dos creencias sino a dos mundos
establecidos desde lo ético, lo simbólico, lo cultural e incluso, desde lo
perceptivo. En ese sentido, Kusch cuestiona una visión en apariencia
convencional de mundo que se desprendería de la distinción sujeto-
objeto. La consideración occidental del mundo lo dene como “un espacio
vacío lleno de objetos que son percibidos por sujetos” y propone que el
descubrimiento de las leyes que regulan ese mundo, articuladas en el discurso
cientíco, nos sitúan ante la verdad del mundo, con el objeto fundamental
de explicarlo, predecirlo y, nalmente, dominarlo por medio de la técnica.
De allí se desprende nuestra concepción de naturaleza entendida como
recursos naturales. Entonces, la ecuación desde una perspectiva occidental
es una realidad que se da afuera, un conocimiento de esa realidad y una
acción sobre la misma a los nes de dominarla.
Los aportes de Aníbal Quijano (2000) al estudio de las ciencias
sociales fue plantear que América se constituyó como el primer espacio/
tiempo de un nuevo patrón de poder, como la primera identidad de la
modernidad. De esta manera, codica las diferencias entre conquistadores y
conquistados en la idea de raza, una supuesta diferente estructura biológica
que ubicaba a los unos en situación natural de inferioridad respecto de los
otros, los blancos europeos. Esa idea fue asumida por los conquistadores
como el principal elemento constitutivo, fundante, de las relaciones de
dominación que la conquista imponía en América
5
.
“Como en el caso de las relaciones entre capital y pre-capital, una línea similar de ideas fue elaborada
acerca de las relaciones entre Europa y no-Europa. Como ya fue señalado, el mito fundacional de la versión
eurocéntrica de la modernidad es la idea del estado de naturaleza como punto de partida del curso civilizatorio
cuya culminación es la civilización europea u occidental. De ese mito se origina la especícamente eurocéntrica
perspectiva evolucionista, de movimiento y de cambio unilineal y unidireccional de la historia humana. Dicho
mito fue asociado con la clasicación racial de la población del mundo. Esa asociación produjo una visión en
la cual se amalgaman, paradójicamente, evolucionismo y dualismo. Esa visión sólo adquiere sentido como
expresión del exacerbado etnocentrismo de la recién constituida Europa, por su lugar central y dominante en
el capitalismo mundial colonial/moderno, de la vigencia nueva de las ideas miticadas de humanidad y de
progreso, entrañables productos de la Ilustración, y es la vigencia de la idea de raza como criterio básico de
clasicación social universal de la población del mundo.
| Alonso Bezerra de Carvalho, Cláudio Roberto Brocanelli e Genivaldo de Souza Santos (Org.)
42 |
En América, la idea de raza fue un modo de otorgar legitimidad a
las relaciones de dominación impuestas por la conquista. La posterior
constitución de Europa como nueva identidad después de América y la
expansión del colonialismo europeo sobre el resto del mundo, llevó a la
elaboración de la perspectiva eurocéntrica de conocimiento y con ella
a la elaboración teórica de la idea de raza como naturalización de esas
relaciones coloniales de dominación entre europeos y no-europeos.
Históricamente, eso signicó una nueva manera de legitimar las ya
antiguas ideas y prácticas de relaciones de superioridad/inferioridad
entre dominados y dominantes. Desde entonces ha demostrado ser el
más ecaz y perdurable instrumento de dominación social universal,
pues de él pasó a depender inclusive otro igualmente universal, pero
más antiguo, el inter-sexual o de género: los pueblos conquistados y
dominados fueron situados en una posición natural de inferioridad
y, en consecuencia, también sus rasgos fenotípicos, así como sus
descubrimientos mentales y culturales. De ese modo, raza se convirtió
en el primer criterio fundamental para la distribución de la población
mundial en los rangos, lugares y roles en la estructura de poder de la
nueva sociedad. (QUIJANO, 2000).
Los habitantes de América tenían identidad y eran nombrados
por su designación: aztecas, mayas, chimús, aymaras, incas, chibchas,
etc. Trescientos años más tarde todos ellos quedaban reunidos en una
sola identidad: indios. Esta nueva identidad da noción racial, colonial
y negativa. Todos aquellos pueblos fueron despojados de sus propias y
singulares identidades históricas, su nueva identidad racial, colonial y
negativa implicaba el despojo de su lugar en la historia de la producción
cultural de la humanidad, eran pueblos denidos como inferiores,
primitivos con una perspectiva de conocimiento que simbolizaba el
pasado, una epistemología arcaica, primitivo. Esta lógica se aplicó en cada
territorio colonizado en el sistema mundo que orientaban los imperios,
desarrollado por la colonialidad del poder
6
(QUIJANO, 2000).
La confrontación entre la experiencia histórica y la perspectiva eurocéntrica de conocimiento permite señalar
algunos de los elementos más importantes del eurocentrismo: a) una articulación peculiar entre un dualismo
(precapital-capital, no europeo-europeo, primitivo-civilizado, tradicional-moderno, etc.) y un evolucionismo
lineal, unidireccional, desde algún estado de naturaleza a la sociedad moderna europea; b) la naturalización
de las diferencias culturales entre grupos humanos por medio de su codicación con la idea de raza; y c) la
distorsionada reubicación temporal de todas esas diferencias, de modo que todo lo no-europeo es percibido
como pasado. Todas estas operaciones intelectuales son claramente interdependientes. Y no habrían podido ser
cultivadas y desarrolladas sin la colonialidad del poder.
Pensamento Latino-Americano e Educação: por uma ética situada |
| 43
La confrontación entre la experiencia histórica y la perspectiva
eurocéntrica de conocimiento permite señalar algunos de los elementos
más importantes del eurocentrismo: a) una articulación peculiar entre un
dualismo (precapital-capital, no europeo-europeo, primitivo-civilizado,
tradicional-moderno, etc.) y un evolucionismo lineal, unidireccional,
desde algún estado de naturaleza a la sociedad moderna europea; b)
la naturalización de las diferencias culturales entre grupos humanos
por medio de su codicación con la idea de raza; y c) la distorsionada
reubicación temporal de todas esas diferencias, de modo que todo lo no-
europeo es percibido como pasado. Todas estas operaciones intelectuales
son claramente interdependientes y no habrían podido ser cultivadas y
desarrolladas sin la colonialidad del poder.
Los aportes de Freire (1997) al pensamiento americano se ancló
en la educación, donde su premisa “El educador ya no es sólo el que educa
sino aquel que, en tanto educa, es educado a través del diálogo con el
educando […] Es una pena que el carácter socializante de la escuela, lo
que hay de informal en la experiencia que se vive en ella, de formación o
de deformación, sea desatendido.
7
[...] la educación no congura a la sociedad sino que la sociedad
congura a la educación en la medida de los intereses de aquellos
que tienen el poder. [...] Y yo dije que ese concepto de la educación
como un medio para la transformación de la sociedad, me parece
estar basado en la segunda fase del ciclo, en aquella fase en la cual
la educación preserva lo que la sociedad le permite transformar. En
la visión “bancaria” de la educación, el “saber”, el conocimiento,
es una donación de aquellos que se juzgan sabios a los que juzgan
ignorantes. Donación que se basa en una de las manifestaciones
instrumentales de la ideología de la opresión: la absolutización
de la ignorancia, que constituye lo que llamamos alienación de
la ignorancia, según la cual ésta se encuentra siempre en el otro
(FREIRE, 1997).
Hay una dicotomía que convierte a las escuelas en lugares para
la distribución del conocimiento y no para el acto de conocer, porque la
Lo que importa en la formación docente, no es la repetición mecánica del gesto, este o aquel, sino la
comprensión del valor de los sentimientos, de las emociones, del deseo, de la inseguridad que debe ser superada
por la seguridad, del miedo que, al ser “educado”, va generando valor.
| Alonso Bezerra de Carvalho, Cláudio Roberto Brocanelli e Genivaldo de Souza Santos (Org.)
44 |
educación no es el trabajo de transmitir conocimientos, sino el acto de
conocer, así lo sostiene Freire.
[…] la educación es un proceso permanente y aquí diferimos:
es un proceso permanente por razones tales como, por ejemplo,
la dimensión inacabada de los seres humanos, porque los seres
humanos son seres, seres históricos y seres de búsqueda, búsqueda
permanente. Segundo, en ésta búsqueda los seres humanos
adquieren la habilidad de conocer su realidad y de saber que saben.
A causa de eso, para mí, uno de los aspectos fundamentales de
la educación es que fue y continúa siendo una cierta teoría del
conocimiento puesta en práctica. (FREIRE, 1997).
Los aportes seleccionados de Cullen (2007) están centrados en
la cultura, como ámbito simbólico compartido, se trata de una red de
sentidos que un conjunto atribuye al desear, al sentir, al actuar y al pensar,
construyendo un nosotros o un sujeto cultural
8
.
{Hegel} distingue tres objetos sucesivos, recogidos por tres
disciplinas distintas: el alma (objeto de la antropología), la
conciencia (objeto de la fenomenología), el sujeto (objeto de la
psicología). Son sucesivos, porque la conciencia supone el negar
dialécticamente el alma, y el sujeto no es sino la negación que la
conciencia hace de la sustancialidad del alma. Pensar las relaciones
entre el cuerpo y la cultura desde el punto de vista de la conciencia
genera un modelo signado por la negación…Por eso el cuerpo
molesta en la cultura, produce malestar. Porque sólo es posible
hacerse cargo de su ‘otredad’ y de su ‘contradicción’ desde una tarea
educativa. Sólo educando, se reprime, y sólo educando se disuelve
lo contradictorio. (CULLEN, 2007).
Si sabemos estar como “vulnerables”, es decir, interpelables por el
otro, podremos crear el mundo de vuelta haciéndolo más justo. Entonces,
la losofía de la educación habita donde habita la losofía sin más, es
“…el cuerpo es malestar en la cultura porque la cultura identica su subjetividad social con la conciencia y
la libertad, que niegan la urdimbre comunicativa único esbozo de un sujeto cultural pleno, que constituye a la
corporalidad humana como estructura individual sui generis de la conciencia y de la libertad, que no necesita
armarse negando, reprimiendo, limitando. Desde aquí la tarea educativa: reconocer en el cuerpo el deseo de
moverse a sí mismo en la búsqueda de la subjetividad cultural. [...] Nuestra tarea empieza por reconocer en el
cuerpo nudo comunicacional que nos involucra una simple demanda: yo puedo ser sujeto.
Pensamento Latino-Americano e Educação: por uma ética situada |
| 45
una forma ética de resistencia, ayudando a liberar el potencial crítico y
naturalizado de las representaciones sociales de los diferentes actores.
Esta posición ética está en frente del pensamiento único que legitima la
exclusión y la hegemonía de dominación de poder.
La tarea de la Filosofía de la Educación es en primer lugar y como
forma de resistencia, ayudar a liberar este potencial crítico de la
educación, empezando por saber ver sus formas, participar de
sus intentos, y entonces, proveer de argumentos más sólidos para
sostener ese potencial crítico de las prácticas. [...] También dar
elementos para deconstruir representaciones sociales e históricas
naturalizadas [...] En tercer lugar, la losofía de la educación
puede entenderse como una forma de resistencia que denuncie las
crecientes estrategias depotenciadoras de la crítica, que tienden a
dar una visión fragmentaria del sujeto de la educación, una visión
meramente instrumental de las instituciones, una visión apolítica
de los procesos de enseñanza y aprendizaje, y una estrategia
mercantil en las evaluaciones y acreditaciones. (CULLEN, 2007).
En denitiva, la posición que plantea Cullen como propuesta para
la losofía de la educación como parte de la manera de resistir e insistir con
inteligencia crítica. La insistencia es en lo público, en el conocimiento y la
responsabilidad social.
Silvia Rivera Cusicanqui
9
aporta al pensamiento americano una
distancia en la condición de colonizado y en las formas de recolonización
aplicada en América: “La condición colonial esconde múltiples paradojas.
De un lado, a lo largo de la historia, el impulso modernizador de las elites
europeizantes en la región andina se tradujo en sucesivos procesos de
recolonización.
“La experiencia de la contemporaneidad nos compromete en el
presente –aka pacha- y a su vez contiene en sí misma semillas de futuro que
brotan desde el fondo del pasado, qhip nayr uñtasis sarnaqapxañani. El
presente es escenario de pulsiones modernizadoras y a la vez arcaizantes, de
estrategias preservadores del status quo y de otras que signican la revuelta
Pensar en Movimiento- UNTREF. Disponible: http://untref.edu.ar/pensarenmovimiento/capitulo3.html.
Acceso en: 23 abr. 2020. TEJIENDO y destejiendo subjetividades. Disponible: https://www.youtube.com/
watch?v=-dgzmSiUHlM. Acceso en: 23 abr. 2020.
| Alonso Bezerra de Carvalho, Cláudio Roberto Brocanelli e Genivaldo de Souza Santos (Org.)
46 |
y renovación del mundo: el pachakuti. El mundo al revés del colonialismo,
volverá sobre sus pies realizándose como historia sólo si se puede derrotar
a aquellos que se empeñan en conservar el pasado, con todo su lastre de
privilegios mal habidos. Pero si ellos triunfan, “ni el pasado podrá librarse
de la furia del enemigo”, parafraseando a Walter Benjamin (RIVERA
CUSICANQUI, 2010).
Cusicanqui plantea que no puede haber un discurso de la
descolonización, una teoría de la descolonización, sin una práctica
descolonizadora. Asimismo, diferencia que el discurso del multiculturalismo
y el discurso de la hibridez son lecturas esencialistas e historicistas de la
cuestión indígena, que no tocan los temas de fondo de la descolonización;
sostiene que encubren y renuevan prácticas efectivas de colonización y
subalternización.
[...] Su función es la de suplantar a las poblaciones indígenas
como sujetos de la historia, convertir sus luchas y demandas
en ingredientes de una reingeniería cultural y estatal capaz de
someterlas a su voluntad neutralizadora.
[…] Existe también el mundo ch’ixi. Personalmente, no me
considero q’ara (culturalmente desnuda, usurpadora de lo ajeno)
porque he reconocido plenamente mi origen doble, aymara y
europeo, y porque vivo de mi propio esfuerzo. Por eso, me considero
ch’ixi, y considero a ésta la traducción más adecuada de la mezcla
abigarrada que somos las y los llamados mestizas y mestizos. La
palabra ch’ixi tiene diversas connotaciones: es un color producto
de la yuxtaposición, en pequeños puntos o manchas, de dos colores
opuestos o contrastados: el blanco y el negro, el rojo y el verde. Es
ese gris jaspeado resultante de la mezcla imperceptible del blanco y
el negro, que se confunden para la percepción sin nunca mezclarse
del todo. La noción ch’ixi, como muchas otras (allqa, ayni) obedece
a la idea aymara de algo que es y no es a la vez, es decir, a la lógica
del tercero incluido. (RIVERA CUSICANQUI, 2010).
conviviR en la difeRencia
Lo diferente no es una amenaza, está afuera de lo incluido, en lo
moderno, lo diferente da la posibilidad que exista lo incluido, es pensar
Pensamento Latino-Americano e Educação: por uma ética situada |
| 47
al revés, la identidad está dada por la diferencia con otro, es el otro el que
constituye el vínculo, sin vínculo no hay identidad ni diferencia.
Francois Dubet
10
, pensador europeo, sostiene que los europeos
quieren ser ahora americanos, mientras antes los americanos, con la ilusión
del progreso, querían ser europeos y argumenta, que en América la diferencia
se convive y ellos a la diferencia solo anteponen la fórmula de la igualdad.
La dualidad no está dada por identidad y diferencia, sino es una
triada, donde lo excluido es la condición de posibilidad para denir a las
armaciones por lo que son o no son, y el tercero excluido que conforma
la triada es el suelo simbólico donde se está, que siempre es un horizonte
cultural prexistente.
Lo negado por la modernidad, era la otra cultura, lo diferente
que daba identidad a lo moderno, y esta nos habita actualmente en forma
silenciosa y a través de los destinatarios de la educación, que conllevan el
principio irreductible de la sabiduría no legitima, pero que tramita la vida
desde otro orden simultáneo, no sucesivo.
El sistema educativo podría dar entidad a los saberes que tienen
los destinatarios, incorporándolos al curriculum explícito, para compartir
una dimensión de posibilidad y no un sendero circular, donde la pregunta
ya lleva la posible respuesta.
condición de posibilidad
Si como arma la lógica de la modernidad, las cosas, los vínculos,
los sujetos se denen por lo que son en oposición a lo que no son, se olvidan
de lo implícito de la armación que es un suelo silencioso que habita lo
negado de otra manera. las cosas, los vínculos, el sujeto no se denen, sólo
están y desde ese umbral están siendo. El proceso de dominación necesita
denir al otro, condicionarlo en su potencia y aferrarlo a un relato de
sostenimiento del sistema mundo.
En el “Ocaso de la Edad Moderna” Romano Guardini, presenta
la conguración que el hombre tiene de sí mismo y el mundo, haciendo
una diferencia entre la edad medieval y la moderna, entre la tensión de la
10
Entrevista a Dubet. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=PfpgxIYKFDE&list=UUuzqKy7G
uVhr-0zzJc3WQ5g
| Alonso Bezerra de Carvalho, Cláudio Roberto Brocanelli e Genivaldo de Souza Santos (Org.)
48 |
tradición institucionalizada de la fé y la imposición de la verdad. Es posible
contemplar que la relación vincular entre pares humanos se da como un
punto interno en relación a un poliedro irregular, donde subsisten la
comunicación, los símbolos, la tensión de poder, de género y el marco
del relato de sostenimiento del sistema capitalista. Donde la condición de
posibilidad es la que congura la relación y no la ausencia o negación de
la misma, la que congura la verdad. Si la condición de posibilidad es el
tercer excluido de la armación, para asumir la negación que nos habita en
forma silenciosa, es como posicionarnos no desde el recorrido eurocéntrico
y antropomórco del ser, sino desde el estar, en relación con el acontecer
comunitario.
Figura 1 - Ser/Estar/Acontecer
Ser ←→ Estar
Acontecer
Fonte: TASAT (2017).
Desde esta noción la educación, asumiría su estar situado,
aconteciendo con, por y para otros, escuchando y ampliando sus horizontes
de aprendizaje a la incorporación de los saberes negados, no como astucia de
la razón que, en la tolerancia de la diferencia intercultural, solo antepone la
integración, sino como condición para relacionar la racionalidad moderna con
la sabiduría ancestral, popular, en denitiva, la sabiduría “bárbara” negada.
Para ello es importante conceptualizar no al sujeto, sino a la
relación el lazo social que nos da identidad en la diferencia situada.
A continuación se presenta un hallazgo en el recorrido de esta
tesis, un diagrama que se encuentra en el archivo y biblioteca Rodolfo
Kusch sede Maimará, Jujuy
11
-UNTREF, donde Kusch presenta un
cuadrante inédito de sus estudios, sobre la diferencia entre el conocimiento
de la modernidad y la sabiduría andina.
11
Archivo Biblioteca Rodolfo Kusch. Maimará, Jujuy www.untref.edu.ar/catalogo-bibliteca
Pensamento Latino-Americano e Educação: por uma ética situada |
| 49
Figura 2 - Dualidad de la Modernidad -Kusch
Fonte: TASAT (2017).
En el diagrama, Kusch presenta la dualidad de la modernidad
refugiada en la ciencia, la razón y el logo, sustentada por el sujeto, único,
idéntico a sí mismo, que preja al ser; por un lado y por otro lado
conviviendo el miedo como sustento de vida y la deidad como organizador
del cosmos por parte de la sabiduría andina. Siendo los dos tópicos forma
de tramitar la vida desde la ciencia, la losofía, la magia y la sabiduría.
Desde el diagrama presentado por Kusch y con los fundamentos
presentados en el módulo, podemos realizar un diagrama del lazo social,
como integración-relación para pensar la convivencia en la educación, no
negando, sino asumiendo la condición de posibilidad que nos proyecta,
indeterminado, en constante e incierta construcción.
La modernidad se instaló en el espacio de verdad-certeza,
escondiendo en la enajenación de la acción la acumulación originaria que
presentó Marx, dando uso y usufructo a la propiedad privada, que es parte
de lo legal que sustenta el sistema mundo.
| Alonso Bezerra de Carvalho, Cláudio Roberto Brocanelli e Genivaldo de Souza Santos (Org.)
50 |
Figura 3 – Cuadrante Relacional de la lógica de la convivencia
Fonte: TASAT (2017).
Otra variable que se desvanece es la protohistoria compartida,
solo quedando como válida la historia chica, presentada por Kusch. La
historia europea de los últimos 500 años, la historia de la especie que se
piensa solo a sí misma como posibilidad de autoconservación; que se disipa
en el patio de los objetos y que genera el malestar que mueve la historia, el
individualismo, la razón instrumental y la pérdida de libertad.
Pensar desde el lazo social, es animarse a convivir en, desde y
por las diferencias, sin necesidad de igualar. Las políticas de igualdad en
educación solo tuvieron como efecto la segregación de las diferencias.
Apartarse del pensamiento cierto de la modernidad, que ancló en el sujeto
su sujeción a la distinción para diferenciarse.
Desde la lógica paraconsistente los antagonismos podrían
convivir, porque la consistencia en más amplia que la armación que limita
Pensamento Latino-Americano e Educação: por uma ética situada |
| 51
la relación: se es o no se es, en un marco más amplio de tiempo y espacio,
como un subconjunto de un conjunto, adentro de un teorema.
La persistencia es una emotividad insistente de un acierto de los
negados por la modernidad, que resistieron, lucharon y conviven en forma
silenciosa, como destinatarios de la educación moderna.
conclusiones
Los pensadores europeos aportaron al ideario de la modernidad,
estableciendo un imaginario simultáneo, hegemónico y único, que no
reconoció otras sabidurías legítimas (ancestrales-populares) diferentes al
relato de progreso racional, con las que convive al día de hoy en el campo
de la educación y habitan en forma silenciosa a través de los destinatarios
en el curriculum oculto de las instituciones educativas.
Desde esta otra perspectiva se le asignó a la educación la tarea de
desarrollar un proceso de socialización de las nuevas generaciones para su
adaptación, conformidad y sujeción a un conjunto de legados culturales
y normativos. Más aún, su adhesión indubitable a lo que Comte llama
un fondo común de verdades”, es decir lo “sacro laico” que sustenta
una identidad nacional y conduce necesariamente a una determinada
homogeneidad cívica (Geneyro, 2007).
Se trata de pensar en y desde América, en tanto el pensamiento
desarraigado de nuestra tierra y des-gravitado de nuestro horizonte cultural,
fundamentó la implementación de políticas hegemónicas, económicas-
sociales y culturales, que tomaron como referencia una noción de cultura y
de sujeto cultural formulada en otros contextos, y, por tanto, desconectada
de los problemas, particularidades y tensiones propias del territorio y los
mundos que constituyen la América profunda.
La modernidad instaló un modo de pensar sostenido en la causa-
efecto, todo pensamiento que no dependa de un proceso de validación no
entra en la lógica occidental Se apela a la epistemología de la certeza, sin
dudas y estable, congurando un sistema hegemónico donde el antagonismo
no se tiene en cuenta, contenido en los discursos e imaginarios sociales.
Los aportes de Aníbal Quijano (2000) al estudio de las ciencias
sociales, fue plantear que América se constituyó como el primer espacio/tiempo
de un nuevo patrón de poder, como la primera identidad de la modernidad.
| Alonso Bezerra de Carvalho, Cláudio Roberto Brocanelli e Genivaldo de Souza Santos (Org.)
52 |
En educación el legado de la modernidad convive con lo cotidiano
del situarse americano, con sus diferencias plasmadas en las nuevas naciones
del nuevo continente y los mestizajes de las culturas invisibilizadas, que
resistieron a la espada, la pluma, la palabra y la institucionalidad de la fe.
Solamente podremos construir una sociedad en donde la vida
merezca plenamente ser vivida por todos, en la que cada uno pueda desplegar
plenamente sus potencialidades como persona, si hacemos una apuesta fuerte
y vigorosa por desocultar esa verdad ocultada por siglos de dominación, y
que está dado en la convivencia de los antagonismos, no como síntesis de
superación, sino como umbral de espacio habitado colectivamente.
RefeRencias
ACOSTA, Y. Reexiones desde nuestra América. Estudios latinoamericanos de historia
delas ideas y losofía de la práctica. Montevideo: Nordan Comunidad, 2012.
CULLEN, C. Resistir con Inteligencia. México: Pueblo Nuevo, 2007.
DUSSEL, E. El encubrimiento del otro. Hacia el origen del mito en la modernidad.
Madrid: Nueva Utopia, 2007.
FREIRE, P. Pedagogía de la autonomía. Cordoba: Tierra del sur, 1997.
GENEYRO, J. C. Contrastes: Revista Internacional de Filosofía, Malaga, p. 247-266, 2007.
KUSCH, R. Obras Completas. Rosario: Fundación Ross, 2007.
QUIJANO, A. Colonialidad del Poder, Eurocentrismo y América Latina. Buenos Aires:
UNESCO-CLACSO, 2000.Educación y ciudadanía: vicisitudes de algunos legados de
la Modernidad.
QUIJANO, A. El regreso del futuro y las cuestiones de conocimiento. In: QUIJANO,
A. Cuestiones y horizontes: de la dependencia histórico-estructural a la colonialidad/
descolonialidad del poder. Buenos Aires: CLACSO, 2014. p. 833-846.
RIVERA CUSICANQUI, S. Ch’ixinakax Utiwa: una reexión sobre prácticas y
discursos descolonizadores. Buenos Aires: Tinta Limón, 2010.
SANTOS-HERCEG, J. Conicto de representaciones: América Latina como lugar para la
losofía. Santiago, Chile: Fondo de Cultura Económica, 2010.
WALSH, C. Geopolíticas del conocimiento, interculturalidad y descolonialización.
Boletín ICCI-ARY Rimay, Quito-Ecuador, n. 60, 2004.
| 53
P    
:  
     
R K
Alonso Bezerra de Carvalho
UNESP/Marília
“O povo julga, por certo, conhecer algo xo, pronto, permanente; na
verdade, há em cada instante luz e escuro, amargo e doce lado a lado e
presos um ao outro, como dois contendores, dos quais ora um ora outro
tem a supremacia.(NIETZSCHE, 1989, p. 76).
O professor e o aluno não existem. Usamos e atribuímos nomes
às coisas, como se estas tivessem uma duração xa, enm, essencializamos
a vida. É isso que nos ensina Nietzsche.
| Alonso Bezerra de Carvalho, Cláudio Roberto Brocanelli e Genivaldo de Souza Santos (Org.)
54 |
Inspirado pela provocação nietzschiana, a proposta neste texto é
discutir e/ou apresentar um conjunto de ideias com o objetivo de articular e
pôr em diálogo ou ressignicar a losoa e a educação a partir de um lugar
situado que é a América Latina. Para tanto, faremos algumas indicações
quanto ao papel e à participação da Filosoa na constituição da cultura
latinoamericana que, em um primeiro entendimento de nossa parte, pode
estar associado à questão do ser e à formulação dos princípios racionais, tal
como aparece na concepção losóca de Parmênides. Para se contrapor ou
estabelecer com a losoa parmenídica retomaremos Heráclito que, com
a sua ideia de movimento, nos leva a pensar não na concepção do ser, algo
imóvel e estável, mas de um estar, que traz a percepção de algo em devir e
transformação, que pode incluir o diferente. Trazendo para os nossos dias,
a losoa heraclitiana nos conduz a compreender a proposta do lósofo
e antropólogo argentino Rodolfo Kusch, que fez profundas reexões e
suscitou ideias inovadoras acerca da possibilidade de se reconhecer um
pensamento a partir do solo latinoamericano. Como considerações nais,
apontamos algumas ideias para se pensar o que seria uma educação ou uma
losoa da educação a partir de uma nova compreensão e de um novo
olhar para o espaço e o tempo que constitui a América.
Para os propósitos das nossas reexões, aqui partimos da ideia de
que uma nova forma de poder e de conhecimento pode ser compreendida
se zermos uma retrospectiva acerca da noção de ser que o pensamento
losóco formulou ao longo de sua história. Aqui daremos atenção às
ideias de Heráclito e de Parmênides, lósofos gregos que, juntamente
com outros, procuraram responder à questão acerca do ser. Se ainda não
é possível encontrar neles uma proposta metafísica e racional com todos
os seus desdobramentos epistêmicos, éticos e políticos, podemos tomá-
los como ponto de partida para a compreensão e problematização das
temáticas e ideias advindas posteriormente, como é o caso da tentativa de
implementação de um processo de universalização de verdades, valores,
crenças e ações em nosso continente.
heRáclito e a ideia de viR-a-seR
Nascido na ilha de Éfeso na Grécia, Heráclito (540-480 a.C) é
considerado um dos mais originais lósofos da antiguidade, chamando
Pensamento Latino-Americano e Educação: por uma ética situada |
| 55
para si os problemas mais polêmicos e as mais difíceis questões do seu
tempo e enfrentando-os com audácia na busca de respostas. O seu projeto
losóco insere-se no debate acerca da questão de se há uma unidade
permanente e universal, como exigência da razão, ou uma pluralidade e
mutabilidade das coisas particulares e efêmeras, como atestam os sentidos.
Heráclito e seus colegas gregos perguntavam-se se há uma norma universal
xa que dirige todos os acontecimentos singulares, de maneira a haver
uma harmonia do universo acima das visíveis contradições, oposições e
conitos do mundo fenomênico.
A perspectiva que ele defende se funda na ideia de que a realidade
manifesta-se como um uxo perpétuo de todas as coisas que a constituem.
“Nada permanece estável, imóvel, mas tudo muda, tudo se transforma sem
cessar e nada escapa a esse uir perene e universal [...] A única coisa que
permanece inalterável é a própria mudança, o movimento. A realidade,
portanto, é essencialmente processo.” (SANTOS, 2001, p. 87).
Em grande parte de seus fragmentos essa ideia está bastante
clara, explicitando a percepção de que tudo, sem exceção, participa de um
contínuo e inexorável processo de mudança inestancável e universal. Nos
parece que isto ca bem evidente quando diz:
Este mundo, o mesmo de todos os (seres), nenhum deus, nenhum
homem o fez, mas era, é e será um fogo sempre vivo, acendendo-
se em medidas e apagando-se em medidas (...) Em rio não se pode
entrar duas vezes no mesmo. Dispersa-se e de novo reúne; compõe-se
e desiste; aproxima-se e afasta-se (...) Nos mesmos rios entramos e
não entremos; somos e não somos (HERÁCLITO,1989, p. 56-60).
A metáfora do rio que muda a todo instante exemplica a noção de
ser heraclitiana, pois o rio, embora tenha uma aparência de imutabilidade,
na verdade, há um uir permanente. As águas que o compõem são uentes,
correm sempre e tampouco são as mesmas. “Tudo ui (panta rei), nada
persiste, nem permanece o mesmo”. O mesmo ocorre com o ser humano
que nelas entra, pois ele também está mudando permanentemente. Não
há, no desenrolar do seu viver, a possibilidade de fazer duas experiências
idênticas. Todas as coisas, indistintamente, portanto, são e não são ao
mesmo tempo.
| Alonso Bezerra de Carvalho, Cláudio Roberto Brocanelli e Genivaldo de Souza Santos (Org.)
56 |
A esse processo Heráclito chamou de devir ou vir-a-ser, do qual
participam todas as coisas que existem realmente. O vir-a-ser é, na sua
estrutura, permanente conito dos contrários que se alternam, é luta
constante entre um contrário e outro, uma guerra que torna possível a
existência das coisas. O vir-a-ser é a essência da physis, isto é, da natureza,
do cosmos.
Haveria um logos que orienta o vir-a-ser, isto é, um verdadeiro
princípio que rege a totalidade do real, a norma que governa o mundo. E a
harmonia (unidade profunda) daí derivada resulta no equilíbrio dinâmico
das tensões entre os contrários. “Tudo se faz por contraste; da luta dos
contrários nasce a mais bela harmonia”, diz Heráclito em um dos seus
fragmentos.
A alegria só perdura no espírito daquele que a concretiza, na medida
em que esta disposição sobreviva à luta contra a tristeza inerente
à condição humana [...] Trata-se, portanto, de uma harmonia
tensa (luta entre pólos opostos) e não de uma harmonia estática.
(SANTOS, 2001, p. 89-90).
Além da metáfora do rio, Heráclito considera o fogo como
a representação ou o símbolo desse processo. O fogo é como se fosse a
manifestação empírica do logos, isto é, uma substância originária (arché),
substrato e fundamento de todas as coisas. Por própria natureza, ou seja,
por sua capacidade de perpétua mudança, de transformação, de contraste
e harmonia, o fogo é o que melhor se presta a cumprir essa função de
elemento que se muda em todas as coisas. Tudo deriva do fogo e a ele
retorna oportunamente, ou como diz Hegel, comentando Heráclito:
o fogo é o tempo físico; ele é esta absoluta inquietude, absoluta
dissolução do que persiste – o desaparecer de outros, mas também
de si mesmo; ele não é permanente. Por isso compreendemos
(é inteiramente consequente) por que Heráclito pode nomear o
fogo como o conceito do processo, partindo de sua determinação
fundamental [...] O fogo, enquanto o metamorfosear-se das coisas
corpóreas; é mudança, transformação do determinado, evaporação,
transformação em fumaça [...] devir, seria o incorpóreo e sempre
uido. (HEGEL, 1989, p.68).
Pensamento Latino-Americano e Educação: por uma ética situada |
| 57
Portanto, Heráclito não despreza o logos, mas o dene e o
compreende em uma perspectiva que considera e inclui o movimento,
a incompletude, a mudança, de maneira a se tornar um dos primeiros
lósofos que delimita e propõe não apenas um projeto losóco, mas
forma uma tradição com herdeiros até os nossos dias. Em sua doutrina,
o logos é aquilo segundo o qual tudo acontece; é o pensamento que tudo
dirige; é a razão universal, é o uno que tudo governa, fazendo com que o
devir não aconteça de uma forma desordenada, confusa e ao acaso. Como
o fogo, que acende e apaga sob medida, e como elemento constitutivo
de tudo, o logos produz um universo que é o cosmo (e não o caos), que é
equilíbrio dinâmico, inteligível e compreensível porque racional.
Cometendo o pecado de ir contra ou não conceber o princípio
da contradição, Heráclito “negou, em geral, o ser”, conforme arma
Nietzsche. “Não vejo nada além do vir-a-ser”, diz o lósofo de Éfeso.
Parafraseando essa ideia: “não vejo nada além do estar, ou “do estar no
más”, como defende Rodolfo Kusch. Mas antes de chegarmos a Kusch,
vejamos a posição de Parmênides.
paRmênides e a questão do seR e os pRincípios Racionais
Sabe-se que Parmênides é originário da cidade de Eléia, na
Grécia antiga, e que hoje corresponderia à região de Salerno, na Itália, e
que nasceu por volta de 530 a.C. e morreu por volta dos anos 460 a.C,
embora não se tenha muita segurança quanto a isso. Seu projeto losóco,
de certa maneira, se opõe à proposta heraclitiana, pois introduz uma nova
perspectiva na tradição reexiva grega, levando às últimas consequências
uma visão monista da realidade. Nega, de maneira peremptória, a
possibilidade do movimento, da mudança e da multiplicidade e propõe
que existe uma única realidade – o Ser -, que não pode ser transformado.
O Ser, dizia Parmênides, é o logos porque sempre idêntico a si
mesmo, sem contradições, imutável e imperecível. O devir, o
uxo dos contrários, é a aparência sensível, mera opinião [doxa]
que formamos porque confundimos a realidade com as nossas
sensações, percepções e lembranças. A mudança é o não-ser, o nada,
impensável, indizível. O pensamento e a linguagem verdadeira só
são possíveis se as coisas que pensamos e dizemos guardarem a
| Alonso Bezerra de Carvalho, Cláudio Roberto Brocanelli e Genivaldo de Souza Santos (Org.)
58 |
identidade, forem permanentes, pois só podemos dizer e pensar
aquilo que é sempre idêntico a si mesmo. (CHAUÍ, 2003, p. 105).
Nesse sentido, é que podemos considerar Parmênides como o
primeiro lósofo que reconhece a Razão como o único instrumento válido
para se chegar ao conhecimento verdadeiro, ou seja, à totalidade do real,
absoluta e integral.
Não é possível nenhuma outra realidade e, sobretudo, o devir, a
mudança e o movimento defendidos por Heráclito, pois esses são,
denitivamente, inadmissíveis. Partindo dessa asserção e praticando
um extraordinário exercício de dedução lógica, isto é, usando
apenas a razão (sem a intervenção dos sentidos), Parmênides, deduz
tudo o que se pode armar sobre o Ser (única realidade), negando
validade ao que se conhece através dos sentidos (opiniões), que
só dão conta das aparências. Parmênides não faz concessões: ou
uma coisa existe ou não existe. Se já existe, não pode vir a existir.
Não teria sentido. Se não existe, também não pode vir a existir,
visto que, do nada (do não-ser, do não-existir), nada pode provir.
(SANTOS, 2001, p. 63).
Portanto, Parmênides pode ser considerado como o primeiro
lósofo que faz da Razão a dimensão mais importante do homem, pois é
por meio dela que podemos pensar e conhecer de maneira formal e abstrata
a realidade, distanciando-nos das coisas físicas e sensíveis. Para ele, “pensar
e ser são uma só e mesma coisa”, porque só o ser (única realidade) é objeto
do pensamento e, sem o ser, não haverá o que pensar, nem como expressar
o pensamento. Sendo assim, não tem o menor sentido pensar o nada (o
não-ser). Apenas a Razão pode dar ao lósofo novos olhos para ver em
profundidade o mundo real, verdadeiro, como ele é, enquanto os sentidos
são impotentes para esse nível de conhecimento, pois estão eivados de
enganos e falsidades: uma coisa não pode ser e deixar de ser, ao mesmo
tempo, sob o mesmo aspecto. O Ser, captado pela Razão, é o absoluto
pleno, eternamente presente, imutável, uno, necessário e imperecível. A
verdade é o ser e a multiplicidade; a mudança, por sua vez, é só aparência
e ilusão. Num fragmento: “o Ser é, e o não-ser não é”.
Pensamento Latino-Americano e Educação: por uma ética situada |
| 59
É do projeto e da doutrina racionalista parmenidiano que surgem
os princípios racionais: o princípio da identidade, da não-contradição,
do terceiro excluído e da causalidade. É por meio destes princípios
que conhecemos a realidade; são como leis e regras que empregamos e
respeitamos para pensar e conhecer as coisas. O princípio da identidade tem
o seguinte enunciado: “A é A” ou “O que é, é”. Isto é, uma coisa só pode
ser conhecida e pensada se for percebida e conservada com sua identidade.
O princípio da não-contradição, por seu lado, enuncia a seguinte regra: “A
é A e é impossível que, ao mesmo tempo e na mesma relação, seja não-A”.
Isto signica que as coisas e as ideias contraditórias são impensáveis. “A é
ou x ou é y e não há terceira possibilidade”, este é o enunciado do princípio
do terceiro excluído, que nos ajuda a decidir acerca de um dilema – “ou isto
ou aquilo” -, no qual as duas alternativas são possíveis e cuja solução exige
que apenas uma delas seja verdadeira. Por m, o princípio da causalidade
que enuncia: “Dado A, necessariamente se dará B”. E também: “Dado B,
necessariamente houve A”, enm, tudo que existe e tudo que acontece tem
uma razão (causa ou motivo) para existir ou para acontecer, e que tal razão
(causa e motivo) pode ser conhecida pela nossa razão; esse princípio arma
a existência de relações ou conexões internas entre as coisas, entre fatos, ou
entre ações e acontecimentos.
Essas leis que devem reger o nosso pensamento se revestem de
características que são indispensáveis e fundamentais para se chegar ao que
é verdadeiro. Formais: indicam como as coisas devem ser pensadas, mas
não nos dizem quais coisas nem quais conteúdos que devemos ou vamos
pensar; Universais: onde houver razão, em todo tempo e em todo lugar,
esses princípios são verdadeiros e devem ser empregados e obedecidos por
todos; Necessários: indispensáveis para o pensamento, a vontade, as coisas,
os fatos e os acontecimentos, indicando que algo é assim e não pode ser de
outra maneira.
A seguir apresentamos algumas ideias do lósofo e antropólogo
argentino, Rodolfo Kusch, que se situa nesse debate que zemos até agora,
segundo a nossa compreensão, no horizonte do projeto elaborado por
Heráclito. Para Kusch, ao invés de pensarmos a partir do ser, que tudo
quer apreender e conhecer, que tal nos deslocarmos e olharmos o mundo a
partir do devir, ou como ele denomina do estar sendo?
| Alonso Bezerra de Carvalho, Cláudio Roberto Brocanelli e Genivaldo de Souza Santos (Org.)
60 |
Rodolfo Kusch e a améRica pRofunda: a noção do estaR e a
educação
A antropologia losóca de Rodolfo Kusch procura indicar
outros caminhos tanto na crítica à razão ocidental quanto no processo de
compreensão e diagnóstico da cultura latinoamericana. Articulando essas
duas posturas intelectuais e investigativas, ele procura mapear, de fato, o
que é histórica e culturalmente especíco dos povos que habitam esse outro
lado do mundo. Kusch busca, entre outros objetivos, destacar a presença
de um pensamento novo, arraigado nas manifestações da cultura popular
e americana. Se a marca do Ocidente é universalizar os seus valores, suas
crenças e pensamentos, talvez pudéssemos nos exercitar no sentido de
demarcar o que nos é especíco, sobretudo a partir do lugar que “estamos
sendo”, que é o continente latinoamericano.
Se o pensamento racionalista de inuência europeia e de matriz
parmenídica dominou a instauração e a interpretação de nossa cultura,
trata-se de desconstruir essa estrutura lógica que se colocava como superior,
em detrimento das culturas autóctones e indígenas americanas. Na base das
reexões kuschianas está a ideia de que a racionalidade ocidental se centraria
no ser, no ente, na coisa, enquanto a racionalidade indígena se fundaria no
estar, no domicílio, no habitat. Adotando modos de observação próprios
da ciência antropológica, foi a campo aprofundar suas intuições no sentido
de se pensar e extrair uma losoa autenticamente americana. Segundo
Kusch, a experiência americana havia gerado uma situação ontológica e
epistemológica única, que ele a caracterizava como um predomínio do
estar” sobre o “ser”.
O pensamento racionalista europeu ao negar ou desconsiderar
por completo o pensamento americano transforma-o em um objeto sem
vida e sem história, restando-nos construir um movimento de resistência
e de autoarmação, na busca da emancipação dos discursos e práticas que
nos impedem de expressar nossa própria cultura de maneira integrada e
autônoma.
Para Rodolfo Kusch, o medo que sentimos e experimentamos de
ser nós mesmos é resultado do medo inicial em pensar sobre quem somos
nós. Isso deriva, segundo ele, de uma diculdade, para dizer o mínimo, em
possuirmos a nossa própria técnica para pensar, ou melhor, para losofar.
Pensamento Latino-Americano e Educação: por uma ética situada |
| 61
Poderíamos mesmo dizer, para educar, tendo em vista que adotamos
perspectivas pedagógicas de além-mar. “El estancamiento del losofar [ou
do educar] entre nosotros, la imposibilidad de adelantar, o empreender un
losofar, se debe seguramente como suele decirse a una ausencia de técnica
para ello.” (KUSCH, 2000, p. 9).
O pensar popular, característica marcante do pensamento
americano, não requer uma técnica ou uma lógica que nos levaria a um
saber que dissesse o como as coisas são. Pretendendo captar o “quê” das
coisas, no pensamento americano o fundamental é o sentido, o conteúdo
e não a forma, como tem feito o pensar europeu. “Volviendo al losofar,
el problema intrínseco de esta actividad no es de mera técnica, o sea del
cómo, sino tambiém de un algo que se constituye [...] El pensamento culto
[europeu] invierte la dirección, en vez de apuntar al algo del decir, apunta
el cómo.” (KUSCH, 2000, p. 10). Kusch crê que é necessário um equilíbrio
entre conteúdo e forma, de tal maneira que possamos desfetichizar a
técnica e a lógica que promete o progresso como consequência e que tem
marcado, inclusive, a educação burguesa, ao fundamentar o ensino na
ideia do progredir e do avançar, ou seja, em uma concepção de razão que
considera tudo passível de ser dominado, controlado e previsto.
Se enfrenta al caos para encontrar lo previsto. Y para garantizar esto
se usan técnicas. Con esto se mata el tiempo, porque se sustrae la
posibilidad de la novedad. Se pierde el miedo a que lo que aparezca
sea otra cosa. De ahí nuestra educación. Se educa a los jóvenes para
pre-ver, ver antes, saber ya lo que se da, y así detener el tiempo,
evitar el engorro [peso] del sacrifício. (KUSCH, 2000, p. 12).
Segundo Kusch, o que temos visto na América é um grande
desnível entre o que este continente era e o que o Ocidente trouxe. De
um lado, o inferior, o inútil e, de outro, o superior e o útil, que tem como
objetivo o progredir, o ascender, o ser alguém, não importa a que custo e
a que preço.
Ser alguién implica el afán de serlo y ese deseo se identica, en este
contexto, con el progreso, con la sustitución de los frutos por (la
acumulación de) simples cosas, con la obsesión de sumar objetos.
Así, la perfección del ser, en última instancia, implica tener [...] El
individuo busca la perfección y ésta se identica con un afán de
| Alonso Bezerra de Carvalho, Cláudio Roberto Brocanelli e Genivaldo de Souza Santos (Org.)
62 |
progreso innito relacionado con los objetos, un progreso que implica
la negación del viejo deseo de mínima que simplemente pretendía
conservar la vida, comprometido con el mero estar. (CULLEN,
2003, p. 53).
Inuenciados por essa visão europeia, não suportamos o medo e
o estar, pois isso nos angustia, diferentemente do indígena, que ao sentir
medo recorria aos bruxos em busca de ajuda. Para eles, assumir nossa
dimensão humana é viver ao nível da terra e enfrentar nossos temores. Para
nós, isso não é suciente, pois queremos tudo claro, esclarecido e passível
de ser compreendido pela razão. É como se houvesse um imperialismo da
racionalidade que, na verdade, revela a nossa fraqueza e impotência frente
à totalidade daquilo que deveríamos pensar. Somos incapazes de simbolizar
ao pensarmos em termos ocidentais, pois queremos reduzir tudo a uma
relação de causa e efeito, isto é, ao princípio de causalidade.
[...] Ni lo que llamamos cultura nos brinda un saber total [...]
Cultura cotidianamente, supone un saber de libros y de datos igual
que en caso de la ciencia. El mejor ejemplo es la librería. Entrarnos
en ella y siempre sentimos nuestra inferioridad frente a tanto saber
volcado en el objeto libro. Seguimos viviendo la enciclopedia
cientíca a nivel de cultura. Se piensa que ese saber acumulativo
que se da en la enseñanza y que se cristaliza en la librería es una
ventaja del siglo [...] Lo que en el siglo XX se llama cultura, se
reduce entonces a un simple fetichismo. (KUSCH, 2000, p. 22).
Diante desse quadro, podemos constatar em nossa sociedade
americana uma dupla polaridade: de um lado, o “estar no más” e, de
outro, o “ser alguién”, conforme expressões kuschianas. Ou seja, vivemos
uma rara mescla de um não saber da vida íntima ou cotidiana e um saber
enciclopédico e acadêmico.
Esta ideia de estar no mundo e nada mais (“estar no más”, “estar
siendo”) seja como uma característica da cultura americana, seja como uma
crítica à razão ocidental, como propõe Kusch, nos leva a regressar à história
da própria losoa, que hipervalorizou a razão esclarecida em detrimento
de outras dimensões humanas, como a dimensão passional.
Pensamento Latino-Americano e Educação: por uma ética situada |
| 63
Na perspectiva kuschiana, podemos concluir que a postura
de não levar em conta as paixões humanas, o não-ser, o devir, o
sentimento de medo como um contraponto ou outro lado da razão ou
do ser, é desconsiderar um estado original que precisa ser olhado em sua
singularidade e profundidade. Segundo Kusch, americanizar a losoa é
fazer uma reexão sobre o conteúdo da própria consciência, em que o
sujeito não pode ir mais além de sua vivência, pois é um sujeito fusionado
no mundo. Para tanto, temos que considerar o solo que habitamos, que
é o lugar que sustenta a vida e é seu apoio espiritual. A cultura tem que
ter uma margem de arraigo, ser considerada como situada em um espaço
geográco. É do solo que emerge toda uma cultura e toda uma maneira de
ser, de pensar, de agir e de falar, enm, um ethos. Por isso a ideia de uma
geocultura do homem latinoamericano.
Detrás de toda cultura está siempre el suelo [...] Y ese suelo así
enunciado, que no es ni cosa, ni si toca, pero que pesa, es la
única respuesta cuando uno se hace la pregunta por la cultura. Él
simboliza el margen de arraigo que toda cultura debe tener [...] No
hay otra universalidad que esta condición de estar caído en el suelo,
aunque se trate del altiplano o de la selva. De ahí el arraigo y, peor
que eso, la necesidad de ese arraigo, porque, si no, no tiene sentido
la vida. (KUSCH, 2000, p. 109-110).
Portanto, o solo, as paixões, o medo, os sentimentos, o aqui e o
agora e o devir de nossas vidas, são as características centrais para se pensar e
compreender a singularidade da cultura latinoamericana: é o “estar sendo
como estrutura existencial e como decisão cultural. Diferente do “ser” que
dene, que coloniza, que ignora a diferença e que faz referência à essência,
o “estar” assinala e aponta a condição, o modo exterior de tudo aquilo que
existe (ente), sem preocupação com uma interioridade, universalidade e
imutabilidade.
Segundo Kusch, o horizonte simbólico americano destaca o
predomínio do estar, do “estar sendo”, o que implica mais do que aquilo
que é enunciado ou dito pelo ser; é um viver puro, é estar domiciliado
e “prendido a un suelo que se da como inalienable” (KUSCH, 2000, p.
238). Ao desconsiderarmos isso revelamos a nossa própria inautencidade.
| Alonso Bezerra de Carvalho, Cláudio Roberto Brocanelli e Genivaldo de Souza Santos (Org.)
64 |
Nuestra autenticidad no radica en lo que Occidente considera
autêntico, sino en desenvolver al estrutura inversa a dicha
autenticidade, en la forma “estar siendo” como única possibilidad
[...] Sólo el reconocimiento de este último dará nuestra autenticidad.
(KUSCH, 2000, p. 239).
Isso quer dizer, explica Kusch, que nas culturas ocidentais, e que
é bem manifesto na América, o ser se sobrepôs ao estar, conquistando-o,
colonizando-o. Porém, a trajetória do estar se confunde com o caos de
um mundo que angustia, de um “mundo que é assim” e que deve ser
contemplado e vivido, não no sentido de um progresso e de explicações
cientícas, simplesmente.
Se de um lado, o mundo do ser europeu aparentemente resolveu
o problema da hostilidade e do medo que o mundo oferece, por meio da
teoria e da técnica, por outro lado, o mundo do estar americano não supõe
uma superação da realidade, mas faz uma invocação a ela, colocando-a e
colocando-se frente a ela. Enquanto o Ocidente cria a ciência e a educação
para se contrapor e enfrentar o medo, o devir, o mutável, etc., o indígena
se mantém em sua “magia”, em seus rituais, conservando a realidade do
mundo, limitando-se a interagir com a natureza, retirando dela o melhor
proveito, mas com um profundo respeito.
consideRações finais
É inspirados nessas reexões que talvez seja necessário assumirmos
uma maneira de pensar e de agir, inclusive no campo da educação, a partir
daquilo que foi negado pela positividade ocidental. A perspectiva que se
tem adotado e o que se tem ensinado nas escolas é uma visão da América
distante daquele mundo vivido por seus primeiros habitantes e que foi ao
longo do tempo destruído, desconsiderado e soterrado, pois está fundada
em um pensamento totalizador e colonizador e em uma superestrutura
idêntica para todos os sujeitos, suprimindo as diferenças. “Es la América
que lucha en contra de la borradura de lo humano y del sujeto dador de
sentido y símbolos.” (CHELINI, 2012, p. 5).
Neste sentido, para edicar um novo pensar e um novo agir
pedagógico, talvez seja necessário nos contrapor aos impulsos individualistas
Pensamento Latino-Americano e Educação: por uma ética situada |
| 65
do eu moderno, de matriz cartesiana, e reetir sobre um nós que não seja
metafísico e nem abstrato, mas arraigado em suas origens, situado na
terra e em suas raízes. Isso signica dar um passo atrás, voltar a um estado
embrionário que, como uma semente que cresce, possa dar frutos, enm,
uma semente que germina sem determinismos e que se compromete com
o mundo a partir de um “estar sendo”.
La cultura signica lo mismo que cultivo. Pero no sabemos qué
cultivar. No sabemos dónde está la semilla. Será preciso voltear a
quien la está pisando. Pero pensemos también que esa semilla está
en nosotros. Es lo que me quiso decir aquel brujo de Tiahuanaco.
Ucamau mundajja, “el mundo así es”. La semilla está de este lado
del mundo. Realmente un brujo indígena sabe de estas cosas mucho
más que nosotros. Nosotros sólo sabemos alfabetizar. Es un papel
muy pobre. Tendríamos que decidirnos por el brujo indígena.
Hagámoslo por América. (KUSCH, 2000, p. 111).
Isto signica valorizar e retomar o tema do devir, do não-ser, do
medo, dos gestos culturais que na América são bastante manifestos, o que
seria uma oportunidade para expressarmos e edicarmos novas instituições
e práticas que garantam um ethos americano, que considera o povo como
fonte e riqueza de um novo núcleo existencial.
Pensar, resistir e viver, esse é o chamado! É considerar a nossa
América em sua cotidianidade. Ou como dizia Kusch, em sua fetidez e
não em sua pulcritude. Fetidez e pulcritude são dois modos de se encontrar
na América. O primeiro aponta a dimensão mítica e telúrica da América
– América profunda; enquanto o outro aponta a razão como ferramenta
para a planicação técnica do mundo e a estruturação social através de um
contrato – América da superfície. Ambas categorias permitem desmascarar
a maneira de operar do pensamento ocidental pela qual a fetidez se apresenta
como barbárie e selvageria que deve redimir-se em nome de uma pulcritude
que restitua o ser, o progresso e a civilização.
[…] La categoría básica de nuestros buenos ciudadanos consiste
en pensar que lo que no es ciudad, ni prócer, ni […] pulcritud
no es más que un simple hedor susceptible de ser exterminado.
Si el hedor de América es el niño lobo, el borracho de chicha, el
indio rezador o el mendigo hediento, será cosa de internarlos,
| Alonso Bezerra de Carvalho, Cláudio Roberto Brocanelli e Genivaldo de Souza Santos (Org.)
66 |
limpiar la calle e instalar baños públicos. La primera solución para
los problemas de América apunta siempre a remediar la suciedad e
implantar la pulcritud […]. (KUSCH, 1975, p. 12-13).
Portanto, entre as concepções heraclitiana e parmenídica de
mundo, penso que a proposta de Kusch caminha na direção da primeira,
pois olha para o real e a vida em seu dinamismo e em sua profundidade.
Sem deixar de lado o caráter aborígene que marca e edica a cultura
latinoamericana, o desao está em repensar e construir uma educação
que esteja próxima desse mundo e dessa história que fora suplantado,
violentado e em muitos aspectos destruído no processo de colonização e
de domínio ocidental-europeu.
RefeRências
CHAUÍ, M. Convite à Filosoa. São Paulo: Ática, 2003.
CHELINI, M. E. J. Kusch y la posibilidad de un nuevo pensar desde el “estar”
americano. FAIA, Ciudad de Buenos Aires, v.1, n. 1, p. 1-7, 2012.
CULLEN, C. Rodolfo Kusch: esbozo de una dialéctica de la subjetividade. Buenos Aires:
UBA, 2003.
HEGEL, G. W. F. Fragmentos, doxograa e comentários. In: OS PRÉ-SOCRÁTICOS.
Tradução de José Cavalcante Souza e Anna Lia Amaral São Paulo: Nova Cultural, 1989.
(Os pensadores, v. 1).
HERÁCLITO. Fragmentos, doxograa e comentários. In: OS PRÉ-SOCRÁTICOS.
Tradução de José Cavalcante Souza e Anna Lia Amaral São Paulo: Nova Cultural, 1989.
(Os pensadores, v. 1).
KUSCH, R. América Profunda. Buenos Aires: Bonum, 1975.
KUSCH, R. Geocultura del hombre americano. In: KUSCH, Rodolfo. Obras
Completas. t. 3. Rosário: A. Ross, 2000.
NIETZSCHE, F. Fragmentos, doxograa e comentários. In: OS PRÉ-SOCRÁTICOS.
Tradução de José Cavalcante Souza e Anna Lia Amaral São Paulo: Nova Cultural, 1989.
(Os pensadores, v. 1).
SANTOS, M. J. dos. Os pré-socráticos. Juiz de Fora: Editora UFJF, 2001.
| 67
L  
 
  
  
Daniel Ríos Muñoz
David Herrera Araya
Departamento de Educación
Universidad de Santiago de Chile
‘La educación debería ayudar a nuestros jóvenes a descubrir adónde
van y también cuál es el puesto que les corresponde en el tren de la
vida’.
(P. Roberto Polain Cartier).
A través de la historia, la educación ha sido considerada,
por especialistas, profesores y por aquellos que confían en su poder
transformador, como un proceso vital que permite el desarrollo de la
persona. Esta construcción formativa despliega los diferentes saberes
| Alonso Bezerra de Carvalho, Cláudio Roberto Brocanelli e Genivaldo de Souza Santos (Org.)
68 |
del ser humano y le permite participar, de forma crítica, responsable y
propositiva, de una sociedad cada vez más compleja y dinámica.
La escuela, como estructura social, es la responsable de asegurar
los aprendizajes de los estudiantes: los conocimientos, las habilidades y
las actitudes. Además, es en este espacio donde los estudiantes aprenden a
convivir con otros (HOPKINS, 2009).
Dado este escenario, el profesor es el principal agente escolar que
debe promover dichos aprendizajes por medio de diferentes actividades
curriculares y pedagógicas, basadas en principios didácticos, metodológicos
y evaluativos. Un aspecto central de su práctica docente tiene relación con
la valoración y certicación de los aprendizajes de los estudiantes.
La evaluación se ha constituido en un proceso importante para
colaborar en la participación de los estudiantes con el propósito de favorecer
su autonomía y también posibilitar el desarrollo de valores y actitudes
que pueden convertirse en un capital social para su futura participación y
compromiso en la construcción de una sociedad más diversa, inclusiva y
equitativa.
La autoevaluación, la coevaluación y la evaluación de pares, son
estrategias evaluativas relevantes para promover aprendizajes centrales en la
constitución de la persona del estudiante desde una perspectiva integral que
privilegia la formación en la responsabilidad, la honestidad, la autocrítica,
la crítica, trabajo en equipo, entre otras.
Estos aprendizajes integrales contribuyen a la formación ética
de los estudiantes, lo que puede favorecer una participación responsable,
basada en la conciencia y práctica de sus derechos y deberes, en su futuro
actuar social, cultural, político, económico y trascendental como seres
humanos (AZERÊDO, 2013).
la educación como pRoceso humanizadoR
La educación es esencialmente política y ética, porque contribuye
a la formación integral de las personas y, a través de la actuación de esta,
a la construcción de nuestra sociedad, a partir de su integración crítica y
propositiva, plena en derechos y deberes ciudadanos. No existe herramienta
más poderosa que la EDUCACIÓN para cumplir con esta nalidad: la
Pensamento Latino-Americano e Educação: por uma ética situada |
| 69
formación plena del estudiante. Pero, también debe ser asumida como
un medio para el fortalecimiento de nuestras sociedades, vía contribución
que realizan los ciudadanos y ciudadanas en el fragor de cada día de sus
existencias.
La educación formal, sobre todo la escolar, promueve un
currículum que ha sido seleccionado, desde los Ministerios de Educación,
con el desafío que las experiencias escolares permitan la formación plena de
los estudiantes. En esta formación escolar, y para un mundo cada vez más
globalizado e interdependiente, los conocimientos, habilidades, valores y
actitudes que aprendan son esenciales para su incorporación en la sociedad.
Esta formación debiera contribuir al desarrollo de todas las potencialidades
personales del alumno. Entregarle el máximo de oportunidades en las
diversas actividades curriculares que la escuela diseña para su benecio.
La escuela al servicio de los estudiantes, cumpliendo de esta manera su
función social.
Esta es la buena educación para todos, independientes de los
orígenes sociales, económicos y culturales de los educandos. En este
contexto, podemos preguntarnos ¿si las escuelas y el sistema educativo
están respondiendo a estos desafíos que nuestras sociedades demandan?
¿Si los Proyectos Políticos Pedagógicos están cumpliendo con su misión
trascendental? ¿Si los directivos escolares están liderando estos proyectos
a partir de una gestión transformativa, basada en el trabajo colaborativo
e innovador, o más bien se orientan por lógicas burocráticas que ponen
el acento en los aspectos administrativos por sobre los pedagógicos? ¿Si
lo profesores están enseñando lo que el currículum ofrece: aprendizajes
vinculados al saber (conocimientos); al saber hacer (habilidades); y, al
saber ser (valores y actitudes)? ¿Si los educadores están educando para que
los estudiantes aprendan a convivir, en base a la tolerancia y al respeto
del otro? ¿Si los estudiantes están aprendiendo lo que les servirá para su
desarrollo personal y contribución social futura? ¿Sí las familias y los
padres contribuyen a la formación de sus hijos, más allá de los aportes
de socialización que efectúan en el seno del hogar?. En suma, es posible
preguntarse ¿si la escuela de hoy está al servicio de la formación plena del
estudiante y al servicio de nuestra sociedad democrática?
| Alonso Bezerra de Carvalho, Cláudio Roberto Brocanelli e Genivaldo de Souza Santos (Org.)
70 |
los actoRes escolaRes
De los actores mencionados anteriormente, qué duda cabe del
rol esencial que cumplen los profesores y las profesoras como promotores
de buenos aprendizajes para sus estudiantes. Son estos los que tienen
la responsabilidad de reexionar y poner en práctica el currículum que
la escuela proporciona a sus estudiantes, a partir del Proyecto Político
Pedagógico de cada escuela. Vital es su gestión pedagógica en la sala de
clases o en cualquier escenario de aprendizaje con que cuenta el centro
educativo. Aquí está el corazón de la escuela.
En este espacio el estudiante puede aprender no solo conocimientos
y habilidades, sino también aquellos comportamientos, valores y actitudes
que en su futura construcción social pueden contribuir a su integración
crítica, comprometida y activa participación en la sociedad. Desde el
imperativo ético y los principios de diversidad y tolerancia, el liderazgo
pedagógico orientado a colaborar al proceso formativo de estudiantes en
contextos vulnerables, se transforma en un horizonte de oportunidades
para garantizar una buena educación, posibilitando con ello la formación
de todas sus habilidades, para la construcción plena de la persona en una
perspectiva integral y holística.
Siguiendo a Dewey (2007), aquí está la posibilidad de que el
alumno aprenda y practique el comportamiento democrático del futuro.
Para ello, es necesario que el profesor tenga conciencia del rol que juega, de
la importancia del liderazgo pedagógico democrático que debe presentar
para ofrecer espacios de aprendizajes basado en un buen clima de aula,
caracterizado este por relaciones cordiales con sus estudiantes, y también
entre estos, desarrollando la capacidad de acogerlos en sus diversas
demandas, respetarlos como sujetos del proceso educativo, diseñando
con claridad los objetivos y actividades curriculares que implementa y de
las experiencias de aprendizaje que se disponen para avanzar en prácticas
formativas que permitan la actividad reexiva y participativa en estos
espacios intersubjetivos de co-construcción del sujeto.
En este sentido, se hace imperativo hoy que los profesores sean
más educadores que transmisores de información, donde muchas veces
esta práctica es escasa, poco relevante y descontextualizada. Que sientan
la labor educativa como una misión esperanzadora, al servicio de los
Pensamento Latino-Americano e Educação: por uma ética situada |
| 71
estudiantes y de la sociedad para su engrandecimiento, con vista a una
más amplia y profunda democracia. Esta educación debiera estar basada
en el pensar y el sentir de los profesores. En el intelecto y en el amar.
Pensar y sentir constituyen la díada esencial para la vocación pedagógica y
el profesionalismo que exige la misión de educar.
hacia una evaluación tRansfoRmadoRa
Para orientar la práctica pedagógica es esencial la presencia de los
objetivos escolares. En estos se plasman los saberes, habilidades y actitudes
fundamentales que se deben alcanzar como producto de su experiencia
educativa. Por medio de la didáctica, la diversidad metodológica, la
heterogeneidad evaluativa, entre otras, se posibilita la enseñanza de las
disciplinas escolares, las que actúan como un medio para posibilitar la
educación de los estudiantes. Con esto, no se trata de posicionar al docente
como un actor reproductivo, más bien como un agente transformativo
capaz de valorar, incorporar y acompañar el proceso de aprendizaje y
autoaprendizaje de los estudiantes (FERNANDES, 2009).
Lamentablemente en reiteradas ocasiones, y por decisiones
curriculares conscientes o inconscientes de diferentes actores educativos,
estos objetivos se reducen a la enseñanza del conocimiento y de las
habilidades básicas. Esta situación provoca que la evaluación se reduzca al
acto de medición psicométrica sobre el aprendizaje, lo que lleva a enfatizar
la aplicación de evaluaciones más tradicionales desde una perspectiva
positivista-técnica de la práctica evaluativa. En este panorama, se asume la
evaluación desde la concepción tyleriana. Lo esencial en esta racionalidad y
práctica es medir los resultados de aprendizaje de acuerdo a lo planteado en
los objetivos con énfasis en los conocimientos reproductivos y habilidades
de pensamiento superciales.
Así, las pruebas y las preguntas de selección múltiple, que tienden
a evaluar pensamientos simples, descontextualizados y fragmentados, son
los principales artefactos que se utilizan para evaluar los aprendizajes
(STOBART, 2010). Esta perspectiva evaluativa empobrece la misión
política y ética de la educación, porque se tiende a valorar más un tipo
de aprendizaje por sobre otros, como si estos fueran excluyentes. Se
hacen invisibles, sobre todo, a aquellos que justamente contribuyen a
| Alonso Bezerra de Carvalho, Cláudio Roberto Brocanelli e Genivaldo de Souza Santos (Org.)
72 |
la formación integral de la persona de los estudiantes: los valores y las
actitudes, principalmente los relacionados con su construcción ciudadana,
lo que pone en riesgo su futura participación y compromiso con el
fortalecimiento de la democracia, el bien común, la solidaridad y la justicia
(HOUSE, 1997).
Relevando la importancia política y ética de la educación, es
necesario avanzar, entre otras preocupaciones, hacia evaluaciones que
coloquen en el centro del proceso educativo al alumno (POPHAM, 2013).
Que lo considere como el principal responsable de la propia construcción
personal, de sí mismo, pero también en relación a otros. Acompañado
por profesores que piensan y sienten la educación como la más poderosa
herramienta de transformación personal y social.
Para esto, también se requiere de una evaluación para el
aprendizaje, una evaluación esencialmente educativa, que contribuya a
generar una curiosidad y una motivación permanente en el estudiante, en
espacios escolares que le otorguen la posibilidad de vivir y practicar, lo que
será su futuro comportamiento en sociedad (DEWEY, 2007).
Este tipo de evaluación debe ser un acto de conanza para que
los alumnos compartan el poder que la evaluación ha entregado a los
profesores. Esta asimetría coloca al profesor en la cima de la montaña y
a los estudiantes en el valle. Aquí se pone en juego todo el poder que
descansa en los educadores, en sus juicios evaluativos, en las decisiones que
toman, a partir de las evidencias que recogen. En este contexto, ¿Es posible
compartir este poder que entrega la evaluación? ¿Están dispuestos los
profesores a perder parte de este poder? O planteado de manera positiva:
¿Están dispuestos los docentes a compartirlo con sus estudiantes?. Para una
mirada de futuro, ¿Es posible que profesores y alumnos caminen por valles
para llegar en conjunto a la cima?.
Debemos buscar las estrategias para descentralizar el acto
evaluativo docente y transformarlo en un compromiso sustentado en la
conanza y el compromiso ético. Por ello, se hace necesario democratizar este
proceso de valoración de los procesos de aprendizaje (RÍOS; HERRERA,
2019). Es un imperativo político y ético avanzar hacia una mayor simetría,
entre profesores y estudiantes, en consecuencia, hacia una más amplia
participación de los educandos en los procesos valorativos (NOT, 1992).
Esta reciprocidad conlleva la posibilidad de que el estudiante se haga