Monique Hulshof e Ubirajara Rancan de Azevedo Marques (Org.)
110 |
vida—, dois trechos comparativos d’“A Arquitetônica da Razão Pura” não
terão desperto nenhuma atenção especial no leitor. Tais passagens, além de
não mencionarem essa teoria embriológica, optam por um tipo de compa-
ração que, sem o nomear diretamente, apóia-se com clareza no preformis-
mo e, pois, em modelo generativo oposto à epigênese.
Mas com a publicação por Erdmann
3
de reexões
4
do lósofo,
tornou-se documentalmente viável a possibilidade de algum conito entre
embriológico—referência também nominal, própria, em escrito seu publicado em vida—ocorre somente no
“§ 81” da KU [Kant, KU, AA 05: 422-423]. Cf. Sloan (2002, p. 242): «In 1785 Kant for the rst time in his
published writings employed the embryological term “epigenesis”». A observação de Sloan deverá ser mitigada, já
que o termo em pauta, efetivamente usado por Kant em suas Recensionen zu J. G. Herders Ideen zur Philosophie
der Geschichte der Menschheit, foi-o, porém, no interior duma citação da obra recenseada. A propósito, a citação
de Kant, do modo como feita, não corresponde a nenhuma passagem propriamente dita do texto de Herder,
mas a um recorte e realinhamento de armações do autor [no cotejamento abaixo, foi destacado em negrito o
conteúdo comum a ambos os textos]:
Präformirte Keime hat kein Auge gesehen.
Wenn man von einer Epigenesis redet, so spricht
man uneigentlich, als ob die Glieder von außen
zuwüchsen. [...]
[Kant, RezHerder, AA 08: 50]
Präformierte Keime, die seit der Schöpfung
bereitlagen, hat kein Auge gesehen [...] Sieht man
diese Wandlungen, diese lebendigen Wirkungen
sowohl im Ei des Vogels als im Mutterleibe des Tiers,
das Lebendige gebärt, so, dünkt mich, spricht man
uneigentlich, wenn man von Keimen, die nur
entwickelt würden, oder von einer Epigenesis redet,
nach der die Glieder von außen zuwüchsen. [...]
[Herder, 2004].
3
No âmbito das “reexões” publicadas por Erdmann, são duas as que mencionam a “epigênese”; cf. Erdmann
(1882) [“Reexionen zur Anthropologie”]; 1884 [“Reexionen zur Kritik der reinen Vernunft”]; p. 276; p.
375. Na primeira destas, lê-se: “Ursprung transscendentaler Begrie: 1) per intuitionem mysticam, 2) <per>
inuxum sensitivum, 3) per praeformationem, 4) per epigenesin intellectualem †) — intellectual, intuitiv oder
discursiv. — Der Zweck der Metaphysik ist Gott und eine künftige Welt. — epicUr nichts a priori.” [cf. Kant,
Re, AA 18: 12: “Ursprung transscendentaler Begrie 1. per intuitionem mysticam. 2. (
g
inuxum) sensitivum.
3. per praeformationem. 4. per epigenesin intellectualem. (
g
intellectualia intuitiv oder discursiv.) Der Zwek
der Metaphysik ist Gott und eine künftige Welt. epicur nichts a priori”]. Já a nota “†)” de Erdmann, diz: “Das
possibilidades aqui conjuntamente ordenadas, o ‘§ 27’ da Crítica [da Razão Pura] aceita unicamente a primeira
e a quarta; a terceira (Crusius) só é mencionada para ser retirada; a quarta, que em 1772 está no primeiro
plano da reexão, é completamente recusada” [“†) Von den hier coordinirten Möglichkeiten lässt die Kr. § 27
nur noch die erste und vierte gelten. Die dritte (Crusius) wird nur erwähnt, um abgewiesen zu werden. Die
vierte, die 1772 im Vordergrund der Ueberlegung steht, ist ganz zurückgetreten”]. As armações de Erdmann
parecem mostrar-se parcialmente incoerentes para com o conteúdo do “§ 27” a que ele próprio recorre em tal
nota para fundamentá-las, pois a origem dos conceitos transcendentais por intuição mística [“per intuitionem
mysticam”], sequer mencionada no parágrafo em questão, não é positivamente aceita por Kant como uma
possibilidade explicativa da origem de tais conceitos. A armação nal de sua nota mostra-se inda mais
peremptoriamente incoerente para com o conteúdo do “§ 27”, já com ela própria, pois que, depois de armar
que: “Das possibilidades aqui conjuntamente ordenadas, o ‘§ 27’ da Crítica [da Razão Pura] aceita unicamente
a primeira e a quarta”—e a “quarta” é justo a explicação da origem dos conceitos transcendentais “per epigenesin
intellectualem”, a única aceita em tal parágrafo—, ele arma: “a quarta, que em 1772 está no primeiro plano da
reexão, é completamente recusada”.
Anteriormente à publicação por Erdmann dum grande conjunto de manuscritos de Kant [cf., aqui, a
nota imediatamente anterior], Rosenkranz e Schubert já haviam publicado, havia então quarenta anos, algo