A
N
I
C
I
F
O
Á
R
T
I
I
S
A
R
E
V
I
N
U
Sueli Guadelupe de Lima Mendonça
Luciana Aparecida Araújo Penitente
Stela Miller
(Organizadoras)
A Questão do Método e a Teoria
Histórico-Cultural
Sueli Guadelupe de Lima Mendonça
Luciana Aparecida Araújo Penitente
Stela Miller
(Organizadoras)
A Questão do Método e a Teoria
Histórico-Cultural: bases teóricas e
implicações pedagógicas
Marília/Ocina Universitária
São Paulo/Cultura Acadêmica
2017
UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA
FACULDADE DE FILOSOFIA E CIÊNCIAS
Diretor:
Dr. Marcelo Tavella Navega
Vice-Diretor:
Dr. Pedro Geraldo Aparecido Novelli
Conselho Editorial
Mariângela Spotti Lopes Fujita (Presidente)
Adrián Oscar Dongo Montoya
Ana Maria Portich
Célia Maria Giacheti
Cláudia Regina Mosca Giroto
Giovanni Antonio Pinto Alves
Marcelo Fernandes de Oliveira
Maria Rosangela de Oliveira
Neusa Maria Dal Ri
Rosane Michelli de Castro
Ficha catalográca
Serviço de Biblioteca e Documentação – Unesp - campus de Marília
Editora aliada:
Cultura Acadêmica é selo editorial da Editora Unesp
Q5 A Questão do método e a teoria histórico-cultural : bases teóricas e implicações pedagógicas /
Sueli Guadelupe de Lima Mendonça, Luciana Aparecida Araújo Penitente, Stela Miller
(organizadores). – Marília : Ocina Universitária ; São Paulo : Cultura Acadêmica,
2017.
170 p. : il.
Inclui bibliograa
ISBN 978-85-7983-878-1 (Impresso)
ISBN 978-85-7983-879-8 (Digital)
1. Pedagogia crítica. 2. Materialismo histórico. 3. Pesquisa educacional. 4. Ensino
- Metodologia. I. Mendonça, Sueli Guadelupe de Lima. II. Penitente, Luciana Aparecida
Araújo. III. Miller, Stela.
CDD 370.115
DOI https://doi.org/10.36311/2017.978-85-7983-879-8
Sumário
Apresentação
Sueli Guadelupe de Lima Mendonça,
Luciana Aparecida Araújo Penitente e Stela Miller
............................ 7
Prefácio
Marilda Gonçalves Dias Facci
.......................................................... 13
Primeira Parte
o método em questãomarx e teoria histórico-cultural
La visión integral o de totalidad en el método dialéctico, su presencia
en lo histórico cultural y sus proyecciones en la práctica educativa
Guillermo Arias Beatón
.................................................................... 19
Segunda Parte
o método nas pesquisas educacionais
O método nas pesquisas educacionais: uma aproximação metodológica
ao estudo do desenvolvimento cultural
Idania B. Peña Grass
....................................................................... 39
O método na teoria histórico-cultural: a pesquisa sobre a relação
indivíduo-generecidade na educação
Maria Eliza Mattosinho Bernardes
................................................... 63
terceira Parte
método e trabalho pedagógico
O método como base para reexão sobre um modo geral de organização
do ensino
Marta Sueli de Faria Sforni
............................................................. 81
A alfabetização na educação infantil à luz da pedagogia histórico-crítica
Ana Carolina Galvão Marsiglia; Hadassa da Costa Santiago Bremenkamp 97
Trabalho pedagógico na educação infantil: em busca da atitude ativa de
professores e crianças
Elieuza Aparecida de Lima
.............................................................. 113
quarta Parte
o método e a formação de adolescentes e jovens
O método na psicologia do desenvolvimento e a formação de
adolescentes e jovens
Armando Marino Filho ...................................................................
133
Proyectos futuros en jóvenes cubanos: una mirada desde el enfoque
histórico cultural
Laura Dominguez Garcia
............................................................... 147
Sobre os Autores ............................................................................ 167
aPreSentação
Sueli Guadelupe de Lima Mendonça
Luciana Aparecida Araújo Penitente
Stela Miller
Durante a realização do evento que reuniu a 15ª. Jornada do Nú-
cleo de Ensino da Faculdade de Filosoa e Ciências — UNESP — Campus
de Marília e o 3º. Congresso Internacional sobre a Teoria Histórico-Cultu-
ral, realizado de 09 a 11 de agosto de 2016, foram realizadas conferências
e palestras algumas das quais compõem a presente coletânea.
Nesse evento objetivou-se discutir a questão do método do ponto
de vista histórico-cultural, trazendo ao debate, além da base teórica a partir
da qual o tema foi tratado, algumas de suas possíveis implicações pedagó-
gicas direcionadas à reexão sobre pressupostos necessários à constituição
de uma teoria pedagógica passível de efetivar-se nas práticas educativas, na
pesquisa e na formação de professores.
Vygotski (2000), ao tratar de suas pesquisas acerca das funções
psicológicas superiores, ressalta a estreita relação que há entre o objeto e
método. O objeto a ser investigado caracteriza-se por certas particulari-
dades e especicidades a partir das quais são denidos o problema e o
método que mais adequadamente se presta ao estudo desse objeto. Por
meio do método delineia-se o caminho a ser seguido, a forma e o curso das
ações investigativas, e, por isso, a sua busca converte-se, segundo o autor,
em uma das tarefas de maior importância da investigação” (VYGOTSKI,
2000, p. 47).
https://doi.org/10.36311/2017.978-85-7983-879-8.p7-12
8 MENDONÇA, S. G. L.; PENITENTE, L. A. A.; MILLER, S. (Org.)
O método, porém, é uma questão crucial não apenas para as ações
investigativas, quando está em jogo a busca de respostas para problemas
cientícos circunscritos em determinadas áreas do conhecimento. Ele é
também essencial quando se trata das questões pedagógicas, tanto aquelas
que abrangem os processos de preparação dos prossionais que atuarão nos
diferentes sistemas de ensino, como, mais especicamente, os processos
de ensino e de aprendizagem que se desenvolverão, por meio da atuação
desses prossionais, no interior das escolas que fazem parte desses sistemas.
Durante sua formação, os prossionais que atuam nas escolas,
particularmente os professores, passam por um processo que objetiva pôr
em relação os conteúdos – que serão objeto de aprendizagem por parte das
crianças e jovens que estarão no futuro sob sua orientação – e o método
pelo qual esses conteúdos podem ser ensinados. Para isso, o processo de
formação prossional é também pensado em termos da relação entre obje-
to e método: é preciso denir tanto os conteúdos que deverão fazer parte
dessa formação, como o caminho a ser seguido para a implementação desse
processo.
Da mesma forma, os processos de ensino e de aprendizagem, que
se concretizam em sala de aula no trabalho com crianças e jovens, têm um
conteúdo especíco e uma forma adequada de organizar-se para que se
torne possível a objetivação do desenvolvimento dos sujeitos envolvidos.
A questão do método e sua inter-relação com o objeto é, pois,
central nos campos de atuação acima discriminados. Mas não somente,
ela é crucial em todas as áreas de atividades humanas, manifestando-se de
forma mais ou menos complexa na dependência da natureza do objeto
dessas atividades.
Os artigos presentes nesta coletânea apresentam a questão do mé-
todo em uma sequência pensada a partir de uma abordagem mais ampla
do tema, passando pela discussão do método nas pesquisas educacionais
e no processo de formação prossional do professor, nalizando com as
questões relativas às implicações pedagógicas para a formação de crianças e
jovens. Para isso, os artigos foram organizados em quatro partes.
A primeira parte, intitulada “O método em questão – Marx e
teoria histórico-cultural”, traz o artigo “La visión integral o de totalidad
A Questão do Método e a Teoria Histórico-Cultural 9
en el método dialéctico, su presencia en lo histórico cultural y sus proyecciones
en la práctica educativa escrito por Guillermo Arias Beatón. Nesse artigo,
Beatón apresenta discussão interessante sobre o método marxista, ao ana-
lisar como Vigotski em seus trabalhos, perseguiu o uso desse método em
sua essência, mostrando de modo original as marcas e as limitações desse
processo pelo qual enveredou em suas pesquisas sobre o desenvolvimento
humano.
Na segunda parte, “O método nas pesquisas educacionais”, estão
os artigos de Idania B. Peña Grass e de Maria Eliza Mattosinho Bernardes.
Idania B. Peña Grass, em seu artigo intitulado “O método nas
pesquisas educacionais: uma aproximação metodológica ao estudo do desenvol-
vimento cultural” trata de uma questão crucial para a pesquisa educacional:
abordar o método em sua estreita vinculação com o objeto de estudo. A
autora destaca que o foco de sua análise não é o método tomado em si mes-
mo, mas a relação dialética entre objeto e método pela qual pode-se com-
preender o papel e a importância da teoria histórico-cultural para a pesqui-
sa educacional. Para isso, trata dos princípios básicos que estão na base da
escolha do método para a adequada abordagem do objeto de pesquisa, que,
por se caracterizar como um processo em constante movimento, deman-
da uma análise explicativa das relações dinâmico-causais, superando, com
isso, os limites próprios da análise puramente descritiva e da constatação
das características aparentes da realidade pesquisada.
O artigo de Maria Eliza Mattosinho Bernardes, “O método na
teoria histórico-cultural: a pesquisa sobre a relação indivíduo-generecidade
na educação, focaliza a pesquisa educacional da perspectiva da teoria his-
tórico-cultural, que analisa o objeto em sua concretude, materialidade e
historicidade. Traz à discussão os princípios teóricos da pesquisa sobre o
desenvolvimento psicológico a partir dos quais são analisados os processos
educativos no desenvolvimento psicológico, contribuindo com isso para a
compreensão da pesquisa educacional à luz dessa teoria.
A terceira parte denominada “Método e trabalho pedagógico”,
engloba artigos que falam da questão geral de como o trabalho pedagógico
pode se organizar para orientar o processo de desenvolvimento dos alunos,
e das possibilidades abertas pela Teoria Histórico-Cultural para a organi-
10 MENDONÇA, S. G. L.; PENITENTE, L. A. A.; MILLER, S. (Org.)
zação do trabalho pedagógico a ser realizado na educação infantil a m de
proporcionar às crianças uma atividade adequada às principais transfor-
mações que se dão em seu psiquismo nesse momento da vida. Nessa parte
estão os artigos de Marta Sueli de Faria Sforni, de Ana Carolina Galvão
Marsiglia em conjunto com Hadassa da Costa Santiago Bremenkamp e de
Elieuza Aparecida de Lima.
Em seu artigo “O método como base para reexão sobre um modo
geral de organização do ensino, Marta Sueli de Faria Sforni propõe uma
articulação entre o Método Materialista Histórico-Dialético, a Teoria
Histórico-Cultural e a Didática, objetivando fazer do ensino uma possi-
bilidade efetiva de desenvolvimento humano.
Para isso, a autora defende um modo geral de organização do
ensino feito com base em cinco princípios que orientam a prática docen-
te, a saber, princípio do ensino que desenvolve, princípio do caráter ativo
da aprendizagem, princípio do caráter consciente, princípio da unidade
entre plano material (ou materializado) e o verbal, e o princípio da ação
mediada pelo conceito. A ideia é que, tendo como base esses princípios,
o professor possa organizar o processo de ensino de modo a adequá-lo às
suas intenções de conduzir a aprendizagem de seus alunos visando ao seu
desenvolvimento.
Ana Carolina Galvão Marsiglia e Hadassa da Costa Santiago
Bremenkamp, no artigo denominado A alfabetização na educação in-
fantil à luz da pedagogia histórico-crítica, expõem os resultados de uma
pesquisa bibliográca e documental, feita com base na Pedagogia His-
tórico-Crítica, que objetivou identicar práticas pedagógicas necessárias
à apropriação da alfabetização na educação infantil, defendendo a ideia
de que ela só pode ser alcançada adequadamente quando há o ensino
intencional, que, por sua vez, deve estar presente em todas as etapas edu-
cacionais, de modo a garantir a sequência de aprendizagens necessária
à apropriação da língua escrita. Concluem que a alfabetização, em seu
sentido pleno não foi alcançada com os sujeitos da referida pesquisa em
função das “referências dominantes” para o ensino e a aprendizagem da
língua escrita que criticam as formas intencionais de ensino.
A Questão do Método e a Teoria Histórico-Cultural 11
No artigo intitulado Trabalho pedagógico na educação infantil:
em busca da atitude ativa de professores e crianças, Elieuza Aparecida de
Lima traz a discussão sobre o papel e o valor do ensino na educação de
crianças pequenas como possibilidade efetiva de humanização. Para tan-
to, parte dos pressupostos da Teoria Histórico-Cultural considerando as
relações sociais como elemento necessário ao processo de humanização
das crianças, principalmente nos anos iniciais de sua vida, possibilitando-
-lhes a apropriação de conhecimentos motivadores no desenvolvimento
da inteligência e da personalidade, o que requer um trabalho pedagógico
dirigido à organização de situações que são projetadas intencionalmente
e um prossional habilitado para proporcionar a elas condições objetivas,
de modo que aprendam e se desenvolvam de maneira ativa em níveis
cada vez mais elaborados.
A quarta parte, “O método e a formação de adolescentes e jo-
vens”, fecha a coletânea. Nela estão os artigos de Armando Marino Filho
e de Laura Dominguez Garcia, tratando especicamente da orientação de
jovens na fase nal de seus estudos na educação básica.
No artigo denominado “O método na psicologia do desenvolvi-
mento e a formação de adolescentes e jovens, Armando Marino Filho
aborda a temática sobre o desenvolvimento de adolescentes e jovens na
perspectiva da Teoria Histórico-Cultural, articulando a fundamentação
teórica com suas pesquisas e experiências, com foco especial na formação
do pensamento desses sujeitos, ressaltando a centralidade dessa função
psíquica para o desenvolvimento psicológico, e também destacando a sua
importância para as inter-relações entre a formação dos indivíduos para o
domínio e transformação das atuais formas de existência social.
Laura Dominguez Garcia em seu artigo “Proyectos futuros en
jóvenes cubanos: una mirada desde el enfoque histórico cultural, discorre
sobre as principais regularidades do desenvolvimento psicológico na eta-
pa da juventude, a partir dos princípios da Teoria Histórico-Cultural, em
particular da categoria situação social de desenvolvimento, apresentando
os resultados de pesquisas realizadas com diferentes grupos de jovens
cubanos e voltadas à caracterização de seus projetos futuros, entendidos
como formações complexas da personalidade – expressão temporal da
12 MENDONÇA, S. G. L.; PENITENTE, L. A. A.; MILLER, S. (Org.)
motivação – que se estruturam como tarefa principal dos jovens, objeti-
vando determinar seu lugar futuro na sociedade, dentro dos sistemas de
atividade e comunicação que transcorrem em suas vidas.
referncia
VYGOTSKI, L. S. Obras Escogidas. 2. ed. Madri: Visor, 2000. Vol. III.
Prefácio
Marilda Gonçalves Dias Facci
1
“Por mais estranho e paradoxal que pareça, à primeira vista, é precisamen-
te a prática, como princípio construtivo da ciência, que exige uma losoa,
ou seja, uma metodologia da ciência(VIGOTSKI, 1996, p. 345)
Os textos que compõem esta coletânea intitulada Teoria Históri-
co-Cultural e a questão do método – bases teóricas e implicações pedagógicas,
organizada pelas professoras Sueli Guadelupe de Lima Mendonça, Lucia-
na Aparecida Araújo Penitente e Stela Miller fazem parte das discussões
apresentadas pelos pesquisadores que zeram exposições de trabalhos no
evento que conjugou a 15ª. Jornada do Núcleo de Ensino e o 3º. Congres-
so Internacional da Teoria Histórico-Cultural, realizado em 2016. O tema
proposto foi muito sugestivo: “Teoria Histórico-Cultural e a questão do
método - bases teóricas e implicações pedagógicas”. A nalidade do evento
foi pensar a relação teoria e prática a partir da Psicologia Histórico-Cultu-
ral, que tem como fundamento o materialismo histórico e dialético.
Ao analisar o texto escrito por Vigotski (1996) por volta de 1917,
O signicado histórico da crise da Psicologia, um ponto que sempre produz
reexão é quando ele chama a atenção para a epígrafe que apresentei no
início deste prefácio. Concordo plenamente com o autor que a prática é
fundamentada por uma losoa. Ele nos incita a pensar, no nosso caso que
lidamos com a área de ciências humanas, em qual visão de homem está
guiando, por exemplo, a atividade pedagógica realizada cotidianamente
1
Professora do Departamento de Psicologia e Programa de Pós-Graduação em Psicologia da Universidade Es-
tadual de Maringá.
https://doi.org/10.36311/2017.978-85-7983-879-8.p13-18
14 MENDONÇA, S. G. L.; PENITENTE, L. A. A.; MILLER, S. (Org.)
em busca da transmissão-apropriação do conhecimento. A unidade dialé-
tica entre teoria e prática é imprescindível quando reetimos sobre a trans-
formação que ocorre nos indivíduos no processo ensino-aprendizagem;
seja naquele em que se vai humanizando os sujeitos por meio da educação,
da apropriação dos conteúdos curriculares, dos conhecimentos cientícos;
seja naquele que sistematiza o ensino de forma a instrumentalizar os alunos
para, por meio de mediações teóricas, conhecer a realidade para além da
pseudoconcreticidade, como arma Kosik (1976).
O professor Dermeval Saviani (2003), ao elaborar a Pedagogia
Histórico-Crítica, deixa muito claro que a função da educação é a trans-
missão e apropriação dos conhecimentos produzidos pelos homens no
processo histórico. Nesta socialização, quais seriam os fundamentos losó-
cos, epistemológicos e psicológicos que guiam os prossionais que atuam
no espaço educativo? Essa é uma questão premente de ser discutida, pois,
para “[...] qualquer ciência chega, mais cedo ou mais tarde, o momento
em que deve ter consciência de si mesma como um conjunto, compreen-
der seus métodos e trasladar a atenção dos atos e fenômenos aos conceitos
que utiliza” (VIGOTSKI, 1996, p. 229). Parece-me que o evento foi por
este caminho e os autores se debruçaram sobre esse ponto nevrálgico, que
merece toda nossa atenção.
Ao ler os capítulos que seguem, um eixo central que liga todos os
textos é a discussão sobre o método do materialismo histórico e dialético
guiando as reexões e as proposições das práticas que são exemplicadas
nos textos. O Prof. Guilhermo Beatón escreve nesta obra que se considera
um aprendiz do método do materialismo histórico e dialético, e quei
reetindo: se compreender esse método já é uma tarefa espinhosa, complexa,
o que se dirá, então, de ainda discorrer sobre as implicações pedagógicas
deste método? É isso que o leitor encontrará nas páginas que se seguem.
Os pesquisadores se debruçam sobre categorias do marxismo para pensar o
miúdo da escola” – expressão utilizada em uma das conversas com a Profª.
Marta Sforni – e que precisa ser desenredado nas situações de ensino, como
a autora propõe no texto que escreve nesta coletânea.
Nos capítulos que tratam da prática pedagógica, o que obser-
vamos é uma forte defesa da apropriação dos conhecimentos cientícos
como fator imprescindível para o desenvolvimento das funções psicológi-
A Questão do Método e a Teoria Histórico-Cultural 15
cas superiores, deixando clara a função da educação e entendendo a apren-
dizagem como essencial para o desenvolvimento humano, como bem ana-
lisam Ana Carolina Marsiglia, Hadassa da Costa Santiago Bremenkamp e
Elieuza Lima. As autoras trazem também para o centro do debate, a atua-
ção do professor, prossional este que deve estar preparado para criar as
melhores e mais ricas condições objetivas para que os alunos desenvolvam
suas potencialidades.
Alguns textos trazem uma discussão de categorias do método que
auxiliam no aprofundamento dos conceitos tratados, resgatando a concre-
tude, a materialidade e a historicidade, conforme propõe Eliza Bernardes;
outros, ainda, abordam categorias centrais da Psicologia Histórico-Cul-
tural, tais como a relação entre o interno e externo na situação social de
desenvolvimento, como tão bem discute Idania Grass.
A juventude também é analisada, tanto por Armando Marino
Filho, que fala do desenvolvimento psicológico do jovem no Brasil, como
por Laura Garcia, que trata dos projetos futuros dos jovens cubanos. Tratar
da adolescência a partir da Psicologia Histórico-Cultural é um tema mui-
to importante, quando ainda impera nos estudos e produções uma visão
de adolescência embrenhada em aspectos biológicos, sem considerar que,
nessa fase, o jovem tem possibilidades de desenvolver os verdadeiros con-
ceitos e tem grande desenvolvimento das funções psicológicas superiores,
como propõe Vygotski (1996), transformando tanto os conteúdos como
as formas de pensar.
A discussão do método, como armamos, tangencia os trabalhos
e vai criando motivos que nos incitam a querer estudar mais, aprofundar
conceitos, dialogar com os autores. Provavelmente aqueles que participa-
ram no evento de Marília, puderam ser contemplados com discussões mui-
to ricas.
Entendemos que o exercício do uso do método se faz necessário
no contexto em que vivemos hoje, no qual se trata, corriqueiramente, das
metodologias utilizadas, mas raramente se fala dos métodos, mesmo entre
aqueles que armam ter base nos conceitos da Psicologia Histórico-Cultu-
ral. Neste material, além dos autores partirem do concreto, na problema-
tização das temáticas, apresentam mediações que levam a pensar nos fatos
16 MENDONÇA, S. G. L.; PENITENTE, L. A. A.; MILLER, S. (Org.)
por meio da abstração teórica, voltando a esse concreto agora permeado
por generalizações avançadas. Isso possibilita ver a essência do que está
sendo tratado, fugindo da aparência.
Diante dessas considerações, é necessário registrar o agradecimen-
to por ser convidada a escrever esse prefácio em uma obra que explicita a
aplicação do marxismo na relação entre psicologia e educação. Ao observar
a trajetória do grupo de estudiosos da Psicologia Histórico-Cultural e do
Marxismo em Marília, ca evidente o compromisso político dos pesquisa-
dores e prossionais com uma educação que realmente desenvolva a eman-
cipação humana e que leve em consideração o contexto histórico-cultural
que produz relações de classe que permeiam a atividade educativa. Além
disso, ca explícita a luta por uma psicologia e educação que tenham como
método o materialismo histórico e dialético. Já em 1927 Vigotski anuncia-
va que a psicologia marxista ainda não existia, que sua construção era uma
tarefa histórica. Entendemos que a tarefa continua e essa obra caminha
nesse trilho ...
referênciaS
KOSIK, K. Dialética do concreto. 7. ed. São Paulo: Paz e Terra, 1976.
SAVIANI, D. Pedagogia histórico-crítica: primeiras aproximações. 8. ed. Campinas:
Autores Associados, 2003.
VIGOTSKI, L. S. Teoria e método em psicologia. 3. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2004.
VYGOTSKI, L. S. Obras Escogidas IV. Madrid: Visor Distribuciones, 1996.
Primeira Parte
o método em questão: marx e
teoria
histórico-cultural
la viSión integral o de totalidad en el
método dialéctico, Su PreSencia en lo
hiStórico cultural y SuS ProyeccioneS en la
Práctica educativa
Dr. Guillermo Arias Beatón
Estimados colegas y amigos, trabajadores académicos, luchadores
por transformar el Mundo en un Mundo mejor. Propósito esencial, no
obstante los avatares, de la concepción teórica y metodológica marxista,
materialista dialéctica e histórica y su forma de hacer y producir conoci-
mientos, su método.
En esta conferencia he preparado un análisis en tres momentos.
Pero antes, deseo decir que me considero un aprendiz del método materia-
lista dialéctico e histórico y una persona que ha intentado desde los años
70 del siglo XX, conocer desde la vida real y en su mayor integralidad, las
prácticas educativas en la familia como primer agente educativo, en la es-
cuela y en la sociedad, estudiando las condiciones o determinantes de una
educación de calidad que promueva y arrastre el desarrollo psíquico, tal y
como interpreto que proclaman los pensadores cubanos de los siglos XVIII
y XIX (LUZ Y CABALLERO, 2001; MARTÍ, 1975) y lo que postula des-
de inicio del siglo XX el Enfoque Histórico Cultural (VYGOTSKI, 1991).
Después de un análisis inicial de las características del método
dialéctico e histórico, presentaré un ejemplo de aplicación o empleo de
éste, utilizando algunos estudios y análisis hechos por el propio Vygotski,
acerca del desarrollo psíquico a partir de su concepción Histórico Cultural
y por último, presentaré sucintamente lo que considero una corroboración
en la práctica educacional cubana de esta explicación.
https://doi.org/10.36311/2017.978-85-7983-879-8.p19-38
20 MENDONÇA, S. G. L.; PENITENTE, L. A. A.; MILLER, S. (Org.)
Primer momento
El problema de abarcar la integralidad o totalidad en las explica-
ciones del proceso de producción de conocimientos, es uno de los aspectos
más complejos y centrales del método dialéctico y el conseguirlo, abarca a
todas las demás características que lo denen.
Parto del hecho de que explicar algo, convertirlo en lo concreto
pensado a partir de explorar, organizar y ordenar la situación concreta en
la que se observa y existe un objeto de estudio determinado, es atrapar,
imaginar y llevar al pensamiento, la estructura de los determinantes y el
funcionamiento interno de dicho objeto, explicar los nexos y relaciones de
las condiciones o determinantes que lo hacen existir y ser (MARX, 2011,
VYGOTSKI, 1991, POLITZER, 1965).
Esta es una de las características metodológicas y conceptuales
que más se viola o se desvirtúa, en otras concepciones cientícas y losó-
cas. Muchos autores señalan (NETTO, 2011), por ejemplo, que uno de
los males mas importantes del stalinismo, fue el no considerar la amplia
naturaleza mediada de las determinantes de cualquier objeto de estudio, en
el proceso de conocer y explicar los hechos de la naturaleza, la sociedad y
el ser humano y además, no considerar el principio del historicismo, parte
esencial de esa totalidad. Por eso, el stalinismo tiene poco que ver con el
marxismo y el método dialéctico, porque él se constituyó en una desvia-
ción de esta forma de pensar, y se apropió de muchas de las concepciones
positivistas y pragmáticas que rigen en la sociedad moderna y posmoderna.
Por eso, puede que no sea una casualidad que en aquellas cir-
cunstancias, Luria, Leontiev y Teeplov, le criticaran a Vygotski, que en sus
explicaciones sobre el desarrollo psíquico, empleara muy ampliamente el
carácter mediado de este desarrollo. Esta la realizaron en 1960, en la intro-
ducción que escribieron para la publicación, por primera vez, del libro El
desarrollo de las funciones psíquicas superiores, que, por suerte no repitieron
en la publicación en ruso de las Obras Escogidas de 1982 (LEONTIEV,
LURIA Y TEEPLOV, en VYGOTSKI, 1987).
La amplitud y profundidad de una explicación integral exige va-
rias condiciones, en primer lugar no dejar de considerar que todo objeto o
hecho que se investiga y estudia, siempre desborda los límites concretos de
A Questão do Método e a Teoria Histórico-Cultural 21
los estudios en cuestión y se encuentra interrelacionado con otros hechos
o situaciones de una manera muy compleja e histórica que solo se puede
ir develando con otros estudios que se realicen, según lo exijan los análisis
cientícos que se lleven a cabo, siguiendo los indicios de la famosa ley de
la concatenación de los fenómenos en la naturaleza, la sociedad y el propio
ser humano.
Por eso toda explicación de algo, ha de ser realizada señalando
sus posibles límites y posibilidades, agregándole a la explicación, por par-
te del investigador o cientíco, si no realiza nuevos estudios, preguntas o
alternativas de explicaciones, en función de lo que se haya obtenido hasta
ese momento y que indiquen lo que falte por conocer y abarcar, para al-
canzar dicha totalidad. Esta labor, ha de estimular o marcar pautas para
que otros investigadores realicen y continúen nuevas investigaciones. Por
eso las ciencias son el producto histórico y colectivo de seres humanos
que trabajan por descubrir las explicaciones necesarias de un determina-
do objeto.
La totalidad se amplía o se hace mas integral por medio de otros
trabajos, estudios e investigaciones que incluso, aunque no hayan sido
hechas sobre las bases teóricas y metodológicas del método dialéctico,
aportan datos e interpretaciones que sometidos a un análisis crítico per-
tinentes, consigan una articulación coherente de todas las explicaciones
hasta ese momento obtenidas y, por último, por el sistema de estudios
e investigaciones del propio autor o de otros autores que continúen la
búsqueda de dicha integralidad en momentos históricos posteriores y
durante años. Un ejemplo de esto es que Marx dedicó más de 40 años a
sus estudios y explicaciones y aun se trabaja para conseguir que su obra
cumpla con los propósitos de contribuir a transformar al Mundo, a la
sociedad y al propio ser humano, o sea, producir un Mundo mejor, una
sociedad mejor y un ser humano menos alienado.
Una investigación que se centre en un aspecto especíco y con
sus resultados pretenda explicar el todo sin tener en cuenta que no lo es,
es una manera limitada de analizar la integralidad, es lo que conduce al
reduccionismo, a la supercialidad y a la falta de rigor, muy acorde con
el empleo de otras concepciones de hacer ciencias.
22 MENDONÇA, S. G. L.; PENITENTE, L. A. A.; MILLER, S. (Org.)
Me interesa insistir en este problema porque es una de las razones
por la cual otras formas de pensar han alterado el proceso de búsqueda
del conocimiento al fragmentar y no integrar las explicaciones, sino verlas
como verdades parciales de un proceso que es mucho mas complejo y di-
námico. Esta característica hace que muchas tendencias metodológicas se
queden en las descripciones de los hechos y no lleguen a sus esencias.
La verdad cientíca no se puede resolver como pretenden las
concepciones epistemológicas, no ontológicas actuales y como enfatizó
Peirce, el creador de la losofía Pragmática en el siglo XIX, por medio de
expresar con claridad las ideas cientícas (PEIRCE, 1878; TORROELLAS,
1946). Esto solo se consigue a mi juicio como exige el método materialista
dialéctico e histórico cuando se atrapa y explica la esencia. En esas
condiciones y con estos conocimientos, es que se puede trabajar la claridad
de la explicación o ideas cientícas. Solo con la claridad no se consigue
obtener la explicación esencial, pues a decir de Comenio, este sería un
discurso hueco o vacío (COMENIO, 1983).
Tampoco con la objetividad a ultranza muchas veces formal y
abstracta, que no expresa la esencia del objeto de conocimiento, se con-
sigue mucho más, a penas se llega a una descripción, aunque se realicen
experimentos o se cuantiquen los datos, como lo exige el positivismo
(COMTE, 1934; 1969; COELHO, 2005).
La explicación cientíca sin considerar las condiciones concretas
y reales del objeto de estudio, el proceso histórico, el papel del tiempo y las
condiciones circunstanciales y concretas en ese proceso, tampoco permite
alcanzar la explicación lo más integral posible. Muchas tendencias meto-
dológicas y losócas tampoco tienen en cuenta tan importante determi-
nante, dañándose de esta manera la explicación del objeto.
Segundo momento
Si bien Vygotski, dado el tiempo del que dispuso, empleando este
método, no logró la integralidad que buscaba en relación con la explica-
ción del desarrollo psíquico humano y las condiciones que permitían su
formación y desarrollo; prácticamente todos sus trabajos son un intento
consciente de un acercamiento a esta integralidad, señalándonos las pistas
A Questão do Método e a Teoria Histórico-Cultural 23
de lo que era necesario seguir haciendo, en los marcos de una psicología
general y verdaderamente cientíca, al estilo del Capital.
Vygotski, siempre hizo un análisis crítico e histórico, en cada
tema que abordó, a partir de su concepción losóca general. Explicando
críticamente cómo dicho problema había sido tratado en las ciencias psi-
cológicas tradicionales e incluso en otros campos del saber. Tampoco dejó
de delimitar su posible integralidad y empleó este recurso metodológico,
presentándonos una muestra de cómo trabajar la integralidad de los he-
chos y sus explicaciones, no obstante no poseer todos los datos y estudios
necesarios (VYGOTSKI, 1972; 2001; 1987; 1993; 2004).
Todo ello como ya explicaré, nos permite hoy producir análisis
mas aproximados a dicha totalidad. Por eso nosotros decimos sobre la obra
de Vygotski que ella siempre está presta a un enriquecimiento, ampliación,
profundización o esclarecimiento nuevo. Es una teoría abierta y también
hospitalaria, como la identica mi colega y amiga Gloria Fariñas, siempre
y cuando se realicen los estudios y análisis críticos pertinentes.
La obra de Vygotski cumple con esta característica porque se
aprecia que él parte de la concepción integral que conforma al propio
método, que se fundamenta en que todo está concatenado, parte de la
realidad concreta que es una síntesis de lo diverso y asume que todo es
un proceso mediado e histórico que conforma lo psíquico especícamente
humano, o sea, que no existe algo que sea un proceso intrínseco o inhe-
rente del objeto de estudio (VYGOTSKI, 1991, 1987, 1996). Es por esta
razón esencial que necesitamos conocer las leyes y regularidades que rigen
los hechos y fenómenos, para no alterar ni su naturaleza ni su contenido,
solo contribuir armónicamente con su expresión, para beneciarnos en
nuestra adaptación activa (BACON, 1961; LUZ Y CABALLERO, 2001;
VYGOTSKI, 1991). Esta concepción teórica y metodológica que elabora
Vygotski en sus años de trabajo con el método dialéctico, me permiten hoy
hacer esta referencia integradora.
Los trabajos de Las funciones psíquicas superiores, Pensamiento
y lenguaje, El signicado histórico de la crisis de la psicología, La historia
del comportamiento y el desarrollo del signo y sus signicados, La teoría de
las emociones, entre muchos otros, son ejemplo del estudio y análisis del
24 MENDONÇA, S. G. L.; PENITENTE, L. A. A.; MILLER, S. (Org.)
que estamos hablando. Los Estudios de las edades que también quedaron
inconclusos, se aproximan a este intento de explicar en su totalidad, lo que
ya había podido conseguir en trabajos más especícos y generales sobre
el estudio acerca del desarrollo psíquico. Todo esto es una muestra, para
mí, de que Vygotski emplea consecuentemente y de forma consciente el
método dialéctico que propone Marx, pero aprecia y sabe que solo está
trabajando de manera parcial una totalidad y deja los indicios o aspectos
en los que habría que continuar insistiendo, para conseguir la explicación
en el contexto de una psicología general siempre en desarrollo y formación,
tal y como lo explica en el epígrafe cinco del Signicado de la crisis...
(VYGOTSKI, 1991, p. 277- 290).
Un ejemplo concreto, se puede analizar en el trabajo de Vygotski,
donde él señala tanto, las restringidas posibilidades que el estudio de los
reejos condicionados, por sí solo, posee para explicar los complejos meca-
nismos de la psiquis humana; no obstante ser la base de esos mecanismos,
los que se van haciendo cada vez mas complejos, dado que se concatenan
y median con otras determinantes, que entonces, permiten explicar el de-
sarrollo psíquico en su mayor integridad. Este es también un excepcional
ejemplo del empleo del análisis de las contradicciones que se presentan en
este proceso y que son necesarias develar y explicar, para poder concebir la
comprensión y explicación denitiva, delinear en su totalidad y dinámica,
los procesos de génesis, consolidación y desarrollo de este proceso, tal y
como lo exige el método dialéctico e histórico (MARX, 2011; NETTO,
2011). También, en este análisis no deja de insistir, Vygotski, en la necesi-
dad de incluir los estudios del papel de otros determinantes en la explica-
ción del problema.
El estudio al que me reero en esta oportunidad, es uno de sus
primeros trabajos; de naturaleza histórico cultural, después del periodo
mas ecléctico, en el que trabajó en la Psicología del Arte y la Psicología
Pedagógica; me reero al relacionado con Los métodos de investigación re-
exológicos y psicológicos (VYGOTSKI, 1991, p. 3-22) que desde el mismo
principio, en el año 1926, llama la atención sobre estas limitaciones, no
obstante ser un mecanismo que desde que se descubrió, ilustra la com-
plicada mediación entre las condiciones biológicas iniciales de la subjeti-
vidad humana y las determinantes ambientales, sociales y culturales que
A Questão do Método e a Teoria Histórico-Cultural 25
rodean al sujeto a partir de su nacimiento y continúan a todo lo largo de
su vida social y cultural pero; él está insistiendo no obstante, que sus limi-
taciones aun son evidentes, a pesar del valor explicativo que le reconoce,
al igual que lo hacen Henry Wallon en su obra Psicología Dialéctica y
Leontiev en el Desarrollo del Psiquismo (WALLON, 1965; LEONTIEV,
1974).
Sin dudas, estos estudios de la actividad nerviosa superior de
ayer, se insertan, hoy en las explicaciones mas abarcadoras; que desde
Aristóteles, pasando por Wolf en los inicios del siglo XIX, y hasta nues-
tros días se han realizado, donde los estudios de la Biología sobre los me-
canismos epigenéticos explican que el funcionamiento de las determinan-
tes o condiciones biológicas no se producen de manera pura, automática
o como producto de una energía o mecanismo intrínseco o inherente a lo
biológico, sino, que ellos son un producto de las complejas relaciones y
mediaciones entre los determinantes y mecanismos biológicos y los am-
bientales, incluidos los sociales, los culturales y los de contenidos psicoló-
gicos que se van conformando, como resultado de esa misma mediación
e interrelación compleja entre las dos primeros. O sea, es un proceso
mediado y complejo donde participan decisivamente determinantes de
diferentes naturalezas y esencias, pero que en su interrelación y fusión,
producen los contenidos de lo subjetivo en el ser humano (CASANO-
VA PERDOMO, 2015; PEDROL TROITEIRO, 2015). Eso ya lo sabe
Vygotski, y por eso, en 1930 señala que lo biológico en el ser humano,
también está mediado por lo cultural (VYGOTSKI, 1993; 1987).
Otro importante análisis de Vygotski, es cuando señala la nece-
sidad de estudiar cómo el lenguaje oral media la formación de los ree-
jos condicionados en el ser humano. Valora en éste las propias ideas de
los reexólogos, pero insiste, a diferencias de estos, en el posible estudio
acerca del papel del lenguaje hablado, para ampliar y profundizar las ex-
plicaciones más complejas del desarrollo y formación de los reejos con-
dicionados en las condiciones especícas de la psiquis humana. Insiste en
el origen y la génesis a partir del grito al nacer o reejo incondicionado
y el papel del habla de los adultos en la conformación en el niño de re-
ejos condicionados que producen el lenguaje autónomo y termina con
el dominio de las palabras y la denitiva adquisición del lenguaje oral,
26 MENDONÇA, S. G. L.; PENITENTE, L. A. A.; MILLER, S. (Org.)
perteneciente ya al periodo psicológico del desarrollo psíquico y no solo a
él de los reejos (VYGOTSKI, 1991; 1993; 1987; 1996).
En este trabajo, Vygotski nos muestra sus agudos análisis, acerca
de las contradicciones entre los diferentes autores, que si bien concuerdan
en algún grado con que lo psíquico no se debe separar de lo neuro-
siológico, no concuerdan con estudiar el papel del lenguaje, reduciendo
este hecho particular, solo a los mecanismos neurosiológicos, tal y como
insiste el positivismo y más tarde el pragmatismo y la ideología ocial
que adopta la sociedad hasta hoy. Vygotski nos deja este análisis crítico
y él nos permite seguir trabajando por la búsqueda de la explicación que
aun tenemos que elaborar para denitivamente comprender el cómo se
produce el proceso de formación y desarrollo de la psiquis humana o
subjetividad.
Sin dudas esto refuerza la concepción teórica y metodológica del
método dialéctico de que las relaciones humanas o sociales y las formas
de pensar, no se producen de forma inherente, ni tampoco, por la libre
voluntad de las personas; sino que ellas están mediadas, en última instan-
cia, por las condiciones sociales, culturales y materiales que impone una
determinada organización social y económica o forma de vida.
La posibilidad de desarrollar un papel verdaderamente activo,
crítico y consciente por parte del investigador para crear e imaginar, re-
sulta muy importante y parte del método de Marx y que Vygotski emplea
(MARX, 2011; VYGOTSKI, 1991; NETTO, 2011). Si esto no lo tiene
en cuenta el investigador, la integralidad o totalidad tampoco se consigue
e incluso se puede llegar a considerar que algo parcial sea la totalidad o
integralidad del caso estudiado, como sucede en las visiones positivistas y
pragmáticas de Beterej, Pavlov y Watson y se supera por medio de la con-
cepción teórica y metodológica de Vygotski, dado el empleo del método
materialista dialéctico e histórico.
En resumen, partiendo de un análisis crítico minucioso, ajustado
a una determinada concepción, se puede realizar un estudio de las contra-
dicciones para ampliar y profundizar la integralidad de la explicación de
un hecho particular como son los reejos condicionados en los seres vivos
anteriores al ser humano y en particular en los procesos concretos de la
A Questão do Método e a Teoria Histórico-Cultural 27
vida real de los propios seres humanos, Vygotski nos da una muestra de
cómo es el “arte” de emplear el método dialéctico para la comprensión y
explicación del desarrollo psíquico. No pierde de esta manera los límites
de la integralidad, incluso aunque no la llegue a conocer en su totalidad.
Intuyo, que la intensión de Vygotski es explicar, lo más integral posible el
mecanismo de la formación y desarrollo psíquico, para poder organizar las
condiciones que permitan conseguir mejorar su proceso de formación y
desarrollo, o sea, transformar lo que haya que mejorar.
Vygotski, no deja de trabajar y buscar una mayor integralidad en
las explicaciones que realiza en sus estudios de los año 30 sobre la historia
del comportamiento, en el mono, hombre primitivo y el niño, conjunta-
mente con los de la historia y génesis de las funciones psíquicas superiores,
aborda este mismo problema desde una perspectiva más esencial y más
integral del desarrollo psíquico, indagando la posible génesis logenética
primero de las características del comportamiento de los seres vivos que
se adaptan al medio a través de los instintos, los reejos condicionados,
los que pueden llegar a usar instrumentos pero todavía no los fabrican o
producen y lo qué sucede con el ser vivo (ser humano), que mediante la
vida social y el trabajo ya son capaces de no solo emplear los instrumentos;
sino también producirlos y conservarlos y, cómo eso lleva a la producción
de símbolos, signos y sus signicados para controlar su comportamiento
e incluso intentar ejercer un control sobre la naturaleza por medio de los
ritos o ceremonias místicas y religiosas (VYGOTSKI, 1996; 1987; 1995;
1991, VYGOTSKI y LURIA, 2007).
Estudiando los trabajos de la antropología cultural, los psicólogos
del desarrollo infantil y sus propios estudios acerca del papel del lenguaje y
el empleo de signos en la solución de problemas prácticos, en el juego y en
el dibujo, produce una explicación cultural que se convertirá en la fuente
social, cultural e histórica que irá transformando poco a poco la psiquis
del ser vivo humano como consecuencias de las transformaciones que se
van produciendo en la sociedad y la cultura hasta nuestros días. Con ello
se devela, entonces, el desarrollo psíquico del ser humano en su historia
y en la ontogenia, que ya es entonces un desarrollo de naturaleza social y
cultural, pero sin negar la base o participación biológica y neurosiológica
en esa compleja mediación.
28 MENDONÇA, S. G. L.; PENITENTE, L. A. A.; MILLER, S. (Org.)
Esta ontogenia, entonces se va constituyendo también histórica-
mente, en la medida que todo aquel proceso logenético e histórico cultu-
ral que se va conformando primero en el ser humano de los inicios y mas
tarde en seres humanos de otros momentos históricos, pasa por la produc-
ción del lenguaje articulado, el dominio del fuego, la domesticación de los
animales, la invención de la escritura, las producciones losócas, entre
otros contenidos culturales hasta nuestros días. De esta manera, podemos
decir que el desarrollo psíquico humano posee un contenido diferente se-
gún los momentos históricos del desarrollo concreto de las relaciones de
los seres humanos con la naturaleza, la sociedad y la cultura, al igual que
Marx lo explica en relación con la sociedad y el desarrollo de las fuerzas
productivas y las relaciones de producción.
Este análisis integrativo que estoy intentando hacer creo que que-
da mucho mas preciso ahora, al menos para mí, que lo que se puede leer
directamente en los trabajos que tratan sobre este problema en la obra del
propio Vygostki y sus continuadores. Así es como creo que marcha y se pro-
duce el proceso de la búsqueda y hallazgo de la totalidad e integralidad de la
explicación de los procesos que se estudian, y que realizo en este momento
como continuador del proceso de producción del conocimiento en el Enfo-
que Histórico Cultural. Sin esta integración más acabada, poco avanzaremos
en el complejo proceso de atrapar una mejor y esencial explicación integral
y plena de lo subjetivo o del desarrollo psíquico humano, en la actualidad.
Solo seguiremos creando escuelas al estilo de la Psicologías tradicionales o de
los paradigmas de Kuhm (ARIAS, 1999, 2002, 2005, 2006, 2011).
Más tarde, Vygotski, en otro momento de sus estudios sobre el
desarrollo psíquico y como si todo lo hecho fuera poco, entre los años 1932-
33, se dedica al problema de la educación de calidad como la vía esencial que
arrastra o produce el desarrollo psíquico, trabaja, analiza y explica las edades
del desarrollo y las crisis que se producen en este proceso; intenta atrapar la
integralidad también de lo psíquico ahora hacia las profundidades de esta
nueva cualidad y devela denitivamente la relación que parece existir entre
lo social, lo cultural que es histórico, lo biológico y, lo propiamente psico-
lógico que se va constituyendo señalando o proponiendo que la experiencia
que vive el sujeto, a partir de su vida real, concreta y contextual, son vividas
o vivenciadas y atribuidas de sentidos por el sujeto que vive dichas experien-
A Questão do Método e a Teoria Histórico-Cultural 29
cias. Señala cómo este mecanismo integra todo lo de afuera con lo interior,
según las leyes internas, facilitando, desencadenado o entorpeciendo todo
el proceso del desarrollo psíquico en su constitución (VYGOTSKI, 1988;
1989; 1996).
Diríamos que los trabajos referidos son, entonces, un conjunto de
datos y explicaciones que procuran abarcar la integralidad y totalidad del
complejo proceso del desarrollo psíquico humano, que nos muestra como
la totalidad es el producto de la integración de otras totalidades concatena-
das o sea, una visión, desde más adentro de los contenidos de la vida real
o concreta de los seres humanos y develada en los trabajos de lo histórico
cultural, con sus categorías abstractas necesarias para su explicación, hacia
las profundidades de estos contenidos de acuerdo con una de las condicio-
nes o determinantes mas importantes del método dialéctico: intentar com-
prender y explicar la génesis, consolidación, desarrollo y las condiciones de
crisis del objeto o en este caso del sujeto que se estudia y, que se me ocurre
develar a partir de lo producido por lo histórico cultural, en medio de esta
oportunidad que Ustedes me brindan para reexionar y trabajar en tan
importante tema: la búsqueda de una totalidad en base a otras que aunque
están implícitas, como su columna vertebral, en toda la obra, comprensión
y explicación del Enfoque Histórico Cultural iniciada por Vygotski y sus
continuadores, no creo que esté explícitamente formulada aun.
El presente análisis, intenta superar los momentos de fragmen-
tación, hiperbolización de determinantes como la actividad, la comuni-
cación, la orientación, el lenguaje, lo ideológico y político, lo social, lo
cultural, producidas en determinados momentos históricos (stalinismo,
occidentalización, positivización, pragmativización o pos modernización
de lo histórico cultural), a mi juicio algo diferentes a las hipótesis iniciales,
pero que por ser históricas y sistemáticas, podemos retomar por medio
del estudio y la sistematización crítica que proponemos hacer siempre que
intentemos ahondar en la totalidad e integralidad de un proceso de pro-
ducción de conocimientos, en este caso el Histórico Cultural que todavía
es y será inconcluso.
Es más, existen y han existido intentos, yo digo que no conscien-
tes, de presentar la obra de Vygotski como ecologista en vez de dialécti-
ca; semiótica, lingüística, interaccionista simbólica o cognitiva en vez de
30 MENDONÇA, S. G. L.; PENITENTE, L. A. A.; MILLER, S. (Org.)
histórico cultural. Toda la lucha pragmática por hacer de las ideas de lo
histórico cultural, ideas mas clara como lo promulga Peirce el creador del
pragmatismo, es lo que lleva a los libros rehechos por estos dedicados estu-
diosos de lo Histórico Cultural y con ello han eliminado parte, de las ideas
dialécticas y de los análisis agudos de las contradicciones que se presentan
en la vida real y que no pueden ser explicadas de una única forma o por
verdades acabadas y universales. Todo esto en la historia mas reciente han
contribuido y han hecho predominante aun la falta de una visión mas
integral de las explicaciones del desarrollo psíquico según lo explicado por
el Enfoque Histórico Cultural en sus inicios, de ahí mi insistencia en la
sistematización critica, que ya reclamaron en sus tiempos Luria y Leontiev,
pero sin hacerla (LEONTIEV, 1974; LURIA, 1979).
Se me ocurre que una de las preguntas que pudiéramos realizar
cuando se analiza el desarrollo psíquico a partir de todo lo dicho y la idea
esencial a lo que nos lleva la concepción teórica y metodológica en que se
basa lo histórico cultural, a partir del materialismo dialéctico e histórico y
su método, sería ¿por qué todavía hay y convivimos con una gran parte de
personas que no alcanzan en su desarrollo psíquico, todas las cualidades o
características que otros si consiguen: es un problema de origen biológico
como postulan los positivistas y los biologicista, es un problema cultu-
ral (determinismo cultural que termina siendo biológico y mecanicista),o
es un problema de la sociedad por la forma en que ella está organizada,
que obliga a una educación instrumentalista que no le permite al sujeto la
plena formación y desarrollo de las funciones psíquica superiores, consi-
guiéndose el pensamiento lingüístico y el lenguaje intelectual y de hecho,
el desarrollo psíquico mas elevada que se puede obtener en el ser humano?
Se trata de que una parte importante de la población no pueden
alcanzar la educación con la calidad que requeriría para conseguir el ade-
cuado desarrollo. Sin la explicación plena y total de este objeto de estudio,
que aborda lo histórico cultural, es que la sociedad capitalista consigue
mantener en el oscurantismo a la mayor parte de la sociedad que llega a
ignorar el papel del propio ser humano en su transformación.
En denitiva, el empleo del método dialéctico en el proceso de la
producción de conocimiento, indica un proceso eminentemente social y
colectivo, no son solo investigaciones o estudios aislados, sino un conjunto
A Questão do Método e a Teoria Histórico-Cultural 31
de estudios mediados, encaminados a encontrar la explicación mas abar-
cadora, total e integral de un problema concreto y real de la sociedad para
transformar lo que haya que mejorar. La sociedad y su organización actual
nos demandan conocer esto de manera indirecta, para transformar lo que
reclama el pedido de las grandes organizaciones sociales en el Mundo y en
especial en América Latina, cuando se proclama que un Mundo Mejor es
Posible. Si la Psicología, la Pedagogía, la Educación no asumen mas ple-
namente esta forma de hacer las cosas con la idea de transformar y no solo
de contemplar, no concluiremos con la labor inconclusa de lo Histórico
Cultural.
tercer momento
El método dialéctico exige que la explicación alcanzada muestre
en la práctica social y material su veracidad, o sea, la práctica como criterio
de la verdad, por eso otro ejemplo que me gustaría presentar es como a
lo largo de mas de 40 años hemos podido, un enorme grupo de personas
en nuestro país, Cuba, armar una explicación mas integral del problema
mundial de la educación que conduce y arrastra el desarrollo y evita o dis-
minuye signicativamente el fracaso escolar, en el plano más general, sobre
la base de lo que expliqué anteriormente.
En Cuba desde los años nales de los 60 del siglo pasado se co-
menzó a estudiar los problemas del desarrollo psíquico en la edad inicial o
infantil con vistas a conseguir una educación en estas edades que garantiza-
ra dicho desarrollo y más tarde en los años iniciales de los 70 se continúo
esta labor con mas estudios y la introducción de los resultados en el per-
feccionamiento de la Educación General en el Ministerio de Educación.
Esta labor se pudo realizar porque desde 1953, en el programa
del Moncada se declaró que si triunfaba la revolución uno de los primeros
objetivos, era conseguir una educación para todos, dada la numerosa can-
tidad de niños y niñas no escolarizados y contradictoriamente la enorme
cantidad de maestros sin trabajo.
A partir de 1959 este objetivo fue promulgado y a nales de los
años 60 no solo se había disminuido a solo un tres por ciento el analfabe-
tismo; sino que todos los niños y niñas estaban escolarizados. Sin embargo,
32 MENDONÇA, S. G. L.; PENITENTE, L. A. A.; MILLER, S. (Org.)
los estudios realizados seguían encontrando que un porciento de alrededor
del 25%, tenía fracaso escolar lo que hizo que se exigiera por parte del
gobierno y el pueblo que no solo se consiguiera una educación para todos,
sino también de calidad. En ese momento la educación estaba integra-
da por todos los subsistemas de educación, círculos infantiles (que estaba
fuera del Ministerio de Educación), preescolar, primaria, media, técnica,
adulto, especial y universitaria.
A partir de todo el trabajo realizado durante las década de los
60, 70 y los 80 y, a inicio de los 90, podemos decir que la educación se
encuentra estructurada en lo fundamental y esencialmente en su base, la
educación inicial, preescolar y los primeros grados de la primaria según
los principales postulados teóricos, metodológicos y prácticos presentes
en la teoría del Enfoque Histórico Cultural, para garantizar el desarrollo
psíquico que permita una alfabetización exitosa y con ello un desempeño
educacional de calidad.
Los contenidos del trabajo educativo en estas edades se apoyaron
en los presupuestos de lo Histórico Cultural, tales como:
- Garantizar un estado emocional positivo y un vínculo afectivo, que
garantice la labor educativa, el aprendizaje y el desarrollo psíquico
pertinente;
- Las acciones con los objetos que permitan el desarrollo de los esque-
mas sensoriales y el aprendizaje de la forma adecuada de estudiar,
explorar y denominar o hablar sobre las características y propiedades
de los objetos;
- Garantizar la calidad del lenguaje hablado como forma de comuni-
cación social del niño y la niña, permitiendo el desarrollo del voca-
bulario, la comprensión, el dominio de la estructura gramatical y la
adecuada pronunciación;
- El dominio del dibujo creativo y que garantice que el niño y la niña
se apropie de la conciencia de que todo se puede representar por
medio de este medio cultural;
- El juego en sus diferentes manifestaciones, esencialmente el de pa-
peles de manera tal que el niño y la niña desarrollen la capacidad de
A Questão do Método e a Teoria Histórico-Cultural 33
representar o sustituir por medio de la actividad lúdicra, los hechos
y situaciones de la vida real y social;
- La modelación gráca que contribuya a desarrollar la capacidad de
modelar los objetos y hechos de la realidad;
- El análisis fónico de las palabras y la representación material de los
sonidos, como la vía esencial, que a través del juego con las palabras
y los sonidos que la conforman, los niños y niñas tomen la con-
ciencia necesaria y básica para que el aprendizaje y dominio de la
escritura sea un proceso de más calidad.
El adoptar y materializar estos principios y contenidos de lo His-
tórico Cultural en la labor educativa de más del 99% de los niños y niñas
entre el segundo y el sexto año de vida, ha sido el secreto y lo esencial que
ha permitido que los estudios y evaluaciones que se han realizado periódi-
camente, no obstante los problemas y dicultades que no han dejado de
existir, nos indiquen que los índices de fracaso escolar en Cuba no pasan
de un 2% y que estos sean escolares solo con retraso escolar y no con anal-
fabetismo.
Creo que estos datos son una corroboración práctica del valor
que tienen las explicaciones aun inconclusas, de lo histórico cultural sobre
el desarrollo psíquico, pero no obstante esto, son necesarios estos análisis
y estudios integradores y críticos para ayudar a producir otras y nuevas
explicaciones que continúen contribuyendo a mejorar y seguir transfor-
mando, donde sea necesario, la organización de una educación de calidad
que promueva y arrastre el desarrollo por medio de un aprendizaje también
de calidad.
referenciaS
ARIAS BEATON, G. Acerca del valor teórico y metodológico de la obra de L. S.
Vygotski. Revista Cubana de Psicología, v. 16, n. 3, 1999.
______. Por una mejor vida y aplicación del enfoque histórico cultural. CD Convención
HOMINIS´02. Palacio de las Convenciones, Ciudad de la Habana, Cuba. 2002.
______. La Persona en el enfoque histórico cultural. São Paulo: Linear B, 2005.
______. Inteligência e Educação. São Paulo: Terceira Margem, 2006.
34 MENDONÇA, S. G. L.; PENITENTE, L. A. A.; MILLER, S. (Org.)
______. e process of Producing Knowledge: Vygotsky Revisited in the book Vygotsky
Society in 21st century advances in cultural historical theory and praxis with non-
dominant communities. Edited by Pedro R. Portes & Spencer Salas. New York: Peter
Lang Publishing, 2011.
BACON, F. Novum Organum. Buenos Aires: Editorial Losada, 1961.
CASANOVA PERDOMO, A. R. Epigenética: contenido esencial para comprender el
desarrollo psicológico en el hombre. Alternativas Cubanas en Psicología, v. 3, n. 7, p. 53-
63, 2015. (La Habana Cuba, 2015).
COELHO, R. Indivíduo e sociedade na teoria de Augusto Comte. São Paulo: Perspectiva,
2005.
COMENIO, A. J. Didáctica Magna. C. de la Habana, Cuba: Editorial Pueblo y
Educación, 1983.
COMTE, A. Positive philosophy. In: MAN & THE UNIVERSE. e Philosophers of
Science. Edited by Saxe Commins and Robert N. Linscott, Washington Square Press,
1969.
______ . Cours de philosophie positive. Paris: Alfred Cortes, 1934.
LEONTIEV, A. N. El concepto de reejo: su importancia para la Psicología Cientíca.
Discurso inaugural del XVIII Congreso Internacional de Psicología Cientíca, Moscú,
Publicado en el Boletín de Psychologie 254, XX, N. 5, diciembre de 1966 y traducido y
publicado en Publicaciones Ligeras de la Universidad de La Habana por el Dr. Ernesto
González Puig el 20 de agosto de 1974.
______ . Problemas del desarrollo del psiquismo. 2. ed. La Habana, Cuba: Pueblo y
Educación, 1974.
LURIA, A. Mirando hacia atrás. Madrid, España: Norma, 1979.
LUZ Y CABALLERO, J. Obras. Escritos educativos. La Habana, Cuba: Imagen
Contemporánea, 2001. V. II.
MARTÍ, J. Obras Completas. La Habana: Editorial de las Ciencias Sociales, 1975.
MARX, K. Grundrisse: manuscritos de 1857-1858. Esboço da crítica da economia
política. São Paulo: Boitempo, 2011.
NETTO, P. J. Introdução ao estudo do método de Marx. São Paulo: Expressão Popular,
2011.
PEDROL TROITEIRO, R. Determinismo biológico vs determinismo mediado en el
desarrollo humano. Alternativas Cubanas en Psicología, v. 3. n. 7, p. 42-52, 2015. (La
Habana Cuba, 2015).
PEIRCE, C. S. How to Make Our Ideas Clear. Popular Science Monthly. 12 January
1878, p. 286-302.
A Questão do Método e a Teoria Histórico-Cultural 35
POLITZER, G. Psicología Concreta, prologo y apéndice de José Bleger. Buenos Aires:
Editor Jorge Álvarez, 1965
TORROELLA, G. El pragmatismo: características generales. Revista Cubana de Filosofía
v. 1, n. 1, p. 24-31, junio-julio de 1946.
VYGOTSKI, L. S. Psicología del Arte. Barcelona, España: Breve Biblioteca de Reforma
Barral Editores, 1972.
______. Historia del desarrollo de las funciones psíquicas superiores. La Habana, Cuba:
Editorial Cientíco Técnica, 1987.
______ . Interacción entre enseñanza y desarrollo. In: Selección de Lecturas de Psicología
de las Edades I - Colectivo de Autores, Facultad de Psicología Universidad de La
Habana. Editorial del Ministerio de Educación Superior, 1988.
______ . Pensamiento y lenguaje. La Habana: Edición Revolucionaria, 1981.
______ . Obras Completas. Fundamento de Defectología. La Habana: Editorial Pueblo
y Educación, 1989.
______ . Obras Escogidas. Madrid: Editorial Visor, 1991. Tomo I.
______ . Obras Escogidas. Madrid: Editorial Aprendizaje/Visor, 1993. Tomo II.
______ . Obras Escogidas. Madrid: Editorial Aprendizaje/Visor, 1995. Tomo III.
______ . Obras Escogidas. Madrid: Editorial Aprendizaje/Visor, 1996. Tomo IV.
______ . Imaginación y creación en la edad infantil. 2. ed. La Habana: Editorial Pueblo y
Educación, 1999.
______ . Psicología Pedagógica: un curso breve. Buenos Aires: Aique Grupo Editor, 2001.
______ . Teoría de las Emociones: estudio histórico-psicológico. Madrid: Ediciones Akal,
2004.
VYGOTSKI, L. S.; LURIA, A. R. El instrumento y el signo en el desarrollo del niño. Madrid:
Fundación Infancia y Aprendizaje, 2007.
WALLON, H. Fundamentos dialécticos de la Psicología. Buenos Aires: Editorial Proteo,
1965.
Segunda Parte
o método nas pesquisas educacionais
o método naS PeSquiSaS educacionaiS: uma
aProximação metodológica ao eStudo do
deSenvolvimento cultural
Idania B. Peña Grass
PeSquiSa educacional e deSenvolvimento humano.
Pensar no método na pesquisa educacional traz à tona várias re-
exões, especialmente porque o assunto está imerso num longo caminho
de resultados signicativos na área, na prolífera história da pesquisa edu-
cacional no Brasil, e nos inúmeros esforços de grandes pensadores, peda-
gogos, psicólogos, lósofos, sociólogos e de todos aqueles que de diversas
formas ocuparam e ocupam o lugar do educador. É no meio deste amplo
e variado espectro de resultados, baseado em diversas teorias e enfoques,
que será analisado, não o método em si, mas o papel e a importância da
teoria histórico-cultural para a pesquisa educacional a partir da relação
dialética entre objeto e método. Tratar-se-á dos princípios básicos que
orientam a escolha do método para abordar a complexa tarefa de pes-
quisar um objeto, cuja essência é um processo em constante movimento,
automovimento e transformação. Assim, o método deve corresponder
ao caráter dinâmico do próprio objeto e imbricado nele explicá-lo nas
suas múltiplas facetas. Esta tarefa exige aproximar-se ao conhecimento do
objeto mediante a análise explicativa das relações dinâmico-causais e não
da análise descritiva e/ou da medição quantitativa pontual. Resulta difícil
separar a função do pesquisador e do educador, quando de pesquisa edu-
cativa se trata. O educador, o professor, deve ser um pesquisador, porque
estudar o processo de desenvolvimento sem participar do mesmo é negar
a essência da mediação através das relações entre os sujeitos da educação
https://doi.org/10.36311/2017.978-85-7983-879-8.p39-62
40 MENDONÇA, S. G. L.; PENITENTE, L. A. A.; MILLER, S. (Org.)
e do sistema de signos culturalmente elaborados, em especial, da palavra
e seus signicados. A presença do pesquisador para exercer esta função
já constitui um fator de inuência no desenvolvimento. É improvável
pesquisar em educação partindo do sistema categorial da teoria históri-
co-cultural e se manter à margem dos sujeitos e dos processos estudados.
Não é mais o tempo no qual o pesquisador, supostamente munido do
saber cientíco, entra em contato com os sujeitos da pesquisa aplica uma
quantidade razoável de instrumentos de pesquisa para comprovar as hi-
póteses e elaborar as conclusões e ainda acreditar que os resultados são do
sujeito. Perde-se aqui um fator importante, a saber, determinação social
do psíquico.
Pesquisar em educação signica pesquisar o desenvolvimento da
personalidade, entendida esta como aspecto metodológico central, como
a expressão autêntica e genuína do social e do cultural, da história da
personalidade. Se, até o momento em que Vigotsky deniu o método
genético-experimental, os estudos e pesquisas realizadas poderiam ser
resumidos ao esquema estímulo-reação, por não ter incluído o fator his-
tórico-cultural. É possível, em consequência, reetir sobre o estado das
pesquisas educacionais atuais, e questionar até que ponto estas poderiam
estar debatendo-se na mesma encruzilhada, às vezes de maneira ingênua.
Na realização de pesquisas que priorizam a descrição de mudanças nas
reações, respostas e comportamentos dos sujeitos da pesquisa, como resul-
tado de mudanças na quantidade e complexidade dos estímulos ou fatores
externos. É mister analisar também em que medida as pesquisas partem
do conceito de desenvolvimento das Funções Psicológicas Superiores
da personalidade. Esta última é aqui entendida como
sistema autorregulado com vários níveis de regulação, que funcionam
integrados a partir da relação entre o cognitivo, o afetivo e o volitivo,
determinada histórica e socialmente, como expressão sistêmica e dinâ-
mica da subjetividade, susceptível a mudanças constantes. ” GRASS
(2014, p.147)
Na teoria histórico-cultural se enfatiza a necessidade de esclarecer
a gênese das Funções Psicológicas Superiores. Portanto, esta perspectiva
exige a elaboração de um método correspondente às peculiaridades de tais
processos e funções. Desta maneira, os métodos de pesquisa da atividade
A Questão do Método e a Teoria Histórico-Cultural 41
pedagógica, devem colocar no centro da atenção o estudo das inuências
educativas desenvolvedoras da personalidade” (Ibidem).
A característica principal do desenvolvimento das Funções psi-
cológicas superiores é o uso de signos, especialmente da linguagem, para
o domínio do próprio comportamento, ou seja, o desenvolvimento do
volitivo se torna um eixo central, como elaborar métodos de pesquisa que
abordem as metodologias de ensino e de avaliação para demonstrar que o
desenvolvimento de crianças e adolescentes conscientes, capazes de tomar
decisões responsáveis e saudáveis, está atrelado ao desenvolvimento voliti-
vo que não acontece espontaneamente: a escola e a família são os grupos
sociais encarregados dessa mediação.
O interesse em abordar a questão do método nas pesquisas edu-
cacionais já expressa a existência de certo grau de insatisfação com o estado
atual das mesmas, signica uma procura por novas respostas a partir de
novas hipóteses, um olhar mais aprofundado sobre a aplicação na prática
dos princípios e construtos da teoria histórico-cultural.
Aceitar o papel que o estado de insatisfação e insuciência traz
para o desenvolvimento, permite compreender a importância da necessi-
dade de pensar no método nas pesquisas educacionais. É claro que a in-
satisfação, o desconforto, o defeito, são forças quem promovem o desen-
volvimento, nas próprias palavras de Vigotsky (1989) aparece esta ideia
quando analisa o problema da educação de crianças chamadas “com defei-
to”, na nomenclatura atual, crianças com necessidades educativas especiais.
Esclarece que o sentimento de fraqueza e diculdade é decisivo não só
para o desenvolvimento infantil, mas para o desenvolvimento humano em
geral. A presença de diculdades, incertezas e obstáculos mobiliza as estru-
turas psicológicas para o enfrentamento, provocando assim o surgimento
de novas estruturas que garantam o ajuste e expressão no comportamento.
Resulta válido pensar que as inquietações e incertezas surgidas
no âmbito da pesquisa cientíca propiciam novas vias para a solução de
contradições, para a procura de respostas e para promover a sistematização
de procedimentos metodológicos adequados aos estudos no contexto
educacional. Propomos olhar o caminho das pesquisas educacionais em
concordância com a ideia de Vigotsky (1987), sobre a perspectiva do
42 MENDONÇA, S. G. L.; PENITENTE, L. A. A.; MILLER, S. (Org.)
futuro no desenvolvimento da personalidade, como um processo de
avanço para um ponto situado à frente, que parte de necessidades objetivas
e se move por exigências sociais. Ele resume esta perspectiva da seguinte
maneira: A perspectiva psicológica do futuro é a possibilidade teórica da
educação (VIGOTSKY, 1989, p.144, grifo e tradução nossa).
Esta perspectiva diz especicamente sobre a compreensão dialéti-
ca e histórica do desenvolvimento da personalidade e sobre o surgimento e
domínio das Funções Psicológicas Superiores. O papel das pesquisas edu-
cacionais orientado à aplicação da teoria histórico-cultural deve estar atre-
lado à compreensão dos aspectos centrais que determinam a transformação
do natural em cultural e em social. Elucidar com um olhar prospectivo,
como, e em função de quais processos e atividades acontece essa transfor-
mação constitui um dos desaos principais das pesquisas em educação.
Com o intuito exclusivo de ilustrar a importância desta ideia,
pode ser feita uma analogia entre o conceito de Zona de Desenvolvimen-
to Proximal e a mencionada perspectiva do futuro, da seguinte forma; se
consideramos de um lado, os resultados obtidos ao longo da história do
desenvolvimento de pesquisas educacionais, o que já foi atingido, o que a
ciência psicológica e a pedagogia sabem fazer, ou seja, todo o corpo teórico
e metodológico adquirido, como se fosse a zona de desenvolvimento real;
de outro lado, os novos construtos e categorias que devem servir de base
às pesquisas, como se fosse a zona de desenvolvimento potencial, então,
a distância que existe entre aquilo que a ciência psicológica e a pedagogia
sabem fazer” e o que poderão desenvolver a partir dos novos construtos
teóricos (desenvolvimento dialético e histórico das Funções Psicológicas
Superiores), seria a Zona de Desenvolvimento Proximal.
Deduza-se que a condução das pesquisas educacionais na pers-
pectiva histórico-cultural requer a determinação e desenvolvimento de mé-
todos que sejam capazes de penetrar na essência dos processos e funções
psíquicas com um olhar prospectivo sobre o objeto. Entenda-se aqui pro-
cessos e funções que têm sua origem e se desenvolvem na interação com a
cultura, que se transformam nela e ao mesmo têm impacto transformador
sobre ela. Trata-se portanto, de um objeto que só existe em desenvolvimen-
to e transformação. Daqui a necessidade de métodos especícos adequados
às particularidades deste objeto de altíssima complexidade que não pode
A Questão do Método e a Teoria Histórico-Cultural 43
ser enquadrado nem preso em compartimentos estancos, parcelas, fatores
e todo gênero de classicações esquemáticas.
Só uma concepção prospectiva permitirá a elaboração do méto-
do. A teoria histórico-cultural deixou um profundo e transformador legado
teórico a partir de uma concepção diferenciada sobre o objeto de estudo,
mas os procedimentos metodológicos só foram avistados, pois as próprias
características do objeto exigem a construção sem receitas e a adequação
dos mesmos a cada problema de pesquisa.
Concordamos com Vigotsky quando descreve a presença de dois
procedimentos metodológicos nas pesquisas psicológicas em geral, e com-
para estas com o lugar que o esqueleto ocupa na sustentação do corpo; a
semelhança com os organismos de corpo mole como o caracol, está em
um grupo de pesquisas que expõe a metodologia separada da pesquisa em
si, como se fosse o esqueleto por fora, e o outro grupo, em que a meto-
dologia da pesquisas é a essência, o centro, que sustenta a pesquisa toda,
nela o esqueleto está por dentro como nos vertebrados, e situa o próprio
método neste segundo grupo. Nesta perspectiva não é possível separar o
corpo teórico que explica a compreensão dos fenômenos psicológicos, ou
seja, do objeto de estudo, do corpo metodológico e procedimental. Eles
formam uma unidade que indissolúvel dada pelas características especiais
do próprio objeto.
Estamos de acordo com Demo (2006) quando arma que,
ciência vive do desao imorredouro de descobrir realidade que, sem-
pre de novo, ao mesmo tempo se descobre e se esconde. Possivelmen-
te esta marca é comum também à realidade natural, mas é sobretudo
característica da realidade social. O que se vê, de modo geral, não é
nem de longe, a parte principal, e na consequência, o que está nos
dados, muitas vezes é manifestação secundaria, ocasional, supercial”
(p.19).
No meio de tanta incerteza e da determinação multicausal dos
fenômenos psicológicos e educativos, é válida e desaadora a tentativa de
abordar a questão do método como aspecto central em sua relação e inter-
dependência com o objeto de estudo e suas derivações nos procedimentos,
instrumentos, problema, hipótese, sujeitos da pesquisa educacional.
44 MENDONÇA, S. G. L.; PENITENTE, L. A. A.; MILLER, S. (Org.)
a relação entre o método e o objeto de eStudo: dialética do interno
e do externo.
Para estabelecer a relação entre o objeto e o método será neces-
sário denir os aspectos centrais do objeto de estudo e em consequência,
denir os aspectos principais do método de pesquisa. Este caminho leva
diretamente à concepção teórica que o pesquisador assume, às relativas
verdades” cientícas com as quais se identica, constituído como corpo
teórico de partida, a partir do qual estabelece o problema, as hipóteses
de trabalhos e os questionamentos derivados no próprio processo. As
conclusões da pesquisa devem dar resposta às hipóteses em maior ou
menor medida, assim como vislumbrar, em aproximação sucessiva, a so-
lução do problema. Na perspectiva que nos ocupa, resulta imprescindível
uma adequação e ajuste entre as ideias sobre o desenvolvimento psíquico,
desenvolvimento da personalidade e o método adotado para elucidar os
mecanismos gerais e especícos que o sustentam, em estreita relação com
as leis e princípios que denem a essência dos fenómenos e processos
estudados.
Rubinstein (1978) é enfático quando arma que o objetivo
principal de qualquer teoria e, portanto, da psicologia, consiste em pôr
em evidência as leis especícas básicas dos fenômenos estudados, na qual
os métodos de pesquisa, como os de toda pesquisa cientíca, estão deter-
minados sempre pela concepção teórica de base, que serve de orientação,
direção e guia (p. 44). Em concordância com todos os representantes
da teoria histórico-cultural, dene como princípio central, a concepção
materialista dialética do determinismo, na condição de fundamento
teórico metodológico para o conhecimento cientico do funcionamento
psicológico. Este princípio pode ser resumido na seguinte proposição (p.
31): as causas externas atuam através das condições internas,
Aplicar à pesquisa educacional o princípio do determinismo,
em nossa opinião, signica:
- Entender a interconexão dialética entre o interno, como a natureza
psicológica do ato, e o externo, obras e atos do comportamento, nos
fenômenos psíquicos;
A Questão do Método e a Teoria Histórico-Cultural 45
- Apropriar-se do conceito de Situação Social do Desenvolvimen-
to, como a condição na qual se revela a relação entre o interno e o
externo que conduz ao surgimento de novas funções psicológicas;
- Explicar as características dos sujeitos da pesquisa de acordo com a
periodização das formas culturais do comportamento como a ex-
pressão da complexa dinâmica das funções psicológicas superiores
na realização da atividade predominante e do lugar que o sujeito
ocupa nas relações sociais;
- Revelar o papel da atividade humana e da comunicação na Situação
Social do Desenvolvimento em sua relação com a Zona de Desen-
volvimento Proximal;
- Analisar as Funções Psicológicas Superiores em sua origem e de-
senvolvimento e seu papel na regulação e auto-regulação do com-
portamento;
- Entender a autorregulação do comportamento como a via que
encontram as Funções Psicológicas Superiores, especialmente o vo-
litivo, para expressar a relação entre o interno e o externo.
Estes aspectos serão analisados seguir a partir dos nexos teóricos e
metodológicos entre eles e sua inserção no processo de pesquisa. De todos é
conhecido que as manifestações externas do comportamento têm um víncu-
lo especial com os fenômenos psíquicos, eles são interdependentes, embora
qualquer manifestação externa não constitui um indicador exato do processo
interno. Esta dinâmica remete à questão da relação entre as categorias: essên-
cia, conteúdo e forma. A forma, as aparências externas dos fenômenos não
necessariamente reetem suas essências. Com frequência, na vida cotidiana,
temos evidências desta relação, por exemplo, um morcego que voa e come
frutas nas árvores, nos remete a simples vista, ao conceito de ave, embora
pelas características essenciais pertence ao grupo dos mamíferos, no ser hu-
mano, o conteúdo por trás das formas, neste caso, o comportamento obser-
vável, pode ser reexo de conteúdos psicológicos diversos. Na observação de
uma situação especíca, na qual dois indivíduos exibem comportamentos
semelhantes, na aparência externa, podemos descobrir que ambos são a ex-
pressão de processos psicológicos com uma estrutura interna bem diferente.
46 MENDONÇA, S. G. L.; PENITENTE, L. A. A.; MILLER, S. (Org.)
Por esta razão, conhecer as características da relação especial entre
o interno e o externo é importante para o processo de pesquisa, especial-
mente quando são usados instrumentos que tendem a homogeneizar as
respostas dos sujeitos da educação, ou quando o sistema categorial do qual
se parte não inclui esta relação para a determinação do método e dos pro-
cedimentos especícos.
Para não cair no antigo erro das pesquisas de corte behaviorista,
baseadas no esquema estímulo-reação, o pesquisador deve levar em con-
sideração que o comportamento observável guarda uma estreita relação
com os processos internos, estes últimos, ltram e organizam o compor-
tamento, mas, ao mesmo tempo controlam e regulam os impactos que tal
comportamento tem na realidade, sofre uma nova ltragem para adequar
e recongurar a conduta em geral. Nesta dialética complexa das funções
psicológicas, em que o psíquico, surgido na relação com o contexto, uma
vez que se expressa externamente o faz através da autorregulação, que con-
duz por sua vez a transformação do ato psíquico, exige do pesquisador uma
postura dialética. Para compreender esta relação, a organização da pesquisa
e a análise dos resultados deve partir do fenômeno em estudo como um
processo e não como um resultado.
Os fenômenos psíquicos quando reetem a realidade cumprem a
função reguladora, transformando constantemente a relação entre o exter-
no e o interno. Apesar do esclarecimento teórico da dinâmica desta relação,
ainda é comum o uso de instrumentos de pesquisa voltados para a medição
do resultado tácito, externo, a partir dos quais os sujeitos são classica-
dos e incluídos em categorias, que servirão para deduzir aspectos sobre o
desenvolvimento psíquico. É provável que em determinados momentos
do processo de pesquisa seja necessário usar instrumentos que recolham
dados sobre as manifestações externas do comportamento, inclusive ob-
servar diretamente o comportamento; o problema radica em como se es-
tabelece a relação entre esses dados e os determinantes internos. Para tal,
os instrumentos devem reetir claramente o conceito de desenvolvimento
adotado, evitando assim a repetição de ideias mecanicistas, pragmáticas e/
ou multifatoriais.
A existência concomitante do interno e do externo na manifesta-
ção dos fenômenos psíquicos, ao longo da história da ciência psicológica
A Questão do Método e a Teoria Histórico-Cultural 47
reetiu-se através do uso de dois métodos principais para o estudo: de um
lado a observação externa do comportamento, em situações experimentais,
para constatar ou medir o resultado, as respostas, a conduta observável, e
do outro lado, a auto-observação, às vezes, a introspeção, ambas procuram
obter dados da consciência, dos estados e processos psicológicos internos.
A teoria histórico-cultural reconhece a necessidade de ambas vias gerais,
para o conhecimento psicológico, mas faz uma diferenciação entre auto-
-observação e introspeção. Não é aceita esta última como um procedimen-
to válido para obter dados conáveis, porque na introspeção, não é levada
em conta a realidade exterior, o psíquico se reete a si próprio, fechado
num ciclo dentro do mesmo, o psíquico “puro”, como dados da consciên-
cia pura. Já a auto-observação é considerada um método válido que recolhe
os dados da autoconsciência, como reexo de seu vínculo com a realidade
vivida pelo indivíduo. Como método cientíco a auto-observação, na qua-
lidade de reexo mediato, exige ser corroborado com os dados da observa-
ção do comportamento externo, para encontrar a correlação entre eles e ter
valor de dados de pesquisa cientíca.
Podemos resumir a relação entre o externo e o interno com as
palavras de Rubinstein, (1978)
Conhecer um fenómeno psíquico signica descobrir este fenômeno
em sua relação com o objeto, do qual o fenómeno é um reexo, o re-
exo do objeto é mediato, através da vida e da atividade do sujeito, do
indivíduo real que o reete. (p. 226, grifo e tradução nossa).
A categoria teórica que resolve esta relação é de grande importân-
cia para a pesquisa em educação. Foi enunciada por Vigotsky e desenvol-
vida brilhantemente por Bozhovich (1976). Nos referimos ao conceito de
Situação Social de Desenvolvimento, entendida como uma combinação
especial dos processos internos do desenvolvimento e das condições ex-
ternas, típica para cada etapa ou estagio, A Situação Social do Desenvolvi-
mento condiciona tanto a dinâmica do desenvolvimento psíquico durante
o período evolutivo correspondente, quanto as novas formações psicológi-
cas, qualitativamente peculiares que surgem no nal do período, chamadas
Neoformações.
48 MENDONÇA, S. G. L.; PENITENTE, L. A. A.; MILLER, S. (Org.)
As neoformações expressam a luta entre as aquisições do estágio
anterior de desenvolvimento e as novas exigências das condições atuais,
nesse encontro promove-se a reestruturação dos processos e funções psí-
quicas, para dar respostas às demandas. A unidade e o vínculo interno
entre o estágio passado e o que começa. É importante não confundir a
assimilação da experiência associada aos fatores externos, como aprendiza-
gem em contraposição ao desenvolvimento, visto como as mudanças nos
processos internos. Ambos processos caminham juntos na experiência do
sujeito, imerso na Situação Social de Desenvolvimento. A experiência cul-
tural acontece como um processo de ltragem, em estreita relação com as
condições internas, um e outro estão imbricados no devir da história do
indivíduo.
Considera-se oportuno e necessário enfatizar que, qualquer pes-
quisa do processo educativo deve tomar em consideração como conceito
central, a Situação Social de Desenvolvimento assim como a determina-
ção e explicação das mudanças essenciais da mesma. Ora porque a pesqui-
sa se baseia nos resultados obtidos em estudos e pesquisas anteriores, ora
porque vá à procura de novos conhecimentos.
A conabilidade dos resultados da pesquisa depende da medida
em que esta leva em consideração o caráter dinâmico do período do de-
senvolvimento, através das neoformações e a atividade principal de cada
faixa etária.
A importância que adquire o estudo das condições internas pode
ser analisada através de um exemplo sobre o desenvolvimento do processo
de solução de problemas no pensamento do estudante durante o ensino es-
colar. Imaginemos um aluno que se depara com a tarefa de achar a solução
para um tipo de problema matemático e depois lhe são dados outros pro-
blemas parecidos ao primeiro. Espera-se que o estudante resolva o proble-
ma e que depois transra a solução aos restantes problemas, fazendo uso da
analogia ou da semelhança, mas também pode acontecer que o estudante
não consiga realizar essa transferência. O pesquisador poderia questionar
sobre qual seria a causa deste fenômeno, se parte do suposto que a não
transferência da solução está associada às condições em que é apresentado
o problema, a pesquisa orientar-se-á para a mudança das condições em que
A Questão do Método e a Teoria Histórico-Cultural 49
foi apresentado o problema ao estudante, poder-se-á orientar ao professor
para mudar a maneira em que os problemas são apresentados ao aluno,
transformar os problemas em si. Claro está, que neste caso, entende-se
que a transferência depende da mudança de suas condições externas. Em
todo caso seria descrita a atividade do professor como determinante da
transferência na solução. Embora a descrição e mudança do acontecimento
externo não desvende o conteúdo psicológico interno da transferência, não
diz sobre o processo de abstração e generalização.
Segundo Rubinstein (1978) introduzir mudanças nas condições
do problema cria condições favoráveis para o processo de análise estabe-
lecendo um grupo de condições prévias, mas não oferece dados sobre o
processo interno, ou seja, sobre a generalização. Olhar para as condições do
problema ou tarefa didática, não passa de uma tentativa de entender um
dos lados de um fenômeno multifacetado, determinado em primeiro lugar
pela relação entre o interno e o externo. Quando a aprendizagem escolar é
vista como um processo de assimilação de conhecimentos, ou de aquisição
de habilidades, como o interno e o conhecimento a ser assimilado como
o externo, sem dúvidas o conceito de Zona de Desenvolvimento proximal
ocupa um segundo plano, o processo de mediação, de interação mediante
o qual acontece a aprendizagem é secundário e a própria aprendizagem um
produto quanticável.
Na teoria histórico-cultural foi abordada de diversas formas a di-
nâmica do interno e do externo e em todas elas o ponto em comum é o
caráter dialético do processo, o passo constante de um a outro provocando
nessa dinâmica transformações sucessivas. Na pesquisa educativa esta ques-
tão é com frequência abordada para tratar o processo de aprendizagem,
e junto com ele o processo de interiorização. Às vezes pode parecer que
existe um mundo circundante, lá fora do sujeito que deve ser interiorizado
lá dentro, nas estruturas psicológicas internas e que o sucesso desse trânsito
depende dos processos de ensino-aprendizagem. Existe a tendência a con-
siderar as inuências externas como se fossem aprendizagem e não desen-
volvimento, mas não é possível separar o que vem de fora com o interno
se este último só se congura a partir da atividade e da interação com os
outros e com o mundo circundante.
50 MENDONÇA, S. G. L.; PENITENTE, L. A. A.; MILLER, S. (Org.)
Neste sentido alertamos para a inconsistência de tal dicotomia
que só pode existir do ponto de vista de uma análise didática pontual. De
acordo com Rubinstein (1978),
[...] Não é certo [...] que a atividade mental prática surge como resul-
tado da “interiorização” da atividade psíquica. Toda a atividade externa
do homem, contem no seu interior componentes psíquicos (fenôme-
nos, processos) mediante os quais esta se regula. [...] não é licito eli-
minar da ação os componentes psíquicos […] armar que a atividade
psíquica surge como resultado de interiorizar a atividade externa. A
interiorização não surge de uma atividade material externa carente de
componentes psíquicos internos, e sim, de uma forma de existência
dos processos psíquicos (p. 340, grifo e tradução nossa).
Ou seja, estabelece-se aqui o problema do desenvolvimento da
consciência. É graças ao vínculo entre esta e as ações que o ser humano
estabelece relação com o mundo que o rodeia. A atividade é o elo que es-
tabelece a relação entre o ser humano e o mundo. Portanto a relação entre
o objetivo e o subjetivo expressa o nexo entre a consciência e a atividade, é
na ação com o objeto que o indivíduo o transforma ao mesmo tempo que
transforma a si próprio. A consciência não só permite reetir essa relação
com o mundo, mas também, diz sobre as atitudes, as necessidades, moti-
vações e inclinações do sujeito perante a realidade.
o PaPel regulador e autoregulador da conSciência: um Problema
antigo e de atualidade naS PeSquiSaS
A compreensão do papel regulador da consciência adquire rele-
vância para as pesquisas em educação porque traz à tona a necessidade de
revelar os processos que intervém nessa relação entre o ser, a consciência e
a realidade. Um conceito chave para abordar este aspecto é o conceito de
vivência, que por sua vez está intimamente relacionado aos conceitos de
sentido e signicado.
De acordo com Vigotsky (1995) a vivência é a unidade básica
para o estudo da Situação Social de Desenvolvimento. Nela estão repre-
sentados, num todo indivisível; de um lado o meio, o experimentado pela
criança e do outro o que a própria criança oferece, que se determina pelo
A Questão do Método e a Teoria Histórico-Cultural 51
nível atingido por ele anteriormente. A vivência permite a relação afetiva
da criança com o meio.
Do ponto de vista da pesquisa, acreditamos que abordar a vi-
vência como unidade de análise, permitirá encontrar os nexos essenciais
entre o interno e o externo que determinam a atitude dos sujeitos da edu-
cação no processo educativo. A vivência se refere ao mundo afetivo, aos
sentimentos, emoções e estados do sujeito. Estudar as vivências signica
desvendar as necessidades e inclinações básicas que determinam a atitude
do indivíduo perante a vida. O caráter das vivências deve denir o caráter
e o estado das necessidades e, quanto mais essenciais sejam estas necessi-
dades, mais fortes e profundas resultarão as vivências. Qualquer alteração
do equilíbrio entre o sujeito e o meio deve ativar as correspondentes ne-
cessidades do sujeito e conduzir ao desenvolvimento de formas de conduta
e atividade necessárias para o restabelecimento do equilíbrio. Entenda-se
que este equilíbrio não se refere sempre ao estado de adequação social, e
sim ao papel ativador das necessidade e motivos que impulsionam o sujeito
a exibir determinados comportamentos.
Espera-se que a formação conduza ao sujeito a estar imerso em
situações nas quais o comportamento esteja orientado para o bem-estar
social e/ou individual. As vezes a vivência do sujeito é a expressão de mo-
tivações e necessidades que em sua aparência não correspondem com o
esperado, por exemplo, um adolescente rebelde, indisciplinado, ou uma
criança hiperativa. Basta conhecer a posição que ocupa nas relações sociais
e as exigências colocadas na Situação Social de Desenvolvimento para en-
contrar as vivências que estão na base de tais comportamentos, desvendar
as necessidades que a criança e o adolescente precisam satisfazer com aque-
la conduta. Pode ser o resgate de um lugar perdido para se auto-armar,
exigências acima das possibilidades reais da criança etc.
O educador e/ou pesquisador devem elaborar as ferramentas ne-
cessárias para descobrir porque a criança não compreende a situação, na
qual está envolvida, nem o lugar que ocupa nela, a criança só manifesta
uma atitude de origem afetiva, que tem expressão real no comportamen-
to, como consequência da inter-relação estabelecida na Situação Social de
Desenvolvimento. O estudo dos fatores do desenvolvimento psíquico da
criança deve começar analisando o lugar que ela ocupa no meio no qual
52 MENDONÇA, S. G. L.; PENITENTE, L. A. A.; MILLER, S. (Org.)
está inserido, o lugar que ocupa nas relações sociais especialmente entre os
adultos próximos
Pelo vínculo que tem com as necessidades em cada etapa, as vi-
vências podem tornar-se as principais forças motrizes do desenvolvimento,
se no entorno no qual o indivíduo está inserido são construídas situações
estimuladoras do desenvolvimento, que promovam o movimento na Zona
de Desenvolvimento Proximal.
A determinação do papel das vivências como um núcleo central
para o desenvolvimento das Funções Psicológicas Superiores representa
um desao atual, apesar de ter sido apontado no século passado na psico-
logia soviética, tanto para a pesquisa quanto para a educação em geral. Traz
junto o problema da consciência, da regulação e a autorregulação.
Para entender o papel da vivência no desenvolvimento humano
como núcleo do mundo afetivo, resulta necessário estabelecer sua relação
com outros aspectos, também centrais, como o cognitivo e o volitivo. A
vivência é outro tipo de reexo da realidade na consciência. Não é o mes-
mo o processo (cognitivo) que permite o reexo da realidade, dos objetos
do mundo circundante, exemplo os conceitos, que o reexo da relação
que o homem estabelece com esse mundo (afetivo), expressado através de
atitudes, exemplo não sentir arrependimento por um ato imoral. O efeito
que provocam no indivíduo os contatos e inter-relações com o entorno
despertam processos de natureza afetivo-emocional que regulam o com-
portamento a partir da força, intensidade e signicados construídos nessas
interações.
Lamentavelmente, o processo educativo ainda está centrado na
transmissão de informações para formar e desenvolver emaranhados blocos
de informação, às vezes fragmentados, desconectados das atitudes adequa-
das para fazer uso dos conceitos como ferramentas para enfrentar a vida
e as relações. Essa sobrecarga de informações contribui à desorientação
cognitiva pelo acúmulo e a afetiva pela perda da motivação e da intencio-
nalidade com o conhecimento. Neste ponto, as pesquisas poderiam revisar
o corpo conceitual que diculta estabelecer procedimentos capazes de es-
tudar o caráter das vivências na atividade pedagógica.
A Questão do Método e a Teoria Histórico-Cultural 53
Mas nem sempre existe uma correspondência entre o compor-
tamento esperado pelos educadores e o exibido pelos alunos, enquanto a
escola, em geral, se dedica a informar para depois medir em situação de
avaliação, os supostos conhecimentos sobre as matérias escolares, o de-
senvolvimento das necessidades, atitudes e afetos dos alunos em relação
a estes, podem não corresponder em absoluto ao esforço e intenção dos
educadores.
Bozovich (1976) demonstrou nas pesquisas efetuadas por ela e
seus discípulos, que as vivências reetem realmente o estado de satisfação
do sujeito em suas relações mútuas com o meio. As vivências informam
e orientam o sujeito na situação e, na medida em que têm uma relação
estreita com as necessidades, lhes permite atuar numa direção determina-
da. Regulam o comportamento.
A vivência representa um conceito de vital importância para o
desenvolvimento das pesquisas educativas, porque permite estudar o sis-
tema de necessidades e motivos que determinaram aquela vivência assim
como a inter-relação entre seu conteúdo e sua força.
Para ter uma ideia da importância que tem compreender o ca-
ráter regulador das vivências, foram realizadas pesquisas por vários auto-
res citados por Bozovich (1976) que demonstram o papel determinante
destas no comportamento, a necessidade de proporcionar experiências
organizadas, o sucientemente intensas para despertar necessidades de
automovimento, no sentido que a educação almeja. A sociedade sem-
pre oferece à criança e ao adolescente tudo o que a cultura criou até ali,
deduza-se, que o impacto destas inuências no desenvolvimento da per-
sonalidade sempre acontecerá, planejado ou não, através das vivências,
na atividade que o indivíduo realiza. Mas, do que se trata, é de quais
inuências provocam quais impactos. Que tipo de sujeito, com quais có-
digos de comportamento, considerar-se-ão representantes da sociedade a
que aspiramos que pertençam. A esta questão, só teremos resposta se as
condições educativas fundamentais de vida e atividade estão organizadas
para orientar e guiar a interação com o mundo circundante, com as ou-
tras pessoas, com os adultos mais próximos encarregados de transmitir o
legado às novas gerações.
54 MENDONÇA, S. G. L.; PENITENTE, L. A. A.; MILLER, S. (Org.)
Paradoxalmente, a posição que a criança ocupa no ambiente adul-
to desde o início da vida como um ser dependente, inseguro, insuciente,
cria as bases para o seu desenvolvimento. A criança nasce com um reper-
tório natural de respostas ao ambiente, com um biótipo. Entende-se aqui,
portanto, que o processo de transformação de um biótipo num sociótipo
com o devir personalidade, e mais importante ainda é a compreensão da
educação como o domínio social do processo natural. Vigotsky (1989),
descreve a infância como o período da insuciência e da compensação.
Graças a essa necessidade de conquistar um lugar social se transforma de
ser natural em ser social, em uma personalidade.
Uma tarefa das pesquisas seria entender o papel que a escola atual
desempenha no desenvolvimento de vivências adequadas nos sujeitos da
educação que o projeto pedagógico escolar propõe, e como esse projeto
contempla, através das diferentes atividades, a expressão dessas vivências
em comportamentos adequados, autorregulados por códigos esperados
e aceitos pela sociedade. Não devemos esquecer que o desenvolvimento
acontece espontaneamente, segundo as condições nas quais o sujeito está
imerso, sejam quais forem estas. Corresponde ao processo e à atividade
educativa, a organização das inuências educativas desenvolvedoras da per-
sonalidade.
À maneira de ilustração do desenvolvimento das vivências,
Bozovich (1976) descreve ter encontrado nas pesquisas realizadas, uma re-
gularidade entre crianças e adolescentes com problemas de conduta, isto
é, a ausência de experiências autorreguladoras do comportamento, com
códigos morais adequados ao modelo social. Uma criança pode cometer
infração ou delito sem sentir remorso ou arrependimento, porque estão
ausentes as tendências morais que se oporiam aos impulsos imediatos, es-
sas crianças não tiveram experiências que despertassem vivências capazes
de impedir o ato, inclusive a criança, pode até estar satisfazendo naquele
ato, a necessidade de mostrar ousadia, prepotência etc. Importante para
o educador e/ou pesquisador, é entender quais necessidades são satisfeitas
naquele ato, quais experiências conguram a satisfação destas necessidades,
quais motivos se estabelecem como orientadores daquele comportamento.
Do nosso ponto de vista Grass (1989), urge estabelecer a relação
entre necessidades, motivos, aspirações e possibilidades de satisfazê-las na
A Questão do Método e a Teoria Histórico-Cultural 55
Situação Social de Desenvolvimento, a partir do estudo das vivências como
unidade de análise da função reguladora da personalidade. A isto acres-
centamos que o estudo das vivências remete ao papel da consciência e sua
função autorreguladora através da atividade volitiva.
O papel regulador das vivências tem pontos de contato muito es-
treito com a atividade volitiva, a qual desempenha o papel de fator deter-
minante no desenvolvimento das Funções Psicológicas Superiores e consti-
tui como sua característica principal, o caráter consciente e autorregulado.
Dando continuidade ao pensamento de Vigotsky (1995) de que
o traço diferencial de todas as Funções Psicológicas Superiores é o domínio
das próprias reações e do comportamento, realizamos durante muitos anos,
pesquisas iniciando com a de doutorado, com o objetivo de comprovar o
papel da regulação do comportamento, regulação volitiva, ou autorregu-
lação, e encontrar novas categorias de análise, assim como instrumentos
capazes de avaliar a atividade volitiva em crianças, adolescentes, jovens e
adultos. Os resultados obtidos corroboraram que a atividade volitiva serve
como modelo para estudar todas as formas de atividade consciente do ser
humano. Surpreende que, apesar da importância que tem para a com-
preensão das regularidades do desenvolvimento as pesquisas nesse sentido
ainda são escassas. Em qualquer tipo de alteração ou distúrbio no com-
portamento encontramos uma notável afetação na regulação volitiva. Tão
importante resultou para nossas pesquisas este resultado que a construção
do nosso método terapêutico, chamado inicialmente Terapia Ativa, Grass;
Morales; Peres (1990), está baseado na estrutura da regulação volitiva. Em
seus inicios foi aplicado as mais diversas atividades tais como, escolares,
esportivas, organizacionais e de saúde.
A atividade volitiva é a regulação consciente pelo homem de seu
comportamento e atividade e se manifesta através da capacidade de vencer
obstáculos internos e externos na realização de atividade dirigida por ns
conscientes.
Vigotsky (1987) arma que no estágio superior do desenvolvi-
mento natural, o homem alcança o domínio de sua própria conduta, sub-
mete a seu poder as próprias reações, o homem domina as formas externas
da natureza, mas também domina seu próprio processo de atuação diante
56 MENDONÇA, S. G. L.; PENITENTE, L. A. A.; MILLER, S. (Org.)
de suas leis naturais, para o homem dominar o próprio comportamento
precisa dominar o sistema de estímulos, e este sistema de estímulos tem
um caráter social (p. 171).
A análise que Vigotsky (1995) faz para enfatizar a importância da
regulação volitiva se estende às crianças com retardo mental e graças aos
experimentos realizados conseguiu entender qual é a maior deciência no
desenvolvimento psicológico dessas crianças, e as deniu como uma insu-
ciência e incapacidade para dominar os próprios processos do comporta-
mento e às vezes até para utilizá-los. A partir desses resultados estabeleceu
os seguintes postulados básicos, que acreditamos importante resgatar, para
abrir novas questões de pesquisa cientíca com crianças e adolescentes com
necessidades educativas especiais.
Postulados básicos das formas culturais de conduta:
1. Têm uma base natural;
2. São criadas vias colaterais quando a função não pode ser exercida
de forma direta, a substituição e a compensação;
3. Utilização de signos externos como mediadores;
4. Domínio da própria conduta ou o volitivo.
O domínio da conduta própria se aprende na relação que a criança
estabelece com o mundo em volta, no qual o adulto tem o papel preponde-
rante. Este processo de regulação volitiva não acontece espontaneamente, as-
sim, é uma das tarefas da educação e das pesquisas educacionais, desenvolver
estratégias formadoras e estimuladoras da autorregulação. Lembremos que a
função de regulação do comportamento, garante a adequação do mesmo às
novas exigências sociais, permite o desenvolvimento da conduta prospectiva,
ou seja, o sujeito consciente dos propósitos da vida própria e dono das atitu-
des que perante ela assume, responsável pelas consequências dos atos e capaz
de enfrentar as diculdades que o percurso vital coloque. A regulação volitiva
é a cara oposta da preguiça e do comportamento irresponsável. A sociedade
cada vez mais precisa de pessoas portadoras dessas qualidades.
Os processos e estados psíquicos apresentam particularidades indi-
viduais que devem coincidir com as exigências da atividade. Por exemplo, a
A Questão do Método e a Teoria Histórico-Cultural 57
presença de motivos morais, e a consciência de sua necessidade, nem sempre
correspondem com a atividade e atitude do indivíduo. Para que isso aconte-
ça, a personalidade terá que vencer o estado de passividade, o cansaço psíqui-
co e a preguiça. Desta forma, a função da regulação volitiva se relaciona com
a solução da tarefa ou atividade por parte da personalidade.
Na literatura, a autorregulação está relacionada com a autonomia
da personalidade. Quando está determinado o objeto da autorregulação,
a nalidade para o seu funcionamento, a estratégia para sua obtenção e
atualizados os mecanismos necessários para seu autocontrole, então, a re-
gulação, se torna regulação volitiva e estará em condições de resolver de
maneira independente a tarefa. Podemos constatar que os processos de
autorregulação pelo sujeito do próprio comportamento apresenta seria di-
culdades que têm a origem no processo educativo e na estruturação da
Situação Social do Desenvolvimento. Os grupos sociais onde o indivíduo
cresce e se desenvolve têm uma tendência a pôr em mãos das circunstâncias
ou de terceirizar as funções que, por lei natural, devem corresponder ao
homem em sua devir personalidade. Os efeitos desse estilo de interação,
ditado pelas condições concretas de convivência, acarreta sérias consequên-
cias para o desenvolvimento da personalidade e das Funções Psicológicas
Superiores.
Os membros, representantes da sociedade atual, estamos acos-
tumados e aceitamos como natural o tipo de relações sociais estabelecidas
no cotidiano. Nesses diversos contextos, acontece o desenvolvimento da
personalidade, somos afetados constantemente pelo vínculo que estabele-
cemos com o mundo circundante, mas prestamos pouca atenção aos fato-
res que nos determinam. Mas, é na inter-relação com eles que as crianças
adolescentes e jovens apropriar-se-ão dos valores acumulados. Os novos
membros desta sociedade, logicamente, não conhecem outra, mas é den-
tro que acontecerá o desenvolvimento das funções psicológicas superiores,
a constituição do indivíduo como personalidade. É nesse ambiente que
desenvolverá as diferentes atividades predominantes para cada etapa do
desenvolvimento e entrará em contato com outros membros da sociedade.
O que a simples vista parece comum, pode ser objeto de ques-
tionamentos e reexões como objeto de pesquisa à luz dos pressupostos
da teoria histórico-cultural. Acreditamos que ainda não somos totalmente
58 MENDONÇA, S. G. L.; PENITENTE, L. A. A.; MILLER, S. (Org.)
cientes dos impactos que esta corriqueira cotidianidade traz para os novos
membros da sociedade, e a longo prazo para a sociedade como um todo, já
que estará um dia representada majoritariamente por eles, por aqueles que
hoje temos a responsabilidade de formar.
Com a intenção de analisar aqui alguns comportamentos fre-
quentes no cotidiano e seu interesse para a pesquisa, lembraremos da lei
genética fundamental Vigotsky (1987), que diz sobre o desenvolvimento
cultural em dois planos, primeiro entre as pessoas e depois no indivíduo,
neste processo os signos e instrumentos que estão fora passam a ser de do-
mínio da personalidade. Quer dizer, os adultos mais jovens da sociedade
atual são representantes dos impactos que as vertiginosas transformações
sociais deixaram neles.
Tomemos a questão dos hábitos alimentares nas famílias de adul-
tos jovens com lhos menores. Com o desenvolvimento da indústria ali-
mentar, cada vez mais sosticada e o ritmo acelerado da vida, ditado pelas
regras do mercado de trabalho, foram criadas instituições que terceirizaram
a nutrição humana. Nos pais jovens, geralmente já foram desenvolvidas
necessidades de consumo de alimentos, rápidos, homogêneos na apresen-
tação e no conteúdo. Foram submetidos a vivências agradáveis em relação
a alimentos prontos e semi-prontos. Em alguns, perdeu-se, porque não
tiveram outros adultos “mais experientes” que transmitissem, num pro-
cesso colaborativo, as diferentes maneiras de escolher, preparar e consumir
alimentos em casa, em família. Para estes pais jovens é aceitável como nor-
mal esse tipo de alimentação. Em consequência, os lhos, a nova geração,
reproduzirá esta experiência apreendida, às vezes num ambiente acolhedor,
tais hábitos alimentares.
A perda de costumes saudáveis na alimentação e o aumento de
doenças em crianças, antigamente frequentes em adultos, é um reexo das
mudanças na correlação dos fatores internos e externos no desenvolvimen-
to psicológico, transformações consideráveis no conteúdo da mediação.
Existem, por exemplo, cada vez mais pessoas que nunca descascaram uma
fruta ou legume para consumir, desta maneira não conseguirão transmitir
esta experiência a outros. Quanto menos estas experiências formem parte
das vivências dos indivíduos mais novos, mais tenderão a se extinguir as
atividades associadas a elas. A Situação Social de Desenvolvimento apre-
A Questão do Método e a Teoria Histórico-Cultural 59
senta inuências externas cada vez mais pobres para certos tipos de ativi-
dade, portanto as condições internas em forma de processos psicológicos
serão um reexo das condições oferecidas. Assim, estará comprometido o
desenvolvimento das funções associadas a estas atividades.
Outro tanto acontece se analisarmos as características das relações
entre as crianças, entre os adolescentes, entre os adultos e estes em relação
ao uso das tecnologias da informação. Observam-se mudanças introdu-
zidas nos processos psicológicos que ainda não têm sido sucientemente
estudadas a nível de pesquisa. O desenvolvimento cultural acontece a par-
tir das relações concretas entre os seres humanos, os contatos mais signi-
cativos entre os indivíduos são estabelecidos com participação do corpo, a
dotação neurosiológica do homem está preparada para reagir e avaliar aos
outros indivíduos com os quais estabelece o contato, através de sensores
visuais, auditivos, táteis, olfatórios, e simbólicos do qual participa também
a palavra. Na medida em que o uso da tecnologia associada às redes sociais
se expande, a natureza dessas relações muda.
A participação dos componentes naturais, que oferecem infor-
mações sobre a linguagem corporal é substituída por procedimentos me-
diados por aparelhos. De alguma maneira os canais usuais que o cérebro
aprendeu a usar para estabelecer esses vínculos e conexões neuronais, como
as expressões faciais, o tom de voz, entre outros, que inclusive muitos deles
vêm da logênese, aos poucos se tornam irrelevantes para o estabelecimen-
to dos contatos, que em sua maioria se resumem a inúmeras mensagens
escritas e símbolos substitutos das expressões corporais.
Não só esses componentes das relações sofrem transformações,
mas, a vivência em si, também se transforma. Os afetos que formam
parte das relações e que se expressam no contato com outros indivíduos
provocando vivências de maior ou menor intensidade, com o uso dessas
tecnologias se deslocam para um lugar de silêncio, sem voz, sem corpo,
sem cheiro, no qual a escrita abreviada e às vezes deturpada na estrutura
resume a vivência. O compromisso com a resposta, sempre estabelecida
fundamentalmente pelo contato visual e auditivo, se desloca no tempo
e no espaço, se torna impessoal e imprevisível. A satisfação terceirizada
das necessidades, processo no qual o indivíduo cada vez menos precisa da
empatia presencial para a realização, abre um amplo grupo de questões
60 MENDONÇA, S. G. L.; PENITENTE, L. A. A.; MILLER, S. (Org.)
sobre o desenvolvimento das funções psicológicas superiores. As pesquisas,
especialmente as educacionais, terão a missão de desvendar as novas vias
e mecanismos pelos quais acontecem esses processos. Quando assumimos
o determinismo dialético e histórico como guia no corpo teórico de fato
aceitamos que ainda não temos as respostas. Novos métodos e procedi-
mentos de pesquisa deverão ser elaborados e postos em prática.
Exige-se do pesquisador uma nova postura diante do objeto de
estudo. Numa sociedade na qual o consumo de bens materiais, não sempre
está ligado às necessidades básicas, e sim, a necessidades alienadas, na qual
as relações se estabelecem por diversas vias, nas quais se incluem as virtuais,
as crianças cada vez mais terceirizadas no processo educativo, familiar e es-
colar, o sistema de valores, signos, estímulos auxiliares do comportamento,
cada vez abrem mais suas fronteiras. A explicação das particularidades do
desenvolvimento cultural encaminhar-se-á para novos olhares nas relações
que determinam e regulam o comportamento humano.
referênciaS:
BOZHOVICH, L. I. La personalidad y su formación en la edad infantil. Habana:
Instituto Cubano del Libro, 1976.
DEMO, P. Pesquisa: principio cientíco e educativo. São Paulo: Cortez, 2006.
GRASS, P. I. B. O desenvolvimento da autonomia e da criatividade e a formação da
personalidade do estudante. In: MILLER, E.; BARBOSA, M. V.; MENDOZA, de L. S.
G. (Org). Educação e humanização. Jundiai: Paco Editorial, 2014.
____________. Particularidades da atividade volitiva em estudantes universitários. Kiev:
Instituto Gorki, 1989.
GRASS, P. I. B. MORALES, D. D.; PEREZ, V. S. Utilización de la terapia activa
para el desarrollo del autodominio e de la perseverancia en jóvenes con diferentes niveles de
desarrollo de estas cualidades volitivas. Santa Clara: UCLV, 1990.
LEONTIEV, A. N. Actividad conciencia personalidad. Ciudad de la Habana: Pueblo y
Educación, 1985.
RUBINSTEIN, S. L. El ser y la conciencia. Ciudad de La Habana: Pueblo y Educación,
1979.
________________. El desarrollo de la psicología: principios y métodos. Ciudad de La
Habana: Rene Meneses, 1978.
VIGOTSKY, L.S. Historia del desarrollo de las funciones psíquicas superiores. Ciudad de
La Habana: Editorial Cientíco Técnica, 1987.
A Questão do Método e a Teoria Histórico-Cultural 61
________________. Obras Escogidas. Madrid: Visor Distribuciones, 1995. v. III.
________________. O desenvolvimento psicológico na infância. São Paulo: Martins
Fontes, 1998.
________________. Obras Completas. Ciudad de La Habana: Pueblo y Educación,
1989. Tomo V.
o método na teoria hiStórico-cultural:
a PeSquiSa Sobre a relação indivíduo-
generecidade na educação
Maria Eliza Mattosinho Bernardes
introdução
A pedra que rejeitaram os construtores, essa veio a ser a pedra angular...
(VIGOTSKI, 2004, p. 203)
A produção do conhecimento no campo da psicologia do desen-
volvimento que visa explicar a relação entre a aprendizagem e o desenvolvi-
mento psicológico funde-se com a própria história da psicologia enquanto
ciência moderna (CAMPOS, 2010). A história da ciência psicológica, sis-
tematizada a partir de meados do século XIX, evidencia marcas da trans-
formação da própria sociedade que, segundo Guzzo (2010, p. 132), “surge
e se aprimora em um momento histórico e social de criação e consolidação
do capitalismo”.
No contexto histórico, a psicologia enquanto disciplina desem-
penhou um papel fundamental para justicar teoricamente a constitui-
ção dos indivíduos e contribuiu – e continua a contribuir – para que a
forma de sociabilidade pudesse reproduzir o desenvolvimento econômico.
No campo epistêmico, a psicologia se organiza, segundo Patto (1984), a
partir de bases teórico-metodológicas que a justiquem enquanto ciência
moderna, pautando-se em estudos laboratoriais e tecnicistas, ou ainda em
formas mais adaptacionistas que visavam solucionar o problema do com-
portamento e da aprendizagem.
https://doi.org/10.36311/2017.978-85-7983-879-8.p63-80
64 MENDONÇA, S. G. L.; PENITENTE, L. A. A.; MILLER, S. (Org.)
Como consequências da organização lógica e epistêmica da psi-
cologia, no contexto da educação nacional, identicam-se a segregação e
a classicação de crianças nos espaços educativos em geral, assim como a
implantação de políticas de exclusão no interior da escola, principalmente
aquelas que atendem à população mas pobre, mesmo que esta se expresse
por meio do discurso ocial pautado na educação inclusiva. Apesar do
grande esforço de responder ao problema do fracasso escolar, a psicologia
tem apresentado respostas especícas que pouco avançam na solução deste
problema social – “por que as crianças não aprendem?” (TANAMACHI;
MEIRA, 2003).
Esta realidade caótica foi analisada, em sua origem, por Vigotski
(2004) no texto “Signicado Histórico da Crise da Psicologia: uma Inves-
tigação Metodológica” (1927), quando anuncia que a crise da psicologia
é, na realidade, uma crise metodológica. As bases para a análise crítica das
teorias psicológicas foram explicitadas pelo autor ao apresentar a necessida-
de de se chegar a uma psicologia geral que superasse as explicações parciais
da constituição e desenvolvimento psicológico. Para o autor, o conceito de
psicologia geral não se refere a uma série de disciplinas especícas que agre-
gariam concepções psicológicas na construção de um todo fragmentado,
mas refere-se à teoria psicológica que explicaria a desenvolvimento histó-
rico e a constituição do homem concreto a partir de bases cientícas que
resgatem as dimensões ontológica, gnosiológica, epistemológica e lógica.
Na justicativa deste posicionamento teórico-metodológico, Vi-
gotski aponta para a necessidade de seguir o método inverso proposto por
Marx ao armar que a “anatomia do homem era a chave da anatomia do
macaco”.
2
No campo psicológico, Vigotski (2004, p. 207) coloca que “
podemos compreender cabalmente uma determinada etapa no processo
de desenvolvimento – ou, inclusive, o próprio processo – se conhecemos o
resultado ao qual se dirige esse desenvolvimento, a forma nal que adota
e a maneira como o faz”. Assim, visa-se a superação das teorias psicológi-
cas que se fundamentam nas observações e generalizações empíricas pelo
plano metodológico que contemple categorias e conceitos que partem de
uma fundamentação superior – mais elaborada – para a inferior, do abstra-
2
Para maior entendimento do conceito, recomenda-se a leitura do texto “A anatomia do homem é a chave da
anatomia do macaco: a dialética em Vigotski e em Marx e a questão do saber objetivo na educação escolar”
(DUARTE, 2000).
A Questão do Método e a Teoria Histórico-Cultural 65
to ao empírico. Resgata-se na psicologia a raiz teórico-metodológica que
contempla a análise dos fatos da história da ciência – “os acontecimentos
concretos, historicamente vivos” (p. 210).
As categorias do método que fundamentam o movimento de su-
peração das teorias psicológicas com princípios indutivistas e dedutivistas
pela Teoria Histórico-Cultural são o trabalho, o caráter material da existên-
cia humana e a historicidade dos fatos.
O trabalho, entendido como atividade adequada a um m, é
considerado o que nos faz humanos, uma vez que pelas necessidades emer-
gentes da realidade, o homem dene objetivos, planeja ações para realizá-
-los e transforma a natureza, ao mesmo tempo em que se autotransforma,
humanizando-se. Pelo trabalho são denidas as condições da vida social.
Nesse movimento, que é de ordem histórica, as leis biológicas que regiam
a vida antes do processo de hominização, são substituídas por leis sócio-
-históricas. Tal fato dene as novas condições materiais e os meios de sub-
sistência são transformados em novas condições de existência do homem,
enquanto ser social.
O caráter material da existência humana é a categoria que expli-
ca o modo de produção e de constituição do processo de humanização.
Assim sendo, entende-se ser por meio da produção que se denem as
bases das relações sociais. Entendendo o homem como ser social, ele é
considerado sujeito e objeto das atividades humanas, pois produz suas
condições de existência por meio de instrumentos que transformam a
realidade objetiva, assim como, dialeticamente, é transformado pelas
condições criadas. O desenvolvimento da sociedade na vida concreta
produz mudanças na consciência e na conduta humana, fato que nos
leva a considerar a categoria historicidade como a dimensão essencial da
formação do psiquismo humano.
Tais categorias do método materialismo histórico e dialético são
o diferencial da Teoria Histórico-Cultural, pois permitem explicar a rea-
lidade concreta e as possibilidades existentes para a sua transformação
por meio da atividade humana organizada visando a um m. Conside-
ram-se, portanto, a atualidade do pensamento de Marx e Engels para
se entender e explicar as condições e circunstâncias necessárias para a
66 MENDONÇA, S. G. L.; PENITENTE, L. A. A.; MILLER, S. (Org.)
superação da alienação instituída historicamente na sociedade de classes,
ainda que seja de forma parcial.
Ao partir da problemática anunciada, o objetivo deste artigo é
apresentar algumas reexões a partir do método de investigação sobre o
desenvolvimento psicológico do homem concreto, próprias da psicologia
histórico-cultural, assim como apresentar princípios teórico-metodológi-
cos para que a relação entre o ensino, a aprendizagem e o desenvolvimento
psicológico possa ser objetivada pela organização dos processos educativos
em geral e, em especial, pela educação escolar. Tem-se, portanto, a inten-
ção de apresentar algumas contribuições para a pesquisa educacional na
teoria histórico-cultural, tendo em vista a concepção de que a educação
em geral é considerada mediação essencial para que a aprendizagem e o
desenvolvimento psicológico sejam objetivados nos sujeitos singulares.
queStõeS do método
Ao analisar criticamente as teorias psicológicas produzidas no seu
tempo, Vigotski (2000a) identica o estudo do desenvolvimento cultural
da criança como uma “nova necessidade” e para tal faz-se necessário iden-
ticar um novo método que criasse possibilidades para explicar o movi-
mento de “constituição e desenvolvimento psicológico”, identicado pelo
autor como o “desenvolvimento das funções psicológicas superiores. As-
sim, o novo método de investigação relaciona-se diretamente com o novo
objeto da pesquisa, que se assume como sendo, ao mesmo tempo, premissa
e produto, ferramenta e resultado da investigação psicológica.
O estudo dos processos psíquicos superiores é identicado por
Vigotski como sendo o “tendão de Aquiles” da psicologia experimental,
ou psicosiológica. O método de investigação da psicologia tradicional,
segundo Vigotski (2000b), objetiva-se na relação entre estímulo e resposta,
ora por investigar os processos puramente objetivos decorrentes da natu-
reza, ora por investigar os sintomas de um processo psíquico, ou ainda de
uma experiência objetivada em sua dimensão imediata na relação homem-
-mundo.
No campo da psicologia infantil, o autor evidencia a incoerên-
cia das teorias psicológicas seja por serem desdobramentos da psicologia
A Questão do Método e a Teoria Histórico-Cultural 67
animal, por assemelharem-se às pesquisas realizadas com adultos, ou por
pautarem-se em observações causais relacionadas aos conhecimentos coti-
dianos da vida da criança. A crítica de Vigotski às psicologias particulares
refere-se ao fato de as mesmas considerarem a criança como ser natural – a
partir de concepções idealistas, mecanicistas ou materialistas – e não como
ser social
3
. Tal fato, segundo o autor, é recorrente mesmo quando as teorias
psicológicas investigam a relação entre pensamento e palavra, na tentati-
va de superação da relação entre o estímulo, como agente externo, sobre
os órgão sensoriais. No exercício da crítica, Vigotski reporta-se à Pavlov
quando este anuncia a necessidade de superar os estímulos condicionados
no estudo das funções superiores. Para o autor:
[...] a palavra é para o homem um estímulo condicionado tão real
quanto todos aqueles outros que têm em comum com os animais,
porém é, ao mesmo tempo, de muito maior amplitude que todos os
restantes e neste sentido não pode comparar-se nem quantitativamente
nem qualitativamente com os estímulos condicionados dos animais.
(VIGOTSKI, 2000b, p. 60).
A superação da concepção naturalista nos estudos psicológicos
ocorre por meio dos fundamentos do materialismo dialético e histórico
como método de conhecimento na análise das funções psicológicas supe-
riores. Ao considerar o homem como ser social, concebe-se que a natureza
que inui sobre a constituição e o desenvolvimento humano não são mais
as leis biológicas, mas as condições históricas. De forma dialética, tem-se
como desdobramento deste processo a atuação dos homens sobre as novas
condições de existência, transformando a natureza externa e se autotrans-
formando. Esta compreensão da relação homem-mundo pauta-se no pen-
samento de Engels
4
fundamentando a psicologia histórico-cultural.
Enquanto síntese do processo lógico-histórico que explica a rela-
ção homem-mundo, Vigotski (2000b, p. 61) arma que
o enfoque naturalista da conduta em geral, incluídas as funções psí-
quicas superiores, formadas no período histórico do desenvolvimento
da conduta, não leva em conta a diferença qualitativa entre a história
humana e a história dos animais”.
3
Entende-se o ser social a partir da concepção marxiana.
4
Vigotski ao citar Engels, refere-se à obra A Dialética da Natureza.
68 MENDONÇA, S. G. L.; PENITENTE, L. A. A.; MILLER, S. (Org.)
Para tanto, são identicados na psicologia histórico-cultural dois
planos genético no estudo psicológico, a logênese e a ontogênese – refe-
rente à transformação da espécie e do próprio ser, respectivamente, como
objetivação do trabalho e da necessidade de comunicação.
Indica que no estudo do desenvolvimento cultural da conduta
é necessário considerar a tese do materialismo histórico dialético que de-
fende que a atividade especicamente humana pressupõe o uso de ferra-
mentas na transformação da natureza interna e externa ao homem. Para
Vigotski, tal mediação é fundamental para a compreensão da constitui-
ção do gênero humano uma vez que, na relação com a natureza, “[…]
o animal utiliza a natureza exterior... enquanto que o homem, mediante
seus movimentos... a governa”. Arma ainda que “[...] a ação planicada
de todos os animais não tem imprimido sobre a terra o selo de sua vonta-
de. Para isso tem que se voltar ao homem” (2000b, p. 61-62).
A relação dialética e histórica integrada ao método materialista
é essencial para a objetivação do “método funcional de dupla estimula-
ção” empregado por Vigotski no estudo do desenvolvimento cultural do
psiquismo humano, uma vez que analisa o processo de interação entre
o homem enquanto ser social e a natureza por meio da mediação
de instrumentos e signos. Sobre tal tese, há de se explicitar que tanto os
signos quanto dos instrumentos exercem a função mediadora na consti-
tuição e desenvolvimento psicológico, porém têm orientações distintas –
os signos transformam a atividade interna dos sujeitos e os instrumentos
criam a possibilidade de transformação na atividade externa aos sujeitos.
O que se identica como essencial nesta tese é que a mediação tanto dos
signos quanto dos instrumentos exerce uma inuência na relação psico-
lógica dos sujeitos, transformando a natureza, recriando-a para que aten-
da às necessidades do homem, assim como o próprio homem se recria ao
no movimento histórico de transformação da realidade.
O método de dupla estimulação se objetiva na obra do autor
nas pesquisas sobre o desenvolvimento das funções psicológicas supe-
riores das crianças (VIGOTSKI, 2000a, 2001) e nas pesquisas de cunho
transcultural com adultos (VIGOTSKI; LURIA, 1996).
A Questão do Método e a Teoria Histórico-Cultural 69
A relevância da mediação de signos e instrumentos no desen-
volvimento cultural da criança é objetivada pelos processos educativos em
geral que impactam na transformação do psiquismo humano por meio
das relações sociais. Na particularidade da educação escolar, a mediação
das signicações elaboradas historicamente pela ciência, arte, política e -
losoa é considerada fundamental na organização do ensino que visa ao
desenvolvimento das funções psicológicas superiores quando são criadas
condições favoráveis para a superação do pensamento empírico rumo ao
pensamento teórico. Tal movimento é identicado como o processo de
internalização das signicações nos processos educativos, objetivado na
apropriação dos conceitos cientícos pelos sujeitos em atividade.
Vigotski (1989) apresenta três traços fundamentais no método
de investigação. O primeiro refere-se à “análise de processos em substi-
tuição à análise de objetos”. Neste aspecto, o enfoque evolutivo do pro-
cesso psicológico é considerado essencial na pesquisa em psicologia, pois
cria condições para a reconstrução de cada estágio no desenvolvimento. O
segundo aspecto visa à “explicação do fenômeno em substituição a descri-
ção do mesmo. Ao procurar a essência do conceito para que seja possível
explicá-lo, torna-se fundamental identicar os nexos internos do mesmo
e não simplesmente identicar as características perceptíveis, externas ou
aparentes. O terceiro aspecto requer a “investigação do “comportamento
fossilizado, compreendido como ações perpetuadas pelas signicações que
medeiam o movimento de apropriação da produção humana. Tal conceito
é de fundamental importância na compreensão do método de investiga-
ção, uma vez que:
Esses modos e formas de conduta que se encontram, que surgem de
forma esteriotipadas em determinadas circunstâncias, vêm a ser for-
mas psicológicas petricadas, fossilizadas, originadas em tempos remo-
tíssimos, nas etapas mais primitivas do desenvolvimento cultural do
homem, que se tem conservado de maneira surpreendente, como ves-
tígios históricos em estado pétreo e ao mesmo tempo vivo na conduta
do homem contemporâneo. (VYGOTSKI, 2000b, p. 63).
Tais traços do método de investigação, anunciados como emer-
gentes na pesquisa sobre o psiquismo humano por Vigotski, são conside-
rados fundamentais na pesquisa contemporânea que tenha o intento de
70 MENDONÇA, S. G. L.; PENITENTE, L. A. A.; MILLER, S. (Org.)
ser a expressão do método, pois evidenciam a necessidade de superação de
técnicas descritivas da aparente realidade investigada. Pressupõe identicar
os nexos lógico-históricos da realidade em foco, explicando a essência da
realidade concreta.
Se tomarmos estes aspectos do método proposto por Vigotski
para a análise do psiquismo, identica-se que os planos lo e ontogenéti-
co contemplam as dimensões ontológicas, gnosiológicas, epistemológicas
e lógicas na pesquisa educativa por requererem, no movimento de análise
da realidade psicológica o historicismo, a concretude e a materialidade da
constituição e do desenvolvimento humano.
Ao investigar a relação entre as funções elementares e superiores,
assim como os processos de transformação das mesmas no estudo sobre a
conduta humana, Vigotski (2000b) explicita a base materialista e histórica
presente no estudo a partir da lógica dialética sobre o psiquismo.
Ao se reportar às funções elementares e superiores no estudo da
conduta, o autor arma que, “ambos os pontos tomados em conjunto,
determinam a seção da gura histórica de todo o sistema de conduta do
indivíduo”. (p. 67). Também arma que “[...] a conduta somente pode ser
compreendida como história da conduta. Esta é a verdadeira concepção
dialética em psicologia”. (p. 68).
Ao relacionar a transformação das funções elementares e superio-
res às mediações, o autor arma que:
A criação e o emprego de estímulos articiais na qualidade de meios
auxiliares para dominar as próprias reações é a base da nova forma
de determinar o comportamento que diferencia a conduta superior da
elementar e cremos que a existência simultânea de estímulos dados e os
criados é o traço distintivo da psicologia humana. (VIGOTSKI, 2000b,
p. 82).
O fato de se entender a importância dos estímulos articiais en-
quanto meios auxiliares na formação e transformação das funções psíquicas
faz com que se problematizem os processos educativos que expressam as
condições concretas para que os indivíduos se humanizem. Neste aspecto,
as condições mediadoras da produção humana material e não-material são
concebidas como fator essencial para que o potencial humano se objetive
A Questão do Método e a Teoria Histórico-Cultural 71
nos sujeitos singulares, ou seja, para que cada sujeito seja a expressão das
máximas potencialidades humanas, próprias do gênero humano, objeti-
vadas na sua individualidade. Assim, os processos educativos assumem a
posição de serem um aspecto particular nas diversas atividades humanas,
seja na família, na escola, nos centros esportivos, nos núcleos de amigos
e outros lugares onde o conhecimento elaborado historicamente – arte,
ciência, losoa e política – possa ser mediado.
A linguagem e a atividade prática sensitiva, de acordo com Leon-
tiev (1983), são considerados mediadores essenciais para que ocorra a ob-
jetivação do que é próprio do gênero humano nos sujeitos singulares. Tra-
ta-se de se problematizar as condições particulares para que tal objetivação
ocorra em todos os sujeitos.
oS ProceSSoS educativoS e o deSenvolvimento PSicológico
As condições concretas para que a mediação da produção huma-
na ocorra varia de acordo com a organização da própria sociedade. Este
processo ocorre pela via da sociabilidade e potencializa ou impede o de-
senvolvimento psicológico. Na nossa sociedade, o acesso à cultura em geral
não é disponibilizado a todos os sujeitos de forma igualitária, fato deter-
minante que delimita as possibilidades de desenvolvimento das funções
psicológicas superiores dos sujeitos. Esta concepção de desenvolvimento
psicológico diferencia-se radicalmente das concepções biologizantes, am-
bientalistas ou mesmo adaptacionistas, uma vez que coloca nas condições
mediadoras produzidas pela vida em sociedade o compromisso ético e po-
lítico que deve garantir a relação aprendizagem e desenvolvimento.
No referencial teórico-metodológico que fundamenta este estu-
do, o desenvolvimento das funções psicológicas superiores é explicado pela
relação singular-particular-universal, própria do método do conhecimento
objetivado na psicologia histórico-cultural (OLIVEIRA, 2005). No cam-
po dos processos educativos, as condições concretas na organização das
ações e operações na atividade pedagógica (BERNARDES, 2009), assim
com das políticas educacionais, assumem a condição particular que me-
deia a relação entre o singular – o que é do sujeito como síntese de uma
realidade objetiva – e o universal – o que se refere à essência humana ma-
72 MENDONÇA, S. G. L.; PENITENTE, L. A. A.; MILLER, S. (Org.)
nifestada pelo potencial do gênero humano. O particular, enquanto con-
dição mediadora que emerge dos vários determinantes que se objetivam na
organização social, é meio para que a nalidade dos processos educativos
impacte na constituição da subjetividade dos sujeitos singulares. Assim, a
aprendizagem e o desenvolvimento das funções psicológicas superiores são
identicados como objetivações da atividade pedagógica que visa a media-
ção dos conhecimentos elaborados pelo conjunto dos homens ao longo de
sua história.
Heller (1985) aponta que a mediação do conhecimento ela-
borado historicamente nos processos educativos é um dos aspectos que
possibilita aos sujeitos alçarem a superação da alienação instituída histo-
ricamente na sociedade. Tal característica humana se integra à dimensão
universal no método de produção do conhecimento, pois segundo Vigo-
tski (2000b, p. 84),
“[...] a atividade mais geral e fundamental do ser humano, a que a
diferencia em primeiro lugar o homem dos animais deste ponto de
vista psicológico é a signicação, quer dizer, a criação e o emprego
dos signos”.
Também expressa a dimensão singular na constituição do pró-
prio sujeito no movimento de superação do desenvolvimento atual ao
apropriar-se da produção humana. No entanto, o potencial humano,
entendido como o universal, somente pode se objetivar nos sujeitos sin-
gulares caso tais produções humanas sejam mediadas no campo da so-
cialidade.
Para Vigotski (2000b, p. 85), na atividade mediada “o homem
introduz estímulos articiais, confere signicado à sua conduta e cria
com ajuda dos signos, atuando desta forma, novas conexões no cére-
bro”. Assim, as funções psicológicas superiores, tais como a memória,
o pensamento, a abstração, a linguagem, a generalização entre outras
constituem-se numa relação interfuncional, sendo impossível decompor
a unidade complexa do psiquismo humano em elementos isolados. En-
tende-se, portanto, que as transformações psicológicas ocorrem na re-
lação objetivação e subjetivação por meio das mediações simbólicas na
atividade prática.
A Questão do Método e a Teoria Histórico-Cultural 73
Ao se considerar que as novas conexões no cérebro são criadas
a partir da mediação das signicações na atividade prática, e que sem
esses estímulos articiais o processo de autotransformação das funções
psicológicas não ocorre – por não ser de ordem natural e sim de ordem
social – evidencia-se a grande importância dos processos educativos na
formação e na transformação dos sujeitos.
Neste aspecto, dá-se ênfase à educação escolar na (trans)formação
dos sujeitos, uma vez que ela deve ser compreendida como o lócus onde
o conhecimento elaborado historicamente pelo conjunto dos homens de-
veria ser disponibilizado a todos de forma igualitária. O problema há que
ser respondido, a partir da concepção de desenvolvimento psicológico que
nega a explicação do fracasso escolar como sendo próprio das caracterís-
ticas individuais, ou do próprio contexto familiar, é em que condições e
circunstâncias o ensino escolar pode/deve favorecer a objetivação da relação
indivíduo-genericidade?
A pesquisa que visa encontrar respostas a este problema necessita
registrar as informações emergentes da realidade investigada, de acordo
com as suas próprias necessidades. As ações e operações para capturar os
dados da realidade caótica podem ser aquelas desenvolvidas ao longo da
histórica da ciência, ou criadas pelo pesquisador para entender e explicá-la,
enquanto realidade no pensamento. Trata-se da superação das técnicas de
pesquisa em si, visando a produção de um conjunto de ações e operações
entendidas com técnicas para si, para fornecer informações necessárias que
possibilitem responder ao problema de pesquisa.
O objeto da pesquisa educacional requer o registro de infor-
mações sobre os vários determinantes sociais que impactam a realidade
investigada. A complexicação que emerge do contexto da pesquisa sobre
educação e desenvolvimento psicológico, que se organiza a partir do mé-
todo materialista histórico e dialético, requer procedimentos metodoló-
gicos próprios, que sejam a expressão da dimensão criadora do trabalho
investigativo. O desenho da pesquisa neste referencial teórico é construí-
do pelo pesquisador superando, pela incorporação, as técnicas formais
utilizadas nos estudos da psicologia tradicional. Tal posicionamento na
pesquisa é decorrente da necessidade de explicação da realidade caótica
por parte do pesquisador, construindo um conjunto de ações para além
74 MENDONÇA, S. G. L.; PENITENTE, L. A. A.; MILLER, S. (Org.)
do registro e descrição das relação interpessoais, mas que identique e
explique o sistema de relações existente entre os vários determinantes que
constituem a realidade concreta, agora no pensamento.
Nossas pesquisas
5
mostram-nos que na atividade de organização
do ensino os sujeitos devem ter consciência de que o processo de desenvol-
vimento psicológico não é natural ou espontâneo, e sim de ordem social,
para que a educação escolar possa vir a ser instituída como atividade me-
diadora do processo de transformação da conduta superior. Por sua vez,
entende-se que a formação da consciência ocorre a partir das relações com
a vida concreta, e não o inverso. Portanto, concebe-se que a formação da
consciência constitui-se dialeticamente. Ao assumir que a constituição dos
homens se dá a partir relação inter-intrapessoal, considera-se que são me-
diações simbólicas possíveis de serem acessadas no plano interpessoal que
se subjetivam no plano intrapessoal, assim como se objetivam na prática
social, que transformam a realidade interna e externa ao homem.
No campo educacional, ao estudar o sistema de ações e operações
na atividade pedagógica
6
como a unidade dialética entre a atividade de
ensino e de estudo (BERNARDES, 2009), identicamos que o objeto de
ensino deve ser mediado não como objeto em si, mas para si, integrado ao
conjunto de signicados sociais elaborado historicamente que fazem parte
de um sistema de relações conceituais, cuja essência evidencia os nexos
internos do próprio conceito.
Outro aspecto a ser considerado é o conjunto de ações e operações
coletivas e cooperativas entre os sujeitos na atividade pedagógica. Neste
aspecto, evidencia-se a necessidade de organização dos sujeitos visando o
movimento dialógico do conceito que tenha como nalidade a superação
do sentido pessoal dos estudantes, possível no nível das deduções
informais, para a apropriação do signicado social do objeto de estudo
– o próprio conceito. Para tanto, há de se superar a compreensão de que
o conceito é construído pelo próprio estudante, mas faz-se necessário
assumir que o mesmo é produzido ao longo da história dos homens e
precisa ser transformado em conhecimento escolar para ser apropriado
5
Recomenda-se a leitura do livro Mediações Simbólicas na Atividade Pedagógica: contribuições da teoria histórico-
-cultural para o ensino e aprendizagem (BERNARDES, 2012).
6
O sistema de ações e operações na atividade pedagógica é explicitado de forma ampla em Bernardes (2012).
A Questão do Método e a Teoria Histórico-Cultural 75
pelos estudantes na forma de conceito cientíco. Na atividade conjunta,
entre estudantes e professores, identicamos a importância de os mesmos
terem consciência de que integram uma coletividade de estudo, em que
as dimensões afetiva, volitiva e cognoscitiva integram-se como unidade
nas ações interpessoais. Outro elemento fundamental é o compartilhar
de ações de controle da aprendizagem por parte de todos que integram
a atividade pedagógica visando a organização do tempo, do espaço, de
funções nas ações coletivas, assim como no processo de avaliação do ensino
e da aprendizagem.
Estes aspectos são considerados fundamentais na organização do
ensino que tenha como nalidade promover o desenvolvimento das fun-
ções psicológicas superiores pela mediação do conhecimento, tanto dos
estudantes quanto dos professores, pois ao ensinar o professor também
aprende, e o estudante ao estudar também tem a oportunidade de ensinar.
Neste processo, o pensamento tanto dos professores quanto dos estudantes
deve superar a empiria e a espontaneidade, rumo à constituição do pen-
samento teórico e cientíco. No entanto, há de se considerar que ambos,
estudantes e professores, tenham consciência de suas funções sociais ao se
assumirem enquanto sujeitos na atividade pedagógica e das possibilidades
reais do ensino no processo de transformação pessoal e social.
Para tanto, há de se levar em conta, quando se tem como meta a
organização do ensino, que promova o desenvolvimento das funções psi-
cológicas superiores o conhecimento técnico e cientíco dos professores
– nos campos da psicologia, da didática, das metodologias de ensino e das
ciências particulares – assim como o compromisso ético e político dos mes-
mos com os processos de transformação do homem e da própria sociedade.
Entendemos que a superação do problema inicialmente colocado
deste artigo – por que a criança não aprende? – passa necessariamente por
encaminhamentos técnico e cientícos no campo da organização do ensi-
no que evidenciem caminhos para que a aprendizagem dos conhecimentos
escolares promova o desenvolvimento das funções superiores do estudante
por meio das mediações do conhecimento. Propõe-se a superação da práti-
ca pedagógica pautada nos princípios da empiria e do espontaneismo para
uma prática pedagógica que se paute em princípios teóricos e cientícos no
estudo dos objetos concretos, para sujeitos entendidos como seres sociais.
76 MENDONÇA, S. G. L.; PENITENTE, L. A. A.; MILLER, S. (Org.)
Tal posicionamento não exclui a relação entre sujeito e objeto de estudo
em sua concretude, mas a recoloca como uma relação mediada por signi-
cações que necessitam ser ensinadas por aqueles que assumem a função
de ensinar o conhecimento, que nos humaniza, aos herdeiros da cultura.
Recolocamos o problema há muito debatido na educação nacio-
nal que indica a necessidade de se levar em conta a importância do co-
nhecimento técnico e do compromisso ético e político, enquanto unidade
indissociável por parte dos sujeitos que organizam o ensino e denem as
políticas educacionais, quando se tem em pauta o ensino que seja conside-
rado desenvolvedor por criar possibilidades de objetivação da generecidade
humana nos sujeitos singulares.
referênciaS
BERNARDES, M. E. M. Ensino e Aprendizagem como unidade dialética na atividade
pedagógica. Psicologia Escolar e Educacional, v. 13, p. 235-242, 2009.
______. O pensamento na atividade prática: implicações no processo pedagógico.
Psicol. estud., Maringá , v. 16,n. 4,p. 521-530, dez. 2011.
______. Mediações simbólicas na atividade pedagógicas: contribuições da teoria histórico-
cultural para o ensino e aprendizagem. Curitiba: CRV, 2012.
CAMPOS, R. H. F. A pesquisa em psicologia da educação: aspectos históricos. 33.
ANPED, Educação no Brasil: o balanço de uma década. Caxambu, MG, 2010.
DUARTE, N. A anatomia do homem é a chave da anatomia do macaco: a dialética
em Vigotski e em Marx e a questão do saber objetivo na educação escolar. Educ. Soc.
v. 21, n. 71, p. 79-115, 2000. Disponivel em: <http://dx.doi.org/10.1590/S0101-
73302000000200004>. Acesso em: 25 mar. 2009.
HELLER, A. O cotidiano e a história. São Paulo: Paz e Terra, 1985.
GUZZO, R. S. L. et al. Psicologia e Educação no Brasil: uma visão da história e
possibilidades nessa relação. Psic.: Teor. e Pesq. v. 26, n. spe, p. 131-141, 2010.
LEONTIEV, A. N. Actividad, conciencia, personalidad. Habana, Cuba: Pueblo y
Educación, 1983.
OLIVEIRA, B. A dialética do singular-particular-universal. In: ABRANTES, A. A.;
SILVA, N. R.; MARTINS, S.T. F. Método histórico-social na psicologia social. Petrópolis,
RJ: Vozes, 2005. p. 25- 51.
PATTO, M. H. S. Psicologia e ideologia: uma introdução crítica à psicologia escolar. São
Paulo: T. A. Queiroz, 1984.
SAVIANI, D. Escola e democracia. Campinas, SP: Autores Associados, 2008.
A Questão do Método e a Teoria Histórico-Cultural 77
TANAMACHI, E. R.; MEIRA, M. E. M. A atuação do psicólogo como expressão do
pensamento crítico em psicologia e educação. In: MEIRA, M. E. M.; ANTUNES, M.
A. M. Psicologia escolar: práticas críticas. São Paulo: Casa do Psicólogo, 2003. p. 11-62.
VIGOTSKI, L. S. O signicado histórico da crise da psicologia: uma investigação
metodológica. In: ______. Teoria e método em psicologia. 3. ed. São Paulo: Martins
Fontes, 2004. p. 203-417.
______. El problema del desarrollo de las funciones psíquicas superiores. In: ______.
Obras escogidas III. Madrid: Visor, 2000a. p.11- 46.
______. Metodo de investigación. In: ______. Obras escogidas III. Madrid: Visor,
2000b. p.47-96.
______. Pensamiento y palavra. In: ______. Obras escogidas II. Madrid: Machado
Libros, 2001. p. 287- 348.
______. A formação social da mente: o desenvolvimento dos processos psicológicos
superiores. 3. ed. São Paulo: Martins Fontes, 1989.
VYGOTSKY, L. S.; LURIA, A. R. Estudos sobre a história do comportamento: símios,
homem primitivo e criança. Porto Alegre: Artes Médicas, 1996.
terceira Parte
método e trabalho pedagógico
o método como baSe Para reflexão Sobre um
modo geral de organização do enSino
Marta Sueli de Faria Sforni
No site de apresentação do III Congresso Internacional sobre a
Teoria Histórico-Cultural da Unesp de Marília, é feito menção a um pro-
blema que tem sido bastante divulgado já há alguns anos, com alarde, pela
mídia: a educação básica brasileira, principalmente nas escolas públicas,
tem apresentado dados de avaliação do desempenho escolar de seus es-
tudantes, principalmente nas áreas de leitura, escrita e matemática, muito
aquém do desejável”
7
. Como prossionais da área da educação, olhamos
para esses dados com cautela. Sabemos que as avalições em larga escala que
evidenciam o baixo desempenho escolar dos estudantes brasileiros, estão
inseridas em um pacote de medidas elaborado por organismos interna-
cionais que visa o ajuste dos países periféricos às demandas do capital em
tempos de reestruturação global da economia. Esse ajuste implica a pro-
moção de ações educativas voltadas para a administração das consequên-
cias da desigualdade social acentuada, bem como para a formação exível
requerida pela nova forma de organização do setor produtivo (AFONSO,
2001; CARVALHO, 2009; GALUCH; SFORNI, 2011; SHIROMA;
MORAES; EVANGELISTA, 2002). Mudanças em nível mundial impu-
seram alterações signicativas à educação brasileira manifestando-se na in-
tervenção mais direta, via indução de currículos, sobre o tipo de formação
escolar que se requer e no explícito acompanhamento da capacidade de
as instituições educativas propiciarem a formação requerida, papel que é
3º Congresso Internacional Sobre a Teoria Histórico-Cultural e 15ª Jornada do Núcleo de Ensino de Marília.
Site on line: Apresentação. Marília: Faculdade de Filosoa e Ciências – Unesp –Campus de Marília, 2016. Dis-
ponível em: http://www.inscricoes.fmb.unesp.br/principal.asp. Acesso em 28 jul. 2016.
https://doi.org/10.36311/2017.978-85-7983-879-8.p81-96
82 MENDONÇA, S. G. L.; PENITENTE, L. A. A.; MILLER, S. (Org.)
assumido pelas avaliações em larga escala, como Provinha Brasil, Prova
Brasil e Enem.
Essas avaliações, ferramentas no interior de um novo modelo de
administração gerencial com ênfase na gestão de resultados, passaram a
nortear as ações do Ministério da Educação a partir da década de 1990. Os
dados produzidos são utilizados por políticas que têm como meta adaptar a
escola às necessidades de desenvolvimento do capital (LIBÂNEO, 2016) e
não de colocá-la a serviço do desenvolvimento humano de modo genérico,
como defendido pela Teoria Histórico-Cultural.
Todavia, apesar de produzidos nesse contexto de gestão da edu-
cação pública, marcada pelas políticas neoliberais, os dados expressam um
cenário que há tempos tem sido denunciado por aqueles que defendem a
escola como espaço social privilegiado de desenvolvimento humano. O
baixo desempenho escolar em leitura, escrita e matemática, visto pelo re-
ferencial teórico que adotamos, é também preocupante, não pelo fato de a
escola não estar desenvolvendo valores, habilidades e competências exigi-
das pelo mundo contemporâneo, como armam os gestores dessas políti-
cas, mas em razão da estreita relação entre a aprendizagem dos conteúdos
escolares e o desenvolvimento humano.
Ou seja, considerando que a cultura produzida, de modo especial,
o conhecimento teórico, está objetivado na linguagem das diferentes áreas
do conhecimento que compõem o currículo escolar, o incipiente domínio
da linguagem escrita constitui-se imenso obstáculo para a apropriação do
conhecimento teórico produzido pela humanidade. Sem essa apropriação
ou com ela ocorrendo em níveis precários, ca comprometido o desenvol-
vimento do psiquismo humano em suas máximas possibilidades.
Não é nova a armação de que, de acordo com a Teoria Histó-
rico-Cultural, a promoção desse desenvolvimento é a principal função da
educação escolar, no entanto, como sinalizado no site de apresentação do
evento:
Não há ainda consolidada uma teoria pedagógica que promova um
trabalho pedagógico em sala de aula que envolva os estudantes em suas
tarefas de estudo de modo a promover a sua aprendizagem efetiva.
8
8 3º Congresso Internacional Sobre a Teoria Histórico-Cultural e 15ª Jornada do Núcleo de Ensino de Marília.
Site on line: Apresentação. Marília: Faculdade de Filosoa e Ciências – Unesp –Campus de Marília, 2016. Dis-
A Questão do Método e a Teoria Histórico-Cultural 83
Tal fato acaba gerando uma situação paradoxal em algumas es-
colas ou redes de ensino: a Teoria Histórico-Cultural se faz presente na
fundamentação teórica da Proposta Curricular, no discurso dos professo-
res e no conteúdo de alguns cursos de formação continuada, nos quais
é armada a importância da aprendizagem de conceitos cientícos e do
desenvolvimento do pensamento teórico dos estudantes. No entanto, a or-
ganização do ensino segue à margem dessa fundamentação, orientando-se
por livros didáticos que são recomendados por se adaptarem aos critérios
do Programa Nacional do Livro Didático (PNLD). Critérios que atendem
a perspectiva de formação assumidas pelas políticas internacionais, ou seja,
que priorizam a formação de valores, atitudes e competências necessárias
a atual forma de organização do setor produtivo (MEDEIROS; SFORNI,
2016).
Ao ter a demanda do capital como formação prioritária, os con-
teúdos conceituais acabam dividindo espaço com conteúdos atitudinais e
procedimentais, que ocupam grande parte do tempo escolar, já que, como
arma o próprio documento da Unesco para a educação na América La-
tina e Caribe, dentre as aprendizagens a ser promovida pela escola, a mais
importante é aprender a conviver (DELORS,1996). A predominância
desses conteúdos nos livros didáticos, principalmente dos anos iniciais do
ensino fundamental, tende a ser bem aceita por alguns professores que
os consideram úteis para a vida prática em contraposição aos conteúdos
escolares clássicos cujo valor lhes parece restrito ao ambiente escolar. De
fato, a tradição do ensino de conceitos cientícos de acordo com a lógica
formal levou a se considerar a sua aprendizagem como verbalismo sem va-
lor, como abstração em si, razão pela qual deixá-lo em segundo plano não é
sentido como uma perda para a formação dos alunos. Além disso, o ensino
de conteúdos atitudinais e procedimentais aproximam-se do discurso do
senso comum, não exigindo sólida formação para ser transmitido, o que
ca em sintonia com a formação de professores cada vez mais aligeirada e
frágil teoricamente.
Esse quadro, inicialmente exposto acerca da escola que temos,
visa a defender a ideia de que se desejamos avançar para além do enuncia-
do de um ensino que seja promotor do desenvolvimento humano, como
ponível em: http://www.inscricoes.fmb.unesp.br/principal.asp. Acesso em 28 jul. 2016.
84 MENDONÇA, S. G. L.; PENITENTE, L. A. A.; MILLER, S. (Org.)
defendido pela teoria histórico-cultural, é necessário combater concepções
que enfatizam a escola como espaço de adaptação dos sujeitos às deman-
das imediatas da sociedade, esclarecer a diferença entre aprendizagem de
conceitos de acordo com a lógica formal e a lógica dialética, contrapor-se
às políticas de formação de professores que não propiciam sólida formação
teórica a esses prossionais, bem como lutar por condições objetivas de
trabalho nas escolas e nas salas de aula que possibilitam sua efetivação.
Não se faz um “ensino de acordo com a Teoria Histórico-Cultu-
ral”, apenas via denição curricular e cursos de formação de professores,
isolando a sala de aula das condições objetivas nas quais ela se constitui,
dentre elas estão aquelas próprias do campo pedagógico – material didático
recebido, avaliações externas, projetos impostos pelos governos estaduais e
municipais, etc., que são estruturados com base em políticas que vão na
contramão de uma escolarização voltada para o desenvolvimento humano
da classe trabalhadora. Nesse sentido, ter como ideal a socialização do co-
nhecimento produzido signica um ato de resistência que extrapola o fazer
imediato da sala de aula.
Todavia, se o espaço da sala de aula sofre todas essas determina-
ções externas, contraditoriamente, é nele que os professores atuam coti-
dianamente e podem também produzir resistências. No caso especíco do
conteúdo de escolar, a resistência está na negação da oferta de um ensino
restrito às exigências imediatas, sem ênfase no conhecimento cientíco,
enm, está na busca um ensino que propicie aquilo que a experiência ime-
diata não propicia: a formação do pensamento teórico.
Mas “qual o caminho adequado a seguir? Que congurações ca-
racterizariam um bom ensino e uma aprendizagem que, de fato, possam
promover o desenvolvimento desses estudantes?”, perguntam os organiza-
dores desse evento no site de apresentação.
Consideramos que respostas a essas perguntas exigem o diálogo
entre a Teoria Histórico-Cultural e a Didática, juntamente com pesqui-
sas de campo de caráter experimental. Sem se avançar nesse diálogo, a
tendência é apenas fazer menção da teoria para: a) enaltecer as interações
entre professores e alunos; b) enfatizar a necessidade de se considerar os
conhecimentos espontâneos dos estudantes nas interações em sala de aula;
A Questão do Método e a Teoria Histórico-Cultural 85
c) destacar o papel do professor como mediador; d) ressaltar a importância
dos conceitos cientícos na educação escolar, sem, no entanto, problema-
tizar o próprio modo de organização do ensino dos conceitos, deixando,
assim, espaço para que no momento de denir a aula (conteúdos e meto-
dologias), a organização adotada seja aquela exposta pelos livros didáticos,
conforme já mencionamos ao destacar a cisão entre a proposta curricular e
a atividade de ensino.
Não consideramos ser possível em uma sociedade de classes uma
educação que seja integralmente a expressão do método materialista histó-
rico-dialético, como arma Leontiev:
Na sociedade de classes, a encarnação no desenvolvimento dos indi-
víduos dos resultados adquiridos pela humanidade na sequência do
desenvolvimento da sua actividade global, e a de todas as aptidões hu-
manas permanecem sempre unilaterais e parciais (LEONTIEV, 1978,
p. 173-4).
Reforça, ainda, o autor que “para a esmagadora maioria das pes-
soas, a apropriação destas aquisições só é possível dentro de limites miserá-
veis” (LEONTIEV, 1978, p. 283). No entanto, entendemos que a escola é
também um espaço de luta e de contradição. Não é a instância determinante
das transformações sociais, mas nem por isso deixa de ter inuência sobre
ela. Razão pela qual sempre esteve na pauta das políticas conversadoras que
fazem questão de ocupar esse espaço.
Reconhecendo esse cenário, temos realizado pesquisas que visam
compreender como o ensino pode ser organizado de modo que contribua
para o desenvolvimento humano. Conhecimentos acerca do objeto do co-
nhecimento e do sujeito da aprendizagem, presentes no método materialista
histórico-dialético e na Teoria Histórico-Cultural sinalizam limites de algu-
mas formas usuais de organização do ensino e nos apontam aspectos a serem
superados quando se tem em vista um ensino com esse potencial formativo.
Alguns princípios pedagógicos, ações docentes e procedimentos de
ensino podem ser apontados como resultados dessa investigação. Eles procu-
ram objetivar os pressupostos da Teoria Histórico-Cultural e, em decorrên-
cia, a orientação teórica e metodológica do materialismo histórico e dialético.
86 MENDONÇA, S. G. L.; PENITENTE, L. A. A.; MILLER, S. (Org.)
ProceSSo de cognição: movimento entre o concreto e o abStrato
Os princípios e procedimentos de ensino que serão destacados
ao longo deste texto seguem um percurso que se aproxima do processo de
cognição exposto por Marx (1996) e também tratado por Davídov (1988),
Davydov (1982), Kopnin (1978), Ilienkov (2006), de modo especial, no
que se refere ao movimento dialético entre concreto e abstrato. Esse pro-
cesso tem como ponto de partida e de chegada o concreto, os fenômenos
da realidade objetiva, concreta. Mas o concreto aparece de modo distinto
em cada um desses pontos. No ponto de partida, ele é captado pela con-
templação sensorial, pela percepção imediata. Como a realidade é síntese
de múltiplas determinações, ela só pode ser compreendida para além de
sua aparência, por meio de abstrações, pelas leis gerais e conceitos.
Os conceitos são, portanto, mediadores entre o concreto ime-
diato (ponto de partida) e o concreto pensado (ponto de chegada). O
pensamento avança das impressões imediatas do contato com a realidade
e caminha para a sua compreensão, sobretudo, pelo processo de análise
(ILIENKOV, 2006). Esse processo é denominado por Davídov (1988) de
redução, segundo ele, a tarefa fundamental da análise consiste “[...] na
redução das diferenças existentes dentro do todo à base única que as gera,
a sua essência” (DAVÍDOV, 1988, p. 147). O descobrimento da essência
revela a conexão interna que, como fonte única, determina as demais par-
ticularidades do todo. Trata-se da abstração inicial. No estágio do pensar
abstrato, busca-se o que constitui a base, a unidade da diversidade.
Formada essa abstração, outro movimento do pensamento torna-
-se possível, “Partindo da abstração inicial se desenvolve toda a multiplici-
dade concreta do fenômeno” (ILIENKOV, 2006, p. 173) esse é o processo
denominado de ascensão do abstrato ao concreto. Nesse processo, a síntese
ocupa lugar de destaque, trata-se da inferência do singular e concreto par-
tindo do geral e abstrato. Nesse momento, o concreto “aparece já, não em
forma de soma de diversos dados, observações, fatos, proposições separa-
das, etc., mas como um saber sobre fenômenos iluminados por uma única
ideia” (ILIENKOV, 2006, p. 160, grifo do autor, tradução nossa).
Davidov (1988) arma que, embora os processos de redução (do
concreto ao abstrato por meio da análise) e ascensão (do abstrato ao con-
A Questão do Método e a Teoria Histórico-Cultural 87
creto por meio da síntese) encontrem-se unidos, o movimento que expres-
sa o pensamento teórico é o processo de ascensão do abstrato ao concreto.
O processo de redução é apenas um meio subordinado, um meio necessá-
rio para alcançar essa que é a nalidade do pensamento: compreender os
fenômenos da realidade objetiva.
Como já armado, esse processo de cognição é próprio dos pro-
cedimentos de investigação. No entanto, como arma, Marx (1996) há
diferença entre o método de investigação (de pesquisa) e o método de ex-
posição do conhecimento produzido
9
. Sabemos que na escola o estudante
não produz conhecimento cientíco, mas dele se apropria. O conteúdo
que será por ele apropriado já está sistematizado, já se encontra em forma
abstrata, por essa razão, espera-se que daí ocorra o procedimento de ascen-
são do abstrato ao concreto, processo que mais se aproxima do procedi-
mento de exposição do conhecimento do que de investigação.
Então, por qual razão ter como referência o procedimento de in-
vestigação para pensar nos procedimentos de ensino? Apesar de as crianças
em idade escolar não criarem conceitos, imagens, valores e normas de mo-
ralidade social, elas apropriam-se deles no processo da atividade de apren-
dizagem. Ao realizar essa atividade, diz Davydov: “as crianças executam
ações mentais semelhantes às ações pelas quais estes produtos da cultura
espiritual foram historicamente construídos” (DAVYDOV, 1988, p. 21).
Em outras palavras:
Em sua atividade de aprendizagem, as crianças reproduzem o processo
real pelo qual os indivíduos vêm criando conceitos, imagens, valores
e normas. Portanto, o ensino de todas as matérias na escola deve ser
estruturado de modo que, como escreveu Ilenkov, “seja reproduzido,
de forma condensada e abreviada, o processo histórico real da gênese e
desenvolvimento do conhecimento” (DAVYDOV, 1988, p. 22).
Isso signica que apesar de a atividade de aprendizagem estar em
correspondência com o procedimento de exposição de um conhecimento
já produzido, nessa atividade devem ser conservadas as situações e ações do
9
“É, sem dúvida, necessário distinguir o método de exposição formalmente do método de pesquisa. A pesquisa
tem de captar detalhadamente a matéria, analisar as suas várias formas de evolução e rastrear sua conexão íntima.
Só depois de concluído esse trabalho é que se pode expor adequadamente o movimento real. Caso se consiga
isso, e espelhada idealmente agora a vida da matéria, talvez possa parecer que se esteja tratando de uma constru-
ção a priori” (MARX, 1996, p. 140).
88 MENDONÇA, S. G. L.; PENITENTE, L. A. A.; MILLER, S. (Org.)
processo de criação desse conhecimento. Ao se recuperar essas situações e
ações que estão ocultas no conhecimento já sistematizado, na abstração, é
que se toma consciência da sua instrumentalidade, tornando o conceito
um meio de raciocínio, imaginação, atenção percepção dos fenômenos da
realidade objetiva. Obviamente, não se trata de reproduzir todo o processo
de investigação de forma integral, com todas as suas nuances, mas de for-
ma abreviada na consciência individual dos estudantes.
Por meio da análise os alunos são orientandos a identicar a
relação geral principal em certa área, a qual passa a ser base para a genera-
lização substantiva. O “núcleo” da matéria estudada, converte-se em meio
para deduzir relações mais particulares (DAVYDOV, 1988) . O conteúdo
do “núcleo” da matéria estudada e meio para deduzir as relações particula-
res é o conceito, por esse motivo ele é considerado, ao mesmo tempo o re-
exo de um objeto ou fenômeno e um procedimento de operação mental.
modo geral de organização do enSino
As pesquisas realizadas até o momento nos permitiram destacar
cinco princípios orientadores da ação docente: princípio do ensino que
desenvolve, princípio do caráter ativo da aprendizagem, princípio do ca-
ráter consciente, princípio da unidade entre plano material (ou materia-
lizado) e o verbal, princípio da ação mediada pelo conceito. Esses prin-
cípios desdobram-se em ações que expressam uma atividade de ensino
que por eles é orientada (SFORNI, 2015a). Sentimos que a compreensão
acerca dos princípios e a ações deles decorrentes foi um avanço no senti-
do de ter uma bússola para guiar o trabalho docente. Todavia, o percurso
didático permanece ainda pouco delineado, o que diculta ao professor
pensar na sequência de ações a serem realizadas ao longo de uma unidade
conceitual.
Procuramos, então, organizar as ações, antes vinculadas aos
princípios, numa sequência que se aproxima aos momentos de planeja-
mento de ensino. Antes, porém, de chegarmos ao aspecto formal do pla-
nejamento, na redação do(s) objetivo (s), procedimentos metodológicos
e avaliação, há que se pensar num modo geral de organização do ensino,
orientado pelo método, cujo planejamento escrito é sua objetivação.
A Questão do Método e a Teoria Histórico-Cultural 89
Então retornemos a alguns aspectos já destacados, agora com a
intenção de pensarmos suas implicações pedagógicas no que se refere ao
planejamento de ensino. Consideramos que o nuclear para se pensar o en-
sino dos conteúdos das diferentes áreas do conhecimento é a compreensão
do conceito como um instrumento mediador da relação dos seres humanos
com a realidade. Por meio do trabalho, a humanidade produziu objetos,
os instrumentos físicos, e os meios de produção desses objetos, ou seja, o
conhecimento. A atividade prática objetiva, produtiva, o trabalho é a base
do pensamento humano. Todas as formas do pensamento se constituem e
funcionam “dentro dos modos historicamente formados dessa atividade,
transformadora da natureza” (DAVYDOV, 1982, p. 280).
Essa cultura material e intelectual é resultado da atividade cogni-
tiva do homem na interação com a realidade objetiva. Os meios materiais
e ideais da existência humana cam “encarnados” nos próprios objetos e na
linguagem, por meio da qual são comunicados os conhecimentos produ-
zidos, seja via linguagem gestual, oral ou escrita. Como arma Leontiev:
A linguagem é aquilo através do qual se generaliza e se transmite a ex-
periência da prática socio-histórica da humanidade; por consequência,
é igualmente um meio de comunicação, a condição da apropriação
pelos indivíduos desta experiência e a forma da sua existência na cons-
ciência (LEONTIEV, 1978, p. 172).
A linguagem, ou sistema de signos, assume uma função seme-
lhante a um instrumento técnico no trabalho. Usamos o termo instrumen-
to simbólico apoiados nessa analogia feita por Vigotski: enquanto o instru-
mento físico permite a ação externa do homem sobre o meio, a linguagem
permite a realização da ação interna.
Ao mesmo tempo em que o homem cria os instrumentos materiais
que lhe permitem maior domínio sobre a natureza, cria também os
meios articiais que lhe possibilitam controlar a sua própria conduta.
O nó em uma corda, utilizado pelo sujeito para se lembrar de algo;
um traço feito para controlar uma quantidade; um desenho para se
referir a um fenômeno; uma fórmula para registrar um processo; são
todos sinais articiais, ou seja, signos externos que permitem ao su-
jeito realizar ações internas – recordar, imaginar, raciocinar, sentir,
planejar – enm ações mentais que permitem atuar, criar e intervir
no mundo objetivo (SFORNI, GALUCH, 2009, p. 80-81)
90 MENDONÇA, S. G. L.; PENITENTE, L. A. A.; MILLER, S. (Org.)
Tal como no instrumento físico estão incorporadas e xadas as
operações de trabalho historicamente elaboradas e, portanto, a sua apro-
priação implica uma “reorganização dos movimentos naturais instintivos
do homem e a formação das faculdades motoras superiores” (LEONTIEV,
1978, p. 269), processo semelhante ocorre na apropriação dos fenômenos
da cultura intelectual. Na linguagem estão operações de palavras que são
xadas historicamente nas suas signicações: “A aquisição de conhecimen-
tos torna-se um processo que provoca igualmente formação na criança de
acções interiores cognitivas, isto é, de acções e de operações intelectuais
(LEONTIEV, 1978, p. 183).
Essa forma de conceber a linguagem, de modo especial, os con-
ceitos cientícos, contrapõe-se ao modo usual como os compreendemos
em razão da nossa trajetória escolar, marcada por um ensino de conceitos
organizado de acordo com a lógica formal. De acordo com essa tradição,
considera-se que dominar um conceito é sinônimo de saber sua denição,
no entanto, como arma Davydov, na Teoria Histórico-Cultural:
O conceito é tratado [...] como forma da atividade mental mediante a
qual se reproduz o objeto idealizado e o sistema de suas conexões, que
reetem em sua unidade a generalidade e a essência do movimento do
objeto material. O conceito aparece tanto como forma de reexo do
objeto material, como meio de sua reprodução mental, de sua estrutu-
ra, ou seja, como singular operação mental (DAVYDOV, 1982, p. 300).
Ao se compreender o conceito no sentido exposto por Davydov,
ca clara a importância conferida por essa Teoria à aprendizagem concei-
tual como meio de desenvolvimento das Funções Psíquicas Superiores e
tomada de consciência. Sua apropriação está vinculada à atividade mental,
o que implica mobilização das funções psíquicas superiores e, portanto, o
desenvolvimento dessas funções. Na exposição do autor ca clara a relação
entre o conceito e sua materialidade, como meio que possibilita o reexo
subjetivo da realidade objetiva. Sua apropriação permite uma nova relação
do sujeito com a realidade, mais profunda e abrangente do que aquela que
pode ser captada pela sensação e pela percepção.
O conceito é, portanto, uma síntese da atividade humana na
busca de compreensão e controle dos objetos e fenômenos da realidade
objetiva. Ao nos apropriarmos de um conceito nos apropriamos de uma
A Questão do Método e a Teoria Histórico-Cultural 91
abstração que permite a interação com vários aspectos da realidade. Essa
interação se expressa pelas ações mentais possibilitadas pelo conceito. Ou
seja, o conceito se interpõe entre o sujeito e os fenômenos, propiciando
ao sujeito captar os fenômenos para além das suas manifestações empíri-
cas imediatas. Desse modo, apropriar-se de um conceito signica “pensar
com” ele, movimentá-lo do geral (abstrato) para o particular (concreto) e
vice-versa. Isso signica que o conceito provoca transformações no conteú-
do e na forma de pensar o mundo.
Assim, a primeira ação ao se organizar o ensino de um conceito
não é buscar os meios para se chegar a sua denição, mas analisar qual
o pensamento que está nele objetivado, a materialidade que ele expressa.
Em outras palavras, cabe perguntar: esse conceito é uma ferramenta que
permitiu a humanidade dominar quais fenômenos da realidade? Ele nos
permite tomar consciência de quais fenômenos? As respostas a essas per-
guntas podem ser encontradas na própria gênese do conceito, o estudo so-
bre sua origem histórica revela muito da sua materialidade, da sua criação
como ferramenta para uma determinada nalidade. Kopnin (1978) parte
do pressuposto de que a unidade do histórico e do lógico é premissa para
compreender a essência de um objeto, de um conceito em sua estrutura,
sua história, seu desenvolvimento. Para revelar a essência do objeto é neces-
sário reproduzir o processo histórico real de seu desenvolvimento.
Em relação ao sujeito da aprendizagem, há que se compreender
que apesar de não se considerar que na educação escolar o sujeito constrói
o conhecimento sobre o conceito isso não signica que ele o recebe passi-
vamente, via um mecanismo transmissão-recepção direta do professor para
o estudante. A apropriação exige um processo ativo do sujeito. No entanto,
não se trata de qualquer atividade, mas daquela que constitui-se em um
problema cuja solução pode ser mediatizada pelo conceito. “Em relação
aos fenômenos espirituais, a um conceito, por exemplo que ela encontra
pela primeira vez, a criança deve manifestar uma actividade intelectual,
uma actividade do pensamento que lhe corresponda” (LEONTIEV, 1978,
p. 185). Como encontrar a atividade do pensamento que lhe corresponda?
A humanidade deixou registrada, em forma de síntese (conceitos), um pro-
cesso de pensamento que procura apreender a realidade objetiva, seja ela
em seus aspectos naturais, sociais, econômicos, históricos, etc., esse proces-
so de pensamento deve ser apropriado na aprendizagem dos conceitos. A
92 MENDONÇA, S. G. L.; PENITENTE, L. A. A.; MILLER, S. (Org.)
aprendizagem exige a reprodução da atividade mental que está objetivada
no conceito, portanto, não pode ser feito de outro modo se não por meio
de um processo ativo por parte daquele que aprende.
Apesar de se tratar de um fenômeno cognitivo, a aprendizagem
não está desvinculada de um processo afetivo. O que move o pensamen-
to é a necessidade, interesse e motivo da pessoa que pensa. Como ar-
ma Vygotski (1982) há sempre uma tendência afetivo-volitiva por trás do
pensamento. Desse modo, a criação de motivos para aprender também é
algo que faz parte do planejamento de ensino. Na criação de motivos é
importante levar em conta as vivências dos estudantes, o que inclui a pe-
riodização e a situação social de desenvolvimento em que se encontram, de
modo a encontrar elementos que possam conectar o conteúdo novo a ser
ensinado com as experiências já vivenciadas pelos estudantes.
Em síntese, ao se decidir pelo ensino de determinado conceito
presente na proposta curricular das diversas áreas do conhecimento, o
Ponto de Partida para o planejamento é a análise do objeto e do sujeito
da aprendizagem e dos processos afetivo-cognitivos a serem mobilizados.
- o objeto da aprendizagem: O que é nuclear neste conceito? Ele
é um instrumento produzido pelo homem para compreender quais fenô-
menos da realidade objetiva? Para responder a essas perguntas é necessário
analisar a gênese do conceito em seu aspecto lógico-histórico.
- o sujeito da aprendizagem: Qual é o nível de desenvolvimento
atual e previsão do nível de desenvolvimento esperado para esse grupo de
alunos? Quais práticas sociais já vivenciadas pelos estudantes podem ser
explicadas pelo conceito a ser ensinado?
- os processos afetivo-cognitivos: Que perguntas, problemas ou
situações podem ser mobilizadores do pensamento dos estudantes para
criar neles o motivo de estudo do conceito? Que situações podem ser ob-
servadas, imaginadas, percebidas por eles por meio deste conceito? Essa
análise propicia o surgimento de ideias de atividades com os conceitos que
mobilizam as Funções Psíquicas Superiores.
A Questão do Método e a Teoria Histórico-Cultural 93
1. Ponto de partida
Pensar no sujeito no objeto
e nos processos afetivos/
cognitivos
1a) Análise da gênese do conceito no seu aspecto lógico-histórico
para buscar o que é nuclear no conceito – análise do conceito a ser
ensinado
1b) Avaliação do nível de desenvolvimento atual e previsão do nível
de desenvolvimento esperado - analise do sujeito da aprendizagem
1c) Escolha de atividades com os conceitos que mobilizem as Fun-
ções Psíquicas Superiores – análise dos processos cognitivos/afetivos
A partir dessa análise é possível denir o objetivo geral e objeti-
vos especícos no planejamento: O objetivo geral está sempre vinculado
ao domínio do que é nuclear do conceito; os objetivos especícos são os
desdobramentos do objetivo geral, em forma de “ações mentais mediadas
pelo conceito”: comparar, analisar, investigar, identicar, deduzir, fazer in-
duções, estabelecer relações, etc.
Após essa análise é necessário denir as ações de ensino, os proce-
dimentos metodológicos, que não são aleatórios, mas organizados dentro
de uma lógica. Apoiam-se no processo de redução do concreto imediato
ao abstrato e ascensão do abstrato ao concreto, exposto anteriormente,
bem como no percurso descrito por Leontiev (1978) e Galperin (2009) de
formação das ações intelectuais: das ações realizadas no exterior, às ações
situadas no plano verbal chegando às ações realizadas internamente pelo
sujeito.
A aquisição das ações mentais que estão na base da apropriação pelo
indivíduo da “herança” dos conhecimentos e conceitos elaborados
pelo homem, supõe necessariamente que o sujeito passe das acções
realizadas no exterior às acções situadas no plano verbal, depois a
uma interiorização progressiva destas últimas; o resultado é que estas
acções adquirem o caráter de operações intelectuais estreitas, de actos
intelectuais (LEONTIEV, 1978, p. 188).
Nesse percurso ca evidente a centralidade exercida pelo conceito
(linguagem/signo) das ações externas às internas e sua função como abs-
tração que permite o movimento entre o concreto imediato ao concreto
pensado.
94 MENDONÇA, S. G. L.; PENITENTE, L. A. A.; MILLER, S. (Org.)
Nesses procedimentos estão presentes processos indutivos e de-
dutivos, bem como analíticos e sintéticos, que, conforme a situação, po-
dem ser realizados por meio de atividades em grupo, exposição verbal do
professor, leituras dirigidas, enm, por meio de técnicas de ensino que
melhor permitam realizar a passagem das ações externas com o conceito às
ações internas.
2. Planejando as ações
Das ações externas às
internas: o plano material ou
materializado (ilustrativo),
a linguagem verbal (oral e
escrita) e o plano mental.
2a) Elaboração de problemas desencadeadores, cuja solução exi-
ge do aluno a mediação do conceito (plano material ou materia-
lizado: uso de materiais, experimentos, problemas...)
2b) Previsão de momentos em que os alunos dialoguem entre si,
elaborem sínteses coletivas, mesmo que provisórias (linguagem -
reexão e análise)
2c) Uso de textos cientícos e clássicos da respectiva área de co-
nhecimento (linguagem cientíca)
2d) Orientação do processo de elaboração de sínteses conceituais
pelos estudantes (união entre linguagem dos estudantes e lingua-
gem cientíca)
Ao se planejar a avaliação do processo de ensino, é necessário
apresentar uma nova situação singular, concreta, para que o estudante pos-
sa analisá-la com base no conceito estudado. A avaliação não está centrada
na denição verbal, mas na sua capacidade de uso do conteúdo como me-
diador na explicação de novos objetos e fenômenos da realidade objetiva.
3. Avaliação 3a) Inclusão de novos problemas de aprendizagem ao nal do
processo de estudo para analisar se os alunos operam mental-
mente com o conceito (ação no plano mental ‒ uso do conceito
como mediador – generalização)
conSideraçõeS finaiS
Apesar de destacarmos alguns procedimentos de ensino, em for-
ma de etapas, consideramos que o fundamental ao professor é compreen-
der os princípios sobre os quais eles estão assentados e permitir identicar
neles um modo geral de organização do ensino, assim, o professor pode
ter autonomia para buscar e criar ações que são mais adequadas aos seus
objetivos. Não consideramos viável engessar a discussão sobre a prática
A Questão do Método e a Teoria Histórico-Cultural 95
pedagógica em procedimentos que devem ser rigorosamente seguidos pelo
professor, um ensino na perspectiva aqui apresentada requer que se esteja
aberto para lidar com a complexidade da atividade de ensino, com a singu-
laridade própria de cada turma, de cada contexto. Desse modo, a organi-
zação da atividade de ensino torna-se algo mobilizador do pensamento do
professor que, ativo mentalmente no planejamento e ação em sala de aula,
também se desenvolve.
A organização do ensino deve ser a expressão da dimensão cria-
dora do trabalho pedagógico, ela é construída pelo professor em atividade,
superando, pela incorporação, as técnicas formais de ensino já apresentadas
por várias vertentes pedagógicas. Nos procedimentos citados neste texto
estão implícitas abordagens metodológicas indutivas e dedutivas, técnicas
de ensino individuais (com tarefas dirigidas, estudo de textos, pesquisa bi-
bliográca, etc.), técnicas coletivas (aula expositiva e dialogada) e técnicas
de grupo (grupos de discussão e de exposição).
As técnicas entendidas como ferramentas de ensino não são ex-
pressão de uma tendência educacional ou outra, nem boas ou ruins em si,
a direção dada a essas ferramentas é o que as qualicam como próprias ou
impróprias para uma determinada perspectiva de formação. Tendo clara a
intencionalidade do ato educativo, o professor tem condições de saber o
contexto adequado para fazer bom uso delas.
referênciaS
AFONSO, A. J. Reforma do estado e políticas educacionais: entre a crise do estado-
nação e a emergência da regulação supranacional. Educação & Sociedade, Campinas,
v. 22, n. 75, p. 15-32, Agosto/2001. Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/es/
v22n75/22n75a03.pdf>.
CARVALHO, E. J. G. de. Reestruturação produtiva, reforma administrativa do Estado
e gestão da educação. Educação & Sociedade, Campinas, v. 30, n. 109, p. 1139-1166,
set./dez. 2009. Disponível em <http://www.scielo.br/pdf/es/v30n109/v30n109a11.
pdf>. Acesso em: 21 mai. 2015.
DAVÍDOV, V. V. La enseñanza escolar y el desarrollo psíquico: investigación teórica y
experimental. Moscú: Progreso, 1988.
DAVYDOV, V. V. Tipos de generalización en la enseñanza. 2a . Reimpresión. Ciudad de
La Havana: Editorial Pueblo y Educación, 1982
DAVYDOV, V. Problems of developmental Teaching: the experience of theoretical and
experimental psychological research. Soviet Education, v. 30, n. 8, Ago. 1988.
96 MENDONÇA, S. G. L.; PENITENTE, L. A. A.; MILLER, S. (Org.)
DELORS, J. (Org.). Educação: um tesouro a descobrir. Relatório para a UNESCO da
Comissão Internacional sobre Educação para o século XXI. Lisboa: Edições Asa, 1996.
GALPERIN, P. Y. La formación de los conceptos y las acciones mentales. In:
QUINTANAR, R. L. Las funciones psicológicas en el desarrolo del niño. México: Trillas,
2009. p. 80-90.
GALUCH, M. T. B; SFORNI, M. S. F. Interfaces entre políticas educacionais,
prática pedagógica e formação humana. Práxis Educativa, Ponta Grossa, v.6, n.1, p.
55-66 , jan.-jun. 2011. Disponível em: <http://www.revistas2.uepg.br/index.php/
praxiseducativa/article/view/1862/1999>. Acesso em: 27 nov. 2011.
ILIENKOV, E. V. La ascensión de lo abstracto a lo concreto en principios de la lógica
dialéctica. In: JIMÉNEZ, A. T. Teoría de la construcción del objeto de estudio. México:
Instituto Politécnico Nacional, 2006. p. 151-200.
KOPNIN, P. V. A dialética como lógica e teoria do conhecimento. Rio de Janeiro:
Civilização Brasileira, 1978. (Coleção Perspectivas do Homem, v. 123).
LEONTIEV, A. N. O Desenvolvimento do Psiquismo. Trad. Manuel D. Duarte Lisboa:
Horizonte Universitário, 1978.
LIBÂNEO, J. C. Politicas educacionais no Brasil: desguramento da escola e do
conhecimento escolar. Cadernos de Pesquisa (Fundação Carlos Chagas), v. 46, p.
38-62, 2016. Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/cp/v46n159/1980-5314-
cp-46-159-00038.pdf>. Acesso em: 15 jan. 2017.
MARX, K. O Capital: crítica da economia política. São Paulo: Nova Cultural, 1996.
(Coleção Os Economistas, Vol. I, Tomo I).
MEDEIROS, D. H.; SFORNI, M. S. F. (Im)possibilidades da organização do ensino:
desenvolvimento do pensamento teórico dos estudantes. Curitiba: Appris Editora, 2016.
SFORNI, M. S. F. Interação entre didática e teoria histórico-cultural. Educação &
Realidade, Porto Alegre, v. 40, n. 2, p. 375-397, abr./jun. 2015a. <Disponível em:
http://seer.ufrgs.br/index.php/educacaoerealidade/article/view/45965/33402>.
SFORNI, M. S. F. A trajetória da Didática no Brasil e sua (des)articulação com a Teoria
Histórico-Cultural Revista HISTEDBR On-line, v. 15, n. 61, jul. 2015b. Disponível
em: <http://periodicos.sbu.unicamp.br/ojs/index.php/histedbr/article/view/8640516>.
Acesso em 02 out. 2015.
SFORNI, M. S. F.; GALUCH, M. T. B. Apropriação de instrumentos simbólicos:
implicações para o desenvolvimento humano. Educação, Porto Alegre, v. 32, n. 1, p. 79-
83, jan./abr. 2009. Disponível em: <http://revistaseletronicas.pucrs.br/ojs/index.php/
faced/article/viewFile/5140/3776>.
SHIROMA, E. O.; MORAES, M. C.; EVANGELISTA, O. Política Educacional. 4 ed.
Rio de Janeiro: DP&A, 2002.
VYGOTSKI, L. S. Obras escogidas. Madrid: Visor Distribuiciones, 1982. Tomo II.
a alfabetização na educação infantil à
luz da Pedagogia hiStórico-crítica
Ana Carolina Galvão Marsiglia
Hadassa da Costa Santiago Bremenkamp
introdução
Mediante o desenvolvimento cultural dos indivíduos, conforme
suas formas de organização social foram se aprimorando, tornou-se ne-
cessário criar um sistema que facilitasse a comunicação, bem como, de-
senvolver um recurso auxiliar de memória. Esse recurso foi a escrita, que
estabeleceu o marco que separou o ser humano da pré-história e abriu as
portas para a civilização. Ela se congura como um instrumento cultural
que foi se sosticando na medida em que a história do ser humano foi se
desenvolvendo até alcançar o sistema alfabético que conhecemos. Hoje,
com alguns anos de vida, precisamos nos apropriar de um sistema que
levou séculos para se constituir.
Como sistema cultural, ele necessita ser transmitido para ser
apropriado, sendo decisivo no desenvolvimento do psiquismo (como for-
ma de linguagem). O psiquismo desenvolvido é conquistado socialmente e
avança em sua complexicação na medida das apropriações realizadas, sen-
do o sistema de escrita alfabética uma delas, que possibilitará a abstração
do pensamento, o qual promoverá um salto qualitativo em cada indivíduo,
como parte do gênero humano, sendo um ato dependente das condições
de humanização dos indivíduos nas quais lhe são disponibilizados os signi-
cados culturalmente construídos pela humanidade (MARTINS, 2013).
Todavia, percebemos que a apropriação desse sistema fundamen-
tal para o desenvolvimento dos indivíduos não tem alcançado a todos de
https://doi.org/10.36311/2017.978-85-7983-879-8.p97-112
98 MENDONÇA, S. G. L.; PENITENTE, L. A. A.; MILLER, S. (Org.)
forma plena. Mesmo em meio a tantos métodos desenvolvidos e aplicados
ao longo da história, a alfabetização ainda continua a ser um problema.
A Avaliação Nacional de Alfabetização (ANA), organizada pelo Instituto
Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP), tem
como objetivo avaliar em larga escala o nível de alfabetização e letramen-
to
10
dos estudantes ao nal do 3º. ano do ensino fundamental, em escolas
rurais e urbanas.
Segundo os resultados da ANA de 2014
11
, a maior porcentagem
da avaliação da leitura concentra-se nos níveis 2 (33,96%) e 3 (32,63%).
Já na escrita, esse resultado é maior no nível 4 (55,66%). Ou seja, a maio-
ria dos estudantes alcançaram níveis de aprendizado da leitura e escrita
que são considerados bons. Todavia, não podemos deixar de observar que
a porcentagem de alunos que alcançaram os maiores níveis estabelecidos
na avaliação (nível 4 em leitura e 5 em escrita), ocupam apenas cerca de
10% dos avaliados (respectivamente, 11,2% e 9,88%). Enquanto isso, o
número de estudantes que possuem os piores resultados é compatível ou
até maior do que aqueles que alcançaram os maiores níveis, como podemos
observar na avaliação de leitura: enquanto 11,2% dos alunos alcançaram
o maior nível, 22,21% concluem o 3º. ano do ensino fundamental com a
formação mais rudimentar do aprendizado da leitura.
Sabemos que a alfabetização é de suma importância no processo
de humanização e que os resultados alcançados pelos estudantes na ANA
são passíveis de questionamentos (o que é “bom” nesses parâmetros?). As-
sim, defendemos que a alfabetização só é possível de ser alcançada de forma
adequada quando há o ensino intencional, que deve acontecer em todas as
etapas da educação, garantindo uma sequência de aprendizagens essenciais
para a apropriação do conhecimento da língua escrita.
Partindo deste princípio, focamos nosso estudo no grupo 6 da edu-
cação infantil, último ano desta etapa da educação básica, entendendo que os
esforços dos prossionais estão mais intensos nesse momento para o alcance
do objetivo de alfabetizar, por se tratar do último período que antecede àquele
em que formalmente há obrigatoriedade de iniciar o processo de alfabetização.
10
Concordamos com Gontijo (2005) sobre a concepção da alfabetização como prática sociocultural que abrange
não apenas a aquisição do sistema convencional de escrita, mas também o âmbito social e os sentidos que a
língua possui, sendo desnecessário o uso do termo “letramento”.
11
Conra os resultados completos em INEP, 2015.
A Questão do Método e a Teoria Histórico-Cultural 99
Tomando a pedagogia histórico-crítica como base teórica, por
meio de um estudo bibliográco, buscamos compreender a prática peda-
gógica adequada para o desenvolvimento da compreensão do sistema alfa-
bético na educação infantil. Para tomar contato com essa prática, zemos
uma análise documental a partir das atividades do caderno de um aluno do
grupo 6 da educação infantil, que apresentaremos adiante.
Embora concordemos que não há a obrigatoriedade (e possibili-
dade) de as crianças da educação infantil concluírem esta etapa já plena-
mente alfabetizadas, defendemos que o professor da educação infantil deve
desenvolver um trabalho que assuma o compromisso de propiciar às crian-
ças as condições de apropriação cultural, indispensável para sua instituição
como parte do gênero humano, sendo a apropriação do sistema de escrita
alfabética, fundamental.
Compreendendo que os seres humanos se humanizam de forma
cultural, as crianças necessitam da mediação de signos para se apropriar da
realidade. Nesse sentido, a escola tem papel fundamental na intencionali-
dade da transmissão da cultura. Assim, temos acordo com Saviani (2011,
p. 13) sobre a função da escola, ao destacar a educação como um trabalho
não-material que se refere ao “[...] ato de produzir, direta e intencional-
mente, em cada indivíduo singular, a humanidade que é produzida históri-
ca e coletivamente pelo conjunto dos homens”. Dessa forma, a escola deve
cumprir com essa função, sendo a instituição legitimada pela sociedade
para ser responsável pelo ensino sistematizado, devendo preocupar-se em
transmitir o acúmulo histórico-cultural aos seus alunos, de modo a possi-
bilitar a inserção dos indivíduos na história de maneira criativa, autônoma
e transformadora.
comPreendendo a alfabetização na educação infantil
A leitura e a escrita precisam ser apropriadas por todos os indi-
víduos, colaborando no desenvolvimento do psiquismo humano. Tendo
em vista a importância deste processo, nos baseamos nos estudo de Luria
(2010) para entendermos como ele se realiza na apropriação do sistema de
escrita alfabética em cada indivíduo singular.
100 MENDONÇA, S. G. L.; PENITENTE, L. A. A.; MILLER, S. (Org.)
A primeira fase da escrita apontada pelo autor é a pré-escrita ou
pré-instrumental, que se inicia por volta dos três anos de idade
12
. Nessa
fase do desenvolvimento, a escrita é somente um brinquedo e, portanto,
suas funções se limitam puramente ao viés externo, em uma tentativa de
imitar o adulto, não entendendo ainda sua função como um instrumento
auxiliar de memória. Pelo contrário:
Seu comportamento é o de alguém que relembra, não o de alguém
que lê. A maior parte das crianças que estudamos reproduziu sentenças
ditadas (ou, mais precisamente, algumas delas) sem olhar para o que
tinham escrito, xando interrogativamente o teto. Todo o processo de
recordação ocorria de forma completamente apartada dos rabiscos, que
não eram, de forma alguma, usados pela criança (LURIA, 2010, p.
156).
O estágio seguinte é denominado pelo autor como atividade grá-
ca diferenciada, presente por volta dos quatro a cinco anos, que se ini-
cia como atividade gráca indiferenciada, na qual a escrita aparentemente
continua não fazendo sentido nenhum, mas a criança consegue estabelecer
relação com o que foi dito e assim, se torna um recurso para a memória.
Todavia, os rabiscos registrados no papel não são instituídos, por isso nem
sempre signicarão o mesmo conteúdo. Assim, a criança entende que o
que escreveu signica algo, mas nem sempre se recorda exatamente do
que lhe foi dito anteriormente, apesar de dizer alguma coisa em resposta,
porque sabe que o que escreveu representa algo, fazendo isso conforme os
seus interesses emocionais. Dessa forma, a criança nem sempre recordará
o conteúdo correto, mas irá reetir algum conteúdo e “Em vez de um ato
instrumental que usa X para reverter a atenção de volta para A, temos aqui
dois atos diretos: 1) a marca no papel e 2) a resposta à marca como uma
sugestão”, conforme esquema apresentado por Luria (2010, p. 160):
(conteúdo dado) A X
X N (Associação recordada)
(marca primitiva)
Figura 1
Fonte: Luria (2010)
12
Toda idade é apenas um indicativo, posto que as conquistas almejadas só são possíveis diante das condições
de vida e educação dos sujeitos (MARTINS, 2013).
A Questão do Método e a Teoria Histórico-Cultural 101
Torna-se necessário que haja um avanço desse signo-primário,
criado pela criança como uma sugestão de que aqueles registros represen-
tam algo, para o signo-símbolo, no qual é possível a representação real do
que lhe foi dito, contribuindo para o desenvolvimento da escrita enquanto
recurso mnemônico. Esse avanço necessário para a superação da escrita
não-diferenciada para a atividade gráca diferenciada se dá, conforme os
experimentos de Luria (2010) por meio da inclusão do conhecimento de:
cor, forma, tamanho, quantidade e outros diferenciadores que ela vai utili-
zar na linguagem escrita.
Por volta de cinco a seis anos, considerando que o desenho é o
melhor recurso que a criança tem disponível nesta etapa do seu desenvol-
vimento, temos a escrita pictográca. O desenho se expressa de forma cada
vez mais elaborada, sendo utilizado como uma forma de registro mne-
mônico, mas ainda sem que esteja associado a um expediente auxiliar de
escrita (isso nos chama atenção para a necessidade de dirigir o desenho da
criança).
A partir do avanço que a criança alcança quando consegue utili-
zar seus desenhos como recurso mnemônico, deve-se propor o desao no
qual ela necessitará registrar algo consideravelmente difícil ou até mesmo
impossível por meio de uma simples gura. A partir de então, a criança
desenvolverá formas de superação, levando-a à consolidação da escrita sim-
bólica.
Um dos caminhos para estabelecer essa superação, segundo os
experimentos de Luria, é a representação de alguma parte do todo que
auxilie a criança na recordação do que registrou, como é o caso de uma
criança que ao registrar o termo “Há 1000 estrelas no céu”, desenha uma
linha horizontal representando o céu e armando que não pode desenhar
1000 estrelas, desenha um avião. O outro caminho que se aproxima mais
da escrita simbólica é a representação do item que apresenta diculdades
em seu registro por signos que a auxiliarão na lembrança do que ele real-
mente representa. Isso pode ser visto quando é dado o mesmo termo para
outra criança e esta representa as 1000 estrelas pelo desenho de apenas
duas, armando que por meio das duas estrelas desenhadas, lembrará que
estas se referem a 1000. Dessa forma,
102 MENDONÇA, S. G. L.; PENITENTE, L. A. A.; MILLER, S. (Org.)
Um grau considerável de desenvolvimento intelectual e de abstração é
necessário para que a criança seja capaz de retratar todo um grupo por
uma ou duas características. Uma criança capaz de agir assim já está no
limite da escrita simbólica (LURIA, 2010, p. 179).
Todavia, constata-se que neste momento, apesar de entender
que os signos que lhe foram ensinados podem representar qualquer coi-
sa, a criança ainda não sabe estabelecer a relação entre o conteúdo, a
fonética e graa. Em seus experimentos, Luria (2010) nos revela que ao
alcançar a escrita simbólica, a criança volta a passar por todos os proces-
sos anteriores. O retorno ao sistema de signos ocorre quando o sistema
pictográco se torna insuciente com a inserção de elementos abstratos
nas sentenças ditadas, induzindo à criação de um signo que represente
o termo impossível de ser representado por meio do desenho. Somente
aí o sistema alfabético ganha sentido como o instrumento completo que
apresenta a solução para os desaos que foram colocados para a criança
até este momento.
A partir dessa breve exposição acerca dos estágios de desenvolvi-
mento da escrita propostos por Luria (2010), ca claro que este desenvol-
vimento acontece antes do 1º. ano do ensino fundamental, considerado
responsável por iniciar e dar um salto na alfabetização da criança. Assim,
é importante ressaltar que a educação infantil pode e deve iniciar este pro-
cesso, pois
[...] embora saibamos que cabe à primeira série escolar iniciar formal-
mente a alfabetização das crianças, é impossível que este tema não es-
teja presente no cotidiano infantil, seja em quaisquer circunstâncias,
e com muito mais ênfase no interior das escolas de educação infantil
(STEMMER, 2010, p.131).
Diante dessa premissa, recorremos a Martins e Marsiglia (2015)
para indicação de ações adequadas para o desenvolvimento da escrita com
crianças de cinco e seis anos, idade que antecede o período formal de iní-
cio da alfabetização. A partir das ideias formuladas por Luria (2010), as
autoras elaboraram propostas de ações pedagógicas que colaboram para a
superação de cada estágio do desenvolvimento, objetivando a apropriação
da leitura e da escrita.
A Questão do Método e a Teoria Histórico-Cultural 103
Em função da análise do caderno que faremos a seguir, concentra-
remos nossa discussão nas proposições das autoras para a escrita pictográ-
ca e sua transição à escrita simbólica. Conforme já exposto, em condições
típicas de desenvolvimento, com as intervenções necessárias, as crianças do
grupo 6 da educação infantil apresentarão características da fase pictográ-
ca, isto é, serão capazes de recorrer ao registro por meio do desenho como
instrumento auxiliador de memória. Portanto, segundo Martins e Marsi-
glia (2015) a prática pedagógica deve agir com o intuito de oferecer aos
alunos situações em que estes farão desenhos de forma dirigida para assim
ser possível às crianças estabelecerem representações. Para tanto, um pro-
cedimento importante pode ser solicitar aos alunos que registrem substan-
tivos abstratos, verbos e adjetivos tornando o desenho algo limitado para
registrar tudo aquilo que o aluno pretende. Ao mesmo tempo, o professor
deve apresentar às crianças a escrita, como sistema cultural complexo, que
lhes permitirá registrar qualquer conteúdo.
Isto porque a criança já conhece as primeiras letras e números e deve
ser apresentada formalmente ao alfabeto levando em conta a relação
entre grafemas e fonemas. De posse dos instrumentos culturais e da
compreensão de que é preciso ampliar seu repertório de escrita (relação
interpsíquica), o aluno passa, com auxílio (área de desenvolvimento
iminente), a desenvolver operações que lhe assegurem a internalização
do sistema de escrita (relação intrapsíquica) tornando-o desenvolvi-
mento efetivo (MARTINS; MARSIGLIA, 2015, p. 57).
Para consolidar a internalização desse sistema, as autoras desta-
cam a necessidade do ensino das relações entre fonemas e grafemas, su-
gerem a produção de textos coletivos e a apresentação de diversos gêneros
para que assim seja possível, no âmbito interpsíquico, algo que ainda não
é possível os alunos fazerem no âmbito intrapsíquico, pois ainda não se
apropriaram desse complexo conteúdo.
O professor pode fazer a leitura do alfabeto, ensinando o som que
cada letra possui, associando estes sons a outros elementos como recurso
de memória. Além disso, é importante que as crianças representem graca-
mente as letras no caderno, pois fazer isso de forma recorrente contribuirá
para a automatização tanto da graa quanto dos seus sons corresponden-
tes. Esse conceito de automatização é importante para o aprendizado da
leitura e escrita, pois segundo Saviani (2011, p. 18):
104 MENDONÇA, S. G. L.; PENITENTE, L. A. A.; MILLER, S. (Org.)
Também aqui é preciso xar certos automatismos, incorporá-los, isto
é, torná-los parte de nosso corpo, de nosso organismo, integrá-los em
nosso próprio ser. Dominadas as formas básicas, a leitura e a escrita
podem uir com segurança e desenvoltura. À medida que se vai liber-
tando dos aspectos mecânicos, o alfabetizando pode, progressivamen-
te, ir concentrando cada vez mais sua atenção no conteúdo, isto é, no
signicado daquilo que é lido ou escrito.
Outras ações propostas são frases, cartas e músicas enigmáticas,
pois, por meio delas, o aluno vai adquirindo a capacidade de ler com o
auxílio do desenho, bem como precisará realizar a tarefa de substituí-lo
pela palavra escrita. As autoras também sugerem como recursos, jogos e
brincadeiras, fundamentais para esse período do desenvolvimento, pois
A brincadeira é fonte do desenvolvimento e cria a zona de desenvolvi-
mento iminente. A ação num campo imaginário, numa situação ima-
ginária, a criação de uma intenção voluntária, a formação de um plano
de vida, de motivos volitivos − tudo isso surge na brincadeira, colocan-
do-a num nível superior de desenvolvimento [...] (VIGOTSKI, 2008,
p. 35).
A partir das ações pedagógicas propostas (entre tantas outras pos-
síveis), estarão disponibilizadas às crianças os conhecimentos do sistema
alfabético e a compreensão do seu uso social possível de expressar qualquer
conteúdo, tanto para registro quanto para a comunicação. Com base nes-
ses apontamentos teóricos, passamos à apresentação de uma prática peda-
gógica alfabetizadora, tomando como objeto o caderno de um aluno do
grupo 6 da educação infantil.
análiSe de uma Prática na educação infantil
Tendo em vista o referencial teórico deste trabalho, entendendo
a leitura e a escrita como um instrumento social complexo que pode ter
seu ensino iniciado desde os primeiros anos de vida passando pelas diversas
fases como proposto por Luria (2010), analisaremos como esse processo se
revela nas atividades pedagógicas propostas às crianças da educação infantil
de uma cidade de grande porte do Estado do Espírito Santo.
Buscamos, por meio das ações propostas pela professora do grupo
A Questão do Método e a Teoria Histórico-Cultural 105
6, a partir do caderno de um de seus alunos
13
, identicar de que forma as
ações desenvolvidas nesta turma de um Centro Municipal de Educação
Infantil contribuem para desenvolver as bases necessárias para apropriação
da linguagem escrita.
Analisando o caderno do aluno até o mês de junho de 2014,
observamos diversas ações referentes ao conhecimento das letras, questões
envolvendo matemática, além da produção de desenhos.
Conforme já assinalamos, segundo os experimentos de Luria
(2010), as crianças estão na fase do desenvolvimento da escrita pictográ-
ca e correspondem psicologicamente ao descrito para esta etapa, ou seja,
utilizam o desenho como auxílio para a memória. Assim, o professor deve
atuar para a sua superação inserindo elementos que dicultem o registro
por meio de desenho, obrigando que recorram ao sistema alfabético, en-
tendendo-o como um sistema cultural que possibilita ao ser humano o re-
gistro de qualquer conteúdo. No entanto, ao procurarmos atividades peda-
gógicas que propiciam esse desenvolvimento entre aquelas planejadas pela
professora, encontramos somente três. Na primeira, era solicitado à criança
que registrasse o/a maior e menor menino e menina da turma (Figura 2
14
).
Figura 2
13
O caderno foi selecionado pela professora, que o considerou o mais avançado da turma.
14
Todas as imagens aqui utilizadas foram devidamente autorizadas pelo Termo de Consentimento Livre e Es-
clarecido.
106 MENDONÇA, S. G. L.; PENITENTE, L. A. A.; MILLER, S. (Org.)
Já na segunda proposta, as crianças deveriam realizar uma en-
trevista com algum outro colega sobre suas preferências, gostos e sonhos
futuros e logo depois, deviam registrar as respostas obtidas (Figura 3);
Figura 3
A terceira atividade pedagógica trazia a discussão acerca dos te-
mas “igualdade e liberdade” e era solicitado que as crianças elaborassem
um desenho que representassem cada termo (Figura 4):
Figura 4.
Fonte: Foto retirada pela pesquisadora do caderno analisado.
A Questão do Método e a Teoria Histórico-Cultural 107
Embora essas ações pedagógicas proponham, conforme mencio-
nado por Luria (2010), elementos de tamanho (atividade 1) e carregados
de signicados difíceis de expressar por meio de desenhos (atividades 2 e
3), observamos que não há diferenciação nos desenhos que lhes servisse
como auxílio para a memória. Na atividade 1 (gura 2), todas as crian-
ças foram desenhadas da mesma forma, não sendo possível identicar o/a
maior e menor menino e menina. Da mesma forma, as atividades seguintes
foram realizadas com o registro simples de representação de gura huma-
na, não sendo possível estabelecer, por meio do desenho, o que as ativida-
des propunham.
Outro fator que merece destaque é que de 56 atividades regis-
tradas no caderno, apesar de 14 delas estarem relacionadas a desenhos,
somente três estavam direcionadas para o que Luria (2010) nos propõe
acerca da inserção de elementos que exijam, na produção do desenho, o
uso de instrumentos que auxiliem na recordação do que foi registrado. E
mesmo nestas três, conforme demonstram as guras apresentadas, não foi
dado destaque a nenhuma característica solicitada (tamanho, substantivos
abstratos e substantivos etc.). Portanto, no caso da criança autora dos dese-
nhos, ainda não se superou o desenvolvimento pictográco.
Dessa forma, a questão que merece destaque não é o fato de as
crianças não conseguirem expressar gracamente o conteúdo dado. Não
se trata de considerá-las “culpadas” de atraso no desenvolvimento. O im-
portante é a compreensão desse processo, por parte do professor, de modo
a organizar o ensino para promover o desenvolvimento dos seus alunos.
Destarte, entendemos que a professora deveria direcionar as atividades
para possibilitar às crianças o desenvolvimento de registros que contem-
plassem as características do conteúdo solicitado. Todavia, não há uma
continuidade pedagógica para que isso fosse trabalhado (pelo menos não
houve registro no caderno de atividades que possibilitassem avanços nessas
questões).
É preciso sublinhar que não responsabilizamos a professora em
questão, individualmente, pois entendemos que isso faz parte, por um
lado, da precarização da formação docente (qualidade e quantidade de
cursos de formação inicial/contínua) e por outro, por um discurso de
valorização da espontaneidade dos alunos, excluindo teorias que prezem
108 MENDONÇA, S. G. L.; PENITENTE, L. A. A.; MILLER, S. (Org.)
pelo ensino intencional e pela transmissão de conhecimentos, como
se elas não existissem, como se isso não fosse possível por meio de um
trabalho teórico-prático que se comprometa com a emancipação social dos
indivíduos. Conforme destaca Martins (2010, p. 20):
Um primeiro princípio que tem norteado a formação de professores, a
se colocar em tela [...], diz respeito ao descarte da teoria, da objetivida-
de e da racionalidade expresso na desqualicação dos conhecimentos
clássicos, universais, e em concepções negativas sobre o ato de ensinar.
Desta forma, ca claro que assim como são negados os conheci-
mentos necessários à formação dos alunos, também o são aos professores e
futuros professores, que acabam por acreditar e valorizar a supercialida-
de do conhecimento que emerge do cotidiano dentro das escolas. Assim,
muitos professores, sem ter clareza do que fazem, acabam contribuindo
para a perpetuação da sociedade de classes ao não oferecer uma educação
de qualidade aos lhos da classe trabalhadora, que necessitam do conhe-
cimento para superar a condição de exploração em que vivem, sendo esta
também a sua condição (formação aligeirada e supercial). De fato, é ne-
cessário que “[...] os trabalhadores da educação escolar compreendam que
ninguém objetiva aquilo que não lhe foi dado à apropriação” (DANGIÓ;
MARTINS, 2015, p. 219), pois somente assim será possível superar os
resultados da alfabetização no Brasil em que a maioria da população não
alcança os maiores níveis de aprendizado da leitura e escrita.
conSideraçõeS finaiS
Pretendemos com este estudo realizar breves aproximações de
identicação das práticas pedagógicas necessárias para apropriação da alfa-
betização na educação infantil, que mesmo nas pesquisas de avaliação em
larga escala mostram que o ensino da leitura e da escrita não tem alcançado
a maioria das crianças em suas formas mais elaboradas. Destarte, defende-
mos a possibilidade desse processo se iniciar na educação infantil, a partir
de uma teoria crítica da educação. Anal,
[...] a apropriação da escrita pela criança não se limita à aprendizagem
de sons, como simples soletração, mas deve ser compreendida como
um processo de aquisição de um complexo sistema de desenvolvimen-
A Questão do Método e a Teoria Histórico-Cultural 109
to das funções superiores advindo do percurso histórico cultural da
criança. Há de se levar em conta que esse percurso tem início na pró-
pria necessidade natural de expressão e comunicação da criança [...]
(DANGIÓ; MARTINS, 2015, p. 212).
Por isso mesmo, as autoras argumentam que
[...] criar a necessidade de escrever deve ser uma preocupação didática
do professor atento ao ensino que produz desenvolvimento, levando-se
em conta as múltiplas relações da criança com a escrita, especialmente
com a literatura (DANGIÓ; MARTINS, 2015, p. 213).
Dessa forma, é interessante que os professores proponham ati-
vidades em que os alunos aprendam a linguagem escrita cumprindo seu
papel social e não de forma meramente mecânica. Precisamos propor
atividades na educação infantil que envolvam situações de comunicação
que, devido a sua complexidade, necessitarão de recursos que vão além das
possibilidades dos desenhos, garantindo a superação desse registro para
a utilização do sistema alfabético. Com base nos apontamentos de Luria
(2010) e Martins e Marsiglia (2015) inferimos a necessidade de valorizar-
mos os desenhos das crianças, mas ao mesmo tempo, mostrá-las que esse
é um recurso limitado e insuciente para comunicação social em situações
mais complexas. Isso pode ser feito por meio de diversas ações e atividades,
inclusive por meio de jogos e brincadeiras, importantes nesse período de
formação. Porém,
Quando observamos que os estudantes não estão dominando a lin-
guagem escrita, como sistema simbólico presente na cultura em que
estão inseridos; quando percebemos que há uma grande distância entre
o conhecimento conquistado pela humanidade e o apropriado pelos
sujeitos, reconhecemos que a educação escolar não está sendo capaz
de produzir em cada indivíduo singular, a humanidade produzida pelo
conjunto dos homens. Enm, a escolarização não está contribuindo
para a constituição do indivíduo como gênero humano, já que não
consegue lhe assegurar a efetiva condição de atuar, criar e intervir na
sociedade da qual faz e, ao mesmo tempo, não faz parte, já que dela não
participa como sujeito, por estar privado dos instrumentos simbólicos
elaborados e utilizados pelo conjunto dos homens (SFORNI, GALU-
CH, 2009, p. 82).
110 MENDONÇA, S. G. L.; PENITENTE, L. A. A.; MILLER, S. (Org.)
Dessa forma, entendemos que precisamos de uma educação que
vá ao encontro das necessidades de cada indivíduo. Apesar de termos cla-
reza do papel que a educação infantil tem no processo da compreensão
do sistema da escrita pelas crianças, concluímos que há muito ainda a ser
conquistado e que isso nos revela a importância de uma sólida formação
inicial/contínua de professores para que possam assumir essa responsabili-
dade. Longe de corroborar ideias que culpam o professor, nosso intento é
destacar que as práticas espontaneístas revelam formação docente pautada
por ideários pedagógicos que as privilegiam e assim empobrecem a forma-
ção tanto de professores, quanto de alunos. Devemos, pois, buscar funda-
mentação teórico-prática que de fato subsidie a alfabetização das crianças
de forma completa, ampliada e enriquecida, como propõe a pedagogia
histórico-crítica.
referênciaS
DANGIÓ, M. S.; MARTINS, L. M. A concepção histórico-cultural de alfabetização.
Germinal: Marxismo e educação em debate, Salvador, v. 7, n. 1, p. 210-220, jun. 2015.
Disponível em: <http://www.portalseer.ufba.br/index.php/revistagerminal/article/
view/13214/9533>. Acesso em 04 dez. 2015.
GONTIJO, C. M. M. Alfabetização e a questão do letramento. Cadernos de Pesquisa em
Educação, Vitória/ES, v. 11, n. 22, p. 42-69, jan./jun. 2005.
INEP. Avaliação Nacional da Alfabetização 2014. Instituto Nacional de Estudos
e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira. Ministério da Educação. Brasília,
2015. Disponível em: <http://portal.mec.gov.br/index.php?option=com_
docman&view=download&alias=21091-apresentacao-ana-15-pdf&Itemid=30192>.
Acesso em 26 out. 2015.
LURIA, A. R. O desenvolvimento da escrita na criança. In: VIGOTSKII, L. S.; LURIA,
A. R.; LEONTIEV, A. N. Linguagem, desenvolvimento e aprendizagem. 11. ed. São
Paulo: Ícone, 2010. p. 143-189.
MARTINS, L. M. O desenvolvimento do psiquismo e a educação escolar: contribuições
à luz da psicologia histórico-cultural e da pedagogia histórico-crítica. Campinas-SP:
Autores Associados, 2013.
MARTINS, L. M. O legado do século XX para a formação de professores.
In: DUARTE, N.; MARTINS, L. M. (Org.) Formação de professores: limites
contemporâneos e alternativas necessárias. São Paulo: Cultura Acadêmica, 2010. p. 13-
31.
A Questão do Método e a Teoria Histórico-Cultural 111
MARTINS, L. M.; MARSIGLIA, A. C. G. As perspectivas construtivista e histórico-crítica
sobre o desenvolvimento da escrita. Campinas-SP: Autores Associados, 2015.
SAVIANI, D. Pedagogia histórico-crítica: primeiras aproximações. 11. ed. rev. Campinas,
SP: Autores Associados, 2011.
SFORNI, M. S. F.; GALUCH, M. T. B. Apropriação de instrumentos simbólicos:
implicações para o desenvolvimento humano. Educação, Porto Alegre, v. 32, n. 1, p. 79-
83, jan./abr. 2009. Disponível em: <http://revistaseletronicas.pucrs.br/ojs/index.php/
faced/article/viewFile/5140/3776>. Acesso em 04 dez. 2015.
STEMMER, M. A educação infantil e a alfabetização. In: ARCE, A; MARTINS, L. M.
(Org.) Quem tem medo de ensinar na educação infantil? Em defesa do ato de ensinar. 2
ed. Campinas, SP: Editora Alínea, 2010. p.125-145.
VIGOTSKI, L. S. A brincadeira e o seu papel no desenvolvimento psíquico da criança.
Revista Virtual GIS. n. 8, abr/2007 (publicada em junho de 2008). UFRJ, 2008. p. 23-36.
Disponível em: http://www.ltds.ufrj.br/gis/anteriores/rvgis11.pdf. Acesso em 04/12/15.
trabalho Pedagógico na educação infantil:
em buSca da atitude ativa de ProfeSSoreS
e criançaS
15
Elieuza Aparecida de Lima
introdução
[...] o ensino da criança corretamente organizado [...] conduz atrás de
si o desenvolvimento mental infantil e desperta à vida uma série de
processos de desenvolvimento que sem o ensino seriam, em geral, im-
possíveis. O ensino é, por conseguinte, o aspecto internamente necessário
e universal no processo de desenvolvimento, na criança, não das peculia-
ridades naturais, mas históricas do homem. (DAVÍDOV, 1988, p. 55,
grifos do autor, tradução nossa).
Os ensinamentos de Davídov (1988) impulsionam reexões so-
bre a função do ensino especialmente voltado às mais ricas e elaboradas
escolhas para o êxito do trabalho pedagógico realizado em turmas de Edu-
cação Infantil, em busca da superação de práticas educativas pouco moti-
vadoras da atitude ativa do professor e das crianças no cenário escolar, o
que prejudica possibilidades de aprendizagem de capacidades psicológicas
humanizadoras na infância.
Um retrato do dia a dia do trabalho pedagógico em turmas de
crianças pequenas evidencia como ainda são comuns concepções e prá-
ticas educativas em que a tarefa do professor se resume aos cuidados de
alimentação, higiene e sono e à preservação da integridade física dos bebês
15
Agradecimento especial às companheiras de estudos e sonhos, Amanda Valiengo, Juliana Guimarães Marce-
lino Akuri e Mariana Sampaio, primeiras leitoras deste texto.
https://doi.org/10.36311/2017.978-85-7983-879-8.p113-132
114 MENDONÇA, S. G. L.; PENITENTE, L. A. A.; MILLER, S. (Org.)
menores de três anos de idade (PRIETO, 2016). É inquestionável que
esses cuidados sejam vitais à sobrevivência da criança. Como aprendemos
com autores tais como Mukhina (1995) e Vygotski (1995), embora sejam
essenciais, esses cuidados não são sucientes para que a criança se desen-
volva como um ser humano capaz de pensar, sentir e agir de modo cada
vez mais sosticado.
O lme “O começo da vida” (O COMEÇO, 2016) inspira-nos
para a continuidade das argumentações anteriores. Em suas diversas cenas,
é possível perceber relações de adultos e crianças, e entre as crianças, que
conrmam a tese defendida há um século por pesquisadores soviéticos tais
como Vigotski, Luria e Leontiev (1988): ao se relacionar com o mundo
de pessoas e objetos, a criança, assumindo um papel ativo e participante,
se apropria de conhecimentos em vivências fortalecidas pelo afeto, tor-
nando-se cada vez mais um partícipe do gênero humano, por meio de
aprendizagens de capacidades psicológicas que a humanizam. Esse proces-
so de humanização caracteriza-se, por exemplo, pela apropriação, em ní-
veis superiores, de modos de pensamento, linguagem, percepção, atenção,
memória, emoção, que se diferenciam qualitativamente daquelas primeiras
e involuntárias formas tão próprias dos primeiríssimos meses de vida.
Por meio da educação, nos anos iniciais da vida, surgem capa-
cidades psicológicas novas e qualitativamente superiores, ao lado de mu-
danças quantitativas de peso, tamanho do cérebro e estatura, tão visíveis,
intensas e velozes nas crianças pequenas.
Ainda no círculo familiar, quando os pais ou algum outro adul-
to alimenta e conversa com o bebê, ele se comunica agitando braços e
pernas, expressando os primeiros sorrisos. Quando está com fome ou
está com a fralda suja, manifesta seu incômodo por meio do choro, gritos
e balbucios. Em situações educativas potencialmente humanizadoras, em
atenção a essas e outras necessidades infantis, o adulto vem ao encontro
do bebê e o toma nos braços, olhando diretamente para ele, perguntando
se está com fome ou se fez xixi. Motivado pela comunicação direta do
adulto, o bebê responde com gestos, gritos e movimentos, expressando
uma comunicação sem palavras. Nesse processo, além de cuidar de sua
integridade física, o adulto estabelece relações sociais e de comunicação
com o bebê e vai criando nele necessidades novas e humanizadoras como
A Questão do Método e a Teoria Histórico-Cultural 115
falar, se movimentar, manipular objetos, dentre outras.
Nesse processo complexo e desaador, está o cerne do trabalho
pedagógico com crianças bem pequenas: inseri-las e torná-las participantes
de relações sociais, iniciadas no círculo familiar e ampliada para outros cír-
culos, dentre os quais a escola, espaço propício e basilar para impulsionar
intencional e conscientemente vivências capazes de elevar suas formas de
agir, sentir e pensar.
Sobre o papel vital da escola e, portanto, da educação escolar na
formação das marcas do humano nas pessoas, Vénguer e Vénguer (1993, p.
10-11, tradução nossa) esclarecem:
o verdadeiro papel do ensino e da educação se evidencia só se reco-
nhecemos que a experiência social é a fonte direta do desenvolvimento
psíquico. E precisamente o ensino e a educação são o meio fundamen-
tal para transmitir esta experiência à criança. É certo que os adultos,
de uma ou de outra forma, ensinam as crianças. Porém este ensino se
dá, em grande medida, de forma espontânea, não controlada, se baseia
em tradições já estabelecidas. A tarefa consiste em converter o ensino
espontâneo em consciente, orientado a um m capaz de exercer a má-
xima inuência sobre o desenvolvimento. (VÉNGUER; VÉNGUER,
1993, p. 10-11, tradução nossa).
Esse entendimento do valor da educação escolar e, nessa pers-
pectiva, do ensino como atividade docente intencionalmente dirigida à
humanização das crianças, mediante o oferecimento de condições de vida,
educação e atividade motivadoras da ativação e do aperfeiçoamento de
formas qualitativamente superiores das capacidades psicológicas, constitui-
-se, como nos esforçamos para apresentar neste texto, reexão necessária
para repensarmos o trabalho pedagógico na Educação Infantil, sua função
social e seu valor para as máximas e mais ricas revoluções na inteligência e
personalidade ao longo da infância.
A compreensão desse processo e das possibilidades de intervenção
docente deliberada exige amparo cientíco. Em nosso percurso de estu-
dos
16
, encontramo-nos e apropriamo-nos de pressupostos da Teoria His-
16
Esses estudos e pesquisas (DE MARCO, 2014; SCUDELER, 2015; AKURI, 2016; ARRUDA, 2016, PRIETO,
2016; SAMPAIO, 2016) constituem parte das discussões decorrentes do Programa de Estudos e Pesquisas “Especi-
cidades da Docência na Educação Infantil”, do Grupo de Estudos e Pesquisas sobre Especicidades da Docência
na Educação Infantil (GEPEDEI), da Unesp, Marília, SP. Coordenado pela Dr.ª Elieuza Aparecida de Lima.
116 MENDONÇA, S. G. L.; PENITENTE, L. A. A.; MILLER, S. (Org.)
tórico-Cultural como contribuições cientícas essenciais para o conheci-
mento desse processo de humanização da pessoa que, nascida num mundo
produzido historicamente, torna-se uma candidata à humanização. Essa
humanidade não é, como buscamos reetir, herdada biologicamente, por
resultar das aprendizagens conquistadas ao longo da vida mediante as rela-
ções, encontros e apropriações que cada sujeito tem condições de vivenciar.
Nas páginas deste texto, damos especial atenção ao momento da
vida denominado “infância”, por seu valor para todas as demais aprendi-
zagens humanas, numa fase em que a criança está aberta para conhecer o
mundo por meio de situações intencionalmente dirigidas para que ela se
aproprie de conhecimentos relativos às ciências, artes, linguagem, losoa.
A partir daqui, nosso objetivo é o exercício de reexão sobre o
papel e o valor da educação na formação e desenvolvimento daquilo que
nos diferencia dos demais animais e nos qualica como humanos, isto é,
nossos modos de pensar e agir orientados conscientemente, reveladores de
formas típicas de linguagem, memória, atenção, emoções, percepções. Essa
armativa fundamenta-se na máxima que “o homem não nasce humano
porque se humaniza no seio das relações sociais estabelecidas com pessoas
e objetos historicamente produzidos em situações de atividade (LEON-
TIEV, 1978), apropriando-se de capacidades típicas da nossa humanidade.
Ao longo de nossa exposição, focamos nossa atenção em aspectos
do trabalho pedagógico com crianças pequenas que expressa a atividade
docente em busca da superação de discursos e práticas pouco potenciali-
zadoras de aprendizagem e desenvolvimento infantil, e de um movimento
dialético do pensar e do agir do professor, fundamentados nos direitos e
necessidades de conhecimento na infância. Para as discussões pretendidas,
fortalecemo-nos em uma polifonia de vozes de autores e pesquisadores
cujas bases cientícas alicerçam a dinâmica do pensar e do agir de pros-
sionais dedicados à infância, empenhados em planejar, gerir e avaliar pro-
postas pedagógicas motivadoras da formação, ativação e aperfeiçoamento
pleno das qualidades humanas em cada criança.
Com essa perspectiva, inicialmente, trazemos à reexão aspec-
tos orientadores da Educação Infantil como direito da criança pequena,
A Questão do Método e a Teoria Histórico-Cultural 117
conduzida por princípios legais e cientícos. Na tessitura deste capítulo,
pressupostos da Teoria Histórico-Cultural são base para pensarmos a dinâ-
mica e o movimento dialético de um trabalho pedagógico direcionado à
plenitude da educação da criança na infância, por meio do êxito do ensino
e das reais possibilidades de atividade e aprendizagem infantil.
a educação infantil como direito da criança à humanização
[...] quando os professores prestam atenção àquilo que a criança diz
e sabem abster-se de fornecer ajuda, então podem agir também em
termos de ‘desao’ e estimular a criança a progredir. Para realizar uma
ação incisiva, o professor deve agir dentro da ‘zona de desenvolvimen-
to proximal’, diz Malaguzzi, citando Vygotsky, [...]. Não se consegue
identicar esse nível se não se levar em consideração a criança ‘real’,
não a criança em sentido abstrato. ‘Não podemos inventar as crianças
para nós’. (RABITTI, 1999, p. 127).
Especialmente nos últimos séculos, a infância vem ganhando sig-
nicados e duração delineados por conquistas históricas e sociais. Uma
dessas denições refere-se à infância como momento único e especial da
vida, propício à humanização infantil, considerando-se que os aprendiza-
dos adquiridos nessa etapa formam bases para novos conhecimentos em
outros níveis da escolaridade (LIMA, 2005; AKURI, 2016; SAMPAIO,
2016).
Reconhecemos os anos iniciais da vida como tempo para viver
o aqui e o agora, com a perspectiva de apropriação de conhecimentos es-
senciais para que a criança se torne cada vez mais humana (DE MARCO,
2014; AKURI, 2016). Isso signica entender a educação dos pequenos de
até cinco, seis anos como processo em que a criança pode avançar signi-
cativa e qualitativamente em seu desenvolvimento cultural, ao se apropriar
de novas necessidades tipicamente humanas, essenciais para a formação e a
ativação de formas cada vez mais sosticadas de pensar e de agir.
A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei n.º
9.394/96) (BRASIL, 1996) traz a especicidade desse momento da educa-
ção, adjetivando-a como Educação Infantil e suprimindo expressões de leis
anteriores que se referiam a essa etapa da escolaridade como “educação pré-
118 MENDONÇA, S. G. L.; PENITENTE, L. A. A.; MILLER, S. (Org.)
-primária” ou “creche e pré-escola” (LIMA, 2005; PRIETO, 2016). Essa
denominação ganha contornos signicativos para todos os que militam em
favor de uma educação humanizadora de crianças menores de seis anos,
considerando o valor dos aprendizados na infância para o desenvolvimento
máximo da inteligência e da personalidade infantil.
Lá se vai mais de uma década que a Resolução nº. 3 de agosto
de 2005 (publicada no Diário Ocial da União de 08 de agosto de 2005,
seção I, p. 27) (BRASIL, 2005) promulgou “a antecipação da obrigato-
riedade de matrícula no Ensino Fundamental aos seis anos de idade” e
a organização do ensino fundamental para 9 (nove) anos”, o que dene
legalmente a antecipação da escolaridade formal e a diminuição da duração
da Educação Infantil. De acordo com a resolução, esta etapa da escolarida-
de é prevista até os 5 (cinco) anos de idade (LIMA, 2005; DE MARCO,
2014). Em defesa da plenitude da Educação Infantil e dos direitos sociais
das crianças pequenas, essa resolução marca um retrocesso no percurso
de conquistas sociais, historicamente acumuladas pela infância, no Brasil
(AKURI, 2016).
Do ponto de vista legal e cientíco, particularmente de pesquisas
e produções teóricas na área da educação (LIMA, 2005; ARRUDA, 2016;
AKURI, 2016; PRIETO, 2016; SAMPAIO, 2016), os primeiros anos
de vida caracterizam-se por especicidades do desenvolvimento humano
(SCUDELER, 2015; ARRUDA, 2016; PRIETO, 2016). Nestes anos, o
mundo se abre para a criança e seu interesse de conhecimento gira em tor-
no do mundo dos objetos e do mundo das pessoas. Vygotski (1995) e seus
colaboradores sinalizam três momentos que marcam a apropriação de no-
vos interesses de conhecimento pelas crianças pequenas e a atividade guia
responsável pelas principais transformações psíquicas em cada um desses
momentos (ARRUDA, 2016).
No primeiro ano de vida, a relação com as pessoas expressa o
modo de encontro e de ação da criança no mundo, mediante a comuni-
cação emocional do bebê com as pessoas que o circundam, fomentando
as principais e qualitativas mudanças em sua inteligência e personalidade
(PRIETO, 2016) e marcando o primeiro dos três momentos dessa perio-
dização do desenvolvimento psíquico ao longo dos seis primeiros anos de
vida.
A Questão do Método e a Teoria Histórico-Cultural 119
Para ilustrar essa argumentação, retomamos aspectos do lme “O
Começo da Vida” (O COMEÇO, 2015) denotativos dessa comunicação
sem palavras, que provoca saltos qualitativos no desenvolvimento do bebê:
enquanto a criança está aninhada no colo de seu pai, num ambiente em
que há quadros dispostos nas paredes, ela sorri ao ver um deles. A relação
com as artes, a natureza e com o outro (pessoa ou objeto da cultura) é dina-
mizada por quem educa e cuida da criança, provocando encontros com o
mundo material e imaterial e substanciando as aprendizagens sem as quais
o desenvolvimento humano não se efetiva em suas máximas possibilidades.
Mas, qual a importância dessa ilustração para o trabalho pedagó-
gico em turmas de bebês em escolas de Educação Infantil? Nesse momento
da vida, o ensino é orientado e pode ter êxito por meio das intervenções
diretas e intencionais do professor com o objetivo de, além de suprir suas
necessidades básicas de sobrevivência, ampliar qualitativa e signicativa-
mente o repertório cultural do bebê, tendo-o como interlocutor e sujeito
participante. Essa intervenção conscientemente dirigida requer, pois, um
olhar atento às possibilidades de ação pedagógica no primeiríssimo ano
que envolve iniciativas antecipadoras da fala, oferecimento de situações
em que a criança aprende a necessidade de, além de estar com as pessoas,
manipular objetos que a circundam. Está aí uma oportunidade propícia
para inseri-la em cenários em que a música, literatura e outras formas de
arte, natureza, pessoas (adultos e crianças de diferentes idades), alimentos,
espaços, objetos, etc. sejam acessíveis e enriqueçam seu processo de estar e
de agir no mundo.
Nesse convívio enriquecido pelos bens produzidos pelas gerações
humanas, a criança pequena vai aprendendo novas e sosticadas necessida-
des de conhecimento: assim, dos doze meses até por volta dos três anos, ela
dirige sua atenção e atividade para o mundo dos objetos, tendo o adulto
como fonte de conhecimento sobre eles. Essa relação objetal provoca novas
formações psicológicas essenciais para as revoluções no desenvolvimento
psíquico e delineia o início do segundo momento evidenciado por Vigo-
tski, Luria e Leontiev (1988) e outros pesquisadores russos. Vejam: isso sig-
nica que não é porque a criança passa a maior parte de seu tempo explo-
rando objetos que ela se desenvolve, mas porque a atividade manipulatória
com objetos exige e ativa formas superiores de pensamento, percepção,
120 MENDONÇA, S. G. L.; PENITENTE, L. A. A.; MILLER, S. (Org.)
atenção, memória, linguagem e essa ativação dá novos contornos e mo-
vimentos à dinâmica de sua personalidade e de sua inteligência (AKURI,
2016; PRIETO, 2016).
Um exemplo especial para ilustrar esse momento de encontros
com o mundo é ofertado no vídeo “Caminhando com Tim Tim” (CA-
MINHANDO, 2014). Nas imagens organizadas pelos pais de Valentim
(Tim Tim), o encontro com o mundo de pessoas e objetos é propiciado de
maneira respeitosa e humanizadora: o caminho até a casa da avó é escrito
pelos passos de um menino de um ano e quatro meses que aprende, a cada
instante, a escutar, ver, pensar, se relacionar. Nesses encontros possíveis, a
mãe Genifer é a educadora que oferece segurança para o caminhar, mas
não vive o caminho em lugar de Tim Tim, oportunizando um lugar social
privilegiado para que as marcas do caminho sejam apropriadas por ele.
Conforme a mãe enfatiza na película: “Valentim tem me ensinado sobre
os caminhos, caminhares e destinos, que o chegar não é mais valioso que a
andança [...]” (CAMINHANDO, 2014).
Questionamo-nos: quais os encontros oferecidos às crianças pe-
quenas, em Escolas de Educação Infantil, quando antecipamos, já aos dois
ou três anos, experiências próprias do Ensino Fundamental? Em lugar de
associar letras e guras, ou de colar bolinhas ou pedrinhas para memorizar
a sequência numérica, são possíveis outros encontros e vivências?
Em nossos estudos, apropriamo-nos de bases teóricas motivadoras
da premissa que o trabalho pedagógico com crianças pequenas potencializa
condições de pleno desenvolvimento infantil quando o exercício do olhar,
do pensar e do agir do professor é enriquecido teoricamente e subsidia
situações educativas em que meninos e meninas possam tecer encontros
no caminhar, manipulando e explorando objetos e riquezas do “Cesto de
Tesouros” e da “Brincadeira Heurística (MAJEM; ÒDENA, 2010); ouvin-
do histórias, poesias e músicas por meio de livros, CDs ou das “Caixas que
Contam Histórias” (LIMA; VALIENGO, 2011), brincando com os “po-
tes de encantos e aprendizagem” (CHAVES; JARDIM; GABRIEL, 2012),
por exemplo. Isto é, o trabalho do professor pode incidir positivamente em
condições de aprendizagem e desenvolvimento em processos nos quais o
ensino seja realmente a atividade docente dirigida ao êxito do processo de
humanização das crianças.
A Questão do Método e a Teoria Histórico-Cultural 121
Na perspectiva das metáforas do encontro e do caminhar e na
apropriação do conhecimento cientíco, ao longo dos três primeiros anos,
a criança pode se apropriar de interesses cada vez mais complexos e an-
seia, além de manipular os objetos da cultura, entender a relação que as
pessoas estabelecem com eles na sociedade e que caracteriza os papéis so-
ciais criados pela humanidade: nesse processo, nascem novas possibilidades
de conhecimento por meio da brincadeira de faz de conta ou do jogo de
papéis sociais (AKURI, 2016). Inicia-se, assim, o terceiro momento da
periodização do desenvolvimento infantil que compreende a denominada
idade pré-escolar (de três a seis anos), período em que a criança, almejando
realizar as mesmas ações dos adultos, mas não tendo condições para isso, se
expressa a partir do faz de conta.
Ao lado de cada atividade principal (norteadora das principais
mudanças no desenvolvimento da consciência infantil), estarão outras ati-
vidades também relevantes no processo de formação cultural na infância.
Com a defesa de que o trabalho pedagógico na Educação Infantil pode
dirigir intencionalmente seus objetivos para a garantia dos direitos sociais
da criança, vale enfatizar que uma das tarefas principais da Escola de Edu-
cação Infantil é a ampliação das necessidades de conhecimento e das for-
mas de expressão na infância, em lugar de priorizar algumas formas de
expressão em detrimento de outras, o que vem acontecendo de maneira
acentuada na sociedade contemporânea, por meio da antecipação da esco-
larização formal das crianças desde que são bem pequenas.
Para Davídov (1988), as atividades principais em momentos dis-
tintos do processo de humanização formam uma base orientadora de no-
vos aprendizados e, neste sentido, nos primeiros anos de vida, a atividade
lúdica impulsiona conquistas psíquicas necessárias para novos aprendiza-
dos a partir dos sete anos e, ao lado desses novos aprendizados, continua a
ser uma forma de expressão e de relação da criança com o mundo. O autor
nos ensina que:
[...] a autêntica atividade de trabalho se pode formar só sobre a base da
[atividade] lúdica e da [atividade] de estudo; esta unicamente sobre a
base da lúdica, porque o estudo está dirigido, em particular, à assimila-
ção de abstrações e generalizações que pressupõem a presença na criança
da imaginação e da função simbólica as quais se constituem, precisa-
mente, no jogo [de papéis sociais ou brincadeira de faz de conta][...].
122 MENDONÇA, S. G. L.; PENITENTE, L. A. A.; MILLER, S. (Org.)
Desta forma, sobre a base da atividade lúdica, na criança constitui-
-se uma série de neoformações psicológicas. Trata-se antes de tudo da
imaginação e da função simbólica da consciência, que lhe permitem
transferir em suas ações as propriedades de umas coisas por outras,
substituir um objeto por outro. Logo, na criança, surge a orientação
para o sentido geral e o caráter das relações humanas [...].
No geral, no nal da idade pré-escolar se forma na criança a aspiração
à atividade socialmente signicativa e socialmente valorizada, aspiração
que constitui a premissa fundamental [...] para a aprendizagem escolar.
(DAVÍDOV, 1988, p. 75; 81-82, tradução nossa).
Essas armativas de Davídov (1988) sintetizam aspectos do papel
e do valor do ensino na Educação Infantil. Depreendemos dessas assertivas
que o trabalho pedagógico dirigido à plenitude e ao êxito de aprendizagens
motivadoras de desenvolvimento infantil alicerça-se em conhecimentos
conquistados em atividades consideradas principais em cada momento da
vida, associadas a outras afetas à música, dança, literatura, ciências, comu-
nicação verbal, etc. Esse direcionamento consciente do professor à ativi-
dade educativa exige intencionalidade para atendimento às especicidades
dos aprendizados em cada momento da vida. Signica, portanto, conside-
rar o papel do ensino organizado na infância e da atividade lúdica como
norteadora de apropriações propulsoras de um amplo desenvolvimento das
crianças nos anos iniciais da vida.
em buSca da atuação ativa da criança e do ProfeSSor no trabalho
Pedagógico na educação infantil
No Brasil, ao longo das últimas décadas, estudos e pesquisas con-
rmam a premissa de que a educação ofertada em Escolas de Educação
Infantil pode se tornar possibilidade de garantia dos direitos fundamentais
da criança pequena e, também, exercício de um olhar atento à infância.
Esse olhar atento baseia-se, conforme Vigotski, Luria e Leontiev (1988),
na perspectiva da criança como ser ativo, que se desenvolve amplamente a
partir da sua própria atividade, mediante os relacionamentos humanos –
vivências possíveis nas relações entre adultos e crianças e entre as crianças
–, e os encontros com os objetos da cultura.
A Questão do Método e a Teoria Histórico-Cultural 123
A metáfora do encontro com o outro (pessoas e objetos) advém
da defesa de que as relações que cada pessoa estabelece com o mundo
são fonte do movimento dialético que faz avançar, em saltos qualitativos,
o desenvolvimento intelectual e da personalidade do sujeito. Trata-se de
processo essencial para que cada indivíduo se aproprie das qualidades hu-
manas incrustadas nos objetos sociais e nas relações humanas.
Enfatizamos, assim, a tese de que as aprendizagens efetivadas ao
longo da vida são molas propulsoras de desenvolvimento humano, por se
tornarem condições sem as quais as qualidades humanas não se formam
em cada criança, jovem ou adulto. No caso da Educação Infantil, conside-
rando o que a criança já sabe, o professor a ajuda nas tarefas que ela não
pode realizar sozinha, buscando incidir o novo conhecimento, na zona
de desenvolvimento próximo caracterizada pelo desenvolvimento que está
próximo de acontecer. Sob esse prisma, redimensiona-se a própria ideia do
que seja a criança: um sujeito capaz de se relacionar, interagir, se comu-
nicar, internalizar conhecimentos atribuindo sentido a eles, a partir das
relações sociais de que participa e do lugar que ocupa nessas relações. A
educação na infância pode, assim, deagrar o desenvolvimento cultural da
criança, ao romper os limites da natureza biológica, promovendo o proces-
so de formação da natureza social humana.
Para o êxito do trabalho pedagógico, qual o signicado dessas
considerações? Essencialmente, rearmamos a argumentação seguinte:
“[...] da explicação dos processos mentais depende a possibilidade de diri-
gir o desenvolvimento, de inuir de forma bem-pensada sobre seu curso
(VÉNGUER; VÉNGUER, 1993, p. 10, tradução nossa). Com essa com-
preensão, a organização intencional do ensino (conhecimentos, situações,
espaço, materiais, tempo) é condição indispensável para o êxito da educa-
ção na formação cultural humana, desde o nascimento da pessoa.
Pela propriedade e clareza de sua exposição, retomamos Vénguer
e Vénguer (1993, p. 12, tradução nossa):
É certo que o ensino é absolutamente indispensável para que a criança
avance no desenvolvimento mental. Porém não qualquer ensino. É
necessário saber com que sequência se deve introduzir a criança no
tesouro dos conhecimentos humanos e como fazê-lo. É necessário,
além disso, considerar as possibilidades da criança, seus interesses e
124 MENDONÇA, S. G. L.; PENITENTE, L. A. A.; MILLER, S. (Org.)
[necessidades], e recordar sempre que ela não só se prepara para a
vida futura, mas que está vivendo e que nossa tarefa é fazer essa vida
interessante e feliz.
Tudo isso leva à necessidade de organizar o ensino da criança [...] ba-
seando-se no estudo profundo das possibilidades e das características
do desenvolvimento infantil em cada grau evolutivo e na determinação
do lugar que este grau ocupa na “escala” geral da infância.
Segundo a expressão do destacado psicólogo soviético A. V. Zaporó-
zhets, a nalidade do ensino [...] [nesse momento da vida] não deve
ser a aceleração, mas a ampliação do desenvolvimento infantil: seu en-
riquecimento, o desdobramento máximo daquelas qualidades que são
especícas, precisamente, dessa idade.
A ampliação do desenvolvimento da criança implica a organiza-
ção conscientemente dirigida dos processos que o provocam e fundamen-
tam. Nessa organização, um dos elementos centrais é repensar o lugar que
a criança ocupa nas relações sociais e também o papel do professor nesse
processo.
Compreendida e tratada como sujeito capaz de fazer, de modo
independente ou com a parceria de um outro sujeito mais experiente, a
criança passa a ocupar um lugar ativo nas relações sociais, agindo no mun-
do de objetos e pessoas. Desse lugar participante no mundo, decorrem
aprendizagens de diferentes capacidades que tornam a criança cada vez
mais humana. Nas palavras de Lima (2005, p. 66),
A infância passa a ser assim um momento de vivências e aprendizagens
intencionalmente organizadas de modo a dar à criança possibilidades
de agir, pensar, vivenciar, se relacionar e, assim, constituir qualidades
especicamente humanas. Essa é a infância da criança e das suas pos-
sibilidades, da garantia dos seus direitos como sujeito historicamente
situado.
Por meio das suas vivências, a criança constitui sua autoestima,
sua autoimagem e formas de autoavaliar suas ações e atitudes perante ou-
tras pessoas, acumulando, neste processo, um conjunto de conhecimentos
e de qualidades humanas que a torna um indivíduo único e particular.
Isso signica que os traços de caráter, de temperamento, os interesses, as
aptidões individuais são amplamente desenvolvidos nos processos de inte-
A Questão do Método e a Teoria Histórico-Cultural 125
ração, de educação e de comunicação da criança com outras crianças e com
os adultos de seu entorno.
Para a educação das qualidades especicamente humanas em Es-
colas de Educação Infantil, o professor medeia o acesso da criança à cultura
acumulada, enriquecendo-o e sosticando-o. É nessa atividade socialmen-
te mediada que a criança atribui sentido aos bens culturais que passa a co-
nhecer. Ressaltamos, pois, que: “Ao falarmos de mediação pedagógica, do
ponto de vista da Psicologia Histórico-Cultural, falamos das intervenções
e ações que garantem às crianças o domínio dos meios externos do desenvolvi-
mento cultural” (MARCOLINO, 2013, p. 22, grifos da autora).
Para ampliação dessas assertivas, Mukhina (1995, p. 65-69, grifos
da autora) escreve:
A psicologia soviética da infância considera que as aptidões naturais
hereditárias revelam apenas uma certa disposição para uma ou outra
atividade, podendo criar condições mais ou menos favoráveis para de-
senvolver essa atividade. [No entanto,] as aptidões, assim como outras
qualidades psíquicas, formam-se no processo de vida, sob a inuência
da educação e do ensino.
Emerge dessas ideias um novo olhar sobre os relacionamentos hu-
manos (da criança com os adultos e outras crianças e delas com os objetos
da cultura) e a atividade de cada criança para a formação e desenvolvimen-
to daquelas características particularmente humanas, todas constituintes
da sua individualidade (LEONTIEV, 1978).
Pesquisas recentes raticam essa tese (SCUDELER, 2015;
AKURI, 2016; ARRUDA, 2016; PRIETO, 2016), argumentando que,
do ponto de vista da Teoria Histórico-Cultural, o trabalho com bebês e
crianças pequenas é complexo e desaador, constituindo como processo
social e histórico em busca da garantia dos direitos sociais da infância e
das possibilidades de humanização no ambiente escolar. Particularmente,
Arruda (2016, p. 68) pondera:
Ao longo de sua história, especialmente, com a produção cientíca
na área da Psicologia e da Educação nas últimas décadas, a Educação
Infantil vem constituindo uma identidade que articula o cuidar e o
educar como modos de formação humana nos anos iniciais da vida, re-
futando a premissa de que apenas o cuidado bastaria para a humaniza-
126 MENDONÇA, S. G. L.; PENITENTE, L. A. A.; MILLER, S. (Org.)
ção de crianças bem pequenas. Diferentes autores corroboram com essa
armação e sinalizam a indissociabilidade desses dois aspectos com-
ponentes de um currículo pleno para a educação coletiva na infância.
Em defesa de uma Educação Infantil potencialmente humani-
zadora, a indissociabilidade do cuidar e do educar é um dos elementos
fundamentais de um currículo vitalizador da participação ativa da criança
nas relações sociais possíveis no ambiente da escola da infância (AKURI,
2016; SAMPAIO, 2016). A atenção e a apropriação desse aspecto indis-
pensável do trabalho pedagógico requerem preparação teórica e prática,
cuja solidez, rigor e clareza fundamentam-se em estudos que amparam
nossas escolhas didático-pedagógicas.
Por meio das discussões tecidas neste capítulo, Davídov (1988, p.
54, tradução nossa) ampara a ideia condutora das reexões modestamen-
te articuladas até aqui, salientando que “[...] o desenvolvimento psíquico
[cultural] da criança começa e está mediatizado por sua educação e ensino”.
conSideraçõeS finaiS
[...] a pedagogia não deve orientar-se ao ontem, mas ao amanhã do de-
senvolvimento infantil. Só assim será possível, no processo de ensino,
despertar os processos de desenvolvimento que estão na zona de de-
senvolvimento próximo. (DAVÍDOV, 1988, p. 54-55, grifos do autor,
tradução nossa).
Ao longo das páginas precedentes, nosso esforço foi o de trazer à
reexão aprendizagens decorrentes de estudos e pesquisas da área da psico-
logia e da educação sob a ótica da Teoria Histórico-Cultural.
O exercício de discussão motivou-se pelos ensinamentos de au-
tores notáveis como Vigotski, Luria e Leontiev (1988), para os quais a
educação e o ensino não seguem o desenvolvimento, mas o precedem,
tornando-se sua força e motivação.
Essa força motivadora da educação e do ensino implica consciên-
cia e intencionalidade na condução de um trabalho pedagógico na Educa-
ção Infantil capaz de se congurar como possibilidade humanizadora, ao
fazer avançar a formação cultural da inteligência e personalidade infantil,
A Questão do Método e a Teoria Histórico-Cultural 127
dirigindo-se às máximas possibilidades de desenvolvimento da criança pe-
quena. Esse processo educativo baseia-se, portanto, no que a criança ainda
não é capaz de fazer sozinha, mas em colaboração com o outro e com sua
mediação.
Esse cenário educativo intencionalmente dirigido implica a inter-
venção mediadora do professor como prossional habilitado teórica e me-
todologicamente para o desao de conduzir conscientemente o caminho
e os encontros da criança com a cultura e, com isso, com as possibilidades
de aprendizagem e de desenvolvimento de sua inteligência e personalidade
em patamares sosticados.
Nossa argumentação encaminha-se, portanto, para reexões so-
bre processos e programas de formação docente em nível inicial e conti-
nuado, amparados cienticamente, com rigor e solidez, de maneira que o
ensino torne-se atividade docente dirigida ao êxito do trabalho pedagógico
potencializador das máximas possibilidades de humanização no começo
da vida.
referênciaS
AKURI, J. G. M. Currículo na Educação Infantil: implicações da Teoria Histórico-
Cultural. 2016. 117 f. Dissertação (Mestrado em Educação) – Universidade Estadual
Paulista, Faculdade de Filosoa e Ciências, Marília, SP, 2016.
ARRUDA, J. Especicidades da Docência na Infância: o foco no trabalho com bebês.
2016. 138 f. Dissertação (Mestrado em Educação) – Universidade Estadual Paulista,
Faculdade de Filosoa e Ciências, Marília, SP, 2016.
BRASIL, Lei 9.394, de 20.12.96, Estabelece as Diretrizes e Bases da Educação Nacional.
Diário Ocial da União, v. 84, n. 248, 23 dez. 1996.
______. Resolução n.º 3, de 03/08/05, Dene normas nacionais para a ampliação do
Ensino Fundamental para nove anos de duração. Diário Ocial da União, Seção I, p. 27,
03 ago. 2005.
CAMINHANDO com Tim Tim. Produção: Genifer Gerhardt. 2014. Disponível em
<https://www.youtube.com/ watch?v=1dYukOrq5RI>. Acesso em: 12 jan. 2017.
CHAVES, M.; JARDIM, M. C. O.; GABRIEL, M. A. X. Brincadeiras e aprendizagens
com os bebês. In: CHAVES, M.; LIMA, E. A.; FERRAREZE, S. (Org.). Teoria
Histórico-Cultural e formação de professores: estudos e intervenções pedagógicas
humanizadoras. Maringá: Programa Interdisciplinar de Estudos e Populações,
Laboratório de Arqueologia, Etnologia e Etno-história – UEM, 2012. p. 63-72.
128 MENDONÇA, S. G. L.; PENITENTE, L. A. A.; MILLER, S. (Org.)
DAVIDOV, V. La ensenãnza escolar y el desarrollo psíquico: investigacion psicológica
teórica y experimental. Moscou: Editorial Progresso, 1988.
DE MARCO, M. T. Percepções de professores de escolas públicas de Educação Infantil acerca
de sua formação e prática educativa: o caso de Medianeira – PR.2014. 124 f. Dissertação
(Mestrado em Educação) – Universidade Estadual Paulista, Faculdade de Filosoa e
Ciências, Marília, SP, 2014.
LEONTIEV, A. O homem e a cultura. In:______. O desenvolvimento do Psiquismo.
Lisboa: Livros Horizontes, 1978. p. 261-284.
LIMA, E. A. Infância e Teoria Histórico-Cultural: (des)encontros da teoria e da prática.
2005. 276 f. Tese (Doutorado em Educação) – Universidade Estadual Paulista,
Faculdade de Filosoa e Ciências, Marília, SP, 2005.
LIMA, E. A.; VALIENGO, A. Literatura infantil e caixas que contam histórias:
encantamentos e envolvimentos. In: CHAVES, M. (Org.). Práticas pedagógicas e
literatura infantil. Maringá: Eduem, 2011. p. 55-67.
MAJEM, T.; ÒDENA, P. Descobrir brincando. Campinas, SP: Autores Associados,
2010.
MARCOLINO, S. A mediação pedagógica na Educação Infantil para o desenvolvimento da
brincadeira de papéis sociais. 2013. 185 f. Tese (Doutorado em Educação) – Universidade
Estadual Paulista, Faculdade de Filosoa e Ciências, Marília, SP, 2013.
MUKHINA, V. Psicologia da idade pré-escolar. São Paulo: Martins Fontes, 1995.
O COMEÇO da vida. Direção: Estela Renner, Produção: São Paulo: Maria Farinha
Filmes, 2016. Disponível em: <http://ocomecodavida.com.br/lme-completo>. Acesso
em: 13 jan. 2017.
PRIETO, M. N. A organização do tempo em Escolas de Educação Infantil: contribuições
para o processo de humanização na infância. 2016. 157 f. Dissertação (Mestrado em
Educação) – Universidade Estadual Paulista, Faculdade de Filosoa e Ciências, Marília,
SP, 2016.
RABITTI, G. À Procura da Dimensão Perdida: uma Escola de Infância de Reggio
Emilia. Tradução Alba Olmi. Porto Alegre: Editora Artes Médicas Sul, 1999.
SAMPAIO, M. Leitura e contação de histórias na Educação Infantil: um estudo sob
a perspectiva da Teoria Histórico-Cultural. 2016. 155 f. Dissertação (Mestrado em
Educação) – Universidade Estadual Paulista, Faculdade de Filosoa e Ciências, Marília, SP,
2016.
SCUDELER, A. P. B. Possibilidades de atividades de comunicação emocional entre bebês:
um estudo à luz da teoria histórico-cultural. 2015. 147 f. Dissertação (Mestrado em
Educação). – Universidade Estadual Paulista, Faculdade de Filosoa e Ciências, Marília,
SP, 2015.
A Questão do Método e a Teoria Histórico-Cultural 129
VÉNGUER, L.; VÉNGUER, A. Actividades inteligentes: jugar en casa con nuestros hijos
en edad preescolar. Madrid: Visor, 1993.
VIGOTSKI, L. S; LURIA, A. R.; LEONTIEV, A. N. Linguagem, desenvolvimento e
aprendizagem. São Paulo: Ícone, 1988.
VYGOTSKI, L. S. Obras Escogidas. Madrid: Visor, 1995. Tomo III.
ZAPORÓZHETS, A. V. Importancia de los períodos iniciales de la vida en la
formación de la personalidad infantil. In: DAVIDOV, V.; SHUARE, M. (Org.). La
Psicologia Evolutiva y Pedagógica en la URSS. Moscou: Editorial Progresso, 1987. p. 228-
249. (Antologia).
quarta Parte
o método e a formação de
adolescentes e jovens
o método na PSicologia do deSenvolvimento
e a formação de adoleScenteS e jovenS
Armando Marino Filho
introdução
O que os olhos enxergam, o cérebro vê com os signicados sociais.
17
A discussão aqui proposta considera o desenvolvimento e a for-
mação de adolescentes e jovens a partir de algumas observações realizadas
em estudos no âmbito da Teoria Histórico-Cultural (THC) e do trabalho
em projetos de pesquisa e cursos de graduação.
A exposição das observações estará limitada pela experiência pro-
porcionada nessas condições de compreensão teórica no âmbito da ati-
vidade concreta baseada nesta fundamentação teórica. Não se pretende,
no entanto, abarcar de forma ampla os processos de desenvolvimento e
formação, mas chamar a atenção para alguns aspectos sobre o objeto de
estudo proposto para a exposição.
Chamam a atenção informações sobre o contexto da formação
do jovem no Brasil, que nos leva a pesar os desaos da formação e da
pesquisa sobre o desenvolvimento humano nos indivíduos com os quais
trabalhamos. Por isso, as considerações recaem sobre alguns objetivos que
considero essenciais para a formação humanizadora que ultrapassa a for-
mação técnica e apresentam de forma sucinta como tenho enfrentado esse
problema nas condições do meu trabalho como professor e psicólogo. Não
somente como professor, mas também como psicólogo atuante na ativida-
17
Armando Marino Filho
https://doi.org/10.36311/2017.978-85-7983-879-8.p7-12
https://doi.org/10.36311/2017.978-85-7983-879-8.p133-146
134 MENDONÇA, S. G. L.; PENITENTE, L. A. A.; MILLER, S. (Org.)
de clínico psicoterapêutica. Trabalho que desenvolvo fundamentando-me
na THC, por volta de 12 anos.
Um pequeno cenário da condição do jovem no Brasil
18
mostra
que há uma grande quantidade que trabalha e estuda simultaneamente,
que não frequenta a escola entre as idades de 15 a 29 anos, que não con-
cluem o ensino médio e que não frequentam o ensino superior. Crianças
e adolescentes de até 14 anos de idade que não têm saneamento básico,
pessoas de 5 a 13 anos que têm ocupação no mundo do trabalho, que
enfrentam alto risco de homicídio e dentre os quais aumenta a taxa de
suicídios. Acrescente-se ainda, que os vínculos das crianças, adolescentes e
jovens com a escola surgem por diversos motivos, e em raros casos com o
objetivo essencial da atividade de estudo.
algumaS queStõeS metodológicaS na PeSquiSa Sobre deSenvolvimento
e formação
A formação e o desenvolvimento estão diretamente vinculados
às condições concretas de produção da vida. Exigem diversidade de rela-
ções sem perder a unidade daquilo que é essencial para a humanização, a
participação nas atividades sociais. Então, algumas questões se apresentam
como pontos de partida para pensar a formação dos indivíduos.
A primeira questão, a diversidade de condições socioeconômicas
e culturais da juventude que são aproximadamente 50 milhões no Brasil.
Aponta para a primeira preocupação metodológica que é a de não traba-
lhar com uma compreensão idealizada de jovem, sem as suas reais formas
de existência. Esse requisito é ponto de partida para o conhecimento das
condições concretas, dinâmicas e particularidades do objeto de pesquisa na
constituição do método.
Segundo, a importância da intencionalidade do pesquisador, que
dentro de uma linha teórica implica em se ter uma compreensão teórico/
losóca sobre o homem e a sociedade e o que esperamos da nossa existên-
cia. Outrossim, ter claro que a formação e o desenvolvimento não se dão,
nas diferentes instituições sem controle ideológico. Por isso, a formação e
o desenvolvimento dos jovens estão condicionados à historicidade de in-
18
Dados do IBGE: Síntese de indicadores sociais, publicado em 2015.
A Questão do Método e a Teoria Histórico-Cultural 135
teresses de classes, em uma disputa ideológica sobre o rumo da sociedade
e da vida das pessoas. A historicidade, isto é, o fato de que são os homens
que condicionam os modos de organização da vida social implica em supe-
rar a naturalização dos fenômenos sociais estudados e analisá-los à luz das
relações de poder e dominação que caracterizam a sociedade.
Por isso, o que ensinar? Que qualidade de pessoas queremos de-
senvolver e formar? Que sociedade queremos construir? Todos esses fatores
fazem parte não so mente das condições concretas de existência dos proces-
sos formativos em nossa sociedade, mas devem fazer parte igualmente dos
motivos e interes ses do processo de pesquisa e intervenção.
Por quê? Primeiro, porque os processos de ensino e aprendizagem
estão no centro do desenvolvimento, portanto os conteúdos e as formas
que estruturam esses processos estarão sempre presentes na realidade con-
creta da pesquisa. Segundo, a pesquisa movida pela lógica dialética e orien-
tada pelo materialismo histórico não se orienta à descoberta de verdades
estáticas, de formas xas de existência dos fenômenos que estudamos, mas
principalmente do movimento, da historicidade e da possibilidade de sua
transformação pelo pesquisador. Terceiro, e por isso mesmo, o pesquisador
deve ter claro para si a que a sua pesquisa se direciona para além da produ-
ção do conhecimento, para a transformação da sociedade.
deSenvolvimento e formação
O conceito de desenvolvimento traz sempre polêmica e reexões
extensas. Nas condições de tempo e espaço dados por este trabalho não
cabe uma discussão prolongada. Portanto, apontaremos algumas qualida-
des do conceito que melhor nos orienta para a compreensão do nosso ob-
jeto de discussão.
Em princípio, o desenvolvimento se apresenta como uma cons-
tante diferenciação das inter-relações internas e ampliação das relações ex-
ternas. A complexicação da atividade e a diversidade de inter-relações
objetivas caracterizam, de forma geral o desenvolvimento. Por exemplo,
ao tratar do desenvolvimento cultural da criança, e da consideração sobre
o psiquismo como um todo estruturado que tem suas especicidades e,
portanto, determina a especicidade das partes que o compõe, Vigotski
(2000, p. 121) arma que:
136 MENDONÇA, S. G. L.; PENITENTE, L. A. A.; MILLER, S. (Org.)
[...] Primeiro, esse conceito [estrutura, A.M.F.] aparece no início da
história cultural de desenvolvimento da criança e forma o momento
inicial ou ponto de origem de todo o processo; segundo, os processos
de desenvolvimento cultural em si precisam ser entendidos como a
mudança da estrutura básica original e o desenvolvimento de novas
estruturas em sua base que são caracterizadas por novas relações entre
as partes. Vamos chamar as primeiras de estruturas primitivas; um todo
psicológico natural que é determinado principalmente pelas formações
biológicas da psique. As segundas emergem no processo cultural de
desenvolvimento, nós vamos chamar de estruturas superiores já que
representam formas genéticas mais complexas e superiores de comporta-
mento. (tradução nossa, grifo nosso)
A diversidade de condições de educação em meios materiais e
simbólicos particulares coexiste com uma regularidade no processo de de-
senvolvimento. Os processos de subjetivação dos modos de ser e existir em
sociedade, em dada cultura, e a formação da consciência. A assunção da
historicidade como processo de desenvolvimento e formação, embora nos
leve a compreender a diversidade de suas possibilidades dadas as escolhas
que os homens fazem para a organização da sua vida, não dispensa a busca
pelas formas da sua regularidade, isto é, a repetição dos fenômenos que
estudamos nas condições para que ocorram.
A transformação das formas iniciais do ser biológico em ser social
depende do processo de apropriação, na atividade comunicativa e de sig-
nicação, dos signos da linguagem. Nesse processo ocorre a transformação
da consciência. Vemos, portanto, que há uma inter-relação de interdepen-
dência entre atividade objetiva e subjetivação dos modos de ser. De acordo
com Vigotski (1997, p. 49, tradução nossa)
[...] se não nos limitamos a um mesmo sistema de reexos, senão que
consideramos distintos sistemas e a possibilidade de transmissão de um
sistema a outro, nos encontramos com o mecanismo fundamental que
objetivamente caracteriza a consciência: a capacidade que tem nosso
corpo de constituir-se em excitante (por meio de seus atos) de si mes-
mo (e de cara a outros novos atos) constitui a base da consciência.
Esses processos, no entanto, se desenvolvem em um ambiente
de constante luta para a superação das contradições postas pela forma de
organização social, política e econômica que, em nossa sociedade, se carac-
A Questão do Método e a Teoria Histórico-Cultural 137
terizam como formas de controle, de impedimento do desenvolvimento e
formação do poder humano para a maioria dos indivíduos, já produzido
historicamente. Os processos de subjetivação na maioria dos indivíduos
sociais não ocorrem a contento para a sua melhor constituição, para forma-
ção de uma consciência desenvolvida sobre as formas do ser social.
Uma consciência desenvolvida a contento para a formação dos
indivíduos signica que esta outorga aos segundos o poder, como forma de
excitantes de si mesmo”, isto é, o poder como forma de desenvolvimento
das funções psicológicas superiores necessárias ao domínio pelo indivíduo
das formas de produção da vida social, para si e para os outros, em parâ-
metros baseados na ética da humanização para todos. Rero-me ao poder
pelo fato de que não é a internalização da cultura exclusivamente que leva
à amplitude do desenvolvimento. É preciso poder superar a cultura posta
pelas gerações anteriores. É preciso poder avaliar os modos de ser postos
pelas relações de dominação.
A formação dos indivíduos ocorre pela produção de um conjunto
de ideias e conhecimentos sobre o mundo, a vida e a natureza humana,
que, sob as atuais relações de dominação, naturalizam a existência histórica
dos seres humanos, da sociedade, da cultura. A naturalização, nesse senti-
do, signica atribuir àquilo que é histórico, àquilo que decorre das relações
entre os homens e com a natureza, um carácter exclusivamente natural,
escamoteando os interesses de classes e individuais que se sobrepõem sobre
os interesses e necessidades de todos. Nessas condições, a gênese histórica
sobre a formação da sociedade, as relações dos homens entre si e com a
natureza aparecem como dadas a priori e orientadas teleologicamente para
interesses e necessidades de outra esfera de existência que não a humana.
As consequências de um processo de desenvolvimento e forma-
ção baseados na má formação da capacidade crítica, fundamentada por
uma consciência desenvolvida sobre a realidade social têm se mostrado
como uma questão nodal para o desenvolvimento social. Quero chamar
a atenção para o fato, que, nessas condições de apropriação e subjetivação
dos conhecimentos temos formado, em geral, uma estrutura de pensamen-
to baseado na crença na autoridade. A crença a que me rero aqui, não
se refere unicamente à religiosa, mas a uma forma geral do pensamento
de agregar ideias na forma de adesão sem questionamento crítico sobre o
138 MENDONÇA, S. G. L.; PENITENTE, L. A. A.; MILLER, S. (Org.)
signicado dos seus conteúdos. Fato esse facilmente vericável na apro-
priação dos signos e signicados abstratos internalizados pelos adolescentes
e jovens com quem trabalhamos no processo educativo e de escolarização.
Estou me baseando em pesquisas que tenho realizado em cursos
de extensão, em cursos de graduação e pós-graduação, nos quais sempre
se revelam formas de pensamento que identicam o valor de uma ideia,
de uma concepção sobre o homem, a sociedade etc. fundamentado na
autoria, no valor simbólico do autor. Quando questionados sobre o valor
dos conceitos, qualquer tentativa de argumentação é insuciente e a jus-
ticativa nal é que algum autor importante no cenário acadêmico como
Vigotski, Piaget entre outros, justicam a veracidade e o valor teórico dos
conceitos.
Os alunos e, também professores, mostram na maioria dos casos
uma dependência quase absoluta da fórmula pensada por alguém, para
responder às demandas e problemáticas da sua atividade. Isso no discurso,
porque na prática, na sua atividade imperam o senso comum e a tentativa
e erro. Embora essa forma de pensamento não impeça a continuidade das
atividades cotidianas, essas não ocorrem sem prejuízo ao desenvolvimento
dos próprios indivíduos e da sociedade. As ações orientadas pela crença
não se direcionam à transformação das relações de dominação.
A crença é instrumento para relações de dominação. Observemos
que aquela característica essencial da consciência como poder ou capacida-
de de ser “excitante de si mesmo” é substituída, nesses casos, pela obediên-
cia à signicação dada pelo outro. É assim que se perpetuam as desiguais
formas de participação na vida social e apropriação da cultura. A formação
da juventude tem ocorrido, para a maioria das pessoas, desta forma.
A título de expor o pensamento de Vigotski (2000, p. 125) sobre
o domínio da autoconduta” e a sua contraposição em relação à obediên-
cia, quero nalizar este tópico com a seguinte citação:
[...] a obediência e as boas intenções se relegam a segundo plano, desta-
cando em primeiro lugar o problema do autodomínio, problema que tem,
com efeito, muito maior importância já que se refere a uma intenção que
dirige o comportamento infantil. O afastamento a um segundo plano
do problema da intenção em relação ao problema do autodomínio se
manifesta na questão da obediência da criança pequena. A criança deve
A Questão do Método e a Teoria Histórico-Cultural 139
aprender a obedecer pelo caminho do autodomínio. O autodomínio não
se baseia nem na obediência nem na intenção senão, pelo contrário, na
obediência e na intenção surgem a base do autodomínio. As mudanças
análogas que nós conhecemos pela pedagogia da vontade são impres-
cindíveis para o problema fundamental da psicologia da vontade.
(Tradução nossa, grifo nosso)
O problema que enfrentamos com a atual formação se refere a
que o autodomínio está sendo formado às avessas, está direcionado aos
ditames ideológicos postos no processo educativo e de formação da juven-
tude. O autodomínio se forma como obediência aos interesses alheios e
escusos da sociedade capitalista.
a centralidade da formação do PenSamento
Pensar e ser são, portanto, certamente diferentes, mas [estão] ao mesmo
tempo em unidade mútua.
Karl Marx
Quero, neste momento, colocar o pensamento no centro do pro-
cesso formativo, embora dependendo por que viés olharmos a problemáti-
ca, a personalidade ou a consciência pode ocupar este lugar. O pensamento
é atividade intelectual diretamente ligada à atividade objetivada nas rela-
ções concretas dos homens em sociedade. Está direcionado à multiplicida-
de ou multideterminações das condições de produção da vida. Tem sempre
uma tarefa na resolução de problemas (RUBINSTEIN, 1965). Leontiev
(1978, p. 21) expõe essa mesma ideia da seguinte forma:
Em outras palavras, o pensamento e a consciência são determina-
dos pela existência real, pela vida dos homens, e somente existem
como consciência deles mesmos, como um produto do desenvol-
vimento do mensiconado sistema de relações objetivas. (tradução
nossa)
O pensamento relaciona o sujeito com o mundo. É mediador
das relações e, portanto, os objetivos, as resoluções de tarefas, o uso de ins-
trumentos e da linguagem, mas também, os sentimentos afetos e emoções
passarão pelo seu crivo. Não há problema externo ou interno que não passe
pelo pensamento. Pensar é condição si ne qua non para a vida humana.
140 MENDONÇA, S. G. L.; PENITENTE, L. A. A.; MILLER, S. (Org.)
Projetar o desenvolvimento de adolescentes e jovens sem colocar a forma-
ção do pensamento no centro é um ato de violência contra a humanização
desses sujeitos.
Uma questão crucial nessa problemática é que aprendemos a pen-
sar durante as atividades sociais. Aqui nos deparamos com o fato de que
o nosso pensamento é discursivo. A lógica de organização da atividade
apropriada por meio dos signicados sociais se transforma em lógica do
pensamento.
O pensamento depende da linguagem, do uso das palavras e dos
conceitos para o seu desenvolvimento. Assim se apresenta, também, um
dos grandes problemas do ensino e da formação atual. Os adolescentes e
jovens, mas também muitos adultos, não conhecem os signicados das pa-
lavras que usam. Têm apenas noções mais ou menos generalizadas no coti-
diano. Qualquer tentativa de explicar o signicado de palavras e conceitos
interrompe o seu pensamento ou na melhor das hipóteses produz uma
redundância do tipo “a lógica é quando você tem um pensamento lógico”.
Ora, se o nosso pensamento é discursivo e demanda conhecer e
poder usar palavras, signos e signicados, poder simbolizar, imaginar etc.
com o uso de signicados sociais, o que ocorre no pensamento de pessoas
que só tem a sonoridade das palavras com um conteúdo confuso e inde-
nido? Quais problemas poderá o pensamento resolver com essas palavras?
Que realidade essas palavras permitem os olhos enxergarem e o cérebro
ver?
O desenvolvimento do pensamento ocorre por meio daquilo que
lhe dá origem. As contradições postas pela realidade social e a necessidade
de sua superação para a manutenção da existência, para a continuidade da
vida. É com base na contradição que o pensamento ganha terreno. É o do-
mínio, portanto, das formas de superação das contradições que determina
a formação e desenvolvimento do ser social.
[...] A contradição interna do processo do pensamento, que está na
base de seu automovimento, de autodesenvolvimento, consiste em que
cada passo do pensamento esclarece, por uma parte, algo (certas cone-
xões, relações novas) e, por outra, o conhecimento em questão permite
ver os contornos de aspectos pouco conhecidos do objeto, propor nesse
plano novos questionamentos. (PODDIÁKOV, 1987 p. 170).
A Questão do Método e a Teoria Histórico-Cultural 141
O que poderíamos dizer sobre isso se no processo educativo os
pensamentos são apresentados na sua síntese nalizada, ou se durante o
processo de ensino não se reproduz junto com os alunos todo o processo de
análise, abstração e síntese dos conteúdos de ensino? Das contradições que
subsistem na sua gênese dos fenômenos que queremos compreender com
os signicados? A constatação de que a maioria dos alunos não consegue
ou tem muita diculdade para articular o pensamento quando tratamos
dos conteúdos cientícos denuncia não somente o seu desenvolvimento
acadêmico, o desenvolvimento do seu pensamento, mas principalmente,
todo o sistema educativo e escolarizado pelo qual somos responsáveis.
No caso da maioria dos alunos as possibilidades de articulação do
pensamento para o conhecimento da realidade não vai muito além do co-
nhecimento produzido e dado no processo de apropriação, como um ob-
jeto a-histórico. Como um objeto dado pelo professor, que é a autoridade
no assunto. O pensamento dado assim não gera as contradições das quais
Podiakov aponta acima. Na maior parte das vezes o pensamento proferido
pelos alunos é ecolálico, vazio de posicionamento pessoal, não demonstra
atividade intelectual de resolução das contradições postas pela realidade
e de compreensão dos problemas mais complexos da concretude da vida.
Aqui encontramos, também, um aspecto metodológico impor-
tante. Qual é a relação que o pesquisador, que o professor, estabelecem
com os conceitos teóricos que organizam a sua pesquisa, a sua atividade
de ensino? É o de compreensão ou o de crença no autor? Como explicar a
realidade com conceitos que eu não consigo explicar com clareza aos meus
alunos?
Falo assim porque é outra questão que tenho percebido em pes-
quisas das quais tomo parte ou como coordenador ou como membro de
bancas de avaliação, ou mesmo quando utilizo dissertações ou teses para
estudo próprio. Em muitos casos o que se percebe na prática de professores
é também diculdade de explicar com clareza o conteúdo dos conceitos e,
no caso dos trabalhos acadêmicos, uma extensa revisão bibliográca dos
conceitos que não aparecem na análise dos dados e fatos da pesquisa. Pare-
ce para mim que corremos o risco de na hora de confrontar o conceito com
a realidade não sabermos o que fazer com o conceito e, portanto, muito
pouco com a realidade.
142 MENDONÇA, S. G. L.; PENITENTE, L. A. A.; MILLER, S. (Org.)
o que enSinar, então?
E o que ensinar se relaciona com a formação do pesquisador
como requisito fundamental para a pesquisa por meio da THC. Segundo
ILYENKOV (2007), nossas escolas devem ensinar como pensar. Eu que-
ro acrescentar que precisamos, ainda, educar a relação que se estabelece
com as coisas, com a vida e com as outras pessoas. A relação que o sujeito
estabelece com a sua atividade explicita a forma da sua consciência, suas
intenções, interesses e o seu lugar no mundo. Explicita que tipo de desen-
volvimento está ocorrendo.
Mas, também, educar a sua relação com as formas não cotidianas
do pensamento, a arte, a ciência, a política, entre outras, no sentido que
se constituem instrumentos necessários ao domínio da vida social. A ca-
pacidade de pensar o movimento complexo da realidade, necessário para a
relação transformadora com a vida social, com a vida humana, supera em
importância os conteúdos cognitivos, técnicos e instrucionais do ensino.
Os pensamentos teórico/losóco e teórico/cientíco precisam
ser o ponto de partida e o horizonte orientador do planejamento do ensino
e da formação e, da mesma forma do projeto de pesquisa que não pode ter
outro escopo que não o da transformação da sociedade.
A atual formação, amputada desse princípio, leva à formação de
uma consciência fragmentada, que precisa recorrer ao individualismo para
encontrar um sentido para a sua existência. O que nos leva a pensar, então,
em que tipo de pessoas queremos formar e desenvolver, inclusive com as
nossas pesquisas.
Porque aqui aparece outro condicionante metodológico da pes-
quisa, que para mim é um dos mais importantes. Para conhecer um dado
fenômeno é preciso colocá-lo em movimento, acompanhar as transfor-
mações de sua existência, produzir o próprio fenômeno que se quer co-
nhecer. Dado que os fenômenos humanos referentes ao desenvolvimento
psicológico são históricos e sociais, ca evidente que podemos produzi-los,
compreendê-los. A realidade social e histórica do desenvolvimento ontoge-
nético pode ser conhecida, também, no exato momento de sua produção.
A Questão do Método e a Teoria Histórico-Cultural 143
conSideraçõeS finaiS
Se, tomamos como centralidade na formação dos indivíduos o
desenvolvimento do pensamento sobre a realidade, são indivíduos que to-
mam a realidade na qual existem como objeto de investigação para sua
vida, que queremos. Isso nos coloca também diante de uma questão im-
portante em relação à pesquisa na THC. Qual é a relação viva, como sujei-
to social e indivíduo humano que o pesquisador estabelece com o método?
Para entender melhor essa questão, podemos fazer alguns ques-
tionamentos: O método é somente um instrumento para a organização do
meu pensamento durante a pesquisa? Qual é a relação que estabeleço entre
o método e minha própria vida? Como o método me constitui enquanto
sujeito na realidade em que vivo?
Quero propor que para quem vive a THC o método não pode
ser um instrumento à parte da sua própria existência como sujeito social.
Como é possível pesquisar histórica e dialeticamente a realidade se eu não
penso assim as minhas relações com a sociedade e com as pessoas mais
próximas?
Os sujeitos não são apenas objetos de pesquisa. Quer queiramos
ou não, ao realizar uma pesquisa nós entramos na vida das pessoas, o que
nós coloca frente a uma questão ética dos interesses da pesquisa.
Se eu quero indivíduos: que superem o individualismo para exis-
tir em comunidade; que se compreendem em unidade com a humanida-
de, e são capazes de pensar para além das contradições e da diversidade
a sua identidade humana com os outros; que reconheçam a natureza e
a preservação da vida como um bem comum; que são capazes de pensar
independentemente, de confrontar ideias, de suspeitar das suas crenças e
superá-las por meio do conhecimento; que possam problematizar sobre
as contradições da existência e compreendê-las em seu movimento. Indi-
víduos que queiram cuidar da vida social. Então a minha pesquisa deve
necessariamente organizar-se em seu movimento, contraditoriamente em
relação às condições sociais postas na atualidade.
Os interesses, objetivos, o uso dos meios, procedimentos e or-
ganização da atividade de pesquisa não podem coincidir com a mesma
lógica posta pela sociedade atual. Porque o tipo de sociedade que queremos
144 MENDONÇA, S. G. L.; PENITENTE, L. A. A.; MILLER, S. (Org.)
construir com a formação dos indivíduos é contrária à formação como esta
tem sido produzida, como um ato de violência contra o possível desenvol-
vimento dos jovens.
Como forma de orientação psicológica, a formação e o desen-
volvimento precisam objetivar que os indivíduos atuem de determinada
forma que possam assumir o domínio da prática social de produção da
vida dos homens. Nesse sentido, a conscientização da função humaniza-
dora da prática social deveria ser o escopo de formação da consciência
dos indivíduos como sujeitos da ação produtiva e transformadora da vida
social.
A sociedade, que existe na relação dos indivíduos entre si e com
a natureza não pode, por isso mesmo, ser pensada separadamente da
formação dos próprios indivíduos e suas relações. Reete essa formação
da mesma forma que os indivíduos representam a sociedade na qual se
desenvolvem. Sociedade e indivíduos não são duas coisas.
A sociedade que produzimos será sempre reexo dos indivíduos
que formamos e vice-versa. Se eu penso uma sociedade: que se congure
como comunidade entre os homens; que superou toda forma de precon-
ceito e se organiza para a produção da vida de todos os homens; que se
vale da natureza, mas a preserva contra a exploração desnecessária à ma-
nutenção da vida; que está voltada para produzir homens livres, que por
meio do conhecimento e da capacidade de pensar superam o misticismo
e criam novas formas de organização da vida social no sentido da huma-
nização para todos; que possam por em movimento os cuidados com a
vida social e humana. Teremos, então, campos de análise e orientação da
pesquisa sobre o desenvolvimento que nos levam a conceitos fundamen-
tais da THC para as pesquisas nessa área.
O processo de signicação, que constitui o conjunto dos meios
de organização do sistema psicológico e da linguagem como processos de
orientação, execução e controle da atividade vital; a relação interpsicológi-
ca, que evidencia os meios de mediação durante os processos de ensino e
aprendizagem; a organização da atividade que orienta a participação dos
sujeitos, o seu lugar no mundo e a formação de sua personalidade durante
a sua vida social.
A Questão do Método e a Teoria Histórico-Cultural 145
referência bibliográfica
ILYENKOV E. V. Our shcools must teach how to think. Journal of Russian and East
European Psychology, v. 45, n. 4, p. 9-49, July-August 2007.
LEONTIEV, A. N. Actividad, conciencia y personalidad. Buenos Aires: Ediciones del
Hombre, 1978.
PODIÁKOV N. In: DAVIDOV, V.; SHUARE, M. (Comp.). La psicologia evolutiva y
pedagógica en la URSS: antología. Moscú: Editorial Progresso, 1987.
RUBINSTEIN, S. L. El ser y la consciencia. La Habana: Universitaria, 1965. (Volume 4)
VYGOTSKI, L. S. Obras Escogidas III: problemas del desarrollo de la psique. Traducciôn
de Lidia Kuper. Madrid: Visor, 2000.
ProyectoS futuroS en jóveneS cubanoS:
una mirada deSde el enfoque hiStórico
cultural
Laura Domínguez García
i laSituación Social del deSarrolloen la edad juvenil
La juventud junto a la adolescencia han sido denidas tradicio-
nalmente como edades de tránsito entre la niñez y la adultez. En la actua-
lidad existe consenso en considerarlas momentos claves en el proceso de
socialización del individuo, pues en el transcurso de estos períodos el su-
jeto se prepara para cumplir determinados roles sociales propios de la vida
adulta, en la actividad profesional-laboral, en sus relaciones con la familia,
la pareja y los amigos.
Aunque casi la totalidad de los autores, independientemente de
la concepción teórica que sobre el desarrollo asumen en la Psicología, con-
sideran que el criterio principal para la delimitación de estas etapas no
responde a la edad cronológica, la mayoría de los estudiosos proponen
determinados límites para las mismas.
En Cuba la juventud se enmarca en la etapa entre los 16 y 30
años, ya que se tiene en cuenta que es a partir de los 16 años de edad
cuando el individuo posee todos los derechos legales al voto, se le otorga
el carné de identidad y se le considera una persona responsable de sus
actos.
La juventud se caracteriza por ser una etapa de aanzamiento de
las principales adquisiciones logradas en períodos anteriores y, en especial, en
la adolescencia; consolidación que se produce en consonancia con la tarea
https://doi.org/10.36311/2017.978-85-7983-879-8.p147-166
148 MENDONÇA, S. G. L.; PENITENTE, L. A. A.; MILLER, S. (Org.)
principal que debe enfrentar el joven: autodeterminarse en las diferentes esfe-
ras de su vida dentro de sus sistemas de actividades y comunicación.
Para la caracterización de la juventud como etapa del desarrollo
psicológico partimos de los principios del Enfoque Histórico Cultural,
derivados de la obra de Vygotski (1935; 1987; 2001; 2003) y sus conti-
nuadores (Bozhovich, 1976; Davidov, 1981, 1987, 1988; Elkonin, 1987;
Galperin, 1982, 1987; Venguer, 1976; Zaporozhets,1987), relativos al de-
terminismo histórico social del desarrollo psicológico, la interiorización,
la mediatización, la unidad de lo cognitivo y lo afectivo, y la unidad de
la educación y el desarrollo; este último, entendido desde la perspectiva
de la existencia de una relación dialéctica entre ambos procesos, donde la
educación desempeña el papel rector.
En la juventud culmina, en lo esencial, el proceso de formación
de la personalidad. El surgimiento de una estructura jerárquica sucien-
temente estable de motivos, su fundamentación a través de la elaboración
consciente del sujeto gracias al desarrollo intelectual alcanzado, así como
la consolidación de formaciones psicológicas, tales como la autovaloración
y los ideales, permiten la regulación efectiva del comportamiento, en las
diferentes esferas de signicación para la personalidad.
Todo este sistema de necesidades, motivos y aspiraciones, se in-
tegra a la concepción del mundo, neoformación típica del período juve-
nil, la cual representa el nivel superior de integración de lo cognitivo y lo
afectivo en la personalidad. El surgimiento de este formación es resultado,
por una parte, de las necesidades de independencia y autoarmación de-
sencadenadas en la adolescencia, las cuales dan paso a una fuerte necesidad
de autodeterminación, y, por otra, de la consolidación del pensamiento
conceptual teórico, todo lo cual permite al joven estructurar su proyecto
de vida, a través de planes, objetivos, metas y de las estrategias correspon-
dientes para su consecución.
La nueva posición “objetiva” que ocupa el joven dentro de la rea-
lidad social condiciona la necesidad de determinar su futuro lugar en la
misma. Es de suponer que todo el desarrollo psicológico precedente le
permite delinear un sentido de la vida, como conjunto de objetivos me-
diatos que el joven se traza, los cuales se vinculan a las diferentes esferas de
A Questão do Método e a Teoria Histórico-Cultural 149
signicación para la personalidad y requieren la elaboración de estrategias
encaminadas a emprender acciones en el presente que contribuyan al logro
de metas futuras.
La elección de la futura profesión o el desempeño de una determinada
actividad laboral ocupa un lugar elevado en la jerarquía motivacional y per-
mite establecer distinciones entre los variados sectores pertenecientes a la
juventud, como son los estudiantes de nivel universitario, preuniversitario
y técnico medio, trabajadores estatales o por cuenta propia, campesinos,
etc. Entre estos sectores existen diferencias de carácter sociológico y econó-
mico que se reejan de múltiples formas en la subjetividad de los jóvenes,
por lo que en la juventud, en comparación con etapas anteriores, se torna
más difícil el establecimiento de regularidades y tendencias generales del
desarrollo psicológico.
El joven debe decidir, en primer término, a qué actividad cientí-
co profesional o laboral va a dedicarse; y en consonancia con esta decisión,
organizar su comportamiento. Por esta razón, se presentan diferencias en-
tre los jóvenes que comienzan a trabajar y aquellos que continúan siendo
estudiantes, o que estudian y trabajan a la vez, sin faltar los desvinculados
de ambas actividades, cuestión que repercute en su sistema su comunica-
ción desde las expectativas y exigencias de la familia, los compañeros y la
sociedad en su conjunto.
A continuación presentaremos un breve recorrido por los princi-
pales componentes de la “situación social del desarrollo” propia de la ju-
ventud como edad psicológica (DOMÍNGUEZ, 2007). Entendemos por
situación social del desarrollo” aquella:
combinación especial de los procesos internos del desarrollo y de las
condiciones externas que es típica en cada etapa y que condiciona tam-
bién la dinámica del desarrollo psíquico durante el correspondiente
período evolutivo y las nuevas formaciones psicológicas peculiares, que
surgen hacia el nal de dicho período” (Vygotski, citado por Bozhovi-
ch, 1976, p. 99).
En este sentido, pasamos a analizar en apretada síntesis los
sistemas de actividades y de comunicación propios de la juventud, así como
el desarrollo de las nuevas formaciones psicológicas típicas de esta edad.
150 MENDONÇA, S. G. L.; PENITENTE, L. A. A.; MILLER, S. (Org.)
i.1 SiStema de actividadeS y SiStema de comunicación en la juventud.
En la juventud la actividad de estudio o actividad formal adquiere
un carácter cientíco-profesional, sobre todo en el caso de aquellos jóvenes
que continúan desarrollando sus estudios en la Educación Superior. Ellos
deberán asimilar contenidos pertenecientes a diversas disciplinas, los cuales
presentan un elevado nivel de abstracción y generalización.
Un aspecto distintivo del proceso de conocimiento en la juven-
tud, tanto en su actividad de estudio como en otras esferas de interés, es
que los jóvenes se distinguen no sólo por su capacidad e interés en resolver
problemas, sino sobre todo por su tendencia a plantearse nuevos proble-
mas, lo que signica que su actividad cognoscitiva es más creativa.
En relación con la actividad informal o no institucionalizada, se-
gún Kon (1990), la lectura, el cine y la televisión se encuentran entre las
actividades preferidas en este grupo evolutivo y, en ocasiones, su gran dis-
persión de intereses les ocasiona dicultades en la organización y distribu-
ción de su tiempo. Otra característica en esta esfera, propia de la juventud,
es que su vida cultural y recreativa se encuentra orientada, en mayor medi-
da, hacia espacios externos al centro de estudios o laboral.
En diferentes momentos de esta etapa, los jóvenes se van inte-
grando al desempeño de una determinada actividad laboral y el éxito en la
misma dependerá, en importante grado, de su preparación profesional y
motivación por las tareas a realizar.
Adentrándonos en el análisis del sistema de comunicación propio
de la “situación social del desarrollo” en la juventud, abordaremos, pri-
meramente, las relaciones de comunicación con los adultos, especialmente
con padres y maestros y, posteriormente, las relaciones que establecen los
jóvenes con sus iguales.
En la juventud las relaciones con los adultos se basan en la valo-
ración crítica de sus cualidades psicológicas y morales, pero esta valoración
posee un mayor nivel de argumentación que en la adolescencia y es mucho
más exible.
En relación con los maestros, su aceptación por parte del joven
depende de sus cualidades personales y de su estilo de comunicación, pri-
A Questão do Método e a Teoria Histórico-Cultural 151
vilegiándose aquel basado en el diálogo y el respeto mutuo y, también, de
su competencia profesional.
En cuanto a la familia, el joven logra una mayor independencia
emocional de sus padres en comparación con el adolescente. Los padres
constituyen modelos de conducta pero de manera más mediatizada que
en etapas anteriores. Las dicultades que surgen en la comunicación del
joven con sus padres están condicionadas por la complejidad de su mundo
interno y porque los padres no siempre tienen una imagen real del joven,
aún cuando en ocasiones piensan poseerla.
Gracias a la madurez alcanzada por el joven la comunicación con
los adultos se basa en el respeto mutuo. La aceptación de estos pasa por
una actitud crítica pero a la vez reexiva, lo que favorece el intercambio
comunicativo sobre nuevas bases.
Después de analizar las regularidades que presenta la relación con
los adultos pasaremos a profundizar en la segunda dirección que adopta el
sistema de comunicación, la cual también en esta edad resulta de gran im-
portancia para el desarrollo psicológico. Se trata en este caso de la comuni-
cación con los coetáneos o iguales, proceso que se establece en las relaciones
grupales, en las relaciones de amistad y en las relaciones de pareja.
El desarrollo de la capacidad de autodeterminación en la juven-
tud y la necesidad de independencia mejor estructurada y fundamentada
que en la adolescencia, permiten al joven mostrarse como un ser relativa-
mente independiente de las opiniones de su grupo de iguales, siendo capaz
de enfrentarse abiertamente a determinados criterios de estos, si considera
inadecuadas ciertas posiciones, normas o exigencias grupales.
No obstante, de manera semejante a lo que sucede en la etapa de
la adolescencia, el joven participa en grupos formales y espontáneos que
le permiten establecer relaciones de comunicación con sus iguales. Estos
grupos, se convierten en importantes espacios de reexión, de expresión y
conformación de sus puntos de vista y, además, contribuyen a la organiza-
ción y empleo saludable de su tiempo libre.
En la juventud se produce una búsqueda intensa de la amistad,
la cual es concebida como una relación afectiva, altamente individualiza-
da, estable y profunda. Al igual que en la adolescencia, las relaciones de
152 MENDONÇA, S. G. L.; PENITENTE, L. A. A.; MILLER, S. (Org.)
amistad entre los jóvenes poseen carácter polifuncional y se rigen por im-
portantes valores morales, como son la honestidad y la lealtad. Pero en la
juventud, a diferencia de lo que resulta típico en la adolescencia, la amistad
presenta un carácter más selectivo, diferenciándose los compañeros de los
amigos, por lo que tiende a disminuir el número de estos últimos.
En cuanto a las relaciones de pareja, la búsqueda de una mayor
estabilidad constituye una tendencia en esta etapa, aunque el logro de ella
y la forma en que cada miembro de la pareja enfoque y proyecte la relación,
dependerá, en gran medida, de la educación recibida principalmente en la
familia respecto a esta esfera. También aparece el proyecto de creación de
la familia propia, la preparación para el matrimonio y para la llegada del
primer hijo, como regularidades de la edad.
i.2 deSarrollo de laS nuevaS formacioneS PSicológicaS ProPiaS de la
juventud.
En la juventud los intereses cognoscitivos se encuentran un tanto
supeditados a los intereses profesionales, aunque son variados y responden
también a los intereses culturales del joven. Los jóvenes se orientan, en
mayor grado, hacia el contenido de las asignaturas que hacia sus aspectos
externos y preeren aquellas que promueven su reexión y los conducen
a realizar generalizaciones, a partir de las cuales, pueden dar explicación
a determinados hechos concretos. No obstante, esta variedad de intereses
puede combinarse con la incapacidad para organizar su tiempo y su propia
actividad cognoscitiva, la cual en ocasiones tiende a ser dispersa.
En este período se consolidan los intereses profesionales y pueden
convertirse en intenciones. Las intenciones profesionales surgen, como for-
mación motivacional compleja y expresión de una tendencia orientadora
de la personalidad hacia esta esfera (GONZÁLEZ, 1983), en el momento
en que el sujeto es capaz de elaborar los contenidos de esta motivación en
las perspectivas de su vida presente y futura y con un elevado compromiso
de la autovaloración.
Pasando a realizar algunas consideraciones acerca del desarrollo
del intelectual, podemos señalar que se consolida el pensamiento concep-
tual teórico propio de la adolescencia. Además, coincidimos con Bozhovich
A Questão do Método e a Teoria Histórico-Cultural 153
(1976), quien expresara que en la juventud este proceso cognoscitivo por
excelencia, adquiere un carácter emocional personal. El joven se interesa por
la solución de problemas cognoscitivos generales, y por todo lo relacionado
con los valores morales e ideológicos, dada su necesidad de autodetermina-
ción y su aspiración a elaborar una concepción del mundo propia.
En la juventud, la identidad personal, también denominada au-
tovaloración (autoconocimiento y autoevaluación del sujeto de sus cuali-
dades físicas, psicológicas y morales) debe alcanzar un importante grado
de estructuración y estabilidad y conducir al joven a proponerse tareas de
su autoeducación, ya que el principal propósito que debe acometer es el
de determinar su futuro lugar en la sociedad. Así, la elección de la futura
profesión o actividad laboral y su desempeño, se apoyan en la valoración
que hace el sujeto de sus capacidades, cualidades e intereses, y forma parte
esencial de la elaboración de un proyecto de vida, que le permita encaminar
su conducta presente en pos de objetivos situados, temporalmente, a largo
plazo.
La identidad personal del joven resulta más exible y estructura-
da que la del adolescente, lo que indica que esta formación ha ganado en
estabilidad y objetividad, conriendo mayor importancia a aquellas cua-
lidades vinculadas con el dominio de sí mismo y su proyección futura.
La función reguladora de la identidad personal se transforme en función
autoeducativa, orientando el comportamiento del joven hacia su autoper-
feccionamiento. Esta función autoeducativa permite al sujeto mantener
una relativa coherencia y estabilidad entre sus contenidos autovalorativos
y la conducta externa y, además, le brinda la posibilidad de proponerse las
estrategias correspondientes orientadas al logro de este propósito.
En cuanto al desarrollo moral, en la juventud se observa que los
conceptos morales se hacen más conscientes y estructurados y el joven lo-
gra formularlos correctamente a través del lenguaje. En esta etapa la moral
opera desde lo interno. El sujeto asume la responsabilidad personal de sus
acciones basándose en principios morales generales y, a la vez, logra una
mayor exibilidad y argumentación de sus valoraciones morales. Así, la
tendencia a la autoarmación del adolescente, se sustituye, en opinión de
Kon (1990), por un auto-análisis más realista y crítico y por la autoeduca-
ción de la personalidad.
154 MENDONÇA, S. G. L.; PENITENTE, L. A. A.; MILLER, S. (Org.)
Los ideales, al igual que la identidad personal, se convierten en
patrón de evaluación del comportamiento del joven, propio y ajeno. En la
juventud se produce una búsqueda consciente del ideal, el cual se asume te-
niendo como base una valoración moral y crítica de sus características. De
esta forma, encontramos como ideales típicos de este período los llamados
ideales generalizados (GONZÁLEZ, 1983), ya que generalmente el joven
no elige un modelo concreto o representado por una persona particular,
sino que el contenido del ideal coincide con su proyección futura. Incluso,
cuando prevalece un ideal cuya estructura está asociada a un modelo con-
creto, el mismo se asume críticamente y con un alto nivel de elaboración,
ya que se abstraen y fundamentan aquellas cualidades del modelo que res-
ponden al sistema de necesidades, motivos y exigencias morales, asumidas
por el joven. Este tipo de ideal fue denominado por Grichanova (citada
por GONZÁLEZ, 1983) como “ideal concretizado”.
Por otra parte, el proyecto de vida como sistema que integra los
proyectos futuros, se sustenta en la elaboración por parte del joven de obje-
tivos mediatos, aspiraciones y expectativas vinculadas a las principales esfe-
ras de realización, entre las que pueden encontrarse la familia, la profesión,
su autorrealización, etc. Estos proyectos tienen como importante sostén el
conjunto de valores que se estructuran como contenidos de su concepción
del mundo y que también forman parte de su identidad personal.
Resulta imposible que el joven elabore un proyecto de vida sólido
y realizable que comprometa todas las potencialidades reguladoras de
su personalidad si no se apoya en lo que es y en lo que quiere ser, en la
contradicción entre su yo real y su yo ideal, todo lo cual se encuentra
matizado por su concepción del mundo y sus valores.
En este proceso de construcción del proyecto de vida intervienen,
desde el punto de vista de su contenido y también dinámico, no solo la
identidad personal del joven, sino también su concepción del mundo y, por
tanto, sus valores.
La regulación moral en la juventud resulta más estable, en com-
paración con la alcanzada etapa de la adolescencia, y esto se debe, en buena
medida, al surgimiento de la concepción del mundo, considerada por los
autores marxistas como neoformación que distingue a esta edad.
A Questão do Método e a Teoria Histórico-Cultural 155
La concepción del mundo es la representación generalizada y sis-
tematizada de la realidad en su conjunto, de las leyes que rigen su devenir
y de las exigencias que plantea el medio social a la actuación del joven; es
también la representación del lugar que ocupa el hombre en este contexto,
y por ende, la propia personalidad.
La concepción del mundo formación motivacional de elevada
complejidad surge en la juventud y es la adquisición más importante
del desarrollo psicológico en esta etapa aunque se sigue desarrollando en
edades posteriores.
En este sentido la concepción del mundo no es meramente una re-
presentación intelectual sobre la realidad (componente cognitivo), sino que
de ella se deriva una determinada actitud ante la misma, muy inuida por
los valores de la persona (componente axiológico).
Los valores constituyen formaciones psicológicas cuyos conteni-
dos se corresponden con signicados socialmente valiosos (responsabili-
dad, honestidad, solidaridad, altruismo, dignidad, justicia, etc.) que per-
miten al joven la valoración moral de lo que acontece en su entorno social,
de su propia persona y de las otras personas con las que establece relaciones
dentro de los sistemas de actividad y comunicación en los que participa.
Los valores forman parte de la subjetividad humana y en ellos se
maniesta la unidad de lo cognitivo y afectivo, ya que poseen un compo-
nente cognitivo que es el conocimiento que tiene el sujeto del contenido
del valor, o dicho de otra forma, la conciencia de qué signica ser honesto,
responsable, digno, justo, etc.; y por otra parte, requieren del compromiso
emocional del sujeto con dicho contenido. Esta unidad de lo cognitivo y
lo afectivo es la que posibilita que el valor se convierta en un regulador
efectivo del comportamiento. Si el contenido del valor no es construido
de manera activa por la persona, si no adquiere para ella además de un
signicado un sentido personal, no puede convertirse en un elemento que
movilice y oriente su conducta.
La aparición de los valores y de la concepción del mundo que los
integra y sistematiza, unida al surgimiento de una identidad personal de-
nida y del proyecto de vida, no es un producto automático del desarrollo ni
se produce de manera espontánea en la juventud, sino que es ante todo un
156 MENDONÇA, S. G. L.; PENITENTE, L. A. A.; MILLER, S. (Org.)
resultado mediato de las condiciones de educación en las que ha transcur-
rido nuestra vida y de la construcción subjetiva que hemos hecho a través
de nuestra historia personal.
La concepción del mundo sirve de sostén a la elaboración del sen-
tido de la vida, en tanto sentido de la propia existencia y camino o estra-
tegia a seguir para encontrar el lugar al que se aspira dentro del cuadro
del mundo. El problema del sentido de la vida, aunque constituye una
reexión sobre sí mismo, sólo se realiza y expresa en la propia actividad
de la persona y en su sistema de interrelaciones con quienes le rodean, no
estableciéndose de manera invariable, por cuanto se va reestructurando
y construyendo durante toda la vida. El surgimiento de la concepción del
mundo y la elaboración del sentido de la vida como elemento distintivo de
la regulación del comportamiento contribuyen al proceso de autodetermi-
nación del comportamiento.
La identidad personal, los valores como componentes de la con-
cepción del mundo y el proyecto de vida son formaciones psicológicas cuyo
desarrollo tiene su cimiente desde edades tempranas y se extiende a lo largo
de la vida. Estas formaciones adquieren en la juventud un alto grado de
estructuración y un elevado poder regulador, cuestión que se ve favorecida
por las exigencias que impone al comportamiento del joven su entorno
social, y todo ello, unido a su necesidad de autodeterminación en los dife-
rentes esferas que adquieren para él sentido personal.
Es en etapa de la juventud donde la “situación social del desar-
rollo” que le es típica propicia que la elección profesional se realice basada
en la motivación profesional del sujeto y que dicha elección se produzca
como acto de autodeterminación, ya que el joven está en condiciones de
realizar una valoración de sus intereses, capacidades y posibilidades, par-
tiendo de sus aspiraciones, y en correspondencia con esta evaluación, to-
mar una decisión más fundamentada.
En la juventud un criterio esencial en la selección profesional es
la motivación hacia el contenido de la profesión, aunque esta elección pue-
de efectuarse también por mecanismos psicológicos totalmente diferentes,
como son la búsqueda de prestigio social, de aprobación familiar, de bie-
nestar económico, la necesidad de ser útil a la sociedad, etc.
A Questão do Método e a Teoria Histórico-Cultural 157
En nuestra tesis de doctorado (DOMÍNGUEZ, 1992), relativa a
la caracterización de los niveles de desarrollo de la motivación profesional
en estudiantes cubanos, pertenecientes a la Enseñanza Media Superior y
a la Educación Superior, partimos de considerar la motivación profesio-
nal como una formación de la personalidad, que integra un conjunto de
componentes psicológicos. El diagnóstico de estos componentes permite,
en nuestra opinión, la determinación de los niveles de desarrollo de esta
formación.
Estos componentes están referidos al conocimiento que posee
el sujeto acerca del contenido de su futura profesión, al vínculo afectivo
que siente hacia ella, y además, a los aspectos de la autovaloración y de la
proyección futura de la personalidad, vinculados a la regulación motiva-
cional en esta esfera.
La caracterización de los componentes cognitivo, afectivo, auto-
valorativo y de proyección futura, a partir de un conjunto de indicadores
elaborados para su diagnóstico, y desde el punto de vista metodológico,
mediante la utilización de técnicas de expresión abierta (composiciones,
cuestionarios, entrevistas, etc.), nos permitió establecer diferentes niveles
de desarrollo de la motivación profesional en jóvenes que cursan diferentes
carreras en nuestro país (DOMÍNGUEZ, 2003).
Los niveles encontrados dependen de las diversas formas en que
se maniestan e integran los componentes anteriormente denidos y po-
seen, a mi juicio, un valor para la práctica educativa, especialmente para
la aplicación del principio de individualización de la enseñanza. El nivel
más representativo constatado por nosotros en los estudiantes universita-
rios presenta como características un desarrollo parcial del componente
cognitivo, un desarrollo del componente afectivo en términos positivos y
la ausencia de desarrollo de los componentes más complejos; es decir, del
autovalorativo y el de proyección futura (DOMÍNGUEZ, 2003).
Los principales logros del desarrollo psicológico en esta etapa
constituyen una manifestación de la principal dirección que sigue todo el
desarrollo de la subjetividad humana saludable: la hermosa y a la vez difícil
tarea de crecer.
158 MENDONÇA, S. G. L.; PENITENTE, L. A. A.; MILLER, S. (Org.)
Este crecimiento, entendido como posibilidad de alcanzar una
personalidad madura requiere de la conquista de la autodeterminación,
como capacidad del sujeto de actuar con relativa independencia de las in-
uencias externas, de orientar su comportamiento en las principales esferas
de signicación para la personalidad y de conducirse de forma consciente,
intencional y estable, en consonancia con los auténticos valores de su en-
torno social.
Es importante destacar que las regularidades aquí analizadas, ba-
sándonos en la categoría en cuestión, se presentan como tendencias del
desarrollo psicológico y permiten establecer los límites de estas edades, sin
desconocer que las mismas se expresan en el sujeto individual de manera
particular e irrepetible, en tanto dependen de las condiciones de educación
en las que transcurre su vida, de las principales adquisiciones psicológicas
logradas en las etapas anteriores y, muy especialmente, de la forma en que
él se apropia de las inuencia externas y construye activamente su propia
subjetividad.
El análisis de estas regularidades debe aún profundizarse desde
una visión dialéctica de la relación existente entre los diferentes factores
determinantes del desarrollo psicológico, que nos permita una compren-
sión más amplia y profunda del carácter histórico y social de los diferentes
períodos del ciclo vital de desarrollo humano, desde una perspectiva psico-
lógica. Esta tarea constituye una premisa esencial para lograr hacer realidad
en la práctica pedagógica y en el proceso de educación de la personalidad
de nuestros niños, adolescentes y jóvenes, la tesis básica del Enfoque His-
tórico Cultural, relativa a que la enseñanza precede el desarrollo y lo dirige,
teniendo en cuenta sus regularidades.
La situación “social del desarrollo” en esta etapa conduce al proce-
so de autodeterminación de la personalidad, en consonancia con las tareas
y exigencias que el joven debe cumplimentar. La posibilidad de alcanzar
este nivel de regulación dependerá de las condiciones de vida y educación
en las que haya transcurrido el desarrollo de la personalidad, y de si dichas
condiciones han preparado al sujeto para actuar en base a propósitos cons-
cientemente adoptados, que mediaticen las contingencias situacionales
que puedan surgir (DOMÍNGUEZ, 2014a; 2014b).
A Questão do Método e a Teoria Histórico-Cultural 159
ii ProyectoS futuroS en jóveneS cubanoS.
Desde 1998 hasta la fecha, en trabajos investigativos de diploma
y maestría, realizados bajo mi tutoría en torno al desarrollo de los proyectos
futuros en jóvenes cubanos, se han obtenido interesantes resultados sobre
el tema (Del Toro, 1998; Sánchez, 1999; A. S. Llanes, 1999; E. Hernán-
dez, 2000; López, 2000; Boza y Quiñones, 2001; Rodríguez y Alfonso,
2002; Garbizo , 2004; Águila, 2005; Y. Hernández, 2006; D. Martínez,
2007; Estévez, 2008; T. Martínez, 2009; Mendoza, 2009; Balseiro 2011;
Y. Llanes, 2011 y 2015; Márquez, 2011; Tamayo, 2011; Contreras, 2013;
Cancio-Bello, 2014; Reyes, 2014; Pantoja, 2014; Brito, Fleitas, 2016, Za-
netti, 2016)
Por proyección futura entendemos
“la estructuración e integración de un conjunto de motivos, elaborados
en una perspectiva temporal futura, a mediano o largo plazo, que poseen
una elevada signicación emocional o sentido personal para el sujeto y de
las estrategias correspondientes para el logro de los objetivos propues-
tos.” (DOMÍNGUEZ, IBARRA, 2003, p. 446).
Para la caracterización de los proyectos futuros de los jóvenes in-
vestigados hemos utilizado técnicas abiertas y semi abiertas (Cuestiona-
rios, entrevistas, 10 deseos, Completamiento de frases) y hemos partido de
cuatro dimensiones de análisis que fueron siendo construidas en el propio
proceso investigativo, cada una de las cuales es evaluada por distintos indi-
cadores. Dichas dimensiones son:
- Contenido del proyecto: Esfera de los sistemas de actividad o de
comunicación al que se orienta. También puede estar referido a la propia
persona.
- Estrategias: Vías o acciones a partir de las cuales el sujeto piensa
alcanzar los proyectos a los que aspira. Pueden presentarse como estructu-
radas, parcialmente estructuradas o no estructuradas.
- Temporalidad: Momento en el tiempo en que se ubica la conse-
cución del proyecto; es decir, si a corto plazo (hasta un año), mediano plazo
(más de un año y hasta cinco años), largo plazo (más de cinco años) o plazo
indenido.
160 MENDONÇA, S. G. L.; PENITENTE, L. A. A.; MILLER, S. (Org.)
- Obstáculos: Previsión de contingencias que puedan afectar la
consecución de los proyectos; ya sean de carácter interno (dependen de
la intencionalidad del sujeto), externo (son independientes de la voluntad
del sujeto) o mixtos (cuando se mencionan a la vez obstáculos internos y
externos).
Los principales resultados derivados de estas investigaciones, en
síntesis, no han permitido arribar a las siguientes conclusiones:
1. Los principales contenidos de proyectos futuros de los jóvenes
investigados, en sentido general, se asocian a las esferas del estudio, la pro-
fesión-trabajo, la familia, la realización de sí mismo, el empleo del libre y la
búsqueda de caminos que les permitan satisfacer sus necesidades materiales.
Lo anterior indica que la posición interna del joven, como resultado de
todo su desarrollo anterior y de las características de su situación social
del desarrollo, condicionan el contenido de los proyectos futuros hacia las
esferas esenciales de su vida.
2. Se encontró una relación de igualdad-diversidad en los proyectos
de los jóvenes. La igualdad se expresa en la semejanza de las aspiraciones
y objetivos de estos, en cuanto a esferas más signicativas hacia las que se
orientan los proyectos. La diversidad está referida a la manifestación concreta
de los mismos, en cuanto al nivel de estructuración de las estrategias para su
consecución, su temporalidad y la previsión de los obstáculos. En este sentido,
en los jóvenes desvinculados del estudio y/o trabajo, los que consumen
sustancias tóxicas y los que han cometido delitos (reclusos), es pobre el
espectro de motivos orientados el futuro, así como su nivel de estructu-
ración. Otra diferencia interesante es que, en los jóvenes evangélicos, su
cosmovisión religiosa se integra al contenido de sus proyectos orientados a
diferentes esferas.
3. Existen diferencias en cuanto al nivel de elaboración de las
estrategias encaminadas a la consecución de los proyectos, ya que mientras
unos las fundamentan y se proponen un conjunto de acciones encamina-
das a potenciar el logro de sus objetivos, otros sólo mencionan algunas de
forma aislada, sin una elaboración personal en torno a ellas. En sentido
general, las estrategias tienden a presentarse como parcialmente estructu-
radas.
A Questão do Método e a Teoria Histórico-Cultural 161
4. La temporalidad es diversa y abarca tanto el corto como el me-
diano y largo plazo, en dependencia del contenido del proyecto. En este
sentido, se destaca una subordinación del proyecto de constitución de la
familia propia al proyecto profesional. Así, mientras los proyectos profe-
sionales y el estudio aparecen con elevada frecuencia y con una temporali-
dad a corto y mediano plazo, siendo fuente de realización personal para el
sujeto, otros proyectos como los de formar una familia propia se ubican a
mediano o largo plazo, ya que el logro de los primeros, en opinión de los
jóvenes, sirve de sostén a los segundos. En las investigaciones más recientes
se destaca el indicador del plazo no denido.
5. La previsión de obstáculos puede tener una orientación también
diversa; interna cuando se hace depender de las propias características per-
sonales del joven; externa cuando los obstáculos se asocian a contingencias
de carácter social, presentes en sus sistemas de actividad y comunicación
o mixta cuando se brindan argumentos en ambos sentidos. No obstante,
aunque tiende a primar la referencia a obstáculos externos, lo que puede
estar indicando limitaciones en la capacidad de autodeterminación.
6. El nivel cultural y la vinculación social de los jóvenes parecen
ser factores inuyentes en las características que adopta la proyección tem-
poral de su motivación orientada al futuro.
conSideracioneS finaleS
1. La caracterización de las principales regularidades del desar-
rollo psicológico en etapa de la juventud puede llevarse a cabo atendiendo
a los principios del Enfoque Histórico Cultural y, en particular, a la catego-
ría “situación social del desarrollo”, que nos propone valorar la interacción
presente en cada edad psicológica, entre las condiciones internas y externas
del desarrollo, la cual da lugar al surgimiento de las nuevas formaciones
psicológicas típicas del período en cuestión.
2. Los proyectos futuros en la juventud no constituyen un re-
sultado lineal del desarrollo psicológico y de la personalidad, ya que su
aparición y nivel de estructuración no depende de la maduración biológica
ni de la inuencia directa de lo social, sino de la apropiación activa que
hace el joven de las inuencias educativas que se promueven en su entorno
162 MENDONÇA, S. G. L.; PENITENTE, L. A. A.; MILLER, S. (Org.)
y del desarrollo subjetivo que ha alcanzado, en función de toda su historia
de vida.
referenciaS
ÁGUILA, B. R. Y. Proyectos profesionales y utilización del tiempo. Tesis de Diploma. Fa-
cultad de Psicología. Universidad de La Habana, Cuba, 2005.
BALSEIRO, A. Y. Proyectos futuros en estudiantes de la Licenciatura en Informática de la
lial universitaria “René Ramos Latour” durante el curso 2010-2011. Tesis de Diploma.
Facultad de Psicología. Universidad de La Habana, Cuba, 2011.
BOZA, G. Y.; QUIÑONES, H. J. Factores psicosociales que determinan la inserción del
alcohólico joven en el proceso de rehabilitación. Tesis de Diploma. Facultad de Psicología.
Universidad de La Habana, Cuba, 2001.
BOZHOVICH, L. I. La personalidad y su formación en la edad infantil. La Habana,
Cuba: Editorial Pueblo y Educación, 1976.
BRITO, P. D. Proyectos futuros y situación social del desarrollo en jóvenes con cardiopatía
congénita, intervenidos quirúrgicamente. Tesis de diploma. Facultad de Psicología. Uni-
versidad de La Habana, Cuba, 2015.
CANCIO-BELLO, A. C. Identidad de género y proyectos futuros: su relación desde la
perspectiva de género en mujeres jóvenes que ejercen la prostitución. Tesis de Diploma.
Facultad de Psicología. Universidad de La Habana, Cuba, 2014.
CONTRERAS, O. Y. Proyectos futuros y situación social del desarrollo de un grupo de jóve-
nes alcohólicos: un estudio realizado en el Programa de Alcohólicos Anónimos. Tesis de
Diploma. Facultad de Psicología. Universidad de La Habana, Cuba, 2013.
DEL TORO, V. Y. Caracterización psicológica de los adiestrados de nivel superior y la re-
serva cientíca de las Ciencias Naturales y Matemáticas de la Universidad de La Habana.
Tesis de Diploma. Facultad de Psicología. Universidad de La Habana, Cuba, 1998.
DAVIDOV, V. V. La enseñanza escolar y el desarrollo psíquico. Moscú: Editorial Progreso,
1988.
__________. Análisis de los principios didácticos de la escuela tradicional y posibles
principios de enseñanza en el futuro próximo. En: La Psicología Evolutiva y Pedagógica
en la URSS. Moscú: Editorial Progreso, 1987. (Antología).
__________. Tipos de generalización en la enseñanza. La Habana, Cuba: Editorial Pue-
blo y Educación, 1981.
DOMÍNGUEZ, G. L. El desarrollo psicológico humano como proceso de continuidad y
ruptura: la “situación social del desarrollo”. Trabajo presentado en el II Coloquio Inter-
nacional: vida, pensamiento y obra de los principales representantes rusos, celebrado los
A Questão do Método e a Teoria Histórico-Cultural 163
días 5 y 6 de mayo de 2014 en el Campus Santa Mônica de la Universidad Federal de
Uberlândia. Minas Gerais, Brasil, 2014a.
__________. La formación de valores en jóvenes universitarios. Revista Universidad de
La Habana, La Habana, Cuba, n. 278, p. 108-118, julio-diciembre 2014b.
__________. Psicología del Desarrollo: problemas, principios y categorías. La Habana,
Cuba: Editorial Félix Varela, 2007.
__________.Motivación Profesional y Personalidad. En: Pensando en la Personalidad.
Colectivo de autores. Tomo I. La Habana, Cuba: Editorial Félix Varela, 2003.
__________. Caracterización de los niveles de desarrollo de la motivación profesional en
estudiantes. 1992.
DOMÍNGUEZ, G, L.: IBARRA, M. L. Juventud y Proyecto de Vida. En: DOMÍN-
GUEZ, G. L. (Comp.) Psicología del Desarrollo: Adolescencia y Juventud. La Habana,
Cuba: Editorial Félix Varela, 2003.
ELKONIN, D. B. (1987) Sobre el problema de la periodización del desarrollo en la
infancia. En: La Psicología Evolutiva y Pedagógica en la URSS. Moscú: Editorial Progreso,
1987. (Antología).
ESTÉVEZ, Y., Y. Caracterización de los Proyectos de Vida de un grupo de Jóvenes Reclusos.
Tesis de diploma. Facultad de Psicología. Universidad de la Habana, Cuba, 2008.
FLEITAS, P. N. Identidad de género y proyectos futuros: su relación desde la perspectiva de
género en hombre jóvenes homosexuales. Tesis de diploma. Facultad de Psicología. Univer-
sidad de La Habana, Cuba, 2016.
GALPERIN, P. Y. Sobre la investigación del desarrollo intelectual del niño. En: La Psi-
cología Evolutiva y Pedagógica en la URSS. Moscú: Editorial Progreso, 1987. (Antología).
__________. Introducción a la Psicología. La Habana, Cuba: Editorial Pueblo y Educa-
ción, 1982.
GARBIZO, F. N. Caracterización de la relación existente entre proyectos profesionales y
familiares en jóvenes estudiantes universitarios del Modelo de continuidad de estudios en la
Educación Superior. Tesis de Maestría en Psicología Educativa. Facultad de Psicología.
Universidad de La Habana, Cuba, 2004.
GONZÁLEZ, R. F. Motivación moral en adolescentes y jóvenes. La Habana, Cuba: Edito-
rial Cientíco-Técnica, 1983.
HERNÁNDEZ, G. E. Planica tu tiempo, haz tus proyectos realidad. Proyección futura
de un grupo de jóvenes maestros. Tesis de Maestría en Psicología Educativa. Facultad de
Psicología. Universidad de La Habana, Cuba, 2000.
HERNÁNDEZ, D. Y. Proyectos futuros y empleo del tiempo en estudiantes universitarios.
Tesis de Diploma. Facultad de Psicología. Universidad de La Habana, Cuba, 2006.
164 MENDONÇA, S. G. L.; PENITENTE, L. A. A.; MILLER, S. (Org.)
KON, I. S. Psicología de la Edad Juvenil. La Habana, Cuba: Editorial Pueblo y Educa-
ción, 1990.
LLANES, T. A. S. Aproximación al estudio de la motivación religiosa en jóvenes evangélicos.
Tesis de Diploma. Facultad de Psicología. Universidad de La Habana, Cuba, 1999.
LLANES, B. Y. Proyecto de vida y esquizofrenia. Un estudio exploratorio con pacientes
jóvenes rehabilitados». Máster Universitario en Desarrollo Social. Facultad de Ciencias
Sociales y de la Comunicación. Instituto Internacional Juan Pablo II. Departamento de
Ciencias Humanas y Religiosas. Universidad Católica de San Antonio. España, 2015.
__________, Caracterización de la esfera motivacional de los adolescentes estudiantes de
tercer año del Politécnico “Antonio Guitera Holmes”. Un estudio con una perspectiva futu-
ra. Tesis de Diploma. Facultad de Psicología. Universidad de La Habana, Cuba, 2011.
LÓPEZ, G. O. Juventud y drogadicción. Diez jóvenes para un estudio de caso. Tesis de
Diploma. Facultad de Psicología. Universidad de La Habana, Cuba, 2000.
MÁRQUEZ, A. Y. Caracterización de la esfera motivacional en estudiantes con discapa-
cidad visual de la Universidad de La Habana. Tesis de Diploma. Facultad de Psicología.
Universidad de La Habana, Cuba, 2011.
MARTÍNEZ, J. D. Caracterización de la motivación en jóvenes. Un estudio realizado en
el Modelo Pedagógico de la Universalización. Tesis de Diploma. Facultad de Psicología.
Universidad de La Habana, Cuba, 2007.
MARTÍNEZ, J. T. Caracterización de la esfera motivacional de jóvenes que abandonan la
carrera de Psicología en el Modelo Pedagógico de Universalización de la Enseñanza. Tesis de
Diploma. Facultad de Psicología. Universidad de La Habana, Cuba, 2009.
MENDOZA, F. M. Proyectos de Vida de un grupo de jóvenes desvinculados del estudio y/o
trabajo en el Consejo Popular Colón, correspondiente al municipio Centro Habana. Tesis de
Diploma. Universidad de La Habana, Cuba, 2009.
PANTOJA, M. A. Proyectos futuros y “situación social del desarrollo” de un grupo de jóvenes
trabajadores estatales y cuentapropistas. Tesis de Diploma. Facultad de Psicología. Univer-
sidad de La Habana, Cuba, 2014.
RODRÍGUEZ, M.; ALFONSO, Y. Caracterización de los proyectos profesionales y fami-
liares en estudiantes de Psicología del Modelo de continuidad de estudios en la Educación
Superior. Tesis de Diploma. Facultad de Psicología. Universidad de La Habana, Cuba,
2002.
REYES, V. S. Proyectos profesionales y motivos de elección de las temáticas abordadas en las
obras de un grupo de jóvenes realizadores de audiovisuales. Tesis de Diploma. Facultad de
Psicología. Universidad de La Habana, Cuba, 2014.
SÁNCHEZ, F. I. Caracterización de los adiestrados de nivel superior y la reserva cientíca
de las Ciencias Sociales y Económicas de la Universidad de La Habana. Tesis de Diploma.
Facultad de Psicología. 1999.
A Questão do Método e a Teoria Histórico-Cultural 165
TAMAYO, R. A. I. Proyectos futuros en jóvenes estudiantes de la Escuela Militar Superior
“Comandante Arides Estévez Sánchez”. Tesis de Diploma. Facultad de Psicología. Univer-
sidad de La Habana, Cuba, 2011.
VENGUER, L. A. Temas de Psicología Preescolar. La Habana, Cuba: Editorial Pueblo y
Educación, 1976.
VYGOTSKI, L. S. La crisis de los siete años. En: SEGARTE IZNAGA, A. L.; MARTÍ-
NEZ CAMPOS, G. A.; RODRÍGUEZ PÉREZ, M. E. (Comp.) Psicología del Desar-
rollo del Escolar. Selección de Lecturas. La Habana, Cuba.: Editorial “Félix Varela”, 2003.
Tomo I.
__________. El Problema de la Edad. En: Psicología del Desarrollo Selección de Lecturas.
Colectivo de autores. La Habana, Cuba: Editorial “Félix Varela”, 2001.
__________. El desarrollo de las funciones psíquicas superiores. La Habana, Cuba: Edito-
rial Cientíco Técnica, 1987.
__________. El Problema del Entorno. En: Fundamentos de la Podología. Cuarta Con-
ferencia publicada. Leningrado: Izdanie Instituto, 1935. (Material digitalizado).
ZANETI, D., P. Características de los proyectos futuros de un grupo de jóvenes universitarios
del Curso Regular Diurno que estudian y trabajan. Tesis de diploma. Facultad de Psicolo-
gía. Universidad de La Habana, Cuba, 2016.
ZAPOROZHETS, A. V. El papel de lo biológico y lo social en la ontogénesis de la
psiquis humana. En: Psicología en el Socialismo. La Habana, Cuba: Editorial Ciencias
Sociales, 1987.
A Questão do Método e a Teoria Histórico-Cultural 167
Sobre oS autoreS
guillermo ariaS beatón doutorou-se pelo Instituto de Ciências Pedagógicas
do Centro de Pesquisa do Ministério da Educação e da Academia de Ciências
de Cuba em 1984. É professor catedrático da Faculdade de Psicologia da Uni-
versidade de Havana e Professor Adjunto do Instituto Pedagógico Enrique José
Varona. Tem ministrado cursos e conferências em diversas universidades e centros
de pós-graduação (México, Chile, Brasil, Espanha, Noruega, Estados Unidos,
Porto Rico e Colômbia) e foi professor visitante nas Universidades de Porto Rico,
México, Espanha e Brasil.
idania b. Peña graSS é Doutora em Ciências Psicológicas pela Dragunova Uni-
versity/Kiev (1984 – 1989). Trabalha como psicóloga na Clínica Centro de De-
senvolvimento da Personalidade - Rio Claro/São Paulo/Brasil desde fevereiro de
2004, atendendo pessoas de todas as idades e realizando atenção individual, em
grupos, familiar e institucional. A Clínica fundamenta-se na Teoria Histórico-
-Cultural de L.S. Vigotsky e atende áreas da saúde mental tais como avaliação
neuropsicológica, diagnóstico, avaliação e orientação psicológica, psicoterapia,
dentre outras.
maria eliza mattoSinho bernardeS é Doutora em Metodologia do Ensino pela
Faculdade de Educação da USP (2006). Trabalha na Universidade de São Paulo
e integra o Grupo de Estudo e Pesquisa sobre Atividade Pedagógica (GEPAPe/
USP) e o Grupo de Estudo sobre a Psicologia Histórico-Cultural no LIEPPE
(IP/USP). Lidera o Grupo de Estudo e Pesquisa Educação, Sociedade e Políticas
Públicas - GEPESPP (EACH USP/ CNPq) e o Laboratório de Educação e De-
senvolvimento Psicológico – LEDEP )EACH USP/CNPq).
marta Sueli de faria Sforni possui graduação em Pedagogia pela Universidade
Estadual de Maringá (1986), mestrado em Educação pela Universidade Estadual
de Maringá (1996), doutorado em Educação pela Universidade de São Paulo
- USP (2003) e pós-doutorado pela Universidade Estadual de Campinas - Uni-
camp (2014). Atualmente é professora associada da Universidade Estadual de
Maringá e membro do corpo docente do Mestrado e Doutorado do Programa de
Pós-Graduação em Educação. Tem experiência na área de Educação, com ênfase
em Métodos e Técnicas de Ensino.
168 MENDONÇA, S. G. L.; PENITENTE, L. A. A.; MILLER, S. (Org.)
ana carolina galvão marSiglia é Graduada em Pedagogia pela Unesp (Bauru)
(2005) e Doutora em Educação Escolar pela Unesp (Araraquara) (2011). Reali-
zou estudos de Pós-doutorado na Universidade Estadual de Campinas (Unicamp)
sob supervisão de Dermeval Saviani (2015-2016). É professora do Centro de
Educação da Universidade Federal do Espírito Santo (UFES) e do Programa de
Pós-Graduação em Educação da mesma Universidade, na linha de pesquisa Do-
cência, currículo e processos culturais. É membro do Núcleo de Educação Infan-
til (NEDI-UFES), do Grupo de Pesquisa Estudos Marxistas em Educação, do
Fórum Capixaba de Lutas Sociais, além de líder do grupo de pesquisa Pedagogia
histórico-crítica e educação escolar (UFES).
hadaSSa da coSta Santiago bremenkamP é Licenciada em Pedagogia pela
Universidade Federal do Espírito Santo. É especializada em Educação, Pobreza e
Desigualdade Social pela Ufes. Membro do Laboratório de Gestão da Educação
Básica do Espírito Santo (LAGEBES/UFES). Integrante do Grupo de Pesquisa
Pedagogia Histórico-Crítica e Educação Escolar. Tem interesse na área da Educa-
ção com ênfase na prática pedagógica.
elieuza aParecida de lima graduou-se em Pedagogia (1996) e obteve os títulos
de Mestre em Educação (2001) e Doutora em Educação (2005) pela Universida-
de Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho - Campus de Marília. É docente do
curso de Pedagogia e do Programa de Pós-Graduação em Educação da Faculdade
de Filosoa e Ciências (FFC) da Universidade Estadual Paulista - Campus de
Marília (SP). É líder do Grupo de Estudos e Pesquisa sobre Especicidades da
Docência na Educação Infantil - GEPEDEI e membro do Grupo de Pesquisa
Implicações Pedagógicas da Teoria Histórico-Cultural (Unesp/Marília).
armando marino filho possui graduação em Psicologia (2003) e Licenciatura e
Bacharelado em Psicologia (2003) pela Universidade Paulista. Tem Mestrado em
Educação (2008) e Doutorado em Educação (2011) pela Universidade Estadual
Paulista Júlio de Mesquita Filho - Marília SP. É Professor Adjunto na Universida-
de Federal de Mato Grosso do Sul (Pedagogia e Licenciaturas). É líder do Grupo
de Pesquisa A Teoria Histórico-Cultural para o ensino e aprendizagem da UFMS
Três Lagoas e membro do Grupo de Pesquisa Implicações Pedagógicas da Teoria
Histórico-Cultural (Unesp /Marília).
laura dominguez garcia é licenciada em Psicologia e Doutora em Ciências Psi-
cológicas. É Professora Titular e Chefe do Departamento de Formação Básica na
Faculdade de Psicologia da Universidade de Havana, Cuba. É membro dos conse-
lhos e do centro de estudos sobre a juventude e membro da Sociedade de Psicólogos
de Cuba, onde tem ocupado diversas responsabilidades. Trabalha há trinta anos
como professora da Universidade de Havana com resultados destacados na do-
cência, na investigação e no trabalho educativo.
A Questão do Método e a Teoria Histórico-Cultural 169
organizadoraS:
Sueli guadeluPe de lima mendonça tem graduação em Ciências Sociais pela
Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (1983), mestrado em
Educação pela Universidade Federal de São Carlos (1990) e doutorado em Edu-
cação pela Universidade de São Paulo (1998). É docente do Departamento de
Didática e membro do Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais da Fa-
culdade de Filosoa e Ciências – Unesp/Marília. É líder do Grupo de Pesquisa
Implicações pedagógicas da teoria histórico-cultural, Vice-coordenadora do Núcleo
de Ensino (Unesp/Marília) e Coordenadora Institucional do Pibid/Unesp.
luciana aParecida araújo Penitente possui graduação em Pedagogia (1995),
Mestrado em Educação (2001) e Doutorado em Educação (2005) pela Univer-
sidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho e Pós-doutorado pela Fundação
Carlos Chagas (2013). É docente da Faculdade de Filosoa e Ciências - Unesp/
Marília, atuando no curso de Pedagogia e no Programa de Pós-Graduação em
Educação. É líder do Grupo de Pesquisa Filosoa Contemporânea: Habermas. É
membro do Grupo de Pesquisa do Programa de Estudos Pós-Graduandos em
Educação: Psicologia e Educação da PUC/SP.
Stela miller possui doutorado em Ensino na Educação Brasileira pela Faculda-
de de Filosoa e Ciências - Unesp - Campus de Marília (1998). É docente aposen-
tada do Departamento de Didática da Faculdade de Filosoa e Ciências da Unesp
Campus de Marília (SP) e professora voluntária do programa de Pós-Graduação
em Educação na mesma Instituição. Tem experiência na área de Educação, com
ênfase em Metodologia do Ensino de Língua Portuguesa (Fundamental I).
170 MENDONÇA, S. G. L.; PENITENTE, L. A. A.; MILLER, S. (Org.)
Catalogação
Telma Jaqueline Dias Silveira
Normalização e Revisão
Karenina Machado
Assessoria Técnica
Maria Rosangela de Oliveira
Capa e Diagramação
Gláucio Rogério de Morais
Produção gráca
Giancarlo Malheiro Silva
Gláucio Rogério de Morais
2017
Impressão e acabamento
Gráca Shinohara
Marília - SP
Formato
16X23cm
Tipologia
Adobe Garamond Pro
Papel
Polén soft 88g/m2 (miolo)
Cartão Supremo 250g/m2 (capa)
Acabamento
Grampeado e colado
Tiragem
300
Sobre o livro